Acórdão do Tribunal da Relação do Porto
Processo:
1717/23.7T8AMT-D.P1
Nº Convencional: JTRP000
Relator: RAQUEL CORREIA DE LIMA
Descritores: INSOLVÊNCIA CULPOSA
PRESUNÇÃO DE CULPA
Nº do Documento: RP202510281717/23.7T8AMT-D.P1
Data do Acordão: 10/28/2025
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: CONFIRMADA
Indicações Eventuais: 2ª SECÇÃO
Área Temática: .
Sumário: Havendo prova de algum dos factos base constantes do número 2 do artigo 186º do CIRE, há uma presunção inilidível de culpa.
Reclamações:
Decisão Texto Integral: Processo: 1717/23.7T8AMT-D.P1

Tribunal Judicial da Comarca do Porto Este
Juízo de Comércio de Amarante- Juiz 4
Processo n.º 1717/23.7T8AMT-D
ACÓRDÃO
I. RELATÓRIO (transcrição)

Por apenso aos autos de insolvência o Sr. Administrador de Insolvência veio apresentar Parecer, nos termos previstos no artigo 188.º, n.º 1, do Código de Insolvência e de Recuperação de Empresa, onde peticiona a qualificação de insolvência da Requerida “A..., Lda.” como culposa, com afetação do/a/s seu/s gerente/s de direito e/ou de facto, AA e BB, alegando, em síntese, que os Requeridos alienaram a favor de sociedade especialmente relacionada o património da Devedora, após terem recorrido a financiamentos para a Devedora, garantidos pelo Estado, tendo prosseguir uma atividade ruinosa, contraindo novos créditos e com a venda do seu património imobilizado e dos bens móveis agravaram a situação de insolvência da Devedora.
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A credora “B..., Lda.” veio também apresentar o seu parecer nos termos previstos no artigo 188.º, n.º 3, do Código de Insolvência e Recuperação de Empresas, pugnando que a insolvência da Requerida “A..., Lda.”, seja qualificada culposa, com afetação do/a/s seu/s gerente/s de direito e de facto, AA e BB.
Para tanto, em síntese, alega que o Requerido BB constituiu outra sociedade para quem foram transferidos os trabalhadores e o património da Devedora, de forma a salvaguardar os bens da Devedora e prejudicar os seus credores, vindo apresentar- se à insolvência já depois de findo o prazo para resolução de tais negócios, tendo a Insolvente prosseguido uma exploração deficitária e incumprido o dever de apresentação à insolvência.
Aberta vista ao Ministério público para se pronunciar, nos termos previstos no n.º 4, do artigo 188.º, do Código de Insolvência e Recuperação de Empresas, promoveu a qualificação culposa da insolvência da requerida “A..., Lda.” alegando no essencial os factos constantes do parecer do Sr. Administrador de Insolvência.
Conclui, peticionando pela afetação do/a/s gerente/s de direito e de facto da Insolvente, o/a/s requerido/a/s AA e BB.
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Regularmente citados/notificados dos Pareceres apresentados pelos Credores, pelo/a Administrador/a de Insolvência e pelo Ministério Público, o/a/s Requerido/a/s deduziu/ram Oposição, pugnando que a Insolvência seja qualificada como fortuita com a consequente não afetação dos Requeridos.

Atenta a simplicidade da causa, foi dispensada a Audiência Prévia, tendo sido proferido despacho saneador, que declarou válida a instância nos seus pressupostos objetivos e subjetivos, despacho a fixar o objeto do litígio e indicar os temas da prova, despacho de admissão dos meios de prova apresentados e a designar data para a audiência de discussão e julgamento.
Despachos que não foram alvo de qualquer reclamação.
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Procedeu-se à realização da audiência de discussão e julgamento tendo, a final, sido proferida sentença que decidiu qualificar culposa a insolvência da devedora, “A..., Lda.”, e, em consequência:

a) Declarou afetada pela qualificação culposa da insolvência, com culpa grave, a sócia e também gerente de direito e de facto da Insolvente, a Requerida, AA;
b) Declarou também afetado pela qualificação culposa da insolvência, o sócio e Requerido BB, com culpa grave, pelo agravamento da situação de insolvência;
c) Decretou a inibição dos requeridos BB e AA para o exercício do comércio e para a ocupação de qualquer cargo de titular de órgão de sociedade comercial ou civil, associação ou fundação privada de atividade económica, empresa pública ou cooperativa, por um período de 4 (quatro) anos.
d) Decretou a inibição dos requeridos BB e AA para administrarem patrimónios de terceiros, por um período de 4 (quatro) anos, atenta a gravidade do seu comportamento e da sua contribuição para o agravamento da situação de insolvência da Devedora;
e) Determinou a perda dos créditos reconhecidos sobre a insolvência à Requerida AA.
f) Condenou os Requeridos BB e AA a indemnizarem os credores da Devedora Insolvente, solidariamente, no montante dos créditos não satisfeitos e até às forças do respetivo património, fixando-se o valor dessa indemnização no montante de 20% dos créditos não satisfeitos na presente insolvência, atento o grau de ilicitude dos factos praticados, o grau de culpa apurado e a sua participação no agravamento da insolvência.

RECURSO
A..., LDA, Insolvente e BB e AA, não se conformando com a sentença vieram interpor recurso.
Após alegações terminam com as seguintes CONCLUSÕES:
(…)
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RESPOSTA DO MINISTÉRIO PÚBLICO ÀS ALEGAÇÕES DO RECURSO
(…)
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Colhidos os vistos, cumpre decidir.

II. DELIMITAÇÃO DO OBJECTO DO RECURSO
O objecto do recurso é delimitado pelas conclusões da alegação dos recorrentes, não podendo este Tribunal conhecer de matérias nelas não incluídas, a não ser que as mesmas sejam de conhecimento oficioso – artigos 635.º, n.º 4 e 639.º, n.ºs 1 e 3 do Código de Processo Civil
No caso vertente, em face das conclusões do recurso, as questões a apreciar são:
· IMPUGNAÇÃO DA MATÉRIA DE FACTO
· VERIFICAÇÃO DOS REQUISITOS DO ARTIGO 186º DO CIRE.

III. FUNDAMENTAÇÃO
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A. OS FACTOS
Na sentença em crise foram fixados os seguintes factos:

FACTOS PROVADOS
A) A Requerida “A..., Lda.” foi declarada insolvente por sentença proferida nos autos principais, em 27.12.2023, em ação apresentada a Juízo em 22.12.2023.
B) A Requerida foi constituída em 04.03.2004, com o objeto social de fabricação de peúgas; com sede social na Rua ..., freguesia ... e ..., concelho de Marco de Canavezes; com o capital social de 5.000,00 euros, ulteriormente aumentado para 30.000 euros, dividido em duas quotas de valor nominal inicial de 15.000 euros, cada uma, pertencentes aos sócios BB e AA, obrigando-se a sociedade com a assinatura de um gerente, tendo sido nomeados gerentes ambos os sócios, tendo o gerente BB renunciado à gerência em 22.11.2019.
C) A requerida “A..., Lda.” publicou na respetiva Conservatória de Registo Comercial as suas contas referentes aos exercícios dos anos de 2006 até ao ano de 2022 (inclusive).
D) No apenso de reclamação de créditos foram reconhecidos créditos, no montante global de 1.329.411,47 (um milhão, trezentos e vinte e nove mil, quatrocentos e onze euros, quarenta e sete cêntimos).
E) Não foram reclamados créditos pela Autoridade Tributária nem pelo Instituto de Segurança Social.
F) A propriedade do veículo com matrícula ..-TE-.., de marca Mercedes Benz encontra-se registada a favor de CC desde 31.10.2023, e antes a favor de “A..., Lda.”, desde 22.12.2020.
G) Com data de 30.12.2022, com vencimento em 28.02.2023, a “A..., Lda.” emitiu uma fatura em nome de BB, referente à venda do veículo com matrícula ..-TE-.., de marca Mercedes Benz, ..., no valor de 9.104,17 euros.
H) CC, nascido em 17.08.2001, é filho dos Requeridos BB e AA.
I) DD, nascido em 19.10.2010, é filho dos Requeridos BB e AA.
J) EE, nascido em 27.12.1995, é filho dos Requeridos BB e AA.
K) Por escritura de Compra E Venda, celebrada em 26.03.2020, a Insolvente representada pelos seus únicos sócios e ela também gerente, BB e AA, vendeu à sociedade “C... – Sociedade Unipessoal, Lda.”, representada pelo seu único sócio e gerente BB, pelo preço global de 16 500 euros, os seguintes prédios:
urbano composto de uma parcela de terreno para construção, lote n.º ..., sito no Lugar ..., descrito na Conservatória de Registo Predial de Marco de Canaveses sob o número ... e inscrito na respetiva matriz predial urbana sob o artigo ... da freguesia ... e ..., com o valor patrimonial de 62.540,00 euros e atribuído de 15.000,00 euros;
Rústico denominado ..., sito no Lugar ..., descrito na Conservatória de Registo Predial de Marco de Canaveses sob o número ... e inscrito na respetiva matriz predial urbana sob o artigo ... da freguesia ... e ..., com o valor patrimonial de 15,81 euros e atribuído de 500,0 euros;
Rústico denominado monte do tapado sito no Lugar ..., descrito na Conservatória de Registo Predial de Marco de Canaveses sob o número ... e inscrito na respetiva matriz predial urbana sob o artigo ... da freguesia ..., com o valor patrimonial de 49,88 euros e atribuído de 500 euros;
Rústico denominado monte canhoto sito no Lugar ..., descrito na Conservatória de Registo Predial de Marco de Canaveses sob o número ... inscrito na respetiva matriz predial urbana sob o artigo ... da freguesia ..., com o valor patrimonial de 51,88 euros e atribuído de 500 euros.
L) Por escritura de Compra E Venda, celebrada em 09.12.2020, a Insolvente representada pelos seus únicos sócios e ela também gerente, BB e AA, vendeu à sociedade “D..., Lda.”, representada pelo seu único sócio e gerente BB, pelo preço de 61.302,00 euros, o prédio urbano composto de edifício de um pavimento destinado a industria e logradouro, lote n.º ..., sito no Lugar ..., descrito na Conservatória de Registo Predial de Marco de Canaveses sob o número ... e inscrito na respetiva matriz predial urbana sob o artigo ... da freguesia ... e ..., com o valor patrimonial de 61.302,00 euros, tendo o preço sido pago com a entrega de três cheques, números ..., ... e ..., sacados sobre a Banco 1....
M) A sociedade “C... – Sociedade Unipessoal, Lda.” foi constituída em 03.12.2019, com o objeto social de atividades de compra e venda de bens imobiliários, nomeadamente, edifícios residenciais e não residenciais e de terrenos; atividades de subdivisão de terrenos em lotes sem introdução de melhoramentos; atividades de arrendamento e exploração de bens imobiliários (próprios ou arrendados), nomeadamente, edifícios residenciais e não residenciais (inclui espaços e instalações industriais, comerciais, etc.) e de terrenos; fabricação de meias, peúgas, collants para homem, mulher e criança; com sede social na Rua ..., ..., freguesia ... e ..., concelho de Marco de Canavezes; com o capital social de 5.000,00 euros, numa quota única pertencente ao sócio BB, obrigando-se a sociedade com a assinatura de um gerente, tendo sido nomeado gerentes o sócio BB.
N) Por deliberação de 04.04.2022, a sociedade “C... – Sociedade Unipessoal, Lda.” alterou a sua firma para “D..., Lda.”, passando o seu capital social a estar dividido em quatro quotas, uma de valor nominal de 500 euros, pertencente ao sócio BB, e três de valor nominal de 1.500 euros, cada uma, pertencentes respetivamente, aos sócios CC, DD e EE.
O) Com data de 30.12.2022, com vencimento em 28.02.2023, a “A..., Lda.” emitiu uma fatura em nome de “D..., Lda.”, referente à venda dos seguintes bens: Conjunto Formas, Máquina BROTHER CB3, Cilindro MAQ. BILLI MAGIC, Mesa e vestiário 8 cacifos, Maq. AUTOM Para aplicação de ganchos EM J TECMA, Maquinas de Peúgas BILLI MAGIC, Maquina de Ramalhar CONTI COMPLET, Maquina de Enformar ME M1 E DA PRIPRECISÃO, Pré-virador PR250, Impressora TSC- 268-M, reformulação do Sistema de Aspiração dos Teares, Compressor de Parafuso BSD 75 T SFC, no valor global de 17 859,60 euros.
P) Com data de 30.10.2023, com vencimento em 29.12.2023, a “A..., Lda.” emitiu uma fatura em nome de “D..., Lda.”, referente à venda dos seguintes bens: Contentor 40 HC SOC, Duas caixas metálicas Tipo contentor de 12 metros HC, Máquina Envolvedora Paletes ATLANTA SINTHESI 1 500, no valor global de 4.981,50 euros
1. Da declaração de IES da Requerida referente ao exercício de 2020 constam os seguintes saldos: vendas e serviços prestados, 1.105.931,08 euros, Subsídios à exploração, 60.760,15 euros, custo de mercadorias vendidas e das matérias consumidas, 615.800,75 euros, fornecimentos de serviços externos 163.629,04 euros, gastos com o pessoal 328.780,90 euros, Outros rendimentos e ganhos, 51.866,83 euros, Outros gastos e perdas, 41 127,02 euros, resultado liquido do período 1.587,52 euros, ativos fixos tangíveis 303.659,17 euros, Inventários 370.530,69 euros, clientes 604.455,84 euros, acionistas/sócios, 82.000,00 euros, caixa e depósitos bancários 22.143,21 euros, capital realizado 30.000 euros, resultados transitados 136.238,56 euros, capital próprio 200.696,26 euros, fornecedores 374 020,63 euros, financiamentos obtidos 737.164,18 euros, total do passivo 1.221.926,18 euros.
2. Da declaração de IES da Requerida referente ao exercício de 2021 constam os seguintes saldos: vendas e serviços prestados, 1.397.303,86 euros, Subsídios à exploração, 2.450,50 euros, custo de mercadorias vendidas e das matérias consumidas, 967.614,18 euros, fornecimentos de serviços externos 176 257,16 euros, gastos com o pessoal 345.169,18 euros, Outros rendimentos e ganhos, 350,66 euros, Outros gastos e perdas, 14.135,85 euros, resultado liquido do período -166.956,32 euros, ativos fixos tangíveis 251.962,18 euros, Inventários 228.600,48 euros, clientes 350.307,24 euros, acionistas/sócios, 59.824,00 euros, caixa e depósitos bancários 211.821,46 euros, capital realizado 30.000 euros, resultados transitados 107.026,08 euros, capital próprio 2.939,94 euros, fornecedores 308.598,69 euros, financiamentos obtidos 754.292,92 euros, total do passivo 1.160.859,78 euros.
3. Da declaração de IES da Requerida referente ao exercício de 2022 constam os seguintes saldos: vendas e serviços prestados, 1.378.163,33 euros, Subsídios à exploração, 3.584 euros, custo de mercadorias vendidas e das matérias consumidas, 750.875,50 euros, fornecimentos de serviços externos 165.266,02 euros, gastos com o pessoal 356.053,90 euros, Outros rendimentos e ganhos, 17.211,16 euros, Outros gastos e perdas, 39.294,08 euros, resultado liquido do período 23.043,45 euros, ativos fixos tangíveis, 245.000,50 euros, Inventários, 320.203,90 euros, clientes, 374.737,44 euros, acionistas/sócios, 35.632,00 euros, caixa e depósitos bancários, 76.358,86 euros, capital realizado, 30.000 euros, resultados transitados, -93.530,24 euros, capital próprio -7.616,61 euros, fornecedores 371.956,33 euros, financiamentos obtidos 627.950,34 euros, total do passivo 1.088.830,69 euros.
4. Da declaração de IES da Requerida referente ao exercício de 2023 constam os seguintes saldos: vendas e serviços prestados, 869.311,45 euros, Subsídios à exploração, 63.940,56 euros, custo de mercadorias vendidas e das matérias consumidas, 855.334,72 euros, fornecimentos de serviços externos 174.542,56 euros, gastos com o pessoal 335.463,92 euros, Outros rendimentos e ganhos, 32.609,41 euros, Outros gastos e perdas, 167.660,66 euros, resultado liquido do período -617.305,92 euros, ativos fixos tangíveis 103.667,68 euros, Inventários 29.053,19 euros, clientes 47.934,80 euros, acionistas/sócios, 5.632,00 euros, caixa e depósitos bancários 14.721,16 euros, capital realizado 30.000 euros, resultados transitados -70.486,79 euros, capital próprio -624.922,53 euros, financiamentos obtidos 331.407,47 euros, total do passivo 846.236,59 euros.
5. No período compreendido entre 03/12/2019 a 30/09/2024, a sociedade “D..., Lda.” teve os seguintes trabalhadores ao seu serviço: FF, desde 01-04-2022 até 30-04-2023, CC desde 02-09-2020 até 31-01-2021, e BB desde 03-12-2019.
6. No período compreendido entre 01/01/2021 a 31/12/2023, a sociedade Insolvente teve os seguintes trabalhadores ao seu serviço: GG, desde 2016- 02-01 até 2023-12-27, HH, desde 2016-02-01 até 2021-09-01, II, desde 2015-05-25 até 2023-12-27, JJ, desde 2014-11-20 até 2023-12-27, EE, desde 2014- 03-20 até 2023-12-27, KK, desde 2013-12-09 até 2021-06-13, LL, desde 2013-04-11 até 2023-12-27, MM, desde 2013-02-20 até 2023-12-27, NN, desde 2013-01-21 até 2023-12-27, OO, desde 2013-01-08 até 2023- 12-27, PP, desde 2020-09-15 até 2022-08-31, QQ, desde 2020-07-20 até 2023-12-27, RR, desde 2019-06-03 até 2023-01-01, SS, desde 2019-01-16 até 2023-12-27, TT, desde 2018-04-03 até 2023-01-01, UU, desde 2018-04-03 até 2022-09-16, VV, desde 2017-09-04 até 2023-07-18, WW, desde 2017-01-26 até 2021-09-19, XX, desde 2016-06-07 até 2022-10-24, YY, desde 2016-06-01 até 2021-03-02, ZZ, desde 2021- 05-11 até 2023-12-27, AAA, desde 2021-04-07 até 2021-09-01, BBB, desde 2021-03-08 até 2021-12-10, CC desde 2021-02-11 até 2023-12-27, CCC, desde 2020-12-21 até 2023-12-27, DDD, desde 2020-12-07 até 2023-12-27, EEE, desde 2020-12-07 até 2021-02-18, FFF, desde 2020-12-07 até 2021-02-12, GGG, desde 2020-10-07 até 2023-12-27, HHH, desde 2020-10-07 até 2023-12-27, III, desde 2022-06-24 até 2023-02-10, JJJ, desde 2022-06-24 até 2022-08-12, KKK, desde 2022-06-08 até 2023-08-31, LLL, desde 2022-05-02 até 2023-12-27, MMM, desde 2022-05-02 até 2023-07-01, NNN, desde 2022-03- 01 até 2023-02-12, OOO, desde 2022-03-01 até 2022-04-30, PPP, desde 2021-11-09 até 2022-05-01, QQQ, desde 2021-10-07 até 2023-01-31, RRR, desde 2021-10-07 até 2022-09-07, SSS, desde 2023-11-07 até 2023-12-27, TT, desde 2023-10-03 até 2023-12-27, TTT, desde 2023-09-27 até 2023-12-27, UUU, desde 2023- 09-27 até 2023-12-27, UU, desde 2023-09-12 até 2023-12-27, VVV, desde 2022-12-12 até 2023-12-27, WWW, desde 2022-11-08 até 2023-12-27, XXX, desde 2022-11-08 até 2023-12-27, YYY, desde 2022-10-11 até 2023-12-27, ZZZ, desde 2012-05-03 até 2022-02-28, AAAA, desde 2011-03-15 até 2023-12-27, BBBB, desde 2009-09-01 até 2023-12- 27, CCCC, desde 2009-06-15 até 2023-12-27, DDDD, desde 2008-10-17 até 2022-11-14, EEEE, desde 2008-01-21 até 2022-07-11, FFFF, desde 2007-11-19 até 2023-12-27, GGGG, desde 2007-11-15 até 2022-03-15, HHHH, desde 2004-05-12 até 2023-12-27, e BB, desde 2004-02-09.
7. O requerido BB continuou a contactar com os fornecedores e com os clientes da Insolvente, após a sua renúncia à gerência.
8. Aquando da transmissão do prédio urbano composto de edifício de um pavimento destinado a indústria e logradouro, descrito na Conservatória de Registo Predial de Marco de Canaveses sob o número ..., para a sociedade “D..., Lda.”, os Requeridos não solicitaram a uma entidade independente qualquer avaliação prévia para aferirem do valor de mercado do imóvel.
9. A sociedade “D..., Lda.” não solicitou qualquer financiamento para a aquisição do prédio urbano descrito na Conservatória de Registo Predial de Marco de Canaveses sob o número ....
10. A sociedade “D..., Lda.” arrendou à Insolvente o prédio urbano descrito na Conservatória de Registo Predial de Marco de Canaveses sob o número ..., mediante o pagamento de uma renda mensal no valor de 1 000 euros.
11. Depois da transmissão para a “D..., Lda.” do prédio urbano descrito na Conservatória de Registo Predial de Marco de Canaveses sob o número ..., foi pago pela Insolvente ao Banco, o empréstimo referente à hipoteca que onerava tal prédio, o que permitiu o distrate de tal hipoteca.
12. A insolvente recebeu no âmbito da Linha de Apoio COVID, as seguintes quantias: em 22.05.2020, a quantia de 250 000 euros, em 23.11.2020, a quantia de 69.580 euros, em 17.06.2021, a quantia de 54 670 euros, e em 06.04.2021, a quantia de 140.000 euros.
13. A insolvente apresentou os seguintes resultados líquidos do período: ano de 2014, 30.328,79 euros, ano de 2015, 15.913,63 euros, ano de 2016, 16.810,78 euros, ano de 2017, 13.492,03 euros, ano de 2018, 7.070,36 euros e ano de 2019, 4.074,58 euros.
14. A insolvente apresentou os seguintes passivos: ano de 2014, 487.724,80 euros, ano de 2015, 853.695,28 euros, ano de 2016, 969.849,20 euros, ano de 2017, 988.733,25 euros, ano de 2018, 997.312,79 e ano de 2019, 1.168.455,16 euros;
15. Em assembleia geral extraordinária realizada em 10.03.2021, os Requeridos deliberaram a distribuição intercalar de lucros, através da utilização dos resultados transitados, com o recebimento por cada um dos sócios BB e AA, do montante de 15.400 euros, sendo os valores a pagar até dezembro de 2021.
16. Em assembleia geral extraordinária realizada em 10.03.2022, os Requeridos deliberaram a distribuição intercalar de lucros, através da utilização dos resultados transitados, com o recebimento por cada um dos sócios BB e AA, do montante de 16.800 euros, sendo os valores a pagar até dezembro de 2022.
17. Na data de 28 de maio de 2024, o prédio urbano descrito na Conservatória de Registo Predial de Marco de Canaveses sob o número ... foi avaliado no valor de 80.600 euros.
18. Da declaração de IES da “D..., Lda.”, referente ao exercício de 2019 constam os seguintes saldos: vendas e serviços prestados, 0,00, custo de mercadorias vendidas e das matérias consumidas, 0,00 euros, fornecimentos de serviços externos 267,32 euros, gastos com o pessoal 894,05 euros, resultado liquido do período -2.428,32 euros, ativos fixos tangíveis 69.914,99 euros, Inventários 0,00 euros, caixa e depósitos bancários 5.000 euros, capital realizado 5.000 euros, capital próprio 2.571,68 euros, passivo corrente: financiamentos obtidos, 0,00, fornecedores 87 852,75 euros, total do passivo 89.058,36 euros.
19. Da declaração de IES da “D..., Lda.”, referente ao exercício de 2020 constam os seguintes saldos: vendas e serviços prestados, 186.201,90 euros, custo de mercadorias vendidas e das matérias consumidas, 133.194,23 euros, fornecimentos de serviços externos 8 764,45 euros, gastos com o pessoal 15.017,94 euros, resultado líquido do período 2 815,31 euros, ativos fixos tangíveis 149.062,81 euros, clientes 39 151,39 euros, caixa e depósitos bancários 8.556,12 euros, capital realizado 5.000 euros, resultados transitados -2.428,32 euros, capital próprio 5.386,99 euros, passivo corrente: financiamentos obtidos, 0,00, fornecedores 204.414,87 euros, total do passivo 207.810,17 euros.
20. Da declaração de IES da “D..., Lda.”, referente ao exercício de 2021 constam os seguintes saldos: vendas e serviços prestados, 437.119,73 euros, custo de mercadorias vendidas e das matérias consumidas, 360.713,93 euros, fornecimentos de serviços externos 3 802,53 euros, gastos com o pessoal 8.462,10 euros, resultado liquido do período 30.736,69 euros, ativos fixos tangíveis 134.797,29 euros, Inventários 132.767 euros, caixa e depósitos bancários 44 131,74 euros, capital realizado 5.000 euros, resultados transitados 246,22 euros, capital próprio 36.123,68 euros, passivo corrente: financiamentos obtidos, 0,00, fornecedores 285.402,63 euros, total do passivo 301.062,98 euros.
21. No processo de insolvência foram apreendidos bens móveis (máquinas e equipamentos) cujo produto da Liquidação ascendeu ao montante global de 8.600 euros.

FACTOS NÃO PROVADOS

a) Que os fornecedores e os clientes da Insolvente soubessem, quanto contactavam com o requerido BB, que este já não era gerente da Insolvente desde novembro de 2019.
b) Que a Insolvente tivesse recebido, efetivamente, a contrapartida correspondente à transmissão de propriedade do veículo com a matrícula ..-TE-.., de marca Mercedes Benz, ....
c) Que o valor da venda dos prédios rústicos transmitidos na escritura de escritura de Compra E Venda, celebrada em 26.03.2020, correspondesse ao seu valor de mercado.
d) Que o valor da venda do prédio urbano transmitido na escritura de escritura de Compra E Venda, celebrada em 09.12.2020, correspondesse ao seu valor de mercado.
e) Que o valor das vendas a que se referem as faturas emitidas em 30.12.2022 e em 30.10.2023, correspondesse aos respetivos valores de mercado dos bens transmitidos.
f) Que os preços das vendas a que se referem as escrituras de Compra E Venda, celebradas em 26.03.2020 e em 09.12.2020 tenham sido utilizados pela Devedora para pagamento de salários e de fornecedores.
g) Que o valor das vendas a que se referem as faturas emitidas em 30.12.2022 e em 30.10.2023 tenha sido utilizado no pagamento de salários e de fornecedores.
h) No ano de 2020, a Insolvente tinha custos fixos com trabalhadores, fornecedores, bancos, Autoridade Tributária e segurança Social, no valor mensal de 80.000 euros.
i) Que a Insolvente tenha outorgado um contrato de comodato, com data de 24 de maio de 2016, pelo prazo de 15 anos, com IIII e JJJJ, tendo por objeto o prédio urbano composto de uma parcela de terreno para construção, lote n.º ..., sito no Lugar ..., descrito na Conservatória de Registo Predial de Marco de Canaveses sob o número ... e inscrito na respetiva matriz predial urbana sob o artigo ... da freguesia ... e ....
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Nos termos do artigo 640.º, n.º 1, do CPC, quando seja impugnada a decisão sobre a matéria de facto, deve o recorrente obrigatoriamente especificar, sob pena de rejeição, os concretos pontos de facto que considera incorretamente julgados, os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão diversa da recorrida, e a decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas. Quando os meios probatórios invocados como fundamento do erro na apreciação das provas tenham sido gravados, incumbe ao recorrente, sob pena de imediata rejeição do recurso na respetiva parte, indicar com exatidão as passagens da gravação em que se funda o seu recurso, sem prejuízo de poder proceder à transcrição dos excertos que considere relevantes, conforme preceitua a al. a), do n.º 2, do mesmo artigo.

Os recorrentes cumpriram de forma correcta o ónus em causa.
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Questão prévia
Alegam os recorrentes que “sentiram-se os Recorrentes compelidos negativamente na execução dos trabalhos, isto porque, foram, efetivamente, muitas vezes impedidos de, livremente, questionarem, quer as testemunhas por eles arroladas, quer as indicadas pela recorrida. Sendo certo que foram muitas as interrupções que não permitiam ou permitiram o bom questionamento das testemunhas. O Julgamento que culminou com a sentença de que se recorre *não foi justo *não foi sério *não foi livre e ofuscou as testemunhas, impedidas de depor sem medo de forma livre – cada palavra era uma interrupção, cada frase um sermão. Não puderam, sem constrangimento, falar livremente, sem que o Tribunal “a quo” as interrompesse, quando expunham a verdade, e muitas das vezes lhes deixasse claro o pouco caso que dava ao que diziam, comprometendo a vontade e empenhamento destas em expressar a verdade. (…) Aqueles que foram os legais representantes da insolvente, as testemunhas, ao abandonarem a sala de audiência de julgamento vinham desgastadas, sentiram que a justiça
passaria “ao lado” da verdade, deporem ou não era a mesma coisa, a convicção do tribunal “a
quo” já estava formada… Mas o mais arrepiante foi sentirem que em sala de audiências tinham medo de falar, aguardavam um “ralhar digno da primária salazarista – com reguadas”, o que inibiu um depoimento livre e autêntico.”

Apreciando
Ao tribunal da Relação não cabe analisar comportamentos dos magistrados que possam resvalar para infracções disciplinares.
Não obstante, verificando este tribunal de recurso que o magistrado não permitiu os esclarecimentos de todos os pontos da matéria de facto que eram relevantes para a decisão, independentemente da questão disciplinar cuja alçada não nos pertence, pode haver necessidade de repetir o julgamento para ver desenvolvidos tais aspectos.
Não é este o caso.

Passemos, assim, à questão da impugnação da matéria de facto.
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Insurgem-se os recorrentes relativamente ao facto provado sob o número 7 pois, no seu entender, ficou provado que à data em que foi decretada a insolvência BB não exercia quaisquer funções de gerente, quer de facto, quer de direito – renunciou ao cargo em 2019.

Apreciando

Sendo um facto concreto e indesmentível que BB renunciou ao cargo de gerente em 2019 – existe prova documental – não houve mudanças no comportamento deste que permitissem concluir que a prática correspondia à forma.
O próprio BB admitiu, quando foi ouvido, que continuou a ajudar a requerida, AA, mesmo depois de ter cessado formalmente as suas funções enquanto gerente.
Pese embora ter dito que os clientes e fornecedores sabiam que ele não era gerente, o certo é que não conseguiu explicar ao tribunal através de que meio aqueles passaram a ter conhecimento da invocada “nova “realidade. Como dizem os recorrentes, não há dever de publicitar esta cessão de funções. Esta desnecessidade, dizemos nós, decorre da mudança, na vida da sociedade, não apenas no papel. Com isto queremos dizer que se o Sr. BB tivesse deixado de contactar os fornecedores e clientes, como fazia até então, independentemente destes saberem se tinha havido renúncia à gestão, era perceptível que, de facto, a partir de certa altura, deixaram de tratar dos assuntos da empresa com aquele, mas com a mulher. Nada disto aconteceu.
O ênfase dado à testemunha KKKK prende-se com a circunstância de ter sido a única pessoa ouvida na qualidade de fornecedor que esclareceu que no seu relacionamento com a empresa, desde o início até à data da insolvência, nada mudou – sempre lidou sempre com o sr. BB, a quem telefonava, pelo menos 1 vez por mês, nunca tendo estabelecido qualquer tipo de ligação com a mulher deste, a requerida AA.

Não há motivo para ser alterado o facto número 7.
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Relativamente aos pontos 8 e 9 dos factos provados

Diz-se no recurso que, quanto ao ponto 8 dos factos provados, “foi requerida pela recorrente AA uma avaliação ao imóvel onde laborava a sociedade – o pavilhão – o que fez junto de um conhecido, que seria vendedor da imobiliária E.... Quanto a este aspeto, o tribunal “a quo” decidiu levar em consideração as declarações de BB, que refere não ter sido realizada qualquer avaliação – ora, à data este não era gerente, mas tão só um comprador. Estava, aliás, chateado com a mulher, já que atravessavam um momento em que estariam separados. Não sendo descabido que este não tivesse conhecimento da referida avaliação. Quanto ao ponto 9 dos factos provados não é a sociedade D..., Lda. que está a ser alvo de insolvência, tal informação não consta dos autos e não se afigura como poderá a Mmª Juiz ter obtido tal informação.”

Apreciando

No ponto 8 dos factos provados consta: “Aquando da transmissão do prédio urbano composto de edifício de um pavimento destinado a indústria e logradouro, descrito na Conservatória de Registo Predial de Marco de Canaveses sob o número ..., para a sociedade “D..., Lda.”, os Requeridos não solicitaram a uma entidade independente qualquer avaliação prévia para aferirem do valor de mercado do imóvel.”

Parece-nos óbvio que a afirmação da requerida de que falou com amigo da imobiliária E... não serve para o fim pretendido. Foi o mesmo ouvido? Efectuou declaração escrita nesse sentido?
O Sr. BB, de facto, afirmou que não foi feita nenhuma avaliação, justificando os recorrentes que este não era gerente, mas só comprador, estando “chateado” com a mulher.
Lendo a decisão percebe-se que a convicção do tribunal não resultou, apenas, do depoimento do Sr. BB, mas da junção dos dois depoimentos.
Dizer-se que aquele estava na posição de comprador para justificar a ausência de avaliação é esquecer que continuava sócio da sociedade que iria desfazer-se de um bem imobiliário e, por esse facto, teria todo o interesse em determinar o valor real do bem. Obviamente que este senhor está numa posição formalmente dúbia, pois, ao mesmo tempo em que é sócio da empresa vendedora, também é socio da empresa compradora.
Não há qualquer fundamento para a alteração do ponto 8.
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No ponto 9 consta que “ A sociedade “D..., Lda.” não solicitou qualquer financiamento para a aquisição do prédio urbano descrito na Conservatória de Registo Predial de Marco de Canaveses sob o número ....”

Dizem os recorrentes que não é a sociedade D..., Lda. que está a ser alvo de insolvência, que tal informação não consta dos autos e não se afigura como poderá a Mmª Juiz ter obtido tal informação.

Apreciando
A primeira oração é completamente acertada. A D... não é insolvente e as questões que se referiram à mesma tiveram como objectivo perceber em que termos aquela sociedade comprou um imóvel à insolvente.
Relativamente à inexistência de empréstimo bancário, o tribunal a quo retirou essa convicção do depoimento do Sr. BB que afirmou que o pagamento foi feito por meio de 3 cheques e que o dinheiro provinha “do negócio, dos lucros”. Analisando a declaração IES da D... relativa ao ano em causa pode concluir-se que não havia lucros suficientes para tal investimento. Por um lado, diz aquele que comprou uma nova empresa porque ele e a mulher se iam divorciar, mas por outro, que a mulher vendeu o imóvel por causa das dificuldades financeiras.
Curioso é que a garantia bancária, hipoteca, existente sobre o imóvel vendido, foi distratada pela vendedora, nunca tendo o comprador assumido a responsabilidade do seu pagamento

Todo este negócio está imbuído de um clima de suspeição que passa para além do razoável.
Como pode vender-se um imóvel que constitui o local de trabalho da sociedade, pelo valor patrimonial (sabendo todos que o valor patrimonial é sempre inferior ao valor real de qualquer imóvel)? Não é razoável passar-se de proprietária a arrendatária, suportando uma renda mensal de €1.000.
*
Relativamente aos pontos 14 e 17, os mesmos constam da matéria provada nos seguintes termos:

14. A insolvente apresentou os seguintes passivos: ano de 2014, 487.724,80 euros,
ano de 2015, 853.695,28 euros, ano de 2016, 969.849,20 euros, ano de 2017, 988.733,25
euros, ano de 2018, 997.312,79 e ano de 2019, 1.168.455,16 euros;

17. Na data de 28 de maio de 2024, o prédio urbano descrito na Conservatória de Registo Predial de Marco de Canaveses sob o número ... foi avaliado no valor de 80.600 euros.

Apreciando.
Os recorrentes não indicam o motivo da pretendida alteração da prova.

Na motivação à decisão de facto tomada na sentença é dito que: “Os factos provados em 13 e 14 resultaram do teor das Declarações de IES da Insolvente juntas pelos Requeridos em 01.04.2025. O facto provado em 17 resultou do teor do Relatório de Avaliação junto em 07.05.2024 pelos Requeridos, à falta de qualquer outra prova que infirmasse a fundamentação e conclusões de tal Relatório.

Não vemos qualquer motivo para alterar a prova de tais factos, tanto mais que resultou de prova documental indicada na motivação à decisão de facto, sendo que o relatório de avaliação é de 2025 e não de 2024 como, por lapso, foi dito.
A parte relativa ao ano será alterada.
*
Dizem os recorrentes que quanto aos factos não provados e que se considera ter sido matéria provada, é a constante das letras A) a E).

a) Que os fornecedores e os clientes da Insolvente soubessem, quanto contactavam com o requerido BB, que este já não era gerente da Insolvente desde novembro de 2019.
b) Que a Insolvente tivesse recebido, efetivamente, a contrapartida correspondente à transmissão de propriedade do veículo com a matrícula ..-TE-.., de marca Mercedes Benz, ....
c) Que o valor da venda dos prédios rústicos transmitidos na escritura de escritura de Compra E Venda, celebrada em 26.03.2020, correspondesse ao seu valor de mercado.
d) Que o valor da venda do prédio urbano transmitido na escritura de escritura de Compra E Venda, celebrada em 09.12.2020, correspondesse ao seu valor de mercado.
e) Que o valor das vendas a que se referem as faturas emitidas em 30.12.2022 e em 30.10.2023, correspondesse aos respetivos valores de mercado dos bens transmitidos.

Dizem ainda os recorrentes que “quanto aos pontos f) e g) dos factos provados e a venda não se deu para descapitalizar a sociedade, mas antes para fazer face às despesas. A viatura Mercedes Benz em causa sofreu um acidente, sendo que a sua reparação ascendia a € 5.823,12 (cinco mil oitocentos e vinte e três euros e doze cêntimos) – ora, para além da insolvente não necessitar de tal veículo, também não estava em situação económica que lhe permitisse despender de dinheiro para a sua reparação. Por assim ser, procedeu à sua venda, tendo sido o veículo vendido por preço superior ao de mercado atendendo aos danos que tinha e às reparações que necessitava. Quanto ao valor, foi efectivamente pago, conforme se afere do depoimento de BB – montante que pagou em dinheiro – ponto b) dos factos não provados, que deve ser dado como provado.”
Continuam os recorrentes, dizendo que “o ponto f) os factos não provados deverá passar a constar dos factos provados, uma vez que ficou provado que a insolvente procedeu às vendas para assegurar os pagamentos e canalizou o dinheiro proveniente das vendas para essa mesma finalidade. Mais, deve passar a constar dos factos provados o ponto g) dos factos não provados, uma vez que provado também ficou que não só as vendas de 2020, mas também as de 2022, se destinaram a fazer face aos pagamentos a funcionárias e fornecedores. No que concerne ao ponto 8 dos factos provados, foi requerida pela recorrente AA uma avaliação ao imóvel onde laborava a sociedade – o pavilhão – o que fez junto de um conhecido, que seria vendedor da imobiliária E.... Devendo ser considerado como provado o ponto d) dos factos não provados. No que respeita ao ponto k), os prédios estavam num estado de degradação elevado e ainda onerados com outro contrato de comodato – o que implicava que o prédio teria um inquilino. Esses mesmos prédios estão em condições degradadas, não passam linhas de água, não é possível construir – vários projetos foram inclusive negados pelas autoridades camarárias. E a própria contabilista – a testemunha LLLL – dá conta que a empresa conseguiu distribuir dividendos devido a lucros transitados de outros anos, ou seja, a sociedade não estava insolvente até ao incêndio no PT.
Por último, alegam que não corresponde à verdade que os factos f), g) e h) sejam não provados. Os documentos são o que prova disso.

f) Que os preços das vendas a que se referem as escrituras de Compra E Venda, celebradas em 26.03.2020 e em 09.12.2020 tenham sido utilizados pela Devedora para pagamento de salários e de fornecedores.
g) Que o valor das vendas a que se referem as faturas emitidas em 30.12.2022 e em 30.10.2023 tenha sido utilizado no pagamento de salários e de fornecedores.
h) No ano de 2020, a Insolvente tinha custos fixos com trabalhadores, fornecedores, bancos, Autoridade Tributária e segurança Social, no valor mensal de 80 000 euros.
Vejamos que os encargos e pagamentos a funcionários, fornecedores, AT e Segurança Social estão bem documentados – nomeadamente através dos extractos bancários.
No que respeita ao ponto i) dos factos não provados, tal contrato sequer foi impugnado, pelo que nos questionamos o porquê de ser invocado.”
“Quanto à venda das máquinas – factos O e P provados -, as mesmas foram vendidas por estarem paradas e por uma necessidade de fazer face a despesas. As máquinas adquiridas foram adquiridas em função de uma promessa de trabalho que acabou por não ocorrer – consequência do covid – altura em que a sociedade insolvente esteve dois meses sem laborar, tendo-se agravado de forma significativa a situação económico-financeira da insolvente. Decidiu-se, então, pela venda das máquinas inutilizadas como uma forma de recuperar algum dinheiro. Quanto ao valor pelo qual foram vendidas as mesmas máquinas, foi realizado um estudo de mercado e o valor a que se chegou foi de acordo com o seu desgaste – o que o recorrente BB explicou e se transcreveu.”

Apreciando

As alíneas a) a e) correspondem à negação dos factos apurados supra. Não alterando os primeiros, não poderá mexer-se nos segundos. Quanto ao valor das máquinas, não obstante a referência efectuada pelo recorrente BB no que toca ao valor das mesmas, não está junto nenhum estudo de mercado, ou qualquer documento relativo ao valor de máquinas semelhantes para que o tribunal pudesse formar uma convicção mais segura relativamente a essa matéria.

Não foi produzida qualquer prova de que a viatura referida nos autos tivesse tido um acidente, qual o valor da reparação. Também não se fez prova de que o recorrente BB tivesse pago qualquer quantia em dinheiro. Tratando-se de empresários, impunha-se-lhes que soubessem que, eventualmente, no futuro, fosse escrutinada a sua conduta financeira, pelo que impunha a jurisprudência das cautelas que todas as transações ficassem documentadas.
Porém, mesmo dando como certa a entrega de tal montante, para onde foi o mesmo canalizado? Onde está o caminho do dinheiro que demonstra ao tribunal que entrou nas contas da sociedade e foi usado para os fins desta? Não existe.
O mesmo acontece com os valores respeitantes às vendas dos imóveis e outros móveis referidos supra.
Não obstante a contabilista LLLL afirmar que a empresa só entra em insolvência em 2023 quando ardeu um PT e ficaram sem luz para poder trabalhar, olhando para os documentos podemos afirmar que a insolvência “rondava” a sociedade desde, pelo menos 2020 – basta atender ao valor do passivo e ao lucro.
Entendemos que assiste razão aos recorrentes no que toca à alínea i) dos factos não provados. Na verdade, está junto aos autos um documento designado como comodato e que não foi posto em causa. Coisa diferente é atribuir-lhe o valor dado pelos recorrentes.
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Concluindo, são os seguintes os factos provados e não provados (encontrando-se a negrito os que foram alterados por este tribunal).

FACTOS PROVADOS
A) A Requerida “A..., Lda.” foi declarada insolvente por sentença proferida nos autos principais, em 27.12.2023, em ação apresentada a Juízo em 22.12.2023.
B) A Requerida foi constituída em 04.03.2004, com o objeto social de fabricação de peúgas; com sede social na Rua ..., freguesia ... e ..., concelho de Marco de Canavezes; com o capital social de 5.000,00 euros, ulteriormente aumentado para 30.000 euros, dividido em duas quotas de valor nominal inicial de 15.000 euros, cada uma, pertencentes aos sócios BB e AA, obrigando-se a sociedade com a assinatura de um gerente, tendo sido nomeados gerentes ambos os sócios, tendo o gerente BB renunciado à gerência em 22.11.2019.
C) A requerida “A..., Lda.” publicou na respetiva Conservatória de Registo Comercial as suas contas referentes aos exercícios dos anos de 2006 até ao ano de 2022 (inclusive).
D) No apenso de reclamação de créditos foram reconhecidos créditos, no montante global de 1 329 411,47 (um milhão, trezentos e vinte e nove mil, quatrocentos e onze euros, quarenta e sete cêntimos).
E) Não foram reclamados créditos pela Autoridade Tributária nem pelo Instituto de Segurança Social.
F) A propriedade do veículo com matrícula ..-TE-.., de marca Mercedes Benz encontra-se registada a favor de CC desde 31.10.2023, e antes a favor de “A..., Lda.”, desde 22.12.2020.
G) Com data de 30.12.2022, com vencimento em 28.02.2023, a “A..., Lda.” emitiu uma fatura em nome de BB, referente à venda do veículo com matrícula ..-TE-.., de marca Mercedes Benz, ..., no valor de 9 104,17 euros.
H) CC, nascido em 17.08.2001, é filho dos Requeridos BB e AA.
I) DD, nascido em 19.10.2010, é filho dos Requeridos BB e AA.
J) EE, nascido em 27.12.1995, é filho dos Requeridos BB e AA.
K) Por escritura de Compra E Venda, celebrada em 26.03.2020, a Insolvente representada pelos seus únicos sócios e ela também gerente, BB e AA, vendeu à sociedade “C... – Sociedade Unipessoal, Lda.”, representada pelo seu único sócio e gerente BB, pelo preço global de 16 500 euros, os seguintes prédios:
urbano composto de uma parcela de terreno para construção, lote n.º ..., sito no Lugar ..., descrito na Conservatória de Registo Predial de Marco de Canaveses sob o número ... e inscrito na respetiva matriz predial urbana sob o artigo ... da freguesia ... e ..., com o valor patrimonial de 62 540,00 euros e atribuído de 15 000,00 euros;
Rústico denominado ..., sito no Lugar ..., descrito na Conservatória de Registo Predial de Marco de Canaveses sob o número ... e inscrito na respetiva matriz predial urbana sob o artigo ... da freguesia ... e ..., com o valor patrimonial de 15,81 euros e atribuído de 500,0 euros;
Rústico denominado monte do tapado sito no Lugar ..., descrito na Conservatória de Registo Predial de Marco de Canaveses sob o número ... e inscrito na respetiva matriz predial urbana sob o artigo ... da freguesia ..., com o valor patrimonial de 49,88 euros e atribuído de 500 euros;
Rústico denominado monte canhoto sito no Lugar ..., descrito na Conservatória de Registo Predial de Marco de Canaveses sob o número ... inscrito na respetiva matriz predial urbana sob o artigo ... da freguesia ..., com o valor patrimonial de 51,88 euros e atribuído de 500 euros.
L) Por escritura de Compra E Venda, celebrada em 09.12.2020, a Insolvente representada pelos seus únicos sócios e ela também gerente, BB e AA, vendeu à sociedade “D..., Lda.”, representada pelo seu único sócio e gerente BB, pelo preço de 61.302,00 euros, o prédio urbano composto de edifício de um pavimento destinado a industria e logradouro, lote n.º ..., sito no Lugar ..., descrito na Conservatória de Registo Predial de Marco de Canaveses sob o número ... e inscrito na respetiva matriz predial urbana sob o artigo ... da freguesia ... e ..., com o valor patrimonial de 61.302,00 euros, tendo o preço sido pago com a entrega de três cheques, números ..., ... e ..., sacados sobre a Banco 1....
M) A sociedade “C... – Sociedade Unipessoal, Lda.” foi constituída em 03.12.2019, com o objeto social de atividades de compra e venda de bens imobiliários, nomeadamente, edifícios residenciais e não residenciais e de terrenos; atividades de subdivisão de terrenos em lotes sem introdução de melhoramentos; atividades de arrendamento e exploração de bens imobiliários (próprios ou arrendados), nomeadamente, edifícios residenciais e não residenciais (inclui espaços e instalações industriais, comerciais, etc.) e de terrenos; fabricação de meias, peúgas, collants para homem, mulher e criança; com sede social na Rua ..., ..., freguesia ... e ..., concelho de Marco de Canavezes; com o capital social de 5 000,00 euros, numa quota única pertencente ao sócio BB, obrigando-se a sociedade com a assinatura de um gerente, tendo sido nomeado gerentes o sócio BB.
N) Por deliberação de 04.04.2022, a sociedade “C... – Sociedade Unipessoal, Lda.” alterou a sua firma para “D..., Lda.”, passando o seu capital social a estar dividido em quatro quotas, uma de valor nominal de 500 euros, pertencente ao sócio BB, e três de valor nominal de 1 500 euros, cada uma, pertencentes respetivamente, aos sócios CC, DD e EE.
O) Com data de 30.12.2022, com vencimento em 28.02.2023, a “A..., Lda.” emitiu uma fatura em nome de “D..., Lda.”, referente à venda dos seguintes bens: Conjunto Formas, Máquina BROTHER CB3, Cilindro MAQ. BILLI MAGIC, Mesa e vestiário 8 cacifos, Maq. AUTOM Para aplicação de ganchos EM J TECMA, Maquinas de Peúgas BILLI MAGIC, Maquina de Ramalhar CONTI COMPLET, Maquina de Enformar ME M1 E DA PRIPRECISÃO, Pré-virador PR250, Impressora TSC- 268-M, reformulação do Sistema de Aspiração dos Teares, Compressor de Parafuso BSD 75 T SFC, no valor global de 17.859,60 euros.
P) Com data de 30.10.2023, com vencimento em 29.12.2023, a “A..., Lda.” emitiu uma fatura em nome de “D..., Lda.”, referente à venda dos seguintes bens: Contentor 40 HC SOC, Duas caixas metálicas Tipo contentor de 12 metros HC, Máquina Envolvedora Paletes ATLANTA SINTHESI 1 500, no valor global de 4.981,50 euros
1. Da declaração de IES da Requerida referente ao exercício de 2020 constam os seguintes saldos: vendas e serviços prestados, 1.105.931,08 euros, Subsídios à exploração, 60.760,15 euros, custo de mercadorias vendidas e das matérias consumidas, 615.800,75 euros, fornecimentos de serviços externos 163.629,04 euros, gastos com o pessoal 328.780,90 euros, Outros rendimentos e ganhos, 51.866,83 euros, Outros gastos e perdas, 41.127,02 euros, resultado liquido do período 1.587,52 euros, ativos fixos tangíveis 303.659,17 euros, Inventários 370.530,69 euros, clientes 604.455,84 euros, acionistas/sócios, 82.000,00 euros, caixa e depósitos bancários 22.143,21 euros, capital realizado 30.000 euros, resultados transitados 136.238,56 euros, capital próprio 200.696,26 euros, fornecedores 374.020,63 euros, financiamentos obtidos 737.164,18 euros, total do passivo 1.221.926,18 euros.
2. Da declaração de IES da Requerida referente ao exercício de 2021 constam os seguintes saldos: vendas e serviços prestados, 1.397.303,86 euros, Subsídios à exploração, 2.450,50 euros, custo de mercadorias vendidas e das matérias consumidas, 967.614,18 euros, fornecimentos de serviços externos 176.257,16 euros, gastos com o pessoal 345.169,18 euros, Outros rendimentos e ganhos, 350,66 euros, Outros gastos e perdas, 14.135,85 euros, resultado liquido do período -166.956,32 euros, ativos fixos tangíveis 251.962,18 euros, Inventários 228.600,48 euros, clientes 350.307,24 euros, acionistas/sócios, 59.824,00 euros, caixa e depósitos bancários 211.821,46 euros, capital realizado 30.000 euros, resultados transitados 107.026,08 euros, capital próprio 2.939,94 euros, fornecedores 308.598,69 euros, financiamentos obtidos 754.292,92 euros, total do passivo 1.160.859,78 euros.
3. Da declaração de IES da Requerida referente ao exercício de 2022 constam os seguintes saldos: vendas e serviços prestados, 1.378.163,33 euros, Subsídios à exploração, 3 584 euros, custo de mercadorias vendidas e das matérias consumidas, 750.875,50 euros, fornecimentos de serviços externos 165.266,02 euros, gastos com o pessoal 356.053,90 euros, Outros rendimentos e ganhos, 17.211,16 euros, Outros gastos e perdas, 39.294,08 euros, resultado liquido do período 23.043,45 euros, ativos fixos tangíveis, 245.000,50 euros, Inventários, 320.203,90 euros, clientes, 374.737,44 euros, acionistas/sócios, 35.632,00 euros, caixa e depósitos bancários, 76.358,86 euros, capital realizado, 30.000 euros, resultados transitados, -93.530,24 euros, capital próprio -7.616,61 euros, fornecedores 371.956,33 euros, financiamentos obtidos 627.950,34 euros, total do passivo 1.088.830,69 euros.
4. Da declaração de IES da Requerida referente ao exercício de 2023 constam os seguintes saldos: vendas e serviços prestados, 869.311,45 euros, Subsídios à exploração, 63.940,56 euros, custo de mercadorias vendidas e das matérias consumidas, 855.334,72 euros, fornecimentos de serviços externos 174.542,56 euros, gastos com o pessoal 335.463,92 euros, Outros rendimentos e ganhos, 32.609,41 euros, Outros gastos e perdas, 167.660,66 euros, resultado liquido do período -617.305,92 euros, ativos fixos tangíveis 103.667,68 euros, Inventários 29.053,19 euros, clientes 47.934,80 euros, acionistas/sócios, 5.632,00 euros, caixa e depósitos bancários 14.721,16 euros, capital realizado 30.000 euros, resultados transitados -70.486,79 euros, capital próprio -624.922,53 euros, financiamentos obtidos 331.407,47 euros, total do passivo 846.236,59 euros.
5. No período compreendido entre 03/12/2019 a 30/09/2024, a sociedade “D..., Lda.” teve os seguintes trabalhadores ao seu serviço: FF, desde 01-04-2022 até 30-04-2023, CC desde 02-09-2020 até 31-01-2021, e BB desde 03-12-2019.
6. No período compreendido entre 01/01/2021 a 31/12/2023, a sociedade Insolvente teve os seguintes trabalhadores ao seu serviço: GG, desde 2016- 02-01 até 2023-12-27, HH, desde 2016-02-01 até 2021-09-01, II, desde 2015-05-25 até 2023-12-27, JJ, desde 2014-11-20 até 2023-12-27, EE, desde 2014- 03-20 até 2023-12-27, KK, desde 2013-12-09 até 2021-06-13, LL, desde 2013-04-11 até 2023-12-27, MM, desde 2013-02-20 até 2023-12-27, NN, desde 2013-01-21 até 2023-12-27, OO, desde 2013-01-08 até 2023- 12-27, PP, desde 2020-09-15 até 2022-08-31, QQ, desde 2020-07-20 até 2023-12-27, RR, desde 2019-06-03 até 2023-01-01, SS, desde 2019-01-16 até 2023-12-27, TT, desde 2018-04-03 até 2023-01-01, UU, desde 2018-04-03 até 2022-09-16, VV, desde 2017-09-04 até 2023-07-18, WW, desde 2017-01-26 até 2021-09-19, XX, desde 2016-06-07 até 2022-10-24, YY, desde 2016-06-01 até 2021-03-02, ZZ, desde 2021- 05-11 até 2023-12-27, AAA, desde 2021-04-07 até 2021-09-01, BBB, desde 2021-03-08 até 2021-12-10, CC desde 2021-02-11 até 2023-12-27, CCC, desde 2020-12-21 até 2023-12-27, DDD, desde 2020-12-07 até 2023-12-27, EEE, desde 2020-12-07 até 2021-02-18, FFF, desde 2020-12-07 até 2021-02-12, GGG, desde 2020-10-07 até 2023-12-27, HHH, desde 2020-10-07 até 2023-12-27, III, desde 2022-06-24 até 2023-02-10, JJJ, desde 2022-06-24 até 2022-08-12, KKK, desde 2022-06-08 até 2023-08-31, LLL, desde 2022-05-02 até 2023-12-27, MMM, desde 2022-05-02 até 2023-07-01, NNN, desde 2022-03- 01 até 2023-02-12, OOO, desde 2022-03-01 até 2022-04-30, PPP, desde 2021-11-09 até 2022-05-01, QQQ, desde 2021-10-07 até 2023-01-31, RRR, desde 2021-10-07 até 2022-09-07, SSS, desde 2023-11-07 até 2023-12-27, TT, desde 2023-10-03 até 2023-12-27, TTT, desde 2023-09-27 até 2023-12-27, UUU, desde 2023- 09-27 até 2023-12-27, UU, desde 2023-09-12 até 2023-12-27, VVV, desde 2022-12-12 até 2023-12-27, WWW, desde 2022-11-08 até 2023-12-27, XXX, desde 2022-11-08 até 2023-12-27, YYY, desde 2022-10-11 até 2023-12-27, ZZZ, desde 2012-05-03 até 2022-02-28, AAAA, desde 2011-03-15 até 2023-12-27, BBBB, desde 2009-09-01 até 2023-12- 27, CCCC, desde 2009-06-15 até 2023-12-27, DDDD, desde 2008-10-17 até 2022-11-14, EEEE, desde 2008-01-21 até 2022-07-11, FFFF, desde 2007-11-19 até 2023-12-27, GGGG, desde 2007-11-15 até 2022-03-15, HHHH, desde 2004-05-12 até 2023-12-27, e BB, desde 2004-02-09.
7. O requerido BB continuou a contactar com os fornecedores e com os clientes da Insolvente, após a sua renúncia à gerência.
8. Aquando da transmissão do prédio urbano composto de edifício de um pavimento destinado a indústria e logradouro, descrito na Conservatória de Registo Predial de Marco de Canaveses sob o número ..., para a sociedade “D..., Lda.”, os Requeridos não solicitaram a uma entidade independente qualquer avaliação prévia para aferirem do valor de mercado do imóvel.
9. A sociedade “D..., Lda.” não solicitou qualquer financiamento para a aquisição do prédio urbano descrito na Conservatória de Registo Predial de Marco de Canaveses sob o número ....
10. A sociedade “D..., Lda.” arrendou à Insolvente o prédio urbano descrito na Conservatória de Registo Predial de Marco de Canaveses sob o número ..., mediante o pagamento de uma renda mensal no valor de 1 000 euros.
11. Depois da transmissão para a “D..., Lda.” do prédio urbano descrito na Conservatória de Registo Predial de Marco de Canaveses sob o número ..., foi pago pela Insolvente ao Banco, o empréstimo referente à hipoteca que onerava tal prédio, o que permitiu o distrate de tal hipoteca.
12. A insolvente recebeu no âmbito da Linha de Apoio COVID, as seguintes quantias: em 22.05.2020, a quantia de 250.000 euros, em 23.11.2020, a quantia de 69 580 euros, em 17.06.2021, a quantia de 54.670 euros, e em 06.04.2021, a quantia de 140 000 euros.
13. A insolvente apresentou os seguintes resultados líquidos do período: ano de 2014, 30.328,79 euros, ano de 2015, 15.913,63 euros, ano de 2016, 16.810,78 euros, ano de 2017, 13.492,03 euros, ano de 2018, 7.070,36 euros e ano de 2019, 4.074,58 euros.
14. A insolvente apresentou os seguintes passivos: ano de 2014, 487.724,80 euros, ano de 2015, 853.695,28 euros, ano de 2016, 969.849,20 euros, ano de 2017, 988.733,25 euros, ano de 2018, 997.312,79 e ano de 2019, 1.168.455,16 euros;
15. Em assembleia geral extraordinária realizada em 10.03.2021, os Requeridos deliberaram a distribuição intercalar de lucros, através da utilização dos resultados transitados, com o recebimento por cada um dos sócios BB e AA, do montante de 15.400 euros, sendo os valores a pagar até dezembro de 2021.
16. Em assembleia geral extraordinária realizada em 10.03.2022, os Requeridos deliberaram a distribuição intercalar de lucros, através da utilização dos resultados transitados, com o recebimento por cada um dos sócios BB e AA, do montante de 16.800 euros, sendo os valores a pagar até dezembro de 2022.
17. Na data de 28 de maio de 2025, o prédio urbano descrito na Conservatória de Registo Predial de Marco de Canaveses sob o número ... foi avaliado no valor de 80.600 euros.
18. Da declaração de IES da “D..., Lda.”, referente ao exercício de 2019 constam os seguintes saldos: vendas e serviços prestados, 0,00, custo de mercadorias vendidas e das matérias consumidas, 0,00 euros, fornecimentos de serviços externos 267,32 euros, gastos com o pessoal 894,05 euros, resultado liquido do período -2.428,32 euros, ativos fixos tangíveis 69.914,99 euros, Inventários 0,00 euros, caixa e depósitos bancários 5.000 euros, capital realizado 5.000 euros, capital próprio 2.571,68 euros, passivo corrente:financiamentos obtidos, 0,00, fornecedores 87.852,75 euros, total do passivo 89.058,36 euros.
19. Da declaração de IES da “D..., Lda.”, referente ao exercício de 2020 constam os seguintes saldos: vendas e serviços prestados, 186 201,90 euros, custo de mercadorias vendidas e das matérias consumidas, 133.194,23 euros, fornecimentos de serviços externos 8.764,45 euros, gastos com o pessoal 15 017,94 euros, resultado líquido do período 2.815,31 euros, ativos fixos tangíveis 149.062,81 euros, clientes 39 151,39 euros, caixa e depósitos bancários 8.556,12 euros, capital realizado 5.000 euros, resultados transitados -2.428,32 euros, capital próprio 5.386,99 euros, passivo corrente: financiamentos obtidos, 0,00, fornecedores 204.414,87 euros, total do passivo 207.810,17 euros.
20. Da declaração de IES da “D..., Lda.”, referente ao exercício de 2021 constam os seguintes saldos: vendas e serviços prestados, 437.119,73 euros, custo de mercadorias vendidas e das matérias consumidas, 360.713,93 euros, fornecimentos de serviços externos 3.802,53 euros, gastos com o pessoal 8.462,10 euros, resultado líquido do período 30.736,69 euros, ativos fixos tangíveis 134.797,29 euros, Inventários 132.767 euros, caixa e depósitos bancários 44.131,74 euros, capital realizado 5 000 euros, resultados transitados 246,22 euros, capital próprio 36.123,68 euros, passivo corrente: financiamentos obtidos, 0,00, fornecedores 285.402,63 euros, total do passivo 301.062,98 euros.
21. No processo de insolvência foram apreendidos bens móveis (máquinas e equipamentos) cujo produto da Liquidação ascendeu ao montante global de 8.600 euros.
22. Está junto aos autos um documento denominado “contrato de comodato”, no qual BB e esposa AA, na qualidade de únicos sócios e gerentes em representação da, sociedade comercial por quotas "A..., LDA", e IIII e JJJJ, no qual os primeiros declaram ceder aos segundos outorgantes a título gratuito e sem qualquer compensação com carácter pecuniário ou outro, um espaço aberto pelo lado posterior cave ao nível do solo que vai fazer parte do imóvel que a primeira outorgante vai edificai na parcela, com a área de 400 m2 que poderá usar pelo prazo de quinze anos, que também declararam aceitar.

B) FACTOS NÃO PROVADOS:
a) Que os fornecedores e os clientes da Insolvente soubessem, quanto contactavam com o requerido BB, que este já não era gerente da Insolvente desde novembro de 2019.
b) Que a Insolvente tivesse recebido, efetivamente, a contrapartida correspondente à transmissão de propriedade do veículo com a matrícula ..-TE-.., de marca Mercedes Benz, ....
c) Que o valor da venda dos prédios rústicos transmitidos na escritura de escritura de Compra E Venda, celebrada em 26.03.2020, correspondesse ao seu valor de mercado.
d) Que o valor da venda do prédio urbano transmitido na escritura de escritura de Compra E Venda, celebrada em 09.12.2020, correspondesse ao seu valor de mercado.
e) Que o valor das vendas a que se referem as faturas emitidas em 30.12.2022 e em 30.10.2023, correspondesse aos respetivos valores de mercado dos bens transmitidos.
f) Que os preços das vendas a que se referem as escrituras de Compra E Venda, celebradas em 26.03.2020 e em 09.12.2020 tenham sido utilizados pela Devedora para pagamento de salários e de fornecedores.
g) Que o valor das vendas a que se referem as faturas emitidas em 30.12.2022 e em 30.10.2023 tenha sido utilizado no pagamento de salários e de fornecedores.
h) No ano de 2020, a Insolvente tinha custos fixos com trabalhadores, fornecedores, bancos, Autoridade Tributária e segurança Social, no valor mensal de 80.000 euros.

B. O DIREITO
Não obstante este tribunal de recurso ter conhecido todas as questões levantadas pelos recorrentes no que toca à impugnação da matéria de facto, o certo é que, todos os actos praticados pelos representantes da insolvente em data que não se encaixe nos três anos anteriores ao início do processo de insolvência acabam por ser irrelevante para efeitos de qualificação da insolvente.
O reconhecimento desta circunstância foi efectuado na sentença que “o Tribunal não poderá atender às vendas celebradas em 26.03.2020 e em 09.12.2020 (factos provados em K e L), onde a Insolvente declarou vender os seus imóveis à sociedade “D..., Lda.”, anteriormente denominada “C... – Sociedade Unipessoal, Lda.”, por tais atos estarem fora do período de 3 anos anteriores ao inicio do processo de insolvência.”
Deste modo, há que valorar as transmissões de propriedade para o Requerido BB e para o filho dos dois Requeridos, CC, referente à transmissão do veículo com matrícula ..-TE-.., de marca Mercedes Benz, ..., ocorrida em 30.12.2022, de acordo com a fatura emitida pela Devedora, e registada em 31.10.2023, a favor do filho do casal, e as transmissões de propriedade ocorridas 30.12.2022 e 29.12.2023, de dois conjuntos de bens móveis (equipamentos), no valor global atribuído de 31 945,27 euros, para a sociedade “D..., Lda.”, especialmente relacionada, por o capital social pertencer ao requerido BB e aos filhos de ambos os Requeridos, sócios da Devedora, (factos provados em B, M, e F, G, H, I, J, O e P).
Como resulta dos factos não provados não se apurou que a Insolvente tivesse recebido, efetivamente, a contrapartida correspondente à transmissão de propriedade do veículo com a matrícula ..-TE-.., de marca Mercedes Benz, .... – cfr. ponto b; que o valor das vendas a que se referem as faturas emitidas em 30.12.2022 e em 30.10.2023, correspondesse aos respetivos valores de mercado dos bens transmitidos – cfr. al. e) e que o valor das vendas a que se referem as faturas emitidas em 30.12.2022 e em 30.10.2023 tenha sido utilizado no pagamento de salários e de fornecedores – cfr. alínea f).
Além destes factos, há que considerar que no processo de insolvência foram apreendidos bens móveis (máquinas e equipamentos) cujo produto da Liquidação ascendeu ao montante global de 8.600 euros e a declaração de IES da Requerida referente ao exercício de 2023 constam os seguintes saldos: vendas e serviços prestados, 869.311,45 euros, Subsídios à exploração, 63.940,56 euros, custo de mercadorias vendidas e das matérias consumidas, 855.334,72 euros, fornecimentos de serviços externos 174.542,56 euros, gastos com o pessoal 335.463,92 euros, Outros rendimentos e ganhos, 32.609,41 euros, Outros gastos e perdas, 167.660,66 euros, resultado liquido do período -617.305,92 euros, ativos fixos tangíveis 103.667,68 euros, Inventários 29.053,19 euros, clientes 47.934,80 euros, acionistas/sócios, 5.632,00 euros, caixa e depósitos bancários 14 721,16 euros, capital realizado 30.000 euros, resultados transitados -70.486,79 euros, capital próprio -624.922,53 euros, financiamentos obtidos 331.407,47 euros, total do passivo 846.236,59 euros.
Vejamos.
O processo de insolvência baseia-se na impossibilidade de o devedor saldar todas as suas dívidas e, portanto, orienta-se por um princípio de distribuição de perdas entre os credores. Mas para que possa iniciar-se a liquidação total do património do devedor é absolutamente indispensável que o tribunal emita uma sentença que o declare em estado de insolvência. Quer dizer: a sentença é o único título executivo susceptível de servir de base á execução universal e colectiva em que a insolvência se resolve. Proferida essa sentença, o sacrifício de todos os bens do insolvente que se segue, mais não é que a sua execução.
No entanto, para que seja proferida a sentença de declaração de insolvência, exige a lei que o devedor se encontre em estado de insolvência. Portanto, o primeiro problema que aquela sentença deve resolver é se se verificam as condições e circunstâncias, que, no pensamento da lei, justificam a declaração daquela situação de insolvência.
A impossibilidade de o devedor solver os seus compromissos que caracteriza o estado de insolvência, pode, porém, ser meramente casual, ou fortuita e culposa, lato sensu (artº 185 do CIRE).
A insolvência é culposa quando esse estado tiver criado ou agravado em consequência da actuação, dolosa ou com culpa grave, do devedor, ou dos seus administradores, de direito ou de facto, nos três anos anteriores ao início do processo de insolvência (artº 186 nº 1 do CIRE).
A qualificação da insolvência como culposa reclama, portanto, uma conduta ilícita e culposa do devedor ou dos seus administradores.
A ilicitude do comportamento do devedor ou dos seus administradores reparte-se por elementos objectivos e subjectivos.
O elemento objectivo afere a ilicitude da actuação do devedor ou dos administradores pela sua correspondência com o estado de insolvência do primeiro: a conduta é ilícita se dela resulta a criação ou agravamento da situação de insolvência. O elemento subjectivo valora a conduta pelo conhecimento e vontade do devedor ou dos seus administradores na criação ou agravamento da situação de insolvência, i.e., pelo dolo ou pela negligência daquele ou destes. Mas não releva uma qualquer negligência – mas apenas uma negligência grave ou grosseira, quer dizer, uma negligência de grau essencialmente aumentado ou intensificado, portanto, uma violação particularmente qualificada dos deveres de cuidado ou diligência presentes no caso. Cfr. Acórdão da Relação de Coimbra de 07.12.2012, tirado no processo 2273/10.1TBLRA-B.C1
Relembremos o texto do artigo 186º do CIRE.
1 - A insolvência é culposa quando a situação tiver sido criada ou agravada em consequência da actuação, dolosa ou com culpa grave, do devedor, ou dos seus administradores, de direito ou de facto, nos três anos anteriores ao início do processo de insolvência.
2 - Considera-se sempre culposa a insolvência do devedor que não seja uma pessoa singular quando os seus administradores, de direito ou de facto, tenham:
a) Destruído, danificado, inutilizado, ocultado, ou feito desaparecer, no todo ou em parte considerável, o património do devedor;
b) Criado ou agravado artificialmente passivos ou prejuízos, ou reduzido lucros, causando, nomeadamente, a celebração pelo devedor de negócios ruinosos em seu proveito ou no de pessoas com eles especialmente relacionadas;
c) Comprado mercadorias a crédito, revendendo-as ou entregando-as em pagamento por preço sensivelmente inferior ao corrente, antes de satisfeita a obrigação;
d) Disposto dos bens do devedor em proveito pessoal ou de terceiros;
e) Exercido, a coberto da personalidade colectiva da empresa, se for o caso, uma actividade em proveito pessoal ou de terceiros e em prejuízo da empresa;
f) Feito do crédito ou dos bens do devedor uso contrário ao interesse deste, em proveito pessoal ou de terceiros, designadamente para favorecer outra empresa na qual tenham interesse directo ou indirecto;
g) Prosseguido, no seu interesse pessoal ou de terceiro, uma exploração deficitária, não obstante saberem ou deverem saber que esta conduziria com grande probabilidade a uma situação de insolvência;
h) Incumprido em termos substanciais a obrigação de manter contabilidade organizada, mantido uma contabilidade fictícia ou uma dupla contabilidade ou praticado irregularidade com prejuízo relevante para a compreensão da situação patrimonial e financeira do devedor;
i) Incumprido, de forma reiterada, os seus deveres de apresentação e de colaboração previstos no artigo 83.º até à data da elaboração do parecer referido no n.º 6 do artigo 188.º
3 - Presume-se unicamente a existência de culpa grave quando os administradores, de direito ou de facto, do devedor que não seja uma pessoa singular tenham incumprido:
a) O dever de requerer a declaração de insolvência;
b) A obrigação de elaborar as contas anuais, no prazo legal, de submetê-las à devida fiscalização ou de as depositar na conservatória do registo comercial.
4 - O disposto nos n.os 2 e 3 é aplicável, com as necessárias adaptações, à actuação de pessoa singular insolvente e seus administradores, onde a isso não se opuser a diversidade das situações.
5 - Se a pessoa singular insolvente não estiver obrigada a apresentar-se à insolvência, esta não será considerada culposa em virtude da mera omissão ou retardamento na apresentação, ainda que determinante de um agravamento da situação económica do insolvente.
É praticamente uniforme na jurisprudência o entendimento de que este n.º 2 consagra presunções juris et de jure, pelo que a prova de alguma das situações ali contempladas determina, inexoravelmente, a qualificação da insolvência como culposa, dispensando a prova tanto do dolo ou da culpa grave do gerente ou administrador, como do nexo de causalidade entre a sua conduta e a criação ou o agravamento da situação de insolvência, e não admitindo prova em contrário, nos termos do disposto no artigo 350.º, n.º 2, parte final, do Código Civil (CC).
Alguma doutrina, com eco numa jurisprudência minoritária, suscita reservas quanto à qualificação das regras deste n.º 2 como verdadeiras presunções – que o artigo 349.º do CC define como «as ilações que a lei ou o julgador tira de um facto conhecido para firmar um facto desconhecido – e quanto à sua falta de autonomia relativamente ao n.º 1.
Neste sentido, Rui Pinto Duarte escreve o seguinte: «o n.º 1 do art. 186.º contém uma proposição que visa ligar certos efeitos (mediados pela qualificação da insolvência como culposa) ao facto de a insolvência ter sido criada ou agravada por actuação dolosa ou culposa do devedor ou dos seus administradores; o n.º 2 não tem, pelo menos, nalgumas das suas alíneas, por objecto ligar o estabelecimento desse facto a outros, como seria próprio de uma presunção, antes contém proposições substantivas especiais, que em parte são concretizações da proposição geral e em parte afastamentos dela; na medida em que não visam a aplicação do n.º 1, os enunciados do n.º 2 não são presunções da existência da hipótese de facto nele descrita; as regras do n.º 3, essas sim, admitindo a categoria das presunções legais (sobre cuja utilidade tenho dúvidas, por entender que as mesmas se reconduzem tendencialmente a regras sobre ónus de prova e ficções), podem ser qualificadas como presunções de a insolvência ter sido criada ou agravada por actuação dolosa ou culposa dos administradores do devedor» (Responsabilidade dos administradores: coordenação dos regimes do CSC e do CIRE, III Congresso de Direito da Insolvência, Cord. Catarina Serra, Coimbra 2015, p. 160, nota 22).
No mesmo sentido, escreve-se o seguinte no ac. TRP de 10.02.2011 (proc. n.º 1283/07.0TJPRT-AG.P1): «Neste contexto, e como se refere em douto acórdão do Tribunal Constitucional referido pelo recorrente – acórdão n.º 570/2008 – “… é duvidoso que na previsão do n.º 2 do artigo 186.º do CIRE se instituam verdadeiras presunções… o que o legislador faz corresponder à prova da ocorrência de determinados factos não é a ilação de que um outro facto (fenómeno ou acontecimento da realidade empírico-sensível) ocorreu, mas a valoração normativa da conduta que esses factos integram. Neste sentido, mais do que perante presunções inilidíveis, estaríamos perante a enunciação legal de situações típicas de insolvência culposa”.
Por isso que seja mais correcto afirmar-se em nosso entender, que nas situações a que se faz referência no artº 186º, nº2, do CIRE, mais do que uma presunção legal, se verifica o que Baptista Machado define – “Introdução ao Direito e ao Discurso Legitimador”, págs. 108 e 109 – como “ficções legais”, pois que, o que o legislador extrai a partir do facto base, não é um outro facto, mas antes uma conclusão jurídica, numa remissão implícita para a situação definida no nº 1 do artº 186º do CIRE. E por isso que, à semelhança das presunções juris et de jure não admita prova em contrário, sendo que dispensa a alegação – e consequentemente a prova – de qualquer outro facto, ficcionando desde logo, a partir da situação dada, a verificação da situação de insolvência dolosa».
Seja como for, estas diferentes qualificações da natureza das regras do n.º 2 não geram dissensos relevantes quanto ao seu efeito prático: a prova de uma das hipóteses previstas naquele n.º 2 conduz necessariamente à qualificação da insolvência como culposa e à afectação do seu autor por esta qualificação. Nos termos do n.º 3, do mesmo artigo 186.º do CIRE, presume-se a existência de culpa grave quando os administradores, de direito ou de facto, do devedor que não seja uma pessoa singular tenham incumprido alguma das obrigações descritas nas suas alíneas. É pacífico na jurisprudência e na doutrina que esta norma consagra verdadeiras presunções juris tantum da culpa grave a que alude o n.º 1 do mesmo artigo, que apenas serão afastadas se o visado lograr fazer prova do contrário, nos termos do disposto na primeira parte do n.º 2 do artigo 350.º do CC. Menos pacífica começou por ser a questão de saber se esta presunção abrange igualmente o nexo de causalidade, isto é, se esta norma dispensa igualmente a prova do nexo de causal entre a conduta do administrador (que se presume gravemente culposa) e a criação ou agravamento da situação de insolvência. Na jurisprudência sempre foi claramente maioritária a resposta negativa a esta questão. Neste sentido, escreveu-se o seguinte no ac. do TRC de 16.09.2014 (proc. n.º 1146/12.8TBCVL-B.C1): «A qualificação da insolvência como culposa pressupõe, (…) de acordo com a norma citada [referindo-se ao artigo 186.º, n.º 1, do CIRE]: que a situação de insolvência tenha sido criada ou agravada por determinada conduta ou actuação do devedor ou dos seus administradores; que tal actuação seja dolosa ou gravemente culposa e que esta actuação tenha ocorrido nos três anos anteriores ao início do processo de insolvência. Contudo, o nº 2 da norma citada enuncia um conjunto de situações, cuja verificação determina, por si só, a qualificação da insolvência como culposa, presumindo o legislador – sem admitir prova em contrário, como decorre da expressão “considera-se sempre” – que em tais situações a insolvência é sempre culposa, sem que seja necessária a efectiva constatação de que existiu dolo ou culpa grave do devedor e de que existiu um nexo causal entre a actuação (dolosa ou gravemente culposa) do devedor ou dos seus administradores e a criação ou agravamento da situação de insolvência. Situação diversa ocorre nas situações previstas no nº 3 da norma citada, onde apenas se presume a existência de culpa grave, sem dispensa, portanto, da demonstração do nexo causal entre o comportamento do devedor – que a lei presume como gravemente culposo – e a criação ou agravamento da situação de insolvência. Por outro lado, e ao contrário do que acontece nas situações a que alude o nº 2, a presunção de culpa estabelecida no nº 3 pode ser ilidida mediante prova em contrário (conclusão que se impõe em face do disposto no art. 350º, nº 2, do C.Civil e em face da circunstância de a lei o não proibir)». Cfr. Acórdão desta Relação, relatado pelo Sr. Desembargador Artur Dionísio Oliveira, Adjunto nestes autos, de 20.02.2024, tirado no processo 1872/22.3T8AMT-C.P1.
Descendo ao caso em apreço, haveria que determinar se a insolvência era culposa porque preenchia alguma das alíneas do número 2º do artigo 186º do CIRE.
Só no caso de tal não acontecer é que haverá que passar ao número 3 do mesmo artigo.
Analisando a matéria de facto, concordamos com o tribunal recorrido quando afirma que a situação fáctica supra descrita se enquadra nas alíneas a) e d) do número 2 do artigo 186º do CIRE.
Além da prova relativa à venda do veículo e às transmissões de propriedade ocorridas 30.12.2022 e 29.12.2023, de dois conjuntos de bens móveis (equipamentos), no valor global atribuído de 31 945,27 euros, para a sociedade “D..., Lda.”, especialmente relacionada, por o capital social pertencer ao requerido BB e aos filhos de ambos os Requeridos, sócios da Devedora, (factos provados em B, M, e F, G, H, I, J, O e P), sem que se tivesse provado que estas quantias tenham sido efectivamente recebidas pela insolvente, parece-nos que a leitura da declaração de IES de 2023 conjugada com o valor dos bens apreendidos, permite-nos concluir que a diferença entre os activos fixos tangíveis constantes da primeiro, no valor de 103 667,68 euros e o dos bens apreendidos - 8 600 euros – é de uma ordem de grandeza tão elevada que permite a subsunção dos factos às referidas alíneas do número 2 do artigo 186º do CIRE.
Parece-nos que pode, igualmente, enquadrar-se a situação na alínea g) do número 2: “Prosseguido, no seu interesse pessoal ou de terceiro, uma exploração deficitária, não obstante saberem ou deverem saber que esta conduziria com grande probabilidade a uma situação de insolvência;”
Da declaração de IES relativa ao ano 2021 resulta que a empresa teve prejuízo relevante, tem capital próprio positivo, mas muito reduzido, está altamente endividada, especialmente com financiamentos e fornecedores, mas possui algum nível de liquidez, mas insuficiente para cobrir o passivo total.
Está em insolvência? Pelos factos apurados resulta que não, mas está numa situação de fragilidade. Apesar do passivo elevado, a empresa tem activos circulantes razoáveis (caixa, clientes e inventários), totalizando cerca de €790.729. Isso mostra que a curto prazo, talvez ainda consiga cobrir parte das suas obrigações.
Já em 2022, tecnicamente, a empresa está em situação de "falência técnica" pois o capital próprio é negativo.
Com base na declaração de IES referente ao exercício de 2023, a empresa está em situação de insolvência - teve uma quebra significativa nas vendas (de €1,3M em 2022 para €869k em 2023). Os custos continuam altos. O resultado líquido foi altamente negativo, com prejuízo de mais de €617 mil — valor muito superior ao lucro do ano anterior. O passivo é mais de 4 vezes superior ao activo. Nos termos do artigo 3.º do CIRE, uma empresa está insolvente quando não consegue cumprir as suas obrigações vencidas. Desde 2021 a empresa estava a caminhar para a insolvência.
Podemos dizer que, tendo-se provado os factos base que integram alguma das alíneas do número 2 do artigo 186º do CIRE, existe uma presunção inilidível de culpa, tornando completamente despicienda a análise dos restantes fundamentos invocados na sentença, concluindo-se pelo carácter culposo da insolvência.
No que respeita à responsabilização do recorrente BB enquanto gerente de facto, a matéria apurada é clara, não permitindo outra solução.
Deste modo, sem necessidade de mais considerações, julga-se totalmente improcedente o recurso interposto, mantendo-se a sentença recorrida.

IV. DECISAO

Pelo exposto, acordam os juízes desta Secção Cível do Tribunal da Relação do Porto em negar provimento ao recurso, mantendo a sentença recorrida.
Custas pelos recorrentes.
DN

Porto, 28 de Outubro de 2025
(Elaborado e revisto pela relatora, revisto pelos signatários e com assinatura digital de todos)
Por expressa opção da relatora, não se segue o Acordo Ortográfico de 1990.
Raquel Correia de Lima
Artur Dionísio Oliveira
Rui Moreira