Acórdão do Tribunal da Relação do Porto | |||
Processo: |
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Nº Convencional: | JTRP000 | ||
Relator: | WILLIAM THEMUDO GILMAN | ||
Descritores: | BUSCA DOMICILIÁRIA APREENSÃO MENOR CONSENTIMENTO DEFENSOR OBRIGATORIEDADE NULIDADE INSANÁVEL PROIBIÇÃO DE PROVA | ||
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Nº do Documento: | RP20240612809/21.1PAMAI.P1 | ||
Data do Acordão: | 06/12/2024 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Texto Integral: | S | ||
Privacidade: | 1 | ||
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Meio Processual: | RECURSO PENAL (CONFERÊNCIA) | ||
Decisão: | PROVIDO PARCIALMENTE O RECURSO INTERPOSTO PELO ARGUIDO. | ||
Indicações Eventuais: | 4. ª SECÇÃO CRIMINAL | ||
Área Temática: | . | ||
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Sumário: | I - A busca domiciliária consentida pelo visado, menor de 21 anos de idade, já suspeito do cometimento de um crime de furto e depois de em conversa informal com os polícias ter confessado os factos, mas ainda não ter sido constituído arguido, não é válida por falta da presença de um defensor para assistir ao consentimento e realização da busca, imposta pelo regime de obrigatoriedade de assistência de defensor a pessoas vulneráveis, nelas se incluindo os menores de 21 anos de idade, previsto no artigo 64º, n.º 1, al. d) do CPP. II - Não obstante não ser ainda arguido, o facto de ser suspeito de um crime, ainda por cima depois de em conversa informal ‘confessar’ o crime, impunha que a pessoa vulnerável fosse de imediato assistida, sob pena de destruição da proteção conferida pelo regime especial instituído pelo artigo 64º, n.º 1, al. d) do CPP, sendo irrelevante o facto de já ter sido (como deveria ter sucedido) ou não constituído arguido. III - Se assim não fosse, para contornar o regime de proteção especial de pessoas vulneráveis do artigo 64º, n.º 1- d) do CPP bastaria deixar sempre para o fim a constituição como arguido, depois de consumadas as ‘conversas informais confitentes’ com o suspeito e as ‘buscas consentidas’, tendo ficado dispensada a assistência de defensor ao visado e obtida prova essencial para a condenação do vulnerável e indefeso suspeito. IV - Não sendo válida a busca e apreensão, afetadas por nulidade insanável nos termos do artigo 119º, al c) do CPP, é nula a prova que com ela se pretendeu obter, verificando-se uma proibição de prova e proibição de valoração de prova. | ||
Reclamações: | |||
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Decisão Texto Integral: | Processo n.º 809/21.1PAMAI.P1 Sumário (da responsabilidade do relator): ………………………………………….. ………………………………………….. …………………………………………..
Relator: William Themudo Gilman 1º Adjunto: Elsa Paixão 2ª Adjunta: Liliana Páris Dias * Acordam em conferência no Tribunal da Relação do Porto: * 1-RELATÓRIO No Processo Comum (Tribunal Singular) nº 809/21.1PAMAI do Tribunal Judicial da Comarca do Porto, Juízo Local Criminal da Maia - Juiz 1, após julgamento foi proferida sentença com o seguinte dispositivo: «Pelo exposto, e nos termos dos citados normativos legais, decido: a) Condenar o arguido AA, pela prática, em coautoria material e com dolo direto, de um crime de furto qualificado, previsto e punido pelas disposições conjugadas dos arts. 203.º, n.º1 e 204.º, n.º2, alínea e), do Código Penal, na pena de 2 (dois) anos e 3 (três) meses de prisão; b) Suspender a execução da pena de prisão aplicada ao arguido AA pelo período de 2 (dois) anos e 3 (três) meses, acompanhada de regime de prova; c) Condenar o arguido BB, pela prática, em coautoria material e com dolo direto, de um crime de furto qualificado, previsto e punido pelas disposições conjugadas dos arts. 203.º, n.º1 e 204.º, n.º2, alínea e), do Código Penal, , na pena de 2 (dois) anos e 3 (três) meses de prisão; d) Suspender a execução da pena de prisão aplicada ao arguido BB pelo período de 2 (dois) anos e 3 (três) meses, acompanhada de regime de prova; e) Condenar cada um dos arguidos AA e BB no pagamento das custas do processo, fixando-se a taxa de justiça devida por cada um dos arguidos em 3 (três) UC. * » * Não se conformando com esta sentença, o arguido BB recorreu para este Tribunal da Relação, concluindo na sua motivação o seguinte (transcrição): «I. Vem o presente recurso interposto da sentença de condenação proferida em 15 de setembro de 2023, a qual condenou o aqui Recorrente pela prática de um crime de furto qualificado, p. e p. pelo artigo 203º, nº1 e 204º nº2, alínea e), do Código Penal, na pena de 2 (dois) anos e 3 (três) meses de prisão, suspensa na sua execução pelo mesmo período acompanhada de regime de prova. II. Contrariamente ao vertido em Primeira Instância não está o arguido comprometido com a prática do crime de furto qualificado como ao diante se demonstrará, pelo que deverá a sentença ser revogada e substituída por outra decisão judicial que in totum absolva o arguido do crime pelo qual foi condenado III. Os factos dados como provados em sede de audiência de discussão e julgamento e o teor da sentença, não se coadunam, em sede ou circunstância alguma, com a veracidade dos acontecimentos, aliás, tal convicção do tribunal recorrido, assentou apenas e só em presunções e suposições. IV. Considerar o depoimento da testemunha CC, designadamente o ofendido e proprietário do café assaltado, claro, coerente e lógico, é o mesmo que renunciar a qualquer lógica comum. V. O Ofendido, apresentou um conjunto de teorias que se revelaram em si desprovidas de qualquer sentido, manifestando assim alguma desorientação acerca da factologia em discussão. VI. O ofendido no seu depoimento, prestado em 04/07/2023 atesta que “havia camaras, mas desligaram as camaras”, ora o que o mesmo quis dizer é que o estabelecimento era apetrechado de sistema de videovigilância, mas que esse mesmo sistema teria sido desligado pelos autores do crime. VII. Resultando claro, as primeiras insuficiências do inquérito e, sobretudo pelo pilar que norteou todo o julgamento o quadro de presunções e suposições. VIII. Com interesse para a causa, era importante que a investigação, carreasse para os autos esta informação, desde logo a peritagem que deveria ter sido levada a cabo ao sistema de vigilância, por forma a saber em que condições teria sido desligado o sistema de vigilância, a que horas, durante quanto tempo e, no limite por quem. IX. E assim, dúvidas não soçobram, que o Tribunal não esgotou os seus poderes de indagação, esta peritagem reveste-se de total importância para a descoberta da verdade material, no limite saber quem desligou o sistema de vigilância e a que horas poderia permitir a identificação do autor do crime e assim estabelecer um quadro de factos e não de suposições e presunções. X. Nem sequer acerca do valor furtado podemos em segurança identificá-lo, o mesmo é dizer que nem podemos refutar a ideia de que poderemos estar perante um valor diminuto (inferior a 1 UC) o que não deixa de ter relevância para todo o processo, em boa verdade o ofendido lançou um valor entre os €200 e os €300 como poderia ter lançado um valor entre os €50 e os €75, ora fê-lo com total arbitrariedade o que colide com os princípios legais. XI. Mas se o seu depoimento mais comodo e útil à acusação não poderia ser, acompanhando assim o quadro de suposição e presunções, o mesmo faz ainda um conjunto de afirmações que arremata com o Ministério Público e a sua investigação. XII. No seu depoimento, assume que por um dos arguidos. Publicamente e de viva voz foi anunciado que iria assaltar o café, garantindo que esta informação era do conhecimento da policia. XIII. Assim importa lembrar que nenhuma destas testemunhas foi ouvida ou sequer convocada a prestar declarações, assim como nenhuma compareceu no julgamento, de novo ante as mesmas condições a investigação furtou-se a conduzir uma investigação séria e credível, prosseguindo no seu quadro de facilitação que encerra numa acusação simplória. XIV. Pela testemunha DD foi dito em sede de audiência de discussão e julgamento nas declarações prestadas em 12/06/2023 que no exercício das suas funções foi-lhe dada a indicação (por denúncia anónima) de que tinha sido o arguido BB o autor do crime. XV. E foi assim, a partir daqui, e com base nesta denúncia anónima que a investigação ao invés de procurar de forma activa investigar toda a informação que lhe foi chegando, optou pelo conformismo. XVI. Levando a cabo um auto de revista e busca – que em abono da verdade concluiu na apreensão de maços de tabaco da residência do Arguido Recorrente (que se admite por mera hipótese ser oriundo do café assaltado ...). XVII. obre esta matéria o arguido recorrente ofereceu uma justificação plausível, que se sublinhe, o facto de ter no seu quarto esses maços de tabaco teria que ver com a circunstância do indivíduo que identificou (apelidando-o de “EE”), seu colega de trabalho/biscates que dormia em sua casa lhe teria oferecido para consumo. XVIII. Do Auto de Busca e Apreensão, esta diligencia deveria ter permitido ao arguido a constituição de advogado ou a nomeação de defensor oficioso. XIX. Isto porque à data dos factos o arguido só tinha 20 anos, pelo que, qualquer acto processual teria de ser obrigatoriamente praticado na presença de defensor oficioso, é o que resulta do disposto no artigo 64º nº1 al. d) do CPC. XX. Assim, não soçobram dúvidas quanto à nulidade absoluta, quer quanto à busca quer quanto à alegada confissão informal que o Arguido Recorrente teria feito à testemunha – Agente da PSP FF. Início ao minuto 13:04 e fim ao minuto 13:40. Em conversas informais nas buscas foi transmitido pelos suspeitos (...) O Senhor BB disse que não entrou e que o seu papel foi no exterior. XXI. Não soçobram dúvidas quanto ao trabalho de investigação, que em suma se limitou a assumir um telefonema anónimo que identificou o arguido recorrente como o autor do crime, a valoração de uma alegada confissão informal e um auto de apreensão ao arrepio de qualquer princípio da legalidade que só pode sucumbir à sua valoração. XXII. E com espanto o tribunal faz um juízo que atropela todos os princípios constitucionais e dá chancela a este tipo de investigação e acusação. XXIII. O Arguido Recorrente, oferece, uma teoria verosímil, ao assinalar que na sua casa vivia um senhor de nome EE, este conhecido pelo crime, o qual na sua versão bem podia ser o autor do crime. XXIV. Assumiu ter na sua posse um conjunto de maços de tabaco (que admite que a sua proveniência possa ser a do café assaltado ...), e que a sua única intervenção nesta estória toda seria a de ser o detentor do tabaco, que lhe teria sido oferecido para este o consumir. XXV. E em segurança nem sequer se pode admitir que este tabaco possa ser o do café assaltado, de relembrar que o ofendido teria já contabilizado 12 assaltos aos seus estabelecimentos/cafés e que no dia anterior também teria decorrido um assalto, elo que o tabaco poderia bem ser de qualquer um deles. XXVI. o arguido recorrente, relatou às autoridades que os autores do assalto teriam sido o GG e o EE (este último aquele que viveria em sua casa), a verdade é que da investigação nada consta sobre estas duas pessoas, nem sequer se evidencia qualquer propósito em saber o que estas teriam a dizer sobre este assunto. XXVII. O que colide com a atitude do arguido recorrente que unanimemente foi considerada como uma atitude colaborante, assumindo à testemunha FF, de forma imediata que teria na sua posse tabaco (depoimento gravado 12-06-2023 início ao minuto 03:21 e fim ao minuto 03:40.) XXVIII. Esbarrando a sua atitude proativa com a inércia da investigação que não procurou os outros intervenientes e que, na convicação do arguido recorrente foram os autores do crime. XXIX. O princípio in dúbio pro reo “pretende garantir a não aplicação de qualquer pena sem prova suficiente dos elementos do facto típico e ilícito que a suporta, assim como o dolo ou a negligência do seu autor” Cristina Líbano Monteiro in “Perigosidade de inimputáveis e In Dubio Pro Reo” Universidade de Coimbra, Coimbra Editora, 1997, p.11. XXX. In casu, os factos que foram dados como provados que culminou com a condenação do recorrente não resultam da prova produzida, a qual, na melhor das hipóteses, apenas criou dúvidas quanto à sua veracidade. XXXI. Relembramos que a convicção do tribunal, quanto aqueles factos, se limitaram a assumir um telefonema anónimo que identificou o arguido recorrente como o autor do crime, a valoração de uma alegada confissão informal e um auto de apreensão ao arrepio de qualquer princípio da legalidade que só pode sucumbir à sua valoração. XXXII. Entendemos por isso que é evidente a insuficiência probatória para a decisão da matéria de facto provada, uma vez que não foram ouvidas as testemunhas que afirmam ter ouvido uma promessa de assalto por parte do coarguido, não foram realizadas perícias ao sistema de videovigilância, a auto de busca e apreensão enferma do vicio da nulidade, a alegada confissão por parte do arguido recorrente vai no mesmo sentido da nulidade do mesmo. XXXIII. E por essa razão, cumpre salientar que estamos perante a violação do princípio do in dúbio pro reo segundo o qual o juiz deve decidir sobre toda a matéria que não se veja afectada pela dúvida de forma que, quanto aos factos duvidosos, o princípio da livre convicção não fornece, não pode fornecer qualquer critério decisório, Cristina Líbano. XXXIV. Em suma é notório que, nos presentes autos, foi pelo menos criada uma dúvida que é clara e razoável quanto aos factos que suportam a condenação do recorrente, pelo que a sua absolvição aparece como a única atitude legitima a adoptar. XXXV. erve ainda o exposto para dizer, que o douto tribunal a quo violou o disposto no nº2 do art. 32º da CRP. XXXVI. Ou seja, a interpretação deveria ter sido no sentido da absolvição do arguido. Por todos os termos expostos, e em todos os mais que Vossas Excelências, Sábios e Ilustres Juízes Desembargadores, provirão pelo seu conhecimento, adentro da mais Elevada Sapiência e Rigor Jurídico, deve o presente Recurso ser admitido, e em consonância alterar-se a decisão recorrida, ser o recorrente absolvido do crime de furto qualificado em que foi condenado pois só assim se realizará o Direito, fazendo-se a costumada JUSTIÇA.» * O Ministério Público, nas suas alegações de resposta, pronunciou-se no sentido de ser confirmada a decisão recorrida, tendo apresentado as seguintes conclusões (transcrição parcial na parte relevante para o recurso): «1- BB foi condenado (…) 2- O arguido não se conformando com a sentença proferida nos presentes autos, vem interpor recurso pedindo a sua absolvição. 3- Em nossa opinião, não assiste qualquer razão ao recorrente, entendendo tal recurso apenas por ser um direito de qualquer condenado. 4- Pouco há a acrescentar para além do que consta da motivação da decisão sobre a matéria de facto e de direito da sentença proferida, uma vez que a Sra. Juíza fundamentou a sua convicção de uma forma clara, concreta e precisa, baseada em toda a prova documental junta aos autos, e ainda nos depoimentos das testemunhas inquiridas em sede de julgamento, a saber, DD, agente da PSP, HH, agente da PSP, FF, agente da PSP, CC, ofendido, e ainda nas declarações do arguido, que tentou justificar a posse de alguns dos bens subtraídos que foram encontrados na sua posse apresentando tentando afastar a sua responsabilidade criminal, o que veio alicerçar a plausibilidade e veracidade dos depoimentos das testemunhas inquiridas em sede de julgamento, sendo que quanto à sua situação económica e familiar foram tidas em conta as suas próprias declarações e o teor do relatório social junto ao autos, tudo analisado à luz das regras da experiência, já que há que ter em conta quer o principio da livre apreciação da prova de que o julgador dispõe, quer o principio da imediação que só a audiência de julgamento proporciona. 5- A participação do arguido na prática do crime está bem concretizada e fundamentada na referida sentença, quer a nível da fundamentação de facto, quer a nível da fundamentação de direito, atentos os factos dados como provados, estando também devidamente fundamentado o elenco das várias circunstâncias que relevaram, in casu, para efeitos da escolha e da medida concreta da pena (veja-se a este propósito a motivação da matéria de facto, a motivação da matéria de direito, e a motivação da escolha e determinação da medida da pena, que inclui a apreciação do regime especial para jovens adultos e a ponderação sobre a não aplicação do perdão de penas decorrente do disposto na Lei n.º 38- A/2023, de 02.08, cujo teor se dá aqui por reproduzido por uma questão de economia processual). 6- Entendemos que não assiste razão ao recorrente em nenhum dos argumentos aduzidos. 7- Os excertos que o recorrente transcreveu para o seu recurso não têm a virtualidade de inquinar a apreciação que a Sra. Juíza fez da prova que foi produzida em audiência de julgamento, nem inquinar a veracidade dos depoimentos quer do ofendido, quer das testemunhas, e de contrariar a fundamentação de facto constante da sentença. 8- Os excertos cirúrgicos vertidos pelo arguido no seu recurso não são suficientes para que o arguido consiga ilibar-se da prática dos factos. 9- Sempre se diga que só com a audição na íntegra dos depoimentos das testemunhas e do ofendido se pode aferir da credibilidade dos mesmos. 10- Entende-se que o arguido com o seu recurso não conseguiu infirmar a prova produzida em julgamento, nem a demais prova documental que também serviu de suporte à condenação do arguido, pois não alegou factos concretos que lograssem colocar em dúvida a matéria de facto que foi dada como provada. 11- Aliás, como pode o arguido pôr em causa toda a prova produzida em audiência de julgamento, mormente o facto de não ter sido efetuada uma “peritagem ao sistema de alarme”, se nada indagou ou requereu em sede de audiência de julgamento, pois tendo tido a possibilidade de o fazer no exercício do contraditório para esclarecimento das suas dúvidas, e não o fez. 12- Não vislumbramos qualquer nulidade da investigação que cumpra conhecer, sendo certo que o arguido teve muitos instrumentos ao seu dispor até ao presente recurso que interpôs para reagir e pôr em causa a acusação deduzida, e não o fez. 13- O enquadramento jurídico que a Sra. Juíza fez perante a situação dos autos afigura-se-me correta, pelo que remetemos para a douta decisão proferida e nesse sentido decidiu bem a Sra. Juíza ao enquadrar a conduta do arguido recorrente na prática de um crime de furto qualificado em que foi condenado. 14- Não vislumbramos a existência de erro na apreciação da prova e insuficiência da prova produzida, estando verificados todos os elementos probatórios que conduzem à verificação de todos os elementos típicos do crime pelo qual o recorrente foi condenado, pelo que não pode ser absolvido, nem em obediência ao princípio do in dúbio pro reo. 15- Estão reunidos todos os elementos subjetivos e objetivos constitutivos do crime de furto qualificado. 16- Compulsada a sentença, verifica-se que quanto à determinação da medida da pena (…) 22- A sentença recorrida não violou qualquer preceito legal ou constitucional, antes tendo efetuado uma correta aplicação do direito aos factos. Nestes termos e face todo o exposto, deve ser negado provimento ao recurso interposto, mantendo-se, na íntegra, a douta sentença recorrida, assim se fazendo inteira JUSTIÇA.» * Nesta instância o Ministério Público no seu parecer entende que o recurso deve ser rejeitado, uma vez que não dá integral cumprimento ao disposto no artigo 414º, nº2 do CPP ou então ser julgado improcedente. * Foi dado cumprimento ao disposto no artigo 417º, n.º 2 do CPP. Colhidos os vistos, foram os autos à conferência. Cumpre apreciar e decidir. * 2-FUNDAMENTAÇÃO 2.1-QUESTÕES A DECIDIR Conforme jurisprudência constante e assente, sem prejuízo das questões de conhecimento oficioso é pelas conclusões que o recorrente extrai da motivação apresentada, em que sintetiza as razões do pedido (artigo 412.º, n.º 1, do CPP), que se delimita o objeto do recurso e os poderes de cognição do Tribunal Superior. As conclusões do recurso têm uma importância primordial, pois o âmbito do recurso é delimitado por estas. As conclusões devem ser concisas, precisas e claras, porque são as questões nelas sumariadas que hão de ser objeto de decisão. É certo que as conclusões apresentadas pelo recorrente deixam muito a desejar, sendo muito extensas, confusas e pouco precisas, mas ainda assim consegue-se delas extrair o que pretende com o recurso. Não procederemos ao convite para esclarecer as conclusões pois poderia redundar numa pura perda de tempo. Face às conclusões extraídas pelo recorrente da motivação apresentada, são as seguintes as questões a apreciar e decidir:. 1- Proibições de prova- nulidade absoluta quanto à busca e quanto à alegada confissão informal. 2- Vícios da decisão - insuficiência para a decisão da matéria de facto provada - artigo 410º, n.º 2, als. a) do CPP. 3- Erro de julgamento em matéria de facto - violação do princípio in dubio pro reo. 4- Não preenchimento do tipo de ilícito e consequente absolvição.
2.1.2- A DECISÃO RECORRIDA: Tendo em conta as questões objeto do recurso, da decisão recorrida importa evidenciar a fundamentação da matéria de facto, que é a seguinte (transcrição): « II. Fundamentação da Facto: 2.1. Factos Provados: Discutida a causa e com relevância para a decisão da mesma, resultaram provados os seguintes factos: 1) À data de 13 de dezembro de 2021, o arguido AA era empregado de balcão do estabelecimento de restauração e bebidas denominado “Café ...” localizado na rua ..., na ..., e explorado por CC. 2) Em data anterior ao dia 13 de dezembro de 2021, os arguidos planearam, de comum acordo, fazerem seus dinheiro e tabaco que se encontravam no interior daquele estabelecimento, para tanto aproveitando a circunstância de o arguido AA conhecer a localização do dinheiro e ter a possibilidade de facilitar a entrada no local. 3) Em execução desse plano, no dia 13 de dezembro de 2021, antes de sair do estabelecimento no final do seu turno de trabalho, cerca das 23h45, o arguido AA, propositadamente, não ativou o alarme do estabelecimento, além do que deixou aberta uma janela de correr que se situa ao lado do balcão. 4) Posteriormente, entre as 23h45 do dia 13 de dezembro de 2021 e as 7h00 do dia seguinte, os arguidos, através da referida janela, acederam ao interior do estabelecimento e dali retiraram e levaram: uma caixa de café, que se encontrava armazenada por baixo da máquina de café, e que continha pelo menos 200,00€ provenientes do apuro dos dois últimos dias de laboração; os seguintes maços de tabaco que se encontravam no interior da máquina dispensadora de tabaco e cuja abertura forçaram, no valor unitário de 4,50€: 5 maços de marca Winston; 5 maços da marca Lucky Strike; 4 maços da marca L&M; 4 maços da marca JPS; 4 maços da marca Elixyr; 4 maços da marca Chesterfield; 3 maços da marca Camel. 5) Antes de abandonarem o local, os arguidos ainda partiram o vidro da porta de entrada do estabelecimento, com o intuito de aparentarem, falsamente, que o acesso ao estabelecimento tinha sido efetuado através dessa porta. 6) De seguida, os arguidos abandonaram o estabelecimento, fazendo seus a quantia monetária de, pelo menos, 200,00€ e os 29 maços de tabaco, no valor total de 130,50€, que fizeram seus e repartiram entre si. 7) Os arguidos agiram com o intuito de, mediante a conjugação das suas ações, fazerem seus o dinheiro e tabaco nos valores supra referidos, apesar de saberem que os mesmos não lhes pertenciam e que atuavam contra a vontade do seu legítimo proprietário. 8) Os arguidos atuaram de modo livre, deliberado e consciente, bem sabendo ser o seu comportamento proibido e punido por lei penal. 9) Por sentença proferida no proc. n.º 40/21.6SPRT, em 23.11.2021, transitada em julgado a 07.01.2022, o arguido AA foi condenado pela prática de um crime de condução sem habilitação legal, previsto e punido pelo art. 3.º do Decreto-Lei n.º 2/98, de 03.01, na pena de 80 dias de multa, à taxa diária de 6,00€, perfazendo o total de 480,00€ - por factos praticados em 23.03.2021. A referida pena foi declarada extinta em 04.10.2022. 10) Por sentença proferida no proc. n.º 572/20.3GAMAI, em 15.09.2021, transitada em julgado a 15.10.2021, o arguido BB foi condenado pela prática de um crime de condução sem habilitação legal, previsto e punido pelo art. 3.º, n.º1, do Decreto-Lei n.º 2/98, de 03.01, na pena de 50 dias de multa, à taxa diária de 6,00€, perfazendo o total de 300,00€ - por factos praticados em 17.06.2020. A referida pena foi declarada extinta em 31.05.2022. 11) Por acórdão proferido no proc. n.º 1203/18.7JAPRT, em 18.11.2021, transitada em julgado em 20.12.2021, o arguido BB foi condenado pela prática de um crime de violação de domicílio ou perturbação da vida privada, previsto e punido pelo art. 190.º, n.º1, do Código Penal e de um crime de sequestro, previsto e punido pelo art. 158.º, n.º1, do Código Penal, na pena de 10 meses de prisão, suspensa por 1 ano com regime de prova – por factos praticados em 05.05.2018. A referida pena foi declarada extinta em 22.02.2023. 12) Por sentença proferida no proc. n.º 84/22.0GFPRT, em 21.09.2022, transitada em julgado em 24.10.2022, o arguido BB foi condenado pela prática de um crime de condução sem habilitação legal, previsto e punido pelo art. 3.º do Decreto-Lei n.º 2/98, de 03.01, na pena de 109 dias de multa, à taxa diária de 6,00€, perfazendo o total de 654,00€ - por factos praticados em 01.09.2022. 13) Não foi possível elaborar relatório social relativamente ao arguido AA, por não ter respondido às convocatórias da DGRSP, mostrando-se incontactável. 14) O arguido BB cresceu integrado em dinâmica familiar disfuncional devido ao conflito entre os seus progenitores. Por decisão judicial, o arguido viveu com os avós paternos até que, aos 12 anos de idade, passou a residir com a progenitora e o padrasto. Revelou dificuldades de aprendizagem e de adaptação ao contexto escolar, tendo completado o 4.º ano de escolaridade. Foi acompanhado pela CPCJ e em consultas de pedopsiquiatria por impulsividade e défice de atenção até aos 18 anos de idade. Não manteve esse acompanhamento após a maioridade, por sua vontade. 15) O arguido BB vive com a mãe, o padrasto e os irmãos, assim como com a sua companheira, e filha com 3 anos de idade. Tem vindo a trabalhar ocasionalmente na construção civil, recebendo cerca de 900,00€ por mês. 16) O arguido BB ocupa, atualmente, o seu quotidiano em casa, onde se dedica a arranjar eletrodomésticos e à criação de peixes. * 2.2. Factos Não Provados: Com interesse para a decisão da causa, não se provaram quaisquer factos para além dos que, nessa qualidade, se descreveram acima e/ou que os factos tiveram outras consequências ou motivações para além das supra descritas. * 2.3. Motivação: Em termos gerais, a prova produzida foi apreciada à luz do disposto no art. 127.º do Código de Processo Penal, ou seja, segundo as regras de experiência e da lógica comum e a nossa livre convicção. Relativamente aos factos descritos em 1) e descrição final constante do ponto 4), a convicção do Tribunal foi decalcada do depoimento claro, coerente e lógico prestado, em audiência de julgamento, pela testemunha CC. Esta testemunha, responsável, à data dos factos, pela exploração do “Café ...” esclareceu a contratação do arguido AA, referindo que este lhe ligou às 7h00 da manhã do dia 14.12.2021 para lhe dar conta do “assalto” ocorrido naquele café. Explicou que foi subtraída a quantia monetária de, pelo menos, 200,00€, quilos de café e maços de tabaco, estes últimos no valor unitário de 4,50€, quantificando assim o prejuízo que sofreu, a que se somou enorme transtorno e incomodo pela situação verificada, o que não pôde deixar de ser notado por este Tribunal. Em audiência de julgamento, somente o arguido BB compareceu e prestou declarações. Pese embora tenha afirmado conhecer o arguido AA, por frequentar o “Café ...” onde este último trabalhou, negou a prática dos factos descritos na acusação pública, referindo apenas que o indivíduo que identificou (apelidando-o de “EE”) lhe trouxe “nessa noite” [ou seja, na noite indicada no ponto 3)] tabaco, dizendo: “se queres fumar, fuma”; tendo ainda trazido um casaco que, “nessa noite”, deixou de lhe interessar, oferecendo-o ao arguido BB. O arguido BB, nas declarações que prestou, afastou a sua responsabilidade criminal, atribuindo-a ao referido “EE”, acrescentando que este lhe contou que atuou com um outro indivíduo chamado “GG”, com o arguido AA e companheira deste. No entanto, na manhã seguinte encontrou o arguido AA e, recebendo uma chamada telefónica da mãe, foi este último arguido quem o acompanhou até sua casa. Considerando a versão assim apresentada pelo arguido BB, muitos e particularmente densos foram os acontecimentos relatados para uma só noite, que o envolveram na cadeia de factos de que diz ter tido conhecimento, mas nos quais – afirma – não ter tido qualquer intervenção. Ora, não pode, este Tribunal, deixar de estranhar o assim descrito pelo arguido BB, por o considerar incompatível com as mais elementares regras de experiência comum e juízos de normalidade dos acontecimentos. De outro modo, é difícil compreender com que especial desiderato poderia ter atuado afinal o arguido BB ao deter ou, pelo menos, permitir que os maços de tabaco subtraídos ficassem no seu quarto – cf. auto de busca e apreensão de folhas 32 a 34, auto de apreensão de folhas 38 e reportagem fotográfica de folhas 45 a 48. Com efeito, como consta do auto de notícia de folhas 24 dos autos, a polícia foi alertada logo no dia 14.12.2021, pelas 7h44m, ou seja, na manhã seguinte à já amplamente mencionada noite referida em 3). Nesse mesmo sentido, a testemunha DD, agente da P.S.P., descreveu que foi informado, no exercício das suas funções, do “assalto do café ...”, tendo-lhe sido dada indicação (denúncia anónima) de que tinha sido o arguido BB (cf. “Aditamento n.º2” de folhas 28 a 30), pelo que se dirigiu a casa deste último, contactando com a progenitora que, por sua vez, contactou telefonicamente o arguido. Ali chegaram os dois arguidos, AA e BB. Também a testemunha HH, agente da P.S.P., realizou as mesmas diligências da testemunha DD, constatando que o alarme não se encontra ativado, e que existiam estragos no vidro do estabelecimento comercial (cf. folhas 24), o que foi igualmente confirmado pela testemunha FF (coordenador P.S.P.). Conforme decorre da análise do auto de busca e apreensão de folhas 32 a 34, no interior da residência do arguido BB, foram encontrados maços de tabaco e um moedeiro, como se disse, precisamente no quarto do arguido BB (em cima do guarda-fatos e da comoda). Ora, não tendo este arguido qualquer intervenção nos factos, questiona-se por que motivo não se guardaram aqueles maços de tabaco na divisão onde dormira o indicado indivíduo “EE”; assim como causa perplexidade a circunstância deste indivíduo “confiar” a BB aqueles bens (acabados de subtrair a outrem). As mais elementares regras da experiência comum implicam que se conclua pelo contrário, isto é, que o arguido BB atuou concertadamente com o arguido AA, do modo descrito em 2) a 8). É certo que este Tribunal considera as declarações prestadas pelo arguido BB, em audiência de julgamento, mas em face dos elementos objetivos (apreensão efetuada e local onde se encontravam os bens subtraídos no “café ...” e demais meios de prova produzidos, não se pode deixar de interpretar a versão assim apresentada como aquela que é própria de quem procura afastar a sua eventual responsabilização criminal pelos factos em causa. Com efeito, a circunstância deste arguido BB deter na sua posse objetos subtraídos no “café ...” (concretamente ao ofendido CC), i.e. maços de tabaco, num momento temporal tão próximo (de escassas horas, ou seja, entre a noite do dia 13.12.2021 e o início da manhã do dia 14.12.2021) daquele em que decorreu a subtração desses bens, não nos pode deixar de indicar que este arguido, tal como o por ele indicado arguido AA foram, de facto, autores dos factos descritos em 1) a 8), este último com enorme facilidade de acesso ao referido estabelecimento comercial, considerando a atividade profissional que ali desempenhava. No mais, os pontos 9) a 12) foram decalcados dos certificados de registo criminal dos arguidos, respetivamente insertos nos autos. Os factos descritos em 13) e 16) resultam demonstrados em conformidade com o que foi informado, por um lado, pela DGRSP relativamente ao arguido AA (cf. folhas 249) e, por um lado, ao que foi afirmado pelo arguido BB a propósito da situação pessoal e socioeconómica (notando-se, designadamente, que, em audiência de julgamento, afirmou ter rendimentos mensais variáveis mas de cerca de 900,00€ por mês, circunstância distintamente mencionada no relatório social). De facto, o arguido BB pronta e espontaneamente respondeu acerca das suas condições pessoais, inexistindo razões para que se duvide do assim referido, nesse conspecto, tendo-se ainda em conta o conteúdo do relatório social junto aos autos, a folhas 250 a 252. Dos autos não constam quaisquer documentos que, por si só ou complementados com os depoimentos prestados, permitam responder de forma diferente à matéria de facto em causa e nenhum elemento probatório colhido nos autos que lograsse afastar ou infirmar a convicção assim criada. * » * 2.3- APRECIAÇÃO DO RECURSO. 2.3.1- Proibições de prova- nulidade absoluta quanto à busca e quanto à alegada confissão informal. Começaremos a apreciação do recurso pela questão das proibições de prova e consequente nulidade, pois que sendo procedente nesta parte o recurso deverá considerar–se a sentença também afetada de nulidade, podendo ter de ser determinada a remessa dos autos de novo à primeira instância para elaboração de nova decisão que, analisando a restante prova válida, mantenha ou modifique em conformidade a matéria de facto e a respetiva matéria de direito. Em resumo, entende o recorrente que se verifica uma nulidade absoluta quanto à busca e quanto à alegada confissão informal que o arguido recorrente teria feito à testemunha. Argumenta que à data dos factos o arguido tinha apenas 21 anos, pelo que qualquer ato processual teria de ser obrigatoriamente praticado na presença de defensor oficioso, nos termos do artigo 64º, nº1, al. d) do CPP. Nos termos desta norma é obrigatória a assistência do defensor em qualquer ato processual, à exceção da constituição de arguido, além dos outros casos aí enumerados, sempre que o arguido for menor de 21 anos. Justifica-se esta obrigatoriedade de assistência total pela particular vulnerabilidade do arguido que se encontre numa das situações aí referidas, incluindo a idade inferior a 21 anos[1]. A ausência de defensor – constituído ou nomeado – sendo esta obrigatória constitui uma nulidade insanável nos termos do artigo 119º, al. c) do CPP. Começando pela busca realizada em casa e ao quarto do recorrente, temos que, conforme consta do expediente junto aos autos (Referência citius 3104992), a busca foi autorizada e realizada cerca das 13h05 e a sua constituição como arguido teve lugar às 14h40. Ora, tendo a constituição como arguido ocorrido após a busca cabe averiguar se tem aplicação a obrigatoriedade de assistência por defensor.
Se atentarmos no aditamento ao auto de notícia, aí se refere que a PSP teve notícia do furto pelas 12h30 do dia 14.12 e que foram informados que um dos intervenientes era o ‘BB’ (recorrente) conhecido da polícia e que se deslocaram para a morada do mesmo, conversaram com o recorrente e com o coarguido, tendo sido referido no auto de notícia que os mesmos confrontados com os factos em apreço, de livre vontade, bem como numa atitude de colaboração para com a polícia assumiram a sua participação no assalto em referência. Por haver suspeitas que o recorrente pudesse ter no seu quarto artigos provenientes do furto, bem como outros elementos que servissem para a produção de prova, confrontaram o recorrente com tal facto o qual autorizou uma busca domiciliária ao seu quarto, como se encontra documentado. Resumindo: 1- ocorre um furto; 2- a polícia é informada de quem é o suspeito do furto e, sendo sobejamente conhecido, dirige-se a casa deste; 3- em conversa informal com a polícia o suspeito confessa os factos; 4-autoriza uma busca, a qual é realizada e são apreendidos objetos provavelmente provenientes do furto; 5- de seguida o suspeito é constituído arguido; 6- o suspeito e depois arguido à data dos factos tem menos de 21 anos de idade; 7- não foi assistido por defensor para autorização e realização da busca; 8- a apreensão dos objetos (mealheiro e maços de tabaco) resultante da busca em casa do suspeito menor de 21 anos de idade, primeiro ‘conversador confitente informal’, depois autorizante da busca e só finalmente arguido foi determinante para a prova da autoria dos factos como resulta da motivação de facto da sentença recorrida. A busca domiciliária consentida pelo visado, menor de 21 anos de idade, já suspeito do cometimento de um crime de furto e depois de em conversa informal com os polícias ter confessado os factos, mas ainda não ter sido constituído arguido, não é válida por falta da presença de um defensor para assistir ao consentimento e realização da busca, imposta pelo regime de obrigatoriedade de assistência de defensor a pessoas vulneráveis, nelas se incluindo os menores de 21 anos de idade, previsto no artigo 64º, n.º 1, al. d) do CPP. Como parece resultar evidente, não obstante não ser ainda arguido, o facto de ser suspeito de um crime, ainda por cima depois de em conversa informal ‘confessar’ o crime, impunha que a pessoa vulnerável fosse de imediato assistida, sob pena de destruição da proteção conferida pelo regime especial instituído pelo artigo 64º, n.º 1, al. d) do CPP, sendo irrelevante o facto de já ter sido (como deveria ter sucedido) ou não constituído arguido. Se assim não fosse, para contornar o regime de proteção especial de pessoas vulneráveis do artigo 64º, n.º 1- d) do CPP bastaria deixar sempre para o fim a constituição como arguido, depois de consumadas as ‘conversas informais confitentes’ com o suspeito e as ‘buscas consentidas’, tendo ficado dispensada a assistência de defensor ao visado e obtida prova essencial para a condenação do vulnerável e indefeso suspeito. Não sendo válida a busca e apreensão, afetadas por nulidade insanável nos termos do artigo 119º, al c) do CPP, é nula a prova que com ela se pretendeu obter, verificando-se uma proibição de prova e proibição de valoração de prova. Quanto à confissão informal que o arguido recorrente teria feito a uma testemunha e por esta relatada em audiência, não se vê da motivação da sentença que o tribunal recorrido tenha valorado a mesma, sem prejuízo de desde já se assinalar que a mesma também não poderia ser valorada, pois que o arguido recorrente já era suspeito, além de que ambos os arguidos tinham menos de 21 anos de idade e não se encontravam assistidos por defensor. Lendo a motivação da sentença recorrida vemos que na formação da convicção do tribunal teve grande importância o facto de terem sido apreendidos os referidos objetos ao arguido recorrente, sendo a apreensão de tais objetos que na lógica da fundamentação permitiu desmontar parte da versão apresentada pelo recorrente. Ora fundamentando-se a sentença em prova proibida, a prova é nula – artigo 126º do CPP – arrastando a sentença para a nulidade, devendo os autos ser remetidos à primeira instância para elaboração de nova sentença que, analisando a restante prova válida, mantenha ou modifique em conformidade a matéria de facto e a respetiva matéria de direito. Fica prejudicado o conhecimento das demais questões colocadas pelo recurso. * 3- DECISÃO. Pelo exposto, acordam os juízes do Tribunal da Relação do Porto em conceder parcial provimento ao recurso e em consequência declarar a nulidade da sentença recorrida, por utilização na formação da convicção do julgador de prova de valoração proibida, impondo-se a prolação de nova sentença que exclua como meios de prova os autos de busca e apreensão em que não foi cumprido o disposto no artigo 64º, 1, alínea d) do Código de Processo Penal. Sem custas. * Notifique.
Porto, 12 de junho de 2024 William Themudo Gilman Elsa Paixão Liliana Páris Dias ______________ |