Acórdão do Tribunal da Relação do Porto | |||
Processo: |
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Nº Convencional: | JTRP000 | ||
Relator: | JUDITE PIRES | ||
Descritores: | DESCOBERTO EM CONTA CONCRETIZAÇÃO CONTRATO | ||
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Nº do Documento: | RP2020110545487/19.3YIPRT.P1 | ||
Data do Acordão: | 11/05/2020 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Texto Integral: | S | ||
Privacidade: | 1 | ||
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Meio Processual: | APELAÇÃO | ||
Decisão: | CONFIRMADA A REVISÃO | ||
Indicações Eventuais: | 3ª SECÇÃO | ||
Área Temática: | . | ||
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Sumário: | I - O descoberto em conta é uma operação bancária através da qual o Banco consente que um seu cliente saque para além do saldo existente na conta de que é titular, até um certo limite e por um determinado prazo, não dependendo de acordo prévio entre o Banco e o cliente. II - A concretização de tal operação bancária não envolve nenhuma declaração de vontade expressa, antes assentando numa proposta tácita de ordem de levantamento por parte do cliente, de sorte que essa operação ficará sujeita ao regime do contrato de mútuo, dado a sua natureza ser semelhante à do contrato de depósito bancário, a que se aplica, conforme doutrina concreta, as disposições relativas ao contrato de mútuo. III - O Banco tem direito a haver do titular da conta as importâncias adiantadas e, não havendo prazo para o reembolso, pode exigi-lo a todo o tempo. | ||
Reclamações: | |||
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Decisão Texto Integral: | Processo n.º 45487/19.3YIPRT.P1 Tribunal Judicial da Comarca do Porto Juízo Local Cível de Gondomar – Juiz 3 Acordam no Tribunal da Relação do Porto: I. RELATÓRIO. 1. “Banco B…, S.A. – …”, pessoa coletiva n.º ………, com sede na …, Porto, apresentou requerimento de injunção, requerendo a notificação de “C… – Segurança Privada, S.A.”, pessoa coletiva n.º ………, com sede na Av…, …, …, Gondomar, no sentido de lhe ser paga a importância de €11.359,25 (onze mil, trezentos e cinquenta e nove euros e vinte e cinco cêntimos), sendo €9.075,33 (nove mil e setenta e cinco euros e trinta e três cêntimos) a título de capital em dívida, acrescida de €2.130,92 (dois mil, cento e trinta euros e noventa e dois cêntimos) de juros de mora e de €153,00 (cento e cinquenta e três euros) de taxa de justiça paga pela apresentação do requerimento de injunção. Fundamentou a sua pretensão em contrato celebrado coma Ré, do qual resultou um saldo negativo da conta de depósitos à ordem e das comissões bancárias devidas pela prestação de uma garantia bancária. A Ré apresentou oposição, na qual alega ter celebrado com o Autor um contrato de penhor específico sobre depósito a prazo e que, a partir de 23 de Março de 2015, ainda com um saldo bancário positivo de €2.802,30, o qual era, contudo, insuficiente, para efectuar pagamentos de dívidas da Ré à Segurança Social e a credores particulares, o Autor autorizou esses pagamentos com valores retirados da caução, que tinha um fim específico, pelo que se o saldo bancário ficou a descoberto foi por culpa exclusiva do Autor. Foi proferido despacho convidando o Autor a aperfeiçoar o requerimento injuntivo, convite ao qual respondeu, apresentando petição inicial articulada, tendo a Ré mantido o alegado na oposição, impugnando os factos alegados e documentos juntos. Após realização do julgamento, foi proferida sentença que, julgando a acção parcialmente procedente condenou “a Ré “C… – Segurança Privada, S.A.” a pagar ao Autor “Banco B…, S.A. – Sociedade…” a quantia de €9.075,33 (nove mil e setenta e cinco euros e trinta e três cêntimos) acrescida de juros de mora à taxa contratual para as operações a descoberto vencidos desde 04 de março de 2019 até efetivo e integral pagamento, absolvendo-a do demais peticionado”. 2. Por não se conformar com a referida sentença, dela interpôs a Ré recurso de apelação para esta Relação, rematando as suas alegações com as seguintes conclusões: “- O ponto 7 dado como facto provado devia ter sido dado como não provado porquanto a recorrente só teve conhecimento dos extratos desde a reunião da recorrente com as testemunhas arroladas pela recorrida em 2018 – conforme os depoimentos das testemunhas D… (00.00 – 10.15); E… (00.00 – 10.50) e o depoimento de parte de F… (00.00 – 11.06) - Por outro lado, qualquer operação a descoberto exige entre a recorrente (cliente) e a recorrida (banco) deve ser formal – obrigatório a exigência formal do negócio Termos em que se requer com o suprimento de vossas Excelencias, seja substituida a douta sentença proferida pelo tribunal a quo e consequentemente seja a recorrente so condenada pelas comissões e não os valores pagos a descoberto o que parece ser de inteira justiça”. O apelado apresentou contra-alegações, nas quais pugna pela improcedência da apelação e manutenção do decidido. Colhidos os vistos, cumpre apreciar. II. OBJECTO DO RECURSO. A. Sendo o objecto do recurso definido pelas conclusões das alegações, impõe-se conhecer das questões colocadas pela recorrente e as que forem de conhecimento oficioso, sem prejuízo daquelas cuja decisão fique prejudicada pela solução dada a outras, importando destacar, todavia, que o tribunal não está obrigado a apreciar todos os argumentos apresentados pelas partes para sustentar os seus pontos de vista, sendo o julgador livre na interpretação e aplicação do direito. B. Considerando, deste modo, a delimitação que decorre das conclusões formuladas pela recorrente, no caso dos autos cumprirá apreciar: - Se a recorrente deve ser apenas condenada a pagar ao Autor os valores relativos às comissões, não sendo devidos os valores pagos a descoberto. III- FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO. 1. O Autor é uma sociedade anónima, que se dedica à atividade bancária. III.1. Foram os seguintes os factos julgados provados em primeira instância: A. Do Requerimento de Injunção 2. No âmbito da sua atividade, o Autor celebrou com a Ré um contrato de conta de depósito à ordem com o n.º ………., cfr. o documento junto sob n.º 1 com a petição inicial cujo teor aqui se dá aqui por integralmente reproduzido. 3. Em consequência de várias operações efectuadas a débito e não suficientemente compensadas com operações a crédito, no período compreendido entre 23 de Março de 2015 e 10 de Abril de 2019, a conta titulada pela Ré veio a apresentar um saldo negativo no montante de €9.075,33. 4. Parte desse saldo é proveniente das comissões devidas pela Ré no âmbito da garantia bancária n.º ….-..-…….. emitida pelo Banco Requerente a favor do “Ministério da Administração Interna”, e que não foram liquidadas até ao momento. 5. A Ré constituiu um penhor sobre o depósito a prazo de que era titular junto do Requerente com o n.º ………., no montante de €14.000,00. 6. A Ré apresentou ao Autor, que aceitou, a proposta de garantia bancária que consta do documento junto sob o n.º 5 com a petição inicial cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido. 7. Apesar de o Autor enviar mensalmente à Ré os extratos da conta de depósito à ordem, a Ré não regularizou os valores a descoberto, motivo pelo qual o Autor interpelou a Ré, por diversas vezes, quer por carta, quer por correio eletrónico, no sentido de pôr termo à situação de incumprimento. 8. Porém, a Ré nada pagou. Da Oposição 9. Entre Autor e Ré, no dia 10 Outubro de 2012, foi celebrado um contrato de penhor específico sobre depósito a prazo, cfr. o documento junto sob n.º 1 com a oposição cujo teor aqui se dá aqui por integralmente reproduzido. 10. Esse contrato celebrado era referente à necessidade, por parte da Ré, de prestar uma caução no valor de €25.500,00 a favor do Ministério da Administração Interna; 11. A partir de 23 de Março de 2015, o saldo bancário corrente da Ré não permitia efectuar diversos pagamentos, a maior parte deles à Segurança Social, mas, alguns deles, também, a particulares. 12. A partir do dia 23 de Março de 2015, e ainda com um saldo bancário positivo de €2.802,30, foram autorizados pelo Autor diversos pagamentos. III.2. Factos Não Provados 13. Esses valores foram retirados da caução prestada para aqueles e apenas fins já referidos, presumindo a Ré que o Autor contava que a Ré depositasse esses valores para repor integralmente o valor da caução, o que não veio acontecer. Da Oposição 14. Tais pagamentos com o valor da caução foram autorizados pelo Autor, bem sabendo que não o podia fazer. IV. FUNDAMENTAÇÃO DE DIREITO. Não se conformando a recorrente com a decisão proferida em primeira instância sobre a matéria de facto submetida a julgamento, reclama desta instância o seu reexame.1. Reapreciação da matéria de facto. Na perspectiva da recorrente, deve a matéria vertida no ponto 7.º dos factos dados como provados ser julgada não provada. Para sustentar o entendimento defendido convoca prova testemunhal – depoimento das testemunhas D… e E… – e declarações de parte da representante da Ré, F…. Procedeu-se à audição integral da gravação que contém os depoimentos das indicadas testemunhas e da legal representante da Ré[1]. As testemunhas D… e E…, ambos bancários, funcionários do Autor, desempenhando o primeiro funções na área de insolvência desde 2013 e antes na área de recuperação de créditos, e o segundo desempenhando igualmente funções na área de insolvência há cerca de 10 anos, revelaram cabal conhecimento, por virtude das funções que exercem, acerca dos factos em discussão, os quais relataram, prestando detalhados esclarecimentos acerca da abertura pela Ré da conta à ordem aos balcões do Autor e factos ocorridos que viriam a culminar na formação do saldo negativo da mesma conta, cujo pagamento o mesmo reclama, e razões que a ele conduziram. F…, administradora única da Ré desde Janeiro de 2016, nela exercendo, antes dessa data, funções administrativas, referiu apenas saber dos factos o que lhe foi transmitido pelo Banco quando, no início, da sua administração, se dirigiu aos balcões de … para proceder à actualização da ficha das assinaturas, altura em que tomou conhecimento do crédito reclamado pelo Autor, que já se encontrava em situação de contencioso. Referindo que havia várias dívidas anteriormente contraídas e das quais não tinha conhecimento, acrescenta que estão a ser regularizadas através de planos de pagamento. Admite a existência e vigência da garantia bancária emitida pelo Banco Autor, uma vez que a empresa continua a poder exercer a sua actividade. Quanto à dívida cujo pagamento é reclamado pelo Banco, a administração da Ré entendeu que não devia proceder à sua liquidação, atribuindo a responsabilidade pela mesma ao anterior sócio gerente da Ré – quando esta era uma sociedade de responsabilidade limitada -, Sr. G… e também pelo facto de o Banco ter facilitado os descobertos, sustentando que a Ré poderia hoje renegociar a dívida com a Segurança Social e amortizar a mesma também através de um plano de pagamento. Mas, para além dos aludidos depoimentos e declarações não terem infirmado a matéria incluída no ponto 7.º dos factos considerados provados, a factualidade em causa deveria ter-se como admitida por acordo. No articulado que o Autor apresentou na sequência do convite formulado pelo despacho de 13.09.2019, alegou o mesmo, entre mais que “...apesar de o Autor enviar mensalmente os Extratos da conta de depósito à ordem para a Ré, a verdade é que esta não regularizou os valores a descoberto, motivo pelo qual o Autor interpelou a Ré, por diversas vezes, quer por carta, quer por correio eletrónico, no sentido de pôr termo à situação de incumprimento reiterado – cfr. comunicações que ora se juntam sob o documento n.º 6, cujo conteúdo se dá aqui como integralmente reproduzido para todos os efeitos legais” – artigo 6.º. Notificada deste articulado, limitou-se a Ré a responder que “...vem […] manter tudo o que foi alegado na sua oposição, impugnando os factos agora vertidos e impugnando, ainda, os documentos juntos”, sendo que na oposição não nega o envio dos extratos da conta à ordem, nem a interpelação efectuada pelo Banco, factos que no requerimento injuntivo não tinham sido articulados. Acresce que as diversas interpelações efectuadas pelo Banco à Ré para proceder à regularização do débito resultante do descoberto foram por aquele documentadas com a apresentação do articulado aperfeiçoado, achando-se as cópias das missivas dirigidas à Ré acompanhadas igualmente de cópias dos respectivos avisos de recepção assinados, pouco relevando, para o caso, quendo teve a actual representação da Ré conhecimento da dívida e da interpelação para ser efectuado o seu pagamento, já que é a responsabilidade social da Ré que está em causa e não a responsabilidade pessoal dos seus representantes, pretéritos ou actuais. Não existe, assim, fundamento válido que justifique a pretendida alteração da decisão relativa à matéria de facto que, por isso, permanece imodificada, improcedendo, nesta parte, o recurso. 2. Mérito do julgado. 2.1. Do descoberto em conta e responsabilidade pela sua liquidação. Acerca do contrato especial de crédito descoberto em conta escreveu A. Menezes Cordeiro[2]: “O descoberto em conta, também chamado facilidades de caixa, á a situação que se gera quando, numa conta corrente subjacente a uma abertura de conta, o banqueiro admita um saldo a seu favor, isto é: um saldo negativo para o cliente [...]. O descoberto pode advir dum negócio prévio com o banqueiro – abertura de crédito ou crédito pessoal. Pode, também, ser consequência automática de outros dispositivos: por exemplo, lançamento de despesas, lançamento de movimentos automáticos concretizados com o ATM off line ou, até, pagamentos de cheques sem provisão a que o banqueiro se encontrava obrigado, por força da lei relativa à circulação dos cheques. Na sua forma mais típica, o descoberto é tolerado pelo banqueiro, por curto período, como modo de facilitar, momentaneamente, a tesouraria de certos clientes. Ao descoberto em conta aplicam-se, tendencialmente, as regras do mútuo bancário [...]. Por vezes, a questão vem tratada nas cláusulas contratuais relativas à abertura de conta. Não havendo outros elementos, o descoberto ad nutum deve ser tomado como uma tolerância do banqueiro, que não constitui direitos para o cliente”. O “descoberto em conta” é uma operação bancária através da qual o Banco consente que um seu cliente saque para além do saldo existente na conta de que é titular, até um certo limite e por um determinado prazo, o que não depende de acordo prévio entre o Banco e o cliente[3]; “trata-se de uma situação acidental, independente de qualquer contrato escrito ou formalizado, e o Banco pode exigir do cliente o reembolso do saldo em toda e qualquer ocasião, a menos que se tenha acordado, em documento escrito, um prazo determinado para esse efeito”[4]. Com efeito, “a maior parte dos “descobertos em conta” não configura uma operação formalmente negociada; o cliente ordena a disponibilização de quantias superiores ao saldo (ordenando que entregue a si ou a quem ele indicar) não tendo o direito de o fazer por falta de depósito; o Banco, sem a tal ser obrigado, satisfaz as ordens do cliente, porque confia na sua solvabilidade. (…) apresenta-se como uma afloração clara da relevância das relações contratuais de facto: as relações entre o Banco e o cliente resultam de um comportamento típico de confiança, que não envolve nenhuma declaração de vontade expressa, antes numa proposta tácita de ordem de levantamento por parte do cliente, de sorte que essa operação ficará sujeita ao regime do contrato de mútuo, dado a sua natureza ser semelhante à do contrato de depósito bancário, a que se aplica, conforme doutrina concreta, as disposições relativas ao contrato de mútuo”[5]. Tais operações, ao contrário do que sustenta a recorrente, não demandam prévio acordo formal, não fazendo qualquer sentido convocar a doutrina acolhida no acórdão de uniformização de jurisprudência do Supremo Tribunal de Justiça, proferido a 11.10.1994 no processo n.º 079219, visando a mesma o contrato de desconto bancário, de natureza claramente distinta do desconto bancário, aqui em discussão. O “descoberto em conta” deve qualificar-se como empréstimo concedido pelo Banco ao titular da conta; esse adiantamento efectuado pelo Banco traduz “um mútuo oneroso, pois o escopo das instituições bancárias é a prossecução do lucro”[6]. No caso dos autos, está-se indiscutivelmente perante uma situação de “descoberto em conta”. Resulta, com efeito, comprovado nos autos que, na sequência da abertura pela Ré a conta de depósito à ordem com o n.º ……….. nos balcões do Banco Autor, em consequência de várias operações efectuadas a débito e não suficientemente compensadas com operações a crédito, no período compreendido entre 23 de Março de 2015 e 10 de Abril de 2019, a referida conta titulada pela Ré veio a apresentar um saldo negativo no montante de €9.075,33. Parte desse saldo resulta das comissões devidas pela Ré no âmbito da garantia bancária n.º ….-..-…….. emitida pelo Banco Requerente a favor do “Ministério da Administração Interna”, que não foram liquidadas. A partir do dia 23 de Março de 2015, e ainda com um saldo bancário positivo de €2.802,30 na conta da Ré, foram autorizados pelo Autor diversos pagamentos. A partir dessa data, não permitindo a conta corrente da Ré efectuar vários pagamentos, a maior parte deles à Segurança Social, mas, alguns deles, também, a particulares, o Banco Autor consentiu no adiantamento de vários montantes, para permitir os pagamentos que a conta corrente da Ré não conseguia satisfazer, até a conta de depósitos de que esta é titular atingir um saldo negativo no valor de €9.075,33. Ora, o Banco tem direito a haver do titular da conta as importâncias adiantadas e, não havendo prazo para o reembolso, pode exigi-lo a todo o tempo. Isto porque “a obrigação de pagamento da quantia correspondente ao saldo devedor da conta bancária (…) tem a sua fonte no contrato de mútuo comercial que se formou pelo encontro de vontades (…)”[7] A falta de pagamento do saldo negativo no prazo estipulado ou quando ele for exigido confere ao Banco o direito a juros, à taxa legal, a partir de qualquer desses momentos. Note-se que “para o vencimento dos juros moratórios a pagar ao banco não basta a data do encerramento da conta e, se outra data não existir, deverá ter-se em conta a data da citação”[8] . Ou seja, “na falta de qualquer cláusula em contrário, o devedor do referido saldo só fica constituído em mora depois de interpelado, judicial ou extrajudicialmente, para o seu reembolso” [9]. Desta forma, sobre a Ré recaía o dever de pagarem ao Autor o valor equivalente ao saldo negativo da conta de que aquela era titular; esse montante não corresponde apenas ao quantitativo disponibilizado pelo Autor, como adiantamento; compreende também, porque de mútuo oneroso se trata, os juros remuneratórios correspondentes ao período em que vigorou a operação bancária em causa, e outros acréscimos devidos. Ao omitir esse pagamento, a Ré incorreu em mora, devendo, como tal suportar, para além do pagamento da quantia em dívida, juros moratórios sobre tal importância, desde a constituição da mora[10]. Antes da introdução da acção em juízo, a Ré foi interpelada diversas vezes para liquidar a quantia em dívida ao Banco. Apesar disso, não o fez. Como destaca a sentença sob recurso, “O Autor pede a condenação da Ré no pagamento de juros de mora contabilizados desde 08 de março de 2017, que corresponde à data do último depósito efetuado na conta, sendo, porém, essa data irrelevante. Uma vez que se provou que o Autor interpelou a Ré, por diversas vezes, quer por carta, quer por correio eletrónico, no sentido de pôr termo à situação de incumprimento, resultando da carta de 15 de fevereiro de 2019, a concessão de um prazo até ao dia 04 de março de 2019 como data limite para regularizar a situação, a mora da Ré verifica-se desde essa data. – cfr. art. 805.º, n.º 1 do Cód. Civil Acresce que o devedor incorre em responsabilidade civil contratual se da mora resultarem prejuízos para o credor (arts. 798.º e 804.º, n.º 1, do Cód. Civil), sendo certo que nas obrigações pecuniárias a indemnização emergente de tal responsabilidade corresponde aos juros a contar do dia da constituição em mora, nos termos do n.º 1 do art. 806.º do Cód. Civil. Assim, à quantia reclamada pelo Autor a título de preço em dívida, acrescem ainda os respetivos juros de mora à taxa contratual para as operações a descoberto”. Não merece, pois, reparo a sentença aqui sindicada, como tal se mantendo, sucumbindo o recurso. * ................................................Síntese conclusiva: ................................................ ................................................ * Nestes termos, acordam os juízes desta Relação, na improcedência do recurso, em confirmar a sentença recorrida.Custas: pela apelante. [Acórdão elaborado pela primeira signatária com recurso a meios informáticos] Porto, 5.11.2010Judite Pires Aristides Rodrigues de Almeida Francisca Mota Vieira ___________________ [1] Embora a recorrente não tenha cumprido de forma inteiramente satisfatória o ónus imposto pela alínea a) do n.º 2 do artigo 640.º do Código de Processo Civil, optou-se por esta solução paliativa em vez da mais radical prevista pelo referido normativo face à forma maleável como o Supremo Tribunal de Justiça vem interpretando as exigências postas a cargo do recorrente pelo artigo 640.º do Código de Processo Civil. [2] Manual do Direito Bancário, Almedina, 1998, págs. 541, 542. [3] Acórdão da Relação do Porto, 14.10.2002, processo n.º 0250949, www.dgsi.pt.; no mesmo sentido: acórdãos da Relação do Porto, de 17/05/99 e de 4/02/99, acórdãos da Relação de Lisboa de 19/12/91, de 7/10/96 e de , 23/5/96, e acórdão do STJ, 16/3/2000, todos em www.dgsi.pt. [4] Acórdão Relação do Porto, 19/3/98, www.dgsi.pt; cf. ainda Acórdão Relação do Porto, 16/03/98, [5] www.dgsi.pt. [6] Acórdão STJ, 16/3/2000, www.dgsi.pt. [7] Acórdão Relação do Porto, 8/10/2002, www.dgsi.pt . [8] Acórdão da Relação do Porto, 8/10/2002, processo n.º 0220839, www.dgsi.pt. [9] Acórdão Relação do Porto, 4/2/99, www.dgsi.pt; cf. ainda Acórdão do STJ, 16/3/2000, www.dgsi.pt. [10] Acórdão da Relação do Porto, 19/3/98, www.dgsi.pt; em sentido contrário, cf. Acórdão da Relação do Porto, 12/7/2001, www.dgsi.pt, que entende que o dever de regularizar o “descoberto” é uma obrigação de prazo certo, fazendo, todavia, depender o mesmo do conhecimento do obrigado do saldo devedor [11] Artigos 804º, nº2, 805º, 806º do Código Civil |