Acórdão do Tribunal da Relação do Porto | |||
Processo: |
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Nº Convencional: | JTRP000 | ||
Relator: | MANUELA MACHADO | ||
Descritores: | INTERVENÇÃO PROVOCADA LITISCONSÓRCIO NECESSÁRIO LITISCONSÓRCIO VOLUNTÁRIO | ||
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Nº do Documento: | RP202406061940/23.4T8PNF-A.P1 | ||
Data do Acordão: | 06/06/2024 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Texto Integral: | S | ||
Privacidade: | 1 | ||
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Meio Processual: | APELAÇÃO | ||
Decisão: | CONFIRMADA | ||
Indicações Eventuais: | 3ª SECÇÃO | ||
Área Temática: | . | ||
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Sumário: | I - De acordo com o disposto no art. 316.º, nº 1 do CPC, quanto à intervenção provocada, ocorrendo preterição de litisconsórcio necessário, qualquer das partes pode chamar a juízo o interessado com legitimidade para intervir na causa, seja como seu associado, seja como associado da parte contrária, resultando, pois, do teor do preceito citado, que o chamamento só pode ter lugar “ocorrendo preterição de litisconsórcio necessário”. II - A previsão da alínea a), do nº 3, do art. 316.º do CPC, ou seja, o requerimento de intervenção principal provocada com fundamento no interesse atendível do réu, em chamar a intervir outros litisconsortes voluntários, sujeitos passivos da relação material controvertida, só se verifica nos casos de litisconsórcio voluntário, nos termos do disposto no art. 32.º do CPC, quando tal seja de retirar da relação material controvertida, tal como é apresentada pelos autores. III - O disposto no art. 317.º do CPC, que se refere a condevedores solidários, também não tem aplicação no caso em que a solidariedade não resulte da lei ou da vontade das partes – art. 513.º do Código Civil. | ||
Reclamações: | |||
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Decisão Texto Integral: | Apelação n.º 1940/23.4T8PNF-A.P1 Acordam na 3ª secção do Tribunal da Relação do Porto RELATÓRIO: AA, maior, contribuinte fiscal nº ..., e mulher BB, maior, contribuinte fiscal nº ..., ambos com residência na Rua ..., ... ..., Penafiel, instauraram ação declarativa, sob a forma de processo comum contra CC, maior, contribuinte fiscal nº ... e esposa DD, contribuinte fiscal nº ..., ambos com residência em …,..., ..., Alemanha. Alegando que compraram aos réus, o prédio urbano que identificam, o qual apresenta defeitos que descrevem e que denunciaram, pedem a condenação dos Réus a: a) reparar/eliminar os defeitos de construção e substituir os materiais que não podem ser reparados por violação de execução de obra/projeto, elencados na P.I, da responsabilidade dos Réus, no prazo máximo de 60 dias a contar do trânsito em julgado da sentença; b) Bem como serem os Réus condenados, a título de sanção pecuniária compulsória, no pagamento de uma quantia diária não inferior a €. 50,00 por dia decorrido o prazo de 60 dias fixado para eliminação/reparação dos defeitos de obra e substituição dos materiais que não cumpriram o projeto de obra. c) A indemnizar os Autores por danos patrimoniais no valor de € 869,56. d) A indemnizar os Autores por danos morais, pagando para isso a quantia de € 2.500,00. Na contestação que os réus apresentaram, e alegando que apenas procederam à venda do imóvel, mas não à respetiva construção, pedem a intervenção principal provocada de: 1. A... UNIPESSOAL, LDA., NIPC ..., com sede na Avenida ...., traseiras, ..., Penafiel, (...), 2. B..., LDA, NIPC ..., com sede na rua ..., ... (...); 3. C..., LDA., NIPC ..., com sede na rua ...- ... e ..., ... e ..., Marco de Canaveses (...), 4. EE – D..., empresário em nome individual, NIF ......, com domicílio profissional na Rua ..., ... (...), Penafiel, 5. E..., UNIPESSOAL, LDA, NIPC ..., com sede na Travessa ..., ..., ... (...), Penafiel, 6. F..., LDA., NIPC ..., com sede na Rua ..., ... (...), Penafiel, Porquanto, para execução do imóvel vendido aos AA., os RR. celebraram com as referidas sociedades contratos de empreitada. Deste modo, a provar-se existirem os defeitos elencados pelos AA. na sua petição inicial, a nível de carpintaria, serralharia e construção civil, há lugar a responsabilidade contratual por parte dos ora chamados na sua reparação, na qualidade de construtores do imóvel. Os autores opuseram-se à admissão da intervenção. * Por decisão de 07-12-2023, foi decidido não admitir a requerida intervenção principal provocada, tendo a decisão o seguinte teor:“Os réus vieram deduzir o incidente de intervenção principal provocada de: 1. A... UNIPESSOAL, LDA., NIPC ..., com sede na Avenida ...., traseiras, ..., Penafiel, (...); 2. B..., LDA., NIPC ..., com sede na rua ..., ... (...); 3. C..., LDA., NIPC ..., com sede na rua ... - ... e ..., ... e ..., Marco de Canaveses (...); 4. EE – D..., empresário em nome individual, NIF ......, com domicílio profissional na Rua ..., ... (...), Penafiel; 5. E..., UNIPESSOAL, LDA., NIPC ..., com sede na Travessa ..., ..., ... (...), Penafiel; e 6. F..., LDA., NIPC ..., com sede na Rua ..., ... (...), Penafiel. Para tal alegam que celebraram contratos de empreitada com as aludidas empresas e que, caso se provem os defeitos alegados pelos AA., há responsabilidade contratual dos chamados na sua reparação, na qualidade de construtores do imóvel. Já se pronunciaram os AA. pelo indeferimento do requerido, uma vez que a relação material controvertida é entre os AA. e os RR., vendedores do imóvel, e que nunca os AA. tiveram qualquer relação com os sujeitos que se pretende chamar. * Cumpre apreciar e decidir da admissibilidade da requerida intervenção.* Em virtude da consagração legal do princípio processual da estabilidade da instância (art. 260º do C.P.C.), salvas as possibilidades de modificações consignadas na lei, uma vez efectuada a citação do réu, a instância deve manter-se a mesma quanto às pessoas, ao pedido e à causa de pedir.Assim, no que às modificações subjectivas concerne – além dos casos previstos na al. a) do art. 262º do mesmo código, que não estão em causa na presente acção –, os interessados podem lançar mão dos incidentes de intervenção de terceiros – al. b) do citado artigo. Nos incidentes de intervenção de terceiros verifica-se a vinda a um processo pendente de um terceiro – definido como quem não é parte originária no processo, nem sucessor de qualquer das partes – com o fim de valer, ou contra ele ser feita valer, uma pretensão. Estando pendente uma causa entre duas ou mais pessoas, estabelece o art. 316º, n.º 1, do C.P.C., que qualquer das partes pode chamar a juízo interessado com direito a intervir na causa, seja como seu associado, seja como associado da parte contrária. Quer isto significar que o interveniente só pode entrar na lide como associado de uma parte ou da outra. “A intervenção principal tem por objecto dirimir, em demanda pendente, litisconsórcio ou a coligação de um terceiro com alguma das partes da mesma demanda. A lei dá a esse terceiro o nome de “interveniente”. Há, pois, intervenção principal em litisconsórcio e intervenção principal em coligação” – cfr. Manual dos Incidentes da Instância em Processo Civil, E. Lopes Cardoso, pp. 189 e ss.. O DL n.º 329-A/95, de 12/Dez., veio introduzir significativas modificações ao regime de suprimento de excepções dilatórias e à admissibilidade e configuração dos incidentes de intervenção de terceiros. Como se afirma no preâmbulo do citado Dec. Lei, “consente-se, em certas circunstâncias, a sanação da própria ilegitimidade singular passiva, através da previsão da figura do litisconsórcio eventual ou subsidiário e da subsequente possibilidade de intervenção principal provocada do verdadeiro interessado em contradizer.”. Ora, face à versão apresentada pelos autores (que alegaram, além do mais, que o R. se dedica à construção e venda de imóveis e que o imóvel que compraram aos RR. padece de defeitos), tem de se concluir que os chamados não terão qualquer interesse directo em contradizer, nos termos do art. 316º, n.º 2, do CPC, face ao peticionado e caso se venha a demonstrar o alegado, pois os invocados chamados não contrataram com os AA. e não respondem perante estes, nem os AA. peticionam o que quer que seja em relação a eles (nem a sua intervenção se justifica em termos acessórios, não tendo sido alegado qualquer direito de regresso pelos RR. [sem prejuízo das acções autónomas que possam propor], ou seja, o busílis da questão está, efectivamente, no que se pretende obter com o incidente, que no caso concreto não se pode convolar, pois os RR. pretendem a condenação dos chamados face aos contratos celebrados, por responsabilidade na reparação dos defeitos caso estes se venham a provar, mas tal matéria não cabe nos requisitos do art. 321º do CPC, que aqui, também, nunca será admissível – cfr. o Ac. da RL de 26/11/2009, processo n.º 705/08.8TVLSB-A.L1-8, in www.dgsi.pt). Pelo exposto, de acordo com as disposições legais supra citadas, não se mostrando preenchidos os respectivos pressupostos, indefiro o requerido chamamento. (…)”. * Não se conformando com tal decisão, vieram os réus apresentar o presente recurso, o qual foi admitido como apelação, a subir de imediato, em separado e com efeito meramente devolutivo. Os apelantes apresentaram as seguintes conclusões: “A) Vem o presente recurso interposto da douta sentença proferida nos autos à margem referenciados, nos termos da qual se decidiu que não se mostram preenchidos os respetivos pressupostos, pelo que indeferiu o incidente de intervenção principal provocada deduzido pelos RR. na sua contestação. B) Os RR. discordam da douta sentença recorrida, razão pela qual interpõem o presente recurso, no qual pretendem que este Venerando Tribunal decida a presente questão: Considerando que in casu os AA. peticionam dos RR. A reparação de defeitos de que alegadamente padece a casa que os últimos lhe venderam, podem estes, mediante o incidente de intervenção principal provocada, chamar à demanda, como seus associados, os empreiteiros que construíram o imóvel, quer para os auxiliar na sua defesa, por terem contratado com eles a construção do imóvel nas suas várias especialidades, quer com vista ao acautelamento de um eventual direito de regresso? C) A intervenção principal implica, quando admitida, e nos termos do artigo 262.º, al. b) do CPC, a modificação subjetiva da instância, mediante a constituição de novo sujeito processual na posição de autor ou réu, em litisconsórcio ou coligação com os autores ou réus primitivos. D) Em conformidade com o disposto no artigo 316.º, n.º 1 do CPC, qualquer das partes pode chamar a juízo o interessado com direito a intervir na causa, seja como seu associado, seja como associado da parte contrária. E) A intervenção principal provocada pode destinar-se assim a sanar a preterição de litisconsórcio necessário, assegurando a legitimidade ativa ou passiva, mas não se destina exclusivamente a esse efeito. F) Efetivamente, também no caso de litisconsórcio voluntário, o autor pode livremente fazer intervir “algum litisconsorte do réu que não haja demandado inicialmente ou de terceiro contra quem pretenda dirigir o pedido nos termos do artigo 39.º” – cfr. n.º 2 do art.º 316º do CPC. G) Já o réu apenas pode requerer a intervenção principal provocada de outros sujeitos passivos “quando mostre interesse atendível em chamar a intervir outros litisconsortes voluntários, sujeitos passivos da relação material controvertida” – art.º 316.º, n.º 3 al. a) do CPC– ou quando for condevedor solidário da prestação que lhe está a ser exigida e pretenda fazer intervir o outro condevedor solidário, a fim de obter “o reconhecimento e a condenação na satisfação do direito de regresso que lhe possa vir a assistir, se tiver de realizar a totalidade da prestação” – art.º 317.º do CPC. H) Deste modo, cabem no âmbito do incidente de intervenção principal provocada “todas as situações de existência de uma pluralidade de devedores (obrigados) ou de garantes da obrigação objecto da causa principal, isto desde que se mostre interesse atendível, quer numa atuação defensional conjunta, quer no acautelamento de um eventual direito de regresso ou de sub-rogação que lhes assista. I) Tanto mais que, como é consabido, a legitimidade das partes (interesse em demandar e em contradizer) resulta em primeiro lugar da lei e só na falta de indicação da lei que a contrarie é que se atende à relação material controvertida (art.º 30.º n.º 3 do CPC). J) No caso em apreço a lei confere àqueles que se pretendem fazer intervir (empreiteiros) legitimidade para serem demandados, isoladamente ou a par dos vendedores do imóvel, aqui RR. (os quais foram só vendedores do imóvel e não construtores), (cfr. art.º 1225.º, n.º 1 do Código Civil), por serem igualmente responsáveis pelo prejuízo alegadamente causado aos terceiros adquirentes, aqui AA. K) Legitimidade para serem demandadas que também lhes confere o Decreto-Lei n.º 84/2021, de 18 de outubro, sob a epígrafe “DIREITOS DO CONSUMIDOR NA COMPRA E VENDA DE BENS, CONTEÚDOS E SERVIÇOS DIGITAIS”, nos seus artigos 15.º, n.º 10 e 40.º, diploma que igualmente prevê o direito de regresso do vendedor contra o produtor. L) Consequentemente, em face das citadas normas, podem os réus, aqui recorrentes, fazer intervir os litisconsortes (voluntários) desde que demonstrem interesse atendível nesse chamamento, o que efetivamente fizerem ao alegarem que foram os referidos chamados que construíram o imóvel e como tal estão em melhores condições que os RR. em saber se os defeitos efetivamente existem, se defenderem da sua existência ou não, auxiliando assim os réus na sua defesa. M) Face ao exposto, é evidente e objetivo o interesse dos RR., ora recorrentes, em chamar a intervir os empreiteiros, sujeitos passivos da relação material controvertida, para serem demandados na ação precisamente por vícios da construção. N) Em suma, os RR. têm assim interesse atendível em chamar a intervir os litisconsortes voluntários (empreiteiros) sujeitos da relação material controvertida. Reitera-se, tal interesse resulta não só do eventual direito de regresso contra os construtores, se os assacados defeitos resultarem da obra que estes realizaram e os réus forem condenados a eliminá-los, mas também para que os possa auxiliar na defesa, por ser precisamente aqueles a quem são assacados os vícios e que deve estar a par de como foi construído o edifício, serem detentores das técnicas utilizadas e ninguém melhor do que eles poderão contestar os eventuais defeitos de que os AA. se queixam. O) Violou, assim, a douta sentença recorrida o disposto nos artigos 30.º, 260.º, 262.º, 311.º, 316.º, 317.º todos do CPC, artigo 1225.º do C.C e artigos 15..º, n.º 10 e 40.º do DL 84/2021, de 18 de outubro, pelo que deve ser revogada e substituída por outra que admita o incidente de intervenção principal provocada deduzido pelos RR. e mande citar dos chamados para os termos da ação, seguindo-se os demais trâmites legais. Nestes termos e nos demais de direito que V. Exas. doutamente suprirão deve ser dado integral provimento ao presente recurso e, em consequência deve revogar-se a douta decisão recorrida e substituir-se por outra que admita o incidente de intervenção principal provocada deduzido pelos RR. e mande citar dos chamados para os termos da ação, seguindo-se os demais trâmites legais.”. Não foram apresentadas contra-alegações. * FUNDAMENTOS DE FACTOOs fundamentos de facto são os que constam do relatório que antecede. * MOTIVAÇÃO DE DIREITOO objeto do recurso é delimitado pelas conclusões da alegação do recorrente, não podendo este tribunal conhecer de matérias nelas não incluídas, a não ser que as mesmas sejam de conhecimento oficioso – cfr. arts. 635º, nº 4, 637º, nº 2, 1ª parte e 639º, nºs 1 e 2, todos do Código de Processo Civil. Atendendo às conclusões das alegações apresentadas pelos apelantes, a única questão a decidir é saber se deve, ou não, ser admitida a intervenção principal provocada requerida pelos réus/recorrentes. Vejamos: Os autores/recorridos pedem, através da ação, a condenação dos Réus a reparar/eliminar os defeitos de construção e substituir os materiais que não podem ser reparados por violação de execução de obra/projeto, do imóvel que dizem ter comprado aos réus, em determinado prazo, bem como pagamento de sanção pecuniária compulsória e indemnização por danos patrimoniais e morais. Na sua contestação, os réus alegam que apenas procederam à venda do imóvel, mas não à respetiva construção, pelo que pedem a intervenção principal provocada das sociedades com as quais, para execução do imóvel vendido aos AA., os RR. celebraram contratos de empreitada, justificando o interesse na intervenção, não só com base no eventual direito de regresso contra os construtores, se invocados defeitos resultarem da obra que estes realizaram e os réus forem condenados a eliminá-los, mas também para que os possam auxiliar na defesa, por serem aqueles quem está a par de como foi construído o edifício, sendo quem melhor poderá contestar os eventuais defeitos de que os Autores se queixam. Ora, após a citação do réu, deve a instância manter-se a mesma quanto às pessoas, ao pedido e à causa de pedir, salvas as possibilidades de modificação consignadas na lei, como resulta do disposto no art. 260.º do CPC, que prevê o princípio da estabilidade da instância. Contudo, esse princípio de estabilidade é passível de ser afetado por via de uma modificação subjetiva pela intervenção de novas partes, como se retira da previsão do art. 261.º do CPC, quando dispõe que “Até ao trânsito em julgado da decisão que julgue ilegítima alguma das partes por não estar em juízo determinada pessoa, pode o autor ou reconvinte chamar essa pessoa a intervir nos termos dos artigos 316.º e seguintes.”. De acordo com o disposto no art. 316.º, nº 1 do CPC, quanto à intervenção provocada, ocorrendo preterição de litisconsórcio necessário, qualquer das partes pode chamar a juízo o interessado com legitimidade para intervir na causa, seja como seu associado, seja como associado da parte contrária. Como resulta do teor do preceito citado, o chamamento só pode ter lugar “ocorrendo preterição de litisconsórcio necessário”. E, ocorre litisconsórcio necessário, nos termos dos arts. 33.º e 34.º do CPC, se a lei ou o negócio exigir a intervenção dos vários interessados na relação controvertida, caso em que a falta de qualquer deles é motivo de ilegitimidade, ou, se a intervenção de todos os interessados for necessária, pela própria natureza da relação jurídica, para que a decisão a obter produza o seu efeito útil normal. Não é, claramente, o que ocorre nos autos. O mesmo art. 316.º do CPC, permite, ainda, a intervenção provocada em mais dois casos: “Nos casos de litisconsórcio voluntário, pode o autor provocar a intervenção de algum litisconsorte do réu que não haja demandado inicialmente ou de terceiro contra quem pretenda dirigir o pedido nos termos do artigo 39.º.”, que também não tem aplicação no caso, já que não foram os autores a requerer a intervenção. E o nº 3 do mesmo preceito, por sua vez, dispõe que “O chamamento pode ainda ser deduzido por iniciativa do réu quando este: a) Mostre interesse atendível em chamar a intervir outros litisconsortes voluntários, sujeitos passivos da relação material controvertida; b) Pretenda provocar a intervenção de possíveis contitulares do direito invocado pelo autor.”. Não sendo, obviamente, as pessoas coletivas que os réus pretendem chamar à ação, contitulares do direito invocado pelos autores, vejamos se pode a situação ser integrada na previsão da alínea a), do nº 3, do art. 316.º citado, ou seja, se os réus têm interesse atendível em chamar a intervir outros litisconsortes voluntários, sujeitos passivos da relação material controvertida. Nos termos do disposto no art. 32.º do CPC, quanto ao litisconsórcio voluntário: “1 - Se a relação material controvertida respeitar a várias pessoas, a ação respetiva pode ser proposta por todos ou contra todos os interessados; mas, se a lei ou o negócio for omisso, a ação pode também ser proposta por um só ou contra um só dos interessados, devendo o tribunal, nesse caso, conhecer apenas da respetiva quota-parte do interesse ou da responsabilidade, ainda que o pedido abranja a totalidade. 2 - Se a lei ou o negócio permitir que o direito seja exercido por um só ou que a obrigação comum seja exigida de um só dos interessados, basta que um deles intervenha para assegurar a legitimidade.”. No caso, tendo em conta a relação material controvertida, tal como é apresentada pelos autores, não estamos perante uma situação de litisconsórcio voluntário, já que a relação material invocada é apenas entre os autores e os réus, pelo que também por esta via, não pode ser deferida a intervenção principal provocada pretendida pelos apelantes. Aliás, como refere Salvador da Costa, Os Incidentes da Instância, 5ª ed., págs. 113 a 118, a intervenção na lide de alguma pessoa como associado do réu pressupõe um interesse litisconsorcial no âmbito da relação controvertida, cuja medida da sua viabilidade é limitada pela latitude do acionamento operado pelo autor, não podendo intervir quem lhe seja alheio. Não tem, assim, aplicação o art. 316.º do CPC, e também não tem aplicação o disposto no art. 317.º do CPC, que se refere a condevedores solidários, o que também não é o caso, já que a solidariedade tem que resultar da lei ou da vontade das partes – art. 513.º do Código Civil, o que também não ocorre no caso. No sentido referido, veja-se o Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, Processo 34976/15.9T8LSB-A.L1-2, de 20-12-2017, disponível em dgsi.pt, onde se diz: “1. O litisconsórcio é necessário, segundo dispõe os nºs 1 e 2 do artigo 33º do C.P.C., quando a lei ou o contrato o impuserem ou quando resultar da própria natureza da relação jurídica, ela seja necessária para que a decisão a obter produza o seu efeito útil normal. 2. Resulta dos artigos 914º e 916º do Código Civil que, na compra e venda defeituosa, os sujeitos da relação substantiva são o comprador e o vendedor, decorrendo do artigo 1225º, nº 1 do C.C. que na empreitada de construção modificação ou reparação de edifícios ou imóveis destinados por sua natureza a longa duração, em que no decurso dos 5 anos a contar da entrega ou da garantia convencionada a obra venha a apresentar defeitos, o empreiteiro é responsável pelo prejuízo causado ao dono da obra ou ao terceiro adquirente; 3. E, o n.º 4 do citado artigo 1225º do C.C. estipula que os números anteriores se aplicam também ao vendedor de imóvel que o tenha construído, modificado ou reparado, o que significa que não tem aplicação ao caso em que a sociedade promotora e vendedora não o construiu, antes o mandou construir a um empreiteiro. 4. O artigo 30º, nº 3 do C.P.C. estatui que na falta de indicação da lei em contrário são considerados titulares do interesse relevante para efeitos de legitimidade os sujeitos da relação controvertida tal como foi configurada pelo autor; 5. Mas, ainda que se considerasse que a relação material controvertida poderia ser aquela também configurada pelos Réus na contestação e não apenas aquela trazida aos autos pelo Autor sempre a intervenção a chamamento por parte da ré estaria condicionada à demonstração do interesse atendível consagrado no artigo 316º, nº 3, alínea a) do C.P.C.. 6. Não estando o Autor a discutir a empreitada, apenas a compra e venda defeituosa, e não se verificando a situação em que a ré/vendedora haja sido ela própria a construtora, não se vislumbra o interesse atendível da ré em fazer intervir na acção o empreiteiro e o técnico alegadamente responsável pela obra, pelo que será de rejeitar o incidente de intervenção principal provocada passiva destes, antes sendo de admitir o incidente de intervenção acessória provocada.”. Afigura-se, assim, correta a decisão recorrida, quando decide não admitir a intervenção principal provocada requerida pelos réus/apelantes. Quando muito, os réus poderiam requerer a intervenção acessória provocada, para efeitos de direito de regresso, nos termos da previsão do art. 321.º do CPC, direito de regresso que, contudo, apenas em sede de alegações de recurso invocaram, e não no requerimento de intervenção. Deste modo, terá que improceder o recurso e manter-se a decisão recorrida. * Decisão:* Face ao exposto, acordam os juízes deste Tribunal da Relação em julgar improcedente a apelação interposta do despacho que não admitiu a intervenção principal provocada requerida pelos réus, mantendo a decisão recorrida. Custas pelos recorrentes. Porto, 2024-06-06 Manuela Machado Isabel Silva Paulo Duarte Teixeira |