Acórdão do Tribunal da Relação do Porto | |||
Processo: |
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Nº Convencional: | JTRP000 | ||
Relator: | PELAYO GONÇALVES | ||
Descritores: | RECLAMAÇÃO | ||
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Nº do Documento: | RP | ||
Data do Acordão: | 09/07/2006 | ||
Votação: | . | ||
Texto Integral: | S | ||
Privacidade: | 1 | ||
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Meio Processual: | RECLAMAÇÃO. | ||
Decisão: | INDEFERIDA. | ||
Indicações Eventuais: | LIVRO 681 - FLS. 42. | ||
Área Temática: | . | ||
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Sumário: | |||
Reclamações: | Rec. 476 4831/06 - 3ª Sec. No Tribunal Judicial de Vila Nova de Famalicão, nos autos de Averiguação Oficiosa que nele pende termos sob o nº. …./05, em que foi requerente o M.P. e requerido B……, o Dr. C……., na qualidade de Conservador do registo Civil dessa comarca, veio por requerimento de fls. 15 interpor recurso do despacho proferido no dia 4 de Abril de 2006, que no seu entender, deveria ser processado como de agravo e com efeito suspensivo. Porém, o Mm. Juiz não recebeu tal recurso por duas razões: a) o recorrente careceu de legitimidade para recorrer; b) o recurso ter sido interposto já fora do prazo – v. fls. 87. Não se conformou o recorrente com a rejeição do seu recurso pelo que usou da faculdade concedida pelo art. 688º do CPC reclamando contra ela para o Presidente do Tribunal da Relação da área. As alegações que nos dirige a expor as razões que justificam que o recurso seja recebido são do seguinte teor: “C……., na qualidade de Conservador do Registo Civil de Vila Nova de Famalicão, nos autos de Averiguação Oficiosa da Paternidade que correu termos no Tribunal Judicial de Vila Nova de Famalicão, e em que foi requerente o Ministério Público e requerido B……, não lhe tendo sido admitido, por despacho de fls. 65, o recurso de agravo que interpôs do despacho de fls. 54, datado de 4/4/2006, com fundamento em ilegitimidade para recorrer e em intempestividade do recurso, VEM RECLAMAR, nos termos do art. 688º do CPC com os fundamentos seguintes. Quanto à legitimidade O requerente, na qualidade em que intervém tem legitimidade ao abrigo do disposto no nº.2, do art. 680º do mencionado Código, que garante o recurso às pessoas directas ou indirectamente prejudicadas pela decisão, e ainda que não sejam partes na causa ou sejam apenas partes acessórias. A lei é clara e transparente, não deixa dúvidas; mesmo assim citamos o Professor Alberto dos Reis (CPC, anotado Vol. V, página 249) – “O recurso está aberto não só a pessoas que intervenham no processo, embora acidentalmente, como também a pessoa que nenhuma intervenção tenham nele. O que importa é que a decisão afecta ou prejudique directamente o recorrente”. Ora, foi dada numa ordem ao Conservador do Registo Civil de Vila Nova de Famalicão para prática dum acto de registo e é ele que o vai executar, logo é interessado e destinatário. E foi dessa ordem notificado (estranhamente, em oficio assinado pelo Exmo Senhor Procurador). Cabe aqui uma interrogação sobre se trata duma ordem, duma decisão judicial no sentido que lhe dá o art. 205º, nº.2 da CRP. Com efeito, o Mm. Juiz a quo escreveu “solicite-se ao senhor Conservador do registo Civil que proceda ao averbamento no assento de nascimento do menor da alteração do nome conforme requerido pelas partes”. Logo, não determina, não decide, apenas faz uma solicitação. Configura mais um despacho de expediente interno, destinado aos funcionários judiciais. E foi por mera cautela que o Conservador do Registo Civil não desatendeu, simplesmente, á referida solicitação. Por isso, interpôs recurso. Não parece que caiba aos Tribunais dar ordens ao Registo Civil para praticar ou deixar de praticar actos da competência deste, salvo se esses actos forem consequência dos efeitos da decisão judicial. Por exemplo, se o tribunal decretar um divórcio, ou uma interdição, ou uma adopção e comunica a decisão à Conservatória do registo Civil, para efeito de averbamento, aquela não pode deixar de o fazer (art. 1º nº 1 - c) e p) e art. 69º nº.1 a), d) e g) do Código do Registo Civil). Salvo melhor opinião, não se afigura despropositado referir que as Conservatórias do Registo Civil e os respectivos conservadores estão na tutela do Ministério da Justiça e do Director-geral dos Registos e do Notariado (art. 49º do regulamento aprovado pelo Decreto-Regulamentar nº. 55/80, de 08/10, publicado em cumprimento do disposto no art. 96º, nº.1 do Decreto-Lei nº. 519-F2/79, de 29/12), não na tutela dos Tribunais, devendo apenas obediência às suas decisões na mesma medida em que a devem todas as entidades (citado art. 205º nº. 2 da CRP). O que está na origem da douta decisão em causa é a divergência de entendimentos entre a Procuradoria da República em Vila Nova de Famalicão e a Conservatória do registo Civil da mesma comarca, relativamente à alteração do nome dos menores subsequente à perfilhação voluntária, no âmbito dos Processos de Averiguação Oficiosa da Maternidade /Paternidade. Entende a procuradoria que deve receber a declaração dos pais no sentido de tal alteração. Defende a Conservatória do registo Civil que essa alteração deve ser requerida na Conservatória, não a atendendo, se aí não for feita. E esta divergência deu já origem a dois Acórdãos do Tribunal da Relação do Porto, tirados nos processos nº. 193/05-3 e 2463/05-2, respectivamente de 03-02-2005 e 07-07-05 (fotocópias anexas). Daqui parece, assim, reforçada a tese da legitimidade do Conservador do registo Civil para recorrer, porque o mesmo é tão interessado na decisão como o Ministério Público. Vai de encontro a posição desta entidade e é contra a do Conservador do Registo Civil. Não existe portanto, ilegitimidade do recorrente. Quanto à tempestividade: O recorrente foi notificado por ofício datado de 20/04 último (certidão junta). Admitindo que a carta tenha sido posta no correio no próprio dia, conclui-se que a notificação se presume feita no dia 24 do dito mês, segunda feira (art. 254º, nº.4 do CPC). Ora, o requerimento de interposição do recurso foi enviado por carta registada em 27 de Abril e foi recebida no Tribunal no dia seguinte (fotocópia junta) – fls. 14. Sendo o prazo de 10 dias, só terminava em 04 de Maio. Portanto, parece-se que só por mero lapso tenha sido invocada a extemporaneidade do recurso, para o não admitir. Pelo exposto também parece claro que não existe extemporaneidade. Assim, e em conclusão: O requerente tem legitimidade para recorrer e fê-lo em tempo. O Mm. Juiz manteve a sua decisão e o M.P. respondeu a pugnar pelo indeferimento da reclamação do modo que consta de fls. 38 e 43 e que aqui se dá por reproduzido. Cumpre decidir. *** O caso em apreço circunscreve-se à legitimidade do reclamante para interpor recurso do despacho do Juiz que lhe ordenou, como Conservador do registo Civil da Comarca, para proceder ao averbamento no assento de nascimento do menor cuja paternidade foi averiguada da alteração do seu nome, designadamente o acrescento do apelido de “D……”. Bem como se tal recurso foi interposto tempestivamente. Como estão juntos aos autos – v. fls. 6 e segts e 26 e segts – já dois doutos acórdãos foram proferidos sobre a questão ora em causa: da legitimidade do Conservador do registo Civil e a do M.P. para proceder á alteração do nome de menor, designadamente, da adição do nome do pai, que voluntariamente perfilhou o menor e autorizou que do nome dele constasse o seu apelido de “D……..”. Quanto á legitimidade do recorrente para interpor recurso de decisão judicial com que não concorde, temos vindo a seguir o entendimento de que, nos termos do art. 680º, nº.1 e 2 do CPC o direito a interpor recurso, de recorrer de decisão judicial, é atribuído apenas, em princípio, a quem for «parte principal na causa, tenha ficado vencido» (nº.1), mas, a título excepcional, é reconhecido também às «pessoas directa e efectivamente prejudicadas pela decisão..., ainda que não sejam partes na causa ou sejam apenas partes acessórias» (nº.2). Sendo que a palavra «vencido» se tem entendido como «prejudicado», aquele a quem a decisão recorrida tenha sido desfavorável. “Da conjugação do art. 680º com o nº.3 do art. 687º, ambos do CPC, resulta que tem legitimidade para recorrer não só as partes principais que tenham ficado vencidas, mas também os terceiros e as partes acessórias que tenham sido directa e efectivamente prejudicados pela decisão, ...” – Ac. T.C. nº. 829/96, de 26/6/1996, in DR. II Série de 5/3/98, e ac. STJ de 7/12/93 – BMJ 432-298. Como exemplos de terceiros com legitimidade para recorrerem das decisões que os afectem directa e efectivamente tem referido a doutrina as testemunhas e peritos quando punidos com multa, bem como depositários, arrematantes quando prejudicados nos seus interesses. Sendo o critério essencial para apurar da legitimidade para recorrer, nos termos do citado nº.2 do art. 680º, é o de saber se da decisão resulta para o recorrente “um prejuízo que directa e efectivamente se repercuta na sua esfera jurídica» - v. Armindo Ribeiro Mendes, in Recursos em Processo Civil, 1992, pág. 163. Donde o “prejuízo” ter de ser real e jurídico. No caso dos autos o recorrente não age no seu interesse individual e pessoal, mas na qualidade de Conservador do Registo Civil de Vila Nova de Famalicão, sendo que a decisão proferida, ofende a orientação prosseguida para alteração de nome dos cidadãos, que, no seu entender, exige dever ser feita por requerimento de ambos os pais na Conservatória. Trata-se de querela entre o Conservador e o M.P. da comarca, comprovada pelos dois acórdãos desta Relação juntos. Agora, surge a questão da legitimidade do Sr. Conservador para defesa da posição que assumiu de recusa de averbamento no assento de nascimento do menor do aditamento de apelido como atrás referimos. Não nos compete apreciar e decidir das razões e fundamentos da inconformidade da Reclamante com a decisão de que pretende recorrer, mas se é, ou não, admissível de recurso, como expressamente prevê e disciplina o citado art. 668º. Trata-se de questão controversa no domínio da legitimidade para que o nome do menor seja alterado, se o pode ser por mera solicitação do M.P. nas A.O.P.I., ou só por requerimento subscrito e assinado pelos pais, dirigido ao Conservador e apresentado na Conservatória devida. Lemos com atenção a resposta do M.P. que “prima facie” deveria proceder, quanto à 1ª questão. Como atrás referimos, o recorrente não age em nome pessoal (nessa posição nenhum prejuízo lhe adviria do decidido nos autos), mas como conservador do organismo de registo Civil, na defesa da interpretação e aplicação dos preceitos legais respeitantes à alteração dos nomes neles registados, por entidade oficial do estado, sem necessidade de patrocínio judiciário e isento de despesas judiciais. Das recusas do Conservador de efectuar algum registo é admissível recurso, nomeadamente nos termos do art. 286º e segts., competindo ao Conservador proferir despacho a sustentar ou a reparar a recusa ou a decisão – art. 288º, nº.2, idem. E para tal tem legitimidade para defender a decisão que proferiu. A decisão de que se pretende recorrer afecta direitos e interesses aplicados e defendidos pelo Cons. Do registo Civil de Vila Nova de Famalicão. Pelo menos poderá constituir solução jurídica em debate que deverá ser processada e decidida em acção própria, para tal fim. Não olvidando que “Os funcionários do registo civil, os párocos e os agentes diplomáticos e consulares, que não cumprirem os deveres impostos neste Código – art. 294º CPC respondem pelos danos a que deram causa. E a alteração do nome de uma pessoa pode causar-lhe danos, mesmo no futuro. Tanto mais que se tratando de questão de solução não pacifica na Doutrina e na Jurisprudência não obsta que o Tribunal da 2ª Instância decida em sentido contrário, com mais elementos, ponderação e juridicamente mais capaz para obtenção da solução legal e justa – art. 689º, nº.1, parte final. Quanto a esta questão a reclamação deveria proceder. Mas não quanto à segunda questão. *** O prazo para interposição do recurso inicia-se com a notificação da decisão – art. 685º, nº 1 e 2 do CPC.O despacho do Mm. Juiz de que se pretende recorrer foi proferido em 4/4706 – v. fls. 80 – e mandado notificar ao Sr. Conservador por despacho do M.P. de 20/4/06, o que foi cumprido pelo oficio do mesmo dia – v. fls. 85. Tendo sido expedido, o recurso conforme oficio da Conservatória, em 27/4/06, e recebido no Tribunal no dia seguinte – v. fls. 83 e 14. Porém já antes pelo oficio citado na resposta da M.P., datado de 6/4/06, de fls. 79, foi junto cópia do despacho do juiz, que mereceu despacho do Sr. Conservador nele exarada em 7/4/06, ordenando diligências. Temos, pois, de reconhecer que o Reclamante teve conhecimento do despacho judicial de que pretende recorrer em 7/4/06 e não em 27 do mesmo mês como alega. Assim sendo, já o prazo de 10 dias havia expirado há cerca de 11 dias, pois apenas foi recebido em Tribunal no dia 28 do mesmo mês. *** Assim sendo, embora se pudesse admitir a legitimidade do Reclamante a interpor o recurso, o certo é que o fez já expirado o prazo para o fazer pelo que teve de ser indeferido como preceitua o art. 687º, nº.3 e 686º, nº.1 do CPC.Se o Sr. Conservador se vale da lei adjectiva geral, do CPC, que invoca na sua reclamação, sabe que do despacho de que pretende recorrer já lhe havia sido notificado desde 7 de Abril de 2006. *** Isto posto, sem necessidade de maior fundamentação, por escusada, INDEFIRO a presente reclamação.Sem custas por não serem devidas pelo Reclamante. *** Porto, 07 de Setembro de 2006 O Vice-Presidente Rui Fernando da Silva Pelayo Gonçalves | ||
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Decisão Texto Integral: |