Acórdão do Tribunal da Relação do Porto
Processo:
11255/19.7T8PRT.P1
Nº Convencional: JTRP000
Relator: JOAQUIM CORREIA GOMES
Descritores: AUDIÊNCIA PRÉVIA
DEBATE VERBAL
AUSÊNCIA
NULIDADE
Nº do Documento: RP2020120311255/19.7T8PRT.P1
Data do Acordão: 12/03/2020
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: ANULADA A DECISÃO
Indicações Eventuais: 3ª SECÇÃO
Área Temática: .
Sumário: I - A realização de audiência prévia que não possibilite a integralidade das suas finalidades principais, como seja a ocorrência de um debate oral sobre as controvérsias conducentes ao conhecimento do mérito da ação através do saneador-sentença, integra uma nulidade, porquanto omite uma irregularidade com influência no exame da causa.
II - Tendo sido convocada audiência prévia apenas com a finalidade de obter a conciliação das partes e sendo suspensa a instância para esse efeito, sem que viesse a ser obtido qualquer acordo, não tendo sido posteriormente retomada a audiência prévia, de modo a propiciar o debate oral prévio sobre as questões controversas, optando-se por proferir, desde logo, saneador-sentença julgando procedente a excepção peremptória de caducidade, absolvendo os RR. do pedido, ocorre uma nulidade, com repercussões naquela decisão judicial.
Reclamações:
Decisão Texto Integral: Recurso n.º 11255/19.7T8PRT.P1 (NulidDesp02)
Relator: Joaquim Correia Gomes; Adjuntos; António Paulo Vasconcelos, Filipe Caroço

Acordam na 3.ª Secção do Tribunal da Relação do Porto

I. RELATÓRIO
1. No processo n.º 11255/19.7T8PRT do Juízo Central Cível do Porto, J5, da Comarca do Porto, em que são:

Recorrente/Autor (A): Condomínio B…

Recorridos/Réus (RR): C…, AS; D…, S.A.; E…, S.A.

foi proferido saneador-sentença em 13/mar./2020, no qual se decidiu o seguinte:
“1. Pelo exposto, julgando parcialmente procedente a exceção de ilegitimidade ativa do autor relativamente a parte do que pede, absolvo as rés da instância, relativamente aos pedidos b.8) e b.9), bem como relativamente aos restantes pedidos na parte em que incluem o exercício de direitos sobre as frações autónomas do B….
2. Tendo sido julgada procedente a exceção de ilegitimidade ativa quanto aos pedidos em relação aos quais foi alegada litispendência, sendo as rés absolvidas parcialmente da instância, fica o conhecimento desta exceção prejudicado.
3. Por todo o exposto, julgando procedentes as exceções de caducidade, julgo a acção improcedente, absolvendo as rés dos pedidos.”
1.1. O Condomínio B… em 21/mai./2019 demandou a C…, D… e E…, invocando que a primeira realizou a empreitada do referenciado prédio, mediante contrato com a segunda, tendo sido esta e a terceira que procederam à venda das frações integrantes do mencionado condomínio. Mais sustentaram que a R. Construtora fez entrega das frações com defeitos assinalados, tendo as outras duas RR. pleno conhecimento dessas anomalias, os quais foram atempadamente denunciados na produção antecipada de prova no processo n.º 15649/17.48PRT do Juízo Local Cível do Porto, J6, como sejam nos terraços e varandas de cobertura das várias frações, onde se assinala deficiência no escoamento de águas, por erro de execução no caimento das mesmas, com consequente infiltração nos pisos inferiores, microfissuras ou fissuras que se detetam nas paredes que constituem os vários edifícios, nos muros de delimitação, de acesso à garagem e no edifício da Portaria, assim como no pavimento das garagens, ocorridos por erro de execução. Mais acresce que interpeladas para eliminarem esses defeitos, conforme mails enviados, já em setembro e novembro de 2015, janeiro de 2016, pela administradora ao tempo, que, em setembro de 2016 apresentou uma inicial lista de defeitos as RR nunca se opuseram a essa eliminação, tendo a A. em junho de 2017, após um estudo prévio por si solicitado, ficado conhecedora da exata extensão dos danos e defeitos, terminando com o seguinte pedido de condenação das RR:
a) a reconhecerem a inexecução culposa dos contratos de empreitada e compra e venda acima referidos, e, por isso, dos defeitos acima assinalados e, consequentemente,
b) a eliminarem, a expensas próprias, por si ou por terceiro que disso se encarregue, os defeitos assinalados no relatório pericial que consta do procedimento de produção antecipada de prova, b.1) quanto a assentamentos, b.2) rebocos; b.3) – impermeabilizações, nas partes comuns e nas instalações de WC de frações tal como assinalado no relatório pericial efetuado sob contraditório; b.4) – refechamento de fendas e fendilhação; b.5) – nivelamento de estruturas de varandas e casas de banho; b.6) – substituição de caixilharias e estores e caixas dos mesmos; b.7) – eliminação de humidades; b.8) – eliminação da parede em “gesso carbonado” existente nas habitações e que agrava consideravelmente a reparação das caldeiras; b.9) – substituição dos termo acumuladores deficientes e intervenção a nível de canalização para evitar perda de água nas paredes; b.10) – instalação de sistemas de videovigilância por ligação ao gravador e
b.10.1) – videoporteiro; b.11) – pinturas e revestimentos, bem como b.12) – trabalhos complementares a tal inerentes. c) efetuar essa eliminação e os demais trabalhos no prazo de 90 dias a contar do de entrada em obra, este a fixar no 30º dia a contar da douta decisão que ordene a eliminação dos defeitos.
1.2. A R. D…, S.A. contestou em 01/jul./2019 aceitando que celebrou um contrato de empreitada com a R. C… respeitante ao imóvel em causa, vendendo as frações por si indicadas. Mais excepcionou a litispendência com o processo 12332/18.7T8PRT no Juízo Local Cível do Porto, J6, a caducidade com o direito da A., com base no regime de venda de coisa defeituosa (artigos 916.º, n.º 3 e 917.º Código Civil), impugnando no demais a versão da A., pugnando pela sua absolvição, seja da instância, mediante litispendência, seja do pedido, através da caducidade do direito ou então pela improcedência do pedido.
1.3. A R. C… contestou em 09/jul./2019 excepcionando que o A. condomínio não tem, na qualidade de administrador, legitimidade activa para a demandar, tendo já caducado o seu direito com base no artigo 1225.º, n.º 3 Código Civil, impugnando a restante versão do segundo.
1.4. A E…, S.A. contestou em 11/jul./2019 aceitando que comprou R. D…, S.A. 25 das frações identificadas pela A., não tendo a mesma qualquer intervenção no âmbito da celebração ou execução do contrato de empreitada celebrado entre as duas outras RR.. Mais excepcionou a ilegitimidade activa da A. quanto à matéria das frações autónomas, assim como a caducidade do direito invocado pela A. com base nos artigos 916.º, n.º 1 e 3, 917.º Código Civil, assim como artigo 5.º-A e 4.º Decreto-Lei n.º 67/2003, de 08/abr., impugnando a demais versão da p.i., sustentando que não lhe pode ser imputada qualquer responsabilidade decorrente do incumprimento do contrato de empreitada, pugnando pela procedência da excepção dilatória da mencionada ilegitimidade do A. Condomínio, com a sua absolvição da instância, da excepção peremptória da caducidade ou então pela improcedência da ação, conducente estas à absolvição do pedido.
1.5. O A. Condomínio respondeu em 27/ago./2019 pugnando pela sua legitimidade activa, porquanto os apontados defeitos são de planeamento e execução de elementos estruturantes, distinguindo ainda entre tal excepção e a falta de representação, não existindo qualquer litispendência, não ocorrendo qualquer caducidade, chamando a atenção de que em 14/jul./2017, foi instaurado o procedimento de produção antecipada de prova, já como manifestação do exercício do direito de acção sobre eliminação de defeitos, para além de que tratando-se de uma empreitada consumo, são aplicáveis as normas do Decreto-Lei n.º 67/2003.
1.6. Nestes autos foi lavrado termo de apensação nos seguintes termos:
“Em 25-09-2019 apensei aos presentes autos, os de Produção Antecipada de Prova N.º 11255/19.7T8PRT-A (anteriormente c/ o N.º 15649/17.4T8PRT.)
2. O A. Condomínio insurgiu-se contra o referido saneador-sentença, tendo em 08/mai./2020 interposto recurso, apresentando as seguintes conclusões:
A) Se o tribunal, como se descreve acima em 1 a 6 destas alegações, tendo designado audiência prévia com o objectivo de tentativa de conciliação – refª, 407550785 –, depois deste acto, ainda convida as partes a praticar actos que têm a ver com “aperfeiçoamento” e “eventual instrução” - refªs 410203914 e 411656657 - para ulteriormente, sem qualquer fundamentação para tal, vir a dispensar designação de audiência prévia, e, apesar disso, se pronuncia, em douto despacho decisório sobre - excepção dilatória - para que os autos não forneciam a fundamentação fáctica tal pressuposta pelo douto julgador -; - excepção peremptória de caducidade, ou seja, conhecimento do mérito, ou seja matérias cujo conhecimento se visa nas al.s) b) e d) do artigo 591 e b) do nº 1 do artigo 595, ambos do C.P.C., violou o regime impositivo do artigo 591 do C.P.C., pelo que está ferido do vício de nulidade – artº 195º, nº 1 do C.P.C., com a consequência de se anular o acto decisório (absolvição da instância e absolvição do mérito) que foi praticado em vez do acto omitido, devendo ser ordenada a efectivação daquela audiência com a finalidade das al.s) b) e d) do artigo 591 e b) do nº 1 do artigo 595 - nº 2 do artº 195º, todos do C.P.C.
B) Se o A., Condomínio peticiona acautelar e assegurar a conservação e manutenção de parte comum por danos como os que descreve nos artigos 2ª, 3º e 4º do articulado transcrito acima em 8º e 9º destas alegações,
B.1.) algo que, ainda que apontado tão somente como indícios, se descreve como defeitos de planeamento e execução de elementos estruturantes, mesmo de canalização e escoamento, que juridicamente e, por isso, devem ser entendidos como “defeitos no imóvel”, – na compreensão acolhida para esta figura jurídica nos doutos arestos da RP20180305177/15.0T8CPV-A.P1 de 03/05/2018, de 03/05/2018, do STJ. de 17.12.2015, e pelos autores citados nas notas 17, 24 e 25 do aresto 995/16.2T8BGG.G2, de 14.02.2019),
B.1.1) defeitos que, como ali se escreve, “já estão a causar - e podem dar, futuramente, causa a - danos em outras partes comuns, designadamente pelas infiltrações que daí advêm e atingirão, desde logo, as placas entre fracções “cfr. ponto 10º destas alegações onde se transcreve parte do ponto 14 da matéria de facto pressuposto da douta decisão (!!),
B.1.2) demais quando na resposta - refª: 33242380 - se enfatiza que “4º - Não se peticionou - no que se refere aos artigos 50º e 51º danos que nada tenham a ver com o que sejam “humidades decorrentes do errado caimento de varandas e instalações de casas de banho” (artigo 64º, in fine da p.i)” (sic - com sublinhado nosso)”, parece incontroverso que a relação material configurada se contém na salvaguarda de “partes comuns”.
B.2) Se estaria, pois, o A legitimado, mesmo substantivamente, para salvaguardar os direitos relativos à propriedade comum, demais que não se fundamenta em direito de propriedade ou posse das fracções (cfr. doutos arestos da Rel. Porto, TRP0524412 de 24-10-2006 e 22.02.2005, in CJ, tomo I, pág. 195, citados acima em 12 destas), considerar que, face à relação material assim configurada pelo A., este não é parte processualmente legítima activa, além de confundir os conceitos de legitimidade substancial e legitimidade processual, é, s.m.o., violar, por erro de interpretação e aplicação o regime do artº 30, nº 3 do C.P.C.
Deve, pois, ser revogada a douta decisão que declarou a ilegitimidade activa do A e absolveu os RR. da instância quanto aos “pedidos b.8) e b.9) (assentes nos factos alegados sob os artigos 44.º, 45.º, 46.º, 48.º, 49.º, 50.º, 51.º da petição inicial), bem como dos restantes pedidos – v.g., pedido b.3) – na parte em que incluem o exercício de direitos sobre as frações autónomas do Edifício” (sic), para que os autos prossigam seus termos com o A como parte legítima para apuramento desses pedidos.
C.1) Quando se absolvem as RR D… e E… por estar caducado o direito do A por falta de denúncia atempada, pois que “Tratando-se do prazo de propositura da ação, o impedimento só ocorre com a formulação dos pedidos de reconhecimento do direito exercido e de condenação da contraparte a cumprir a sua obrigação, isto é, através da instauração da ação (já não da citação); tratando isto é, através da instauração da ação (já não da citação); tratando-se de um ónus, só se dá com a sua satisfação inequívoca”,
C.2) apesar do que se dera como pressuposto em termos de matéria de facto – e que se reproduziu acima em 24 destas –,
C.3) não se fez aplicação da figura do “reconhecimento”, que, pelo efeito de tornar certo o direito contra as contestantes exercitável – cfr. autores e locais citados em 25 e 25.1 acima –, implica dispensa de qualquer denúncia,
C.4) nem tratou adequadamente essa conduta sob o prisma da violação da boa fé contratual e processual, face aos princípios da cooperação e boa fé processual.
Porque houve errónea interpretação e aplicação dos artigos 331, nº 2, 352º, 236, nº1, bem como 334 do C.C., bem como dos princípios constantes dos artigos 8º, 574, nº3 – Iª parte e 457, nº2, a) e b) do C.P.C., deve ser revogada a douta decisão quanto à caducidade por falta atempada de denúncia de defeitos, arguida pelas RR. D… e E….
D) Para declarar procedente a excepção de caducidade invocada pela Ré C… se afirma que, porque se trata de “ … [que] defeitos dizem respeito a uma obra entregue pelo empreiteiro em 29 de janeiro de 2013. Tal significa que a ação destinada a exercer o direito à sua reparação deveria ter sido interposta até 29 de janeiro de 2018”,
D.1) A douta decisão encarou a questão sob o regime geral da empreitada, não aplicando o regime especial do Dec. Lei 67/03, tal como se considera na doutrina e jurisprudência que, a título exemplificativo, se apontou em 31 e 31.1.
D.1.1) Ao fixar o termo “a quo” em 29.01.2013, agiu ao arrepio da orientação que se apontou acima em 33, 37 e 38, sendo que no douto aresto referido neste último se diz : “No caso de a acção ser proposta pela administração do condomínio na sequência de deliberação da respectiva assembleia de condóminos, esse prazo máximo de caducidade da acção deverá contar-se desde a data em que os condóminos adquirentes já possuem a maioria do valor do prédio, ….] (sic – com sublinhado nosso). E mais decidiu,
D.1.1.1) sem atentar no quadro fáctico, documentado e aceite, em 34, 34.1, 39 – sendo que, o que se alega em 40 e 40.1 faz perceber quando (e se) se deve considerar ter ocorrido a “entrega do prédio para uma entidade/administração distanciada do vendedor e com plena autonomia para denunciar os eventuais defeitos existentes na obra” (sic) - arestos do STJ de 29-11-2011 e 721/12.5TCFUN.L1.S1. de 31.05.2016 (!!).
A acção de danos denunciados poderia, pois, tendo em conta o regime do artigo 5º - A nº 3 do Dec.-Lei 67/03, ser instaurada até, no mínimo, Junho de 2019!! Intentada que foi em Maio de 2019, não estava caducada!!
A douta decisão fez, pois, aplicação errada do regime dos artigos 329.º, como artº 272, ex vi do artº 278, todos do C.C., e não aplicou o regime do nº 3 do artigo 5-A do Dec. Lei 67/2003, como deveria.
Deve, pois, ser julgada improcedente a excepção de caducidade relativa ao prazo de garantia arguida pela Ré C…;
D.2) Ao decidir sobre “o termo a quo” sem ter considerado a matéria de facto alegada em 63º e 64º da p.i., onde se relataram para além de defeitos que poderiam ser cognoscíveis pelo A em Junho de 2016,
- defeitos outros que precisou, quanto à natureza e causa (“danos decorrentes da deficiente impermeabilização de paredes expostas à intempérie, bem como o assentamento, agravado pela circulação de veículos de e para a garagem, com a consequente desagregação de cubos no pavimento”),
- indicando um termo “a quo” (“que tudo ocorreu após o inverno de 2016”),
- sendo que no que respeita a humidades decorrentes do errado caimento de varandas e instalações de casa de banho”, reporta a Junho de 2017 a data de constatação, factos de que, como se consagra no ponto 14 da douta decisão “[disto] foram todas as RR. notificadas “aquando do procedimento de produção antecipada de prova n.º 15649/17.4T8PRT em 10 de agosto de 2017 (fls. 81)”, além de se ter violado a regra da al. b) do nº 1 do artigo 595 do C.P.C., vício processual que expressamente se argui, desconsiderou a figura dos defeitos e o momento em que se devem considerar relevantes, apesar do que se escreve nos textos doutrinais e na decisão jurisprudencial enumerados acima em 41.1 e 43.
Houve, pois, errada interpretação do artigo 1224, nº2 do C.C., como errada aplicação do mesmo, pois deveria ter sido, antes, aplicada a norma do artigo 5- A do Dec- Lei 67/2003, “norma especial relativamente às regras gerais do Código Civil previstas para o contrato de empreitada, derrogando aquelas com as quais se revelem incompatíveis no seu campo de aplicação – o da relação de consumo- apud STJ 721/12.5TCFUN.L1.S1, de 05/31/2016.
Porque em Maio de 2019 não caducara o exercício judicial do direito à reparação contra a Ré C…, nem nenhumas das 2ª e 3ª RR (!!), deve ser julgada improcedente a excepção de caducidade por omissão atempada de denúncia de defeitos.
E) Ao considerar que quanto à “ …relevância à produção antecipada de prova – contra o que entendemos –, esta só poderá ser para efeitos de denúncia (participação recetícia de um defeito), e já não para efeitos de exercício efetivo do direito (impedimento da caducidade da ação)” (sic - com sublinhado nosso), a douta decisão fez errada interpretação do regime do procedimento incidental de produção de prova, face ao regime do artigo 5-A do Dec. Lei 67/2003 e 331, nº1 do C.C.
Na verdade, e salvo melhor opinião, tal como se expendeu acima de 47 a 53 destas,
E.1) Tendo em conta os princípios que norteiam o instituto da caducidade e o que interessa à definição do direito em dado prazo – como se apontou com autores citados em 45, 45.1 e 47 –, bem como a natureza do “procedimento autónomo”, com regime de contraditoriedade, esta assegurada por prévia notificação pessoal (como expendemos acima em 47 a 50 destas),
E.2) e porque o legislador na lei especial – artº 5º, nº 4 do Dec. Lei 67/2003 – se basta para fazer suspender o prazo de caducidade com uma tentativa extrajudicial,
E.2.1) se tivermos em conta o que, em termos de “cooperação”, com vista à brevidade e eficácia na justa composição do litígio “– artº 7º, nº 1 do C.P.C. – , em termos de simplificação e agilização processual”, até para o encurtamento de discussão, e para “justa composição do litígio em prazo razoável “ – artigo 6º do mesmo diploma adjectivo – se busca com o espírito inovador também da redução dos pontos de divergência que perpassa no nº 4 do artº 594º do C.P.C., E.2.2) – atenta a antecipação, que, através de procedimento, cuja instauração pressupõe a definição dos parâmetros de um litígio, a prova pericial nele obtida permite, seja no momento da instrução, seja até em termos de delimitação prévia
do litígio – artº 420º, nº 2 do C.P.C., a “relevância da produção antecipada de prova …..[não será] ”[– contra o que entendemos –, esta] só [poderá ser] para efeitos de denúncia (participação recetícia de um defeito),( sic, na douta sentença), antes revela exercício de direito, Demais que
E.3) o artº 331º, nº1 do C.C. exige tão somente, “prática do acto a que a lei …. atribua efeito impeditivo algo que “pode ser um contrato, um acto unilateral..” (apud BMJ.107, pág.229 e autor cit. na nota 1175) (atente-se que também no C.C. só se alude expressamente a “acção” p. ex., nos artigos 1410, nº1 e 2178, ou, quanto a direitos indisponíveis – artgs 1643 e segs., 1810, 1814, 1817, p.ex - todos do C.C), enquanto que esta “lei” – artigo 5-A do Dec. Lei 67/2003 – não usando expressamente o meio da acção, antes se basta com “exercício do seu direito” (e não é irrelevante que exclua a arbitragem… pois aqui já há apelo a uma decisão condenatória, alternativa de jurisdição que a lei orgânica dos tribunais ao tempo do C.C. não previa!!).
E.4) Ao criar um anómalo regime de suspensão, algo que o típico instituto da caducidade – artigos 328 e segs do C. Civil –, como a doutrina nacional e estrangeira e mesmo direito alemão e italiano (cfr. B.M.J. 107, págs. 209 a 213), não equacionava, o legislador de 2003 não podia, a fortiori, desconsiderar o efeito ao menos suspensivo da caducidade que a instauração de procedimento prévio cuja data de instauração e cognoscibilidade se dá como assente em 14 e 15 da douta fundamentação da decisão recorrida (cfr. 44 destas).
Por isso,
E.5) Em 14.06.2017 ou, quando menos, em 10 de agosto de 2017 tinha sido praticado acto tendente a delimitar o objecto do litígio, conhecido das RR., pelo que no mínimo estava suspenso o prazo de caducidade de 3 anos que decorria desde denúncia de defeitos.
Por erro de interpretação do regime do artigo 420º, nº2 do C.P.C e nº 4 do artigo 5º do Dec. Lei 67/2003, declarou-se caducidade de um direito – eliminação de defeitos pelos responsáveis – que não caducara em Maio de 2019.
F) Tendo desconsiderado a prova do alegado em 61º da p.i, e pelas razões que se expenderam acima em 55 e 56 destas, o douto tribunal omitiu conhecer de causa que obstaria à procedência da excepção de caducidade aduzida, ainda que não entendesse como “tentativa extrajudicial de conciliação”.
Houve, pois, insuficiência da base fáctica para a decisão – b) do nº 1 do artigo 595º do C.P.C., e, sempre, erro de interpretação do artigo 5º, nº4 do Dec. Lei 67/2003.
Há, pois, que revogar a douta decisão para que os autos prossigam para condenação solidária das RR, na eliminação dos defeitos estruturais, ocultos e aparentes, todos atempadamente denunciados e peticionada, já que, atento o alegado nos artigos 1º a 7º, 9º, 44º, 52º a 56º, 75º e 76º da p.i., há entre elas uma verdadeira “comunhão de fins”, a sustentar a tese da solidariedade entre as RR. – A. Varela, Obrigações, vol.I, 4ª ed., pág.
671.
3. A R. E…, S.A. contra-alegou em 02/jul./2020, pugnando pela improcedência do recurso, apresentando as seguintes conclusões:
A. Vem o ora Recorrente alegar, erros vício e erro de julgamento, pugnando pela revogação da douta sentença proferida e consequente prosseguimento dos autos para condenação solidária das Rés nos pedidos formulados.
B. Foram submetidas à apreciação do tribunal a quo as excepções de ilegitimidade activa, litispendência e caducidade.
C. Entende o Recorrente que o conhecimento das excepções pelo tribunal a quo com consequente prolação de saneador-sentença e absolvição das Rés, pressupunha “a obrigatoriedade de discussão em audiência prévia”.
D. Nos termos do disposto no artigo 592.º n.º 1 al. b) do CPC, a audiência prévia não se realiza “Quando havendo o processo de findar no despacho saneador pela procedência de exceção dilatória, esta já tenha sido debatida nos articulados”.
E. Sucede que após apresentação das contestações, o Autor apresentou a competente Resposta, no âmbito do qual teve oportunidade de se pronunciar sobre todas as excepções alegadas pelas Recorridas, exercendo o contraditório em conformidade.
F. Resulta dos autos que a audiência prévia agendada, e que veio a realizar-se, tinha como finalidade a tentativa de conciliação das partes.
G. E nada impede que assim seja, contrariamente ao que o Recorrente pretende dar a entender nas suas alegações de recurso, abordando a questão como se estivéssemos perante alguma preterição formal, isto é, o facto de tal diligência não se destinar também aos outros fins elencados no artigo 591.º do CPC.
H. O tribunal a quo concedeu às partes todas as oportunidades para carrearem para os autos todos os factos e documentos necessários ao julgamento da causa, ainda que não tenha sido realizada audiência prévia com o escopo previsto na al. b) do n.º 1 do artigo 591.º do CPC.
I. A audiência prévia realizou-se e ficou concluída.
J. Ainda que o tribunal a quo não tivesse proferido despacho saneador-sentença, os autos prosseguiriam, naturalmente, para julgamento e não para continuação de audiência prévia.
K. Pelo que, não merece qualquer censura a posição do tribunal a quo assumida no saneador-sentença, porquanto no âmbito do seu poder decisório e de livre apreciação, considerou, e bem, estar em condições de conhecer não só das excepções dilatórias, mas também da excepção peremptória de caducidade, proferindo decisão de mérito.
L. Não se verificando a invocada nulidade por omissão ou erro de julgamento, conforme o Recorrente pretende fazer crer.
M. Destarte, o Recorrente não tem legitimidade para discutir os alegados defeitos das fracções autónomas adquiridas pelos condóminos, mas tão somente para os alegados defeitos que dizem respeito às partes comuns.
N. Não está em causa uma legitimidade colectiva, isto é, caso em que o autor não tem legitimidade para intentar a ação, desacompanhado dos condóminos, mas sim um problema de legitimidade singular, uma vez que o autor não tem legitimidade para formular o pedido no que respeita às fracções autónomas.
O. Das atas da Assembleias de Condóminos, não resulta que estes tenham conferido poderes de representação, ou quaisquer outros que legitimem a apresentação pelo Autor da presente ação, tendo em vista o ressarcimento de alegados danos nas frações autónomas.
P. A administração da fração autónoma compete, em exclusivo, ao condómino titular do respetivo direito de propriedade (cfr. artigo 1305.º do CC), sendo inquestionável que a ação destinada a efetivar a responsabilidade do construtor/vendedor do prédio por defeitos de construção nas frações autónomas do prédio, não pode ser instaurada pelo Condomínio, aqui Recorrente.
Q. Neste sentido, veja-se o Acórdão da Relação do Porto de 24-10-2006, Processo 0524412, (disponível na íntegra em www.dgsi.pt).
R. No caso presente estamos perante uma ilegitimidade ativa quanto à matéria das frações autónomas, que nos termos da conjugação dos artigos 278.º n.º 1 d), 577.º e) e 578.º CPC, traduz-se numa exceção dilatória que conduz necessariamente à absolvição dos Réus instância.
S. Pelo que, bem andou o tribunal a quo ao decidir que “O autor não tem legitimidade para discutir os alegados defeitos das frações autónomas adquiridas pelos condóminos; apenas pode discutir os defeitos alegadamente existentes nas partes comuns.”
T. A respeito da excepção de caducidade, assiste razão às Rés conforme resulta da sentença, ao invocarem e comprovarem factos que revelam que à data da propositura da acção, os direitos que o autor exerce contra estas encontravam-se extintos por caducidade.
U. A obra foi entregue pela Ré C… em 29 de Janeiro de 2013, facto não impugnado pelo Autor.
V. O Autor dispunha do prazo de 5 anos, a contar da data supra referida, para instaurar a presente acção, ou seja, até 29 de Janeiro de 2018, nos termos do disposto no artigo 1225.º, n.º 1 do C.Civil, o que não sucedeu.
W. O Autor conhece os defeitos cuja reparação reclama, pelo menos, desde 11 de Janeiro de 2016, ou em última análise, desde 16 de Setembro de 2016, data em que o Autor remeteu à Ré C… a lista respeitante aos alegados defeitos existentes nas partes comuns.
X. A denúncia à Ré C… ocorreu, pelo menos, em 16 de Setembro de 2016, verifica-se que o Autor teria até Setembro de 2017 para instaurar a acção para reclamar a eliminação dos alegados, ao abrigo do disposto no artigo 1225.º n.ºs 2 e 3 d C. Civil.
Y. O Autor nunca denunciou às Rés D… e E… a existência de defeitos previamente à citação para a ação em apreço.
Z. Em 14 de Julho de 2017, foi instaurado o procedimento de produção antecipada de prova, tendo a Ré C… sido citada em 10 de Agosto de 2017, a Ré D… citada em 3 de Novembro de 2017 e a Ré E… citada em 16 de Novembro de 2017.
AA. O procedimento de produção antecipada de prova poderia, quanto muito, relevar para efeitos de concretização da denúncia às Rés – participação receptícia de um defeito – reportada à data das respetivas citações, mas já não para o exercício dos direitos de que o Autor se pretende valer e consequente impedimento do prazo de caducidade para instaurar a correspondente acção.
BB. Não obstante, tal denúncia ocorreria já depois do prazo de um ano do conhecimento dos alegados defeitos pelo Autor, nos termos do disposto no artigo 1225.º, n.º 2 do C. Civil.
CC. A presente acção foi instaurada em 21 de Maio de 2019, tendo a Ré C… sido citada em 28 de Maio de 2019, a Ré D… em 30 de Maio de 2019 e a Ré E… citada em 6 de Junho de 2019.
DD. À data da instauração da acção – 21 de Maio de 2019 - há muito que se encontrava ultrapassado o prazo para o Autor exercer os seus pretensos direitos, pelo que, há que concluir pela caducidade dos mesmos.
EE. No que respeita em concreto à aqui Recorrida E…, é inegável que ocorreu a caducidade do direito do Autor, por insatisfação do prazo de denúncia.
FF. Até à venda da última fração de que era proprietária, (o que ocorreu a 15.09.2016), tinha a mesma posição jurídica dos restantes condóminos, ou seja, era comproprietária das partes comuns do prédio e proprietária das frações melhor identificadas nos autos.
GG. E nessa qualidade, sempre agiu no sentido de ver reconhecido o seu direito correspondente à reparação dos danos existentes nas partes comuns, que limitavam o exercício pleno do seu direito de propriedade.
HH. A Recorrida, enquanto proprietária/condómina, em conjunto com os demais comproprietários, deliberou no sentido de se diligenciar junto da construtora C… (aqui 1.ª Ré), de modo a que a mesma procedesse à reparação dos defeitos da obra existentes nas partes comuns do edifício.
II. No que respeita às frações identificadas pelas letras “D” a “R” e “V” a “AE”, o Autor alegou a existência de determinados defeitos nas frações autónomas (cfr. artigo 44.º a 51.º da petição inicial), porém, até à citação para a ação, os condóminos/proprietários não denunciaram os defeitos ou vícios identificados no relatório pericial.
JJ. A única entidade a quem foram denunciados os defeitos foi à sociedade construtora E….
KK. Relativamente ao incidente de produção antecipada de prova, do mesmo não se pode extrair qualquer efeito ou conclusão para a aqui Recorrida em termos de responsabilização.
LL. O referido incidente, apenas serviu para apurar quais os danos existentes no edifício à data, sendo que os mesmos, na sua quase totalidade se reportam às partes comuns do edifício, partes essas sobre as quais, a ora Recorrida, nenhuma responsabilidade tem (ou seja, não construiu o edifício nem era o dono da obra).
MM. Como bem referiu o tribunal a quo, tal procedimento poderia, quanto muito, ser acolhido como acto de denúncia dos alegados defeitos invocados pelo Autor.
NN. Ainda assim, sempre se dirá que, uma vez que a Recorrida foi citada no âmbito do referido incidente de produção de prova em 16 de Novembro de 2017, à data da interposição da acção, 21 de Maio de 2019, mais de um ano depois, o direito do Autor já havia caducado.
OO. Os defeitos das fracções autónomas constantes do relatório pericial, nunca foram reportados à Recorrida pelos proprietários/condóminos, nomeadamente os que resultam elencados nos artigos 44.º a 51.º da petição inicial.
PP. Tal denúncia deveria ser efectuada até 1 ano após o conhecimento do defeito.
QQ. Assim, a falta de denúncia à ora Recorrida, determina a caducidade do alegado direito dos condóminos, nos termos do disposto no artigo 917.º do CC.
RR. Por esta via, na eventualidade de nesta sede vir a considerado que o Autor tem legitimidade para a presente ação no que concerne às fracções autónomas, sempre se dirá que também o direito do Condomínio em exigir à Recorrida a reparação de eventuais vícios e falta de qualidade nas frações autónomas do imóvel já caducou, nos termos do disposto nos artigos 916º, nº 1 e n.º 3, e 917º, do CC.
SS. Acresce ainda que, tal caducidade se mantém, se enquadrada no âmbito do Decreto Lei n.º 67/2003, de 08 de abril, que estabelece o regime da venda de bens de consumo e garantias associadas.
TT. O citado regime, no artigo 5.º-A, estabelece que o comprador deve denunciar ao vendedor a falta de conformidade num prazo de um ano a contar da data em que a tenha detetado.
UU. Pelo que, também por esta via, o direito do Condomínio em exigir à Recorrida a reparação de eventuais vícios e falta de qualidade nas frações autónomas do imóvel caducou, nos termos do disposto nos artigo 5.º - A e 4.º do Decreto Lei n.º 67/2003, de 08 de abril.
VV. Sendo ainda de mencionar que, a aplicação deste regime resulta discutível no caso presente, pois por um lado em termos de legitimidade ativa o Condomínio, aqui Recorrente, não se enquadra no conceito de consumidor e, por outro lado, se se atender ao proprietário de cada fração, também se dirá que existem situações em que não estamos perante verdadeiros consumidores para efeitos do regime em apreço
3. A R. D…, S.A., contra-alegou em 02/jul./2020, pugnando pela improcedência do recurso, apresentando as seguintes conclusões:
A. A nulidade por omissão invocada pelo Recorrente assenta numa cronologia imprecisa, por vezes mesmo falsa, omitindo factos essenciais e tentando fazer crer que o Recorrente não teve todas as oportunidades de contraditório, tendo até apresentado respostas e articulados supervenientes que o Tribunal a quo admitiu e considerou, quando poderia, face à Lei, não o fazer!
B. Sabendo que nos autos ocorreu efectivamente a audiência prévia, o Recorrente não se coíbe de invocar uma omissão de dispensa de audiência previa ou uma omissão de realização de audiência prévia, o que não é concebível.
C. Não logra o Recorrente pôr em causa a legitimidade do Tribunal a quo em, assim o entendendo, poder conhecer imediatamente do mérito da causa face à procedência da excepção de caducidade no Despacho Saneador, nos termos e para os efeitos do artigo 595º, nº 1, alínea b) do Código de Processo Civil.
D. Pelo que deve improceder a nulidade por omissão invocada pelo Recorrente.
E. Muito bem andou a Douta Sentença, uma vez que resulta claro dos autos que o Recorrente pretendia discutir alegados defeitos das frações autónomas, quando, como o próprio reconhece, apenas tem legitimidade para discutir os alegados defeitos das partes comuns,
F. É absolutamente incompreensível a argumentação que o Recorrente utiliza nas sua Alegações, no sentido de tentar fazer crer que alegados defeitos que carreou para os autos, apesar de serem das frações autónomas, são na verdade…das partes comuns, pelo que o fundamento relativo à ilegitimidade deve também ser considerado improcedente.
G. Muito bem andou a Douta Sentença quando entendeu se ter verificado a caducidade, pois é inequívoco que o Recorrente não denunciou, em tempo útil, os alegados defeitos à ora Recorrida.
H. Ficou provado que, pelo menos, desde 04.05.2015 que o Recorrente tinha já conhecimento dos alegados defeitos invocados na presente ação, e que o Recorrente não efetuou qualquer denúncia de defeitos à ora Recorrida, até à ora Recorrida ser citada para a presente ação, mais de 4 anos após aquele conhecimento, pelo Recorrente! Recorrida sequer mencionada em tais transcrições!
J. Mas, mesmo que tal documento existisse, com um teor como o alegado pelo Recorrente, o mesmo não significaria qualquer reconhecimento com os efeitos pretendidos pelo Recorrente, já que a mera transmissão de um facto à construtora – que in casu, repete-se, nem sequer existiu por parte da ora Recorrida – não equivale ao reconhecimento dos defeitos.
K. Pelo não poderia ter o Tribunal a quo ter decidido diferentemente, não merecendo qualquer censura a decisão de considerar procedente a excepção de caducidade oposta pela ora Recorrida.
L. Assim, o Douto Tribunal a quo decidiu, na Douta Sentença em crise, com grande objectividade, rigor e coerência, fazendo uma exacta e ponderada aplicação do Direito aos factos apurados, pelo que deve ser mantida na íntegra, por não merecer qualquer censura.
4. Admitido o recurso e sustentada inexistência da apontada nulidade, foram os autos remetidos a esta Relação, onde foram autuados em 07/out./2020, realizando-se o exame preliminar e cumprindo-se os vistos legais.
5. O objeto do recurso incide sobre a nulidade por preterição da audiência prévia (a), a ilegitimidade ativa quanto à matéria das frações (b), a caducidade do direito (c)
6. Não existem questões prévias ou incidentais que obstem ao conhecimento do mérito desde recurso.
*
* *
II. FUNDAMENTAÇÃO
1. Circunstâncias a considerar
1. No despacho proferido em 26/jun./2019 consta o seguinte:
“Para realização da audiência prévia proponho o dia 23 de outubro próximo, pelas 9 horas e 30 minutos.
A audiência visará a tentativa de conciliação.
A notificação do presente despacho destina-se a, no prazo de 5 dias, obter o acordo prévio dos ilustres mandatários quanto à data a fixar para a realização da audiência. Dispensa-se os ilustres mandatários (e o Ministério Público, quando tenha intervenção) do encargo de manifestarem a sua anuência, pelo que, nada sendo requerido a este propósito no prazo de 5 dias, considera-se haver prévio acordo na data indicada, desde já se fixando a mesma, em tal caso, para realização da audiência.
Finalmente, também desde já se consigna, para eventual exercício do direito de se pronunciarem - cfr. o art. 3.º, n.º 3, do Cód. Proc. Civ. -, que, no caso de virem a verificar-se posições contraditórias e incompatíveis, a conduta das partes poderá ser apreciada nos quadros do instituto da litigância de má fé.
Notifique aos ilustres mandatários (e ao Ministério Público, quando tenha intervenção).
Nada sendo requerido no prazo de 5 dias, proceda às restantes diligências e notificações.”
2. No dia 23 de outubro próximo, pelas 9 horas e 30 minutos realizou-se a Audiência Prévia, constando na sua acta o seguinte:
“Aberta a audiência pelo Mm.º Juiz foi tentada a conciliação entre as partes, não tendo a mesma sido possível.
Pelos ilustres mandatários das partes foi pedida a palavra e, sendo-lhes concedida requereram a suspensão da instância, por 30 dias, com vista a desenvolver negociações para concretizar um eventual acordo.
Em seguida pelo Mm.º Juiz foi proferido o seguinte
DESPACHO
Defere-se ao requerido, concedendo às partes o requerido prazo de 30 dias, findo o qual serão as partes notificadas para informar o estado das negociações.
Notifique.
Do antecedente douto despacho foram os presentes devidamente notificados.
Para constar se lavrou a presente ata que vai ser assinada, tendo a diligência encerrado pelas 10:10 horas.”
3. O A. Condomínio em 05/dez./2019 apresentou articulado superveniente o qual termina do seguinte modo:
Requer, pois, que, tendo em conta a pendência da instância entretanto suspensa (infelizmente, não com efeito útil), na fase da audiência prévia, se:
- admita o presente articulado superveniente;
- se ouçam as RR. e,
- se considere modificado o direito invocado, na parte em que, relativamente aos defeitos entretanto eliminados e acima referenciados, se condene os RR. a pagar ao A. o valor global de € 5.065,02 (cinco mil e sessenta e cinco euros e dois cêntimos), em vez de prestação de facto porque desnecessária.
4. Mediante despacho proferido em 10/dez./2019 foi determinado o seguinte:
“Notifique o autor para descrever os danos/defeitos (e não apenas os trabalhos de reparação) em causa, bem como a data da sua deteção, a data da sua denúncia e a data da sua reparação.
5. Por requerimento de 19/dez./2019 o A. Condomínio veio esclarecer nos termos aí melhor referenciados.
6. Mediante despacho proferido em 09/jan./2020 foi determinado o seguinte:
“Admite-se liminarmente o articulado. Notifique as rés para, querendo, oferecerem resposta.”
6.5. Mediante despacho proferido em 29/jan./2020 foi determinado o seguinte:
“Os factos constantes do articulado superveniente integrarão o objeto da instrução, nos termos previstos no art. 588.º, n.º 6, do CPC.
Para eventual elaboração da base instrutória, torna-se necessário que o autor concretize os factos deficientemente alegados nos arts. 27.º, 31.º, 32.º e 39.º da petição inicial, indicando, discriminadamente, (i) o elemento ou área do edifício afetada, (ii) o defeito detetado e (iii) o efeito ou dano causado (art. 590.º, n.º 4, do CPC).
Notifique o autor para, no prazo de 10 dias, aperfeiçoar a petição inicial, nos termos assinalados.”
6.6. O A. Condomínio aceitando esse convite ao aperfeiçoamento apresentou em 13/fev./2020 nova petição inicial, referenciando em itálico e sublinhado os acrescentos.
6.7. Mediante despacho proferido em 18/fev./2020 foi determinado o seguinte:
“Dispõem os réus de 10 dias para oferecer o contraditório aos esclarecimentos ora prestados.
Nada sendo dito, entende-se que mantêm a posição assumida na contestação relativamente aos artigos ora concretizados.
Notifique.”
*
2. Fundamentos do recurso
a) Nulidade por omissão da audiência prévia
O Novo Código de Processo Civil (Lei n.º 41/2013, de 26/jun., DR I, n.º 121 - NCPC) estabelece no seu artigo 195.º, n.º 1 do NCPC que “Fora dos casos previstos nos artigos anteriores, a prática de um ato que a lei não admita, bem como a omissão de um ato ou de uma formalidade que a lei prescreva, só produzem nulidade quando a lei o declare ou quando a irregularidade cometida possa influir no exame ou na decisão da causa” – sendo nosso o negrito, agora e adiante. Acrescenta-se no n.º 2 que “Quando um ato tenha de ser anulado, anulam-se também os termos subsequentes que dele dependam absolutamente; a nulidade de uma parte do ato não prejudica as outras partes que dela sejam independentes.” E como não se trata de uma nulidade de conhecimento oficioso, porquanto não está no catálogo previsto na I parte do n.º 1 do artigo 196.º do NCPC, o tribunal “só pode conhecer sobre reclamação dos interessados”, como decorre da II parte deste mesmo segmento normativo. O prazo para reclamar segue a regra geral de 10 dias, enunciada no artigo 149.º, n.º 1 do NCPC.
A jurisprudência tem constantemente assinalado que estando o vício de irregularidade amparado, ainda que indireta ou implicitamente, por um despacho judicial, o meio idóneo para se reagir contra essa ilegalidade, havendo a possibilidade de recurso, é mediante a impugnação desse despacho – neste sentido e como exemplo dessa consistência vejam-se os Ac. TRE de 05/nov./1998 (Des. Granja Fonseca), Ac. TRL de 11/jul./2019 (Des. Micaela Sousa), ambos em www.dgsi.pt.
O mesmo NCPC veio regulamentar de modo destacado a gestão inicial do processo e a audiência prévia. Assim, a disciplina da gestão inicial do processo passou a constar do seu artigo 590.º, enumerando-se no seu n.º 1 os casos de indeferimento liminar e consagrando-se no seu n.º 2 que “Findos os articulados, o juiz profere, sendo caso disso, despacho pré-saneador destinado a: a) Providenciar pelo suprimento de exceções dilatórias, nos termos do n.º 2 do artigo 6.º; b) Providenciar pelo aperfeiçoamento dos articulados, nos termos dos números seguintes; c) Determinar a junção de documentos com vista a permitir a apreciação de exceções dilatórias ou o conhecimento, no todo ou em parte, do mérito da causa no despacho saneador.”. Mais acrescentou-se nos dois segmentos seguintes o âmbito desse convite, distinguindo-se o convite para o suprimento das irregularidades processuais (n.º 3), do convite para o aperfeiçoamento da matéria de facto (n.º 4) – neste último enunciado normativo consta que “Incumbe ainda ao juiz convidar as partes ao suprimento das insuficiências ou imprecisões na exposição ou concretização da matéria de facto alegada, fixando prazo para a apresentação de articulado em que se complete ou corrija o inicialmente produzido”. No subsequente n.º 5, 6 disciplinou-se os articulados aperfeiçoados e no n.º 7 a irrecorribilidade do despacho de aperfeiçoamento. Neste bloco normativo passou-se a agrupar e a condensar os casos de indeferimento liminar e de convite ao aperfeiçoamento da petição inicial irregular ou deficiente, que na versão inicial do CPC de 1961 estavam, respetivamente nos artigos 474.º e 477.º do CPC 1961, sendo deslocados com a Reforma de 1995/96 (Decreto-Lei n.º 329-A/95, de 12/dez.), o primeiro para o artigo 234.º, n.º 5 – logo a seguir para o artigo 234.º - A (Decreto-Lei n.º 180/96, de 25/set.) – e o segundo para o artigo 508.º, como se fosse um despacho pré-saneador. A Reforma de 1995/96 veio constringir as hipóteses de indeferimento liminar e alargar à contestação as possibilidades de aperfeiçoamento. Daí que relativamente ao despacho liminar ou pré-saneador a “novidade” do NCPC seja apenas na sua nomenclatura normativa e sistematização, porquanto manteve a essência da Reforma de 1995.
Por sua vez, no artigo 591.º passou-se a regular a audiência prévia, preceituando-se o seguinte:
1 - Concluídas as diligências resultantes do preceituado no n.º 1 do artigo anterior, se a elas houver lugar, é convocada audiência prévia, a realizar num dos 30 dias subsequentes, destinada a algum ou alguns dos fins seguintes:
a) Realizar tentativa de conciliação, nos termos do artigo 594.º;
b) Facultar às partes a discussão de facto e de direito, nos casos em que ao juiz cumpra apreciar exceções dilatórias ou quando tencione conhecer imediatamente, no todo ou em parte, do mérito da causa;
c) Discutir as posições das partes, com vista à delimitação dos termos do litígio, e suprir as insuficiências ou imprecisões na exposição da matéria de facto que ainda subsistam ou se tornem patentes na sequência do debate;
d) Proferir despacho saneador, nos termos do n.º 1 do artigo 595.º;
e) Determinar, após debate, a adequação formal, a simplificação ou a agilização processual, nos termos previstos no n.º 1 do artigo 6.º e no artigo 547.º;
f) Proferir, após debate, o despacho previsto no n.º 1 do artigo 596.º e decidir as reclamações deduzidas pelas partes;
g) Programar, após audição dos mandatários, os atos a realizar na audiência final, estabelecer o número de sessões e a sua provável duração e designar as respetivas datas.
2 - O despacho que marque a audiência prévia indica o seu objeto e finalidade, mas não constitui caso julgado sobre a possibilidade de apreciação imediata do mérito da causa.
3 - Não constitui motivo de adiamento a falta das partes ou dos seus mandatários.
4 - A audiência prévia é, sempre que possível, gravada, aplicando -se, com as necessárias adaptações, o disposto no artigo 155.º.
No subsequente artigo 592.º mediante a epígrafe “Não realização da audiência prévia”, consigna-se no n.º 1 que “A audiência prévia não se realiza: a) Nas ações não contestadas que tenham prosseguido em obediência ao disposto nas alíneas b) a d) do artigo 568.º [irrelevância da revelia], b) Quando, havendo o processo de findar no despacho saneador pela procedência de exceção dilatória, esta já tenha sido debatida nos articulados”, aditando-se no n.º 2 que “Nos casos previstos na alínea a) do número anterior, aplica -se o disposto no n.º 2 do artigo seguinte.”.
Logo adiante no artigo 593.º, respeitante à “Dispensa da audiência prévia”, consagra-se o seguinte:
“1 - Nas ações que hajam de prosseguir, o juiz pode dispensar a realização da audiência prévia quando esta se destine apenas aos fins indicados nas alíneas d), e) e f) no n.º 1 do artigo 591.º.
2 - No caso previsto no número anterior, nos 20 dias subsequentes ao termo dos articulados, o juiz profere: a) Despacho saneador, nos termos do n.º 1 do artigo 595.º; b) Despacho a determinar a adequação formal, a simplificação ou a agilização processual, nos termos previstos no n.º 1 do artigo 6.º e no artigo 547.º; c) O despacho previsto no n.º 1 do artigo 596.º; d) Despacho destinado a programar os atos a realizar na audiência final, a estabelecer o número de sessões e a sua provável duração e a designar as respetivas datas.
3 - Notificadas as partes, se alguma delas pretender reclamar dos despachos previstos nas alíneas b) a d) do número anterior, pode requerer, em 10 dias, a realização de audiência prévia; neste caso, a audiência deve realizar-se num dos 20 dias seguintes e destina -se a apreciar as questões suscitadas e, acessoriamente, a fazer uso do disposto na alínea c) do n.º 1 do artigo 591.º”.
Mais uma vez confrontando o NCPC com o anterior CPC de 1991, mais precisamente com a referenciada reforma de 1995/96, podemos encontrar algumas similitudes com a audiência preliminar e a sua dispensa, então previstas nos artigos 508.º-A e 508.º-B – correspondendo este preceito ao n.º 5 do artigo 508.º-A, na redação inicialmente conferida pelo Decreto-Lei n.º 329-A/95, de 12/dez.. Na exposição de motivos deste último diploma mencionava-se a dado momento o seguinte: Mas onde, verdadeiramente, se inova de base é com a instituição da «audiência preliminar», que, visando sanear e, sempre que disso for caso, decidir o processo e indo muito além, na sua fisionomia formal e substancial, da actual audiência preparatória, aliás, consabidamente descaracterizada, na prática judiciária concreta, é erigida em pólo aglutinador de todas as medidas organizativas do mesmo processo e traduz a instituição de um amplo espaço de debate aberto e corresponsabilizante entre as partes, seus mandatários e o tribunal, de forma que os contornos da causa, nas suas diversas vertentes de facto e de direito, fiquem concertada e exaustivamente delineados; e se o manifesto apelo subjacente, nesta fase, a uma via de conciliação não for bem sucedido e a questão não se mover apenas e essencialmente no plano de direito, seguir se á a fixação comparticipada da base instrutória, com virtualidade de reclamação e decisão imediata das respectivas questões, assim se delimitando o objecto da futura audiência de discussão e julgamento. Por tudo isto se procurou rodear a respectiva disciplina de cautelas peculiares, de forma que, privilegiando se a presença das partes em caso de interesses disponíveis, a sua realização seja realmente efectivada, por via de consenso de data e sem possibilidade de adiamento, nela se indicando, sendo caso disso, os meios probatórios e se fixando, também concertadamente, a data da audiência final. Sem embargo, será de admitir que, quando a discussão a fazer, findos os articulados, tenha apenas por objecto a fixação da base instrutória e esta se prefigure revestir simplicidade, o juiz possa dispensar a convocação da audiência preliminar, saneando e fixando essa base em despacho escrito, cuja reclamação poderá ser apresentada no início da audiência de julgamento.”
Na Exposição de motivos da Proposta de Lei n.º 113/XII (2.ª) (Diário AR II-A, n.º 41, de 30/nov./2012) sublinhava-se que “como medidas essenciais prevê-se a criação de um novo paradigma para a ação declarativa e para a ação executiva, a consagração de novas regras de gestão e de tramitação processual, nomeadamente a obrigatoriedade da realização da audiência preliminar tendo em vista a identificação do objeto do litígio e a enunciação dos temas da prova” (p. 2). Referia-se também que “O novo figurino da audiência prévia, designação ora dada à audiência a realizar após a fase dos articulados, assente decisivamente num princípio de oralidade e concentração dos debates, pressupondo a intervenção ativa de todos os intervenientes na lide, com vista a obter uma delimitação daquilo que é verdadeiramente essencial para a sua plena compreensão e justa resolução, conjugado com a regra da inadiabilidade e com a programação da audiência final, é suscetível de potenciar esse resultado desejável” (p. 3). Mais adiante explicitava-se que “Há um manifesto investimento na audiência prévia, entendida como meio essencial para operar o princípio da cooperação, do contraditório e da oralidade” e por isso “A audiência prévia é, por princípio, obrigatória, porquanto só não se realizará nas ações não contestadas que tenham prosseguido em regime de revelia inoperante e nas ações que devam findar no despacho saneador pela procedência de uma exceção dilatória, desde que esta tenha sido debatida nos articulados” (p. 8). Daí que “Numa perspetiva de flexibilidade, mas nunca descurando a assinalada visão participada do processo, prevê-se que o juiz, em certos casos, possa dispensar a realização da audiência prévia. Nessa hipótese, o juiz proferirá despacho saneador, proferirá despacho a identificar o objeto do litígio e a enunciar os temas da prova, programando e agendando ainda os atos a realizar na audiência final, estabelecendo o número de sessões e a sua provável duração” (p. 8).
O desenho legislativo da audiência prévia institui esta enquanto modelo intercalar do processo, de modo a possibilitar o debate oral, o contraditório e a participação processual, sendo obrigatório no caso de o processo findar quando se conheça desde logo do mérito da ação, incluindo o conhecimento das excepções peremptórias, sendo facultativo quando o processo tenha de prosseguir ou finde mediante a apreciação de uma excepção dilatória já discutida. E a audiência prévia tem finalidades distintas, assumindo-se como principais, quando são estruturantes, ou secundárias, quando estas são dispensáveis.
A realização de audiência prévia que não possibilite a integralidade das suas finalidades principais, como seja a ocorrência de um debate oral sobre as controvérsias conducentes ao conhecimento do mérito da ação através do saneador-sentença, integra uma nulidade, porquanto omite uma irregularidade com influência no exame da causa.
A jurisprudência tem sido dominante no sentido de que a não realização de audiência prévia, impondo a lei a sua realização, constitui uma nulidade processual, podendo esta ser arguida em sede de recurso, conduzindo à anulação da decisão que dispensou a sua convocação, assim como do saneador-sentença que se seguiu a essa decisão – neste sentido, entre outros, Acs. de TRP 12/nov./2015 (Des. Filipe Caroço), 12/set./2019 (Des. Judite Pires), 27/set./2019 (Des. Aristides Rodrigues de Almeida); Acs TRL de 22/mar./2018 (Des. Teresa Soares), 20/dez./2018 (Des. Luís Espírito Santo), 30/mai./2019 (Des. Isoleta Almeida Costa), 11/jul./2019 (Des. Ana Azeredo Coelho); Ac. TRG de 10/out./2019 (Des. Paulo Amaral); Ac. TRE de 10/mai./2018 (Des. Mata Ribeiro), 24/mai./2018 (Des. Tomé Ramião), 18/out./2018 (Des. Vítor Sequinho); Ac. TRC 03/mar./2020 (Des. Maria Catarina Gonçalves). E como se refere no citado acórdão do TRP de 12/nov./2015 “Mesmo quando a questão tenha sido debatida nos articulados, a decisão de dispensa deve ser precedida da consulta das partes (art. 3.º, n.º 3 do Código de Processo Civil), assim se garantindo não apenas o contraditório sobre a gestão do processo, mas também uma derradeira oportunidade para as partes discutirem o mérito da causa”.
No caso em apreço, não podemos dizer que não foi convocada ou não se realizou a audiência prévia. No entanto, esta apenas teve como seu único propósito a conciliação dos litigantes, numa estrita visão auto-compositiva da audição das partes. Isto significa que foram desde logo preteridos outros desígnios possíveis dessa diligência, como seja possibilitar às partes a discussão jurídica, mediante debate oral, “quando [o tribunal] tencione conhecer imediatamente, no todo ou em parte, do mérito da causa”, sendo esta uma das finalidades estruturantes da audiência prévia, como foi devidamente assinalado na exposição de motivos da Proposta de Lei do NCPC. Como se pode constatar, o tribunal recorrido não deu pleno cumprimento às exigências legais e à compreensão teleológica contemporânea da audiência prévia, tanto na sua convocação, como na sua realização, conferindo apenas prioridade à tentativa de conciliação das partes, ignorando as demais finalidades, o que, convenhamos, é uma leitura acentuadamente minguante dos assinalados princípios da cooperação, do contraditório e da oralidade. Tendo sido convocada audiência prévia apenas com a finalidade de obter a conciliação das partes e sendo suspensa a instância para esse efeito, sem que viesse a ser obtido qualquer acordo, não tendo sido posteriormente retomada a audiência prévia, de modo a propiciar o debate oral prévio sobre as questões controversas, optando-se por proferir, desde logo, saneador-sentença julgando procedente a excepção peremptória de caducidade, absolvendo os RR. do pedido, ocorre uma nulidade, com repercussões naquela decisão judicial. A procedência deste fundamento recursivo, prejudica o conhecimento das demais questões objeto de recurso.
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Na procedência do recurso e tendo havido oposição das RR., as custas ficam a cargo destes últimos – 527.º, n.º 1 e 2 NCPC.
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No cumprimento do disposto no artigo 663.º, n.º 7 do NCPC, apresenta-se o seguinte sumário:
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III. DECISÃO
Nos termos e fundamentos expostos, delibera-se anular o saneador-sentença por omissão da audiência prévia, a qual deve ser retomada de modo a possibilitar a discussão oral das questões controversas conducentes à caducidade.

Custas deste recurso a cargo dos recorridos.

Notifique.

Porto, 03 de dezembro de 2020
Joaquim Correia Gomes
António Paulo Vasconcelos
Filipe Caroço