Acórdão do Tribunal da Relação do Porto | |||
Processo: |
| ||
Nº Convencional: | JTRP000 | ||
Relator: | ANA LUCINDA CABRAL | ||
Descritores: | ARRENDAMENTO DESPEJO FALTA DE PAGAMENTO DE RENDAS ÓNUS DA PROVA | ||
![]() | ![]() | ||
Nº do Documento: | RP201903261208/17.5T8MTS.P1 | ||
Data do Acordão: | 03/26/2019 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Texto Integral: | S | ||
Privacidade: | 1 | ||
![]() | ![]() | ||
Meio Processual: | APELAÇÃO | ||
Decisão: | CONFIRMADA | ||
Indicações Eventuais: | 2ª SECÇÃO, (LIVRO DE REGISTOS N.º883, FLS.195-204) | ||
Área Temática: | . | ||
![]() | ![]() | ||
Sumário: | I - Na acção de despejo o senhorio tem de provar todos os factos constitutivos do direito à resolução que pretende fazer valer, isto é, a falta de pagamento das rendas nas condições em que tal situação lhe confere esse direito potestativo, o que passa por provar a falta de entrega atempada no local convencionado do meio de pagamento das rendas. II - O entendimento de que do disposto no artigo 1084º do CC e no artigo 14º, nº 1, da Lei 6/2006 resulta que a acção de despejo apenas se destina às situações em que a lei impõe o recurso à via judicial, o que apenas acontece relativamente à resolução efectuada pelo senhorio com fundamento no disposto no nº 2 do art. 1083º e não nos casos em que a lei expressamente permite que a resolução do contrato opere por via extrajudicial é incompatível com o direito constitucional de acesso aos tribunais, consagrado no artigo 20º da Constituição. | ||
Reclamações: | |||
![]() | ![]() | ||
Decisão Texto Integral: | Proc. nº 1208/17.5T8MTS.P1 Tribunal Judicial da Comarca do Porto Juízo Central Cível da Póvoa de Varzim - Juiz 3 Acordam no Tribunal da Relação do Porto B…, residente na Rua …, n.º …, Guimarães, instaurou contra C…, Lda., com sede na Av. …, …, Matosinhos, a presente acção de processo comum, pedindo a condenação desta a entregar-lhe o imóvel objecto do contrato de arrendamento cuja caducidade operou a 31/12/2016 e a pagar-lhe a título de indemnização pelo atraso nessa entrega a quantia de 6.948,83€ vencida até à presente data, 9/03/2017, bem como da quantia de 3.034,00/mês, desde então até efectiva restituição e a declaração de resolução do contrato de arrendamento em causa com o consequente despejo imediato do imóvel.I - Relatório Para o efeito, alegou, em suma, que é proprietário do imóvel cujo direito ao arrendamento foi adquirido pela R. por trespasse do estabelecimento nele instalado, altura em que foi estabelecido que a duração do respectivo contrato de arrendamento seria de um ano com início em 1/01/1973. Nesse contexto, refere que por comunicação à R. se opôs à renovação do contrato de arrendamento pedindo a entrega do imóvel na data da caducidade, 31/12/2016, o que não sucedeu. Para mais, invocou que desde Fevereiro de 2016 até à data da caducidade do contrato a R. nunca pagou as rendas atempadamente nem fez cessar a mora. Citada, a R. apresentou contestação, começando por invocar erro na forma do processo, que veio a ser indeferido, e impugnou quer a caducidade do contrato, por se tratar de um contrato de duração indeterminada, quer a mora no pagamento das rendas que se verificou em relação a apenas uma delas. Realizada audiência prévia, foi proferido despacho saneador, identificado o objecto do processo e enunciados os temas de prova, que não mereceram reclamação. Procedeu-se à realização da audiência de discussão e julgamento de acordo com o formalismo legal. Foi proferida decisão a julgar a acção de despejo totalmente improcedente, e, em consequência, a absolver a ré dos pedidos. B…, veio interpor recurso, concluindo: 1.ª Não deveria o Tribunal a quo ter considerado que, face à prova produzida perante si, os pagamentos mensais a que está adstrita a recorrida foram realizados mediante emissão de cheques entregues presencialmente ao recorrente, 2.ª Pois, perante a factualidade dada como assente não se vislumbra como poderá tal facto ter ficado demonstrado, nem podia, pois não corresponde à verdade, nem nunca tal foi alegado pelo Recorrente ou sequer, pela Recorrida; 3.ª Se o Tribunal a quo se serviu, para formar a sua convicção, do depoimento prestado pela testemunha, Sr. D… e da prova documental junta aos autos, não poderia resultar outra conclusão do que não foram os depósitos atrasados pelo recorrente de forma intencional, não tendo estado sequer os cheques alguma vez na sua disponibilidade, 4.ª Na verdade, o depósito dos cheques, a título de pagamento de rendas, SEMPRE foi efectuado pela recorrida; 5.ª Assim, os factos provados impunham decisão diversa daquela que foi assumida na douta sentença do Tribunal a quo. 6.ª Então, se o recorrente disponibiliza à recorrida o gozo temporário do locado em contrapartida tem direito à prestação pecuniária mensal a que a recorrida está obrigada; 7.ª Essa obrigação é o pagamento da renda que, conforme convencionado, tem o seu vencimento no primeiro dia útil do mês, 8.ª Nos termos dos art. 1038.º al. a) do Cód. Civil, é obrigação e dever do arrendatário, in casu, da recorrida, pagar pontualmente a prestação pecuniária; 9.ª Devendo ter-se em conta que o pagamento pontual dessa obrigação significa que deve a renda ser disponibilizada ao senhorio, aqui recorrente, na sua data de vencimento ou nos oito dias subsequentes, 10.ª De forma que o recorrente veja o seu crédito satisfeito bem como o seu interesse no contrato em questão; 11.ª Se a recorrida efetuou o pagamento da renda mensal fora do prazo previsto para o seu vencimento ou nos oito dias imediatamente posteriores, 12.ª A consequência direta de tal incumprimento atempado é que a recorrida se constitui em retardamento e consequente mora relevante para efeitos legais! 13.ª A mora relevante dá lugar, conforme ANTUNES VARELA, à situação objetiva de não realização da prestação atempadamente e irregular inadimplemento do interesse do credor. 14.ª Conforme os artigos 1083.º n.º 4 e 1085.º n.º 2 do Cód. Civil, perante esta situação morosa, de forma repetida, é inexigível a manutenção da vigência do contrato de arrendamento; 15.ª O que foi pedido pelo recorrente na ação declarativa, 16.ª No entanto, este pedido subsidiário do recorrente, não foi atendido pelo Tribunal a quo, não declarando este a resolução do contrato de arrendamento, nem conferindo ao recorrente o direito à indemnização igual a 50% do que for devido, cfr. art. 1041.º n.º 1 e 2 do Cód. Civil. 17.ª Porém, o n.º 2 do art. 1042.º também do Cód. Civil, estatui que o direito à indemnização cessa se o arrendatário fizer cessar a mora no prazo de oito dias a começar do seu vencimento. 18.ª Mas tal não sucedeu. 19.ª A recorrida, de forma useira e vezeira, constituiu-se em mora relevante sem a fazer cessar nos oito dias subsequentes, nas rendas referentes aos meses de Março, Abril, Maio, Junho, Agosto, Outubro, Novembro e Janeiro de 2017, com vencimento nos meses imediatamente anteriores; 20.ª Se, nos termos do art. 1083.º n.º 4 do Cód. Civil, basta que durante quatro meses, seguidos ou interpolados, num período de 12 meses, a recorrida se constitua em mora, este é fundamento para o recorrente resolver o contrato de arrendamento, 21.ª É que a renda apenas se deve considerar paga ou cumprida, quando a mesma seja disponibilizada na esfera jurídica do senhorio, 22.ª Ou seja, só quando o recorrente receciona o montante devido a título de pagamento de renda é que o mesmo se considera pago, o crédito se considera satisfeito ou a obrigação se considera cumprida. 23.ª De outra forma, a demora do arrendatário após o vencimento e respetivos oito dias subsequentes no pagamento da prestação periódica mensal a que está adstrito, apenas lhe pode ser imputada a si próprio, 24.ª O depósito de um cheque por parte da recorrida no último dia do prazo em instituição bancária diferente da que possui a conta bancária do recorrente, nunca chegará dentro do prazo em que a mora não se configura relevante para efeitos de resolução, 25.ª É impossível que não se impute a culpa no retardamento da receção da prestação por parte do recorrente, na conduta da recorrida! 26.ª Faz toda a diferença saber sobre quem recairá a culpa do não pagamento da obrigação pecuniária com a devida antecedência, 27.ª Isto é, quem deve sofrer as consequências deste atraso 28.ª Não havendo dúvidas de que o senhorio tem direito a receber ou ter, na sua disponibilidade, efetivamente, o montante da renda dentro do prazo que o contrato e a lei fixam! 29.ª Já por isso, prevê o art. 1083.º n.º 4 do Cód. Civil a inexigibilidade da manutenção do contrato de arrendamento quando o arrendatário se constitua em mora superior a 4 meses, num período de 12 meses, 30.ª E, assim, a douta sentença recorrida violou os art. 1083.º n.º 4, 1041.º n.º 1 e 2 e 1042.º n.º 1 do Cód. Civil, 31.ª Pois, em face do exposto, deve a decisão recorrida na parte em que absolveu a Ré da instância quanto à resolução do contrato, ser alterada, devendo o Tribunal ad quem julgar procedente o pedido de resolução do contrato de arrendamento, ordenando o despejo imediato do locado, 32.ª Condenando a Ré a entregar o locado livre e devoluto ao Autor; 33.ª Bem como, devem as custas recair sobre a Ré/Apelada. * TERMOS EM QUE, V/ EXAS., VENERANDOS DESEMBARGADORES: I. DEVEM CONSIDERAR QUE OS PAGAMENTOS DOS MONTANTES A TÍTULO DE RENDAS FORAM PAGOS PELA RECORRIDA ATRAVÉS DE CHEQUES BANCÁRIOS, SEMPRE POR SI DEPOSITADOS NA CONTA BANCÁRIA DO RECORRENTE; II. APENAS À RECORRIDA DEVE SER IMPUTADA A MORA RELEVANTE EM QUE SE CONSTITUIU; III. ASSIM, DEVENDO SER ALTERADA A DECISÃO JUDICIAL NA PARTE EM QUE ABSOLVEU A RÉ RELATIVAMENTE À CESSAÇÃO DO CONTRATO DE ARRENDAMENTO POR RESOLUÇÃO, DECIDINDO-SE PELA DECLARAÇÃO DE RESOLUÇÃO DESTE CONTRATO,C…, Lda. veio interpor recurso subordinado e responder à alegação do recorrente B…, concluindo: A) RECURSO QUANTO À DECISÃO DE IMPROCEDÊNCIA DA EXECEÇÃO DE ERRO NA FORMA DE PROCESSO. 1.ª A Recorrida em sede de contestação invocou a exceção de erro na forma do processo, exceção a qual, através de despacho saneador proferido na audiência Prévia, foi julgada improcedente. 2.ª Não obstante o tribunal a quo ter julgado a improcedência da pretensão do Autor Recorrente no decretamento do despejo, deveria o mesmo, logo em sede de despacho saneador, julgar procedente a invocada exceção de erro na forma de processo e julgar-se incompetente para o julgamento da causa. 3.ª Nos termos do NRAU, Lei n.º 672006 alterada pela lei 31/2012, quer no caso em que esteja em discussão a resolução do contrato pelo senhorio quando fundada em caso de mora superior a 8 dias, quer na oposição à renovação do contrato de arrendamento por parte do senhorio, o meio processual próprio è o procedimento especial de despejo, nos termos do seu art.º 15.º e ss. do referido normativo, sendo o órgão competente o Balcão Nacional de Arrendamento. 4.ª Veio o legislador estipular este modo de cessação do contrato de arrendamento de forma imperativa, não deixando ao senhorio qualquer opção alternativa nesta matéria, designadamente o recurso à Acão judicial, tal como sucedeu in casu. 5.ª A imperatividade do regime estabelecido obsta a que o meio instituído possa ter como opção alternativa a ação de despejo, pois que, de contrário, sempre o senhorio poderia afastar aquele comando legislativo, quiçá com diminuição de direitos ou faculdades que ao inquilino assistem quanto ao fazer cessar da mora no pagamento. 6.ª A finalidade da ação de despejo plasmada no artigo 14º, nº 1, do NRAU), é conclusiva e elucidativa, quanto ao âmbito da sua aplicação: "a acção de despejo destina-se a fazer cessar a situação jurídica do arrendamento, sempre que a lei imponha o recurso à via judicial para promover tal cessação...". 29 de 302 10/12 9 7.ª A lei estabelece o recurso à via judicial tão só nas situações do artigo 1083º, nº 2, do CC, nos casos de incumprimento que, pela sua gravidade ou consequências, torne inexigível à outra parte a manutenção do arrendamento. 8:ª Não prevendo a lei, nem o facultando pela sua imperatividade, o recurso à ação no caso dos autos, integra tal recurso a prática de um ato jurídico ilícito, por contrário à lei, com a consequência da sua nulidade insanável, como decorre do artigo 280º, nº 1, do CPC. 9.ª E esta nulidade do exercício de ação, que afeta de nulidade todo o processo, incluindo a petição inicial, constitui uma exceção dilatória, de conhecimento oficioso e conducente à anulação de todo o processado, incluindo a mesma petição inicial, e à absolvição da instância dos Réus (artigos 576º, nº 2, 577º, alínea b), e 578º, do CPC). 10.ª O que o Tribunal a quo não fez, devendo agora em sede de recurso decidir-se como procedente tal exceção. B) RESPOSTA que apresenta a apelada C…, Lda. 11.ª Não merece, em absoluto, qualquer reparo a douta decisão agora impugnada que julgou improcedente o pedido deduzido pelo A.., ora Recorrente. 12.ª Tal como considerado pelo Tribunal a quo, a prova produzida nos autos não permitiu concluir pela existência de mora por parte da arrendatária Recorrida, pelo que não havendo mora sucumbiria a pretensão do A. Recorrente. 13.ª Contudo, mesmo que se possa considerar pela existência de mora, não é certo que a mesma se verificou com a extensão que o Recorrente pretende. 14:ª A partir do mês de agosto de 2016 jamais a mora no pagamento de rendas por banda da Recorrida se verificou. 15:ª Aquando da interposição da ação, já o direito de petição do despejo por mora havia caducado, pois a resolução do contrato de arrendamento com esse fundamento deve ser efetivada dentro do prazo de três meses a contar do conhecimento do correspondente facto, como se extrai da articulação dos n.ºs 1 e 2, do artigo 1085º do Código Civil. 16.ªTendo a ação dado entrada em 09 de março de 2017, já há muito havia decorrido o prazo de três meses, desde a data de vencimento da renda de agosto, vencida a 1 de julho, pelo que é inequívoca a caducidade do direito de resolução do contrato de arrendamento. TERMOS EM QUE, E SEMPRE COM O DOUTO SUPRIMENTO DE V.AS EX.AS, DEVE SER DADO PROVIMENTO AO PRESENTE RECURSO DE APELAÇÃO OU, ASSIM NÃO SE ENTENDENDO, CONFIRMAR-SE A DECISÃO RECORRIDA. FAZENDO-SE ASSIM INTEIRA JUSTIÇA!! Nos termos da lei processual civil são as conclusões do recurso que delimitam o objecto do mesmo e, consequentemente, os poderes de cognição deste tribunal. Assim, as questões a resolver consiste em saber se: Recurso principal - o autor recorrente tem direito a resolver o contrato pela falta de apagamento atempada das rendas;Recurso subordinado - a acção de despejo apenas se destina às situações em que a lei impõe o recurso à via judicial, o que apenas acontece relativamente à resolução efectuada pelo senhorio com fundamento no disposto no nº 2 do art. 1083º e não nos casos em que a lei expressamente permite que a resolução do contrato opere por via extrajudicial. II – Fundamentação de facto. O tribunal recorrido deu como provados e não provados os seguintes:Factos provados. 1. O Autor é o actual proprietário de um prédio urbano sito na Av. …, n.º …/…, concelho de …, descrito na competente Conservatória de Registo Predial sob o número 487 e inscrito na matriz predial urbana sob o artigo 1527 da freguesia e concelho de ….2. Em 30 de Abril de 2004, a R. adquiriu por trespasse a E…, o direito ao arrendamento do estabelecimento comercial de comércio e indústria de produtos alimentares sito no rés-do-chão e sótão das traseiras e primeiro andar do prédio descrito supra. 3. Tendo nessa mesma data, sido celebrada uma alteração ao contrato de arrendamento entre a proprietária à época e a aqui Ré vertida em documento intitulado “Alteração a Contratos de Arrendamento” donde consta: “O Contrato de Arrendamento que, em função do trespasse referido na clausula anterior vincula ambos os outorgantes teve o seu início em 1 de Janeiro de 1973 no que toca ao Rés-do-chão e sótão das traseiras do prédio urbano objecto do contrato e foi posteriormente alterado em 1 de Junho de 1998 por “Contrato Promessa de Arrendamento” então celebrado, tendo-se então também ampliado o objecto do contrato ao primeiro andar do prédio mediante celebração de “Contrato Promessa de Arrendamento”, e, Tendo-se em vista fixar e uniformizar o clausulado dos Contratos de Arrendamento em vigor, introduzindo-se-lhes alterações quer quanto ao montante da renda em vigor, quer quanto à delimitação do objecto do contrato, quer quanto a outros aspectos do clausulado, acordam os primeira e segunda outorgantes em que o Contrato de Arrendamento que a ambos vincula como senhoria e inquilina, respectivamente, passe a ficar sujeito às seguintes condições: 1.º A primeira outorgante reconhece ter dado de arrendamento em 1 de Janeiro de 1973 o rés-do-chão e sótão das traseiras do seu prédio urbano sito à Av. …, …/… na freguesia e cidade de … inscrito na matriz urbana respectiva no artigo 582, arrendamento posteriormente ampliado no seu objecto e passando a ser no mesmo contido o primeiro andar do mesmo prédio. 2.º Assim, convencionam primeira e segunda outorgante, esta adquirente por trespasse do estabelecimento comercial sediado no locado, que o arrendamento em vigor é um único que abrange os referidos rés-do-chão e sótão das traseiras do prédio e o primeiro andar do mesmo, destinando-se o locado ao funcionamento de restaurante, armazém de retém ou parqueamento de automóveis como apoio àquelas actividades. 3.º O prazo de duração do Contrato é de um ano, renovável, e teve o seu início em 1 de Janeiro de 1973. 4.º A renda que a segunda outorgante passará a pagar à primeira é de 1.247,00€ (MIL DUZENTOS E QUARENTA E SETE EUROS) mensais a partir de 1 de Maio de 2004, com vencimento, como já ocorre, no 1.º dia útil do mês anterior àquele a que respeite, no domicílio da senhoria ou de seu representante na cidade de Matosinhos, indicado por escrito. 5.º A segunda outorgante fica autorizada e cabe-lhe executar todas as obras de adaptação aos fins destinados, incluindo as necessárias para, que, através de vistoria camarária, seja atestada, pela respectiva licença de utilização, a sua aptidão para os fins pretendidos com perfeição e segurança, tudo à sua custa e sob a sua responsabilidade, incluindo licenciamento das obras. 6.º Ficam a cargo da segunda outorgante as obras de conservação e limpeza. 7.º Todas as obras e benfeitorias, autorizadas ou não pela primeira outorgante, uma vez realizadas no locado, ficam a pertencer ao prédio e a segunda outorgante não poderá por elas pedir indemnização ou alegar retenção uma vez findo o contrato. …” 4. A renda mensal contratualmente estabelecida nessa data foi de €1.247,00 (mil duzentos e quarenta e sete euros), que fruto das sucessivas actualizações é hoje de €1.517,00. 5. Por carta registada com aviso de recepção enviada através do seu mandatário a 03/03/2016 para a sede da Ré, o Autor opôs-se à renovação do contrato de arrendamento, requerendo a entrega do imóvel no dia 31/12/2016. 6. Comunicação esta que a Ré recebeu, conforme A/R assinado. 7. A 27/12/2016 foi enviada nova comunicação para a sede da Ré e dirigida a esta, através de carta registada com A/R, para relembrar a entrega do arrendado em 31/12/2016, pela oposição à renovação operada pelo senhorio. 8. Comunicação esta que a Ré também recebeu, conforme A/R assinado. 9. A Ré não entregou ao Autor o arrendado. 10. A renda vencida em 1 de Fevereiro de 2016, referente ao mês de Março de 2016, foi paga ao A. por cheque depositado no dia 10 de Fevereiro de 2016 cujos fundos ficaram disponíveis para aquele no dia 12 do mesmo mês; 11. A renda vencida em 1 de Março de 2016, referente ao mês de Abril de 2016, foi paga ao A. por dois cheques de 750,00€ cada um, depositados o primeiro a 9/03/2016 e o segundo a 11/04/2016; 12. A renda vencida em 1 de Abril de 2016, referente ao mês de Maio de 2016, só foi paga ao A. no dia 21 de Abril de 2016; 13. A renda vencida em 1 de Maio de 2016, referente ao mês de Junho de 2016, foi paga ao A. por cheque depositado no dia 16 de Maio de 2016 cujos fundos ficaram disponíveis para aquele no dia 17 do mesmo mês; 14. A renda vencida em 1 de Junho de 2016, referente ao mês de Julho de 2016, foi paga ao A. por cheque depositado no dia 8 de Junho de 2016 cujos fundos ficaram disponíveis para aquele no dia 9 do mesmo mês; 15. A renda vencida em 1 de Julho de 2016, referente ao mês de Agosto de 2016, foi paga ao A. por cheque depositado no dia 11 de Julho de 2016, cujos fundos ficaram disponíveis para aquele no dia 12 do mesmo mês; 16. A renda vencida em 1 de Agosto de 2016, referente ao mês de Setembro de 2016, foi paga ao A. por cheque depositado no dia 8 de Agosto de 2016 cujos fundos ficaram disponíveis para aquele no dia 9 do mesmo mês; 17. A renda vencida em 1 de Setembro de 2016, referente ao mês de Outubro de 2016, foi paga ao A. por cheque depositado no dia 8 de Setembro de 2016 cujos fundos ficaram disponíveis para aquele no dia 12 do mesmo mês; 18. A renda vencida em 1 de Outubro de 2016, referente ao mês de Novembro de 2016, foi paga ao A. por cheque depositado no dia 11 de Outubro de 2016 cujos fundos ficaram disponíveis para aquele no dia 12 do mesmo mês; 19. A renda vencida em 1 de Novembro de 2016, referente ao mês de Dezembro de 2016, foi paga ao A. por cheque depositado no dia 8 de Novembro de 2016 cujos fundos ficaram disponíveis para aquele no dia 12 do mesmo mês. 20. Por tal motivo, o A. enviou à R. uma carta registada no dia 15/03/2016 com o seguinte teor: “Uma vez que V. Exas. só depositaram o valor de €750,00, não depositando assim a totalidade do valor da renda vencida no passado dia 8/03/2016, somos a solicitar a sua urgente regularização, no sentido de se evitar a aplicação da mora legal por tal atraso.” 21. Bem como enviou à R. uma carta registada com A/R no dia 11/04/2016, com o seguinte teor: “Uma vez que V. Exas. só depositaram o valor de €750,00 não depositando assim a totalidade do valor da renda vencida no passado dia 1/03/2016, bem como não depositaram a renda vencida no dia 1/04/2016. Desta forma sou a transmitir-lhe que, por já ter o meu constituinte feito o mesmo aviso no mês passado, sem surtir qualquer efeito, V. Exas. são, nesta data, devedores ao mesmo no montante de €2.663,25, referente às rendas em atraso acrescidas de 50% de indemnização pela mora e já descontando a retenção na fonte de 1.137,75€, feita por V. Exas.. Assim, somos a aguardar 8 dias para o pagamento efectivo das rendas e multa em atraso, sob pena de, considerarmos definitivamente resolvido o contrato de arrendamento, sem mais interpelações, intentar a competente acção de despejo e pedido de condenação de todas as rendas que se vencerem até efectivo e integral pagamento”. 22. Bem como enviou à R. uma carta registada com A/R no dia 13/05/2016, com o seguinte teor: “Uma vez que V. Exas. só depositaram o valor de €750,00 não depositando assim a totalidade do valor da renda vencida no passado dia 1/03/2016, bem como não depositaram a renda vencida no dia 1/04/2016, bem como não depositaram a renda vencida no dia 1/05/2016, sou a transmitir-lhe que, por já ter o meu constituinte feito o mesmo aviso nos 3 meses passados, sem surtir qualquer efeito, V. Exas. são, nesta data, devedores ao mesmo no montante de 4.092,00€, referente às rendas em atraso acrescidas de 50% de indemnização pela mora e já descontando a retenção na fonte de 1.517,00€, feita por V. Exas., conforme mapa explicativo que segue em anexo. Assim, somos a aguardar 8 dias para o pagamento efectivo das rendas e multa em atraso, sob pena de, considerarmos definitivamente resolvido o contrato de arrendamento, sem mais interpelações, intentar a competente acção de despejo e pedido de condenação de todas as rendas que se vencerem até efectivo e integral pagamento”. Factos não provados Todos os que se mostrem em contradição com os que acima se deram como provados, designadamente e ainda que: A renda vencida a 1/06/2016 referente a Julho de 2016 tenha sido paga a 13/06/2016. III- Do mérito dos recursos. Discute-se aqui a resolução do contrato por falta de pagamento de rendas.Recurso principal O esquema do numerus clausus das causas de resolução, por iniciativa do senhorio adoptado no RAU (Regime do Arrendamento Urbano) – e antes dele no Código Civil de 1966 – foi substituído, no NRAU (Novo Regime do Arrendamento Urbano), por uma cláusula geral: o factor nuclear de resolução do contrato de arrendamento é o incumprimento de qualquer obrigação que, pela sua gravidade ou consequências torne inexigível à outra parte a manutenção do arrendamento, portanto, que exclua qualquer possibilidade de a parte lesada adoptar outra conduta que não a extinção do contrato (artigo 1083 nº 2 do Código Civil). O NRAU seguiu a técnica de referenciar, em geral, o fundamento de resolução e de complementar, de seguida, essa definição através duma enumeração. Assim, após um número em que se insere a noção, seguem-se, em cinco alíneas, uma lista de comportamentos tipificados como fundamento de resolução. A sua leitura mostra que a lei seleccionou, por assim dizer, as violações contratuais mais graves e reconheceu-as como fundamento da resolução. É pacífico, em face do uso do advérbio designadamente, que tal enumeração é meramente exemplificativa e que, por isso, outras violações, ainda que menos graves permitirão, ao senhorio resolver o contrato. Além da ilicitude e da culpa, a violação de qualquer dever exige certas consequências gravosas na relação jurídica de arrendamento. Nas palavras da lei, a atitude do arrendatário, além de ilícita deve tornar inexigível ao senhorio normal a subsistência do contrato de arrendamento. Uma concreta causa de resolução deve, por isso, ser sempre submetida à ideia básica do corpo do artigo: a violação de um dever – legal ou contratual – qualquer que ele seja, só constitui causa de resolução do contrato de arrendamento se essa violação, pela sua gravidade ou reiteração, tornar inexigível a manutenção daquele contrato. Nesta perspectiva, nem toda a violação do contrato fundamenta o decretamento da resolução: para que o contrato possa ser resolvido é ainda necessário que dessa violação resulte a comprometida a subsistência do contrato de arrendamento. Só não será assim no tocante à resolução do contrato com base na mora superior a três meses da obrigação de pagamento da renda, encargos ou despesas ou na oposição do arrendatário à realização de obra ordenada por entidade pública: quanto a estes fundamentos de resolução do contrato o juízo de inexigibilidade é feito pela própria lei, ou dito de outro modo, verifica-se uma situação ex lege de inexigibilidade para o senhorio na manutenção do contrato de arrendamento (artigo 1083º nº 3 do Código Civil). A mora de três meses – de uma só renda que seja – é auto-suficiente, enquanto fundamento de resolução do contrato: é a própria lei que proclama, nessa eventualidade, a inexigibilidade da manutenção do arrendamento, não havendo, por isso, lugar a uma autónoma ponderação sobre a sua gravidade e consequências. Quer dizer, a lei exige apenas, para que este fundamento de resolução do contrato de arrendamento se constitua, uma mora de três meses, não impondo nenhum número especial de rendas em mora: basta uma. Cada uma das rendas vencidas tem autonomia para a contagem do prazo de caducidade, pelo que em relação a cada uma delas se aplica o disposto no artigo 1085.º, nº 1 do C. Civil. É ainda inexigível ao senhorio a manutenção do arrendamento no caso de o arrendatário se constituir em mora superior a oito dias, no pagamento da renda, por mais de quatro vezes, seguidas ou interpoladas, num período de 12 meses, com referência a cada contrato. – n º 4 do artigo 1083º. Importa dizer que a mora do arrendatário, no tocante ao pagamento da renda está, porém, sujeita a um regime marcadamente especial que se explica pela importância jurídica e social do contrato de arrendamento. De um aspecto, a mora, apesar da existência de um prazo certo para o cumprimento, só se verifica, tanto para o efeito da indemnização como para o efeito da resolução do contrato de arrendamento, se o arrendatário não cumprir a obrigação de pagamento da renda no prazo de oito dias a contar do seu começo – purgatio morae (artigo 1041 nº 2 do Código Civil); de outro, findo aquele prazo, o arrendatário pode ainda por termo à mora – e, por esse modo obstar à resolução do contrato de arrendamento - oferecendo ao senhorio o pagamento das rendas em atraso, acrescidas de indemnização igual a 50% do valor devido daquelas rendas, assistindo-lhe o direito, em caso de recusa do seu recebimento, pelo senhorio, desses valores, proceder à sua consignação em depósito (artigo 1042 nº 1 do Código Civil). No caso de resolução do contrato de arrendamento por falta de pagamento da renda, quando o direito potestativo correspondente for exercido judicialmente, o arrendatário pode ainda provocar a caducidade daquele direito, pagando, depositando ou consignando em depósito as rendas devidas e aquela indemnização (artigo 1048º, nº 1 do Código Civil). Esta faculdade do arrendatário é, porém, de exercício único: apenas pode ser actuada uma vez, por referência a cada contrato (artigo 1048º nº 2 do Código Civil). A resolução do contrato de arrendamento com qualquer um desses fundamentos deve porém ser efectivada dentro do prazo de três meses a contar do conhecimento do correspondente facto, como se extrai da articulação dos n.ºs 1 e 2, do artigo 1085º. No caso do n.º 4 do mesmo artigo 1083º, o termo a quo de contagem do prazo de caducidade é o momento em que se verificar o conhecimento da situação de mora superior a oito dias, no pagamento da renda, por mais de quatro vezes seguidas ou interpoladas, num período de 12 meses. É um período que se inicia com o primeiro incumprimento, independentemente do mês e do ano civil em causa. Iniciada essa contagem, o fundamento resolutivo verificar-se-á quando forem contabilizados 5 atrasos, desde que não tenham passado mais de 12 meses sobre o primeiro atraso no pagamento das rendas. A passagem do período de 12 meses sobre a verificação de um atraso no pagamento da renda elimina esse facto da contabilização para efeitos de resolução. O início da contagem passa para o incumprimento subsequente, e assim sucessivamente. No caso está contratualmente fixado que a renda a pagar se vence no 1.º dia útil do mês anterior àquele a que respeite. Como se diz na sentença, citando-se Fernando de Gravato Morais, in “Falta de Pagamento da Renda no Arrendamento Urbano”, Almedina, o prazo de oito dias para fazer cessar a mora inicia-se a partir do 1.º dia útil do mês, imediatamente anterior àquele a que diga respeito (o prazo contratado corresponde ao prazo supletivo do artigo 1075.º, n.º 2 do CC) e deve seguir o preceituado no artigo 296.º CC, ou seja, equivale a sete dias. Sendo útil o primeiro dia do mês, começa a contar o prazo efectivo de 7 dias, no 2.º dia, prolongando-se até ao oitavo dia. O inquilino pode efectuar o pagamento da renda até ao dia 8, caso este seja igualmente dia útil; se este dia (8) não for útil, o prazo estende-se até ao primeiro dia útil subsequente. Só há mora relevante a partir do dia 9, se o dia 8 for útil. Quando o pagamento é feito por cheque se o inquilino tiver remetido o cheque atempadamente e mantido a conta com provisão, não há qualquer atraso no pagamento, ainda que o senhorio intencionalmente não tenha recebido o valor durante o período de oito dias. Nesta linha de raciocínio e observando o calendário de 2016 verifica-se que: A renda vencida em Fevereiro, referente ao mês de Março deveria ser paga até ao dia 8 de Fevereiro. Esta renda foi paga ao A. por cheque depositado no dia 10 de Fevereiro de 2016 cujos fundos ficaram disponíveis para aquele no dia 12 do mesmo mês. A renda vencida em Março, referente a Abril, deveria ser paga até ao dia 8 de Março. Esta renda foi paga ao A. por dois cheques de 750,00€ cada um, depositados o primeiro a 9/03/2016 e o segundo a 11/04/2016. A renda vencida em Abril, referente ao mês de Maio, deveria ser paga até ao dia 8 de Abril. Esta renda foi paga ao A. no dia 21 de Abril de 2016. A renda vencida em Maio, referente ao mês de Junho, deveria ser paga até ao dia 9 de Maio. Esta renda foi paga foi paga ao A. por cheque depositado no dia 16 de Maio de 2016 cujos fundos ficaram disponíveis para aquele no dia 17 do mesmo mês. A renda vencida em Junho, referente ao mês de Julho, deveria ser paga até ao dia 8 de Junho. Esta renda foi paga ao A. por cheque depositado no dia 8 de Junho de 2016 cujos fundos ficaram disponíveis para aquele no dia 9 do mesmo mês. A renda vencida em Julho, referente a Agosto, deveria ser paga até ao dia 8 de Julho. Esta renda foi paga ao A. por cheque depositado no dia 11 de Julho de 2016, cujos fundos ficaram disponíveis para aquele no dia 12 do mesmo mês A renda vencida em Agosto, referente a Setembro, deveria ser paga até ao dia 8 de Agosto. Esta renda foi paga ao A. por cheque depositado no dia 8 de Agosto de 2016 cujos fundos ficaram disponíveis para aquele no dia 9 do mesmo mês. A renda vencida em Setembro, referente a Outubro, deveria ser paga até ao dia 8 de Setembro. Esta renda foi paga ao A. por cheque depositado no dia 8 de Setembro de 2016 cujos fundos ficaram disponíveis para aquele no dia 12 do mesmo mês. A renda vencida em Outubro, referente a Novembro, deveria ser paga até ao dia 10 de Outubro. Esta renda foi paga ao A. por cheque depositado no dia 11 de Outubro de 2016 cujos fundos ficaram disponíveis para aquele no dia 12 do mesmo mês; A renda vencida em Novembro, referente a Dezembro, deveria ser paga até ao dia 9 de Novembro. Esta renda foi paga ao A. por cheque depositado no dia 8 de Novembro de 2016 cujos fundos ficaram disponíveis para aquele no dia 12 do mesmo mês. Afirma-se na sentença que “…Da factualidade apurada, colhe-se que todas as rendas em discussão nos presentes autos, excepção feita à relativa ao mês de Maio de 2016, foram pagas através de cheques cuja data de entrega ao senhorio se desconhece. Independentemente da natureza dos primeiro e último dias do prazo de pagamento das rendas em singelo, pese embora as datas dos respectivos depósitos sejam coincidentes ou posteriores ao oitavo dia, a verdade é que se desconhece a data em que esses cheques foram entregues ao A./senhorio e a razão para a sua apresentação naquelas datas. Nessa medida, os elementos conhecidos não permitem imputar a ulterior disponibilidade das verbas à R. arrendatária, e, como tal, não é possível, em relação às rendas correspondentes, atribuir-lhe mora relevante para efeitos indemnizatórios e de eficácia resolutiva….” Daqui se extrai que a questão central a dirimir é a de saber a quem cabe, no caso que nos ocupa, o ónus da prova da entrega atempada dos cheques. Como em geral nos contratos, é consabido que o arrendatário se constitui em mora no tocante à obrigação de pagamento da renda sempre que, por motivo que lhe seja imputável, não fizer esse pagamento (artigo 804º, nº 2 do Código Civil). Como explica Pereira Coelho, in Direito Civil, Arrendamento, Coimbra, 1980, pág. 150, a lei dá ao senhorio em alternativa o direito de pedir a indemnização e o de resolver o contrato: se optar pela resolução, o senhorio só pode exigir as rendas em dívida; nesse caso não tem direito a qualquer indemnização pela mora do arrendatário (artigos 1041 nº 1 e 801 nº 2 do Código Civil). Pois bem, se o senhorio escolher a via da manutenção do contrato de arrendamento e pedir o pagamento das rendas com a indemnização, a regra é a de que o credor tem de provar a celebração do contrato e, consequentemente, as obrigações dele decorrentes, nos termos do artigo 342º, nº 1, do Código Civil. Por seu turno, o cumprimento da respectiva obrigação, designadamente o pagamento do montante da renda convencionada, como facto extintivo do direito de crédito invocado, incumbe ao devedor (cf. art. 342º, nº 2, do CC), sendo certo que o pagamento não se presume a não ser em casos expressamente previstos na lei (cf. art. 786º do C.C.) Se o senhorio se decidir pela extinção do arrendamento, usando o direito potestativo de resolver o contrato, então caber-lhe-á a prova dos respectivos pressupostos, ou seja, dos factos constitutivos do surgimento desse direito (artigo 342º, nº 1, do Código Civil), sendo que a dúvida será resolvida, de acordo com o denominado ónus da prova objectivo, dirigido à actividade do juiz, consagrado no artigo 414º do Código de Processo Civil. No caso, foi convencionado que a renda seria paga no domicílio da senhoria ou de seu representante na cidade de Matosinhos, indicado por escrito. O autor/recorrente tem de provar todos os factos constitutivos do direito à resolução que pretende fazer valer, isto é, a falta de pagamento das rendas nas condições em que tal situação lhe confere esse direito potestativo, o que passa por provar a falta de entrega atempada no local convencionado do meio de pagamento das rendas. Não tendo feito, como se viu, a dúvida terá de ser resolvida em seu desfavor, o que faz soçobrar a sua pretensão. Recurso subordinado Defende a ré recorrente que a lei estabelece o recurso à via judicial tão só nas situações do artigo 1083º, nº 2, do CC, nos casos de incumprimento que, pela sua gravidade ou consequências, torne inexigível à outra parte a manutenção do arrendamento. Não prevendo a lei, nem o facultando pela sua imperatividade, o recurso à acção no caso dos autos, integra tal recurso a prática de um ato jurídico ilícito, por contrário à lei, com a consequência da sua nulidade insanável, como decorre do artigo 280º, nº 1, do CPC. E esta nulidade do exercício de acção, que afecta de nulidade todo o processo, incluindo a petição inicial, constitui uma excepção dilatória, de conhecimento oficioso e conducente à anulação de todo o processado, incluindo a mesma petição inicial, e à absolvição da instância dos Réus (artigos 576º, nº 2, 577º, alínea b), e 578º, do CPC). Ponderemos. Esta visão é a de que o senhorio não pode pedir ao Tribunal a resolução do contrato com fundamento em falta de pagamento de rendas, quando a lei determina que a resolução do contrato com esse fundamento opera por comunicação à contraparte sem necessidade de intervenção judicial. A verdade é que tem sido entendido que o senhorio tem o direito de recorrer aos tribunais e intentar uma acção judicial com vista a obter a declaração de resolução do contrato de arrendamento com fundamento em falta de pagamento da renda. O entendimento de que do disposto no artigo 1084º do CC e no artigo 14º, nº 1, da Lei 6/2006 resulta que a acção de despejo apenas se destina às situações em que a lei impõe o recurso à via judicial, o que apenas acontece relativamente à resolução efectuada pelo senhorio com fundamento no disposto no nº 2 do art. 1083º e não nos casos em que a lei expressamente permite que a resolução do contrato opere por via extrajudicial é incompatível com o direito constitucional de acesso aos tribunais, consagrado no artigo 20º da Constituição. Portanto, não deve negar-se ao senhorio o direito, em abstracto, de recorrer aos tribunais para ver reconhecido judicialmente o seu direito à resolução do contrato de arrendamento, dispondo o mesmo de interesse em agir na propositura de uma acção judicial com essa finalidade. – v.g. Ac. do STJ de 06-05-2010, proc. 438/08.5YXLSB.LS.S1. Pelo exposto, delibera-se julgar totalmente improcedentes as apelações, confirmando-se as decisões recorridas. Custas pelos apelantes nos respectivos recursos. Porto, 26 de Março de 2019 Ana Lucinda Cabral Maria do Carmo Domingues Maria Cecília Agante |