Acórdão do Tribunal da Relação do Porto
Processo:
37/21.6T8AVR-H.P1
Nº Convencional: JTRP000
Relator: FERNANDO VILARES FERREIRA
Descritores: EXONERAÇÃO DO PASSIVO RESTANTE
RECUSA
DECISÃO FINAL DA EXONERAÇÃO
Nº do Documento: RP2024040937/21.6T8AVR-H.P1
Data do Acordão: 04/09/2024
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: CONFIRMADA
Indicações Eventuais: 2ª SECÇÃO
Área Temática: .
Sumário: I – A decisão de recusa antecipada da exoneração do passivo restante, sustentada na previsão isolada da al. a) do n.º 1 do art. 243.º do CIRE, pressupõe a verificação cumulativa dos seguintes pressupostos: a) violação das obrigações impostas ao insolvente como corolário da admissão liminar do pedido de exoneração; b) que essa violação decorra de uma atuação dolosa ou com grave negligência; c) verificação de prejuízo para a satisfação dos créditos sobre a insolvência; d) e existência de nexo de causalidade entre a conduta e o prejuízo.
II – Baseando-se o requerimento de recusa da exoneração na cit. al. a) do n.º 1 do art. 243.º, o mesmo é sempre deferido, por via do comando normativo inserto na segunda parte do n.º 3 do mesmo artigo, se o devedor, sem motivo razoável, não fornecer ao tribunal, no prazo que lhe seja indicado para o efeito, informações que comprovem o cumprimento das suas obrigações.
III – A leitura conjugada do estatuído nas citadas disposições legais permite concluir que o comportamento objetivo assumido pelo devedor, traduzido na falta de fornecimento de informações que comprovem o cumprimento das suas obrigações, sem apresentar justificação razoável para tal, no seguimento de notificação para cumprimento efetuada pelo tribunal, produz efeito cominatório ou sancionatório, em termos de se considerarem verificados os pressupostos da cessação antecipada da exoneração do passivo restante.
IV – Ou, em termos de repartição do ónus da prova nesta matéria, constatado o incumprimento objetivo da obrigação de o devedor informar o Tribunal sobre os seus rendimentos, no período da cessão, cabe ao devedor demonstrar uma causa justificada do incumprimento.
Reclamações:
Decisão Texto Integral: PROCESSO N.º 37/21.6T8AVR-H.P1

[Origem: Tribunal Judicial da Comarca de Aveiro – Juízo de Comércio de Aveiro - Juiz 3]

Relator: Fernando Vilares Ferreira

Adjuntos: Rodrigues Pires

Márcia Portela

SUMÁRIO:

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EM NOME DO POVO PORTUGUÊS, acordam os Juízes Desembargadores da 2.ª Secção do Tribunal da Relação do Porto:

I.

RELATÓRIO

1.

Nos autos de insolvência de pessoa singular n.º 37/21.6T8AVR, sob impulso do Credor Banco 1..., S. A, por sentença de 4.2.2021, foi declarado insolvente o Devedor AA, com os sinais dos autos.

2.

Por despacho de 13.9.2021, foi admitido liminarmente o pedido de exoneração do passivo restante deduzido pelo Insolvente, determinando-se que o rendimento disponível daquele seria integrado por todos os rendimentos que lhe adviessem a qualquer título, com exclusão de todo aquele que excedesse o valor liquido mensal correspondente a 1,25 x (14 x SMMG: 12), tendo o processo de insolvência prosseguido os seus termos para liquidação do ativo, estando ainda pendente.

Na mesma data foi “declarado encerrado o processo de insolvência apenas para efeitos de determinar o início de período de cessão do rendimento disponível, sem prejuízo do prosseguimento do processo de insolvência para liquidação do ativo e seus ulteriores termos”.

3.

Foi requerida a cessação antecipada do procedimento de exoneração, tendo o Insolvente, por sua vez, requerido o pagamento das quantias em dívida em prestações ao abrigo do disposto no artigo 242º-A do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas (CIRE)[1].

4.

Em 11.12.2023 foi proferida SENTENÇA, com o seguinte dispositivo:

[Pelo exposto, com os fundamentos acima referidos:

a) Indefiro o pedido de pagamento a prestações com fundamento no artigo 242º-A do CIRE requerido pelo insolvente AA;

b) Julgo procedentes os pedidos de cessação antecipada do procedimento de exoneração acima identificados e em consequência recuso a exoneração do passivo restante ao insolvente AA;

c) Condeno o insolvente AA nas custas do incidente a que deu causa, com taxa de justiça que se fixa em 2 UC.

Registe, notifique e publicite (artigo 247º do CIRE).]

5.

Não se conformando com aquela decisão, o Insolvente interpôs o presente recurso de apelação, admitido com subida em separado e efeito devolutivo, assente nas seguintes CONCLUSÕES:

I. Entende o recorrente que a decisão de recusa da exoneração do passivo restante não deverá manter-se uma vez que pressupõe a verificação cumulativa dos seguintes pressupostos:

a) violação das obrigações impostas ao insolvente como corolário da admissão liminar do pedido de exoneração; b) que essa violação decorra de uma atuação dolosa ou com grave negligência; c) verificação de prejuízo para a satisfação dos créditos sobre a insolvência; d) e existência de nexo de causalidade entre a conduta e o prejuízo - artigo 243º do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas.

II. Impende sobre o credor do insolvente o ónus de alegação e prova dos factos de que depende a recusa de exoneração do passivo restante, por assumirem natureza impeditiva do direito (art. 342.º, n.º 2, do Código Civil), todavia analisados os requerimentos apresentados pelos credores constata-se que nenhum alegou ou fundamentou que a violação decorreria de uma atuação dolosa ou com grave negligência; ou a verificação de prejuízo para a satisfação dos créditos sobre a insolvência; nem a existência de nexo de causalidade entre a conduta e o prejuízo. Pugnando-se pela ausência de verificação dos pressupostos da cessação antecipada da exoneração do passivo restante.

III. Por outro lado, sempre o devedor alegou causa justificada para o incumprimento do previsto no art. 239.º, n.º 4, al. c). O devedor não só alegou que as entregas iniciar-se-iam com a fixação do valor em Fevereiro de 2022, com o trânsito em julgado da decisão sumária proferida pelo Tribunal da Relação do Porto. Tendo ainda alegado que a sua saúde tem vindo a agravar-se de forma grave, a par da incapacidade já verificada, de 68%, concretizando as consequências desse agravamento.

IV. Nenhum credor alegou que a não disponibilização do referido montante à fidúcia traduzir-se-ia em correspondente prejuízo para a satisfação dos créditos sobre a insolvência. O qual não existiu.

V. Por último, no que concerne ao pressuposto “culpa”, o Insolvente, desde sempre ao longo do processo justificou, conforme supra se evidenciou, a não entrega dos montantes devidos. Tendo, no seu modesto entender, apresentado “motivo razoável” para não cumprir a obrigação de entrega do dito montante à fidúcia, não se considerando verificados os pressupostos da cessação antecipada da exoneração do passivo restante, entre os quais a culpa – a qual tão pouco foi alegada pelos credores.

VI. Sendo que o ónus da prova dos factos integrativos dos fundamentos de recusa da exoneração, não recai sobre o devedor, mas antes são o fiduciário e/ou os credores que, uma vez ouvidos no termo do período de cessão, sobre a concessão ou não da exoneração ao devedor (n.º 1 do art. 244º do CIRE), terão de alegar e provar factos demonstrativos do preenchimento dos requisitos constitutivos dos fundamentos de recusa da exoneração. O que repita-se não aconteceu no caso em apreço quanto aos pressupostos citados.

VII. Não é bastante para decretar a recusa da exoneração do passivo restante a mera verificação do incumprimento de alguma das aludidas obrigações, sendo ainda mister que esse incumprimento seja imputável ao devedor a título de dolo ou culpa grave e, ainda, que desse incumprimento decorra, em termos de causalidade adequada, um prejuízo para a satisfação dos créditos da insolvência.

VIII. Em nosso ver, o insolvente informou tempestivamente da sua situação pessoal e as suas despesas, atuando como qualquer cidadão minimamente diligente e cuidadoso. Uma tal conduta, com o devido respeito, não é, em nosso ver, uma conduta ostensiva ou grosseiramente negligente. Considera o recorrente que não atuou com dolo ou grave negligência e que não prejudicou a satisfação dos créditos sobre a insolvência - alínea a), do nº 1 do artº 243º do CIRE.

IX. É certo que o insolvente, através da sua mandatária, veio comunicar que se encontrava a aguardar a emissão de extracto de remunerações requerida ao CNP para remessa ao AI, alegando que no documento anual emitido pelo Centro Nacional de Pensões que juntou não eram identificadas mensalmente as remunerações e descontos realizados. No entanto, não só o Fiduciário possuía a password de acesso às suas declarações de IRS, como procedeu à entrega da declaração anual do IRS de 2021 e da declaração anual do CNP. O insolvente juntou ainda aos autos lista emitida pelo CNP dos valores líquidos e a referida declaração de IRS. Pelo que, não se aceita o alegado no ponto 22 da matéria pois o fiduciário não ficou habilitado a apurar os rendimentos referentes ao primeiro ano do período de cessão decorridos mais de cinco meses desde o momento em que lhe foram pedidas as informações para o efeito pois tinha acesso às declarações de rendimento do insolvente, faltando-lhe apenas os montantes líquidos do CNP.

X. Sendo a exoneração sempre recusada se o devedor, sem motivo razoável, não fornecer no prazo que lhe seja fixado informações que comprovem o cumprimento das suas obrigações, ou, devidamente convocado, faltar injustificadamente à audiência em que deveria prestá-las (artigo 243º nº 3 do CIRE). Ora, conforme referido o insolvente prestou todas as informações solicitadas faltando apenas a emissão pelo Centro Nacional de Pensões da listagem mensal das remunerações e descontos realizados, a fim de ser identificado o montante líquido.

XI. Concluímos que não estão verificados os pressupostos da parte final do nº 3 do artº 243º do CIRE e mesmo que sufragássemos o entendimento (e não o fazemos) de que a segunda parte do nº 3 do artº 243º, do CIRE, constitui causa autónoma de cessação antecipada e de recusa de exoneração do passivo, não dependendo dos requisitos do nº 1, sempre os respetivos pressupostos estariam ausentes. Mais, entendemos que os factos provados nem sequer permitem reputar a atuação do insolvente como dolosa ou com culpa grave.

XII. No que respeita à negligência grave ou dolo no cumprimento das obrigações: o que os autos revelam é que o fiduciário solicitou a informação dos rendimentos tendo o insolvente enviado os documentos que já detinha: declaração anual do CNP e acesso às declarações de rendimento no site da AT e posteriormente, as listagens da CNP que possibilitaram, como consta dos autos, a correta identificação dos rendimentos auferidos

XIII. Já no que respeita ao prejuízo não foi realizada qualquer tarefa de averiguação sobre o prejuízo assim efetivamente provocado. Aliás, não se deve partir do pressuposto que a eventual falta de resposta do devedor implicará necessariamente prejuízo para os credores.

XIV. Pelo que, se defende não se verificarem os pressupostos da cessação antecipada da exoneração.

XV. Ainda se diga que, de um lado veio o insolvente, tendo manifesta vontade em proceder às entregas dos valores apurados à massa fiduciária, requerer a entrega prestacional do valor apurado. Com efeito, revelou manifesto interesse na exoneração do passivo restante. Razão porque requereu o pagamento em prestações pois embora a lei não preveja expressamente a possibilidade do rendimento disponível que não foi cedido em tempo oportuno ser cedido posteriormente em prestações mensais, também é certo que não a exclui.

XVI. Ou caso assim não fosse entendido, ao abrigo do art. 242º-A, aditado ao CIRE pela Lei nº 9/2022, de 11.1, relativo à prorrogação do período de cessão por se considerar existir probabilidade séria de, nesse período alargado, o devedor vir a cumprir as obrigações a que se sujeitou inicialmente para obter a exoneração.

XVII. Com efeito, nada nos autos aponta para que a convicção do julgador seria de que o devedor não iria cumprir. Por outro lado, esta prorrogação permite que um período adicional de esforço da parte do devedor possa levar à desejada exoneração. Por outro lado, ainda nada nos autos leva a concluir que o devedor atuou à margem do princípio da boa-fé, nem estaria a usar dessa faculdade de forma abusiva – art. 334º do Cód. Civil.

XVIII. Pelo contrário, dever-se-ia concluir atentos elementos constantes do processo pela existência de uma probabilidade séria de cumprimento, por parte do devedor, nesse período alargado, das obrigações a que se refere o art. 239º do CIRE, dado que o recorrente sempre justificou os motivos porque não havia ainda entregue os valores do rendimento disponível, os quais se relacionam sobretudo com questões de saúde.

XIX. Deste modo, por se verificar a situação prevista no art. 242º-A, nº 3 do CIRE, podia ser concedida essa pretensão aderiu, a requerida prorrogação do período de cessão, o que importa a procedência do recurso interposto.

6.

Não foram apresentadas contra-alegações.

II.

OBJETO DO RECURSO

Considerando as conclusões das alegações apresentadas pelo Apelante, e visto o preceituado nos artigos 635.º, n.º 4, 637.º, n.º 2, 1.ª parte, e 639.º, nºs 1 e 2, todos do Código de Processo Civil (CPCivil), a questão a decidir no presente recurso passa por saber se existe ou não fundamento bastante para declarar antecipadamente cessado o procedimento de exoneração do passivo restante.

III.

FUNDAMENTAÇÃO

1.

OS FACTOS

Com relevância para a decisão, o Tribunal a quo julgou provada a seguinte factualidade:

1) Em 13/09/2021, foi proferido despacho admitindo liminarmente o pedido de exoneração do passivo restante formulado pelo insolvente AA, determinando que o rendimento disponível do devedor/insolvente, objeto da cessão, seria integrado por todos os rendimentos que lhe adviessem a qualquer título, com exclusão de todo aquele que excedesse o valor liquido mensal correspondente a 1,25 x (14 x SMMG : 12), tendo o processo de insolvência prosseguido os seus termos para liquidação do ativo, estando ainda pendente.

2) No referido despacho inicial deram-se como assentes os seguintes factos:

“a) O insolvente nasceu em ../../1944 e está actualmente divorciado, tendo o divórcio sido decretado por sentença proferida em 11/02/2010 e transitada em julgado na mesma data.

b) Foram diagnosticadas ao devedor diversas potologias que afectam a sua capacidade de locomoção, sendo o mesmo portador de um atestado multiusos tendo-lhe sido atribuída uma incapacidade motora de 68%.

c) O insolvente, em 26/07/2013, declarou ter acordado com BB, com quem foi casado, que a partir do divórcio (Fevereiro de 2010) pagaria a esta a quantia mensal de € 2.000,00, a titulo de alimentos, estando à data em divida o valor de € 84.000,00, tendo o insolvente ainda ali declarado obrigar-se a continuar a pagar tal montante a titulo de alimentos.

d) O insolvente tem como único rendimento a sua pensão de reforma, no montante de líquido de € 2.622,00.

O insolvente declarou ter as seguintes despesas:

a) Pensão de alimentos devida à ex-cônjuge no valor de € 2.000,00;

b) Despesas de habitação com electricidade, água telefone e seguro no valor total de € 117,00;

c) Com alimentação o valor de € 345,00 (considerando que vive sozinho e não consegue, por motivos de saúde, confeccionar os seus almoços e jantares tendo por referência o valor médio de € 7,5 por refeição;

d) Despesas de saúde no valor médio mensal de € 175,00;

e) Deslocações para consultas em especialidade nomeadamente, a Lisboa, Porto e Coimbra que variam consoante a periodicidade entre € 300,00/€ 400,00.

Além de despesas de vestuário e calçado e contributo mensal para a igreja metodista portuguesa.”.

3) O insolvente recorreu da referida decisão, na parte referente à fixação do sustento mínimo, tendo sido proferida decisão sumária pelo Tribunal da Relação do Porto, em 15/01/2022, com o seguinte teor:

“Nestes termos e pelos fundamentos expostos, julga-se parcialmente procedente o recurso de apelação interposto pelo insolvente e, em consequência, revoga-se parcialmente a decisão recorrida na parte objecto do recurso (que determinou excluído do rendimento disponível o montante correspondente a 1,25 vezes o SMMG) , substituindo-se nessa parte (apenas quanto ao montante para se excluir do rendimento disponível do insolvente,) pelo valor de 2 vezes o SMMG (devendo fixar- se o rendimento disponível (tudo o que o(a) insolvente aufira e que exceda por duas vezes o salário mínimo nacional) considera-se cedido ao fiduciário.”.

4) Na referida decisão sumária consignou-se ainda o seguinte:

“Para além dos factos provados constantes na decisão recorrida a ter em conta, deverá considera-se ainda demonstrado atenta a prova documental junta a seguinte factualidade:

- A situação de saúde do requerente tem vindo a agravar-se nos últimos anos, porquanto, tem artrose muito evoluída e incapacitante no joelho direito, sequela de aviação que teve em 1967. Daí resultou fratura cominutiva dos pratos tibiais, tendo sido operado 24 vezes. Cfr. Relatório junto como Documento nº 3 com a petição inicial.

- Tendo necessidade de recorrer frequentemente ao uso de canadiana/bengala para se deslocar. Daí que, seja portador de deficiência que lhe confere uma incapacidade permanente global de 68% - Cfr. Relatório junto como Documento nº 4 com a petição inicial. Por outro lado, considerando que padece de problema no tornozelo que implica que não pode levantar o pé, arrastando, não pode recorrer a prótese.

- É evidente o agravamento da sua situação de saúde que se deteriora de dia para dia pois sofre de dores constantes devido ao estado do seu joelho e tem de tomar mediação de combate àquelas dores. A cada ano que passa a sua situação agrava-se. Sendo irreversível. Existindo previsão de poder ficar totalmente dependente da ajuda de terceiro (cfr. Relatório clinico).

- Vai às consultas com o apoio de amigo e familiares tendo de pagar a terceiros as deslocações e alimentação do dia em que o acompanham à consulta (declaração junta aos autos). Existe o agravamento da sua situação de saúde que se deteriora de dia para dia pois sofre de dores constantes devido ao estado do seu joelho e tem de tomar mediação de combate àquelas dores. A cada ano que passa a sua situação agrava-se. Sendo irreversível. Existindo previsão de poder ficar totalmente dependente da ajuda de terceiro.”.

5) O administrador da insolvência/fiduciário, por requerimento de 26/10/2022, veio relatar o incumprimento do insolvente quanto à prestação de informações e envio de documentos, tendo requerido a notificação do devedor para proceder à entrega da documentação e informação solicitada, sob pena de ser revogado o despacho inicial de exoneração do passivo restante.

6) Tal requerimento foi notificado pela secretaria nesse mesmo dia ao insolvente na pessoa da sua mandatária, para que desse cumprimento ao solicitado.

7) Por requerimento de 28/11/2022, o fiduciário informou continuar impossibilitado de apresentar o relatório anual, por total ausência de elementos/informação, dado que nenhum elemento lhe foi enviado pelo devedor, não obstante a notificação efetuada pela secretaria.

8) Por requerimento de 15/12/2022, o insolvente, através da sua mandatária, veio comunicar que se encontrava a aguardar a emissão de extrato de remunerações requerida ao CNP para remessa ao AI, alegando que no documento anual emitido pelo Centro Nacional de Pensões que juntou não eram identificadas mensalmente as remunerações e descontos realizados. Tendo requerido a concessão do prazo de 10 dias para o efeito.

9) No referido prazo, o insolvente nada juntou.

10) Por requerimento 06/01/2023, o fiduciário informou continuar impossibilitado de apresentar o relatório anual, por total ausência de elementos / informação, dado que nenhum elemento lhe foi enviado pelo devedor, não obstante a notificação efetuada pela secretaria.

11) O requerimento referido em 10) foi notificado pela secretaria nesse mesmo dia ao insolvente na pessoa da sua mandatária, para que desse cumprimento ao solicitado.

12) Nada tendo sido junto ou comprovado até essa datada, em 01/03/2023, foi proferido despacho, cujo teor se dá aqui por reproduzido, ordenando a notificação do fiduciário para proceder à entrega do relatório anual relativo ao primeiro ano do período de cessão.

13) O fiduciário, em 13/03/2023, apresentou o relatório referente ao primeiro ano do período de cessão, com o teor que aqui se dá por reproduzido, elencando as notificações feitas ao insolvente e informando que nenhuma documentação havia sido por si rececionada ou junta aos autos pelo devedor.

14) No requerimento referido em 13), o administrador da insolvência/fiduciário invocou a violação, por parte do devedor, dos deveres a que alude o artigo 239º nº 4 alíneas a) e c) do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas e requereu a cessação antecipada do procedimento de exoneração do passivo restante.

15) No requerimento referido em 13), o administrador da insolvência/fiduciário juntou cópia de um email remetido à mandatária do insolvente com o seguinte teor:

“Exma. Senhora

Dra. CC

M.I. Advogada

Decorrido que se mostra o primeiro ano do período de cessão, venho pelo presente solicitar que me sejam enviados os comprovativos dos rendimentos auferidos pelo insolvente no âmbito do processo supra identificado (de Outubro de 2021 a Setembro de 2022 - ano 1) de forma a poder elaborar o Relatório Anual referente ao 1º ano, nomeadamente, comprovativos da pensão recebida.

A documentação solicitada deverá ser-me enviada com a maior brevidade possível.

Não obstante estar pendente o recurso interposto por V. Exa., ao mesmo foi atribuído efeito devolutivo, pelo que as obrigações do seu constituinte se mantém de acordo com o despacho proferido.

Na expetativa de uma breve resposta, os meus melhores cumprimentos,”.

16) A credora A..., S.A. requereu a cessação antecipada do procedimento de exoneração do passivo restante, nos termos e com os fundamentos que resultam do requerimento apresentado em 14/03/2023, que aqui se dá por reproduzido, por violação dos deveres impostos no artigo 239º nº 4 alínea a) do CIRE, entre o mais, alegando que o insolvente conhecia que tinha que fazer prova ao fiduciário sobre os seus rendimentos, e entregar à fidúcia os valores que eventualmente excediam o rendimento indisponível, tendo para isso sido interpelado, sendo evidente a atitude dolosa ou quanto muito a negligência grave do insolvente, que durante o tempo que compõe o período de cessão não prestou qualquer informação a que estava obrigado em sede do período de cessão não obstante ter-lhe sido concedido prazo para tal.

17) Em 12/04/2023 foi proferido despacho, cujo teor se dá aqui por reproduzido, ordenando, entre o mais, a notificação do insolvente, na pessoa da sua mandatária e na sua própria pessoa, através de carta registada simples remetida para a última morada comunicada, com a cominação expressa a que alude o artigo 243º nº 3 do CIRE, para, em 10 dias:

“i) Pronunciar-se quanto à requerida cessação antecipada do procedimento e justificar a razão pela qual não prestou as informações solicitadas e não remeteu os documentos em falta e ainda para, em igual, juntar tais documentos aos autos;

ii) Juntar cópia dos recibos dos salários auferidos ou documentos dos subsídios ou pensões de reforma de que tenha beneficiado, desde Setembro de 2021 até à presente data, bem como das declarações fiscais de rendimentos, apresentadas para efeitos de IRS, relativas aos rendimentos auferidos em 2021 e 2022 (esta última caso já tenha sido entregue).”.

18) Em 13/04/2023, o credor Banco 1..., S.A. requereu a cessação antecipada do procedimento de exoneração do passivo restante, nos termos e com os fundamentos que resultam do requerimento apresentado nessa data, que aqui se dá por reproduzido.

19) Em 20/04/2023, a credora B..., S.À.R.L. requereu a cessação antecipada do procedimento de exoneração do passivo restante, nos termos e com os fundamentos que resultam do requerimento apresentado nessa data, que aqui se dá por reproduzido.

20) O insolvente apresentou em 03/05/2023 o requerimento que aqui se dá por integralmente reproduzido, justificando a não prestação das informações solicitadas, em data anterior, alegando que se encontrava a aguardar a emissão de extrato de remunerações requerida ao CNP para remessa ao fiduciário, sustentando ter solicitado o prazo de 10 dias para o efeito, o que não foi possível.

Mais alegou ter procedido à entrega da declaração anual do IRS de 2021 e da lista emitida pelo CNP dos valores líquidos, através de email remetido ao fiduciário em 14/03/2023, sem prejuízo de ter fornecido ao fiduciário a password de acesso ao site da Autoridade Tributária e Aduaneira.

O insolvente juntou ainda aos autos lista emitida pelo CNP dos valores líquidos e a referida declaração de IRS.

Mais sustentou que não conseguiu ainda entregar ao fiduciário a parte dos seus rendimentos objeto de cessão, no essencial, porque o seu estado de saúde tem vindo a agravar-se necessitando de recorrer a consultas, tratamentos médicos e de fisioterapia, medicamentos, tendo, assim, de suportar elevados custos mensais.

Tendo ainda tido um acréscimo de despesas com deslocações, medicamentosas, com consultas médicas, exames, relatórios médicos, o que só consegue fazer com o apoio de amigo e familiares.

Mais alegou que despende atualmente e desde há uns meses para cá, do valor mensal de cerca de €200,00 para ter apoio domiciliário, visto que existem inúmeras tarefas que já não consegue realizar.

Razões pelas quais ainda não conseguiu cumprir a decisão proferida no que tange à entrega dos valores objeto de cessão.

Sendo que a tudo isso acresce o aumento do custo de vida derivado da inflação e do aumento gravoso dos bens essenciais, das prestações de serviço tais como energia elétrica, água, gás, telecomunicações.

21) Em 14/06/2023 foi proferido despacho, cujo teor se dá aqui por reproduzido, ordenando, entre o mais, nos termos e com os fundamentos ali expostos, a notificação do insolvente, para, em 10 dias, vir comprovar documentalmente em que data dirigiu o pedido ao Centro Nacional de Pensões solicitando a lista dos valores líquidos recebidos e determinando ainda a notificação do fiduciário para apresentar relatório complementar espelhando se e que quantias se encontravam em divida.

22) O fiduciário apresentou relatório complementar, em 19/06/2023, informando que se encontrava em dívida o valor global de € 12.933,09, atendendo aos cálculos ali espelhados.

23) Na sequência do despacho referido em 21), o insolvente apresentou o requerimento, com data de 30/06/2023, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido, alegando, entre o mais, o seguinte:

“1. Em 14/03/2023 remeteu via email a listagem dos valores líquidos auferidos pelo insolvente, o qual não dispõe de recibos das pensões de reforma, apenas das declarações anuais já juntas aos autos e da lista emitida pelo CNP dos valores líquidos transferidos.

2. Ora, foi o insolvente notificado para vir comprovar documentalmente em que data dirigiu o pedido ao Centro Nacional de Pensões solicitando a lista dos valores líquidos recebidos

3. Porém, encontra-se impossibilitado de o fazer.

4. Com efeito, foi a subscritora que deduziu tal pedido via email no entanto, não consegue enviar copia do mesmo a este Tribunal admitindo que terá procedido à eliminação do email pois não o consegue detetar na sua caixa de emails enviados.

5. Email que acredita ter remetido em outubro de 2022 – data da procuração do insolvente subscrita para o efeito - e repetido em dezembro de 2022 uma vez que a lista dos valores engloba este mês.”.

24) Os credores B..., S.À.R.L., Banco 1..., S.A. e A..., S.A. requereram a notificação do insolvente para demonstrar o cumprimento das obrigações a que está adstrito, pagando a quantia em dívida, conforme disposto na alínea c) do número 4 do artigo 239º, do CIRE, sob pena de não lhe ser concedida a exoneração do passivo restante.

25) O insolvente respondeu, por requerimento datado de 04/07/2023, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido, alegando, desde logo, entender que o período da cessão teve início apenas em Fevereiro de 2022, com o trânsito em julgado do acórdão proferido pelo Tribunal da Relação do Porto que alterou o sustento mínimo fixado. Razão pela qual os valores indicados no relatório do fiduciário serão inferiores.

Tendo ainda alegado não ter conseguido ainda entregar ao fiduciário parte dos seus rendimentos objeto de cessão, no essencial, porque a sua saúde se tem vindo a agravar, com o inerente aumento das despesas feitas com deslocações e as despesas medicamentosas, despesas com consultas médicas, exames, relatórios médicos.

Além de despender desde há uns meses o valor mensal de cerca de € 200,00 para ter apoio domiciliário, visto que existem inúmeras tarefas que já não consegue realizar.

Ao que acresce o aumento do custo de vida derivado da inflação e do aumento gravoso dos bens essenciais, das prestações de serviço tais como energia elétrica, água, gás, telecomunicações…

Concluindo assim que não conseguiu cumprir a decisão proferida no que tange à entrega dos valores objeto de cessão, mas não o fez dolosamente ou com grave negligência nem com a intenção de prejudicar por esse facto a satisfação dos créditos sobre a insolvência.

26) No requerimento referido em 25), o insolvente declarou ainda entender que não foram invocados quaisquer fundamentos que permitam concluir pela violação dolosa ou com grave negligência de alguma das obrigações que lhe são impostas pelo artigo 239.º, prejudicando por esse facto a satisfação dos créditos sobre a insolvência, razões pelas quais pretende proceder à entrega prestacional do valor apurado.

27) No mesmo requerimento alegou ainda que “24. Ademais, abrigo do artigo 242.º-A do CIRE - Prorrogação do período de cessão – é possível igualmente a prorrogação do prazo de exoneração pelos anos que faltariam para perfazer os cinco anos inicialmente previstos.” e termina requerente o seguinte: “TERMOS EM QUE REQUER A V. EXA. NÃO SEJA RECUSADO ANTECIPADAMENTE O PROCEDIMENTO DE EXONERAÇÃO NOS TERMOS DO N.º 3 DO ART. 243.º DO C.I.R.E., INDEFERINDO O PEDIDO DE CESSAÇÃO ANTECIPADA DO PROCEDIMENTO DE EXONERAÇÃO. REQUERENDO AINDA AUTORIZAÇÃO PARA PROCEDER À ENTREGA DO VALOR À MASSA FIDUCIÁRIA DE FORMA PRESTACIONAL.”.

28) Em 19/09/2023 foi proferido despacho, cujo teor se dá aqui por reproduzido, ordenando, nos termos e com os fundamentos ali expostos, o seguinte:

“1) Determino a notificação do Sr. fiduciário, com cópia deste despacho, para, em 10 dias, apresentar o relatório anual relativo ao segundo ano do período de cessão, nos termos previstos nos artigos 61º e 240º nº 2 do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas, comprovando que dele também foi dado conhecimento aos credores, relevando que o período de cessão teve inicio em 13/09/2021, bem como para, no mesmo prazo, pronunciar-se quanto ao pedido de prorrogação do período de cessão requerido pelo insolvente em 04/07/2023;

2) Determino a notificação deste despacho ao insolvente;

3) Ordeno a notificação dos credores, com cópia deste despacho, para, em 10 dias, pronunciarem-se quanto ao pedido de prorrogação do período de cessão requerido pelo insolvente em 04/07/2023 e requererem fundadamente o que tiverem por conveniente face à impossibilidade do Tribunal apreciar oficiosamente qualquer cessação antecipada do procedimento de exoneração com fundamentos distintos daqueles que foram requeridos pelas pessoas legitimadas para o efeito, designadamente quanto à violação do dever de entrega imediata do rendimento disponível.”.

29) Em 28/09/2023, a credora B..., S.À.R.L. requereu a cessação antecipada do procedimento de exoneração do passivo restante, nos termos e com os fundamentos que resultam do requerimento apresentado nessa data, que aqui se dá por reproduzido.

30) O fiduciário apresentou relatório relativo ao segundo ano do período de cessão, em 03/10/2023, informando que se encontrava em dívida o valor global de € 13.197,32, relativamente a tal período e um valor total de € 26.130,41, englobando o valor em falta relativamente ao primeiro ano, atendendo aos cálculos ali espelhados.

31) Em 07/10/2023 foi proferido despacho, cujo teor se dá aqui por reproduzido, ordenando, nos termos e com os fundamentos ali expostos, o seguinte:

“1) A notificação do insolvente, na pessoa do seu mandatário e na sua própria pessoa através de carta registada simples para a última morada comunicada nos autos, com cópia deste despacho, do relatório apresentado pelo fiduciário em 03/10/2023 e do requerimento apresentado pela credora B..., S.À.R.L. em 28/09/2023, para, em 10 dias:

i) Pronunciar-se quanto aos valores calculados pelo fiduciário como estando em divida no segundo ano do período de cessão e quanto às razões porque não procedeu à sua entrega e discordando dos valores calculados, comprovar documentalmente os rendimentos obtidos no período em causa, mediante junção dos documentos referentes à pensão de reforma e liquidação de IRS referente ao período em questão;

ii) Pronunciar-se quanto ao pedido adicional de cessação antecipada formulado pela credora B..., S.À.R.L.

2) A notificação dos credores, com cópia deste despacho para, em 10 dias, pronunciarem-se e requererem o que tiverem por conveniente face ao que resulta do relatório relativo ao segundo ano do período de cessão apresentado em 03/10/2023 (considerando ainda o que se expôs no despacho anterior) e ainda a notificação dos demais credores para se pronunciarem quanto ao pedido adicional de cessação antecipada formulado pela credora B..., S.À.R.L.

3) A notificação do fiduciário com cópia deste despacho para, em 10 dias, se pronunciar quanto ao pedido adicional de cessação antecipada formulado pela credora B..., S.À.R.L.”.

32) Em 08/11/2023, o credor Banco 1..., S.A. requereu a cessação antecipada do procedimento de exoneração do passivo restante, nos termos e com os fundamentos que resultam do requerimento apresentado nessa data, que aqui se dá por reproduzido.

33) Em 13/11/2023, o Sr. administrador da insolvência/fiduciário requereu a cessação antecipada do procedimento de exoneração do passivo restante, nos termos e com os fundamentos que resultam do requerimento apresentado nessa data, que aqui se dá por reproduzido.

34) Em 15/11/2023, a credora A..., S.A. requereu a cessação antecipada do procedimento de exoneração do passivo restante, nos termos e com os fundamentos que resultam do requerimento apresentado nessa data, que aqui se dá por reproduzido.

35) O insolvente apresentou o requerimento, com data de 23/11/2023, como seguinte teor:

“a) Quanto aos valores calculados pelo fiduciário como estando em divida no segundo ano do período de cessão e quanto às razões porque não procedeu à sua entrega

1. Relativamente aos cálculos o insolvente nada tem a requerer.

2. Por outro lado, no que concerne à ausência de depósito dos valores, vem referir, tal como consta já dos autos, que não só o insolvente considerava que o período da cessão teria início em Fevereiro de 2022 com o trânsito em julgado do Acórdão fixador do rendimento disponível e que, portanto, os valores em falta seriam bastante inferiores e mais fáceis de regularizar.

3. Ora, o insolvente considera não ter incumprido qualquer dos deveres identificados no artigo 239º do CIRE, todavia não conseguiu ainda entregar ao fiduciário a parte dos seus rendimentos objecto de cessão.

4. Com efeito, conforme já decorre dos autos, a saúde do insolvente tem vindo a agravar-se de forma grave, a par da incapacidade já verificada, de 68%, teve uma rotura de ligamentos e problemas nos tendões que dificultam, e muito, a sua mobilidade. Necessitando de recorrer a consultas, tratamentos médicos e de fisioterapia, medicamentos, tendo, assim, de suportar elevados custos mensais. Pelo que, às suas despesas comuns acrescem as quantias despendidas com deslocações e as despesas medicamentosas, bem como as despesas com consultas médicas, exames, relatórios médicos. O que só consegue fazer com o apoio de amigo e familiares. Aliás, despende atualmente e desde há uns meses para cá, do valor mensal de cerca de €200,00 para ter apoio domiciliário, visto que existem inúmeras tarefas que já não consegue realizar.

5. Ora, é evidente o agravamento da sua situação de saúde que se deteriora de dia para dia, incapacitando-o quanto à realização das tarefas do dia á dia relacionados com o tratamento do seu vestuário, casa, limpeza, conservação, apoio à sua própria pessoa etc.

6. Deste modo, as despesas que foram elencadas nos autos sofreram um grande agravamento, onerando e muito o rendimento do insolvente.

7. Pelo que, o insolvente ainda não conseguiu cumprir a decisão proferida no que tange à entrega dos valores objeto de cessão. Mas não o fez dolosamente ou com grave negligência nem com a intenção de prejudicar por esse facto a satisfação dos créditos sobre a insolvência.

8. Por outro lado, o insolvente tem solicitado ao filho o empréstimo de veículo para se deslocar para os tratamentos, consultas, fisioterapia. Veículo que é conduzido pelos familiares e amigos disponíveis. Ora, se assim é, não pode o insolvente deixar de arcar com algumas despesas de manutenção e reparação da viatura e do respectivo seguro.

9. As despesas avolumam-se, tendo aumentado nos últimos meses de forma drástica e diga-se, mesmo, dramática.

Nomeadamente, mas sem limitar, as medicamentosas, as relativas ao apoio pessoal e de vivencia que necessita, as de deslocação e despesas inerentes. E a par destas, o aumento do custo de vida derivado da inflação e do aumento gravoso dos bens essenciais, das prestações de serviço tais como energia elétrica, água, gás, telecomunicações…

10. Tais aumentos estão visíveis a toda a população e afetam a todos, sendo que a respetiva perceção decorre do senso comum e do nosso dia-a-dia. Não há como não nos apercebermos de tal e da desadequação dos rendimentos dos portugueses a esses aumentos. E o insolvente não passa incólume também a tal situação nacional de aumento exponencial de todas as despesas correntes.

11. Por outro lado, o insolvente sente-se completamente atrofiado pelas suas necessidades e despesas e preocupado com o fato de se encontrar impedido de realizar as entregas nos autos. Vê, como muitos, os seus rendimentos a serem consumidos pelas despesas supra, nada ou mesmo muito pouco lhe restando.

12. Encara com muito receio o futuro no qual perspetiva que tais despesas só venham a aumentar a todos os níveis.

13. Esmagado por tais circunstâncias, não teve como se disse possibilidade para entregar a totalidade do rendimento disponível.

14. Por outro lado, tem manifesta vontade em proceder às entregas dos valores apurados á massa fiduciária.

15. Tendo já iniciado entregas no valor mensal de € 500,00 conforme comprovativo de depósito que se junta como documento nº 1.

16. Razões pelas quais, pretende proceder à entrega prestacional do valor apurado, o que muito humildemente requer.

17. Ademais, abrigo do artigo 242.º-A do CIRE - Prorrogação do período de cessão – é possível igualmente a prorrogação do prazo de exoneração pelos anos que faltariam para perfazer os cinco anos inicialmente previstos.

b) Quanto ao pedido adicional de cessação antecipada formulado pela credora B..., S.À.R.L.

18. Veio este credor alegar que o período de cessão de rendimentos não deverá ser prorrogado, atendendo à não existência de probabilidade séria de cumprimento, pelo devedor, das obrigações às quais se encontra adstrito, nomeadamente, a entrega do montante devido à fidúcia, atendendo a que não o concretizou anteriormente na altura devida, em grave prejuízo para a satisfação dos créditos sobre a insolvência.

19. Doutro passo, veio requerer a cessação antecipada do procedimento de exoneração do passivo restante, em virtude da violação dos disposto no artigo 239º nº 4 alínea c) do CIRE.

20. Ora o insolvente pelos motivos expostos nos autos e supra repetidos (consideração de diferente período para o início da cessão dos rendimentos com o trânsito em julgamento e agravamento da sua situação de saúde e encarecimento das suas despesas mensais) veio requerer a prorrogação do prazo por entender que com o alargamento do prazo em questão poderá mensalmente proceder à entregas e concluir a sua exoneração.

21. Existindo o comprometimento da sua parte ao cumprimento das obrigações a que se refere o n.º 1, no período adicional.

22. Nos termos do disposto no artigo 242º-A do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas o juiz pode prorrogar o período de cessão.

23. O insolvente AA veio alegar que o incumprimento se deveu, essencialmente, à sua situação de saúde tendo já, como forma de demonstrar boa-fé e vontade de cumprir, junto comprovativo de entrega à fidúcia da quantia de €500,00 e que irá aumentar mensalmente.

24. O insolvente sempre informou o tribunal das suas dificuldades de saúde e dependência de terceiros neste âmbito.

25. No mais, a prorrogação do período de cessão por três anos é a solução mais equitativa e benéfica para todos os Credores, uma vez que o insolvente apenas dispõe da pensão, uma vez que tudo o mais foi liquidado no âmbito deste processo.

26. Atenta a sua idade, não está em condições de adquirir qualquer outro património, pelo que não se perspetiva que na sua vida consiga pagar o remanescente dos créditos reclamados.

27. Pelo que a forma mais equitativa de satisfazer os Credores seria pela prorrogação do período de cessão, pois apenas este salvaguarda a igualdade entre Credores, os quais (à presente data), são todos comuns.

28. Por fim, reitera-se que probabilidade séria do cumprimento mais se justifica quando se verte sobre os factos provados no âmbito destes autos concluem pela realidade de que o Insolvente teve contingências de saúde de tal escala que o impediram da obrigação de entrega atempadamente.

29. Neste seguimento, é de concluir que se encontram verificados os pressupostos legais e factuais para a prorrogação do período de cessão por três anos, em conformidade com o art. 242º-A do CIRE.

Ademais,

30. Determina o artigo 243º do CIRE que antes ainda de terminado o período da cessão, deve o juiz recusar a exoneração, a requerimento fundamentado de algum credor da insolvência, do administrador da insolvência, se estiver ainda em funções, ou do fiduciário, caso este tenha sido incumbido de fiscalizar o cumprimento das obrigações do devedor, quando: a) O devedor tiver dolosamente ou com grave negligência violado alguma das obrigações que lhe são impostas pelo artigo 239.º, prejudicando por esse facto a satisfação dos créditos sobre a insolvência;

31. Ora, entende o insolvente que não foram invocados nos autos quaisquer fundamentos que permitam concluir pela violação dolosa ou com grave negligência de alguma das obrigações que lhe são impostas pelo artigo 239.º, prejudicando por esse facto a satisfação dos créditos sobre a insolvência.

32. Violação que entende não ter ocorrido nos termos anteriormente referidos.

33. Não se podendo concluir, salvo devido respeito por douta opinião em sentido diverso, pela violação dolosa ou com grave negligência de alguma das obrigações que lhe são impostas pelo artigo 239.º, prejudicando por esse facto a satisfação dos créditos sobre a insolvência.

34. Não sendo alegados factos concretos de onde decorra que o devedor poderia ter procedido a tal entrega, o que apenas não fez porque não quis ou porque não teve o cuidado que lhe era exigível para tal entrega.

c) Requerimentos dos credores Banco 1..., S.A. e A..., SA

35. O Banco 1..., S.A., veio subscrever o requerimento apresentado pela Credora B..., S.À.R.L.2, requerendo a cessação antecipada da exoneração do passivo restante, nos termos e para os efeitos do disposto da alínea a), do n.º 1 do artigo 243.º do CIRE.

36. Por sua vez, a A..., SA ermos em que não havendo razões fundamentadas que permitam sustentar o pedido de prorrogação, deve, ao invés, ser determinada a cessação antecipada da exoneração, conforme previsto no n.º 1 al. a) do 243.º do CIRE.

37. Quanto aos requerimentos apresentados pelos credores dá por reproduzida toda a factualidade anteriormente referida.

38. Concluindo também que os credores não invocam factos dos quais possa resultar a atuação dolosa ou com culpa grave e não por circunstâncias exógenas ou que não lhe sejam imputáveis do insolvente, nem os concretos prejuízos para a satisfação dos créditos da insolvência.

39. Devendo improceder os pedidos apresentados pelos credores.”.

36) No requerimento referido em 35, o insolvente termina requerendo o seguinte:

“TERMOS EM QUE REQUER A V. EXA. NÃO SEJA RECUSADO ANTECIPADAMENTE O PROCEDIMENTO DE EXONERAÇÃO NOS TERMOS DO N.º 3 DO ART. 243.º DO C.I.R.E., INDEFERINDO O PEDIDO DE CESSAÇÃO ANTECIPADA DO PROCEDIMENTO DE EXONERAÇÃO.

REQUERENDO AINDA AUTORIZAÇÃO PARA PROCEDER À ENTREGA DO VALOR À MASSA FIDUCIÁRIA DE FORMA PRESTACIONAL NOS TERMOS DO ARTIGO 242º-A DO CÓDIGO DA INSOLVÊNCIA E DA RECUPERAÇÃO DE EMPRESAS.”.

2.

OS FACTOS E O DIREITO

2.1.

A exoneração do passivo restante, cujo regime se mostra vertido essencialmente nos arts. 235.º a 248.º do CIRE, representa, como é por demais sabido, um benefício muito relevante concedido ao devedor pessoa singular declarado insolvente, por lhe permitir libertar-se do peso do passivo e refazer a sua vida económica, constituindo uma causa de extinção das obrigações.

Nos termos do art. 235.º, “se o devedor for uma pessoa singular, pode ser-lhe concedida a exoneração dos créditos sobre a insolvência que não forem integralmente pagos no processo de insolvência ou nos três anos posteriores ao encerramento deste, nos termos das disposições deste capítulo”.

Por sua vez, o art. 239.º do CIRE, sob a epígrafe “Cessão do rendimento disponível”, dispõe assim:

“1 - Não havendo motivo para indeferimento liminar, é proferido o despacho inicial, na assembleia de apreciação do relatório (…).

2 - O despacho inicial determina que, durante os três anos subsequentes ao encerramento do processo de insolvência, neste capítulo designado por período da cessão, o rendimento disponível que o devedor venha a auferir se considera cedido a entidade, neste capítulo designada fiduciário (…).

3 – (…)

4 – Durante o período da cessão, o devedor fica ainda obrigado a:
a) Não ocultar ou dissimular quaisquer rendimentos que aufira, por qualquer título, e a informar o tribunal e o fiduciário sobre os seus rendimentos e património na forma e no prazo em que isso lhe seja requisitado;
b) (…);
c) Entregar imediatamente ao fiduciário, quando por si recebida, a parte dos seus rendimentos objecto de cessão;

(…)”.

A propósito da figura da exoneração do passivo restante, sob o ponto 45) do Preâmbulo da Lei 53/2004, de 18 de março, pronuncia-se assim o legislador:

[O Código conjuga de forma inovadora o princípio fundamental do ressarcimento dos credores com a atribuição aos devedores singulares insolventes da possibilidade de se libertarem de algumas das suas dívidas, e assim lhes permitir a sua reabilitação económica. O princípio do fresh start para as pessoas singulares de boa fé incorridas em situação de insolvência, tão difundido nos Estados Unidos, e recentemente incorporado na legislação alemã da insolvência, é agora também acolhido entre nós, através do regime da «exoneração do passivo restante».

O princípio geral nesta matéria é o de poder ser concedida ao devedor pessoa singular a exoneração dos créditos sobre a insolvência que não forem integralmente pagos no processo de insolvência ou nos cinco anos posteriores ao encerramento deste.

A efectiva obtenção de tal benefício supõe, portanto, que, após a sujeição a processo de insolvência, o devedor permaneça por um período de cinco anos - designado período da cessão - ainda adstrito ao pagamento dos créditos da insolvência que não hajam sido integralmente satisfeitos. Durante esse período, ele assume, entre várias outras obrigações, a de ceder o seu rendimento disponível (tal como definido no Código) a um fiduciário (entidade designada pelo tribunal de entre as inscritas na lista oficial de administradores da insolvência), que afectará os montantes recebidos ao pagamento dos credores. No termo desse período, tendo o devedor cumprido, para com os credores, todos os deveres que sobre ele impendiam, é proferido despacho de exoneração, que liberta o devedor das eventuais dívidas ainda pendentes de

A ponderação dos requisitos exigidos ao devedor e da conduta recta que ele teve necessariamente de adoptar justificará, então, que lhe seja concedido o benefício da exoneração, permitindo a sua reintegração plena na vida económica.

Esclareça-se que a aplicação deste regime é independente da de outros procedimentos extrajudiciais ou afins destinados ao tratamento do sobreendividamento de pessoas singulares, designadamente daqueles que relevem da legislação especial relativa a consumidores.]

Nas palavras de CATARINA SERRA[2], o regime da exoneração do passivo restante “implica fundamentalmente  que, depois do processo de insolvência e durante algum tempo, os rendimentos do devedor sejam afectados à satisfação dos direitos de crédito remanescentes, produzindo-se, no final, a extinção dos créditos que não tenha sido possível cumprir por essa via, durante tal período. A intenção da lei é a de libertar o devedor das suas obrigações, realizar uma espécie de azzeramento da sua posição passiva, para que, depois de “aprendida a lição” ele possa retomar a sua vida e, se for caso disso, o exercício da sua actividade económica ou empresarial”. O objectivo é, por outras palavras, dar ao sujeito a oportunidade de (re)começar do zero, de um “fresh start”.

Ou seja, a prolação de despacho inicial de admissibilidade do incidente de exoneração do passivo restante não assegura de modo algum a concessão da pretendida exoneração. Representa apenas a concessão de um período temporal durante o qual o devedor fica sujeito a uma espécie de regime de prova de ser merecedor de pretendido benefício, assente no cumprimento de múltiplas obrigações.

Tanto assim que antes ainda de terminado o período da cessão, a exoneração deve ser recusada a requerimento fundamentado de algum credor da insolvência, do administrador da insolvência ou do fiduciário, nas situações previstas no art. 243.º, n.º 1, designadamente quando: “a) O devedor tiver dolosamente ou com grave negligência violado alguma das obrigações que lhe são impostas pelo artigo 239.º, prejudicando por esse facto a satisfação dos créditos sobre a insolvência; b) Se apure a existência de alguma das circunstâncias referidas nas alíneas b), e) e f) do n.º 1 do artigo 238.º, se apenas tiver sido conhecida pelo requerente após o despacho inicial ou for de verificação superveniente; c) A decisão do incidente de qualificação da insolvência tiver concluído pela existência de culpa do devedor na criação ou agravamento da situação de insolvência”.

E acrescenta-se no n.º 3 do cit. art. 243.º: “Quando o requerimento se baseie nas alíneas a) e b) do n.º 1, o juiz deve ouvir o devedor, o fiduciário e os credores da insolvência antes de decidir a questão; a exoneração é sempre recusada se o devedor, sem motivo razoável, não fornecer no prazo que lhe seja fixado informações que comprovem o cumprimento das suas obrigações, ou, devidamente convocado, faltar injustificadamente à audiência em que deveria prestá-las”.

Das normas acabadas de citar retira-se, desde logo, que a cessação antecipada da exoneração do passivo restante depende da formulação de pedido fundamentado, para o qual apenas têm legitimidade os credores, o administrador da insolvência e o fiduciário; representa ela própria uma espécie de incidente dentro do próprio incidente de exoneração do passivo restante; quando o pedido de cessação se baseie nas als. a) e b) do n.º 1 do art. 243.º, o juiz deve ouvir o devedor, o fiduciário e os credores da insolvência antes de decidir a questão; seguindo tal tramitação, a exoneração é sempre recusada se o devedor, sem motivo razoável, não fornecer no prazo que lhe seja fixado informações que comprovem o cumprimento das suas obrigações, ou, devidamente convocado, faltar injustificadamente à audiência em que deveria prestá-las.

É fora de dúvida que a decisão de recusa antecipada da exoneração do passivo restante, sustentada na previsão isolada da al. a) do n.º 1 do art. 243.º do CIRE, pressupõe a verificação cumulativa dos seguintes pressupostos: a) violação das obrigações impostas ao insolvente como corolário da admissão liminar do pedido de exoneração; b) que essa violação decorra de uma atuação dolosa ou com grave negligência; c) verificação de prejuízo para a satisfação dos créditos sobre a insolvência; d) e existência de nexo de causalidade entre a conduta e o prejuízo.

Não custa reconhecer a especial dificuldade, tanto para os credores como para o fiduciário, em fazer prova dos pressupostos que vão além do mero incumprimento objetivo da obrigação.

E daí que o legislador tenha concebido a seguinte regra: baseando-se o requerimento de recusa da exoneração na al. a) do n.º 1 do art. 243.º, o mesmo é sempre deferido, por via do comando normativo inserto na segunda parte do n.º 3 do mesmo artigo, se o devedor, sem motivo razoável, não fornecer ao tribunal, no prazo que lhe seja indicado para o efeito, informações que comprovem o cumprimento das suas obrigações.

A leitura conjugada do estatuído nas citadas disposições legais, leva-nos a concluir que o comportamento objetivo assumido pelo devedor, traduzido na falta de fornecimento de informações que comprovem o cumprimento das suas obrigações, sem apresentar justificação para tal, no seguimento de notificação para cumprimento efetuada pelo tribunal, produz efeito cominatório ou sancionatório, em termos de se considerarem verificados os pressupostos da cessação antecipada da exoneração do passivo restante.

Ou, em termos de repartição do ónus da prova nesta matéria, constatado o incumprimento objetivo, no período da cessão, da obrigação por parte do devedor, cabe a este demonstrar uma causa justificativa do incumprimento.

Tal leitura é a única que, a nosso ver, confere sentido e razão de ser à norma inserta na segunda parte do n.º 3 do art. 243.º, no confronto com o normativo da alínea a) do n.º 1 do mesmo artigo.

Como se deixou bem salientado no acórdão da Relação de Coimbra de 08.05.2018[3], citando CARVALHO FERNANDES e JOÃO LABAREDA, 2.ª Edição, Quid Juris, pág. 915, [“a segunda parte do n.º 3 determina que a exoneração será sempre recusada se o devedor, tendo-lhe sido determinado que preste informações sobre o cumprimento das suas obrigações, ou convocado para as prestar em audiência, não as fornecer no prazo que lhe for estabelecido, ou faltar a essa audiência, sem invocar, em qualquer dos casos, motivo razoável. A recusa da exoneração constitui, quando se verifiquem estas situações, uma sanção para o comportamento indevido do devedor”. A mesma conclusão, que, aliás, resulta, sem margem para dúvidas, do texto legal, é defendida por Alexandre Soveral Martins, in Um Curso de Direito da Insolvência, Almedina, 2015, a pág. 557].

2.2.

No caso dos autos, sem negar a falta de entrega dos montantes objetivamente devidos, o Apelante não aceita que a sua omissão possa ser qualificada como dolosa ou sequer gravemente negligente, por ter apresentado justificação razoável para tal, assim como considera que de tal omissão não resultou provado qualquer prejuízo relevante para os credores, pelo que conclui no sentido da falta de verificação dos pressupostos necessários à declaração de cessação antecipada da exoneração do passivo restante.

Aduz ter manifestado vontade em proceder à entrega do valor devido em prestações mensais, o que lhe deveria ter sido concedido, e que em qualquer caso, lhe deveria ter sido concedida, ao abrigo do artigo 242.º-A do CIRE, aditado pela Lei n.º 9/2022, de 11.01, a prorrogação do período de cessão, por existir probabilidade séria de, nesse período alargado, vir a cumprir as obrigações a que se sujeitou inicialmente para obter a exoneração.

Tal visão mostra-se rejeitada em toda a linha pela decisão recorrida, cujos passos fundamentadores mais relevantes passamos a transcrever e sobre os quais emitiremos a nossa posição.

Assim:

[Desde logo, importa salientar que o insolvente não colocou em causa os valores apurados pelo fiduciário como tendo sido por si recebidos e não entregues, relativamente ao primeiro e ao segundo anos do período de cessão, respectivamente, nos montantes de € 12.933,09 e € 13.197,32, num valor total de € 26.130,41.

(…)

Sendo que o insolvente, apenas em 20/11/2023, procedeu à entrega de € 500,00 e com excepção deste valor, desde o inicio do período de cessão, nada mais entregou.

(…)

É verdade que o insolvente sustentou que ficou convencido que o período da cessão teve início apenas em Fevereiro de 2022, com o trânsito em julgado da decisão sumária proferida pelo Tribunal da Relação do Porto que alterou o sustento mínimo inicialmente fixado.

Efectivamente, em 13/09/2021, foi proferido despacho inicial admitindo liminarmente o pedido de exoneração do passivo restante e fixando como sustento mínimo o montante até ao valor liquido mensal correspondente a 1,25 x (14 x SMMG : 12).

O insolvente recorreu dessa decisão apenas quanto à fixação do sustento mínimo fixado, sendo que, em 15/01/2022, foi proferida douta decisão sumária pelo Tribunal da Relação do Porto, revogando apenas parcialmente a decisão recorrida na parte objecto do recurso alterando o sustento mínimo fixado para o valor de 2 x (14 x SMMG : 12).

No entanto, como decorre expressamente dos artigos 233º nº 7 e 239º nº 2 do CIRE, o início do período de cessão tem por referência o encerramento do processo de insolvência, ainda que apenas com os efeitos restritos previstos na primeira norma.

Sendo certo que o despacho inicial onde foi determinado tal encerramento, proferido em 13/09/2021, produziu os seus efeitos a partir de tal data, independentemente do seu trânsito em julgado, na medida em que, conforme decorre do despacho que o admitiu e expressamente do artigo 14º nº 5 do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas, o recurso foi admitido com efeito devolutivo e não suspensivo.

Donde o insolvente teria de cumprir os seus deveres a partir de tal data, sem prejuízo das alterações que viessem a decorrer de uma eventual revogação da decisão tão só quanto ao montante a ceder.

Para concluir que, ao contrário do que o insolvente sustenta, o período de cessão   iniciou-se em 13/09/2021].

O que deixámos transcrito evidencia com toda a justiça o equívoco do Insolvente acerca do momento em que se iniciou o período de cessão, sem que haja o mínimo de justificação racional para o mesmo, atenta a clareza das normas que o impõem.

Assim, a alegação feita pelo Insolvente, no sentido de que o início do período de cessão apenas se iniciaria com o trânsito em julgado da decisão sumária proferida por este Tribunal da Relação, mencionada em 3) dos factos provados, não constitui, de modo algum, justificação válida para o não cumprimento das obrigações do Insolvente, associadas ao procedimento da exoneração, a partir da data do encerramento do processo.

Relativamente às demais justificações apresentadas pelo Insolvente para não entregar os montantes devidos, traduzidas no agravamento da sua saúde e consequente repercussão na sua situação financeira, vejamos o que se deixou explanado na decisão recorrida:

[Por outro lado, importa ainda relevar que o próprio insolvente alegou inicialmente na petição inicial e nas próprias alegações de recurso, que além da pensão de alimentos (que foi considerada irrelevante), teria despesas de habitação com eletricidade, água telefone e seguro no valor total de € 117,00, com alimentação o valor de € 345,00 (considerando que vive sozinho e não consegue, por motivos de saúde, confecionar os seus almoços e jantares tendo por referência o valor médio de € 7,5 por refeição), despesas de saúde no valor médio mensal de € 175,00 e despesas com deslocações para consultas em especialidade entre € 300,00/€ 400,00.

Tais despesas ascendem ao valor total de € 1.037,00.

Essas mesmas despesas e o estado de saúde do insolvente foram tidas em conta no sustento mínimo fixado na decisão sumária proferida pelo Tribunal da Relação do Porto, correspondendo em 2021 a um valor de € 1.300.00, em 2022 a um valor de € 1.410,00 e em 2023 a um valor de € 1.520,00.

Conforme decorre dos relatórios apresentados e dos extratos da Caixa Geral de Aposentações, o insolvente recebeu sempre valores superiores e nada entregou.

E ainda que se considere que o insolvente passou a despender a partir de determinada altura um valor acrescido de € 200,00 para apoio domiciliário (cuja data nem clarificou), ainda assim, deveria ter procedido à entrega dos valores remanescentes, não sendo tal facto passível de explicar a falta de entrega, no momento próprio, de um valor de € 26.130,41, tendo procedido apenas à entrega do valor de € 500,00, em 20/11/2023, depois de ter sido requerida a cessação antecipada.

Por outro lado, não se pode esquecer que, como resulta expressamente da alínea c) do nº 4 do artigo 239º do CIRE, o devedor estava obrigado a entregar imediatamente ao fiduciário os rendimentos em questão.

Neste contexto impunha-se-lhe justificar previamente a impossibilidade de não proceder à totalidade dos rendimentos que ultrapassaram o sustento mínimo que lhe foi fixado e não que se remetesse ao silêncio e a uma atitude de total passividade, assumindo que a não entrega dos rendimentos, de valor considerável, estava legitimada, sem mais.

Para concluir que a não entrega dos rendimentos em causa, atento o seu elevado valor, face a tudo o que se expôs, denota claramente uma conduta censurável e de manifesto desinteresse, já que o devedor não poderia ignorar que tais quantias, não sendo canalizadas para o pagamento dos créditos da insolvência, prejudicariam necessariamente os credores.

Tendo atuado com dolo, culpa intensa essa revelada no facto de a conduta (não entrega imediata dos rendimentos auferidos) ter perdurado por um longo e continuado período de tempo (não se reportando apenas a um simples ato esporádico ou isolado) e na violação reiterada da violação de entrega das quantias a ceder.

Comportamento que não pode deixar de revelar um conhecimento e uma vontade deliberada de incumprir.

Sendo certo que a não entrega das quantias devidas assume um prejuízo para os credores que se vêm privados de quantias que poderiam ser imputadas, pelo menos, para pagamento parcial dos seus créditos.

Conduta tanto mais censurável num quadro em que, conforme o legislador consignou expressamente na exposição de motivos da Lei nº 53/2004 de 18 de Março (que aprovou o CIRE), a exoneração do passivo restante baseia-se no princípio do fresh start para as pessoas singulares de boa fé incorridas em situação de insolvência.

No pressuposto de que, durante o período de cessão, o devedor cumpra para com os credores todos os deveres que sobre ele impendiam e por ponderação da conduta recta que ele teve necessariamente de adotar.

E também não se poderá ignorar que a exoneração é uma opção do devedor que lhe impõe um sacrifício e responsabilidade acrescidos relativamente ao comum dos cidadãos e ao que resultaria fora de um quadro de exoneração, dado que tal opção também acarretará para os credores (sem que estes o possam evitar) uma restrição parcial ou mesmo exclusão total dos seus créditos.].

Também nesta parte não podemos deixar de acolher por inteiro a visão do Exmo. Juiz de Direito, por retratar de forma lúcida o comportamento reiteradamente incumpridor do Insolvente, para o qual este não logrou apresentar justificação razoável.

Importará apenas reforçar a ideia de que qualquer alteração superveniente das circunstâncias que estiveram na base da fixação do rendimento disponível, em ordem a beneficiar o devedor, deverão oportunamente ser alegadas e demonstradas por este, em ordem a poder eventualmente conduzir a uma alteração do dito “rendimento disponível”. Não foi isso que se verificou, claramente, no caso dos autos, como bem evidenciado pela decisão recorrida. O Insolvente limitou-se sempre a reagir, em face das sucessivas imputações de incumprimento objetivo das obrigações a que estava adstrito, mediante alegações carecidas de substanciação fática suficiente.

Relativamente ao prejuízo para os credores, decorrente da conduta omissiva do Insolvente, o mesmo é inquestionável, porquanto os montantes não entregues deixaram de poder ser afetos ao pagamento dos créditos da insolvência.

Mas outros motivos há para recusar a cessação antecipada do procedimento em questão, conforme se deixou bem explicitado na decisão recorrida, e que passamos a transcrever:

[Por outro lado, cumpre ainda relevar que o fiduciário, por requerimento de 26/10/2022, veio relatar o incumprimento do insolvente quanto à prestação de informações e envio de documentos, tendo requerido a notificação do devedor para proceder à entrega da documentação e informação solicitada, sob pena de ser revogado o despacho inicial de exoneração do passivo restante.

Tal requerimento foi notificado pela secretaria nesse mesmo dia ao insolvente na pessoa da sua mandatária, para que desse cumprimento ao solicitado.

Por requerimento de 28/11/2022, o fiduciário informou continuar impossibilitado de apresentar o relatório anual, por total ausência de elementos / informação, dado que nenhum elemento lhe foi enviado pelo devedor, não obstante a notificação efetuada pela secretaria.

Só por requerimento de 15/12/2022 (decorrido cerca de mês e meio) é que o insolvente, através da sua mandatária, veio comunicar que se encontrava a aguardar a emissão de extrato de remunerações requerida ao CNP para remessa ao AI, alegando que no documento anual emitido pelo Centro Nacional de Pensões que juntou não eram identificadas mensalmente as remunerações e descontos realizados. Tendo requerido a concessão do prazo de 10 dias para o efeito.

Mas no referido prazo, o insolvente nada juntou.

Por requerimento 06/01/2023, o fiduciário informou continuar impossibilitado de apresentar o relatório anual, por total ausência de elementos / informação, dado que nenhum elemento lhe foi enviado pelo devedor, não obstante a notificação efetuada pela secretaria.

Tendo tal requerimento sido notificado pela secretaria nesse mesmo dia ao insolvente na pessoa da sua mandatária, para que desse cumprimento ao solicitado.

Na sequência de despacho, o fiduciário, em 13/03/2023, apresentou o relatório referente ao primeiro ano do período de cessão, elencando as notificações feitas ao insolvente e informando que nenhuma documentação havia sido por si rececionada ou junta aos autos pelo devedor, juntando cópia de um email remetido à mandatária do insolvente com o teor que resulta de 15).

Em 12/04/2023 foi proferido despacho, ordenando, entre o mais, a notificação do insolvente, na pessoa da sua mandatária e na sua própria pessoa, através de carta registada simples remetida para a última morada comunicada, com a cominação expressa a que alude o artigo 243º nº 3 do CIRE, para, em 10 dias:

“i) Pronunciar-se quanto à requerida cessação antecipada do procedimento e justificar a razão pela qual não prestou as informações solicitadas e não remeteu os documentos em falta e ainda para, em igual, juntar tais documentos aos autos;

ii) Juntar cópia dos recibos dos salários auferidos ou documentos dos subsídios ou pensões de reforma de que tenha beneficiado, desde Setembro de 2021 até à presente data, bem como das declarações fiscais de rendimentos, apresentadas para efeitos de IRS, relativas aos rendimentos auferidos em 2021 e 2022 (esta última caso já tenha sido entregue).”.

Sendo que o insolvente, apenas em 03/05/2023, justificou a não prestação das informações solicitadas, em data anterior, alegando que se encontrava a aguardar a emissão de extracto de remunerações requerida ao CNP para remessa ao fiduciário, sustentando ter solicitado o prazo de 10 dias para o efeito, o que não foi possível.

Sem prejuízo de ter alegado ter procedido à entrega da declaração anual do IRS de 2021 e da lista emitida pelo CNP dos valores líquidos, através de email remetido ao fiduciário em 14/03/2023, sem prejuízo de ter fornecido ao fiduciário a password de acesso ao site da Autoridade Tributária e Aduaneira.

O insolvente juntou ainda aos autos lista emitida pelo CNP dos valores líquidos e a referida declaração de IRS.

Em 14/06/2023 foi proferido despacho, ordenando, entre o mais, a notificação do insolvente, para, em 10 dias, vir comprovar documentalmente em que data dirigiu o pedido ao Centro Nacional de Pensões solicitando a lista dos valores líquidos recebidos.

Na sequência do que, o insolvente apresentou o requerimento, com data de 30/06/2023, alegando não lhe ser possível comprová-lo, pelas razões expostas em 23), no essencial, porque a sua mandatária alegou ter feito o pedido por email que terá eliminado.

Constatando-se que o fiduciário apenas ficou habilitado a apurar os rendimentos referentes ao primeiro ano do período de cessão decorridos mais de cinco meses desde o momento em que lhe foram pedidas as informações para o efeito.

Por outro lado, conforme resulta do disposto na alínea a) do nº 4 do artigo 239º do CIRE, durante o período da cessão, o devedor fica obrigado a, entre o mais, informar o tribunal e o fiduciário sobre os seus rendimentos e património, não espontaneamente, mas sim na forma e no prazo em que isso lhe seja requisitado.

Sendo a exoneração sempre recusada se o devedor, sem motivo razoável, não fornecer no prazo que lhe seja fixado informações que comprovem o cumprimento das suas obrigações, ou, devidamente convocado, faltar injustificadamente à audiência em que deveria prestá-las (artigo 243º nº 3 do CIRE).

Como bem referem CARVALHO FERNANDES/J. LABAREDA (Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas Anotado, 2ª edição, 2013, p. 915) “Em princípio, o juiz, atendendo aos elementos de que disponha, tanto pode decidir no sentido de determinar a cessação antecipada do procedimento de exoneração como no sentido contrário, e, consequentemente, recusar ou não a exoneração.

Todavia, a segunda parte do n.° 3 determina que a exoneração será sempre recusada se o devedor, tendo-lhe sido determinado que preste informações sobre o cumprimento das suas obrigações, ou convocado para as prestar em audiência, não as fornecer no prazo que lhe for estabelecido, ou faltar a essa audiência, sem invocar, em qualquer dos casos, motivo razoável.

A recusa da exoneração constitui, quando se verifiquem estas situações, uma sanção para o comportamento indevido do devedor.”.

Como bem se salientou no acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 22/03/2021 (base de dados da DGSI, processo nº 8489/15.7T8VNG-B.P1), no caso previsto na segunda parte do nº 3 do artigo 243º do CIRE “(…) não se exige que a omissão de prestação de informações determine prejuízo para a satisfação dos direitos dos credores, constituindo a recusa de exoneração uma sanção para o devedor inadimplente. A omissão de oferecimento de documentação comprovativa dos rendimentos auferidos num certo período é uma forma de prestação documentada de informações sobre os aludidos rendimentos. A omissão de apresentação dessa prova documental constitui uma violação do dever processual contemplado na segunda parte do nº 3, do artigo 243º do CIRE.].

A análise vinda de citar apresenta-se-nos isenta de censura, respeitando a factualidade apurada, não impugnada de forma válida em qualquer segmento, impondo-se com toda a lógica e racionalidade aos argumentos expendidos pelo Apelante nas suas alegações recursivas.

Também as pretensões de “pagamento em prestações” dos montantes devidos e de “prorrogação do período de cessão formuladas pelo Apelante, enquanto última escapatória no contexto do incumprimento que deixámos caraterizado, não são merecedoras de acolhimento, pelas razões vertidas na decisão recorrida, e que sufragamos sem esforço: [(…) importa ainda ponderar que o insolvente, aludindo ao artigo 242º-A do Código de Processo Civil, requereu o pagamento das quantias em falta em prestações. Por força do disposto no artigo 242º-A do CIRE (na redacção introduzida pela Lei nº 9/2022 de 11 de Janeiro): 1 - Sem prejuízo do disposto na segunda parte do n.º 3 do artigo 243.º, o juiz pode prorrogar o período de cessão, até ao máximo de três anos, antes de terminado aquele período e por uma única vez, mediante requerimento fundamentado: a) Do devedor; b) De algum credor da insolvência; c) Do administrador da insolvência, se este ainda estiver em funções; ou d) Do fiduciário que tenha sido incumbido de fiscalizar o cumprimento das obrigações do devedor, caso este tenha violado alguma das obrigações que lhe são impostas pelo artigo 239.º, prejudicando por esse facto a satisfação dos créditos sobre a insolvência. 2 - O requerimento apenas pode ser apresentado dentro dos seis meses seguintes à data em que o requerente teve ou poderia ter tido conhecimento dos fundamentos invocados, sendo oferecida logo a respectiva prova. 3 - O juiz deve ouvir o devedor, o fiduciário e os credores da insolvência antes de decidir a questão, e decretar a prorrogação apenas se concluir pela existência de probabilidade séria de cumprimento, pelo devedor, das obrigações a que se refere o n.º 1, no período adicional. Desde logo, cumpre relevar que, conforme decorre do referido preceito legal e da própria lógica das coisas (já que, não havendo incumprimento, terá de ser proferido despacho final concedendo a exoneração do passivo restante), o fundamento para que ocorra a prorrogação do período de cessão é que exista um incumprimento de algum dos deveres fixados e que daí tenha decorrido prejuízo para a satisfação dos créditos sobre a insolvência. Daí que se exija que o requerente alegue não só os factos que justificarão que lhe seja dada uma segunda chance de vir a demonstrar o cumprimento dos deveres legais que decorrem do procedimento de exoneração e que por essa via será merecedor da exoneração, mas ainda os factos de onde decorre a violação de alguma das obrigações prevista no artigo 239º e prejuízo para a satisfação dos créditos sobre a insolvência. Aqui chegados, cumpre relevar, desde logo, que o insolvente não requereu a prorrogação propriamente dita, mas tão só o pagamento em prestações, pese embora aludindo ao artigo 242º-A do CIRE. Mas independentemente disso cumpre aferir se existem fundamentos para a cessação antecipada do procedimento de exoneração e nesse caso se se justificará não a recusa da exoneração, mas antes a prorrogação do período de cessão em ordem a que o insolvente ainda possa cumprir as suas obrigações. Como se disse, depois de ouvir o devedor, o fiduciário e os credores da insolvência, o juiz poderá então decretar a prorrogação apenas se concluir pela existência de probabilidade séria de cumprimento, pelo devedor, das referidas obrigações no período adicional. Nem no requerimento apresentado em 04/07/2023 e nem nos requerimentos subsequentes o insolvente reconhece qualquer incumprimento e/ou alega facto de onde decorra vir a existir uma probabilidade séria de cumprimento. O que se extrai dos seus requerimentos é que entende que nada tinha a entregar porque todas as quantias que auferiu foram consumidas pelas suas despesas (que como se disse nem quantificou e nem comprovou documentalmente). Não sendo possível fazer um juízo de prognose favorável, face a tudo o que se expôs para fundamentar a procedência dos pedidos de cessação antecipada do procedimento de exoneração (atendendo, no essencial, ao facto de durante mais de dois anos decorridos, o insolvente apenas ter procedido à entrega do valor de € 500,00, estando em divida um valor substancial, tendo incumprindo de forma grave igualmente as obrigações de colaboração que sobre ele impendiam) e nem se vislumbrando, face ao que o próprio sustenta e atendendo aos seus rendimentos, como é que poderá vir a pagar tal valor, acrescido das quantias que ainda se vencerão de acordo com o sustento mínimo fixado. Para concluir pelo indeferimento do pagamento a prestações, pedido com fundamento no artigo 242º-A do CIRE.].

Resulta de tudo quanto deixámos exposto a manifesta ausência de motivos para censurar a decisão recorrida, sendo antes merecedora de especial elogio, tanto pelo cuidado posto na seleção dos factos relevantes, como pela boa aplicação do direito.

Improcede, pois, o recurso.

2.3.

As custas do recurso são da responsabilidade do Apelante (art. 527.º, n.ºs 1 e 2, do CPCivil, e 1.º do RCProcessuais).

IV.

DECISÃO

Pelos fundamentos expostos, julgamos o recurso improcedente e, em consequência, decidimos:
a) Manter a decisão recorrida; e
b) Condenar o Apelante no pagamento das custas do recurso.


***
Porto, 9 de abril de 2024
Os Juízes Desembargadores,
Fernando Vilares Ferreira
Rodrigues Pires
Márcia Portela
__________________
[1] São deste Código todas as normas doravante citadas sem menção em contrário.
[2] O Novo Regime Português da Insolvência, Uma Introdução, 4.ª Edição, Coimbra, 2010, p. 133.
[3] Relatado por ARLINDO OLIVEIRA no processo 110/14.7TBSPS.C1, acessível em www.dgsi.pt.