Acórdão do Tribunal da Relação do Porto
Processo:
696/23.5T8AMT-A.P1
Nº Convencional: JTRP000
Relator: ALBERTO TAVEIRA
Descritores: INSOLVÊNCIA
RECLAMAÇÃO DE CRÉDITOS
REMUNERAÇÃO DO ADMINISTRADOR JUDICIAL
Nº do Documento: RP20240116696/23.5T8AMT-A.P1
Data do Acordão: 01/16/2024
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: CONFIRMADA
Indicações Eventuais: 2ª SECÇÃO
Área Temática: .
Sumário: A remuneração e despesas de Administrador de Insolvência têm privilégio mobiliário especial quando haja directa relação entre a actividade e a entidade insolvente.
Reclamações:
Decisão Texto Integral: PROC. N.º[1] 696/23.5T8AMT-A.P1
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Tribunal Judicial da Comarca do Porto Este
Juízo de Comércio de Amarante - Juiz 4

RELAÇÃO N.º 96
Relator: Alberto Taveira
Adjuntos: Fernando Vilares Ferreira
Maria da Luz Seabra
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ACORDAM NO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DO PORTO
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I - RELATÓRIO.
AS PARTES
Insolvente: A... SA
Credor: B..., Unipessoal, Lda.
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Nestes[2] autos de reclamação de créditos Por apenso a processo de insolvência A... SA, veio a Sra. Administradora da Insolvência, em cumprimento do preceituado no artigo 129.º do CIRE, apresentar a lista dos credores reconhecidos e a correspondente lista de graduação.
Nenhuma delas foi impugnada no prazo legal.
Assim, em face da não impugnação da lista dos credores conhecidos, de harmonia com o estabelecido no artigo 130.º, n.º 3, do CIRE, homologa-se por sentença a lista de créditos reconhecidos apresentadas pela Sra. Administradora da Insolvência.
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DA/O DESPACHO/DECISÃO RECORRIDO
Foi proferida SENTENÇA, nos seguintes termos:
Pelo exposto, sabendo-se que as custas da insolvência e todas as demais que devam ser suportadas pela massa insolvente, bem como as despesas de liquidação, incluindo a remuneração da Administradora da Insolvência, saem precípuas de todo o produto da massa, deverá de seguida ser dado pagamento aos créditos laborais reclamados e reconhecidos que gozam de privilégio mobiliário geral - (uma vez que não se encontram apreendidos nos autos bens imóveis, não se justifica considerar o privilégio imobiliário especial de que também podem, em abstrato, beneficiar estes créditos, nos termos do artigo 333º do Código do Trabalho); em seguida, deverá ser dado pagamento aos créditos comuns e, por último, aos créditos subordinados.
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Nos termos do disposto no artigo 303.º do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas, a atividade processual relativa à verificação e graduação de créditos, quando as custas devam ficar a cargo da massa, como seria o caso, não é objeto de tributação autónoma. Assim, não há lugar a custas.
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Valor tributário correspondente ao valor do processo principal.”.
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DAS ALEGAÇÕES
O credor B..., Unipessoal, Lda., vem desta decisão interpor RECURSO, acabando por pedir o seguinte:
“(…) deve a sentença ora recorrida ser REVOGADA e substituída por outra que reconheça o crédito da Recorrente no montante global de 13.071,90€ (treze mil e setenta e um euros e noventa cêntimos), como PRIVILEGIADO com preferência sobre os demais, não só sobre os demais privilégios, como sobre as outras garantias, mesmo anteriores, que onerem os mesmos bens e valem contra os terceiros adquirentes, nos termos do disposto no artigo 738º do CC.
Nestes termos, não só pelo alegado, mas também pelo Alto Critério de V.ª Ex.ª., revogando a sentença recorrida, farão V.ª Ex.ª a desejada justiça!”.
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O ora recorrente apresenta as seguintes CONCLUSÕES:
A. O presente recurso tem por objeto a sentença proferida em 1.ª instância, na parte em que considerou que o crédito da Recorrente não goza de privilégio mobiliário especial e, consequentemente, deve ser graduado como crédito comum.
B. Previamente aos presentes autos de Insolvência, a sociedade C..., S.A., foi admitida a PER, no âmbito do qual foi nomeado Administrador de Insolvência o Sr. Dr. AA;
C. No âmbito do PER da sociedade C..., Lda. foi apresentado Plano de Recuperação da C..., Lda., tendo o mesmo sido aprovado pela maioria dos credores;
D. O referido Plano de Recuperação da C..., Lda. veio a ser homologado por Despacho proferido a 31/07/2020, decisão que transitou em julgado a 24/08/2020;
E. O Plano de Recuperação da C..., Lda. previa várias providencias, entre as quais a transmissão do estabelecimento da C..., Lda. para a sociedade A...,S.A., (…); com Manutenção dos 18 postos de trabalho afetos à C..., Lda., com a assinatura de novos contratos de trabalho entre os trabalhadores e a A..., S.A., mantendo os primeiros todos os direitos laborais constituídos à data, (…); Celebração de novos contratos de arrendamento dos imóveis onde labora a C..., Lda., cuja proprietária e locadora é a D..., S.A., com a cessionária do estabelecimento (A..., S.A.); Transmissão para a adquirente dos seguintes ativos da C..., Lda., avaliados no valor de 739.663,05 €, extraídos do balancete de fevereiro de 2020 (…); Transmissão para a adquirente de todo o passivo restruturado, (…); Preço da transmissão do estabelecimento: 1,00 €, atendendo que o passivo restruturado e obrigações da Devedora a transmitir para a cessionária, são superiores aos ativos e direitos da Devedora.
F. Nessa sequencia, a 28/12/2020 foi celebrado o Acordo de Transmissão de Estabelecimento, entre a C..., Lda. e a Insolvente A..., S.A.;
G. O Plano de Recuperação da C..., Lda. previa, uma vez que a Homologação daquele implicava o encerramento do PER, que a execução do Plano de Recuperação fosse fiscalizada pelo Administrador Judicial Provisório, sendo este remunerado pela fiscalização no valor de 2.000,00€/mês, valor ao qual acresce IVA;
H. Acresce ainda que, no âmbito do PER da C..., Lda. foi fixada a remuneração global do Administrador Judicial Provisório em 2.000,00 €, à qual acresce IVA à taxa legal em vigor, perfazendo o valor de 2.460,00 €;
I. Uma vez que não foram pagos os montantes devidos ao Administrador Judicial provisório nomeado naquele PER, a recorrente reclamou e viu reconhecido o crédito reclamado no valor total de 13.071,90€, respeitante à remuneração do administrador judicial provisório no PER, no valor de 2.460,00€, e remuneração pela fiscalização do Plano de Recuperação homologado no PER, no valor de 9.840,00€ e juros de mora no valor de 882,20€;
J. O Tribunal a quo, na sentença ora recorrida entendeu que o crédito da ora recorrente é um crédito comum e não privilegiado.
K. O credito da Recorrente corresponde à remuneração pelo trabalho que a Recorrente realizou, no exercício das suas funções de Administrador Judicial Provisório, no âmbito de um processo anterior (PER)(de uma outra sociedade), ao processo de Insolvência da sociedade ora Insolvente, no qual esta assumiu todo o passivo da Devedora,
L. o anterior processo terminou com a homologação de um plano de recuperação que previa, para alem da remuneração do administrador judicial provisório, também a remuneração pela fiscalização do Plano de Recuperação.
M. O Administrador Judicial Provisório, no exercício das suas funções, tem direito a ser remunerado, não só pelas suas funções como tal, mas também pelas funções de fiscalização de execução do Plano, cfr. n.º 1 do artigo 2º, 22º e 23º, n.º 1 da Lei 22/2013, de 26 de Fevereiro.
N. O crédito reclamado esta previsto, aprovado e devidamente homologado naquele PER.
O. O Recorrente, na qualidade de Administrador Judicial Provisório, e no cumprimento das suas funções, fiscalizou a execução do plano, a qual implicava a necessidade de conservar, executar/liquidar bens do devedor e, necessariamente foram realizadas no interesse dos credores, alias, as funções do Administrador têm precisamente essa natureza e objectivo.
P. O referido Plano previa a transmissão para o adquirente de todo o passivo, pelo que a Insolvente assumiu, integral e nomeadamente o crédito da Recorrente, nos exatos termos em que o mesmo era devido a esta naquele PER, vale dizer, como o privilégio que o mesmo gozava, como goza, uma vez que as remunerações dos Administradores Judiciais Provisórios são equiparados a custas processuais.
Q. Pelo que, humildemente, entendemos que, erradamente o Tribunal a quo entendeu que “(…) o dito crédito não resultou da necessidade de conservar, executar ou liquidar os bens do devedor nem as despesas que lhe são inerentes foram realizadas no interesse de todos os credores a quem é oposto o privilégio. (…),”
R. Igualmente, não tem qualquer fundamento a exigência do Tribunal a quo quando sustenta que não ficou demonstrada a atividade da Recorrente no outro processo (PER), que deu origem ao seu crédito reclamado e reconhecido (apesar de erradamente qualificado).
S. A invocada necessidade da demonstração existia no Processo Especial de Revitalização (PER) e não no presente processo de Insolvência, pois foi naquele PER que o direito à remuneração (pela nomeação/exercício das suas funções de Administrador Judicial Provisório e pela fiscalização do Plano de Recuperação e remuneração do Administrador Judicial Provisório) foi constituído.
T. Uma vez que nesse PER os credores aprovaram e o Exm.º Sr. Juiz homologou a decisão da assembleia de credores de fixar a remuneração ao Administrador Judicial Provisório, ficou definido não apenas o valor da remuneração, mas igualmente aquilo a que a mesma corresponde.
U. Poderia colocar-se a hipótese da necessidade da ora recorrente fazer a aludida demonstração, mas tal hipótese, neste processo de insolvência, só se colocaria caso algum credor impugnasse o crédito da ora recorrente, o que não se verificou, pelo que não há fundamento legal para que se exija à ora recorrente fazer essa mesma demonstração.
V. Para efeito de atribuição de privilégio mobiliário especial, o que releva é que o crédito em causa tenha a natureza de crédito de custas, isto é, seja relativo a uma despesa de justiça feita directamente no interesse comum dos credores, para a conservação, execução ou liquidação de bens móveis, independentemente de saber quem é o responsável final pelo pagamento das custas, o que, no presente caso, se verifica.
W. Deste modo, os créditos reclamados pela ora Recorrente no valor total de 13.071,90€ devem, assim, ter natureza de privilegiados, (privilégio mobiliário especial), nos termos da alínea a) do n. º4 do art.º 47.º do CIRE, com preferência sobre os demais, não só sobre os demais privilégios, como sobre as outras garantias, mesmo anteriores, que onerem os mesmos bens e valem contra os terceiros adquirentes. (artigo 738º, 743º, 746º C.C, do n.º 1 do artigo 3.º e artigo 16, alínea h) do Regulamento das Custas Processuais (RCP)).
X. Ao não reconhecer o crédito da Recorrente quanto à sua natureza e qualificação, como PRIVILEGIADO com preferência sobre os demais, não só sobre os demais privilégios, como sobre as outras garantias, mesmo anteriores, que onerem os mesmos bens e valem contra os terceiros adquirentes, violou a sentença recorrida o disposto no artigo 738º, 743º e 746º do C.C. e o disposto no artigo 3º, n.º 1 e 16, alínea h) do Regulamento das Custas Processuais.
Y. Assim, deve a sentença ora recorrida ser REVOGADA e substituída por outra que reconheça o crédito da Recorrente no montante global de 13.071,90€ (treze mil e setenta e um euros e noventa cêntimos), como PRIVILEGIADO com preferência sobre os demais, não só sobre os demais privilégios, como sobre as outras garantias, mesmo anteriores, que onerem os mesmos bens e valem contra os terceiros adquirentes, nos termos do disposto no artigo 738º do CC.”, realçado nosso.
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A credora, BB apresentou contra-alegações, pugnando pela improcedência do recurso.
a) O Tribunal a quo entendeu e bem que “o crédito reclamado por B..., Unip., Lda. provém de uma dívida respeitante à remuneração pela fiscalização do Plano enquanto Administrador Judicial Provisório nos meses de dezembro/2022 a março/2023, acrescido de remuneração fixa devida no PER da sociedade "C..., Lda. (NIF: ...)", - processo n.º 3575/20.4T8SNT não cabe na previsão do art.º 738 do Código Civil,”, uma vez que o referido crédito provém dessa outra administração e não da necessidade de conservar, executar ou liquidar os bens do devedor no âmbito destes autos, e por conseguinte, essa administração não foi realizada no interesse de todos os credores.
b) Para que o crédito do recorrente pudesse gozar de privilégio mobiliário especial nos presentes autos, era necessário que a sua actividade aqui tivesse sido desenvolvida, demonstrando que o seu crédito resultou de uma atividade de cooperação processual destinada a conservar, liquidar ou executar bens imóveis, no interesse de todos os credores, o que não foi feito como bem entendeu o Tribunal a quo.
c) Por conseguinte, sendo necessário que as despesas a que se refere o art.º 738º do Código Civil, sejam feitas diretamente no interesse comum dos credores, a remuneração fixada no âmbito do processo n.º 3575/20.4T8SNT não se inclui na previsão, o que vale por dizer que o crédito não pode ser graduado com um privilégio mobiliário especial nos termos do artigo 738.º do Código Civil.
d) Em virtude do supra exposto, é manifesto que o recurso apresentado por - B..., Unipessoal Lda., S.A., - deve improceder, mantendo-se a decisão recorrida, uma que esta decisão não viola, os artigos 738º, 743º e 746º do C.C. e o disposto no artigo 3º, n.º 1 e 16º do Regulamento das Custas Processuais como pretende o recorrente.”.
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II-FUNDAMENTAÇÃO.
O objecto do recurso é delimitado pelas conclusões da alegação da recorrente, não podendo este Tribunal conhecer de matérias nelas não incluídas, a não ser que as mesmas sejam de conhecimento oficioso – artigos 635.º, n.º 4 e 639.º, n.ºs 1 e 3 do Código de Processo Civil

Como se constata do supra exposto, a única questão a decidir, é determinar se o crédito do credor é privilegiado ou não.
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OS FACTOS
Os factos com interesse para a decisão da causa e a ter em consideração são os constantes no relatório, e que aqui se dão por reproduzidos.
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DE DIREITO.
Sustenta o credor recorrente, que o seu crédito tem privilégio mobiliário especial por ser decorrente da sua actividade como Administrador Judicial Provisório no processo de Processo Especial de Revitalização (doravante apenas PER) da sociedade C..., Lda.
Que nesse processo é o credor das seguintes quantias:
Pelo que, é a Reclamante credora da Insolvente, no montante de 13.071,90 €, relativos a:
1. Remuneração pela fiscalização do Plano de Recuperação homologado no PER n.º 3575/20.4T8SNT, no valor de 9.840,00 €;
2. Remuneração do Administrador Judicial Provisório no PER n.º 3575/20.4T8SNT, no valor de 2.460,00 €;
3. Juros de mora, no valor de 882,20 €.” – cfr. artigo 17.º da sua reclamação de créditos.

Nestes autos não está em causa o montante do crédito, mas sim se o crédito do PER, por força das medidas decididas em tal processo – Transmissão para a adquirente de todo o passivo restruturado, com o pagamento do mesmo a ocorrer nos termos do definido no ponto 4.4 – vale nestes autos com a mesma garantia – existência de privilégio mobiliário geral.

A sentença em crise quanto à questão fundamentou do seguinte modo:
De acordo com a proposta de graduação apresentada pela Sra. Administradora da Insolvência deverá ser dado pagamento pelo produto da liquidação do ativo, do seguinte modo: em 1.º lugar - as despesas a que aludem as alíneas a) a c) do art.241.º, n.º 1 do CIRE; em 2.º lugar os créditos privilegiados dos trabalhadores: credores 16 a 25 (com privilégio imobiliário e mobiliário geral nos termos do artigo 333.º do CT e artigo 47.º n.º 4 al. a) do CIRE); em 3.º lugar o crédito privilegiado do credor 7 – “B..., Unip., Lda. (com privilégio mobiliário geral, nos termos do artigo 738.º do Código Civil); em 4.º lugar – os créditos comuns; e em 5.º lugar – os créditos subordinados.
Porém, conforme se extrai da lista de credores reconhecidos, o crédito reclamado por B..., Unip., Lda. provém de uma dívida respeitante à remuneração pela fiscalização do Plano enquanto Administrador Judicial Provisório nos meses de dezembro/2022 a março/2023, acrescido de remuneração fixa devida no PER n.º 3575/20.4T8SNT da sociedade "C..., Lda. (NIF: ...)", onde ficou prevista a transmissão de todo o passivo daquela sociedade para a insolvente.
Estipula o artigo 738.º, do Código Civil, que os créditos por despesas de justiça feitas diretamente no interesse comum dos credores, para a conservação, execução ou liquidação de bens móveis, têm privilégio sobre estes bens.
Assim, para que exista o mencionado privilégio, é necessário que:
i. Que as despesas tenham sido feitas num processo para conservar, executar ou liquidar os bens do devedor;
ii. Que os credores sejam pessoas intervenientes no processo e que os seus créditos resultem da conservação, execução ou liquidação dos bens:
iii. Que as despesas tenham sido feitas no interesse de todos os credores a quem é oposto o privilégio.
O desígnio subjacente à concessão do privilégio em alusão assenta na circunstância de que, tendo as despesas sido diretamente realizadas para conservar ou liquidar os bens no interesse dos credores, se justifica que o respetivo crédito prevaleça sobre os créditos dos demais credores
Revertendo à situação sub judice, o crédito reclamado por B..., Unip., Lda. provém de uma dívida respeitante à remuneração pela fiscalização do Plano enquanto Administrador Judicial Provisório nos meses de dezembro/2022 a março/2023, acrescido de remuneração fixa devida no PER n.º 3575/20.4T8SNT da sociedade "C..., Lda. (NIF: ...)", onde ficou prevista a transmissão de todo o passivo daquela sociedade para a insolvente.
Donde, como é evidente, o dito crédito não resultou da necessidade de conservar, executar ou liquidar os bens do devedor nem as despesas que lhe são inerentes foram realizadas no interesse de todos os credores a quem é oposto o privilégio.
Assim, sendo o crédito reclamado proveniente de outro processo sem que se demonstre que resultou de uma atividade de cooperação processual destinada a conservar, liquidar ou executar bens imóveis, no interesse de todos os credores a que é oposto, não goza de privilégio mobiliário especial, devendo ser graduado como crédito comum e, se necessário, sujeitas a rateio.“.

Não podemos deixar de acompanhar o decidido pela M.Ma Juíza.
Dispõe o artigo 47.º, n.º 4 do CIRE, o seguinte:
Para efeitos deste Código, os créditos sobre a insolvência são:
a) «Garantidos» e «privilegiados» os créditos que beneficiem, respectivamente, de garantias reais, incluindo os privilégios creditórios especiais, e de privilégios creditórios gerais sobre bens integrantes da massa insolvente, até ao montante correspondente ao valor dos bens objecto das garantias ou dos privilégios gerais, tendo em conta as eventuais onerações prevalecentes;
b) «Subordinados» os créditos enumerados no artigo seguinte, excepto quando beneficiem de privilégios creditórios, gerais ou especiais, ou de hipotecas legais,
c) «Comuns» os demais créditos.”.
Por sua vez o artigo 51.º, do CIRE, fixa:
1 - Salvo preceito expresso em contrário, são dívidas da massa insolvente, além de outras como tal qualificadas neste Código:
a) As custas do processo de insolvência;
b) As remunerações do administrador da insolvência e as despesas deste e dos membros da comissão de credores;
c) As dívidas emergentes dos actos de administração, liquidação e partilha da massa insolvente;
d) As dívidas resultantes da actuação do administrador da insolvência no exercício das suas funções;
e) Qualquer dívida resultante de contrato bilateral cujo cumprimento não possa ser recusado pelo administrador da insolvência, salvo na medida em que se reporte a período anterior à declaração de insolvência;
f) Qualquer dívida resultante de contrato bilateral cujo cumprimento não seja recusado pelo administrador da insolvência, salvo na medida correspondente à contraprestação já realizada pela outra parte anteriormente à declaração de insolvência ou em que se reporte a período anterior a essa declaração;
g) Qualquer dívida resultante de contrato que tenha por objecto uma prestação duradoura, na medida correspondente à contraprestação já realizada pela outra parte e cujo cumprimento tenha sido exigido pelo administrador judicial provisório;
h) As dívidas constituídas por actos praticados pelo administrador judicial provisório no exercício dos seus poderes;
i) As dívidas que tenham por fonte o enriquecimento sem causa da massa insolvente;
j) A obrigação de prestar alimentos relativa a período posterior à data da declaração de insolvência, nas condições do artigo 93.º
2 - Os créditos correspondentes a dívidas da massa insolvente e os titulares desses créditos são neste Código designados, respectivamente, por créditos sobre a massa e credores da massa.”.
Por sua vez o artigo 738.º, n.º 1 do Código Civil dispõe:
Os créditos por despesas de justiça feitas directamente no interesse comum dos credores, para a conservação, execução ou liquidação de bens móveis, têm privilégio sobre estes bens.”.

O devedor da remuneração do Administrador Judicial Provisório é a empresa sujeita do processo de recuperação, neste caso do PER. Só assim não será nos casos em que, tendo-se frustrado a recuperação da empresa, esta tenha sido declarada falida, sem que ao Administrador Judicial Provisório tivesse sido, entretanto, paga a respectiva remuneração: neste caso — só neste caso — aquela remuneração deverá ser suportada pela massa falida, saindo precípua do produto dessa massa.
Ora, nos presentes o credor pretende fazer valer neste processo de insolvência, um crédito que o mesmo detém sobre uma outra entidade, que não a massa insolvente. Distinto seria o caso do credor ter sido nomeado e exercido a sua actividade na ora insolvente.
Apreciando o crédito do recorrente face ao disposto no artigo 738.º do Código Civil, o mesmo teria que preencher os requisitos citados pela sentença em crise:
i. Que as despesas tenham sido feitas num processo para conservar, executar ou liquidar os bens do devedor;
ii. Que os credores sejam pessoas intervenientes no processo e que os seus créditos resultem da conservação, execução ou liquidação dos bens:
iii. Que as despesas tenham sido feitas no interesse de todos os credores a quem é oposto o privilégio.”
Não está demonstrado quais sejam as despesas que o credor levou a cabo em favor dos credores deste processo. Quais as diligências que em concreto estão em causa. Não se verifica que sejam os mesmos credores. Qual a correspondência entre a actividade do credor e que os créditos dos credores dos credores deste processo, na sua vertente de conservação, execução ou liquidação.
Não está verificado nos autos a comprovação dos citados requisitos, e consequentemente por esta via não assiste razão ao recorrente. Pelo que se impõe a confirmação do decidido ela primeira instância.
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III DECISÃO
Pelo exposto, acordam os Juízes deste Tribunal da Relação do Porto, em julgar improcedente a apelação, confirmando-se a decisão recorrida.
Custas pelo credora/apelante (confrontar artigo 527.º do Código de Processo Civil).
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Sumário nos termos do artigo 663.º, n.º 7 do Código de Processo Civil.
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Porto, 16 de Janeiro de 2024
Alberto Taveira
Fernando Vilares Ferreira
Maria da Luz Seabra
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[1] O relator escreve de acordo com a “antiga ortografia”, sendo que as partes em itálico são transcrições cuja opção pela “antiga ortografia” ou pelo “Acordo Ortográfico” depende da respectiva autoria.
[2] Seguimos de perto o relatório elaborado pelo Exmo. Senhor Juiz.