Acórdão do Tribunal da Relação do Porto | |||
| Processo: |
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| Nº Convencional: | JTRP000 | ||
| Relator: | MARIA DA LUZ SEABRA | ||
| Descritores: | PROCESSO ESPECIAL DE REVITALIZAÇÃO APROVAÇÃO DO PLANO | ||
| Nº do Documento: | RP202510283096/24.6T8STS.P1 | ||
| Data do Acordão: | 10/28/2025 | ||
| Votação: | UNANIMIDADE | ||
| Texto Integral: | S | ||
| Privacidade: | 1 | ||
| Meio Processual: | APELAÇÃO | ||
| Decisão: | REVOGADA | ||
| Indicações Eventuais: | 2ª SECÇÃO | ||
| Área Temática: | . | ||
| Sumário: | Um Plano de recuperação que inclua modificações no pagamento dos créditos da Segurança Social, pode, apesar disso, ser considerado aprovado através da desconsideração do voto contra daquela credora, e homologado mediante a ressalva de o Plano lhe ser ineficaz. | ||
| Reclamações: | |||
| Decisão Texto Integral: | Processo n.º 3096/24.6T8STS.P1 Juízo de Comércio de Santo Tirso- Juiz 3 ** Sumário (elaborado pela Relatora):……………………………… ……………………………… ……………………………… * I. RELATÓRIO 1. A... Unipessoal, Lda veio requerer Processo Especial de Revitalização, tendo sido proferida em 31.03.2025, sentença de não homologação do plano de recuperação proposto pela devedora, com o seguinte teor (transcrição): “Resulta inequivocamente do mapa de votação junto aos autos aos 28/03/2025 que não foi possível lograr a aprovação do Plano de Recuperação apresentado pela aqui Devedora. --- Tal como refere o AJP, durante o período de votações foram recebidos pelo Administrador Judicial Provisório votos sobre o Plano de Recuperação, os quais são representativos de 99,34% da totalidade dos créditos reconhecidos com direito de voto, pelo que se verifica a existência de quórum constitutivo. Mais se verifica que dos votos emitidos, votaram contra o plano de revitalização 52,01% daqueles votos. Não foram, pois, alcançadas as demais maiorias previstas na alínea b) do nº 5 do artigo 17º-F do CIRE. Assim, nos termos do n.º 5 do artigo 17.º-F CIRE, conclui-se que o Plano de Revitalização não foi aprovado. --- Consequentemente, declaro encerrado o processo negocial sem aprovação de plano de revitalização. --- Custas pela devedora. --- --- Valor da ação para efeitos de custas: o da alçada da Relação – artigo 301º do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas. --- Registe, notifique e publique no portal Citius – artigo 17º-G, nº 1 do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas. --- Cessam as funções do AJP, devendo proceder-se ao registo dessa cessação de funções. ** --- Advirta a devedora para os efeitos do disposto no artigo 17º-G, nº 8 do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas. Notifique o Sr. AJ, solicitando o envio do parecer/ comunicação a que alude o art. 17.º-G, n.º 3, do CIRE, esclarecendo se a devedora se encontra em situação de insolvência, e após ouvir a devedora e credores, sendo que nada sendo dito se entende que a devedora ainda não se encontra em situação de insolvência.” 2. Em 1.04.2025 foi apresentado pela Requerente, requerimento de arguição de nulidade, o qual veio a ser indeferido por despacho de 12.04.2025, tendo este despacho o seguinte teor: “--- É de considerar assente o seguinte: . por sentença de 31.03.2025, o tribunal decidiu, após envio do resultado da votação enviado pelo AJP (art.º 17.ºF/6, do CIRE), dar por não aprovado o plano de recuperação “sub judice”, assim se tendo concluído que tal plano de Revitalização não havia sido aprovado, e como tal se declarava encerrado o processo negocial sem aprovação de plano de revitalização; . relativamente a esta decisão, veio oportunamente, a devedora revitalizanda insurgir-se, por haver sido erroneamente contabilizado o voto manifestado pela Segurança Social, argumentando que terá tal decisão sido inquinada pelo vício da nulidade, já que havia anteriormente solicitado que não fosse contabilizada aquela posição do ISS,IP, desde logo por este credor equivaler a 52% dos votos, não lhe assistindo direito ao voto uma vez que a proposta de pagamento dos créditos a este credor está dentro dos limites previstos na lei. --- Ouvido AJP e Credor ISS, IP, veio aquele primeiro, de forma aliás pouco compreensível, solicitar que se aguardasse a posição do credor em causa, após o que nada veio clarificar, sendo que a clarificação solicitada pelo Tribunal estava ao seu alcance: o tribunal explicou que pretendia saber se face aos elementos constantes dos autos e a que teve de ter acesso (sob pena de denegação das suas funções de AJP), viesse informar se caso não fosse considerada a votação da Segurança Social, se poderia considerar o plano aprovado, e se sim, quais os quóruns atingidos legalmente previstos, e se estes permitiriam dar por aprovado o aludido plano. – O AJP nada disse clarificou, e deixou, confortavelmente, nas mãos do Tribunal a tarefa de indagar se havia ou não modificação do crédito em causa, para efeitos do preceituado no art.º 212.º/2, a), do CIRE. A este respeito, já se havia consignado que “ a modificação pelo plano” a que se reporta o aludido art.º 212.º/2, a), do CIRE terá de ser entendida como uma modificação substancial – seja pela restrição do montante dos créditos, seja pelo perdão de juros, seja pela redução de garantias, ou seja pela previsão de moratórias ou concessão de novos prazos de pagamento.- --- O credor ISS, IP, pugnou pela circunstância de lhe assistir direito a votar nos autos, apelando ao que se decidiu no douto Ac. RP de 24/01/2022, Proc. n.º 697/21.8T8AMT.P1, onde se pode ler: “… a regularização prestacional da dívida à Segurança Social envolve uma modificação dos créditos, na medida em que os mesmos passam a gozar de uma dilação temporal, de uma moratória, quando é certo que a Segurança Social não autorizou o diferimento temporal do pagamento de créditos públicos”. -O plano de revitalização prevê a regularização da dívida à Segurança Social nos seguintes termos: “b) ESTADO – Segurança Social Plano de Regularização: • Pagamento da totalidade da dívida reconhecida através de acordo prestacional até 150 prestações mensais e sucessivas, vencendo-se a primeira até ao final do mês seguinte ao da votação do plano de revitalização. Dispensa de constituição de garantias ao abrigo do disposto no art.º 13.º do artigo 199.º do CPPT.” --- Sucede que veio a ser junta nova versão do plano a ser submetido a votação, onde a este respeito, passou a constar o seguinte, em relação ao credor “ISS.,IP”: “Pagamento da totalidade da dívida reconhecida através de acordo prestacional até 150 prestações mensais e sucessivas, vencendo-se a primeira até ao final do mês seguinte ao da votação do plano de revitalização; •Retoma imediata do pagamento das contribuições mensais vencidas desde a data do despacho de nomeação do Admnistrador Judicial Provisório; • Dispensa de constituição de garantias ao abrigo do disposto no nº 13º do artigo 199º do CPPT. • Pagamento de juros vencidos e vincendos calculados à taxa legal aplicável às dívidas ao Estado. • As ações executivas pendentes não são extintas, sendo suspensas enquanto o plano prestacional estiver a ser cumprido.” --- Após esta nova versão, o credor Segurança Social veio expressar que, mesmo assim, votava contra o plano em causa, nos termos constantes da Deliberação do Conselho Diretivo do Instituto de Gestão Financeira da Segurança Social, I.P., de 26/03/2025, e cujo conteúdo deu por reproduzido, para todos os efeitos legais, e requereu ao tribunal se dignasse declarar a ineficácia ou inoponibilidade da parte dispositiva do Plano em relação aos créditos da Segurança Social, caso o mesmo viesse a ser aprovado e subsequentemente homologado, uma vez que este credor não deu o seu consentimento expresso à modificação dos seus créditos, situação que viola a legislação específica da segurança social, bem como a legislação tributária, designadamente o artigo 30.º, da Lei Geral Tributária, que refere que os créditos da Segurança Social são indisponíveis. Analisando e decidindo.- O plano de revitalização não pode produzir efeitos que se traduzam na modificação restritiva do conteúdo dos créditos titulados pelo Instituto da Segurança Social, contra a sua vontade, constituindo violação negligenciável das normas aplicáveis ao seu conteúdo, nos termos e para os efeitos do art.º 215.º do CIRE, aplicável ao processo especial de revitalização nos termos do artigo 17ºF, nº 7, do mesmo diploma legal [Sobre esta matéria, vide Alexandre Soveral Martins, in “Um Curso de Direito da Insolvência”, Almedina 2015, a páginas 412 a 413, onde se enfatiza que “O aditamento do nº 3 referido (ao artigo 30º da Lei Geral Tributária) visava, designadamente, enfrentar as dúvidas que até aí surgiam acerca da relação entre o CIRE, a LGT, o CPPT, e o regime da regularização das dívidas à segurança social. Com efeito, a jurisprudência mostrava-se dividida quanto à possibilidade de o plano de insolvência, porque previsto em lei especial, afastar o regime contido em normas imperativas da legislação referida. O artigo 30º, nº 3, da LGT não permite agora dizer que as soluções previstas no plano prevaleceriam sobre a legislação fiscal”]. Todavia, da imposição legal de proibição restritiva do conteúdo do crédito tributário não resulta necessariamente a solução drástica de recusa, pura e simples, de homologação do plano de recuperação da revitalizada que o tornaria totalmente inaproveitável, com frustração dos interesses particulares envolvidos e acentuado prejuízo para a organização económica e empresarial que o sistema jurídico tende a salvaguardar até onde lhe for juridicamente possível. Neste sentido, a solução mais equilibrada, adequada e curial que permitirá, simultaneamente, harmonizar os relevantes interesses sociais e económicos que o legislador se propôs salvaguardar através da instituição do processo de revitalização, reforçados através de compromissos assumidos internacionalmente pelo Estado Português, com a imperativa e intransigente defesa dos créditos tributários em geral, consiste em fixar ineficácia relativa à homologação da aprovação do plano de revitalização no que concerne aos créditos de natureza tributária reclamados e de que é titular o Instituto da Segurança Social. Somos sensíveis a esta argumentação e é assim que temos vindo a decidir em diversos casos que nos têm vindo a ser atribuídos neste Juízo do Tribunal do Comércio, onde o aludido credor se abstém e solicita tal consignação expressa de ineficácia do plano. Sucede que no caso presente a questão prende-se, em primeira linha, sobre o próprio resultado da votação, e se, neste domínio, o credor Instituto da Segurança Social deveria ou não ser admitido a votar, já que votou desfavoravelmente, e este seu voto foi decisivo para o resultado obtido de “não aprovação” do plano “sub judice”.- --- Note-se que o credor ISS,IP, não se absteve, como em vários outros casos que já decidimos, sucedeu. – Ora, havendo o plano de revitalização, (…) previsto o pagamento em prestações do crédito do Instituto de Segurança Social, bem como a suspensão das suas execuções contra a recuperanda, é inegável que o respectivo conteúdo traduz e consubstancia uma efectiva, real e substantiva restrição ao conteúdo desses mesmos créditos – v., Ac. do STJ de 17/10/2023, processo n.º 2395/22.6T8STR.E1.S1, in www.dsgi.pt, relatado por Luís Espírito Santo.- A este respeito, mais especificamente, veja-se o Ac. da Relação de Coimbra de 17.10.2023, processo n.º 4950/23.8T8CBR-A.C1, relatado por Chandra Garcia, onde se pode ler: “I - O art.º 212.º, n.º 2, al. a), do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas, segundo o qual os créditos que não sejam modificados pela parte dispositiva do plano não conferem direito de voto, também tem aplicação ao Processo Especial de Revitalização. II – Vigorando o princípio da indisponibilidade dos créditos tributários, um crédito exigível porque vencido, e que no plano passa a ser objecto de pagamento fraccionado em múltiplas prestações mensais, consubstancia uma alteração relevante para os fins do art.º 212.º, n.º 2, al. a), gozando o respectivo credor de direito de voto. III – Igualmente para o crédito detido pela Segurança Social, tendo em conta os arts. 30.º da Lei Geral Tributária, aplicável aos créditos contributivos da Segurança Social, ex vi art. 3.º, al. a), do Código dos Regimes Contributivos do Sistema Previdencial de Segurança Social.” Em face do exposto, e seguindo de perto esta jurisprudência citada, somos de entender que no caso vertente, o credor Instituto da Segurança Social se identificava como “credor com direito de voto”, e, como tal, o resultado a que logrou chegar o AJP mantém-se intacto e operante. Por outro lado, acresce que dificilmente a devedora lograria obter efectiva viabilidade económica e financeira, pois como sabemos tanto o Estado como a Segurança Social são, na maioria dos casos, titulares de créditos avultados sobre o devedor, pelo que, se não puderem participar no esforço de recuperação da empresa, o processo poderá ficar por vezes votado ao insucesso (vejam-se os casos em que a Segurança Social se abstém e solicita apenas que se excepcione a não aplicabilidade do plano ao regime dos seus créditos derivado dos diplomas legais que invoca). Acresce que é o próprio AJP que dá a entender, na sua última exposição junta a estes autos, que nunca estaria na posse de elementos que lhe permitissem emitir parecer favorável quanto à viabilidade séria e razoável da empresa em causa (afirmou que não consegue encontrar argumentos que possam fundamentar a recuperação efectiva da devedora com o plano apresentado).- ---- Em face de todo o exposto, decide-se: . julgar improcedente a existência de qualquer nulidade que inquine a decisão já proferida, aqui se consignando o direito de voto que assiste ao credor Instituto da Segurança Social, no presente caso; . manter-se a decisão já proferida de não aprovação do plano de revitalização submetido a votação, em face da esmagadora maioria de votação desfavorável ao mesmo, nos termos comunicados pelo Sr. AJP.- Notifique.” 4. Inconformada com a referida sentença, a Requerente interpôs o presente recurso de apelação, no qual formulou as seguintes CONCLUSÕES (…) 5. Foram observados os vistos legais. * II. DELIMITAÇÃO do OBJECTO do RECURSO:O objecto do recurso é delimitado pelas conclusões da alegação do recorrente, não podendo este Tribunal conhecer de matérias nelas não incluídas, a não ser que as mesmas sejam de conhecimento oficioso - cfr. arts 635º, nº 3 e 4, 639º, n.ºs 1 e 2 e 608º nº 2 do CPC- devendo o tribunal resolver todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação, exceptuadas aquelas cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras, não estando obrigado a apreciar todos os argumentos apresentados pelas partes para sustentar os seus pontos de vista, nem estando sujeito às alegações das partes no tocante á indagação, interpretação e aplicação das regras de direito- cfr. art. 5º nº 3 do CPC). * A questão a decidir, em função das conclusões de recurso, é a seguinte:- se deve ser homologado o PER apesar do voto contra da Segurança Social, mediante a consideração das seguintes hipóteses: i. desconsideração do voto da ISS.IP; ii. ineficácia do Plano quanto à credora ISS.IP; iii. homologação total do Plano por o mesmo não apresentar violação não negligenciável. III. FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO. *** Em função das conclusões de recurso e dos pedidos nele formulados, a Apelante centrou a sua discordância contra a decisão de não aprovação do Plano de recuperação por si apresentado por entender que apesar do voto apresentado pelo ISS.IP contra tal Plano o mesmo pode e deve ser homologado. Para o efeito formulou os seguintes pedidos recursivos, os quais nortearão a nossa decisão: A. revogado o douto despacho recorrido e ordenada a baixa dos autos ao tribunal a quo para que profira nova decisão que se pronuncie expressamente sobre a validade e o efeito jurídico do voto do Instituto da Segurança Social, IP, à luz dos fundamentos de direito invocados pela recorrente e da jurisprudência dominante sobre a matéria, aferindo se tal voto, no contexto do plano de revitalização apresentado, que prevê pagamento integral dentro dos limites legais de faseamento, pode obstar à aprovação do plano ou se o máximo efeito a atribuir seria a sua ineficácia relativa; B. subsidiariamente, revogado o douto despacho de 12 de abril de 2025 por erro de julgamento e, em sua substituição, proferido douto acórdão que: i) desconsidere o voto negativo do Instituto da Segurança Social, IP, por constituir um exercício desproporcional e abusivo do direito de voto no contexto do processo especial de revitalização, e, em consequência, considere que o plano de revitalização alcança a maioria necessária para a sua aprovação, e homologando-o com eficácia para todos os credores. C. Ainda mais subsidiariamente, e caso v. exas. entendam que o voto do ISS,IP, seria relevante mas que a proposta de pagamento contida no plano, por prever o pagamento integral dentro dos limites máximos legais para o faseamento de dívidas à Segurança Social (até 150 prestações mensais), está conforme à lei, considere que não ocorreu qualquer violação não negligenciável que impeça a homologação, e consequentemente homologue o plano de revitalização com eficácia para todos os credores. D. ainda mais subsidiariamente, e caso se entenda que o voto do ISS,IP, deveria ser considerado, homologue o plano de revitalização, declarando, contudo, a sua ineficácia relativamente ao crédito do Instituto da Segurança Social, IP, mantendo a sua eficácia para todos os demais credores, conforme a tese maioritária da jurisprudência casos de planos que afetam públicos sem consentimento. Pois bem, o pedido formulado sob o ponto A., salvo o devido respeito, afigura-se-nos descabido, porquanto o Tribunal a quo por decisão proferida em 12.04.2025, que faz parte da decisão recorrida, emitiu expressa pronúncia sobre a validade e o efeito jurídico a extrair do voto do Instituto da Segurança Social, IP, aferindo se tal voto, no contexto do plano de revitalização apresentado, que prevê pagamento integral dentro dos limites legais de faseamento, pode obstar à aprovação do plano ou se o máximo efeito a atribuir será a sua ineficácia relativa, tendo concluído que apesar de perfilhar o entendimento de que “(…) O plano de revitalização não pode produzir efeitos que se traduzam na modificação restritiva do conteúdo dos créditos titulados pelo Instituto da Segurança Social, contra a sua vontade, constituindo violação negligenciável das normas aplicáveis ao seu conteúdo, nos termos e para os efeitos do art.º 215.º do CIRE, aplicável ao processo especial de revitalização nos termos do artigo 17ºF, nº 7, do mesmo diploma legal (…) todavia, da imposição legal de proibição restritiva do conteúdo do crédito tributário não resulta necessariamente a solução drástica de recusa, pura e simples, de homologação do plano de recuperação da revitalizada que o tornaria totalmente inaproveitável, com frustração dos interesses particulares envolvidos e acentuado prejuízo para a organização económica e empresarial que o sistema jurídico tende a salvaguardar até onde lhe for juridicamente possível. Neste sentido, a solução mais equilibrada, adequada e curial que permitirá, simultaneamente, harmonizar os relevantes interesses sociais e económicos que o legislador se propôs salvaguardar através da instituição do processo de revitalização, reforçados através de compromissos assumidos internacionalmente pelo Estado Português, com a imperativa e intransigente defesa dos créditos tributários em geral, consiste em fixar ineficácia relativa à homologação da aprovação do plano de revitalização no que concerne aos créditos de natureza tributária reclamados e de que é titular o Instituto da Segurança Social.” O Tribunal a quo só não homologou o Plano e declarou a ineficácia do mesmo relativamente ao crédito da ISS,IP porque entendeu que a homologação não era admissível em função do resultado da votação desse Plano, uma vez que neste caso concreto aquele credor não se havia abstido de votar, como frequentemente faz, mas votara contra, e esse voto havia sido decisivo para o resultado final de não aprovação. A propósito de o ISS,IP ter direito de voto emitiu também pronúncia expressa, nos seguintes termos: “Sucede que no caso presente a questão prende-se, em primeira linha, sobre o próprio resultado da votação, e se, neste domínio, o credor Instituto da Segurança Social deveria ou não ser admitido a votar, já que votou desfavoravelmente, e este seu voto foi decisivo para o resultado obtido de “não aprovação” do plano “sub judice”.- --- Note-se que o credor ISS.IP, não se absteve, como em vários outros casos que já decidimos, sucedeu. – Ora, havendo o plano de revitalização, (…) previsto o pagamento em prestações do crédito do Instituto de Segurança Social, bem como a suspensão das suas execuções contra a recuperanda, é inegável que o respectivo conteúdo traduz e consubstancia uma efectiva, real e substantiva restrição ao conteúdo desses mesmos créditos (…), somos de entender que no caso vertente, o credor Instituto da Segurança Social se identificava como “credor com direito de voto”, e, como tal, o resultado a que logrou chegar o AJP mantém-se intacto e operante.” Acabou o Tribunal a quo por concluir “assistir direito de voto ao credor Instituto da Segurança Social, no presente caso, e manter-se a decisão já proferida de não aprovação do plano de revitalização submetido a votação, em face da esmagadora maioria de votação desfavorável ao mesmo, nos termos comunicados pelo Sr. AJP” Deste modo, não há que ordenar a baixa dos autos para que o Tribunal a quo conheça da alegada omissão de pronúncia, pois que sobre tal questão se pronunciou, caberá sim a este Tribunal de recurso aferir se houve erro de julgamento quanto à questão de o voto do ISS.IP poder obstar à aprovação do plano ou se o efeito a atribuir será a ineficácia relativa do Plano relativamente aos seus créditos. A Apelante entende que a falta de expressa e discricionária autorização por parte do ISS.IP não deve ser suficiente para impedir a homologação de um plano de recuperação por alegada violação do disposto nos arts. 194º, 195º e 215º do CIRE e 190º ss do Código dos Regimes Contributivos do Sistema Previdencial de Segurança Social aprovado pela Lei nº 110/2009 de 16.09 (alterado pela Lei nº 119/2009 de 30.12, pelo DL nº 140-B/2010 de 30-12, pela Lei nº 55-A/2010) e nºs 2 e 3 do art. 30º da LGT. E que o nº 3 do art. 30º da LGT não veio conferir carácter indisponível ou imperativo ao sentido de voto da credora Segurança Social, no sentido de dele depender a aprovação e a validade do Plano, transformando-o num voto de qualidade ou num verdadeiro direito de veto. No seu entender nem sequer se colocaria a questão de ineficácia ou inoponibilidade do Plano relativamente aos créditos da Segurança Social, porque nele não teriam sido introduzidas modificações que não sejam permitidas por lei, designadamente quanto ao plano de pagamento faseado de tais créditos. Conforme resulta da jurisprudência, ao que se crê praticamente consolidada, mormente do Supremo Tribunal de Justiça, mas igualmente deste Tribunal da Relação do Porto[1], desta mesma seção especializada na área do comércio, e tal como já decidimos anteriormente[2], a homologação de um PER que inclua modificações no pagamento dos créditos da Segurança Social contra a sua vontade, violando o disposto nos artigos 30.º, nº 2 e 3, e 36.º, nº 2 e 3 da LGT, e 190.º, nº 1, 2 a) e 6, do Código dos Regimes Contributivos do Sistema Previdencial de Segurança Social, deve ser considerado ineficaz perante a Segurança Social. Isto porque, parafraseando o recente Ac STJ de 27.05.2025, o qual referencia arestos anteriores que já perfilhavam esse entendimento, “um plano de revitalização aprovado e homologado judicialmente, que configure uma restrição ao conteúdo do crédito da Segurança Social, contra a sua vontade, materializa uma violação negligenciável das normas aplicáveis, nos termos constantes do art. 215º do CIRE, aplicável ao PER, por força do nº. 7 do art. 17º-F, do mesmo código. A solução da ineficácia relativa do plano, mostra-se justa e equilibrada, compatibilizando-se todos os interesses em causa, sejam sociais, sejam económicos, ou seja, o plano de revitalização produzirá os seus efeitos, relativamente aos demais credores, à exceção daqueles créditos que se reportam ao Instituto da Segurança Social e votados contra a sua vontade, satisfazendo-se também os imperativos legais.”[3] Tal como de forma clara e cristalina nesse douto aresto se dá conta, “dispõe o artigo 30.º da Lei Geral Tributária, aprovada pelo Decreto-Lei nº. 398/98 de 17/2012, aplicável aos créditos da Segurança Social por força da al. a) do art. 3º do CRCSPSS, que: (…) 2 - O crédito tributário é indisponível, só podendo fixar-se condições para a sua redução ou extinção com respeito pelo princípio da igualdade e da legalidade tributária. 3 - O disposto no número anterior prevalece sobre qualquer legislação especial (Aditado pela Lei n.º 55-A/2010, de 31 de dezembro, Lei do Orçamento do Estado para o ano de 2011). Aludindo, ainda, o art. 125º da mesma Lei, a extensibilidade de tal norma aos processos de insolvência que se encontravam pendentes e ainda aos que não tivessem sido objecto de homologação. Também o art. 36º da LGT, sobre regras gerais, dispõe: Constituição e alteração da relação jurídica tributária 1 - A relação jurídica tributária constitui-se com o facto tributário. 2 - Os elementos essenciais da relação jurídica tributária não podem ser alterados por vontade das partes. 3 - A administração tributária não pode conceder moratórias no pagamento das obrigações tributárias, salvo nos casos expressamente previstos na lei. 4 - A qualificação do negócio jurídico efetuada pelas partes, mesmo em documento autêntico, não vincula a administração tributária. 5 - A administração tributária pode subordinar a atribuição de benefícios fiscais ou a aplicação de regimes fiscais de natureza especial, que não sejam de concessão inteiramente vinculada, ao cumprimento de condições por parte do sujeito passivo, inclusivamente, nos casos previstos na lei, por meio de contratos fiscais. Como escreveu Alexandre Soveral Martins, Um Curso de Direito da Insolvência, Almedina, pág. 412-413 «O aditamento do nº 3 ao artigo 30º da Lei Geral Tributária visava, designadamente, enfrentar as dúvidas que até aí surgiam acerca da relação entre o CIRE, a LGT, o CPPT, e o regime da regularização das dívidas à segurança social. Com efeito, a jurisprudência mostrava-se dividida quanto à possibilidade de o plano de insolvência, porque previsto em lei especial, afastar o regime contido em normas imperativas da legislação referida. O artigo 30º, nº 3, da LGT não permite agora dizer que as soluções previstas no plano prevaleceriam sobre a legislação fiscal». Ora, a alteração legislativa é assertiva e inequívoca do sentido preconizado, ou seja, aos créditos da segurança social haverá que aplicar um regime específico, atenta a sua natureza tributária e indisponível. Neste sentido, nomeadamente, Ac. do STJ. de 17-1-2023 (indicado como acórdão fundamento da contradição), Ac. do STJ. de 9-6-2021, Ac. do STJ. de 15-12-2011, todos in www.dgsi.pt. (…) Ora, a eficácia do plano aprovado sobre os créditos de que o Estado seja titular, quer através da Fazenda Nacional, quer da Segurança Social, contra a sua vontade, mereceu tratamento diferenciado e controverso, quer na doutrina quer na jurisprudência. Porém, é hoje jurisprudência consolidada do STJ., a sua mera ineficácia relativa. Com efeito, com a supra mencionada alteração legislativa, o que se quis foi consagrar a indisponibilidade dos créditos tributários e dos regimes de segurança social, proibindo a sua redução ou extinção. Como se aludiu no Ac. do STJ. de 10-5-2018, in www.dgsi.pt. «Não se ignora que os créditos do Estado por impostos e as contribuições para o sistema de Segurança Social são essenciais ao Estado de Direito, na medida em que o Estado, lato sensu, cumpre funções de ordem pública ligadas ao assegurar da Dignidade das pessoas, postulada pela igualdade e tratamento proporcional, política que executa através da arrecadação de impostos observados os princípios da legalidade e equidade tributárias. O legislador pretendeu erguer uma barreira à jurisprudência do STJ quanto aos créditos tributários no processo de insolvência, acrescentando ao art. 30º da LGT o nº. 3, pretendendo reforçar o princípio da indisponibilidade dos créditos tributários». Como se disse no acórdão fundamento, supra identificado «O plano de revitalização produzirá todos os seus efeitos, viabilizando o prosseguimento da atividade económica e comercial da empresa e satisfazendo os interesses dos credores na exata medida acordada e por eles aceite, à exceção daqueles que teriam reflexo na esfera jurídica do Instituto da Segurança Social, enquanto entidade titular de créditos de natureza tributária, ao qual não serão oponíveis, permanecendo intangíveis e imodificáveis no seu conteúdo». Em sentido idêntico, nomeadamente, Acs. do STJ. de 17-4-2018, 18-2-2014, 1-4-201424-3-2015, todos in www.dgsi.pt. Como escreveu Catarina Serra, O Processo Especial de Revitalização na Jurisprudência, Almedina, 2ª. ed., pág. 105 «O Supremo Tribunal de Justiça e alguns Tribunais da Relação têm vindo a afirmar que o plano de recuperação pode e deve ser homologado desde que se preservem os créditos tributários. Para tanto basta que se proceda, segundo uns, à restrição dos efeitos do plano aos créditos não tributários e, segundo outros, presumindo que a vontade hipotética ou conjuntural das partes é no sentido de conservar o plano, à redução do plano às cláusulas incidentes sobre estes últimos créditos». A solução (…) da ineficácia relativa do plano, mostra-se justa e equilibrada, compatibilizando-se todos os interesses em causa, sejam sociais, sejam económicos, ou seja, o plano de revitalização produzirá os seus efeitos, relativamente aos demais credores, à exceção daqueles créditos que se reportam ao Instituto da Segurança Social e votados contra a sua vontade, satisfazendo-se também os imperativos legais.” Para além da Doutrina referenciada nesse aresto, damos nota de Maria do Rosário Epifânio, que a propósito da referida problemática refere que “a jurisprudência maioritária tem entendido que, face à redação do art. 30º da Lei Geral Tributária, os créditos fiscais e os créditos da segurança social devem considerar-se indisponíveis, pelo que não poderão ser objecto de redução, extinção ou moratória nos planos de recuperação apresentados no âmbito de um PER, sem que o Estado tenha votado favoravelmente. Em consequência, os planos de recuperação aprovados que prevejam uma modificação ou extinção dos créditos públicos sem que o Estado tenha votado favoravelmente estão feridos de vício não negligenciável quanto ao seu conteúdo (art. 215º). Mas, deverá o juiz recusar a homologação do plano (não produzindo, em consequência, o plano quaisquer efeitos) ou, antes, homologar o plano e recusar-lhe eficácia perante quem não possa ser afetado pelo mesmo? Ou seja, haverá uma recusa de homologação ou apenas uma ineficácia do plano em relação aos credores públicos? A jurisprudência tem-se dividido quanto a esta questão. As decisões de recusa de homologação fundamentam-se na existência de “uma violação que, por afetar a boa decisão da causa, configura uma nulidade que atinge todo o plano votado, a ser tratada nos termos da lei processual geral […] com a particularidade prescrita no próprio art. 215º do CIRE. Por seu turno, as decisões (maioritárias) de homologação do plano e de ineficácia do mesmo relativamente aos credores públicos têm sido sustentadas na natureza do plano de recuperação, que, “assente numa ampla liberdade de estipulação pelos credores do insolvente, constitui um negócio atípico, sendo-lhe aplicável o regime jurídico da ineficácia”, e também no argumento de que face aos “interesses subjacentes jurídicos e sociais imbrincados na recuperação da empresa […] a solução mais ajustada é a da ineficácia relativa.” [4] Contrariamente ao defendido pela Apelante, entendemos, tal como também se decidiu no Acórdão desta Relação do Porto de 10.09.2024 (o qual reproduz em parte o Acórdão desta mesma seção de 19-12-2023, Proc n.º 532/23.2T8AMT.P1), que “o regime aplicável é conformado quer pelo disposto no art. 215º do CIRE, que dispõe que “O juiz recusa oficiosamente a homologação do plano de insolvência aprovado em assembleia de credores no caso de violação não negligenciável de regras procedimentais ou das normas aplicáveis ao seu conteúdo, qualquer que seja a sua natureza, e ainda quando, no prazo razoável que estabeleça, não se verifiquem as condições suspensivas do plano ou não sejam praticados os actos ou executadas as medidas que devam preceder a homologação”; quer pelo disposto nos nºs 2 e 3 do art. 30º da LGT, de onde resulta a indisponibilidade de créditos fiscais e, bem assim, a proibição de homologação de planos de revitalização que contemplem a alteração, redução, extinção ou dilação temporal do pagamento de créditos de natureza tributária, sem que o Estado – a Fazenda Nacional/Segurança Social - tenha votado favoravelmente tal homologação. (…)Acresce que a jurisprudência vem afirmando inequivocamente (…) que “com a alteração introduzida naquela norma pelo artigo 123.º da Lei n.º 55-A/2010, de 31 de Dezembro (que aprovou o Orçamento do Estado para 2011), e com a norma transitória do artigo 125.º, do mesmo diploma legal, o legislador deixou claro o propósito de reforçar a intangibilidade dos créditos tributários, impedindo que os mesmos possam ser afectados apenas com fundamento em normas especiais, nomeadamente as relativas aos processos insolvenciais ou pré-insolvenciais, à margem das regras consagradas nas normas gerais do direito tributário. E fê-lo, manifestamente, com o propósito de blindar os créditos tributários no processo de insolvência, ainda que, deste modo, possa criar entraves à recuperação da empresa”. Assim, só pode acompanhar-se a conclusão enunciada naquele acórdão, nos termos da qual “(…) ressalvando situações limite que poderão justificar o recurso a válvulas de segurança interpretativa que a jurisprudência vem ensaiando –, o plano de recuperação aprovado no processo de insolvência ou no PER apenas pode afectar os créditos tributários se respeitar todas as condições de alteração, redução ou extinção desses créditos impostas na lei geral (maxime na LGT, no CPPT e no CRCSPSS), entre as quais se inclui o consentimento do organismo público competente, nomeadamente a AT ou o ISS.” Como se menciona neste acórdão, a identificação de uma menor valia da solução legal vigente, pela jurisprudência, não deve redundar na adopção de interpretações legais correectivas e eventualmente abrogantes. Embora caiba recusar uma postura inteiramente positivista na aplicação do direito, isso não pode redundar na interpretação da Lei em ordem à aplicação de uma solução diversa daquela que foi sucessivamente afirmada como pretendida pelo legislador, mesmo que com esta se não concorde.” Não existe qualquer discricionariedade na decisão da Segurança Social de votar contra o Plano, ainda que porventura as condições nele contempladas respeitem o disposto no art. 191º do Código dos Regimes Contributivos do Sistema Previdencial de Segurança Social e o art. 81º da Regulamentação desse Código, porque entendemos, na senda dos Acórdãos desta Relação do Porto de de 13.05.2025 e de 11.12.2024, que “a fixação, no plano de recuperação, do pagamento em prestações dos créditos fiscais e/ou da segurança social [ainda que com observância do número de prestações e dos prazos previstos nos arts. 196º do CPPT e 190º da Lei nº 110/2009 (e no 81º do DR 1-A/2011, de 03.01)], sem a concordância/autorização da AT e da SS, constitui uma violação não negligenciável de normas aplicáveis ao conteúdo de tais planos; e (…) nestes casos, salvo excecional quadro de estado de necessidade social, a homologação do plano de recuperação não deve ser oficiosamente recusada, antes este deve ser homologado, embora com a expressa declaração da sua ineficácia relativamente aos créditos da Autoridade Tributária e da Segurança Social.” Foi o que ocorreu no caso sob apreciação, pois que o Plano prevê quanto aos créditos da Segurança Social, o seguinte: “b) ESTADO – Segurança Social Plano de Regularização: •Pagamento da totalidade da dívida reconhecida através de acordo prestacional até 150 prestações mensais e sucessivas, vencendo-se a primeira até ao final do mês seguinte ao da votação do plano de revitalização; •Retoma imediata do pagamento das contribuições mensais vencidas desde a data do despacho de nomeação do Administrador Judicial Provisório; • Dispensa de constituição de garantias ao abrigo do disposto no nº 13º do artigo 199º do CPPT. • Pagamento de juros vencidos e vincendos calculados à taxa legal aplicável às dívidas ao Estado. • As ações executivas pendentes não são extintas, sendo suspensas enquanto o plano prestacional estiver a ser cumprido.” Acontece que a decisão tomada pela Segurança Social de votar contra o Plano de revitalização inviabilizou a sua aprovação, porquanto o Plano só não foi aprovado porque o seu voto contra foi decisivo para o resultado final da votação do mesmo: votaram contra 62,01% sendo que o ISS.IP teve um peso de 45,52% (mais o Banco 1..., SA com 6,15%). Não fora este voto contra do ISS.IP- bastava-lhe abster-se- e o Plano granjeava a maioria de aprovação necessária por parte dos restante credores, os quais perfizeram 47,99%, de entre os quais se conta também a credora Autoridade Tributária. Perante este cenário é perfeitamente legítimo que a Apelante questione se não será de desconsiderar o voto contra do ISS,IP já que o Plano perante ele será sempre de se considerar ineficaz, não sendo introduzida qualquer restrição quanto ao pagamento nos moldes por si peticionados, sendo que não fora esse voto o Plano estava em condições de ser aprovado e homologado. A desconsideração do voto do ISS.IP, neste caso concreto, parece-nos defensável, porque apesar de ser inegável que tem direito de voto (art. 212º do CIRE), do seu exercício não depende a atribuição do direito de ver reconhecida a ineficácia do Plano relativamente aos seus créditos, assim se harmonizando o voto da maioria dos credores no sentido de privilegiar a viabilização da devedora, com a posição da credora Segurança Social cujos créditos são indisponíveis. Com isso não se lhe está a retirar direito de voto, está-se sim a viabilizar a homologação de um Plano de recuperação que não fora o acentuado peso percentual do crédito do ISS.IP, neste caso em específico, teria resultado numa aprovação pela maioria necessária dos credores, nos quais se incluiu a própria AT (cujos créditos também são indisponíveis). Conforme se pode extrair da sentença recorrida foi o resultado da votação maioritária de não aprovação que foi determinante para que o Plano não fosse homologado, não tendo sido qualquer violação não negligenciável dele decorrente, pois que relativamente aos créditos da ISS,IP o entendimento do Tribunal a quo tem vindo a ser também, como expressamente refere na sentença recorrida, o de determinar a mera ineficácia sem que tal impeça a homologação do Plano. Ora, afigura-se-nos que neste caso específico esse argumento não deve ser determinante para a não homologação do Plano, isto é, não deve ser considerado decisivo o voto contra do ISS,IP pois que este obtém através da declaração de ineficácia do Plano relativamente aos seus créditos, o mesmo resultado que obteria com a não homologação do Plano, com a agravante de que o resultado extraído da mera contabilização dos votos contra impede a eventual viabilidade da Apelante caso cumpra o Plano aprovado pelos demais credores que com ele concordaram (sendo de valor muito pouco expressivo o outro voto contra do Banco 1..., SA de 6,15%). Por conseguinte, não se vislumbrando dos autos, nem do parecer do Administrador da Insolvência, nem sequer da sentença recorrida, que exista obstáculo legal que impeça a homologação do Plano que não seja a mera contabilização dos votos contra, se retirarmos dessa contabilização a percentagem atribuída ao ISS,IP, com a ressalva expressa da ineficácia do Plano no que respeita ao credor Instituto de Segurança Social- que votara contra o Plano porque previa o pagamento dos seus créditos em prestações contra a sua vontade-, o Plano estará em condições de ser homologado face aos votos a favor da maioria dos credores necessária para a sua aprovação. Pelas razões acima expostas, entendemos ser de homologar o plano de recuperação com a ressalva da sua ineficácia relativamente aos créditos do ISS,IP, revogando-se consequentemente a decisão recorrida. ** V. DECISÃO:Em face do exposto, acordam os Juízes do Tribunal da Relação do Porto, em julgar procedente o presente recurso, revogando-se a sentença recorrida, e homologando-se o Plano de recuperação com a ressalva da sua ineficácia relativamente aos créditos do ISS,IP. Custas a cargo da Apelante (art. 17º F nº 12 do CIRE). A presente decisão deve ser notificada, publicitada e registada nos termos previstos no art. 17º F nº 11 do CIRE. |