Acórdão do Tribunal da Relação do Porto
Processo:
5001/21.2T8MAI.P1
Nº Convencional: JTRP000
Relator: JERÓNIMO FREITAS
Descritores: VIOLAÇÃO DO DIREITO A FÉRIAS
SUBSÍDIOS DE FÉRIAS E DE NATAL
NORMAS IMPERATIVAS
Nº do Documento: RP202309185001/21.2T8MAI.P1
Data do Acordão: 09/18/2023
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: RECURSO PARCIALMENTE PROCEDENTE; ALTERADA A SENTENÇA
Indicações Eventuais: 4ª SECÇÃO
Área Temática: .
Sumário: I - Como facto constitutivo do direito à indemnização por violação do direito a férias, ao trabalhador compete alegar e provar factos consubstanciadores de um comportamento culposo do empregador que obste ao gozo das férias.
II - Para tal é necessário que se prove que houve um efectivo impedimento ao gozo de férias, não sendo, por isso, suficiente a simples não marcação das férias para concluir que o empregador obstou ao seu gozo.
III - As disposições do Código do Trabalho que preveem os subsídios de férias e de Natal são imperativas e não podem ser derrogadas por acordo das partes, constituindo os mesmos prestações obrigatórias.
IV - Do disposto no art.ºs 263º, n.º 1, e 264º, n.º 3, do Código do Trabalho, não resulta obstáculo a que as partes acordem no pagamento, respectivamente, do subsídio de Natal e do subsídio de férias, de forma diversa da prestação única, p. ex. em duodécimos conjuntamente com a retribuição mensal.
V - Para que se concluísse que a Ré - como alegou na acção e aqui reitera no recurso-, cumpriu o dever de pagamento dessas retribuições, por estarem contidas no valor total, englobando cada uma das 12 retribuições mensais uma parte destinada a cobrir os valores a título de subsídio de férias e de Natal, era necessário que tal se extraísse da matéria provada.
VI - Não há qualquer facto provado que minimamente indicie que na celebração do contrato as partes quiseram fixar um valor global de retribuição mais alto cobrindo logo o que seria devido a título de subsídio de férias e subsídio de Natal, estabelecendo esse acordo no clausulado do contrato.
VII - O ónus dessa prova recaía sobre a Ré.
Reclamações:
Decisão Texto Integral: APELAÇÃO n.º 5001/21.2T8MAI.P1
SECÇÃO SOCIAL

ACORDAM NA SECÇÃO SOCIAL DO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DO PORTO

I.RELATÓRIO
I.1 No Tribunal da Comarca do Porto, Juízo do Trabalho da Maia, AA, BB, CC, DD, EE e FF. intentaram a presente acção de processo comum contra A... COMPANY DAC (“A...”), pedindo que julgada procedente, seja decidido o seguinte:
-«A) Ser reconhecido que a retribuição fixa dos AA. tem o valor total de €1486,16, valor que engloba as componentes “Basic”, “Number One”, “Base Supervisor” e “Uni/Med”.
B) Ser reconhecido o direito aos Autores receberem os Subsídios de Férias que nunca auferiram ao longo da relação laboral;
C) Ser reconhecido o direito aos Autores receberem os Subsídios de Natal que nunca auferiram ao longo da relação laboral;
D) Ser a Ré condenada a pagar os montantes relativos a subsídios de Natal que, por Autor, têm o seguinte valor:
i) À Autora AA:
2010: 1.816,77 € (mil oitocentos e dezasseis euros e setenta e sete cêntimos)
2011: 2.188,30 € (dois mil cento e oitenta e oito euros e trinta cêntimos)
2012: 2.145,20 € (dois mil cento e quarenta e cinco euros e vinte cêntimos)
2013: 2.197,47 € (dois mil cento e noventa e sete euros e quarenta e sete cêntimos)
2014: 2.173,55 € (dois mil cento e setenta e três euros e cinquenta e cinco cêntimos)
2015: 1.901,50 € (mil novecentos e um euros e cinquenta cêntimos)
2016: 2.158,35 € (dois mil cento e cinquenta e oito euros e trinta e cinco cêntimos)
2017: 2.194,48 € (dois mil cento e noventa e quatro euros e quarenta e oito cêntimos)
2018: 2.301,68 € (dois mil trezentos e um euros e sessenta e oito cêntimos)
2019: 2.299,11 € (dois mil duzentos e noventa e nove euros e onze cêntimos)
2020: 1.849,15 € (mil oitocentos e quarenta e nove euros e quinze cêntimos)
ii)Ao Autor BB:
2011: 1.261,42 € (mil duzentos e sessenta e um euros e quarenta e dois cêntimos)
2012: 1.628,82 € (mil seiscentos e vinte e oito euros e oitenta e dois cêntimos)
2013: 1.612,76 € (mil seiscentos e doze euros e setenta e seis cêntimos)
2014: 1.925,70 € (mil novecentos e vinte e cinco euros e setenta cêntimos)
2015: 1.752,49 € (mil setecentos e cinquenta e dois euros e quarenta e nove cêntimos)
2016: 2.034,36 € (dois mil e trinta e quatro euros e trinta e seis cêntimos)
2017: 2.277,12 € (dois mil duzentos e setenta e sete euros e doze cêntimos)
2018: 2.114,27 € (dois mil cento e catorze euros e vinte e sete cêntimos)
2019: 2.285,24 € (dois mil duzentos e oitenta e cinco euros e vinte e quatro cêntimos)
2020: 1.914,61 € (mil novecentos e catorze euros e sessenta e um cêntimo)
iii) Ao Autor CC:
2010: 2.276,75 € (dois mil duzentos e setenta e seis euros e setenta e cinco cêntimos)
2011: 2.661,75 € (dois mil seiscentos e sessenta e um euros e setenta e cinco cêntimos)
2012: 2.631,36 € (dois mil seiscentos e trinta e um euros e trinta e seis cêntimos)
2013: 2.780,50 € (dois mil setecentos e oitenta euros e cinquenta cêntimos)
2014: 2.784,08 € (dois mil setecentos e oitenta e quatro euros e oito cêntimos)
2015: 2.760,86 € (dois mil setecentos e sessenta euros e oitenta e seis cêntimos)
2016: 2.813,20 € (dois mil oitocentos e treze euros e vinte cêntimos)
2017: 2.814,14 € (dois mil oitocentos e catorze euros e catorze cêntimos)
2018: 2.861,98 € (dois mil oitocentos e sessenta e um euros e noventa e oito cêntimos)
2019: 2.579,24 € (dois mil quinhentos e setenta e nove euros e vinte e quatro cêntimos) 2020: 1.743,37 € (mil setecentos e quarenta e três euros e trinta e sete cêntimos)
iv) Ao Autor DD:
2010: 2.021,42 € (dois mil e vinte e um euros e quarenta e dois cêntimos)
2011: 2.175,19 € (dois mil cento e setenta e cinco euros e dezanove cêntimos)
2012: 2.154,64 € (dois mil cento e cinquenta e quatro euros e sessenta e quatro cêntimos)
2013: 2.287,39 € (dois mil duzentos e oitenta e sete euros e trinta e nove cêntimos)
2014: 2.349,29 € (dois mil trezentos e quarenta e nove euros e vinte e nove cêntimos)
2015: 2.147,34 € (dois mil cento e quarenta e sete euros e trinta e quatro cêntimos)
2016: 2.218,21 € (dois mil duzentos e dezoito euros e vinte e um cêntimos)
2017: 2.296,64 € (dois mil duzentos e noventa e seis euros e sessenta e quatro cêntimos)
2018: 2.342,92 € (dois mil trezentos e quarenta e dois euros e noventa e dois cêntimos)
2019: 1.682,57 € (mil seiscentos e oitenta e dois euros e cinquenta e sete cêntimos)
v) À Autora EE:
2010: 1.775,03 € (mil setecentos e setenta e cinco euros e três cêntimos)
2011: 2.087,23 € (dois mil e oitenta e sete euros e vinte e três cêntimos)
2012: 2.083,09 € (dois mil e oitenta e três euros e nove cêntimos)
2013: 2.292,93 € (dois mil duzentos e noventa e dois euros e noventa e três cêntimos)
2014: 2.319,73 € (dois mil trezentos e dezanove euros e setenta e três cêntimos)
2015: 1.752,49 € (mil setecentos e cinquenta e dois euros e quarenta e nove cêntimos)
2016: 2.164,82 € (dois mil cento e sessenta e quatro euros e oitenta e dois cêntimos)
2017: 2.324,10 € (dois mil trezentos e vinte e quatro euros e dez cêntimos)
2018 2.206,64 € (dois mil duzentos e seis euros e sessenta e quatro cêntimos)
2019 2.253,38 € (dois mil duzentos e cinquenta e três euros e cinquenta e oito cêntimos)
2020: 1.791,71 € (mil setecentos e noventa e um euros e setenta e um cêntimos)
vi)À Autora FF:
2010: 1.297,16 € (mil duzentos e noventa e sete euros e dezasseis cêntimos)
2011: 2.190,69 € (dois mil cento e noventa euros e sessenta e nove cêntimos)
2012: 2.094,83 € (dois mil e noventa e quatro euros e oitenta e três cêntimos)
2013: 2.349,06 € (dois mil trezentos e quarenta e nove euros e seis cêntimos)
2014: 2.352,99 € (dois mil trezentos e cinquenta e dois euros e noventa e nove cêntimos)
2015: 2.083,12 € (dois mil e oitenta e três euros e doze cêntimos)
2016: 2.129,52 € (dois mil cento e vinte e nove euros e cinquenta e dois cêntimos)
2017: 2.323,62 € (dois mil trezentos e vinte e três euros e sessenta e dois cêntimos)
2018: 2.120,78 € (dois mil cento e vinte euros e setenta e oito cêntimos)
2019: 1.962,26 € (mil novecentos e sessenta e dois euros e vinte e seis cêntimos)
2020: 1.455,83 € (mil quatrocentos e cinquenta e cinco euros e oitenta e três cêntimos)
E) Ser a Ré condenada ao pagamento dos juros vencidos sobre as quantias vencidas a título de subsídio de natal à data de propositura da presente ação que, por Autor, têm o seguinte valor:
EE: €5.410,23;
FF: €5.358,17,
F) - Ser a Ré condenada a pagar os montantes relativos a subsídios de Férias que, por Autor, têm o seguinte valor:
i) À Autora AA:
2010: 1.816,77 € (mil oitocentos e dezasseis euros e setenta e sete cêntimos)
2011: 2.188,30 € (dois mil cento e oitenta e oito euros e trinta cêntimos)
2012: 2.145,20 € (dois mil cento e quarenta e cinco euros e vinte cêntimos)
2013: 2.197,47 € (dois mil cento e noventa e sete euros e quarenta e sete cêntimos)
2014: 2.173,55 € (dois mil cento e setenta e três euros e cinquenta e cinco cêntimos)
2015: 1.901,50 € (mil novecentos e um euros e cinquenta cêntimos)
2016: 2.158,35 € (dois mil cento e cinquenta e oito euros e trinta e cinco cêntimos)
2017: 2.194,48 € (dois mil cento e noventa e quatro euros e quarenta e oito cêntimos)
2018: 2.301,68 € (dois mil trezentos e um euros e sessenta e oito cêntimos)
2019: 2.299,11 € (dois mil duzentos e noventa e nove euros e onze cêntimos)
2020: 1.849,15 € (mil oitocentos e quarenta e nove euros e quinze cêntimos)
ii)Ao Autor BB:
2011: 1.261,42 € (mil duzentos e sessenta e um euros e quarenta e dois cêntimos)
2012: 1.628,82 € (mil seiscentos e vinte e oito euros e oitenta e dois cêntimos)
2013: 1.612,76 € (mil seiscentos e doze euros e setenta e seis cêntimos)
2014: 1.925,70 € (mil novecentos e vinte e cinco euros e setenta cêntimos)
2015: 1.752,49 € (mil setecentos e cinquenta e dois euros e quarenta e nove cêntimos)
2016: 2.034,36 € (dois mil e trinta e quatro euros e trinta e seis cêntimos)
2017: 2.277,12 € (dois mil duzentos e setenta e sete euros e doze cêntimos)
2018: 2.114,27 € (dois mil cento e catorze euros e vinte e sete cêntimos)
2019: 2.285,24 € (dois mil duzentos e oitenta e cinco euros e vinte e quatro cêntimos)
2020: 1.914,61 € (mil novecentos e catorze euros e sessenta e um cêntimos)
iii) Ao Autor CC:
2010: 2.276,75 € (dois mil duzentos e setenta e seis euros e setenta e cinco cêntimos)
2011: 2.661,75 € (dois mil seiscentos e sessenta e um euros e setenta e cinco cêntimos)
2012: 2.631,36 € (dois mil seiscentos e trinta e um euros e trinta e seis cêntimos)
2013: 2.780,50 € (dois mil setecentos e oitenta euros e cinquenta cêntimos)
2014: 2.784,08 € (dois mil setecentos e oitenta e quatro euros e oito cêntimos)
2015: 2.760,86 € (dois mil setecentos e sessenta euros e oitenta e seis cêntimos)
2016: 2.813,20 € (dois mil oitocentos e treze euros e vinte cêntimos)
2017: 2.814,14 € (dois mil oitocentos e catorze euros e catorze cêntimos)
2018: 2.861,98 € (dois mil oitocentos e sessenta e um euros e noventa e oito cêntimos)
2019: 2.579,24 € (dois mil quinhentos e setenta e nove euros e vinte e quatro cêntimos)
2020: 1.743,37 € (mil setecentos e quarenta e três euros e trinta e sete cêntimos)
iv) Ao Autor DD:
2010: 2.021,42 € (dois mil e vinte e um euros e quarenta e dois cêntimos)
2011: 2.175,19 € (dois mil cento e setenta e cinco euros e dezanove cêntimos)
2012: 2.154,64 € (dois mil cento e cinquenta e quatro euros e sessenta e quatro cêntimos)
2013: 2.287,39 € (dois mil duzentos e oitenta e sete euros e trinta e nove cêntimos)
2014: 2.349,29 € (dois mil trezentos e quarenta e nove euros e vinte e nove cêntimos)
2015: 2.147,34 € (dois mil cento e quarenta e sete euros e trinta e quatro cêntimos)
2016: 2.218,21 € (dois mil duzentos e dezoito euros e vinte e um cêntimos)
2017: 2.296,64 € (dois mil duzentos e noventa e seis euros e sessenta e quatro cêntimos)
2018: 2.342,92 € (dois mil trezentos e quarenta e dois euros e noventa e dois cêntimos)
2019: 1.682,57 € (mil seiscentos e oitenta e dois euros e cinquenta e sete cêntimos)
v) À Autora EE:
2010: 1.775,03 € (mil setecentos e setenta e cinco euros e três cêntimos)
2011: 2.087,23 € (dois mil e oitenta e sete euros e vinte e três cêntimos)
2012: 2.083,09 € (dois mil e oitenta e três euros e nove cêntimos)
2013: 2.292,93 € (dois mil duzentos e noventa e dois euros e noventa e três cêntimos)
2014: 2.319,73 € (dois mil trezentos e dezanove euros e setenta e três cêntimos)
2015: 1.752,49 € (mil setecentos e cinquenta e dois euros e quarenta e nove cêntimos)
2016: 2.164,82 € (dois mil cento e sessenta e quatro euros e oitenta e dois cêntimos)
2017: 2.324,10 € (dois mil trezentos e vinte e quatro euros e dez cêntimos)
2018 2.206,64 € (dois mil duzentos e seis euros e sessenta e quatro cêntimos)
2019 2.253,38 € (dois mil duzentos e cinquenta e três euros e cinquenta e oito cêntimos)
2020: 1.791,71 € (mil setecentos e noventa e um euros e setenta e um cêntimos)
vi)À Autora FF:
2010: 1.297,16 € (mil duzentos e noventa e sete euros e dezasseis cêntimos)
2011: 2.190,69 € (dois mil cento e noventa euros e sessenta e nove cêntimos)
2012: 2.094,83 € (dois mil e noventa e quatro euros e oitenta e três cêntimos)
2013: 2.349,06 € (dois mil trezentos e quarenta e nove euros e seis cêntimos)
2014: 2.352,99 € (dois mil trezentos e cinquenta e dois euros e noventa e nove cêntimos)
2015: 2.083,12 € (dois mil e oitenta e três euros e doze cêntimos)
2016: 2.129,52 € (dois mil cento e vinte e nove euros e cinquenta e dois cêntimos)
2017: 2.323,62 € (dois mil trezentos e vinte e três euros e sessenta e dois cêntimos)
2018: 2.120,78 € (dois mil cento e vinte euros e setenta e oito cêntimos)
2019: 1.962,26 € (mil novecentos e sessenta e dois euros e vinte e seis cêntimos)
2020: 1.455,83 € (mil quatrocentos e cinquenta e cinco euros e oitenta e três cêntimos)
G) Ser a Ré condenada ao pagamento dos juros vencidos sobre as quantias vencidas à data de propositura da presente ação a título de subsídio de férias que, por Autor, têm o seguinte valor:
AA: €5.434,29;
BB: €3.774,60;
CC: €6.761,54;
DD: €5.500,29;
EE: €5.694,29;
FF: €5.336,56.
H) Ser reconhecido aos Autores o direito a receber compensação por formação e a Ré ser condenada ao pagamento da mesma, a qual, por Chamado, se traduz nos montantes ilíquidos:
AA: €3.789,00 (três mil setecentos e oitenta e nove euros);
BB: €3.199,60 (três mil cento e noventa e nove euros e sessenta cêntimos);
CC: €3.814,26 (três mil oitocentos e catorze euros e vinte e seis cêntimos);
DD: €3.789,00 (três mil setecentos e oitenta e nove euros);
EE: €3.789,00 (três mil setecentos e oitenta e nove euros);
FF: €3.789,00 (três mil setecentos e oitenta e nove euros).
I) Ser a Ré condenada a pagar os dias de férias nunca pagos nem gozados pelos Autores, acrescidos da compensação prevista no artº 246º/1 do CT, que se traduz nos montantes ilíquidos de:
AA: €1.344,00 (mil trezentos e quarenta e quatro euros) + € 4.032,00(quatro mil e trinta e dois euros);
BB €1.209,60 (mil duzentos e nove euros e sessenta cêntimos) + €3.628,80 (três mil seiscentos e vinte e oito euros e oitenta cêntimos);
CC: €1.344,00 (mil trezentos e quarenta e quatro euros) + € 4.032,00(quatro mil e trinta e dois euros);
DD: €1.344,00 (mil trezentos e quarenta e quatro euros) + € 4.032,00(quatro mil e trinta e dois euros);
EE: €1.344,00 (mil trezentos e quarenta e quatro euros) + € 4.032,00(quatro mil e trinta e dois euros);
FF: €1.344,00 (mil trezentos e quarenta e quatro euros) + € 4.032,00(quatro mil e trinta e dois euros);
J) Ser a R. condenada ao pagamento das diferenças salariais devidas a título de retribuições intercalares e nos meses posteriores à reintegração dos Autores AA, BB e CC, que hoje ascende ao valor de €2.654,19 por cada um desses Autores, sem prejuízo do que venha a ser devido pelos vencimentos que se venham a vencer e que se contabilizará em incidente de liquidação.
K) Ser a R. condenada no pagamento de juros de mora vencidos e vincendos, sobre todas as quantias peticionadas, vencidas e vincendas, incluindo os já melhor indicados neste petitório.
L) Ser reconhecido que os autores operam num “padrão de escalas” 5/3/5/3 (cinco dias de trabalho por cada três dias de folga).».
Realizada a audiência de partes sem que tenha sido obtida a sua conciliação, foi a Ré notificada para apresentar, querendo, contestação.
A Ré apresentou contestação, defendendo que nada deve aos autores e pedindo a improcedência total dos pedidos. Pediu, ainda, o recurso ao reenvio prejudicial, de modo a afastar uma interpretação errada do Direito da União Europeia.
O Tribunal a quo notificou os autores para se pronunciarem quanto à questão do reenvio prejudicial o que estes fizeram por requerimento, através do qual expressaram a oposição a esse reenvio.
Foi proferido despacho saneador no qual foi relegada para julgamento a questão do reenvio prejudicial e, no mais, definida a competência do Tribunal e fixado o objecto do litígio e os temas da prova.
I.2 Por despacho datado de 24.10.2022 foi proferida decisão a determinar a apensação do processo 742/22.0T8MAI aos presentes autos.
Essa acção foi intentada pelos autores GG e HH, os quais deduziram os pedidos seguintes:
-«A) Ser reconhecido que a retribuição fixa dos AA. tem o valor total de €1486,16, valor que engloba as componentes “Basic”, “Number One”, “Base Supervisor” e “Uni/Med”.
B) Ser reconhecido o direito aos Autores receberem os Subsídios de Férias que nunca auferiram ao longo da relação laboral;
C) Ser reconhecido o direito aos Autores receberem os Subsídios de Natal que nunca auferiram ao longo da relação laboral;
D) Ser a Ré condenada a pagar os montantes relativos a subsídios de Natal que, por Autor, têm o seguinte valor:
i) ao Autor GG:
2015 1939,63
2016 1359,46
2017 1333,33
2018 2176,90
2019 2502,78
II)Ao Autor HH:
2019 – €2.505,00
2018 – €2.277,50
2017 - € 2,204,00
2016 - € 2.074,00
2015 - € 1.649,50
2014 - € 1.727,00
2013 - € 1.323,50
2012 - € 1.266,50
2011 - € 1.297,00
2010 - € 1.330,50
2009 – €264,33
E) - Ser a Ré condenada a pagar os montantes relativos a subsídios de Férias que, por Autor, têm o seguinte valor:
I) ao Autor GG:
2015 1939,63
2016 1359,46
2017 1333,33
2018 2176,90
2019 2502,78
ii)Ao Autor HH:
2019 – €2.505,00
2018 – €2.277,50
2017 - € 2,204,00
2016 - € 2.074,00
2015 - € 1.649,50
2014 - € 1.727,00
2013 - € 1.323,50
2012 - € 1.266,50
2011 - € 1.297,00
2010 - € 1.330,50
2009 – €264,33
F) Ser a Ré condenada ao pagamento dos juros vencidos sobre as quantias vencidas à data de propositura da presente ação a título de subsídio de férias e de natal que, por Autor, e no total, têm o seguinte valor:
GG: €2.911,53
HH: €9 399,72;
G) Ser reconhecido aos Autores o direito a receber compensação por formação e a Ré ser condenada ao pagamento da mesma, a qual, por Chamado, se traduz nos montantes ilíquidos:
GG: € 2.273,40 (dois mil duzentos e setenta e três euros e quarenta cêntimos)
HH: €3.199,60 (três mil cento e noventa e nove euros e sessenta cêntimos);
H) Ser a Ré condenada a pagar os dias de férias nunca pagos nem gozados pelos Autores, acrescidos da compensação prevista a artº 246º/1 do CT, que se traduz nos montantes ilíquidos de:
GG: €542,40 (mil trezentos e quarenta e quatro euros) + € 1.627,20;
HH: €1.209,60 (mil duzentos e nove euros e sessenta cêntimos) + €3.628,80 (três mil seiscentos e vinte e oito euros e oitenta cêntimos);
I) Ser a R. condenada no pagamento de juros de mora vencidos e vincendos, sobre todas as quantias peticionadas, vencidas e vincendas, incluindo os já melhor indicados neste petitório».
Foi marcada a audiência de partes, mas não se conseguiu obter o acordo entre as partes.
A ré contestou nos mesmos moldes já apresentados nos autos principais.
Foi elaborado novo saneador que relegou o conhecimento do reenvio prejudicial para final e definiu o objecto do litígio e os temas de prova.
Os autos prosseguiram para julgamento, o qual se realizou segundo o legal formalismo.
I.3 Subsequentemente foi proferida sentença, concluída com o dispositivo seguinte:
-«Nos termos e fundamentos expostos, decide o Tribunal julgar parcialmente procedente a acção e, em conformidade:
I. Declarar que a componente salarial “Base Supervisor” faz parte da retribuição fixa mensal do autor CC.
II. Declarar que as componentes salariais “Unimed” e “Number One CSS” fazem parte da retribuição fixa mensal dos autores.
III. Condenar a ré a pagar aos autores a retribuição dos dias de férias não gozadas (no máximo de dois dias por ano) de acordo com o período temporal e valores a apurar em liquidação de sentença.
IV. Absolver a ré dos restantes pedidos formulados pelos autores.
Custas na proporção do decaimento que se fixa em 80% a cargo dos autores e 20% a cargo da ré, nos termos do artigo 527.º, n.º 1 e 2 do Código de Processo Civil.
Notifique e registe.
Valor da causa já fixado no saneador.
[..]».
I.4 Inconformados com aquela decisão, os AA apresentaram recurso de apelação, o qual foi admitido com o modo de subida e efeito próprios. As alegações foram encerradas com as conclusões seguintes:
a) Os Autores/Recorrentes (AA.) vêm, ao abrigo do disposto dos artigos 79º, a), 79-A/1, a), 81º/1 e 83º-A/1 do CPT, apresentar as suas contra-alegações quanto ao Recurso interposto pela Ré/ Recorrida (R.) e interpor Recurso subordinado da decisão proferida pelo Tribunal a quo no processo nº 5001/21.2T8MAI, que correu termos no J2 do Juízo de Trabalho da Maia Tribunal Judicial da Comarca do Porto quanto às questões em que foram vencido, melhor identificadas infra e nas suas alegações.
b) Os AA impugnam a decisão a quo de facto e de direito.
c) Os AA., socorrendo-se da prova documental e dos depoimentos prestados em audiência de julgamento pretendem impugnar ou alterar os factos da matéria de facto provada 101, 102, 121, 126, 184, 130, 131, 135, 152, 168, 191, 192, o que fazem nos termos melhor explanados nas suas alegações supra e que aqui não se reproduz por economia processual.
d) Ainda, os AA pretendem que os factos não provados sejam dados como provados, seja por contradição com outros factos da matéria de facto provada ou a motivação do Tribunal exposta na Sentença, seja por contrários à prova produzida nos autos, a ver os factos não provados a pontos 1, 2, 4, 6 a 9, 10 a 12, 13, 15, 16, 36, 37, 17 a 22, 23, 24 a 27, 29, 30 e 31, o que fazem nos termos melhor explanados nas suas alegações supra e que aqui não se reproduz por economia processual.
e) Por último, os AA pretendem aditar como factos: “A AA. AA participou em diversas greves, tendo contestado a falta de pagamento de subsídios de férias e de natal, sem obter resposta da Ré”; “Os AA gozam de um padrão de organização do tempo de trabalho de 5/3/5/3 ou 5/3/5/2 desde que passaram a prestar a sua atividade na R.”; Os AA nunca aceitaram ou acordaram que o seu de “salário anual bruto de base” (“basic gross anual salary” na redação em inglês) fosse pago em 14 meses ou vezes.” o que fazem nos termos melhor explanados nas suas alegações supra e que aqui não se reproduz por economia processual.
f) Da matéria de direito, face à decisão a quo os AA vêm recorrer da mesma quanto ao tema dos subsídios de férias e de natal; Da indemnização pela violação do direito a férias; Do tempo de trabalho no padrão de 5/3; Do valor da retribuição dos AA.; Das diferenças salariais devidas aos AA. AA, BB e CC após a sua reintegração.
g) Quanto ao tema relativo aos subsídios de férias e de natal, creem que o Tribunal a quo enfermou a sua decisão de erro de subsunção dos factos ao direito, acompanha de errada leitura da lei, contradizendo-se na sua decisão. Por um lado, o Tribunal reconhece que o direito a auferir subsídio de férias e de natal é um direito irrenunciável. Por outro, sem qualquer base fáctica, vem dizer que os AA. aceitaram receber o seu salário em 14 vezes aquando da sua transferência para Portugal. Ora logo aqui enferma o entendimento dos factos. A R. não o alega, nem os mesmo o indicam, que os AA tenham aceite tal forma de pagamento. Por outro lado, a questão do pagamento do salário anual em 14 vezes só se levantou a partir do ano de 2019 e a maioria dos AA passou a prestar a sua atividade a partir da base do … a partir do ano de 2009, o mais tardar a partir do ano de 2014.
Até o ano de 2019, nunca se havia colocado a questão de pagamento do salário anual existente em 14 vezes pelo que nunca poderiam os AA ter acordado com tal situação, se nem a Ré a propôs. Por outro lado, o Tribunal infirma de uma declaração descontextualizada, e que não é conducente com o restante depoimento da AA AA, que todos os AA teriam a convicção que a empresa não os transferiria para Portugal se tivesse um custo acrescido com tal transferência. Se por um lado o Tribunal não pode fazer tal transferência de declarações, fica claro das transcrições apostas nas alegações, que os restantes AA nas suas declarações negaram categoricamente tal entendimento. Temos assim um fundamento de facto inexistente para a decisão do Tribunal. A outro passo, se o direito é irrenunciável, pouco interessaria a convicção do trabalhador no momento da transferência. Até porque, como repetidamente dito pelos AA, estes tinham receio das represálias que poderiam sofrer por parte da R., a qual é bem conhecida publicamente por tal. Tudo a contraria a jurisprudência uniforme formada contra a falta de pagamento de subsídios de natal e férias pela R., tanto a nível nacional, como a nível europeu e das jurisdições de outros Estados-Membros. Desta forma, deverá a Sentença a quo ser revogada nesta parte e substituída por outra que condene a R. ao pagamento dos subsídios de natal e de férias nunca pagos aos AA., acrescida dos respetivos juros de mora vencidos e vincendos, incluindo os já liquidados com a P.I., bem como deverá ser reconhecido o direito dos AA a receberem subsídios de férias e de natal (pedidos B e C).
h) Ao tema relativo à indemnização pela violação do direito a férias prevista no artigo 246/1º do CT parece que o Tribunal apresenta causa desculpante da ilicitude que não tem qualquer previsão legal. Sendo que o Tribunal alega que não condena a R. ao pagamento de tal indemnização por considerar que esta violou o direito dos AA a 22 dias de férias meramente com base em entendimento jurídico diverso, tal equivaleria a sustentar que o desconhecimento da lei é causa desculpante do crime. Tendo o Tribunal a quo verificado, e inclusivamente condenado ao pagamento dos 2 dias de férias por ano que os AA não puderam gozar durante a relação laboral, teria que obrigatoriamente condenar a R. ao pagamento da indemnização prevista no artigo supra, não prevendo tal dispositivo qualquer causa de exclusão. Assim a decisão nesta parte é nula por falta de sustentação legal, devendo ser substituída por outra que condene a R. ao pagamento da indemnização prevista no artigo 246º/1 do CT nos valores já liquidados a P.I..
i) Quanto ao pedido referente ao padrão de organização dos tempos de trabalho na forma 5/3/5/3, crê-se que, mais uma vez, o Tribunal faz errada interpretação dos factos e, por consequência, administrou a sua justiça de forma enfermada. Na sua motivação e matéria de facto que fundamenta a decisão, o Tribunal vem alegar que o padrão de 5/3/5/3 só se aplicou aos AA entre 2016 e 2021. Tal está errado e vem categoricamente refutado nas declarações de parte dos AA. Como se pode verificar das transcrições que constam das alegações, todos os AA a alegações depuseram no sentido que desde 2009 já se aplicava tal padrão do seu horário ou outro semelhante na forma 5/3/5/2/5/3/5/2/… . Como tal, só por errada interpretação dos factos poderia tal decisão ser proferida. Ademais, resultou comprovado que só após a reintegração dos AA BB, AA, EE e CC em sequência da admissão da ilicitude do seu despedimento coletivo pela R em sede judicial nesse mesmo Juízo do Trabalho, a R recusou atribuir tal organização do tempo de trabalho a esses AA. Mais, como o AA CC atestou, tal é utilizado como um castigo, tendo este AA conhecimento profundo das práticas laborais abusivas da R, uma vez que foi Base Supervisor da Base do … entre 2009 e 2019, dando conta de algumas dessas no seu depoimento. Sendo claro que se trata aqui de um direito adquirido e que o artigo 217º do CT prevê que o horário de trabalho não pode ser unilateralmente alterado, deveria o Tribunal a quo ter reconhecido tal padrão do horário de trabalho como aplicável aos AA. supra. Como tal, deverá a sentença a quo ser revogada nesta parte e ser substituída por outra que condene a R. a atribuir o padrão de organização do tempo de trabalho destes AA na forma 5-3-5-3.
j) Em relação, o tema da retribuição, que se relaciona em boa parte com os argumentos do pedido que antecede o Tribunal a quo apenas deu como procedente parte do pedido ao reconhecer que os subsídios CSS e Uni/med integram o vencimento base dos AA. No entanto, na lógica (errada) de que os AA aceitaram receber a sua retribuição anual em 14 vezes, o que nunca aconteceu, considerou os valores atualmente pagos mensalmente como corretos. No entanto, provado que tal não ocorreu, e que os subsídios de férias e de natal não integram o montante do “salário anual bruto de base” (“basic gross anual salary” na redação em inglês) mas sim, acrescem ao mesmo, deveria ter procedido o pedidos dos AA nesta parte, reconhecendo-se que a retribuição mensal dos AA é €1.486,16 ilíquidos, o que incluí apenas as componentes “Basic”, “number one” e “Uni/Med”, excluindo desse valor os subsídios de férias e de natal. Assim, deverá a sentença a quo ser parcialmente revogada nesta parte e ser substituída por outra que reconheça que a retribuição fixa dos AA. tem o valor total de €1486,16, valor que engloba as componentes “Basic”, “Number One”, “Base Supervisor” e “Uni/Med”. Note-se ainda que, tal como a questão do padrão do horário de trabalho, quanto aos AA reintegrados, a R. até ao seu despedimento sempre liquidou os mesmos nos montantes aqui peticionados, só tendo reduzido o seu valor após reintegração.
k) Por último, quanto às diferenças salariais devidas aos Autores AA, BB e CC após a sua reintegração, reconhecido o pedido que antecede, passa a R. a ser igualmente devedora das diferenças salariais por desde a sua reintegração, até ao momento, vir a liquidar o vencimento desses AA em valor inferior ao que este era devido. Razão pela qual deverá a sentença a quo ser revogada nesta parte e substituída por outra que condene a R. a pagar os montantes reclamados, bem como os vencidos e vincendos deste a propositura da ação até ao seu trânsito em julgado.
Termos em que mui respeitosamente se requer a V. Exas que concedam provimento ao recurso, substituindo a douta decisão recorrida por outra nos termos pugnados nas presentes alegações e conclusões.
I.5 A Ré apresentou contra-alegações, com “ampliação da matéria referente à inclusão do Subsídio Uni/Med no vencimento base dos AA, mas não as sintetizou em conclusões.
Refere, no essencial, o seguinte:
- A impugnação da matéria de facto quanto aos factos provados deve improceder, desde logo, por incumprimento da indicação dos meios de prova prevista no art.º 640.º n.º1, al. b), do CPC, mas também por incidir sobre factos que respeita à matéria do não pagamento da compensação por formação não ministrada, relativamente à qual não recorreram e, ainda, por não ter sustento na prova.
- A impugnação da matéria de facto quanto aos pontos não provados deve improceder, ou por não ter fundamento na prova produzida ou por não ter sido cumprido o ónus de indicação dos meios de prova previsto no art.º 640.º n.º1, al. b), do CPC.
- A impugnação da matéria de facto visando o aditamento de factos respeita a matéria não alegada e os Apelantes não concretizam em que meios de prova sustentam a sua pretensão, nos termos da alínea b) do número 1 do artigo 640.º do CPC pelo que deve ser indeferida.
- O recurso deve improceder na vertente em que questiona a aplicação do direito, tendo o Tribunal a quo decidido correctamente as questões relativas aos subsídios de férias e Natal, à indemnização por violação do direito de férias, do tempo de trabalho no padrão 5/3/5/3 e valor da retribuição dos apelantes e diferenças alegadamente devidas.
- Requer a “DA AMPLIAÇÃO DA MATÉRIA DE RECURSO QUANTO À INTEGRAÇÃO DO SUBSÍDIO UNI/MED NO VENCIMENTO BASE DOS APELANTES”, para que a decisão seja “revogada quanto a esta matéria e ser substituída por outra que decida que o subsídio Uni/Med não integra o vencimento base dos Apelantes”.
I.6 O Digno Procurador Geral Adjunto junto desta Relação emitiu o parecer a que alude o art.º 87.º 3, do CPT, pronunciando-se no sentido da improcedência do recurso, na consideração, no essencial, do seguinte:
-«[..]
5. Impugnam os Recorrentes a matéria de facto, sem que, porém, cumpram, correctamente, o disposto no artigo 640º, n.º 1, do CPC, indicando os concretos pontos de facto que consideram incorrectamente julgados, os concretos meios probatórios que impunham decisão diversa, indicando com exactidão as passagens da gravação em que se funda o recurso, e a decisão que deveria ter sido proferida sobre as questões de facto impugnadas.
Mas das transcrições feitas fica-se com a ideia de que o julgamento da matéria se mostra correcto não merecendo censura.
E, com base nestes factos a douta sentença em recurso faz pormenorizada análise das questões suscitadas no recurso, sobre a retribuição, férias, subsidio de férias, subsidio de Natal, férias não gozadas, alteração do horário de trabalho e reenvio prejudicial, com a qual concordamos e, por isso, para ela se remete, devendo a mesma ser confirmada.
*
6. Termos em que, ressalvando sempre diferente e melhor opinião, se emite parecer no sentido de ser negado provimento ao recurso.
[..]».
I.7 Cumpridos os vistos legais procedeu-se ao envio do projecto de acórdão aos excelentíssimos adjuntos e determinou-se que o processo fosse submetido à conferência para julgamento.
I.8 Questão prévia (1)
Impõe-se deixar esclarecido que os AA incorrem num lapso manifesto na conclusão a), ao fazerem constar dela que “vêm, ao abrigo do disposto dos artigos 79º, a), 79-A/1, a), 81º/1 e 83º-A/1 do CPT, apresentar as suas contra-alegações quanto ao Recurso interposto pela Ré/ Recorrida (R.) e interpor Recurso subordinado da decisão proferida pelo Tribunal a quo no processo nº 5001/21.2T8MAI [..]”. Na verdade, no requerimento para interposição do recurso, aí correctamente, lê-se o seguinte: “DD & Outros, Autores nos autos à margem referenciados e neles melhor identificada, notificada da Douta Sentença, não se conformando com a decisão, vem, ao abrigo do disposto do artigo 79º, a), 79-A/1, a), 81º/1 e 83º-A/1 do CPT interpor Recurso de Apelação, com recurso às gravações da audiência de discussão e julgamento [..]”.
I.9 Questão prévia (2)
No requerimento de interposição do recurso, os autores referem o seguinte:
-«[..] a sentença padece de nulidade por omissão de pronúncia relativamente aos pedidos de condenação em retribuições intercalares quanto aos AA. AA, BB, CC e EE (que por mero lapso não se fez constar do pedido J) mas constando esta do articulado a ponto V, artsº 276º e SS.). Por um lado compreende-se que a falta de pronúncia deste Doutro Tribunal quanto a este pedido poderá ser entendida tendo em conta que o Tribunal não condenou a R. quanto ao pedido de reconhecimento do valor do salário base e complemento CSS atual destes AA. mas, à laia da cautela e do dever de patrocínio, nada sendo concluindo nesta matéria na Sentença de forma explícita, não podem deixar de invocar a nulidade».
Porém, como se retira das conclusões, essa questão não consta suscitada em qualquer uma delas. Refira-se, ainda, que nem tão pouco é tratada nas alegações.
Conforme decorre do n.º 1 e 2, do art.º 639.º do CPC, aplicável ex vi art.º 1.º , n.º2 al. a), do CPT, as alegações devem conter conclusões, nas quais constem de forma sintética, a indicação dos fundamentos com base nos quais é pedida a alteração ou anulação, devendo nas mesmas indicar, quando o recurso verse sobre matéria de direito, “as normas jurídicas violadas” [al. a), do n.º2], “O sentido com que, no entender do recorrente, as normas que constituem fundamento jurídico da decisão deviam ter sido interpretadas e aplicadas” [al. b)] e “Invocando-se erro na determinação da norma aplicável, a norma jurídica que, no entendimento do recorrente, devia ter sido aplicada” [al.c), do n.º2].
Como é pacificamente entendido, o objecto do recurso é delimitado pelas conclusões das alegações apresentadas, salvo questões do conhecimento oficioso [artigos 87.º do Código do Processo do Trabalho e artigos 639.º, 635.º n.º 4 e 608.º n.º2, do CPC, aprovado pela Lei n.º 41/2013, de 26 de Junho].
Dito em poucas palavras, a finalidade ou função das conclusões é definir o objecto do recurso, através da identificação, abreviada, dos fundamentos ou razões jurídicas já desenvolvidas nas alegações.
Não resultando das conclusões que os AA pretendam arguir a nulidade da sentença - nem sequer podendo constar por também nada se encontrar a esse propósito no corpo das alegações -, e não sendo essa questão de conhecimento oficioso, dela não se conhecerá.
I.10 Delimitação do objecto do recurso
Sendo o objecto do recurso delimitado pelas conclusões das alegações apresentadas, salvo questões do conhecimento oficioso [artigos 87.º do Código do Processo do Trabalho e artigos 639.º, 635.º n.º 4 e 608.º n.º2, do CPC, aprovado pela Lei n.º 41/2013, de 26 de Junho] as questões que se colocam para apreciação consistem em saber o seguinte:
A- Recurso dos AA
i) Se o Tribunal a quo errou na apreciação da prova e fixação da matéria de facto, quanto aos pontos provados 101, 102, 121, 126, 184, 130, 131, 135, 152, 168, 191, 192 [conclusões [conclusão c]; quanto aos factos não provados dos pontos 1, 2, 4, 6 a 9, 10 a 12, 13, 15, 16, 36, 37, 17 a 22, 23, 24 a 27, 29, 30 e 31[conclusão d]; e, ainda, por não ter dado como provada matéria que deverá ser aditada [conclusão e];
ii) Se o Tribunal a quo errou na aplicação do direito aos factos “quanto ao tema dos subsídios de férias e de natal; Da indemnização pela violação do direito a férias; Do tempo de trabalho no padrão de 5/3; Do valor da retribuição dos AA.; Das diferenças salariais devidas aos AA. AA, BB e CC após a sua reintegração” [conclusões f a K].
B – Ampliação do objecto do recurso pela Ré
- Se o Tribunal a quo errou na aplicação do direito aos factos e deve ser revogada a decisão quanto à integração do subsídio UNI/MED no vencimento base dos apelantes.
II. FUNDAMENTAÇÃO
II.1. MOTIVAÇÃO DE FACTO
O Tribunal a quo fixou o elenco factual seguinte:
Factos provados:
1. A Ré, A..., é uma sociedade comercial com sede em ..., ..., que se dedica ao transporte aéreo comercial de passageiros.
2. Os Autores prestam a sua atividade regularmente a partir do Aeroporto ... (comumente, Aeroporto ...) sito em ..., ..., Maia, Porto.
3. Depois de um despedimento colectivo os Autores AA, BB, CC e EE foram reintegrados na Ré.
4. Os Autores DD e FF optaram pela indemnização em substituição em reintegração.
5. Os Autores são/foram Tripulantes de Cabine (Cabin Crew).
6. Na ré A... designam-se os Tripulantes de Cabine “comuns” por Costumer Service Agents (CSA).
7. E os Tripulantes de Cabine que exercem funções de Chefe de Cabine, designam-se como “Costumer Service Supervisor - CSS” ou “Number one” (Número um, em português).
8. A autora AA desempenhou funções da categoria de CSS (chefe de cabine) desde o ano de 2011.
9. O Autor BB prestou a sua atividade para a empresa de trabalho temporário B..., entre 23/04/2009 e 31/12/2011, trabalhando nos aviões da ré.
10. A partir de 01/04/2011 o Autor BB passou a prestar ininterruptamente a sua atividade a partir do Aeroporto ....
11. O autor BB a 1 de Janeiro de 2012 passou a exercer a sua atividade diretamente à Ré A....
12. Mantendo-se no Aeroporto ....
13. O Autor BB ocupa a categoria de CSS (chefe de cabine) desde a data de outorgação do contrato junto cuja execução teve início a 1 de Novembro de 2015.
14. O Autor CC prestou a sua atividade para a empresa de trabalho temporário B..., entre 14/05/2006 e 12/12/2006, trabalhando nos aviões da ré.
15. A partir de 13/12/2006 o Autor CC passou a prestar ininterruptamente a sua atividade diretamente à Ré A....
16. Entre 4 Agosto de 2009 (data que corresponde à sua transferência para a base do …) e Abril de 2019, o Autor CC, aí já com a categoria de CSS (chefe de cabine), ocupou também o cargo de Base Supervisor.
17. O mais alto cargo funcional atribuído na base do …, que corresponde a funções de chefia em terra.
18. O Autor DD prestou inicialmente a sua atividade à Ré A... na base de ..., entre 01/01/2009 e 02/09/2009.
19. A partir de 03/09/2009 o Autor DD passou a prestar ininterruptamente a sua atividade diretamente à Ré A... a partir do Aeroporto ... com a categoria de CSS (definitivo a partir de 2010).
20. Entre Novembro de 2015 e Outubro de 2016 prestou a sua atividade à Ré na categoria de CSA.
21. Tendo retornado à sua posição de CSS após essa data, conforme contrato de trabalho datado de 22 de Março de 2017.
22. Desde Maio de 2019, até à data do seu despedimento a 1 de Dezembro de 2020, este Autor encontrou-se de baixa médica.
23. A Autora EE prestou inicialmente a sua atividade à Ré A... através da empresa B..., entre 12/08/2006 e 24/10/2009.
24. A partir de 25/10/2009 a Autora passou a prestar ininterruptamente a sua atividade diretamente à Ré A..., a partir do Aeroporto ..., com a categoria de CSS.
25. A Autora FF prestou a sua atividade à Ré A... desde 11/03/2008.
26. Tendo passado a exercer a sua atividade à Ré a partir da base do … a partir de 3 de Setembro de 2009.
27. É no Aeroporto ... que todos os Autores iniciam (iniciavam) e terminam (terminavam) regularmente a sua jornada de trabalho.
28. É nesse aeroporto que se encontram parqueadas regularmente 8 aeronaves a bordo das quais exercem a sua atividade profissional.
29. De igual forma, no Aeroporto ... têm ao seu dispor uma sala para preparar a sua jornada de trabalho e onde podem encontrar um supervisor (e outros responsáveis) A... responsável pela sua atividade.
30. Era/É na base do … que recebiam as instruções para a sua jornada de trabalho.
31. Era/É também na base do … que participavam em “Briefings”.
32. E é aqui que se encontram os seus instrumentos de trabalho.
33. É ainda na área geográfica próxima do Aeroporto ... que todos habitam.
34. Os Autores Têm/Tinham um cartão de identificação do Aeroporto ..., cartão esse que é unicamente disponibilizado a pedido da Ré e, concedido apenas para tripulantes com endereço em Portugal.
35. Todos os tripulantes efetuavam tarefas em terra como:
- HSBY's-Home Standby/prevenção em casa, que tinham uma duração de pelo menos 11 horas escalados várias vezes por semana.
- ASBY'S-Airport Standy/prevenção na crewroom/sala de tripulantes da Ré sita no Aeroporto ..., por vezes escalados 2 a 3 vezes por semana. Durante o Asby, o trabalhador teria de completar uma lista de tarefas que contemplava:
A) Colocar papel nas impressoras;
B) Preparar paperwork/documentação para a tripulação;
C) Dobrar guardanapos;
D) Levantamento de encomendas ou correio no terminal do balcão de atendimento ao cliente e Lost and Found/Perdidos e achados;
E) Preparação de sacos com dinheiro das vendas a bordo e entregar ao CSS/Chefe de cabine no avião com destino às bases de ... e/ou ...;
F) Acompanhamento/ escolta de tripulantes sem cartão.
36. Realizando ainda outras tarefas como:
- Relatórios de factos e eventos a bordo.
- CRMS
- Assistir a formações de vendas e apresentação de produtos.
- O Base Supervisor/Supervisor de Base poderia solicitar ainda o lançamento de dados em folha de Excel referentes a paperwork/documentação e observação do processo de pré-embarque no terminal e anotação de tempos.
37. Os Autores, à data do seu despedimento auferiam um vencimento base ao qual acrescia um valor a título de complemento CSS (mencionado como Number One nos recibos de vencimento) e outro valor a título de Uni/Med.
38. Auferindo ainda valor variável pelas horas de voo.
39. Um segundo valor variável por comissão de vendas.
40. Algumas das componentes variáveis, bem como o esquema de escala de trabalho/folga, eram negociados por períodos de cerca de 5 anos entre os trabalhadores (Autores) e a Ré, estabelecendo-se em adendas.
41. No início da pandemia covid-19, a Ré propôs uma nova adenda com reduções salariais.
42. Aí incluía cláusula pela qual os trabalhadores (Autores) prescindiam do seu direito a reclamar créditos laborais anteriores a essa adenda.
43. Os Autores, por conta dessa cláusula em específico, recusaram assinar a adenda.
44. Os Autores AA, BB e CC já haviam voltado ao serviço fruto da providência cautelar que interpuseram.
45. Nesse regresso ao serviço por força da providência cautelar, a Ré veio a aplicar a remuneração prevista nessa adenda (referida em 41).
46. Os Autores nunca assinaram tal adenda.
47. Todos os Autores, recebiam mensalmente o complemento de chefia e de fardamento (uni/med).
48. Antes de 2019 a ré não discriminava nos recibos de vencimento dos autores as rubricas relativas aos subsídios de Natal e de férias.
49. Até 2019 nos contratos dos Autores, na retribuição anual não se encontrava estipulado nenhum montante correspondente ao pagamento de subsídios de férias ou de natal.
50. No recibo de vencimento dos autores, desde o início da relação laboral e até 2019 não existiu uma referencia autonomizada quanto aos valores pagos a título de subsídio de férias e de Natal.
51. A lei irlandesa não prevê a existência de subsídios de Natal e de Férias.
52. Nos recibos de vencimento dos autores anteriores a 2019 não consta a liquidação de cada componente.
53. O Autor BB, enquanto prestou a sua atividade à B..., apenas auferia um vencimento integralmente variável correspondente às suas horas de voo e outras componentes salariais.
54. A média do seu vencimento referente a horas de voo quanto a 11 dos restantes meses desse ano, era de € 1085,15 (mil e oitenta e cinco euros e quinze cêntimos).
55. O “Complemento Base Supervisor 2009-2019” apenas foi pago ao autor CC, o qual teve a categoria de Base Supervisor, constando essa componente retributiva dos seus recibos de vencimento exatamente com a descrição “Base Supervisor”.
56. Os Autores auferiam/auferem ainda componente variável e regularmente paga, relativa às horas de voo efetivamente prestadas.
57. Este valor era inicialmente pago em recibo autónomo (comumente apelidado de recibo “Inflight”- ver canto inferior esquerdo dos documentos) àquele de onde constava a retribuição base e outros complementos.
58. A partir do ano de 2015 todas as componentes retributivas dos Autores, incluindo as horas de voo, passaram a constar de um só documento mensal, tendo as horas de voo pagas o descritivo “Gross Sectors” nesses recibos.
59. Os Autores são Tripulantes de Cabine, com categoria de chefe de cabine.
60. A sua profissão consiste na manutenção da segurança a bordo das aeronaves da Ré e o serviço a bordo que constituí a venda de produtos pela qual recebem comissão de vendas.
61. No caso particular da Trabalhadora FF esta esteve de licença de gravidez, maternidade e posteriormente de licença por acordo com a Ré, desde Setembro de 2019 até à data de despedimento.
62. Os autores receberam treino inicial relativo à qualificação própria e necessária ao exercício da profissão de Tripulante de Cabine, o qual permite a obtenção da necessária licença para operar o tipo de aeronave em que prestava o seu trabalho.
63. Os autores frequentaram anualmente a requalificação que permitia manter essa licença.
64. Essa requalificação anual é apelidada pela 1ª Ré como “Recurrent Training” (Treino Recorrente, em tradução livre).
65. A qual é composta por módulos de frequência obrigatória.
66. Antes de 2019, a ré apenas permitia aos autores a gozar o máximo de 20 dias de Férias por ano.
67. Nunca houve qualquer renúncia a dias de férias pelos Autores.
68. A Autora EE encontrou-se, desde o despedimento, em situação de gravidez de risco e a gozar de licença parental em diversas modalidades.
69. Os Autores AA, BB, CC e EE gozaram de 1 de abril de 2016 a 31 de março de 2021 de uma organização do tempo de trabalho/”padrão de escalas” (que se faz por turnos) na modalidade 5/3/5/3.
70. Ou seja, trabalhavam 5 dias, tendo 3 dias de folga e assim sucessivamente.
71. O Autor GG prestou inicialmente a sua atividade à B... (agência Irlandesa que presta serviço equivalente ou semelhante ao de uma agência de trabalho temporário que tem como cliente único a Ré), entre 20/03/2013 e 2017, sendo que apenas em 2015 se transferiu para Portugal.
72. A partir de 01/12/2017 o Autor passou a prestar ininterruptamente a sua atividade diretamente à Ré A..., a partir do Aeroporto ..., com a categoria de CSS (chefe de cabine).
73. O Autor HH prestou inicialmente a sua atividade à B..., entre 07/05/2008 e 31/12/2011, sendo que desde 25 de Outubro de 2009 passou a prestar atividade a partir do Aeroporto ....
74. A partir de 01/01/2012 o Autor passou a prestar ininterruptamente a sua atividade a partir do Aeroporto ... enquanto Tripulante diretamente contratado pela R.
75. A A. AA é trabalhadora da ré desde 01.09.2006.
76. Consta dos contratos de trabalho dos autores uma cláusula com o seguinte teor, “As relações de trabalho entre a A... e V. Exa., serão sempre regidas pelas leis em vigor e periodicamente alteradas na .... Independentemente do regime de segurança social a que está vinculado, o seu contrato é regido pela legislação laboral irlandesa e os seus direitos serão os estabelecidos pela legislação da ... (incluindo, entre outros, a licença de maternidade/paternidade, a ausência por doença, o despedimento e os direitos à reforma). Os tribunais irlandeses são competentes em todas as questões relacionadas com a execução e a rescisão do presente contrato. Caso esta cláusula torne inoperacional devido a alterações legislativas, directiva legal ou qualquer outra alteração que a A... determine como substancial, o presente contrato ficará sem efeito e a sua relação laboral com a A... cessará, sendo-lhe pago o montante legal em vez de pré-aviso”.
77. A escolha da lei aplicável teve um propósito: a Ré tem milhares de trabalhadores espalhados por dezenas de bases europeias, pelo que se torna necessário uniformizar, minimamente, os procedimentos e direitos dos trabalhadores.
78. Exemplificativo desta necessidade de uniformização é precisamente a situação dos AA. dos presentes autos, que foram todos contratados para bases diferentes:
i. a A. AA iniciou as suas funções em ...;
ii. o A. BB iniciou as suas funções em ...;
iii. o A. CC iniciou as suas funções em ...;
iv. o A. DD iniciou as suas funções em ...;
v. a A. EE iniciou as suas funções em ...; e
vi. a A. FF iniciou as suas funções em ....
79. Em novembro de 2018, a Ré acordou com o Sindicato Nacional do Pessoal da Aviação Civil (SNPVAC) a transição para a escolha e aplicação da lei portuguesa nas suas relações laborais com trabalhadores alocados a bases portuguesas.
80. O acordo celebrado com o Sindicato não obriga os trabalhadores individuais que haviam pactado a aplicação de outra lei (como é o caso dos AA.), pelo que esta alteração foi proposta aos trabalhadores (incluindo os AA.) por regulamento interno.
81. Não tendo os AA. apresentado qualquer oposição, após 01 de fevereiro de 2019 as partes passaram a aplicar a legislação portuguesa à sua relação laboral.
82. Por via do acordo acima referido, a R. concordou em passar a aplicar a legislação nacional às relações laborais com os trabalhadores alocados a bases em Portugal.
83. Os AA. foram contratados pela R. para prestarem trabalho como tripulantes de cabine.
84. Como referido supra, todos os AA. foram contratados para iniciarem o seu trabalho em bases estrangeiras.
85. A A. AA foi contratada pela R. em 01.09.2006, foi inicialmente alocada à base de ..., Reino Unido, tendo sido transferida, em 25.10.2009, para a base do …, Portugal.
86. O A. BB foi contratado por uma empresa de trabalho temporário entre 21.04.2009 e 31.03.2011, onde operou voos da A... a partir da base de ..., Espanha. Em 01.01.2012 foi contratado pela R., passando a exercer funções na base do …, Portugal.
87. O A. CC foi contratado pela R. em 01.01.2007, foi inicialmente alocado à base de ..., Reino Unido, tendo sido transferido, em 07.11.2007, para a base de ..., foi transferido, em 17.06.2008, para a base de ..., foi transferido, em 23.01.2009, para a base de ..., e foi transferido, em 03.09.2009, para a base do ….
88. O A. DD foi contratado pela R. em 01.01.2009, foi inicialmente alocado à base de ..., Alemanha, tendo sido transferido, em 03.09.2009, para a base do …, Portugal.
89. A A. EE foi contratada pela R. em 01.05.2007, foi inicialmente alocada à base de ..., Reino Unido, tendo sido transferida, em 25.10.2009, para a base do …, Portugal.
90. A A. FF foi contratada pela R. em 01.06.2009, foi inicialmente alocada à base de ..., ..., tendo sido transferida, em 03.09.2009, para a base do …, Portugal.
91. Os contratos de trabalho dos AA. preveem que o local de trabalho pode ser transferido para qualquer uma das bases europeias onde a Ré opera.
92. A disponibilidade para a mobilidade era uma característica e elemento essencial da vontade de contratar da Ré.
93. Consta dos contratos de trabalho dos autores: “É uma condição do seu emprego que cumpra qualquer uma dessas exigências. Isto inclui, para evitar dúvidas, a transferência para qualquer das bases europeias da Empresa sem compensação. Deve entender-se que, caso seja transferido para outra base, será paga de acordo com o salário e o sistema de pagamento de voos em vigor nessa base.”.
94. “A linha aérea do nosso Cliente opera com aeronaves de variadas localizações e o número de aeronaves em cada uma poderá variar durante o ano. Para evitar qualquer dúvida, você terá de ser flexível para ser transferido para qualquer base do nosso Cliente a qualquer altura sem qualquer compensação”.
95. Sem essa previsão contratual, os AA. não teriam sido contratadas pela Ré, sendo a mobilidade geográfica um elemento essencial à sua atividade, necessidades e especificidades.
96. Os AA. foram recrutados no âmbito de um programa europeu de recrutamento.
97. Esse programa de recrutamento, onde são levadas a cabo entrevistas por toda a Europa, é conduzido a partir da sede da Ré, em ....
98. Os AA. candidataram-se a diversas bases por toda a Europa, indicando as suas candidaturas preferenciais, bem sabendo que poderiam ser colocadas em qualquer uma, mesmo que não estivessem listadas nas suas preferências, e que poderiam igualmente, a qualquer altura, ser transferidas para outra base, noutro país.
99. Os AA. procuraram esta carreira, foram informados das suas características especiais e aceitaram-nas.
100. Antes do início da formação inicial foi entregue aos AA. um contrato de formação – que os AA. leram, compreenderam e assinaram - o qual previa um reforço da informação sobre as condições especiais exigidas aos Tripulantes de Cabine, entre outros, a aplicação da lei irlandesa e a cláusula de mobilidade, os quais previam: “Tal como todos os contratos, este contém linguagem legal, etc. Por isso, se não tiver a certeza de alguma coisa sobre o contrato, por favor contacte-me e responderei a quaisquer dúvidas que possa ter”.
101. Os AA. foram inicialmente contratados pela empresa de trabalho temporário B..., a qual foi responsável pelo treino inicial dos AA.
102. Durante o treino inicial, esteve sempre um membro da B... para explicitar e clarificar quaisquer dúvidas sobre os termos da relação contratual a que se candidatavam os AA.
103. Os AA. também tinham a possibilidade de colocar dúvidas e questões em ferramenta informática própria para o efeito.
104. No âmbito da execução do seu trabalho diário, os AA. prestaram a esmagadora maioria do seu trabalho num avião registado na ....
105. Em grande parte do seu tempo de trabalho, encontravam-se nesse território a sobrevoar o espaço aéreo de diferentes países e espaço aéreo internacional, dado que o espaço do avião registado na ... constitui território ....
106. Iniciando o seu trabalho, os AA. realizavam aterragens e partidas nos mais variados países.
107. Os AA. executavam o seu trabalho no âmbito dessas aterragens e partidas, que preenchem parte das suas funções enquanto tripulantes de cabine.
108. Os AA. receberam, ao longo da sua carreira na Ré, formação profissional fora de Portugal, uma vez que a Ré não tem instalações para o efeito em Portugal.
109. Os AA. abriram e receberam desde o início do contrato de trabalho os seus vencimentos em conta bancária pessoal irlandesa.
110. Os AA. poderiam ter optado por pagar a segurança social em Portugal desde junho de 2012, mas optaram por permanecer no sistema de segurança social ... até terminarem os seus direitos denominados de "grandfathering rights" em maio de 2020 (direito ao abrigo do qual os AA.,
111. Apesar de estarem a laborar em Portugal, poderiam beneficiar do sistema de segurança social ....
112. É na ... que se encontram os superiores hierárquicos dos AA..
113. Os contratos de trabalho dos AA. estão escritos em Inglês e referem expressamente a lei irlandesa como aplicável, contendo todos os elementos submetidos àquele ordenamento.
114. Os AA. recebiam todas as suas instruções, planeamento, horários e intervenções hierárquicas a partir de ..., na ....
115. Todo o agendamento e atos instrutórios da prestação de trabalho ocorrem na ..., nomeadamente agendamento de voos, alterações de voos, planeamento da atividade, marcação de férias, justificações de faltas, ou seja, todos os atos típicos da dinâmica de uma relação laboral têm lugar naquele país.
116. Todas as baixas, licenças e demais pedidos eram submetidos através de uma ferramenta informática controlada pela Ré a partir de ....
117. No caso de atraso ou doença, os AA. tinham de contactar o departamento de controlo de tripulação (“Crew Control”) em ..., sendo este departamento que gere a assiduidade, o absentismo, presenças e substituições.
118. O “check-in” feito no computador existente na crew room serve apenas de confirmação de reporte para o voo, e esse mesmo ato é já realizado num instrumento móvel próprio de que cada tripulante dispõe.
119. O departamento de recursos humanos da Ré é situado em ..., na ..., e é lá que é gerido todo o processo.
120. Em 2019, a Ré enviou comunicações aos seus trabalhadores, incluindo os AA., oferecendo a possibilidade de estas receberem o salário em 14 prestações mensais, opção que não foi tomada por nenhum dos AA.
121. Os AA. receberam os seus contratos por email, tiveram tempo para os ler e questionar a R. sobre quaisquer dúvidas que tivessem.
122. Os AA. assinavam no contrato uma declaração em como tinham tomado conhecimento dos termos e condições do contrato.
123. Por serem as declarações assinadas iguais para os 6 AA., veja-se, a título de exemplo, cfr. contratos de trabalho juntos pelos AA.: “Eu, BB, li, entendi e aceito todos os termos e condições do meu trabalho, conforme definido neste contrato de trabalho. Cumpri-los-ei ao longo da duração do meu trabalho na Empresa.”.
124. E assinavam ainda uma segunda declaração em como tinham lido e compreendido o Guia Geral da A..., cfr. contratos de trabalho juntos pelos AA.: “Eu, BB, li e compreendi plenamente o “Guia Básico da A...” e compreendi e aceitei que a Empresa pode alterar ou variar de tempos a tempos as disposições nele contidas (...).”.
125. Os AA. assinaram os vários contratos e remeteram os mesmos para a R. sem nunca terem colocado qualquer dúvida ou exposto qualquer preocupação.
126. Os AA. tinham vários dias para ler e analisar os contratos, para colocar à Ré as dúvidas que tivessem.
127. Nos termos da lei irlandesa, a remuneração dos trabalhadores é paga em 12 mensalidades anuais, pelo que a retribuição mensal dos AA. foi estipulada em € 1.247,50.
128. A partir de 2019 a Ré passou a aplicar a legislação portuguesa à relação laboral com todos os seus trabalhadores afetos a bases portuguesas (onde se incluíam os AA.).
129. Foi comunicado a todos os trabalhadores da Ré (incluindo os AA), que devido à transição para a lei laboral portuguesa o salário anual que vinham auferindo em 12 prestações mensais iria passar a ser pago em 14 prestações mensais, a não ser que os trabalhadores informassem a preferência pela manutenção do pagamento em 12 prestações mensais (aqui se incluindo o proporcional do subsídio de Natal e férias).
130. Não tendo os AA. manifestado a sua vontade, a Ré, passou a retribuir os AA. 14 vezes por ano, mantendo o valor global anual (€ 14.970,00) mas passando o valor mensal para € 1.069,29.
131. Com esta alteração não foi feita qualquer redução da retribuição dos AA., mantendo estes a mesma remuneração anual que sempre vinham auferindo.
132. Quanto ao subsídio de CSS, trata-se de um subsídio pago aos trabalhadores da Ré que assumem funções de chefia a bordo das aeronaves.
133. Não exercendo os trabalhadores estas funções, ou deixando de as exercer – temporariamente ou permanentemente – este subsídio é retirado.
134. O subsídio de CSS tinha um valor anual de € 2500.
135. À semelhança da retribuição mensal, era pago em 12 prestações mensais de € 208,33, sendo que, com a passagem para a aplicação da lei portuguesa, este passou a ser pago em 14 prestações mensais de € 178,58.
136. O subsídio Uni/Med/Id, é pago aos trabalhadores da Ré para os compensar dos gastos com fardamento e com os valores necessários à manutenção e renovação das identificações aeroportuárias.
137. Os AA. poderiam ainda receber comissões pelas vendas a bordo do avião.
138. A atribuição desta comissão estava diretamente relacionada com o desempenho do trabalhador e não estava antecipadamente garantida.
139. Os descontos para os diversos regimes de providência são efetuados conforme o tipo de voo realizado e nos termos previstos no acordo de dupla tributação celebrado entre Portugal e a ....
140. A A. AA auferiu, ao longo da sua carreira profissional na Ré, os seguintes montantes:

141. O A. BB auferiu, ao longo da sua carreira profissional na Ré, os seguintes montantes:

142. O A. CC auferiu, ao longo da sua carreira profissional na Ré, os seguintes montantes:

143. O A. DD auferiu, ao longo da sua carreira profissional na Ré, os seguintes montantes:

144. A A. EE auferiu, ao longo da sua carreira profissional na Ré, os seguintes montantes:


145. A A. FF auferiu, ao longo da sua carreira profissional na Ré, os seguintes montantes:


146. Quando a Ré acordou pagar os montantes concretos da retribuição anual que constam dos contratos de trabalho, teve em conta o orçamento e o custo estimado com a retribuição anual dos AA..
147. Estes critérios foram absolutamente essenciais para a contratação dos AA. pela Ré e para a definição dos valores das respetivas retribuições.
148. À autora FF, foram deduzidos os seguintes montantes:
i. setembro de 2019: Tax Paid (43,96); PRSI; USC (2,69);
ii. outubro de 2019: Tax Paid (11,32); PRSI; USC (13,71);
iii. novembro de 2019: Tax Paid; PRSI; USC (2,13);
iv. dezembro: sem remuneração e sem descontos.
149. Em 19 de setembro de 2019, a A. FF regressou de licença de maternidade.
150. De 19 de setembro de 2019 até 17 de outubro de 2019, a A. FF esteve de férias remuneradas.
151. Em 18 de outubro de 2019, a A. FF voltou a entrar de licença de maternidade.
152. A Ré dispõe de um catálogo de formação diversificado, o qual tem em consideração as concretas necessidades das várias funções desempenhadas pelos trabalhadores da Ré, bem como responde às exigências europeias relativas ao setor da aviação:
Tradeshow- Annual/BiAnnualy Seminários nos quais os fornecedores discutem e explicam os produtos à tripulação.
Linecheck (CLCK) - Onboard Annual Chec, Verificações a bordo do avião que cada tripulante deve completar anualmente.
3RT (Fire training) Formação em combate a incêndios que cada tripulante terá de realizar de 3 em 3 anos.
CRMS (Annual recurrent training) Formação recorrente anual para todos os tripulantes, que inclui Segurança, Primeiros Socorros, Vendas e CRM.
Summer and Winter Product Change breifings with Base Supervisor, Briefings dos Supervisores de Base, no verão e no inverno, com lançamento/mudança de produtos para cada período, incluindo alterações de preços e informações dos produtos.
AGB (Always getting better) Customer Service Training, 2 dias de formação de produtos e atendimento ao cliente promovidos por um fornecedor.
Recon (Annual Recurrent Training) Re-conversão que cobre todos os aspetos da Conversão do curso de Tripulante, a realizar aquando do regresso à escala após ausência prolongada.
CPD (E-learning) Formação contínua em desenvolvimento pessoal em ambiente online, emitido trimestralmente, com diferentes tópicos e conteúdos.
Base Visits -EBM O responsável de base visita pessoalmente as Bases para permitir reuniões 1/1 com os tripulantes. Max Training Formação on-line específica para aeronaves BST (Base Supervisor Training) Formação de atualização para Funções de Supervisor de Base.
153. Nos últimos 5 anos a A. AA realizou as seguintes horas de formação:


154. Nos últimos 5 anos o A. BB realizou as seguintes horas de formação:

155. Nos últimos 5 anos o A. CC realizou as seguintes horas de formação:

156. Nos últimos 5 anos (sendo 2020 o último ano de trabalho na Ré) o A. DD realizou as seguintes horas de formação:

157. Nos últimos 5 anos a A. EE realizou as seguintes horas de formação:


158. Nos últimos 5 anos (sendo 2020 o último ano de trabalho na Ré) a A. FF realizou as seguintes horas de formação:


159. Em 2020 e 2021, a A. EE não realizou horas de formação, pelos seguintes motivos:
i. em 2020, esteve de licença de maternidade em fevereiro, esteve de baixa médica em outubro e esteve de baixa por gravidez de risco em novembro e dezembro;
ii. em 2021, esteve de licença de maternidade.
160. Para além dos dias de férias que gozavam anualmente, os AA. gozavam ainda, em resultado de um acordo de base que se findou em 2021, de um conjunto de dias adicionais de descanso que, pese embora não tivessem a qualificação de férias, eram dias de repouso concedidos pela 1ª R.
161. De acordo com a lei laboral irlandesa, os AA. apenas teriam direito a 1,66 dias, no total de 20 dias anuais, que gozaram
162. Desde 2016, os AA. vinham trabalhando cinco dias consecutivos e descansavam sempre três dias seguidos.
163. Sendo que dentro dos cinco dias consecutivos mencionados tinham muitas das vezes incluído um dia de prevenção fora do aeroporto.
164. Consta dos contratos de trabalho dos AA.: “Devido à natureza do seu emprego e ao setor empresarial em que a Empresa opera, não existem horas formais de trabalho e a Empresa pode exigir que trabalhe no momento e nos dias que a Empresa pode especificar de tempos a tempos, o que pode incluir sábados, domingos e feriados públicos”.
165. O trabalhador não tem direito contratual a um determinado padrão de turnos e os dias/horas em que é chamado para trabalhar podem ser alterados à discrição absoluta da empresa.”
166. Em 2016, foi celebrado um acordo que abrangia todos os colaboradores da Ré.
167. Nesse acordo foi estabelecido que, por um período de 5 anos (1 de abril de 2016 a 31 de março de 2021), os trabalhadores da Ré poderiam usufruir de um padrão de trabalho de 5/3/5/3.
168. A validade deste acordo chegou ao fim em 31 de março de 2021, altura em que se regressou à organização de trabalho aplicada antes de 1 de abril de 2016.
169. A Ré celebrou um AE com o STTAMP em que de facto se veio a prever o padrão de trabalho de 5/3/5/3, no entanto, esta vantagem atribuída aos trabalhadores pertencentes a este sindicato derivou de um conjunto de cedências feitas pelos trabalhadores desse mesmo sindicato, uma vez que este padrão de trabalho representa um elevado custo para a Ré que tem de contratar trabalhadores adicionais.
170. Os AA., não são sindicalizadas no STTAMP (mas antes no SNPVAC, que se opôs expressamente à extensão deste acordo aos seus membros).
171. Enquanto ao serviço da empresa B..., os AA. foram contratados para bases estrangeiras diferentes:
i. o A. GG iniciou as suas funções na Bélgica, tendo posteriormente sido transferido para a Grécia e a ...; e
ii. o A. HH iniciou as suas funções em França;
172. O A. HH também foi contratado por uma empresa de trabalho temporário (B... – com sede na ...), entre 05.05.2008 e 31.12.2011, onde operou voos da A... a partir da base de ..., França. Em 01.01.2012 foi contratado pela Ré, passando a exercer funções na base do …, Portugal
173. Os contratos de trabalho dos AA. preveem que o local de trabalho pode ser transferido para qualquer uma das bases europeias onde a Ré opera, sendo desde logo evidente que a disponibilidade para a mobilidade era uma característica e elemento essencial da vontade de contratar da Ré, cfr. Docs. n. 5 e 6 juntos pelos AA, referentes a contratos de trabalho onde se pode ler (cláusula 5.1): “É uma condição do seu emprego que cumpra qualquer uma dessas exigências. Isto inclui, para evitar dúvidas, a transferência para qualquer das bases europeias da Empresa sem compensação. Deve entender-se que, caso seja transferido para outra base, será pago de acordo com o salário e o sistema de pagamento de voos em vigor nessa base”.
174. Sem essa previsão contratual, jamais os AA. teriam sido contratados pela Ré, sendo a mobilidade geográfica um elemento essencial à sua atividade, necessidades e especificidades.
175. Os AA. foram recrutados no âmbito de um programa europeu de recrutamento.
176. Esse programa de recrutamento, onde são levadas a cabo entrevistas por toda a Europa, é conduzido a partir da sede da Ré, em ....
177. Quando os AA. se candidataram a uma posição na Ré, aceitaram que a sua candidatura os poderia levar a serem colocados em qualquer uma das diversas bases europeias onde a Ré opera, e que poderiam igualmente, a qualquer altura, ser transferidos para outra base, noutro país.
178. Os AA. procuraram esta carreira, foram informados das suas características especiais e aceitaram-nas.
179. Os AA. foram inicialmente contratados pela empresa de trabalho temporário B..., a qual foi responsável pelo treino inicial dos AA; Durante o treino inicial, esteve sempre um membro da B... para explicitar e clarificar quaisquer dúvidas sobre os termos da relação contratual a que se candidatavam os AA.
180. Quando os AA. fizeram formação inicial com a B..., foi-lhes entregue um contrato de formação – que os AA. leram, compreenderam e assinaram - o qual previa um reforço da informação sobre as condições especiais exigidas aos Tripulantes de Cabine, entre outros, a aplicação da lei irlandesa e a cláusula de mobilidade: “Tal como todos os contratos, este contém linguagem legal, etc. Por isso, se não tiver a certeza de alguma coisa sobre o contrato, por favor contacte-me e responderei a quaisquer dúvidas que possa ter”.
181. Quer junto da B..., quer posteriormente junto da Ré, os AA. também tinham a possibilidade de colocar dúvidas e questões em ferramenta informática própria para o efeito.
182. Esta ferramenta era utilizada bastas vezes pelos AA. para diversos efeitos.
183. O A. HH poderia ter optado por pagar a segurança social em Portugal desde junho de 2012 (tendo sido contratado pela Ré em 01.01.2012), no entanto, optou por permanecer no sistema de segurança social ... até terminar os seus direitos denominados de "grandfathering rights" em maio de 2020 (direito ao abrigo do qual o A., apesar de estar a laborar em Portugal, poderiam beneficiar do sistema de segurança social ..., mais protetor e abrangente que o sistema português).
184. Os AA. receberam os seus contratos por email, tiveram tempo para os ler e questionar a Ré sobre quaisquer dúvidas que tivessem.
185. Os AA. assinavam no contrato uma declaração em como tinham tomado conhecimento dos termos e condições do contrato, por serem as declarações iguais veja-se, a título de exemplo, cfr. Contratos de trabalho juntos pelos AA. no Doc. n. 6: “Eu, HH, li, entendi e aceito todos os termos e condições do meu trabalho, conforme definido neste contrato de trabalho. Cumpri-los-ei ao longo da duração do meu trabalho na Empresa.”.
186. E assinavam ainda uma segunda declaração em como tinham lido e compreendido o Guia Geral da A..., cfr. contratos de trabalho juntos pelos AA.: “Eu, HH, li e compreendi plenamente o “Guia Básico da A...” e compreendi e aceitei que a Empresa pode alterar ou variar de tempos a tempos as disposições nele contidas (...).”.
187. Os AA. assinaram os vários contratos e remeteram os mesmos para a Ré sem nunca terem colocado qualquer dúvida ou exposto qualquer preocupação.
188. Os acordaram a prestação do seu trabalho através de uma retribuição anual de € 14.970,00, à qual acresceria os subsídios em vigor e que fossem aplicáveis à categoria que exercessem.
189. Nos termos da lei irlandesa, a remuneração dos trabalhadores é paga em 12 mensalidades anuais, pelo que a retribuição mensal dos AA. foi estipulada em € 1.247,50.
190. O subsídio de CSS tinha um valor anual de € 2500.
191. À semelhança da retribuição mensal, era pago em 12 prestações mensais de € 208,33, sendo que, com a passagem para a aplicação da lei portuguesa, este passou a ser pago em 14 prestações mensais de € 178,58.
192. Como se pode verificar, esta forma de pagamento não consubstanciou uma redução do valor deste subsídio uma vez que, também à semelhança da retribuição mensal, o valor anual manteve-se inalterado.
193. No que diz respeito ao subsídio Uni/Med/Id, este é pago aos trabalhadores da Ré para os compensar dos gastos com fardamento e com os valores necessários à manutenção e renovação das identificações aeroportuárias.
194. Os AA. poderiam ainda receber comissões pelas vendas a bordo do avião.
195. A atribuição desta comissão estava diretamente relacionada com o desempenho do trabalhador e não estava antecipadamente garantida.
196. O A. GG auferiu, ao longo da sua carreira profissional na Ré, os seguintes montantes:

197. O A. HH auferiu, ao longo da sua carreira profissional na Ré, os seguintes montantes:

198. Quando a Ré acordou pagar os montantes concretos da retribuição anual que constam dos contratos de trabalho, teve em conta o orçamento e o custo estimado com a retribuição anual dos AA.
199. Estes critérios foram absolutamente essenciais para a contratação dos AA. pela Ré e para a definição dos valores das respetivas retribuições.
200. Nos últimos 5 anos o A. GG realizou as seguintes horas de formação:

201. Nos últimos 5 anos o A. HH realizou as seguintes horas de formação:

Factos não provados:
1. A Autora AA prestou inicialmente a sua atividade à Ré A... através da empresa B... (agência Irlandesa que presta serviço equivalente ou semelhante ao de uma agência de trabalho temporário que tem como cliente único a Ré), entre 29/03/2006 e 28/09/2009.
2. A partir de 29/09/2009 a Autora AA passou a prestar ininterruptamente a sua atividade diretamente à Ré A..., a partir do Aeroporto ...,
3. Aceitando a Ré o tempo de serviço através da empresa B... como tempo de antiguidade ao seu serviço.
4. Tendo já ocupado a mesma posição anteriormente (2008 e inícios de 2009) nas bases de ... e ..., conforme contrato de trabalho, anexos e adendas ao mesmo junto.
5. Aceitando a Ré o tempo de serviço através da empresa B... como tempo de antiguidade ao seu serviço também de acordo com a tabela temporária fornecida à Comissão Representativa a critério de data de entrada.
6. Os contratos de trabalho nunca foram negociados.
7. Sendo-lhes entregue versão única e final do contrato, não tendo estes/as qualquer possibilidade de negociar o seu conteúdo.
8. O qual era entregue para mera assinatura do mesmo.
9. Sem que lhes fossem explicadas quaisquer das cláusulas aí presentes.
10. Segundo essa adenda o seu vencimento base passaria a ser de € 1.069,29.
11. O complemento de CSS passaria a ter o valor de € 178,58.
12. Tendo, em retaliação e assédio laboral, a Ré operado um despedimento coletivo para despedir aqueles trabalhadores, entre os quais os Autores, que haviam recusado assinar essa adenda.
13. Ao mesmo tempo, os Autores nunca aceitaram ou reconheceram que o valor dos subsídios de férias ou de natal fossem incorporados na retribuição anual.
14. Ainda a este propósito cumpre mencionar que, como se pode constatar das adendas que os Autores recusaram assinar e deram origem ao despedimento coletivo ideológico, a Ré tentava aí suprir essa sua prática ilegal (não pagar os subsídios de férias e de natal aos seus trabalhadores) pretendendo passar a pagar esses mesmos subsídios, dividindo o atual valor anual bruto dos trabalhadores por 14 meses, em vez de o pagar como o faz atualmente, em 12 meses.
15. A retribuição base dos Autores AA, CC, DD, EE e FF ao longo da sua relação laboral enquanto prestada a partir da base do …, bem como os do Autor BB a partir de 1 de Novembro de 2012, data em que passou a prestar a sua atividade diretamente à Ré, primeiro como Junior CSS e, só a partir de 1 de Novembro de 2015, como CSS, tiveram os seguintes valores:
Vencimento Base CSS 2009
1 022,50 €
Complemento Nº 1 2009
125,00 €
Vencimento Base CSS 2010
1 022,50 €
Complemento Nº 1 2010
125,00 €
Vencimento Base CSS 2011
1 064,17 €
Complemento Nº 1 2011
125,00 €
Vencimento Base CSS 2012
1 105,83 €
Vencimento Base Junior CSS 2012
879,17 €
Complemento Nº 1 2012
125,00 €
Vencimento Base CSS 2013
1 147,50 €
Vencimento Base Junior CSS Janeiro a Março de 2013
937,50 €
Vencimento Base Junior CSS Abril a Dezembro de 2013
966,67 €
Complemento Nº 1 2013
145,83 €
Vencimento Base CSS 2014
1 189,17 €
Vencimento Base Junior CSS Janeiro a Março de 2014
966,67 €
Vencimento Base Junior CSS Abril a Dezembro de 2014
995,83 €
Complemento Nº 1 2014
166,67 €
Vencimento Base CSS 2015
1 218,33 €
Vencimento Base Junior CSS Janeiro a Março de 2015
995,83 €
Vencimento Base Junior CSS Abril a Dezembro de 2015
1 016,67 €
Complemento Nº 1 2015
166,67 €
Vencimento Base CSA 2016
1 037,50 €
Vencimento Base CSS 2016
1 247,50 €
Complemento Nº 1 2016
187,50 €
Vencimento Base CSS 2017
1 247,50 €
Complemento Nº 1 2017
187,50 €
Vencimento Base CSS 2018
1 247,50 €
Complemento Nº 1 2018
208,33 €
Vencimento Base CSS 2019
1 247,50 €
Complemento Nº 1 2019
208,33 €
Complemento Base Supervisor 2009-2019
208,33 €
16. Todos os valores da tabela supra são ilíquidos.
17. A Ré vem a liquidar todas as componentes salariais de forma unitária quanto a impostos e contribuições para a segurança social.
18. Bem como releva referir que a Ré não tem uma atuação constante na aplicação da lei tributária e sistema de previdência social que aplica aos seus trabalhadores.
19. Por vezes descontando todas as quantias sob o regime tributário e de previdência ....
20. Outras vezes, líquida as quantias devidas a título tributário sob o regime ..., e realizando as contribuições para o sistema de Segurança Social português.
21. E outras, tudo liquidando sob o regime português.
22. Nesse período, mais concretamente nos meses de Setembro, Novembro e Dezembro de 2019 a Ré, deduziu do seu pagamento ilíquido montantes a título de unpaid, no total de €1.512,07 (mil quinhentos e doze euros e sete cêntimos).
23. Os Autores, ao longo do tempo de serviço, não receberam formação.
24. A R. insiste em que os AA. Reintegrados auferem o valor inferior à sua normal retribuição, como se estes tivessem assinado a adenda que deu origem ao seu despedimento.
25. A título de retribuições intercalares e nos meses que se deram desde a reintegração dos AA. (exceto a AA. EE) foram liquidados os seguintes montantes ilíquidos em cada um desses meses: €1.069,29 (Basic) + €178,58 (CSS Allowance), ambos ilíquidos.
26. Num total de €1247,87.
27. Quando deveria ter liquidado o valor retributivo de €1489,16 mensais.
28. Sem prejuízo do que a R. lhes tenha pago a título de comissão de vendas ou “Sector pay/Gross Sectors”.
29. Acontece que, desde a sua reintegração após despedimento ilícito da R. esta não lhe atribuí tal organização do seu tempo de trabalho.
30. Atribuindo o seu planeamento mensal em total anarquia, sem qualquer lógica ou padrão.
31. Causando total incerteza na organização do seu tempo.
32. Além da óbvia disrupção daquele que é um direito adquirido dos AA aqui mencionados, é também tal uma disrupção grave da sua vida pessoal e familiar.
33. Não tendo os AA. Aqui mencionados acordado em qualquer alteração ao seu “padrão de escalas”
34. Aceitando a Ré o tempo de serviço através da empresa B... a 20/03/2013 como tempo de antiguidade ao seu serviço.
35. Aceitando a Ré o tempo de serviço através da empresa B... como tempo de antiguidade ao seu serviço.
36. A retribuição base dos AA., GG e HH tiveram os seguintes valores:
Vencimento Base CSS 2009 1 022,50 €
Complemento Nº 1 2009 125,00 €
Vencimento Base CSS 2010 1 022,50 €
Complemento Nº 1 2010 125,00 €
Vencimento Base CSS 2011 1 064,17 €
Complemento Nº 1 2011 125,00 €
Vencimento Base CSS 2012 1 105,83 €
Vencimento Base Junior CSS 2012 879,17 €
Complemento Nº 1 2012 125,00 €
Vencimento Base CSS 2013 1 147,50 €
Vencimento Base Junior CSS Janeiro a Março de 2013 937,50 €
Vencimento Base Junior CSS Abril a Dezembro de 2013 966,67 €
Complemento Nº 1 2013 145,83 €
Vencimento Base CSS 2014 1 189,17 €
Vencimento Base Junior CSS Janeiro a Março de 2014 966,67 €
Vencimento Base Junior CSS Abril a Dezembro de 2014 995,83 €
Complemento Nº 1 2014 166,67 €
Vencimento Base CSS 2015 1 218,33 €
Vencimento Base Junior CSS Janeiro a Março de 2015 995,83 €
Vencimento Base Junior CSS Abril a Dezembro de 2015 1 016,67 €
Complemento Nº 1 2015 166,67 €
Vencimento Base CSA 2016 1 037,50 €
Vencimento Base CSS 2016 1 247,50 €
Complemento Nº 1 2016 187,50 €
Vencimento Base CSS 2017 1 247,50 €
Complemento Nº 1 2017 187,50 €
Vencimento Base CSS 2018 1 247,50 €
Complemento Nº 1 2018 208,33 €
Vencimento Base CSS 2019 1 247,50 €
Complemento Nº 1 2019 208,33 €
37. Todos os valores da tabela supra são valores ilíquidos.
38. A matriz fornecida à Comissão de Trabalhadores, no âmbito do despedimento coletivo, refere essa data sob a coluna “Date Commenced on FR A/C” – em tradução livre “Data de Começo numa Aeronave FR”.
39. No entanto, como se percebe, essa coluna refere-se precisamente à data em que os AA. iniciaram a sua operação num avião A..., o que efetivamente ocorreu na data aí referida, mas ao abrigo de um regime de trabalho temporário perfeitamente lícito, cujo período não se computa para efeitos de antiguidade como trabalhador na R.
40. Esta ferramenta era utilizada bastas vezes pelos AA. para diversos efeitos.
41. Apesar da existência, conhecimento e uso desta ferramenta, os AA. nunca a utilizaram para questionar nada sobre os termos contratuais
42. É no avião que os AA. realizavam 90% do seu trabalho e é, sem espaço para dúvida, aí que realizavam o núcleo essencial das suas funções como Tripulantes de Aeronaves.
43. Se por força do contrato ou da lei aplicável a Ré tivesse de pagar qualquer quantia, subsídio ou prestação adicional, nomeadamente a título de subsídio de férias e/ ou subsídio de Natal, teria, obviamente, estabelecido um montante horário inferior ao acordado nos contratos de trabalho de forma a respeitar e não exceder o seu orçamento e o custo anual com a retribuição dos AA..
44. Apesar da existência, conhecimento e uso desta ferramenta, os AA. nunca a utilizaram para questionar a Ré sobre os termos contratuais.
II.2 IMPUGAÇÃO DA DECISÃO SOBRE A MATÉRIA DE FACTO
Insurgem-se os recorrentes quanto à decisão sobre a matéria de facto, impugnando-a relativamente aos pontos pontos provados 101, 102, 121, 126, 184, 130, 131, 135, 152, 168, 191, 192 [conclusões [conclusão c]; quanto aos factos não provados dos pontos 1, 2, 4, 6 a 9, 10 a 12, 13, 15, 16, 36, 37, 17 a 22, 23, 24 a 27, 29, 30 e 31[conclusão d]; e, ainda, por não ter dado como provada matéria que defende deverá ser aditada [conclusão e];
A recorrida pronunciou-se, contrapondo que a impugnação da matéria de facto quanto aos factos provados deve improceder, desde logo, por incumprimento da indicação dos meios de prova prevista no art.º 640.º n.º1, al. b), do CPC; quanto aos pontos não provados, deve improceder, ou por não ter fundamento na prova produzida ou por não ter sido cumprido o ónus de indicação dos meios de prova previsto no art.º 640.º n.º1, al. b), do CPC; e, na parte em que visa o aditamento de factos, desde logo, deve ser rejeitada por falta de indicação dos meios de prova, nos termos da alínea b) do número 1 do artigo 640.º do CPC pelo que deve ser indeferida.
Conforme decorre do n.º1 do art.º 662.º do CPC, a Relação deve alterar a decisão proferida sobre a matéria de facto, se os factos tidos como assentes, a prova produzida ou um documento superveniente impuserem decisão diversa. Nas palavas de Abrantes Geraldes, “(..) a modificação da decisão da matéria de facto constitui um dever da Relação a ser exercido sempre que a reapreciação dos meios de prova (sujeitos à livre apreciação do tribunal) determine um resultado diverso daquele que foi declarado na 1.ª instância” [Recursos no Novo Código de Processo Civil, Almedina, Coimbra, 2013, p. 221/222].
O mesmo autor, após observar que a possibilidade de alteração da matéria de facto deixou de ter carácter excepcional, acabando “por ser assumida como uma função normal do Tribunal da Relação, verificados os requisitos que a lei consagra”, logo prossegue advertindo que “Nesta operação foram recusadas soluções que pudessem reconduzir-nos a uma repetição do julgamento, tal como foi rejeitada a admissibilidade de recursos genéricos contra a errada decisão da matéria de facto, tendo o legislador optado por abrir apenas a possibilidade de revisão de concretas questões de facto controvertidas relativamente às quais sejam manifestadas e concretizadas divergências pelo recorrente“ [Op. cit., p. 123/124].
Pretendendo a parte impugnar a decisão sobre a matéria de facto, deve observar os ónus de impugnação indicados no art.º 640.º do CPC, ou seja, é-lhe exigível a especificação obrigatória, sob pena de rejeição, dos pontos mencionados no n.º1 e n.º2, enunciando-os na motivação de recurso, nomeadamente os seguintes:
- Os concretos pontos de facto que considera incorretamente julgados;
- Os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida;
- A decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas.
- Quando os meios probatórios invocados como fundamento do erro na apreciação das provas tenham sido gravados, sob pena de imediata rejeição do recurso na respetiva parte, a indicação com exactidão das passagens da gravação em que se funda o seu recurso, sem prejuízo de poder proceder à transcrição dos excertos que considere relevantes.
No que concerne ao que se deve exigir nas conclusões de recurso quando está em causa a impugnação da matéria de facto, sendo estas não apenas a súmula dos fundamentos aduzidos nas alegações, mas atendendo sobretudo à sua função definidora do objeto do recurso e balizadora do âmbito do conhecimento do tribunal, é entendimento pacífico que as mesmas devem conter, sob pena de rejeição do recurso, pelo menos uma síntese do que consta nas alegações da qual conste necessariamente a indicação dos concretos pontos de facto cuja alteração se pretende e o sentido e termos dessa alteração [cfr. Acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça: de 23-02-2010, Proc.º 1718/07.2TVLSB.L1.S1, Conselheiro FONSECA RAMOS; de 04/03/2015, Proc.º 2180/09.0TTLSB.L1.S2, Conselheiro ANTÓNIO LEONES DANTAS; de 19/02/2015, Proc.º 299/05.6TBMGD.P2.S1, Conselheiro TOMÉ GOMES; de 12-05-2016, Proc.º 324/10.9TTALM.L1.S1, Conselheira ANA LUÍSA GERALDES; de 27/10/2016, Proc.º 110/08.6TTGDM.P2.S1, Conselheiro RIBEIRO CARDOSO; e, de 03/11/2016, Proc.º 342/14.8TTLSB.L1.S1, Conselheiro GONÇALVES ROCHA (todos eles disponíveis em www.dgsi.pt)].
Para além disso, exige-se também que o recorrente fundamente “em termos concludentes, as razões da sua discordância, concretizando e apreciando criticamente os meios probatórios constantes dos autos ou da gravação que, no seu entender, impliquem uma decisão diversa” [cfr. Ac. STJ de 01-10-2015, Proc.º n.º 824/11.3TTLRS.L1.S1, Conselheira Ana Luísa Geraldes, disponível em www.dgsi.pt].
É também entendimento pacífico da jurisprudência dos tribunais superiores, mormente do STJ, que o recorrente não cumpre o ónus de especificação imposto no art.º 640º, nº 1, al b), do CPC, quando procede a uma mera indicação genérica da prova que, na sua perspetiva, justifica uma decisão diversa daquela a que chegou o Tribunal de 1.ª Instância, em relação a um conjunto de factos, sem especificar quais as provas produzidas quanto a cada um dos factos que, por as ter como incorretamente apreciadas, imporiam decisão diversa, fazendo a apreciação crítica das mesmas. Nesse sentido, acompanhando o entendimento afirmado nos acórdãos do STJ de 20-12-2017 e 5-09-2018 [respectivamente, nos processos n.ºs 299/13.2TTVRL.C1.S2 e 15787/15.8T8PRT.P1.S2, disponíveis em www.dgsi.pt], no acórdão de 20-02-2019, daquela mesma instância [proc.º 1338/15.8T8PNF.P1.S2, Conselheiro Chambel Mourisco, disponível em www.dgsi.pt], consignou-se no respectivo sumário o seguinte:
- I. O artigo 640.º, n.º 1, alínea b), do Código de Processo Civil estabelece que se especifique os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida, e determina que essa concretização seja feita relativamente a cada um daqueles factos e com indicação dos respetivos meios de prova, e quando gravados com a indicação exata das passagens da gravação em que se funda o recurso.
II - Não cumpre aquele ónus o apelante que nas alegações não especificou os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, relativamente a cada um dos factos concretos cuja decisão impugna, antes se limitando a proceder a uma indicação genérica e em bloco, para aquele conjunto de factos.
Ainda a este propósito, o recente Acórdão do STJ de 06-07-2022 [Proc.º 3683/20.1T8VNG.P1.S1, Conselheiro Mário Belo Morgado, disponível em www.dgsi.pt], após enunciar a “jurisprudência do STJ, norteada por critérios de proporcionalidade e de razoabilidade e rejeitando abordagens desta problemática de raiz essencialmente formal” – como nele se refere, consolidada, entre outros, nos acórdãos de 13.01.2022 [Proc. nº 417/18.4T8PNF.P1.S1], 27.10.2021 [Proc. n.º 1372/19.9T8VFR.P1-A.S1], de 14.07.2021 [Proc. n.º 19035/17.8T8PRT.P1.S1], de 19-05-2021 [Proc. n.º 4925/17.6T8OAZ.P1.S1] e de 14.01.2021 [Proc. nº 1121/13.5TVLSB.L2.S1] – sintetiza no respectivo sumário o entendimento seguinte:
I - As implicações das falhas evidenciadas no plano do cumprimento dos ónus de alegação previstos no art. 640.º, do CPC, avaliam-se em função das circunstâncias de cada caso concreto, tendo em conta, nomeadamente, o número de factos impugnados, o número e a conexão existente entre os factos integrantes de cada “bloco”, o número e a extensão dos meios de prova, a maior ou menor precisão na indicação dos meios de prova e na formulação das pretendidas alternativas decisórias e o grau de clareza com que tenham sido expostas as razões subjacentes ao peticionado, razões que devem ser nitidamente percecionáveis, pois não é suposto que o tribunal da Relação se dedique à descoberta de motivos e raciocínio não explicitados claramente.
II - Impugnar uma decisão significa refutar as premissas e os motivos que lhe subjazem, contrapondo-lhe um pensamento (racionalidade) alternativo, que não dispensa a justificação das afirmações e a expressão de argumentos (tendentes a demonstrar a bondade dos motivos apresentados como sendo “bons motivos”).
III - Independentemente das exigências especificamente contidas no art. 640.º, do CPC, o recorrente – em qualquer recurso – não pode dispensar-se de claramente explicitar os “fundamentos por que pede a alteração ou anulação da decisão” (art. 639.º, n.º 1, do mesmo diploma), resultando da articulação destas disposições legais que o recorrente é onerado com imposições (de motivação) situadas em dois planos que, sendo complementares, têm natureza diversa: i) por um lado, impõe-se-lhe a precisa delimitação do objeto do recurso; ii) por outro lado, exige-se-lhe a efetiva e clara compreensibilidade das razões em que assenta o recurso, por forma a que na sua apreciação o tribunal não se confronte com dificuldades desmesuradas, nem demore tempo excessivo.
Para encerrar estas notas, acresce dizer, que conforme o Supremo Tribunal de Justiça tem entendido, quando o recorrente não cumpra o ónus imposto no art.º 640.º do Código de Processo Civil não há lugar ao convite ao aperfeiçoamento, que está reservado para os recursos da matéria de direito [Cfr. acórdãos de 7-7-2016, processo n.º 220/13.8TTBCL.G1.S1, Conselheiro Gonçalves Rocha; e, de 27-10-2016, processo n.º 110/08.6TTGDM.P2.S1, Conselheiro Ribeiro Cardoso; (ambos disponíveis em www.dgsi.pt)].
Atentos os princípios enunciados, cabe verificar se algo obsta à apreciação da impugnação.
No que concerne às conclusões, verifica-se que na parte da impugnação dirigida aos factos provados a recorrente não cumpre o que se entende exigível, nomeadamente, não concretiza o sentido e termos das alterações pretendidas, limitando-se a dizer que os “pretendem impugnar ou alterar os factos” provados 101, 102, 121, 126, 184, 130, 131, 135, 152, 168, 191, 192 [cfr. conclusão c)]. Assim, no que a esta parte da impugnação concerne, rejeita-se a impugnação da decisão sobre matéria de facto.
Quanto à impugnação dos factos não provados [conclusão d)] e na parte em que visa o aditamento de factos [conclusão e)], as conclusões cumprem o que se entende exigível: no primeiro caso os recorrentes pretendem que seja considerados provados; e, no segundo, indicam a redacção dos factos que pretendem sejam aditados.
No que concerne ao cumprimento dos demais ónus de impugnação destas duas partes da impugnação da decisão sobre a matéria de facto, adiante nos pronunciaremos, para o efeito atentando nas alegações.
II.2.1 Impugnação dos factos não provados dos pontos 1, 2, 4, 6 a 9, 10 a 12, 13, 15, 16, 36, 37, 17 a 22, 23, 24 a 27, 29, 30 e 31.
Seguiremos a ordem inculcada pelos recorrentes nas alegações.
Pontos 1, 2 e 4
O conteúdo desses pontos não provados, é o que segue:
1. A Autora AA prestou inicialmente a sua atividade à Ré A... através da empresa B... (agência Irlandesa que presta serviço equivalente ou semelhante ao de uma agência de trabalho temporário que tem como cliente único a Ré), entre 29/03/2006 e 28/09/2009.
2. A partir de 29/09/2009 a Autora AA passou a prestar ininterruptamente a sua atividade diretamente à Ré A..., a partir do Aeroporto ...,
4. Tendo já ocupado a mesma posição anteriormente (2008 e inícios de 2009) nas bases de ... e ..., conforme contrato de trabalho, anexos e adendas ao mesmo junto.
Os recorrentes alegam que estes factos foram considerados não provados “em total discordância com a convicção do Tribunal”, que na fundamentação da decisão sobre a matéria diz “A audiência iniciou-se com a audição da parte AA, assistente de bordo na ré desde 2006, a trabalhar em Portugal desde 2009.”, e dá como não provado aquela matéria. Questionam “Como pode tal ser, a não ser por mero lapso?”
Os recorrentes não indicam meios de prova para sustentar a alteração pretendida e, embora não o afirmem expressamente, antes se refugiando na interrogação que formulam “Como pode tal ser, a não ser por mero lapso?” – estão a sugerir uma contradição entre aquela parte da fundamentação e a decisão quanto a estes factos.
Daí que não seja de rejeitar a apreciação por falta de indicação de meios de prova.
Contudo, em termos lógicos, aquela mera afirmação do Senhor Juiz, ao referir “assistente de bordo na ré desde 2006, a trabalhar em Portugal desde 2009”, jamais poderia ser suficiente para se concluir que na sua convicção sobre o conteúdo dos pontos 1, 2 e 4, acima transcritos, teria sido produzida prova, muito menos para se considerar os mesmos provados com a abrangência das matérias a que respeitam.
Com o devido respeito, o argumento é descabido e nesta parte a impugnação improcede.
Pontos 6 a 9
Nestes pontos foi considerado não provado o que segue:
6. Os contratos de trabalho nunca foram negociados.
7. Sendo-lhes entregue versão única e final do contrato, não tendo estes/as qualquer possibilidade de negociar o seu conteúdo.
8. O qual era entregue para mera assinatura do mesmo.
9. Sem que lhes fossem explicadas quaisquer das cláusulas aí presentes.
Sobre estes pontos dizem os recorrentes que “economia processual, remete-se para as transcrições supra referentes a este tema”, depois tecendo considerações que apenas têm por base a sua própria convicção, designadamente, referindo que “Destarte, creem os autores que provaram de forma definitiva que nenhum membro da R. se ocupava da tarefa de clarificar o conteúdo do contrato. Tampouco qualquer um dos membros da formação da R. (ou mesmo do seu departamento de Recursos Humanos) teria funcionários com os conhecimentos de direito necessários a explanar uma cláusula de foro. Mais, eram estes pressionados a entregar os mesmos o quanto antes, numa tentativa da R. pressionar estes e os impossibilitar de consultar Advogado sobre o conteúdo do mesmo”. E, em seguida invocam as declarações de parte do Autor CC que “[..]a este propósito, [..] (minuto 47 adiante) respondeu” ao senhor Juiz:
“Magistrado Judicial: Verbalmente nunca lhe pediram para o senhor pressionar um determinado trabalhador?
CC: Sim. Já me pediram. Posso-lhe dar um exemplo. Posso dar um exemplo?
[..]
CC: Pois. Nós assinámos uma primeira adenda que eu já não me recordo quando foi. Foi um dos acordos de empresa, em que esse acordo de empresa, nós ainda não tínhamos sindicatos, mas já tínhamos (Impercetível), já tínhamos representantes [00:48:00] de base. E, obviamente, foi colocado primeiro aos representantes de base para terem a opinião a dar sobre esses mesmos acordos e aquilo que transpirou dos representantes é que basicamente a adenda que nos estava a ser colocada em frente, eles tentaram mudar alguma coisa, mas não tiveram voz. Pronto. E isso foi depois, a posteriori, colocada à votação dos colegas tripulantes em voto secreto. Foi feito apenas pelos trabalhadores da A... aos trabalhadores da B... e da C... que representavam a maior parte, eu diria, nessa altura até representavam 60 por cento dos tripulantes. Não lhes foi dada a opção de votar. Só foi dado aos A.... E os A... votaram e no primeiro dia [00:49:00] em que eu estou… eu estava de folga, telefona-me a minha manager que naquele momento é a (Impercetível) e a perguntar-me, “CC, estás aonde?” E eu, “Eu hoje estou de folga. Mas precisas de alguma coisa?” “Sim, sim. Olha, eu ouvi dizer que a votação aí no … não está favorável a nós”. E eu, “Favorável a nós? Como assim?” “Ouvi dizer que a adenda está em risco de não passar”. E eu. “Ok. Mas é uma votação. As pessoas têm o direito de votar sim ou não”. “Não. Olha, aquilo… não, não. Isso tem que passar”. “Então, olha, aquilo que eu quero que tu faças é que tu vás até ao escritório e que abras as caixas de voto [00:50:00] e me digas como é que a votação está”. E eu…
Concluem, dizendo que “Como tal, ficou por demais provado que os contratos dos AA nunca foram negociados, devendo os pontos 6 a 9 serem agora dados como provados”.
Valem aqui as considerações deixadas no ponto anterior. Em síntese, os AA pretendem fazer prevalecer a sua própria convicção à do tribunal a quo, apenas indicando como meio de prova as declarações de parte transcritas – razão que evitou a rejeição imediata da reapreciação por incumprimento dos ónus de impugnação -, sendo que este nem sequer incide sobre a matéria dos factos impugnados, ou seja, estas declarações nada têm a ver com os contratos de trabalho.
Sempre com o devido respeito, a impugnação é destituída de fundamento e, logo, improcede também nesta parte.
Pontos 10 a 12
O teor dos pontos não provados em causa é o seguinte:
10. Segundo essa adenda o seu vencimento base passaria a ser de € 1.069,29.
11. O complemento de CSS passaria a ter o valor de € 178,58.
12. Tendo, em retaliação e assédio laboral, a Ré operado um despedimento coletivo para despedir aqueles trabalhadores, entre os quais os Autores, que haviam recusado assinar essa adenda.
Alegam os recorrentes que esta matéria respeita “ao processo de impugnação do despedimento coletivo que correu termos no juízo que é o Tribunal a quo sendo factos e documentos do seu inteiro conhecimento e ao seu alcance, que não podia ignorar, nem carecia de alegação nos termos do artigo 412º/2 do CPC”, nessa consideração defendendo que sendo “[..] do conhecimento integral do Tribunal a quo no exercício das suas funções”, deverá ser dados como provados.
Estabelece o art.º 412.º 2, do CPC, o seguinte: “Também não carecem de alegação os factos de que o tribunal tem conhecimento por virtude do exercício das suas funções; quando o tribunal se socorra destes factos, deve fazer juntar ao processo documento que os comprove”.
Elucida Alberto dos Reis, em ensinamento que se mantém actual, que o juiz pode servir-se de factos que tenham chegado ao seu conhecimento no exercício da sua função jurisdicional, sendo que “[O] facto há-de constar de qualquer processo, acto ou peça avulsa em que o juiz tenha intervindo como tal” e “Não basta, é evidente, que o facto tenha sido alegado em processo em que o juiz tenha intervindo; é indispensável que tenha aí sido apurado e demonstrado. O documento que tem de juntar-se é certidão que comprove ter o facto sido considerado como exacto noutro processo” [Código de Processo Civil anotado, vol. III , 4.ª ed., Coimbra Editora, 1985, pp. 264 a 265].
Se o Tribunal a quo errou e não fez o uso devido desta disposição, cabia aos recorrentes evidenciá-lo, identificando com precisão o processo que invocam, concretizando a intervenção que nele terá tido o mesmo Senhor Juiz e, para além disso, indicando com rigor onde constam provados os alegados factos, ou seja, de que peça processual pode extrair-se essa conclusão.
Ora, os recorrentes nada alegam para além do que se referiu, manifestamente insuficiente para evidenciar o alegado erro de julgamento do Tribunal a quo por não ter considerado provadas essas alegações, descurando o disposto no art.º 412.º /2, do CPC.
Num parêntesis, diga-se, ainda, que a alegação do ponto não provado 12 não é um facto, mas antes uma conclusão, que só poderia ser extraída na sentença na aplicação do direito aos factos.
Por conseguinte, também nesta parte improcede a impugnação da decisão sobre a matéria de facto.
Ponto 13
Lê-se no ponto em causa o seguinte: Ao mesmo tempo, os Autores nunca aceitaram ou reconheceram que o valor dos subsídios de férias ou de natal fossem incorporados na retribuição anual.
Alegam os recorrentes que este ponto “além de verdadeiro, está em contradição com o facto 130”, onde se considera provado “Não tendo os AA. manifestado a sua vontade, a Ré, passou a retribuir os AA. 14 vezes por ano, mantendo o valor global anual (€ 14.970,00) mas passando o valor mensal para € 1.069,29.
Na sua perspectiva, há contradição, acrescendo que foi ignorado as declarações da A AA, bem como da testemunha da Ré, II, adjunta de recursos humanos da Ré, nos extractos que invoca, indicando os tempos de gravação e transcrevendo-os.
Mostram-se observados os ónus de impugnação.
A A. AA, questionada pelo ilustre mandatário dos AA respondeu o que segue:
Adv. – A senhora já nos disse aqui também, que o seu vencimento base até 2020, era 1247,50 mais os valores dos restantes complementos.
Tes.– Exato.
Adv. – Desde que foi reintegrada, que valor tem sido pago do vencimento base, e do completo do subsídio número 1 e o [00:20:00] subsídio Unimed?
Testemunha – Portanto, eu tenho 1069,29 de ordenado base, 178,58 de ss, ou seja, suplemento número 1, e 28,57 de Unimed ID.
Adv. – E a senhora assinou algum documento em que aceitou essa redução no seu salário?
Testemunha – Não.”.
Por seu turno a testemunha II foi questionada e respondeu como segue:
“Mandatário2: A Sra. II há pouco disse que estes trabalhadores nunca responderam. Por isso, a companhia manteve-os a receber 12 vezes por ano. E sabe, a companhia, que eles foram reclamar os subsídios de férias e de Natal em tribunal e que não concordam com esta teoria da divisão das 14 vezes. Onde é que está a autorização da companhia para alterar a forma de pagamento e tentar incluir um subsídio de férias e de Natal que eles estão a reclamar judicialmente? Onde é que está autorizado, isso, pelos trabalhadores?
Intérprete de II: Naquela altura, não é, ninguém quis. [00:23:00] Portanto, isto foi em fevereiro de 2019.”.
Na fundamentação da decisão sobre a matéria de facto o Tribunal a quo não se encontra justificação para não ter sido considerada provada a alegação em causa.
Não obstante, cremos não assistir razão aos recorrentes. Em primeiro lugar, não há contradição entre o ponto 13 e o facto 130. Neste último ficou provado que os AA não manifestaram a sua vontade, mas a “ Ré, passou a retribuir os AA. 14 vezes por ano, mantendo o valor global anual (€ 14.970,00) mas passando o valor mensal para € 1.069,29”, enquanto o ponto não provado consubstancia uma conclusão genérica de um facto negativo, que tem um sentido diverso, ao dizer que “os Autores nunca aceitaram ou reconheceram que o valor dos subsídios de férias ou de natal fossem incorporados na retribuição anual”. Ou seja, o facto de os AA. não terem manifestado a sua vontade, não significa necessariamente que algum ou alguns dos AA “nunca aceitaram ou reconheceram que o valor dos subsídios de férias ou de natal fossem incorporados na retribuição anual”.
Confirma essa possibilidade as declarações do autor CC, que segundo refere o Tribunal a quo na fundamentação da decisão sobre a matéria de facto, teve o sentido seguinte:
A testemunha clarificou que quando veio para Portugal “assumi que iria ter uma lei Portuguesa em que iria receber os 14 salários conforme diz a lei”. A testemunha clarificou que iria receber o mesmo valor mensal mas x´s 14meses. A testemunha foi confrontada com o contrato de trabalho em causa nos autos e referiu que manteve a sua convicção no sentido de que iria receber os 14 salários apesar de constar do contrato de trabalho que o valor a receber é anual.
Quando se apercebeu que não estava a receber os subsídios não questionou a empresa. Quanto a esta matéria a testemunha explicou que nunca colocou em questão essa situação porque teve receio da recção da empresa quanto ao seu trabalho, “entre perder o meu trabalho ou ter os meus créditos laborais preferi manter o meu trabalho”.
Ou seja, ainda que pelas razões que referiu, este autor aceitou e nunca colocou a questão à entidade empregadora.
Mais se diga que a prova invocada corrobora o facto provado 130, mas não respeita ao afirmado no ponto não provado 13. Já assinalámos as diferenças. Basta ler e interpretar com o devido rigor ambos os textos.
Por último, tratando-se de uma alegação claramente conclusiva, fazendo uma afirmação geral pela negativa, ademais desamparada de factos concretos que a ela pudessem conduzir. Ora, conforme é entendimento pacífico da jurisprudência dos tribunais superiores, mormente do Supremo Tribunal de Justiça, as conclusões apenas podem extrair-se de factos materiais, concretos e precisos que tenham sido alegados, sobre os quais tenha recaído prova que suporte o sentido dessas alegações, sendo esse juízo conclusivo formulado a jusante, na sentença, onde cabe fazer a apreciação crítica da matéria de facto provada. Dito de outro modo, só os factos materiais são susceptíveis de prova e, como tal, podem considerar-se provados. As conclusões, envolvam elas juízos valorativos ou um juízo jurídico, devem decorrer dos factos provados, não podendo elas mesmas serem objecto de prova [cfr. Acórdão de 23.9.2009, Proc. n.º 238/06.7TTBGR.S1, Bravo Serra; e, mais recentemente, reiterando igual entendimento jurisprudencial: de 19.4.2012, Proc.º 30/08.4TTLSB.L1.S1, Pinto Hespanhol; de 23/05/2012, proc.º 240/10.4TTLMG.P1.S1, Sampaio Gomes; de 29/04/2015, Proc .º 306/12.6TTCVL.C1.S1, Fernandes da Silva; de 14/01/2015, Proc.º 488/11.4TTVFR.P1.S1, Fernandes da Silva; 14/01/2015, Proc.º 497/12.6TTVRL.P1.S1, Pinto Hespanhol; todos disponíveis em http://www.dgsi.pt/jstj].
Entendimento igualmente afirmado no Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 12-03-2014, afirmando-se que “Só acontecimentos ou factos concretos podem integrar a seleção da matéria de facto relevante para a decisão, sendo, embora, de equiparar aos factos os conceitos jurídicos geralmente conhecidos e utilizados na linguagem comum, verificado que esteja um requisito: não integrar o conceito o próprio objeto do processo ou, mais rigorosa e latamente, não constituir a sua verificação, sentido, conteúdo ou limites objeto de disputa das partes” [Proc.º n.º 590/12.5TTLRA.C1.S1, Conselheiro Mário Belo Morgado, disponível em www.dgsi.pt].
Assim, as afirmações de natureza conclusiva devem ser excluídas do elenco factual a considerar, se integrarem o thema decidendum, entendendo-se como tal o conjunto de questões de natureza jurídica que integram o objeto do processo a decidir, no fundo, a componente jurídica que suporta a decisão. Daí que, sempre que um ponto da matéria de facto integre uma afirmação ou valoração de factos que se insira na análise das questões jurídicas a decidir, comportando uma resposta, ou componente de resposta àquelas questões, tal ponto da matéria de facto deve ser eliminado [Ac. STJ de 28-01-2016, Proc. nº 1715/12.6TTPRT.P1.S1, António Leones Dantas, www.dgsi.pt.].
Improcede, assim, também esta parte da impugnação da decisão sobre a matéria de facto.
Pontos 15, 16, 36 e 37
Nos pontos em causa consta o seguinte:
15. A retribuição base dos Autores AA, CC, DD, EE e FF ao longo da sua relação laboral enquanto prestada a partir da base do …, bem como os do Autor BB a partir de 1 de Novembro de 2012, data em que passou a prestar a sua atividade diretamente à Ré, primeiro como Junior CSS e, só a partir de 1 de Novembro de 2015, como CSS, tiveram os seguintes valores:
Vencimento Base CSS 2009
1 022,50 €
Complemento Nº 1 2009
125,00 €
Vencimento Base CSS 2010
1 022,50 €
Complemento Nº 1 2010
125,00 €
Vencimento Base CSS 2011
1 064,17 €
Complemento Nº 1 2011
125,00 €
Vencimento Base CSS 2012
1 105,83 €
Vencimento Base Junior CSS 2012
879,17 €
Complemento Nº 1 2012
125,00 €
Vencimento Base CSS 2013
1 147,50 €
Vencimento Base Junior CSS Janeiro a Março de 2013
937,50 €
Vencimento Base Junior CSS Abril a Dezembro de 2013
966,67 €
Complemento Nº 1 2013
145,83 €
Vencimento Base CSS 2014
1 189,17 €
Vencimento Base Junior CSS Janeiro a Março de 2014
966,67 €
Vencimento Base Junior CSS Abril a Dezembro de 2014
995,83 €
Complemento Nº 1 2014
166,67 €
Vencimento Base CSS 2015
1 218,33 €
Vencimento Base Junior CSS Janeiro a Março de 2015
995,83 €
Vencimento Base Junior CSS Abril a Dezembro de 2015
1 016,67 €
Complemento Nº 1 2015
166,67 €
Vencimento Base CSA 2016
1 037,50 €
Vencimento Base CSS 2016
1 247,50 €
Complemento Nº 1 2016
187,50 €
Vencimento Base CSS 2017
1 247,50 €
Complemento Nº 1 2017
187,50 €
Vencimento Base CSS 2018
1 247,50 €
Complemento Nº 1 2018
208,33 €
Vencimento Base CSS 2019
1 247,50 €
Complemento Nº 1 2019
208,33 €
Complemento Base Supervisor 2009-2019
208,33 €
16. Todos os valores da tabela supra são ilíquidos.
36. A retribuição base dos AA., GG e HH tiveram os seguintes valores:
Vencimento Base CSS 2009 1 022,50 €
Complemento Nº 1 2009 125,00 €
Vencimento Base CSS 2010 1 022,50 €
Complemento Nº 1 2010 125,00 €
Vencimento Base CSS 2011 1 064,17 €
Complemento Nº 1 2011 125,00 €
Vencimento Base CSS 2012 1 105,83 €
Vencimento Base Junior CSS 2012 879,17 €
Complemento Nº 1 2012 125,00 €
Vencimento Base CSS 2013 1 147,50 €
Vencimento Base Junior CSS Janeiro a Março de 2013 937,50 €
Vencimento Base Junior CSS Abril a Dezembro de 2013 966,67 €
Complemento Nº 1 2013 145,83 €
Vencimento Base CSS 2014 1 189,17 €
Vencimento Base Junior CSS Janeiro a Março de 2014 966,67 €
Vencimento Base Junior CSS Abril a Dezembro de 2014 995,83 €
Complemento Nº 1 2014 166,67 €
Vencimento Base CSS 2015 1 218,33 €
Vencimento Base Junior CSS Janeiro a Março de 2015 995,83 €
Vencimento Base Junior CSS Abril a Dezembro de 2015 1 016,67 €
Complemento Nº 1 2015 166,67 €
Vencimento Base CSA 2016 1 037,50 €
Vencimento Base CSS 2016 1 247,50 €
Complemento Nº 1 2016 187,50 €
Vencimento Base CSS 2017 1 247,50 €
Complemento Nº 1 2017 187,50 €
Vencimento Base CSS 2018 1 247,50 €
Complemento Nº 1 2018 208,33 €
Vencimento Base CSS 2019 1 247,50 €
Complemento Nº 1 2019 208,33 €
37. Todos os valores da tabela supra são valores ilíquidos.
Alegam os recorrentes, singelamente, que estes pontos não foram contestados “de forma articulada pela Ré” e “respeitam aos valores dos vencimentos base e complemento CSS ao longo da relação laboral da R e podem ser verificados pelos recibos de vencimento dos AA juntos com a PI (docs. 11 a 17)”.
Contrapõe a Recorrida que “a remuneração dos Apelantes que foi confirmada pela Apelada (impugnando a versão dos factos alegada na petição inicial) e que resulta dos recibos de vencimento dos Apelantes é a que consta dos factos provados 140. a 148. e 196. a 197., não se podendo por isso dar como provados, como pretendem os Apelantes, os factos não provados 15, 16, 36 e 37”, sendo que os “Apelantes não pediram a alteração dos factos provados 140. a 148. e 196. a 197., os quais transitaram em julgado, pelo que não se podem dar como provados factos que entram em direta contradição com estes, devendo, por isso, ser improcedente o pedido dos Apelantes”.
Em primeiro lugar, não é verdade que essa matéria não tenha sido contestada pela Ré. A Ré não só impugnou genericamente (art.º 4.º da Pi), como para além disso, sob o título “da verdadeira retribuição média dos AA”, veio apresentar a sua versão, constando a mesma das contestações em quadros apresentados por Autor, p. ex. no que concerne à Autora AA, a partir do artigo 193.º desse articulado. Como refere a recorrente, essa sua versão deu origem aos factos provados 140 a 148 e 196 a 197, que tão pouco oram impugnados.
Em segundo lugar, não basta aos recorrentes dizer que “podem ser verificados pelos recibos de vencimento dos AA juntos com a PI (docs. 11 a 17)”, antes lhe cumprindo indicar com precisão quais os documentos e formular juízos críticos para evidenciar o alegado desacerto da decisão impugnada. Ademais, faz-se notar, quando para além dos documentos juntos com a pi, apresentou depois 9 requerimentos para juntar documentos, perfazendo mais de uma centena de folhas.
O direito ao recurso não visa conceder à parte um segundo julgamento da causa, mas apenas permitir a discussão sobre determinados pontos concretos, que na perspectiva do recorrente foram incorrectamente mal julgados, para tanto sendo necessário que se enunciem os fundamentos que sustentam esse entendimento, devendo os mesmos consistir na enunciação de verdadeiras questões, que lhe compete indicar e sustentar, cujas respostas sejam susceptíveis de conduzir à alteração da decisão recorrida. Em poucas palavras, o recorrente deve expor ao tribunal ad quem as razões da sua discordância, procurando convencer da sua pertinência, a fim de que este tribunal de debruce sobre elas e decida se procedem ou não.
Só por si, tal é fundamento para rejeição da apreciação do recurso nesta parte.
Mas ainda que assim não se entenda, como bem refere a recorrida e já mencionámos, os factos provados 140 a 148 e 196 a 197, respeitam a esta matéria, não foram impugnados e, logo, não poderia agora dar-se provados estes pontos em manifesta contradição com aqueles.
Assim, também nesta parte improcede a impugnação da decisão sobre a matéria de facto.
Pontos 17 a 22
Nos pontos não provados 17 a 22, consta o seguinte:
17. A Ré vem a liquidar todas as componentes salariais de forma unitária quanto a impostos e contribuições para a segurança social.
18. Bem como releva referir que a Ré não tem uma atuação constante na aplicação da lei tributária e sistema de previdência social que aplica aos seus trabalhadores.
19. Por vezes descontando todas as quantias sob o regime tributário e de previdência ....
20. Outras vezes, líquida as quantias devidas a título tributário sob o regime ..., e realizando as contribuições para o sistema de Segurança Social português.
21. E outras, tudo liquidando sob o regime português.
22. Nesse período, mais concretamente nos meses de Setembro, Novembro e Dezembro de 2019 a Ré, deduziu do seu pagamento ilíquido montantes a título de unpaid, no total de €1.512,07 (mil quinhentos e doze euros e sete cêntimos).
Alegam os AA. simplesmente o seguinte: “[78] O mesmo dizer sobre os pontos 17 a 22, que são diretamente verificáveis pelos recibos de vencimento dos AA. [79]. Motivo pelo qual deverão estes pontos ser dados como provados”.
Contrapõe a recorrida que “por se tratar de um mero ataque à Apelada, sem qualquer base que o suporte ou reflexo nos pedidos formulados na petição inicial, e por estar em conformidade com o facto provado 139., transitado em julgado, deve o pedido quanto aos factos não provados 17 a 22 ser improcedente”.
Remetendo-se para as considerações iniciais sobre os ónus de impugnação, bem assim para as que imediatamente antecedem a esse propósito, por aqui terem inteira aplicação, verificando-se a falta de indicação dos meios de prova concretos, mas também da formulação de juízos críticos para sustentar a pretendida alteração, rejeita-se a apreciação da impugnação nesta parte.
Pontos 23
Lê-se no ponto não provado em causa o que segue: “Os Autores, ao longo do tempo de serviço, não receberam formação”.
Alegam os AA que este ponto resulta em contradição com a alteração requerida aqui ao ponto 152 dos factos provados, por isso devendo ser dada como provada.
Assim, tendo sido rejeitada a apreciação da impugnação quanto aos factos provados e, logo, mantendo-se o que consta provado no facto 152, necessariamente sucumbe o este fundamento.
Daí que, também nesta parte improceda a impugnação da decisão sobre a matéria de facto.
Pontos 24 a 27
Nos pontos não provados 24 a 27, lê-se o seguinte:
24. A R. insiste em que os AA. Reintegrados auferem o valor inferior à sua normal retribuição, como se estes tivessem assinado a adenda que deu origem ao seu despedimento.
25. A título de retribuições intercalares e nos meses que se deram desde a reintegração dos AA. (exceto a AA. EE) foram liquidados os seguintes montantes ilíquidos em cada um desses meses: €1.069,29 (Basic) + €178,58 (CSS Allowance), ambos ilíquidos.
26. Num total de €1247,87.
27. Quando deveria ter liquidado o valor retributivo de €1489,16 mensais.

Alegam os AA que estes pontos “deverão ser dados como provados porquanto, foi a testemunha arrolada pela R, II, sua “deputy”/adjunta de Recursos Humanos que confessou tais factos”.
Argumentam que “a testemunha afirmou perentoriamente que, quanto ao “roster”/organização de trabalho, não aplica aos AA reintegrados o mesmo (seria uma vantagem para os AA) mas, a redução do salário, que já convém, aplica o acordo de empresa que prevê valores inferiores de remuneração, iguais aos que a adenda que os AA recusaram assinar e levou ao seu despedimento coletivo. 86. Isto tudo, quando o acordo de empresa referido, celebrado entre a R e o STTAMP não se aplica aos AA, sindicalizados num outro sindicado, o SNPVAC”.
Invocam um extracto desse testemunho, indicando os tempos de gravação e procedendo à sua transcrição.
Entende-se que foram observados os ónus de impugnação.
Contrapõe a recorrida, no essencial, que os recorrentes distorcem o testemunho, pois a testemunha “declarou que considerando que 99% da tripulação estava a receber o pagamento em 14 vezes, que os Apelantes reclamavam o pagamento de subsídios e que não se opuseram ao pagamento desta forma, então começaram a pagar em 14 vezes”, fazendo notar que “a pretendida alteração se baseia na transcrição da pergunta do Ilustre Mandatário dos Apelantes e não na resposta da testemunha! Assim, nem sequer existe suporte probatório da pretendida alteração...”.
O extracto invocado e transcrito pelos recorrentes é o que segue:
- “Mandatário2: Eu começava exatamente já por esta questão. Há pouco a minhas instâncias a Sra. II disse que estavam a pagar o valor 14 meses porque consideravam que o acordo da empresa assinado pelo STTAMP se aplica a estes trabalhadores, uma vez que 99 por cento dos trabalhadores já estavam sindicalizados no STTAMP. Então, por que é que para reduzir o salário se aplica o acordo da empresa, [01:26:00] mas para dar o roster de cinco, três já não se aplica, só porque eles são sindicalizados no SNPVAC?
Intérprete: A senhora já percebe a pergunta antes de eu a tornar equivalente.
Intérprete de II: São dois assuntos totalmente separados. Não se pode (Impercetível). É totalmente diferente. O padrão, aqui o esquema do cinco, três é um custo significativo para a empresa. E como foi falado com a STTAMP Union, o SNPVAC é uma questão totalmente (Impercetível).
Pois bem, a referir, desde já, que a impugnação conjunta destes factos é feita em bloco, não havendo um fio condutor entre todos eles, o que é fundamento suficiente para rejeição da sua apreciação. Basta confrontar os respectivos conteúdos, sendo irrelevante que o meio de prova seja comum, já que para se considerar um facto provado á que valorar conjuntamente toda a prova produzida, não bastando atender a um meio de prova isolado.
Em segundo lugar, para repor o rigor das coisas, a testemunha não “confessa”, nem podia confessar no sentido jurídico do termo, por não ser representante legal da Ré. Quanto muito poderia produzir declarações suscetíveis de demonstrar a matéria dos pontos em causa.
Mas como faz notar a recorrida, nem é esse o caso, dado que a testemunha não confirma sequer toda a exposição do ilustre mandatário – que não é testemunha e, logo, obviamente, nada contribui para a produção de prova – antes afirmando que são assuntos diferentes, pelas razões que explica. Acresce, e sublinha-se, que nem a questão colocada à testemunha, nem tão pouco a resposta desta, abarca as diferentes matérias dos pontos não provados, designadamente, os valores dos montantes liquidados “em cada um desses meses” [ponto 25), o total das mesmas [ponto 26] e o que deveria ter sido liquidado [ponto 27].
Assim, também aqui improcede a impugnação da decisão sobre a matéria de facto.
Ponto 29
Consta no ponto não provado acima indicado, o seguinte: “Acontece que, desde a sua reintegração após despedimento ilícito da R. esta não lhe atribuí tal organização do seu tempo de trabalho”.
Alegam os AA o seguinte:
«Como se lê supra, esta admite que a R. se recusa a atribuir o esquema de planeamento mensal 5/3/5/3 que tinham anteriormente.
91. Mais, verifica-se que o mesmo ainda existe.
92. Concluindo-se por uma prática de assédio laboral da R. Por um lado diz que não atribui o planeamento nesses moldes porque os AA não se encontram ao abrigo do AE que esta celebrou com o STTAMP mas, para reduzir o seu salário já se usa de tal IRCT.
93. E tal só ocorreu após a reintegração dos AA, demonstrando-se claramente que a R. está a praticar uma manobra de abuso laboral sobre estes trabalhadores.
94. Devendo o mesmo ser agora dado como provado».
Contrapõe a Recorrida que os recorrentes não concretizam em que meios de prova sustentam a sua pretensão, nos termos da alínea b) do número 1 do artigo 640.º do CPC, pelo que deve este pedido ser improcedente.
Tem razão a recorrida. A remissão para o que “se lê supra” não consubstancia a indicação de meio de prova concreto para justificar a pretendida alteração.
O mais que consta alegado são considerações dos recorrentes, afirmando a sua discordância e defendendo a sua posição com base na sua convicção.
Remetendo-se, mais uma vez, para as considerações sobre o cumprimento dos ónus de impugnação, verifica-se que não foram observados. Não há indicação dos meios de prova concretos para justificar a pretendida alteração e, logo, nem tão pouco um juízo crítico com base em prova indicada.
Assim, nesta parte rejeita-se a apreciação da impugnação da decisão sobre a matéria de facto.
Pontos 30 e 31
Nos pontos em causa, lê-se:
30. Atribuindo o seu planeamento mensal em total anarquia, sem qualquer lógica ou padrão.
31. Causando total incerteza na organização do seu tempo.
Alegam os recorrentes o que segue: “E, sendo este dado como provado, também deverão ser dados como provados os pontos 30 e 31 por estarem diretamente relacionados”.
Em suma, a pretendida alteração dependia da alteração do ponto anterior. Não interessando sequer saber se essa fundamentação era suficiente, mantendo-se inalterado o ponto 29 não provado, atenta a construção dos recorrentes, necessariamente sucumbe a impugnação destes dois pontos.
II.2.2 Impugnação da matéria de facto visando o aditamento de factos
Os AA pretendem aditar novos factos, nomeadamente, os seguintes:
i) «A AA. AA participou em diversas greves, tendo contestado a falta de pagamento de subsídios de férias e de natal, sem obter resposta da Ré»;
ii) «Os AA gozam de um padrão de organização do tempo de trabalho de 5/3/5/3 ou 5/3/5/2 desde que passaram a prestar a sua atividade na R.»;
iii) «Os AA nunca aceitaram ou acordaram que o seu “salário anual bruto de base” (“basic gross anual salary” na redação em inglês) fosse pago em 14 meses ou vezes».
Para o primeiro facto invocam um extracto das declarações de parte da autora AA, indicando os tempos de gravação em que encontra e transcrevendo-o.
Alegam que claro que “a AA declarou ter tentado falar com a R sobre o assunto subsídios de férias e de natal, tendo sido a R que ignorou a AA, bem como fez parte de diversas greves que visavam este tema, devendo ser agora admitida a junção à matéria de facto provada”.
Contrapõe a recorrida “que não se consegue alcançar em que parte da Petição Inicial estes factos foram alegados, [..] e os Apelantes não concretizam em que meios de prova sustentam a sua pretensão, nos termos da alínea b) do número 1 do artigo 640.º do CPC pelo que deve a pretensão dos Apelantes ser indeferida”.
Para o segundo estribam-se noutro extracto das declarações da mesma Autora e, ainda, de um extracto das declarações de parte do autor CC, em qualquer dos casos indicando os tempos de gravação e transcrevendo-os.
Opõe a Recorrida, no essencial, que “também quanto a esta pretensão caberá referir que não foram alegados na petição inicial quaisquer factos anteriores ao acordo de 2016, nem estes constam dos temas de prova, por isso o que resulta insofismável da prova produzida é que desde 2016, e devido ao acordo de base celebrado com os representantes dos trabalhadores, foi introduzido o padrão 5/3/5/3 com um prazo de validade claro de 5 anos. (factos provados 165. a 170. e doc. 16 junto com a contestação). Visto que não foram alegados na petição inicial quaisquer factos relacionados com o padrão de horário dos Apelantes anterior a 2016, a Apelada não explicou (nem tinha de o fazer) que antes dessa altura vigorava um acordo de base (que veio a ser substituído pelo de 2016) que previa um padrão 5/2 5/3, e antes desse acordo existia um outro”.
Alegam que “como se vê, o horário foi sempre 5-3-5-3 ou, num momento anterior, terá até sido 5-3-5-2. Bem como se verifica que a R., após o despedimento coletivo que aceitou como ilícito em sede judicial, passou a aplicar exclusivamente aos Tripulantes que aceitaram o AE celebrado com o STTAMP após tal despedimento. Como tal, deverá agora ser aditado o facto supra à matéria de facto provada”.
No que respeita ao terceiro facto, invocam as “transcrições já expostas”, dizendo pretender aditá-lo.
Responde a recorrida que mas quanto a este alegado facto [art. 91]“já se pronunciou supra sob os números 30. a 41., para onde se remete por uma questão de economia processual”.
Passando à apreciação, cabe começar por indagar se foram observados os ónus de impugnação, para tanto importando assinalar que os três factos cujo aditamento de pretende respeitam a realidades diversas e sem conexão entre si. Basta confrontá-los para se extrair essa conclusão.
Quanto aos primeiros dois, os recorrentes indicam individualizadamente a prova com precisão e formulam, ainda que minimamente, juízos, também individualizados, para justificarem os pretendidos aditamentos. Entende-se, pois, que se mostram cumpridos com suficiência os ónus de impugnação.
Mas o mesmo já não é de entender quanto ao terceiro facto: os recorrentes não indicam os concretos meios de prova que justificam o pretendido aditamento, antes remetendo para três extractos das declarações de parte que indicaram para os anteriores pontos que, repete-se, não tem conexão entre si, nem tão pouco com este último; e, mais, não formulam qualquer juízo crítico para justificar a pretendida alteração com base naquela prova. Por conseguinte, no rigor das coisas, os recorrentes pretendem que este Tribunal ad quem se debruce sobre esses três extractos de declarações de parte, para num primeiro passo destrinçar o que em cada um deles é referido que possa ter a ver com esta matéria - necessariamente na nossa perspectiva, dado os recorrentes não terem indicado a sua -, e num segundo, que os conjugue e decida ser tal suficiente, ou não, para aditar o facto.
Dito de outro modo, o que os recorrentes pretendem traduz-se num segundo julgamento dessa matéria, já não na reapreciação da prova indicada e da ponderação de argumentos concretos dos recorrentes, estribados em prova indicada.
Nesta consideração, entende-se rejeitar a impugnação na parte em que visa o aditamento do terceiro facto acima mencionado.
Avançando.
Importa começar por referir que os factos cujo aditamento de pretende não foram alegados pelos AA, pelo que só poderiam ter sido considerados provados nos termos do disposto no art.º 72.º do CPT, que na redacção introduzida pela Lei n.º 107/2019, de 09 de Setembro, no que aqui releva, estabelece o seguinte:
1 - Sem prejuízo do disposto no n.º 2 do artigo 5.º do Código de Processo Civil, se no decurso da produção da prova surgirem factos essenciais que, embora não articulados, o tribunal considere relevantes para a boa decisão da causa, deve o juiz, na medida do necessário para o apuramento da verdade material, ampliar os temas da prova enunciados no despacho mencionado no artigo 596.º do Código de Processo Civil ou, não o havendo, tomá-los em consideração na decisão, desde que sobre eles tenha incidido discussão.
2 - Se os temas da prova forem ampliados nos termos do número anterior, podem as partes indicar as respetivas provas, respeitando os limites estabelecidos para a prova testemunhal; as provas são requeridas imediatamente ou, em caso de reconhecida impossibilidade, no prazo de cinco dias.
[..]»
Por seu turno, estabelece o art.º 5.º do CPC, também na parte que aqui releva, o seguinte:
1 - Às partes cabe alegar os factos essenciais que constituem a causa de pedir e aqueles em que se baseiam as exceções invocadas.
2 - Além dos factos articulados pelas partes, são ainda considerados pelo juiz:
a) Os factos instrumentais que resultem da instrução da causa;
b) Os factos que sejam complemento ou concretização dos que as partes hajam alegado e resultem da instrução da causa, desde que sobre eles tenham tido a possibilidade de se pronunciar;
[..]».
Decorre destes normativos, que em processo laboral, a matéria de facto relevante para a decisão de mérito deve também considerar os factos que, embora não articulados, o tribunal tenha apurado nos termos do art.º 72º, n.ºs 1 e 2, do Código de Processo do Trabalho.
Nem o tribunal a quo faz qualquer referência na decisão da matéria de facto sobre a eventual discussão a propósito dos dois factos em apreço, nos termos e para os efeitos do artigo 72.º do Código de Processo do Trabalho, nem tão pouco os recorrentes aludem sequer àquele normativo, designadamente, para invocar a verificação dos pressupostos aí previstos para dele se fazer uso e a eventual desconsideração pelo Tribunal a quo.
Vem sendo entendido, nomeadamente por esta Relação, que a segunda instância não pode fazer uso do disposto no art.º 72º do CPT, quando estejam em causa factos essenciais, por não poder ser dado cumprimento ao nº2 do mesmo, mas que tal óbice já não se perfila, por efeito da remissão para o disposto do disposto nas alíneas a) e b), do n.º2, do art.º 5.º, do CPC, quando estejam em causa factos instrumentais ou concretizadores. Os primeiros poderão ser considerados desde que tenham resultado da instrução da causa –alínea a) do CPC; os segundos, quando as partes tenham tido a possibilidade de se pronunciar, ainda que só no recurso.
Os factos essenciais são os que fundamentam o direito invocado pelo autor, o pedido reconvencional deduzido pelo réu ou as excepções por este apresentadas.
Entende-se por factos instrumentais, aqueles “cuja função é apenas probatória e não substanciam ou preenchem as pretensões jurídico-materiais do autor ou réu. Da prova dos factos instrumentais infere-se a existência dos factos principais, pois, eles (factos instrumentais) não constituem condicionantes directas da decisão. Da sua prova pode inferir-se a prova dos factos principais” [J.P. Remédio Marques, Acção Declarativa à Luz do Código Revisto, 3.ª Edição, Coimbra Editora, 2011, nota 2, a p. 235].
São factos concretizadores aqueles que densificam e pormenorizam as ocorrências da vida real exposta pelas partes e complementares os que servem para aditar ou completar essas mesmas ocorrências [J.P. Remédio Marques, Op. cit, p. 622, notas 4 e 5].
Quanto ao primeiro facto cujo aditamento é pretendido, na nossa perspectiva, concretizador, no extracto indicado das declarações de parte da AA AA consta o seguinte:
-« “Advogado – Ó senhora AA, aqui várias vezes falou de não sabia muito bem quando é que tinha manifestado à empresa que não concordava, não só com esta questão do pagamento dos subsídios de férias e de natal, mas outras coisas, mas não sabia precisar de quando é que foi, quando não foi. Mas os tripulantes, não fizeram várias greves ao longos dos anos aqui no Aeroporto ...?
Testemunha – Eu fui uma delas.
Advogado – Não foram despedidos colegas que regularmente fizeram greve e até aqui neste tribunal tiveram outros processos?
Testemunha – Sim.
Advogado – E já foi declarada a ré, por ter feito despedimentos ilícitos contrários à constituição por ter despedido tripulantes que regularmente fizeram greve?
Testemunha – Sim.
Advogado – A senhora participou nessas greves?
Testemunha – Participei.
Advogado – Porquê que participou nessas greves?
Testemunha –Porque não achei correto o que eles estavam a fazer.
Advogado – O que é que eles estavam a fazer?
Testemunha – Eles queriam, lá está a fazer os novos contratos.
Advogado – O que é que tinham esses novos contratos de diferente?
Testemunha – Tinham reduções nos salários, e pronto.
Advogado – Abrangiam os subsídios de férias e de natal?
Testemunha – Não abrangia.
Advogado – Não abrangia? Não queriam que vocês renunciassem aos créditos?
Testemunha – Exatamente.
Advogado – E em que anos ocorreram estas greves?
Testemunha – 2018, se não me engano.
Advogado – E já tinha havido uma greve antes de 2018?
Testemunha – Já tinha havido.
Advogado – E em que ano? 15-16-17? Aproximadamente.
Testemunha – Eu acho que foi 16, mas não tenho a certeza.
Advogado – Desculpe?
Testemunha – 16 ou 17 não tenho a certeza.
Advogado – E a senhora participou nessas greves?
Testemunha – Fiz, fiz essas greves.
(…)
Advogado – Então a senhora ao longo dos anos, disse a final à empresa que não concordava com nada disto? Então o que me está a dizer aqui há pouco não é verdade. A verdade é que a senhora manifestou-se.
Testemunha – Eu manifestei-me. O que eu estava a dizer é que em relação às minhas perguntas que são feitas através da App deles, muitas vezes nem há respostas. Portanto, quem é que nós nos vamos virar para perguntar, não é? A não ser aos colegas ou sindicatos.”.
Como bem se vê, a A. foi sujeita a uma sequência de questões formuladas conclusivamente, a parte das quais respondeu apenas afirmativamente, não se ficando a saber em que greves concretamente participou, isto é, quando e quais as razões que a motivavam, nem tão pouco como e quando “contestou” junto da Ré a falta de pagamento de subsídios de férias e de Natal. Mais, se porventura confrontou a Ré com essa discordância, também nada disse sobre se esta lhe deu resposta, ou não.
Ora, como elucidam Antunes Varela, J. Miguel Bezerra e Sampaio e Nora, para que um facto se considere provado é necessário que, à luz de critérios de razoabilidade, se crie no espírito do julgador um estado de convicção, assente na certeza relativa do facto. A prova “assenta na certeza subjectiva da realidade do facto, ou seja, no (alto) grau de probabilidade de verificação do facto, suficiente para as necessidades práticas da vida” [Manual de Processo Civil, 2.ª Edição, Coimbra Editora, Coimbra, 1985, p. 436].
Essa certeza subjectiva, com alto grau de probabilidade, há-de resultar da conjugação de todos os meios de prova produzidos sobre um mesmo facto, ponderando-se a coerência que exista num determinado sentido e aferindo-se esse resultado convergente em termos de razoabilidade e lógica. Se pelo contrário, existir insuficiência, contradição ou incoerência entre os meios de prova produzidos, ou mesmo se o sentido da prova produzida se apresentar como irrazoável ou ilógico, então haverá uma dúvida séria e incontornável quanto à probabilidade dos factos em causa serem certos, obstando a que se considere o facto provado.
As declarações de parte, desamparadas de qualquer outra prova e, sublinha-se, imprecisas por falta de concretização, não se nos afiguram suficientes para considerar provado o primeiro dos pontos provados.
Assim, nesta parte improcede a pretensão dos recorrentes.
Quanto ao segundo facto cujo aditamento é pretendido - «Os AA gozam de um padrão de organização do tempo de trabalho de 5/3/5/3 ou 5/3/5/2 desde que passaram a prestar a sua atividade na R.» - importa começar por relembrar que os autores pedem a condenação da Ré a que seja “ reconhecido que os autores operam num “padrão de escalas” 5/3/5/3 (cinco dias de trabalho por cada três dias de folga)”.
E, para sustentar esse pedido, alegaram na PI o seguinte:
287.º Os Autores AA, BB, CC e EE gozavamde uma organização do tempo de trabalho/”padrão de escalas” (que se faz por turnos) na modalidade 5/3/5/3.
288.º Ou seja, trabalhavam 5 dias, tendo 3 dias de folga e assim sucessivamente.
289.º Acontece que, desde a sua reintegração após despedimento ilícito da R. esta não lhe atribuí tal organização do seu tempo de trabalho.
290.º Atribuindo o seu planeamento mensal em total anarquia, sem qualquer lógica ou padrão.
291º. Causando total incerteza na organização do seu tempo.
292.º Além da óbvia disrupção daquele que é um direito adquirido dos AA aqui mencionados, é também tal uma disrupção grave da sua vida pessoal e familiar.
293.º. Este horário havia sido atribuído por acordo entre os AA. e R. em adenda assinada no ano de 2016.
294.º. Bem como, no AE celebrado pela R. e o STTAMP (pelo qual os AA. não se encontram abrangidos) é esse formato de organização de trabalho/”padrão de escalas” que aí consta plasmado a ponto 6.2 (doc. 10 já junto).
Como bem se percebe, não foi alegado pelos AA que prestassem trabalho de acordo com um “ padrão de organização do tempo de trabalho de 5/3/5/3 ou 5/3/5/2 desde que passaram a prestar a sua atividade na R”, mas sim que “Este horário havia sido atribuído por acordo entre os AA. e R. em adenda assinada no ano de 2016”, que é uma realidade diferente.
A Recorrida tem razão, quando vem dizer que não foram alegados na petição inicial quaisquer factos relacionados com o padrão de horário dos Apelantes anterior a 2016 e, logo, que não explicou (nem tinha de o fazer) que antes dessa altura vigorava um acordo de base (que veio a ser substituído pelo de 2016) que previa um padrão 5/2 5/3, e antes desse acordo existia um outro.
Está-se perante factos essenciais, visto visarem sustentar o pedido acima referido. Logo, não tendo sido articulados, só poderiam ser considerados provados na primeira instância com observância do disposto no art.º 72.º 1 e 2, do CPT, facultando-se à R a possibilidade de exercer o contraditório e produzir prova, estando vedado a esta instância, conforme se explicou, a possibilidade de os levar em consideração.
Assim, também quanto a este ponto improcede a impugnação da decisão sobre a matéria de facto.
II.3 MOTIVAÇÃO DE DIREITO
Os recorrentes insurgem-se contra a sentença, defendendo que o Tribunal a quo errou na aplicação do direito aos factos “quanto ao tema dos subsídios de férias e de natal; Da indemnização pela violação do direito a férias; Do tempo de trabalho no padrão de 5/3; Do valor da retribuição dos AA.; Das diferenças salariais devidas aos AA. AA, BB e CC após a sua reintegração” [conclusões f a K].
II.3.1 Quanto à primeira questão – subsídios de férias e de Natal -, começando por atentar na fundamentação da sentença, o Tribunal a quo pronunciou-se, como segue:
-[..]
II- Do direito a receber os subsídios de férias e de Natal:
Em primeiro lugar diga-se que os períodos temporais em causa para cada um dos trabalhadores são os seguintes:
-AA de 2010 a 2020;
- BB de 2011 a 2020;
- CC de 2010 a 2020;
-DD de 2010 a 2019;
-EE de 2010 a 2020;
- FF de 2010 a 2020;
- GG de 2015 a 2019;
- HH de 2017 a 2019.
Como resulta dos respectivos articulados a primeira questão a decidir é a lei aplicável ao caso concreto.
A nossa análise tem sempre como pressuposto que só está em discussão no caso concreto os direitos dos autores até Fevereiro de 2019. A partir dessa data é pacífico que a ré passou a adoptar a legislação Portuguesa pelo que nenhuma questão se coloca (quer quanto à lei aplicável, quer quanto aos pagamentos dos subsídios).
A ré é uma pessoa colectiva com sede na ... e os autores têm domicilio em Portugal. O Regulamento (CE) n.º 593/2008 é aplicável às relações laborais que têm pontos de conexão com dois países da União.
O art. 3º, n.º 1 do referido diploma refere que “o contrato rege-se pela lei escolhida pelas partes. A escolha deve ser expressa ou resultar de forma clara das disposições do contrato, ou das circunstâncias do caso. Mediante a sua escolha, as partes podem designar a lei aplicável à totalidade ou apenas a parte do contrato.”
Por sua vez o art. 8º consagra que, “1. O contrato individual de trabalho é regulado pela lei escolhida pelas partes nos termos do artigo 3.º. Esta escolha da lei não pode, porém, ter como consequência privar o trabalhador da protecção que lhe proporcionam as disposições não derrogáveis por acordo, ao abrigo da lei que, na falta de escolha, seria aplicável nos termos dos n.os 2, 3 e 4 do presente artigo.
2. Se a lei aplicável ao contrato individual de trabalho não tiver sido escolhida pelas partes, o contrato é regulado pela lei do país em que o trabalhador presta habitualmente o seu trabalho em execução do contrato ou, na sua falta, a partir do qual o trabalhador presta habitualmente o seu trabalho em execução do contrato. Não se considera que o país onde o trabalhador presta habitualmente o seu trabalho mude quando o trabalhador estiver temporariamente empregado noutro país.
3. Se não for possível determinar a lei aplicável nos termos do n.o 2, o contrato é regulado pela lei do país onde se situa o estabelecimento que contratou o trabalhador
4. Se resultar do conjunto das circunstâncias que o contrato apresenta uma conexão mais estreita com um país diferente do indicado nos n.ºs 2 ou 3, é aplicável a lei desse outro país.”
No caso dos autos provou-se que as partes acordaram na aplicabilidade da lei Irlandesa pelo que esta é a lei vigente tendo em conta o disposto no mencionado diploma legal.
Como resulta da referida norma e tem sido abordado por larga jurisprudência dos nossos Tribunais, a escolha das partes não pode privar o trabalhador da proteção que lhe proporcionam as disposições não derrogáveis por acordo, ao abrigo da lei que, na falta de escolha, seria aplicável.
No caso concreto, considerando o que ficou provado quanto ao local onde os autores exercem a sua prestação laboral, temos como certo que a lei é a Portuguesa.
Nos pontos 27 e 32 do acórdão de 15/7/2021 proferido no processo DG e EH contra SC Gruber Logistics SRL e Sindicatul Lucrãtorilor din Transporturi contra SC Samidani Trans SRL, processos apensos C-152/20 e C-218/20, ECLI:EU:C:2021:600) o Tribunal Europeu decidiu que “a aplicação correta do artigo 8.º do Regulamento Roma I implica, em consequência, num primeiro momento, que o órgão jurisdicional nacional identifique a lei que teria sido aplicável na falta de escolha e determine, segundo esta, as regras não derrogáveis por acordo e, num segundo momento, que esse órgão jurisdicional compare o nível de proteção de que beneficia o trabalhador por força dessas regras com o previsto pela lei escolhida pelas partes. Se o nível previsto pelas referidas regras assegurar uma melhor proteção, há que aplicar essas mesmas regras (…) o artigo 8.º, n.º 1, do Regulamento Roma I deve ser interpretado no sentido de que, quando a lei que rege o contrato individual de trabalho tiver sido escolhida pelas partes nesse contrato, e seja diferente da aplicável por força dos n.os 2, 3 ou 4 deste artigo, há que excluir a aplicação desta última, com exceção das «disposições não derrogáveis por acordo» por força da mesma, na aceção do artigo 8.º, n.º 1, deste regulamento”.
Destarte, teremos que analisar se, no caso concreto, foi violada norma inderrogável portuguesa quanto aos aludidos subsídios de férias de Natal.
O n.º 4 do art. 3º do Código do Trabalho consagra que “as normas legais reguladoras de contrato de trabalho só podem ser afastadas por contrato individual que estabeleça condições mais favoráveis para o trabalhador, se delas não resultar o contrário”.
Os subsídios de férias e de Natal estão previstos nos artigos 263º e 264º do Código do Trabalho e a sua origem remonta ao ano de 1972. Na altura foi pago como uma gratificação de Natal aos funcionários públicos com carácter excepcional tendo depois passado a assumir carácter geral e obrigatório.
Não há grandes dúvidas de que se tratam de normas inderrogáveis. A questão é a de saber se o modo de pagamento escolhido pela ré contraria estas normas, ou seja, se existe um prejuízo dos trabalhadores com a forma de pagamento escolhida pela ré caso em que será de determinar o pagamento aos autores de todas as quantias reclamadas referentes ao período temporal supra descrito.
Ora, para compreendermos de forma profunda o caso concreto temos que analisar o contexto laboral dos autores e da ré.
A realidade histórica diz-nos que a ré adaptou o seu procedimento no que respeita ao processamento de vencimentos ao ordenamento jurídico português. Fê-lo a partir de 2019 e da seguinte forma: deu a opção aos trabalhadores de escolherem entre receberem os subsídios em duodécimos ou receberem os subsídios na forma contemplada na lei em termos gerais (pagando dois salários, um em Junho e o outro em Dezembro).
Esta possibilidade de pagamento em duodécimos está consagrada no artigo 264º, n.º 3 e 278º do Código do Trabalho e é aceite a nível jurisprudencial e doutrinal. No caso concreto, repare-se, a ré adaptou o seu procedimento à legislação portuguesa, mas não adicionou mais dois salários ao montante anual auferido pelos trabalhadores. Pelo contrário, em relação aos trabalhadores que não pretendiam receber em duodécimos a ré retirou esse valor dos respectivos salários e pagou-o nas datas legais previstas para os respectivos subsídios.
Não existiu qualquer aumento salarial.
Ora, se a ré tivesse assumido idêntico procedimento quando os autores começaram a exercer funções em Portugal certamente que a presente discussão não se colocava. De resto, para a ré seria fácil e barato fazer em 2009 o que veio a fazer em 2019. Não o fez, contudo.
Quer dizer, o procedimento respeitante ao processamento de salários da ré fez com que os autores, durante o período temporal ora em análise, não tivessem a possibilidade de receber os subsídios autonomamente. Mas, pergunta-se, isto representa uma derrogação das invocadas normas 263º e 264º do Código do Trabalho? Pensamos que não.
A matéria de facto apurada nos autos permite afirmar que os autores sabiam muito bem o que vinham ganhar para Portugal. É do conhecimento geral que Portugal tem um custo de vida menor do que quase todos os países europeus e, em especial, a .... Por exemplo, a cidade do Porto está graduada em 2022 no lugar 79º em termos de custo e vida de cidades europeias (cfr. https://www.expatistan.com/pt).
Outrossim, o salário mínimo na ... em 2022 foi de €1650,00.
Posto isto, custa muito acreditar (e nós não acreditamos) que os autores estivessem convencidos de que viriam para Portugal ganhar mais do que ganhavam na ... ou em outros países europeus e se tivessem conformado com essa putativa supressão dos seus direitos durante quase 10 anos e sem que, em algum momento, ou de qualquer forma, tivessem abordado a ré no sentido de mostrarem o descontentamento.
Os factos dados como provados permitem afirmar que os autores sabiam que o valor acordado para os salários já contemplava os subsídios de férias e de Natal. O modus operandi da ré, no quadro global das suas operações comerciais, era o de negociar um valor de salário global anual.
Por ser assim, é nossa convicção de que a interpretação que se deve conferir às aludidas normas é a de que o valor negociado com os autores, tendo por referência todo o ano civil, já contemplava os dois subsídios previstos na lei portuguesa.
Não existiu, por isso, qualquer supressão das invocadas normas.
Por fim, o facto de a ré (erradamente) não ter dado a hipótese de os autores poderem escolherem a forma de pagamento desses vencimentos, não corporiza uma fonte de direito autónoma que tivesse feito nascer nos autores a expectativa (quanto mais o direito) de virem a receber dois salários extra por cada ano em que trabalharam para a ré. Mas, mesmo aqui, a versão da ré é coerente: sempre entendeu ser de aplicar a lei Irlandesa.
Destarte, improcede totalmente esta pretensão dos autores. [..]».
Os recorrentes defendem o seguinte [conclusão G]:
- «Por um lado, o Tribunal reconhece que o direito a auferir subsídio de férias e de natal é um direito irrenunciável. Por outro, sem qualquer base fáctica, vem dizer que os AA. aceitaram receber o seu salário em 14 vezes aquando da sua transferência para Portugal. Ora logo aqui enferma o entendimento dos factos. A R. não o alega, nem os mesmo o indicam, que os AA tenham aceite tal forma de pagamento. Por outro lado, a questão do pagamento do salário anual em 14 vezes só se levantou a partir do ano de 2019 e a maioria dos AA passou a prestar a sua atividade a partir da base do … a partir do ano de 2009, o mais tardar a partir do ano de 2014.
Até o ano de 2019, nunca se havia colocado a questão de pagamento do salário anual existente em 14 vezes pelo que nunca poderiam os AA ter acordado com tal situação, se nem a Ré a propôs. Por outro lado, o Tribunal infirma de uma declaração descontextualizada, e que não é conducente com o restante depoimento da AA AA, que todos os AA teriam a convicção que a empresa não os transferiria para Portugal se tivesse um custo acrescido com tal transferência. Se por um lado o Tribunal não pode fazer tal transferência de declarações, fica claro das transcrições apostas nas alegações, que os restantes AA nas suas declarações negaram categoricamente tal entendimento. Temos assim um fundamento de facto inexistente para a decisão do Tribunal. A outro passo, se o direito é irrenunciável, pouco interessaria a convicção do trabalhador no momento da transferência. Até porque, como repetidamente dito pelos AA, estes tinham receio das represálias que poderiam sofrer por parte da R., a qual é bem conhecida publicamente por tal. Tudo a contraria a jurisprudência uniforme formada contra a falta de pagamento de subsídios de natal e férias pela R., tanto a nível nacional, como a nível europeu e das jurisdições de outros Estados-Membros».
Pedem a revogação da sentença nesta parte, para ser substituída por outra que condene a R. ao pagamento dos subsídios de natal e de férias nunca pagos aos AA., acrescida dos respetivos juros de mora vencidos e vincendos, incluindo os já liquidados com a P.I., bem como deverá ser reconhecido o direito dos AA a receberem subsídios de férias e de natal (pedidos B e C).
Contrapõe a recorrida, no essencial, o que segue:
-Bem andou o Douto Tribunal a quo ao interpretar a vontade negocial das partes aquando da celebração do contrato, entendendo que estas validamente estipularam uma remuneração anual global que integrava todas as rúbricas remunerativas que os trabalhadores poderiam esperar auferir, bem como fez um correto exercício de comparação das normas potencialmente aplicáveis para determinar se existia prejuízo para os trabalhadores, concluindo que não.
-Dúvidas não podem subsistir quanto à interpretação da vontade das partes: os Apelantes, prestaram trabalho para a Apelada fora de Portugal ao abrigo de contrato que estipulava uma remuneração global anual, tal como o contrato que assinaram quando mudaram a base de alocação para Portugal (cfr. factos provados 18., 71., 73., 78., 85. 90., 129., 130., 134. e 146.).
- Quando se transferiram para Portugal, qualquer intérprete médio compreenderia que o valor anual estipulado incluía toda a remuneração base devida e bem sabiam os Apelantes que não se estava a acordar pagar esse valor anual, incrementado de duas prestações anuais; os contratos de trabalho dos Apelantes, até 2019, sempre acolheram a aplicação da lei irlandesa, naturalmente não se faria representar o pagamento de dois subsídios adicionais - Natal e de férias – que essa legislação não prevê.
- Mas não é por isso legítimo concluir que, do acordo celebrado entre as Partes, não se alcançasse que o valor da retribuição expresso no contrato já incluiria a totalidade dos valores devidos e efetivamente pagos em 12 prestações mensais por ano.
Passando à apreciação, começaremos por precisar a questão em apreço.
Debruçando-se sobre a lei aplicável para resolver esta questão, o Tribunal a quo concluiu que “No caso concreto, considerando o que ficou provado quanto ao local onde os autores exercem a sua prestação laboral, temos como certo que a lei é a Portuguesa”. E, mais adiante refere que ”Destarte, teremos que analisar se, no caso concreto, foi violada norma inderrogável portuguesa quanto aos aludidos subsídios de férias de Natal”.
Em seguida, reportando-se às normas que regem sobre o direito a subsídio de Natal e e subsídio de Férias, isto é, aos artigos 263.º e 264.º do CT, afirma tratarem-se de normas inderrogáveis, para depois referir que “A questão é a de saber se o modo de pagamento escolhido pela ré contraria estas normas, ou seja, se existe um prejuízo dos trabalhadores com a forma de pagamento escolhida pela ré caso em que será de determinar o pagamento aos autores de todas as quantias reclamadas referentes ao período temporal supra descrito”.
Após, procedeu à apreciação nos termos acima transcritos e concluiu “Por ser assim, é nossa convicção de que a interpretação que se deve conferir às aludidas normas é a de que o valor negociado com os autores, tendo por referência todo o ano civil, já contemplava os dois subsídios previstos na lei portuguesa. Não existiu, por isso, qualquer supressão das invocadas normas”.
Em suma, a questão que se coloca para apreciação é a de saber se esta conclusão põe em causa, violando-os, os princípios afirmados nos artigos 263.º e 264.º do CT, quanto ao direito dos trabalhadores a receberem subsídios de Natal e de férias.
Impõe-se deixar duas notas prévias, uma dirigida à fundamentação da decisão recorrida, a outra às alegações das partes.
No percurso lógico que conduziu à decisão o Tribunal a quo estribou-se em duas premissas fulcrais, nomeadamente, ao concluir que “A matéria de facto apurada nos autos permite afirmar que os autores sabiam muito bem o que vinham ganhar para Portugal “ e, mais adiante, que “Os factos dados como provados permitem afirmar que os autores sabiam que o valor acordado para os salários já contemplava os subsídios de férias e de Natal”. Porém, como se vê pela transcrição supra, aquelas afirmações são feitas sem que o Tribunal a quo tenha tido o cuidado, como era devido, de indicar quais os factos do elenco fixado que considerou relevantes para formar aqueles juízos.
No que concerne às alegações das partes, verifica-se que ambas vem invocar extratos das declarações de parte dos autores e das testemunhas, em abono das posições que defendem. Ora, o direito aplica-se aos factos que tenham sido fixados, não tendo já cabimento, por de todo irrelevante, voltar a invocar o sentido dos meios de prova e extractos de declarações, designadamente, do que foi dito por determinado autor ou testemunha.
Feitas estas notas, cabe enunciar os factos que se mostram relevantes para a apreciação da questão, em concreto, os seguintes:
9. O Autor BB prestou a sua atividade para a empresa de trabalho temporário B..., entre 23/04/2009 e 31/12/2011, trabalhando nos aviões da ré.
10. A partir de 01/04/2011 o Autor BB passou a prestar ininterruptamente a sua atividade a partir do Aeroporto ....
11. O autor BB a 1 de Janeiro de 2012 passou a exercer a sua atividade diretamente à Ré A....
12. Mantendo-se no Aeroporto ....
14. O Autor CC prestou a sua atividade para a empresa de trabalho temporário B..., entre 14/05/2006 e 12/12/2006, trabalhando nos aviões da ré.
15. A partir de 13/12/2006 o Autor CC passou a prestar ininterruptamente a sua atividade diretamente à Ré A....
18. O Autor DD prestou inicialmente a sua atividade à Ré A... na base de ..., entre 01/01/2009 e 02/09/2009.
19. A partir de 03/09/2009 o Autor DD passou a prestar ininterruptamente a sua atividade diretamente à Ré A... a partir do Aeroporto ... com a categoria de CSS (definitivo a partir de 2010).
23. A Autora EE prestou inicialmente a sua atividade à Ré A... através da empresa B..., entre 12/08/2006 e 24/10/2009.
24. A partir de 25/10/2009 a Autora passou a prestar ininterruptamente a sua atividade diretamente à Ré A..., a partir do Aeroporto ..., com a categoria de CSS.
25. A Autora FF prestou a sua atividade à Ré A... desde 11/03/2008.
26. Tendo passado a exercer a sua atividade à Ré a partir da base do … a partir de 3 de Setembro de 2009.
27. É no Aeroporto ... que todos os Autores iniciam (iniciavam) e terminam (terminavam) regularmente a sua jornada de trabalho.
48. Antes de 2019 a ré não discriminava nos recibos de vencimento dos autores as rubricas relativas aos subsídios de Natal e de férias.
49. Até 2019 nos contratos dos Autores, na retribuição anual não se encontrava estipulado nenhum montante correspondente ao pagamento de subsídios de férias ou de natal.
50. No recibo de vencimento dos autores, desde o início da relação laboral e até 2019 não existiu uma referencia autonomizada quanto aos valores pagos a título de subsídio de férias e de Natal.
51. A lei irlandesa não prevê a existência de subsídios de Natal e de Férias.
52. Nos recibos de vencimento dos autores anteriores a 2019 não consta a liquidação de cada componente.
71. O Autor GG prestou inicialmente a sua atividade à B... (agência Irlandesa que presta serviço equivalente ou semelhante ao de uma agência de trabalho temporário que tem como cliente único a Ré), entre 20/03/2013 e 2017, sendo que apenas em 2015 se transferiu para Portugal.
72. A partir de 01/12/2017 o Autor passou a prestar ininterruptamente a sua atividade diretamente à Ré A..., a partir do Aeroporto ..., com a categoria de CSS (chefe de cabine).
73. O Autor HH prestou inicialmente a sua atividade à B..., entre 07/05/2008 e 31/12/2011, sendo que desde 25 de Outubro de 2009 passou a prestar atividade a partir do Aeroporto ....
74. A partir de 01/01/2012 o Autor passou a prestar ininterruptamente a sua atividade a partir do Aeroporto ... enquanto Tripulante diretamente contratado pela R.
75. A A. AA é trabalhadora da ré desde 01.09.2006.
85. A A. AA foi contratada pela R. em 01.09.2006, foi inicialmente alocada à base de ..., Reino Unido, tendo sido transferida, em 25.10.2009, para a base do …, Portugal.
86. O A. BB foi contratado por uma empresa de trabalho temporário entre 21.04.2009 e 31.03.2011, onde operou voos da A... a partir da base de ..., Espanha. Em 01.01.2012 foi contratado pela R., passando a exercer funções na base do …, Portugal.
87. O A. CC foi contratado pela R. em 01.01.2007, foi inicialmente alocado à base de ..., Reino Unido, tendo sido transferido, em 07.11.2007, para a base de ..., foi transferido, em 17.06.2008, para a base de ..., foi transferido, em 23.01.2009, para a base de ..., e foi transferido, em 03.09.2009, para a base do ….
88. O A. DD foi contratado pela R. em 01.01.2009, foi inicialmente alocado à base de ..., Alemanha, tendo sido transferido, em 03.09.2009, para a base do …, Portugal.
89. A A. EE foi contratada pela R. em 01.05.2007, foi inicialmente alocada à base de ..., Reino Unido, tendo sido transferida, em 25.10.2009, para a base do …, Portugal.
90. A A. FF foi contratada pela R. em 01.06.2009, foi inicialmente alocada à base de ..., ..., tendo sido transferida, em 03.09.2009, para a base do …, Portugal.
93. Consta dos contratos de trabalho dos autores: “É uma condição do seu emprego que cumpra qualquer uma dessas exigências. Isto inclui, para evitar dúvidas, a transferência para qualquer das bases europeias da Empresa sem compensação. Deve entender-se que, caso seja transferido para outra base, será paga de acordo com o salário e o sistema de pagamento de voos em vigor nessa base.”.
127. Nos termos da lei irlandesa, a remuneração dos trabalhadores é paga em 12 mensalidades anuais, pelo que a retribuição mensal dos AA. foi estipulada em € 1.247,50.
128. A partir de 2019 a Ré passou a aplicar a legislação portuguesa à relação laboral com todos os seus trabalhadores afetos a bases portuguesas (onde se incluíam os AA.).
129. Foi comunicado a todos os trabalhadores da Ré (incluindo os AA), que devido à transição para a lei laboral portuguesa o salário anual que vinham auferindo em 12 prestações mensais iria passar a ser pago em 14 prestações mensais, a não ser que os trabalhadores informassem a preferência pela manutenção do pagamento em 12 prestações mensais (aqui se incluindo o proporcional do subsídio de Natal e férias).
130. Não tendo os AA. manifestado a sua vontade, a Ré, passou a retribuir os AA. 14 vezes por ano, mantendo o valor global anual (€ 14.970,00) mas passando o valor mensal para € 1.069,29.
131. Com esta alteração não foi feita qualquer redução da retribuição dos AA., mantendo estes a mesma remuneração anual que sempre vinham auferindo.
189. Nos termos da lei irlandesa, a remuneração dos trabalhadores é paga em 12 mensalidades anuais, pelo que a retribuição mensal dos AA. foi estipulada em € 1.247,50.
Enunciados estes factos, cabe agora referir que esta precisa questão, com similitude da factualidade essencial, já foi apreciada por esta Relação e Secção, nos acórdãos de 23-10-2023 [proc.º 158/20.2T8MTS.P1, Desembargador António Luís Carvalhão, disponível em www.dgsi.pt] e de 05-06-2023, relatado pelo aqui relator e com intervenção do mesmo primeiro adjunto [proc.º 551/20.0T8PRT.P1, disponível em www.dgsi.pt]. A referir, ainda, que aquele primeiro aresto foi confirmado por acórdão do STJ de 07-07-2023 [Conselheiro Ramalho Pinto, disponível em www.dgsi.pt].
Sublinhando-se a similitude dos casos e fazendo-se notar que em ambos os processos a Ré é também a aqui Ré, não vislumbrando razões para alterar o entendimento afirmado, diremos, desde já, não acompanhamos a decisão do Tribunal a quo, antes sendo de reconhecer razão aos AA.
No acórdão por nós relatado, sintetizou-se no respectivo sumário o entendimento afirmado quanto a esta questão, conforme segue: «IV - Estando provado que a Recorrente nunca pagou subsídio de férias à Autora durante todo o período de vigência do contrato, compreendido entre 25.03.2012 e 28.02.2019, nem tão pouco pagou subsídio de Natal, sobre ela recaía o ónus de alegação e prova de que a escolha da lei irlandesa para regular o contrato e a consequente estrutura retributiva fixada e praticada, não importou como consequência para trabalhadora privá-la “da proteção que lhe proporcionam as disposições não derrogáveis por acordo, ao abrigo da lei que, na falta de escolha, seria aplicável nos termos dos n.ºs 2, 3 e 4 do artigo 8.º”, em concreto, o direito a serem-lhe pagos os subsídios em causa, previstos na legislação portuguesa em normas inderrogáveis, nomeadamente, nos artigos 263º, nº1 e 264º, nº4 do CT/09, por ser a lei do país “a partir do qual presta habitualmente o seu trabalho” [art.º 8.º/2 do Regulamento Roma I]».
Na fundamentação do acórdão, na parte que aqui releva - transponível para o caso, pese embora aí fosse recorrente a aqui recorrida Ré, tanto mais que a argumentação das partes é, também, no essencial, a mesma-, afirmou-se o seguinte:
«[..]
Refira-se que a Recorrente não questiona a sentença quando afirma a imperatividade dos subsídios de férias e subsídios de Natal, ou seja, como referido na fundamentação com apoio à jurisprudência citada, que os artigos 263º, nº1 e 264º, nº4 do CT “são normas inderrogáveis da lei portuguesa, mormente para efeitos de aplicação do artigo 8º nº1 do Regulamento Roma I, as que respeitam à própria existência de um subsídio de férias e de um subsídio de Natal”, (Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 22-02-2022; www.dgsi.jstj.pt-Proc. n.º2191/19.8T8PDL.L1.S2).
Com apoio nos pareceres que juntou aos autos, alega é que os subsídios de férias e Natal são hoje em dia e de forma pacífica, considerados como tendo uma natureza retributiva, que “[..] compõem a retribuição global complexiva do trabalhador, ainda que os respetivos períodos de vencimento e pagamento sejam distintos”, para defender que o respectivo pagamento não tem necessariamente que estar previsto e ser efectuado em duas prestações autónomas, em acréscimo às 12 retribuições mensais, podendo o valor correspondente estar integrado no “quantum remuneratório global , tendo as partes acordado “ uma remuneração que incluía todos os montantes devidos à Apelada”, tanto mais que “a lei irlandesa não prevê a figura do subsídio de férias de Natal”.
Começando justamente por este ponto, concordamos com o entendimento afirmado pelos autores dos pareceres juntos, consonante com o afirmado por António Monteiro Fernandes, nomeadamente, no estudo “A noção de retribuição no regime do contrato de trabalho: uma revisão da matéria” [Direito E Justiça, 1(Especial), 295-325. https://doi.org/10.34632/direitoejustica.2015.9924, pp. 308/309 e 310], aí a propósito do que deve integrar estas prestações – a base de cálculo - , mas com pertinência para o caso, observando o seguinte:
[..] não há espaço para dúvidas acerca do carácter retributivo de qualquer das prestações em causa: remuneração do período de férias, subsídio de férias e subsídio de Natal. Ao contrário do que, por vezes, se sugere19, essas prestações integram a contrapartida anual do trabalho prestado ao longo do ano – não têm, em rigor, nenhum carácter “complementar” nem, muito menos, nelas se encontram quaisquer resíduos da natureza das “gratificações” que podem ser praticadas nas relações de trabalho20. O que acontece é, simplesmente, que a actividade prestada em onze meses é paga em catorze prestações.
O que particulariza estas três atribuições patrimoniais é que a sua correlação com a prestação de trabalho não é, como se disse, directa – dia por dia, semana por semana, mês por mês –, opera à escala do ano e tende, por isso, a ser insensível às variações que, no decurso desse período, atinjam o perfil concreto das actividades através das quais o contrato de trabalho é executado.
[..]
… estas atribuições patrimoniais não se relacionam directamente com concretas prestações de actividade, localizadas no tempo e no espaço (cujas características ou circunstâncias devessem ter nelas contrapartida económica), antes funcionam como “correctivos” da contrapartida anual do trabalho prestado.
[..]».
Diga-se, ainda, que do disposto no art.ºs 263º, n.º 1, e 264º, n.º 3, do Código do Trabalho, não resulta obstáculo a que as partes acordem no pagamento, respectivamente, do subsídio de Natal e do subsídio de férias, de forma diversa da prestação única, p. ex. em duodécimos conjuntamente com a retribuição mensal, dado aquelas normas disporem, em termos de regulamentação supletiva, quanto ao primeiro, que “[..] que deve ser pago até 15 de Dezembro de cada ano”; e, quando ao segundo, que “Salvo acordo escrito em contrário, o subsídio de férias deve ser pago antes do início do período de férias [..]”.
Porém, sendo certo que a Recorrente nunca pagou subsídio de férias à Autora durante todo o período de vigência do contrato, compreendido entre 25.03.2012 e 28.02.2019, nem tão pouco pagou subsídio de Natal [factos 44 e 45], para que aquelas considerações tenham proveito para o caso, ou seja, possa aquele entendimento ser aqui aplicado, é necessário concluir-se - como pretende a recorrente-, que a vontade das partes aquando da celebração foi a de acordarem um valor de retribuição que incluiria “todos os montantes”, isto é, que as 12 retribuições mensais englobassem uma parte destinada a cobrir os valores a título de subsídio de férias e de Natal.
A resposta à questão passa necessariamente pela interpretação das declarações de vontade das partes, à luz da regra estabelecida no n.º1, do art.º 236.º do CC, entendendo-se que “o sentido decisivo da declaração negocial é aquele que seria apreendido pro um declaratário normal, ou seja, medianamente instruído e diligente, colocado na posição do declaratário real, em face do comportamento do declarante” [Pires de Lima e Antunes Varela, Código Civil Anotado, Vol. I, 4.ª edição, Coimbra Editora, 1987, p. 223].
[..]
Por conseguinte, como bem se vê, não há qualquer facto provado – nem foi alegado - que minimamente indicie que na celebração do contrato as partes quiseram fixar um valor global de retribuição mais alto cobrindo logo o que seria devido a título de subsídio de férias e subsídio de Natal, estabelecendo esse acordo no clausulado do contrato.
[..]
Ora, com o devido respeito, para a questão em causa é descabido invocar os valores dos salários mínimos ... e português para fazer comparações. [..]
Estando provado que a Recorrente nunca pagou subsídio de férias à Autora durante todo o período de vigência do contrato, compreendido entre 25.03.2012 e 28.02.2019, nem tão pouco pagou subsídio de Natal, sobre ela recaía o ónus de alegação e prova de que a escolha da lei irlandesa para regular o contrato e a consequente estrutura retributiva fixada e praticada, não importou como consequência para trabalhadora, privá-la da “da proteção que lhe proporcionam as disposições não derrogáveis por acordo, ao abrigo da lei que, na falta de escolha, seria aplicável nos termos dos n.ºs 2, 3 e 4 do artigo 8.º”, em concreto, o direito a serem-lhe pagos os subsídios em causa, previstos na legislação portuguesa em normas inderrogáveis, nomeadamente, nos artigos 263º, nº1 e 264º, nº4 do CT/09, por ser a lei do país “a partir do qual presta habitualmente o seu trabalho” [art.º 8.º/2 do Regulamento Roma I].
Essa prova não foi feita e, logo, nesta parte soçobra o recurso.
Numa derradeira nota, não é despiciendo assinalar que esta Relação já se pronunciou neste sentido no recente acórdão de 23-10-2023 [proc.º 158/20.2T8MTS.P1, Desembargador António Luís Carvalhão, disponível em www.dgsi.pt], no qual se colocava esta precisa questão. Embora nesse processo fosse Ré “A... DAC (Designated Activity Company)”, a factualidade relevante e a questão colocada é em tudo similar à aqui em apreço, o mesmo sendo de dizer quanto à argumentação da Ré, inclusive, no que respeita ao argumento do salário mínimo ... em confronto com o salário mínimo nacional e à junção dos mesmos pareceres.
Conclui-se nesse aresto, que “[..] tem a Autora a haver da Ré os referidos subsídios durante a pendência do contrato, por aplicação dos preceitos inderrogáveis da lei portuguesa, [..]”. Consta do sumário desse acórdão o seguinte: I - Nada obsta a que o salário seja negociado e previsto num valor anual global, assim como não é imperativo que o pagamento dos subsídios de férias e de Natal sejam pagos de uma vez só. II - No entanto, em contrato internacional, ao qual se aplica a lei irlandesa, para se concluir que foi acordado o pagamento dos subsídios de férias e de Natal no valor do salário acordado, impõe-se que um declaratário normal, colocado na posição do real declaratário, o possa deduzir do acordo realizado”.
[..]».
Na mesma linha de entendimento e, como se disse, confirmando o acórdão desta Relação de 23-10-2023 [proc.º 158/20.2T8MTS.P1], no já mencionado acórdão do STJ de 07-07-2023, sintetizou-se no respectivo sumário a posição ai afirmada, nos termos seguintes:
I- É obrigatório o pagamento a trabalhadores, cujo contrato de trabalho está a ser executado em Portugal, de subsídio de férias e de Natal;
II- Se a base de afectação do trabalhador se situa em território português, se o acordo das partes quanto à lei aplicável ao contrato de trabalho afastou a lei portuguesa, que de outro modo seria aplicável, à luz do artigo 8.º n.º 1 do Regulamento Roma I (Regulamento CE n.º 593/2008, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 17 de junho de 2008, sobre a lei aplicável ás obrigações contratuais) tal não pode lograr o resultado de afastar as normas inderrogáveis da lei portuguesa, mormente as que respeitam à própria existência de um subsídio de férias e de um subsídio de Natal.
Na respectiva fundamentação, no que aqui releva, lê-se o seguinte:
-«[..]
As disposições do Código do Trabalho que preveem os subsídios de férias e de Natal são imperativas e não podem ser derrogadas por acordo das partes, constituindo os mesmos prestações obrigatórias - cfr. o artigo 3.°, n.° 4 do Código do Trabalho.
Este STJ tem entendido, de forma pacífica, que é obrigatório o pagamento a trabalhadores cujo contrato de trabalho está a ser executado em Portugal de subsídio de férias e de Natal. Se a base de afectação do trabalhador se situa em território português, se o acordo das partes quanto à lei aplicável ao contrato de trabalho afastou a lei portuguesa, que de outro modo seria aplicável, à luz do artigo 8.º n.º 1 do Regulamento Roma I (Regulamento CE n.º 593/2008, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 17 de junho de 2008, sobre a lei aplicável ás obrigações contratuais), tal não pode lograr o resultado de afastar as normas inderrogáveis da lei portuguesa, mormente as que respeitam à própria existência de um subsídio de férias e de um subsídio de Natal- cfr. acórdãos 27-10-2021, proc. n. º 19733/19.1T8LSB.L1.S2, de 22-02-2022, proc. n. º 2191/19.8T8PDL.L1.S2, de 7/9/2022, proc. 1644/19.2T8TVD.L1.S2, e de 29-11-2022, proc. n. º 2440/19.2T8BRR.L1.S2.
Daí a conclusão retirada, a nível do respectivo sumário, de que são normas inderrogáveis da lei portuguesa, mormente para efeitos de aplicação do artigo 8.º, n.º 1, do Regulamento Roma I, as que respeitam à própria existência de um subsídio de férias e de um subsídio de Natal.
Dada tal obrigatoriedade, estas prestações são sempre devidas, independentemente do valor anual fixado da retribuição do trabalhador, não sendo legítimo fazer qualquer exercício de comparação como pretende a Recorrente.
Não está em causa a natureza jurídica dos subsídios de férias e de Natal, mas outrossim a da sua obrigatoriedade ou inderrogabilidade, que inquestionavelmente existe.
Como se afirma no acórdão recorrido, estabelecendo a lei (leia-se Código do Trabalho) o direito a subsídio de férias (art.º 264º do Código do Trabalho) e o direito a um subsídio de Natal (art.º 263º do Código do Trabalho), não podem por via contratual ser eliminados ou reduzidos esses direitos reconhecidos ao trabalhador pelo legislador.
E utilizando as palavras da recorrida, a tónica deve ser colocada na obrigatoriedade de pagamento de um subsídio de férias e de um subsídio de Natal, constante da lei nacional.
Não se pode comparar o incomparável, sendo que, mesmo que assim não acontecesse, a comparação pretendida pela Recorrente sempre esbarraria com um obstáculo de peso, já que carecem os autos de elementos que permitam concluir que o regime aplicado protege globalmente um valor superior de remuneração, “sendo inegável que lei irlandesa escolhida pelas Partes confere um nível de proteção superior nesta matéria”, segundo as palavras da Recorrente.
É que, como acertadamente refere a Recorrida, o vencimento pago a esta pode parecer muito elevado, face ao salário mínimo português, mas não nos podemos esquecer que o mesmo foi calculado para incluir um prémio por todas as horas associadas ao serviço de voo; incluindo, mas não se limitando a, relatórios pré e pós-voo, atrasos e todas as tarefas a bordo, incluindo o uso do sistema portátil EPOS e trabalho prestado ao domingo e aos feriados.
Finalmente, de referir que o aspecto factual invocado pela Recorrente, de que o contrato original foi celebrado em 2009 e que a Recorrida foi recrutada em processo conduzido a partir de ..., e iniciou a sua prestação para a Recorrente alocada à base de ..., em Itália, carece de qualquer relevância para a decisão do presente recurso, dado que a mesma Recorrente, no seu recurso, dele não retira qualquer consequência a nível da contabilização das quantias devidas à Autora».
Revertendo ao caso, embora não seja controvertido, tenha-se presente que todos os autores passaram a partir das datas apuradas para cada um deles, a prestar integralmente a sua actividade para a Ré a partir de território português, mantendo a Ré o valor de retribuição anual que lhes vinha pagando, na qual não se encontrava estipulado nenhum montante correspondente ao pagamento de subsídios de férias ou de Natal. Assim resulta dos factos acima elencados, desde logo, os sob os n.ºs 27 a 34
Como afirmado nos transcritos arestos, mormente pelo STJ, “as disposições do Código do Trabalho que preveem os subsídios de férias e de Natal são imperativas e não podem ser derrogadas por acordo das partes, constituindo os mesmos prestações obrigatórias”.
Certo é, também, que do disposto no art.ºs 263º, n.º 1, e 264º, n.º 3, do Código do Trabalho, não resulta obstáculo a que as partes acordem no pagamento, respectivamente, do subsídio de Natal e do subsídio de férias, de forma diversa da prestação única, p. ex. em duodécimos conjuntamente com a retribuição mensal, dado aquelas normas disporem, em termos de regulamentação supletiva, quanto ao primeiro, que “[..] que deve ser pago até 15 de Dezembro de cada ano”; e, quando ao segundo, que “Salvo acordo escrito em contrário, o subsídio de férias deve ser pago antes do início do período de férias [..]”.
Estando provado que [48] “Antes de 2019 a ré não discriminava nos recibos de vencimento dos autores as rubricas relativas aos subsídios de Natal e de férias”, e que “[50] No recibo de vencimento dos autores, desde o início da relação laboral e até 2019 não existiu uma referencia autonomizada quanto aos valores pagos a título de subsídio de férias e de Natal”, bem assim que “[52] Nos recibos de vencimento dos autores anteriores a 2019 não consta a liquidação de cada componente” e ainda, que a retribuição é paga 12 vezes por ano [127 e outros dos transcritos], para que se concluísse que a Ré - como alegou na acção e aqui reitera no recurso-, cumpriu o dever de pagamento dessas retribuições, por estarem contidas no valor total, englobando cada uma das 12 retribuições mensais uma parte destinada a cobrir os valores a título de subsídio de férias e de Natal, era necessário que tal se extraísse da matéria provada.
Ora, assim não acontece.
Por um lado, como está provado, [49] “Até 2019 nos contratos dos Autores, na retribuição anual não se encontrava estipulado nenhum montante correspondente ao pagamento de subsídios de férias ou de natal”. Por outro, salvo o devido respeito, não vislumbramos com que base factual é que o tribunal a quo concluiu “que os autores sabiam que o valor acordado para os salários já contemplava os subsídios de férias e de Natal”.
Nem o tribunal a quo o concretizou, nem tal conclusão pode ser retirada da matéria provada. Mais, note-se, tal conclusão pressuporia que ao serem celebrados os contratos de trabalho, estaria previsto pela Ré, sabendo-o os autores, que o valor anual acordado para ser pago em 12 retribuições mensais, continha um acréscimo destinado ao pagamento de subsídios de Natal e férias.
E, como dissemos no acórdão de 05-06-2023 - na parte da fundamentação acima transcrita -, “A resposta à questão passa necessariamente pela interpretação das declarações de vontade das partes, à luz da regra estabelecida no n.º1, do art.º 236.º do CC, entendendo-se que “o sentido decisivo da declaração negocial é aquele que seria apreendido pro um declaratário normal, ou seja, medianamente instruído e diligente, colocado na posição do declaratário real, em face do comportamento do declarante” [Pires de Lima e Antunes Varela, Código Civil Anotado, Vol. I, 4.ª edição, Coimbra Editora, 1987, p. 223]”.
A recorrida Ré defende que o Tribunal a quo interpretou bem a vontade negocial das partes aquando da celebração do contrato, entendendo que estas validamente estipularam uma remuneração anual global que integrava todas as rúbricas remunerativas que os trabalhadores poderiam esperar auferir, referindo que dúvidas não podem subsistir quanto à interpretação da vontade das partes: os Apelantes, prestaram trabalho para a Apelada fora de Portugal ao abrigo de contrato que estipulava uma remuneração global anual, tal como o contrato que assinaram quando mudaram a base de alocação para Portugal (cfr. factos provados 18., 71., 73., 78., 85. 90., 129., 130., 134. e 146.).
Não concordamos de todo. Não há qualquer facto provado, incluindo os invocados pela Ré, que minimamente indicie que na celebração do contrato as partes quiseram fixar um valor global de retribuição mais alto cobrindo logo o que seria devido a título de subsídio de férias e subsídio de Natal, estabelecendo esse acordo no clausulado do contrato.
Desde logo, sendo certo que a lei [51] “A lei irlandesa não prevê a existência de subsídios de Natal e de Férias”, se porventura a Ré, fossem quais fossem as razões, entendesse ir para além do que era devido e contemplar também os trabalhadores como um valor acrescido à retribuição devida em contrapartida da prestação da actividade, destinado a pagar-lhes também subsídio de Natal e Férias, faria todo o sentido que o mencionasse expressamente no contrato escrito e, também, que nos recibos mensais surgisse alguma menção a esse propósito. Como vimos, assim não aconteceu até 2019.
Mas ainda que assim não fosse, então pelo menos faria sentido que fosse dado conhecimento por qualquer forma aos trabalhadores aquando do processo de contratação. Ora, também nenhum facto provado o evidencia. Aliás, diga-se, nem tão pouco foi alegado.
Por conseguinte, contrariamente ao que entendeu o tribunal a quo, mas sem que o justificasse com a indicação dos factos concretos, nada permite concluir que “o valor negociado com os autores, tendo por referência todo o ano civil, já contemplava os dois subsídios previstos na lei portuguesa”,
O ónus dessa prova recaía sobre a Ré, mas não foi feita e, logo, nesta parte o recurso deve ser atendido.
Em consequência, cabe revogar a sentença nessa parte e, em substituição, condenar-se a Ré pagar aos Autores os subsídios de férias e de Natal durante os períodos de vigência do contrato em que prestaram a sua actividade em território nacional, sendo os montantes a apurar em liquidação posterior nos termos dos art.ºs 609º, nº 2 e 358º, nº 2 do Código de Processo Civil (pelas razões que adiante se perceberão, no ponto II.3.4).
II.3.2 Discordam os AA da sentença, em razão do Tribunal a quo ter julgado improcedente o pedido de condenação da Ré no pagamento de indemnização pela violação do direito a férias.
Na fundamentação da sentença, quanto a esta questão lê-se o seguinte:
«[..]
Como decidiu o acórdão do Tribunal da Relação de Évora de 08.11.2017, disponível em www.dgsi.pt, “estipula o n.º 1 do artigo 246.º do Código do Trabalho, que caso o empregador “obste culposamente” ao gozo das férias nos termos previstos nos artigos anteriores, o trabalhador tem direito a compensação no valor do triplo da retribuição, correspondente ao período em falta, que deve ser gozado até 30 de Abril do ano civil subsequente.
Assim, como facto constitutivo do direito à indemnização, o trabalhador terá que alegar e provar factos consubstanciadores de um comportamento culposo do empregador que obste ao gozo das férias (cfr. artigo 342.º, n.º 1, do Código Civil).
Como a jurisprudência do Supremo Tribunal de Justiça tem afirmado, o direito indemnizatório em causa pressupõe que o trabalhador tenha pretendido exercer o seu direito e que este lhe tenha sido negado, sem fundamento válido, pela empregadora: ou seja, é necessário provar que houve um efectivo impedimento ao gozo de férias, não sendo, por isso, suficiente a simples não marcação das férias para concluir que a empregadora obstou ao seu gozo [neste sentido, entre outros, os acórdãos de 27-04-2005 (Recurso n.º 3583/04), de 19-10-2005 (Revista n.º 1761/05), de12-02-2009 (Recurso n.º 2583/08) e de 16-12-2010 (Recurso n.º 314/08.1TTVFX.L1.S1), disponíveis, com excepção do primeiro, em www.dgsi.pt).
Ora, no caso que nos ocupa o que se verifica nesta matéria é tão só que os associados do Autor/recorrido não terão gozado (todas) as férias a que tinham direito: mas, face ao que se deixou referido, esse não gozo de férias é insuficiente para se poder concluir que a Ré/recorrente obstou ao gozo das férias (em falta) dos associados do Autor e, consequentemente, que estes tenham direito à peticionada indemnização pela violação do direito a férias.”
Neste campo a lei portuguesa é mais favorável ao trabalhador e não pode ser derrogada pela lei irlandesa. Por isso, aplicando a lei portuguesa ao caso concreto e nos termos da aludida norma, os autores têm direito a receber os dois dias de férias não gozados desde o início do contrato até à data em que passaram a ser concretamente disponibilizados pela ré – quantias e lapsos temporais a apurar em sede de liquidação.
Improcede a pretensão de receber a compensação prevista no artigo 246º do Código do Trabalho uma vez que no caso concreto o não gozo das férias se ficou a dever a uma interpretação jurídica efectuada pela entidade patronal».
Defendem os recorrentes que “tendo o Tribunal a quo verificado, e inclusivamente condenado ao pagamento dos 2 dias de férias por ano que os AA não puderam gozar durante a relação laboral, teria que obrigatoriamente condenar a R. ao pagamento da indemnização prevista no artigo supra, não prevendo tal dispositivo qualquer causa de exclusão. Assim a decisão nesta parte é nula por falta de sustentação legal, devendo ser substituída por outra que condene a R. ao pagamento da indemnização prevista no artigo 246º/1 do CT nos valores já liquidados a P.I”.
Contrapõe a recorrida, no essencial, que como bem decidiu o Tribunal a quo, considerando o contrato celebrado pelas partes (que prevê a aplicação da lei irlandesa); o entendimento da Apelada de que seria aplicável esta lei pelo que apenas estava obrigada a dar 20 dias de férias; e, essencialmente, que os Apelantes nunca se pronunciaram em sentido contrário, nunca tendo exigido a marcação de 22 dias de férias, é óbvio que nunca a Apelada obstou ativamente ao gozo de férias, pelo que não existe direito à compensação prevista no número 1 do art.º 246.º do CT.
Está provado o seguinte:
66. Antes de 2019, a ré apenas permitia aos autores a gozar o máximo de 20 dias de Férias por ano.
67. Nunca houve qualquer renúncia a dias de férias pelos Autores.
160. Para além dos dias de férias que gozavam anualmente, os AA. gozavam ainda, em resultado de um acordo de base que se findou em 2021, de um conjunto de dias adicionais de descanso que, pese embora não tivessem a qualificação de férias, eram dias de repouso concedidos pela 1ª R.
161. De acordo com a lei laboral irlandesa, os AA. apenas teriam direito a 1,66 dias, no total de 20 dias anuais, que gozaram.
E, como refere a recorrida, não está provado qualquer facto, designadamente, de onde resulte que os autores puseram em causa não lhes ser concedido o gozo de 22 dias de férias ou sequer que tenham pedido, muito menos exigido, a marcação de 22 dias de férias.
Passando à apreciação, sem que o ponto exija grandes considerações, tanto mais que os recorrentes não trazem argumentos jurídicos devidamente alicerçados para sustentar o alego erro de interpretação e aplicação do art.º 246.º/1 do CT, diremos já que não se lhes reconhece razão, nesta matéria acompanhando-se a fundamentação e decisão recorrida
Como elucida o Acórdão de 08-06-2017 [Proc.º 280/15.7T8BJA.E1, Desembargador João Nunes, disponível em www.dgsi.pt], citado pelo Tribunal a quo e também aqui invocado pela recorrida:
-«[..]
Estipula o n.º 1 do artigo 246.º do Código do Trabalho, que caso o empregador “obste culposamente” ao gozo das férias nos termos previstos nos artigos anteriores, o trabalhador tem direito a compensação no valor do triplo da retribuição, correspondente ao período em falta, que deve ser gozado até 30 de Abril do ano civil subsequente.
Assim, como facto constitutivo do direito à indemnização, o trabalhador terá que alegar e provar factos consubstanciadores de um comportamento culposo do empregador que obste ao gozo das férias (cfr. artigo 342.º, n.º 1, do Código Civil).
Como a jurisprudência do Supremo Tribunal de Justiça tem afirmado, o direito indemnizatório em causa pressupõe que o trabalhador tenha pretendido exercer o seu direito e que este lhe tenha sido negado, sem fundamento válido, pela empregadora: ou seja, é necessário provar que houve um efectivo impedimento ao gozo de férias, não sendo, por isso, suficiente a simples não marcação das férias para concluir que a empregadora obstou ao seu gozo [neste sentido, entre outros, os acórdãos de 27-04-2005 (Recurso n.º 3583/04), de 19-10-2005 (Revista n.º 1761/05), de12-02-2009 (Recurso n.º 2583/08) e de 16-12-2010 (Recurso n.º 314/08.1TTVFX.L1.S1), disponíveis, com excepção do primeiro, em www.dgsi.pt)”.
Acompanhamos este entendimento, de resto, pacífico.
Não alegaram os AA, nem se provaram, factos que permitam imputar um comportamento culposo à Ré empregadora, visando obstar a que eles tivessem exercido o direito de gozo de férias. A Ré concedeu-lhes 20 dias anuais, que gozaram, actuando em conformidade com a lei irlandesa, que na sua perspectiva era aplicável em geral às relações laborais em causa [cfr. facto 113. É certo que a lei portuguesa, aplicável como entendeu o Tribunal a quo, lhes confere o direito a mais dois dias úteis por ano, mas da conduta da Ré, radicada naquele pressuposto, não pode concluir-se que actuou culposamente com o propósito de obstar ao gozo de férias do A.
Assim, como se disse, nesta parte sucumbe o recurso.
II.3.3 Discordam os autores da sentença por ter julgado improcedente o pedido de condenação da Ré a reconhecer “que os autores operam num “padrão de escalas” 5/3/5/3 (cinco dias de trabalho por cada três dias de folga).
O Tribunal a quo pronunciou-se quanto a essa questão nos termos seguintes:
Finalmente, a questão do tempo de trabalho no padrão 5/3:
Relativamente a esta matéria provou-se que:
- Consta dos contratos de trabalho dos AA.: “Devido à natureza do seu emprego e ao setor empresarial em que a Empresa opera, não existem horas formais de trabalho e a Empresa pode exigir que trabalhe no momento e nos dias que a Empresa pode especificar de tempos a tempos, o que pode incluir sábados, domingos e feriados públicos.
- O trabalhador não tem direito contratual a um determinado padrão de turnos e os dias/horas em que é chamado para trabalhar podem ser alterados à discrição absoluta da empresa.”
- Em 2016, foi celebrado um acordo que abrangia todos os colaboradores da Ré.
- Nesse acordo foi estabelecido que, por um período de 5 anos (1 de abril de 2016 a 31 de março de 2021), os trabalhadores da Ré poderiam usufruir de um padrão de trabalho de 5/3/5/3.
- A validade deste acordo chegou ao fim em 31 de março de 2021, altura em que se regressou à organização de trabalho aplicada antes de 1 de abril de 2016.
-A Ré celebrou um AE com o STTAMP em que de facto se veio a prever o padrão de trabalho de 5/3/5/3, no entanto, esta vantagem atribuída aos trabalhadores pertencentes a este sindicato derivou de um conjunto de cedências feitas pelos trabalhadores desse mesmo sindicato, uma vez que este padrão de trabalho representa um elevado custo para a Ré que tem de contratar trabalhadores adicionais.
- Os AA., não são sindicalizadas no STTAMP (mas antes no SNPVAC, que se opôs expressamente à extensão deste acordo aos seus membros).
Estipula o artigo 217º do Código do Trabalho, norma que os autores citam, que “À alteração de horário de trabalho é aplicável o disposto sobre a sua elaboração, com as especificidades constantes dos números seguintes.
2 - A alteração de horário de trabalho deve ser precedida de consulta aos trabalhadores envolvidos e à comissão de trabalhadores ou, na sua falta, à comissão sindical ou intersindical ou aos delegados sindicais, bem como, ainda que vigore o regime de adaptabilidade, ser afixada na empresa com antecedência de sete dias relativamente ao início da sua aplicação, ou três dias em caso de microempresa.
3 - Exceptua-se do disposto no número anterior a alteração de horário de trabalho cuja duração não seja superior a uma semana, desde que seja registada em livro próprio, com a menção de que foi consultada a estrutura de representação colectiva dos trabalhadores referida no número anterior, e o empregador não recorra a este regime mais de três vezes por ano.
4 - Não pode ser unilateralmente alterado o horário individualmente acordado.”
Como se decidiu no acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 30.01.2019, disponível em www.dgsi.pt, “nos termos do art. 200º do C. Trabalho de 2009, entende-se por horário de trabalho «a determinação das horas de início e termo do período normal de trabalho diário e do intervalo de descanso, bem como do descanso semanal», sendo que aos limites de duração do trabalho se reportam os arts. 203º e ss. e que ao descanso semanal se reportam os arts. 232º e ss., todos do mesmo diploma legal.
É ao empregador que cabe estabelecer o horário de trabalho, dentro dos limites legais (art. 212º nº 1 do CT), competindo-lhe fazê-lo observando as regras expressas no nº 2 do mesmo preceito, entre as quais “Facilitar ao trabalhador a conciliação da atividade profissional com a vida familiar”. Tal poder/dever do empregador inscreve-se no quadro dos poderes de direção e organização do trabalho, consagrados no art. 97º do CT. Em consonância com tal poder, a lei reconhece igualmente ao empregador o poder de alterar o horário de trabalho, unilateralmente, por necessidades organizativas da empresa, conforme decorre do nº 1 do art. 217º do CT, apenas não o podendo fazer se este tiver resultado de acordo expresso em sede de contrato individual de trabalho (nº 4) ou quando resulte de IRCT aplicável que o horário apenas pode ser alterado por acordo (V. neste sentido, entre outros Ac. do STJ de 30.04.2014, proferido no processo 363/05.1 TTVSC.L1:s1, publ. In www.djsi.pt.).”
No caso concreto o AE celebrado com o STTAMP não é aplicável aos autores. De acordo com as necessidades de funcionamento da ré com o conteúdo do contrato de trabalho não existe qualquer direito adquirido pelos autores uma vez que a aplicação do padrão de horário 5/3/5 esteve vigente apenas num determinado período temporal e ao abrigo de um acordo que cessou a vigência em 2021. A ré é livre de fixar o horário de trabalho dos autores dentro das suas necessidades e de acordo com o contrato e a lei – no caso concreto não se provou que a aplicação de outro horário se ficou a dever a um “castigo” ou que exista qualquer espécie de discriminação dos autores em relação a outros trabalhadores da ré.
Por conseguinte, improcede esta pretensão dos autores».
Alegam os recorrentes autores o que segue: “Quanto ao pedido referente ao padrão de organização dos tempos de trabalho na forma 5/3/5/3, crê-se que, mais uma vez, o Tribunal faz errada interpretação dos factos e, por consequência, administrou a sua justiça de forma enfermada. Na sua motivação e matéria de facto que fundamenta a decisão, o Tribunal vem alegar que o padrão de 5/3/5/3 só se aplicou aos AA entre 2016 e 2021. Tal está errado e vem categoricamente refutado nas declarações de parte dos AA. Como se pode verificar das transcrições que constam das alegações, todos os AA a alegações depuseram no sentido que desde 2009 já se aplicava tal padrão do seu horário ou outro semelhante na forma 5/3/5/2/5/3/5/2/… . Como tal, só por errada interpretação dos factos poderia tal decisão ser proferida. Ademais, resultou comprovado que só após a reintegração dos AA BB, AA, EE e CC em sequência da admissão da ilicitude do seu despedimento coletivo pela R em sede judicial nesse mesmo Juízo do Trabalho, a R recusou atribuir tal organização do tempo de trabalho a esses AA. Mais, como o AA CC atestou, tal é utilizado como um castigo, tendo este AA conhecimento profundo das práticas laborais abusivas da R, uma vez que foi Base Supervisor da Base do … entre 2009 e 2019, dando conta de algumas dessas no seu depoimento. Sendo claro que se trata aqui de um direito adquirido e que o artigo 217º do CT prevê que o horário de trabalho não pode ser unilateralmente alterado, deveria o Tribunal a quo ter reconhecido tal padrão do horário de trabalho como aplicável aos AA. supra. Como tal, deverá a sentença a quo ser revogada nesta parte e ser substituída por outra que condene a R. a atribuir o padrão de organização do tempo de trabalho destes AA na forma 5-3-5-3”.
Contrapõe a recorrida, no essencial, que este tema apenas é aplicável aos Apelantes BB, AA, EE e CC, por serem os únicos que ainda são trabalhadores da Apelada. Como referiu na impugnação da decisão sobre a matéria de facto, estes não se pronunciaram na petição inicial sobre o padrão de horário que lhes era aplicado antes de 2016, estando essa matéria fora do objeto do processo, razão pela qual só se deu como provado que este horário foi aplicado a partir de 2016 aos Apelantes. A obrigação de aplicação do referido padrão emerge apenas do acordo de empresa celebrado com o STTAMP em 2016, que pelo princípio da filiação apenas se aplica aos seus filiados, e por portaria de extensão a todos os demais trabalhadores que não ficaram excluídos do seu âmbito como foi o caso dos Apelantes por via da sua filiação no SNPVAC.
Pugna pela improcedência do recurso nesta parte.
Passando à apreciação, constata-se que os recorrentes impugnam a decisão com base em argumentos dirigidos a pôr em causa a apreciação e valoração feita pelo tribunal a quo relativamente à prova. Note-se, que nem sequer estruturam as alegações partindo apenas do pressuposto de ter sido acolhida a impugnação da decisão sobre a matéria de facto na parte que tinha em vista esta matéria, antes voltando a trazer de novo os mesmos argumentos, que não de direito.
O argumento final de direito, apelando à interpretação do art.º 217.º do CPC, assenta no pressuposto, nas palavras dos recorrentes, de “resulta[r] claro das declarações que este sempre será um direito adquirido destes AA”.
Em suma, toda a argumentação assenta no pressuposto da matéria de facto ter sido alterada e considerados provados factos que não o estão.
Assim, não tendo a impugnação da decisão sobre a matéria de facto sido atendida, necessariamente sucumbe esta parte do recurso.
II.3.4 Insurgem-se os autores quanto ao decidido pelo Tribunal a quo relativamente ao pedido de condenação da Ré a reconhecer [A] “[..] que a retribuição fixa dos AA. tem o valor total de €1486,16, valor que engloba as componentes “Basic”, “Number One”, “Base Supervisor” e “Uni/Med”.
Sobre este pedido, no dispositivo da sentença consta a decisão seguinte:
I. Declarar que a componente salarial “Base Supervisor” faz parte da retribuição fixa mensal do autor CC.
II. Declarar que as componentes salariais “Unimed” e “Number One CSS” fazem parte da retribuição fixa mensal dos autores”.
Na fundamentação da sentença, sobre essa questão, encontra-se o que segue:
I. Da remuneração dos autores:
Reza o artigo 258º do Código do Trabalho que “considera-se retribuição a prestação a que, nos termos do contrato, das normas que o regem ou dos usos, o trabalhador tem direito em contrapartida do seu trabalho.
2 - A retribuição compreende a retribuição base e outras prestações regulares e periódicas feitas, directa ou indirectamente, em dinheiro ou em espécie.
3 - Presume-se constituir retribuição qualquer prestação do empregador ao trabalhador.”
Como decidiu o Supremo Tribunal de Justiça no aresto de 03.11.2016, “A retribuição é constituída pelo conjunto de valores (pecuniários ou em espécie) que a entidade empregadora está obrigada a pagar regular e periodicamente ao trabalhador como contrapartida da atividade por ele desenvolvida, dela se excluindo as prestações patrimoniais do empregador que não sejam a contraprestação do trabalho prestado.
2 - Considera-se regular e periódica e, consequentemente, passível de integrar o conceito de retribuição, para os efeitos de cálculo da retribuição de férias e dos subsídios de férias e de Natal, a atribuição patrimonial cujo pagamento ocorra todos os meses de atividade do ano (onze meses).
3 - Face ao cariz sinalagmático do contrato de trabalho, a regularidade e periodicidade não constitui o único critério a considerar, sendo ainda necessário que a atribuição patrimonial constitua uma contrapartida do trabalho e não se destine a compensar o trabalhador por quaisquer outros fatores.
4 - Destinando-se o subsídio de prevenção a compensar o trabalhador pela sua disponibilidade, no seu domicílio, para eventual execução de serviços exclusivamente no âmbito da reparação inadiável de avarias, não o recebendo se tiver que prestar atividade, caso em que lhe é pago o trabalho suplementar ou o trabalho noturno, e provando-se também que o subsídio de condução se destina a compensar o trabalhador pela especial penosidade e risco decorrente da condução de veículos automóveis, os mesmos, porque não constituem a contrapartida da prestação de trabalho, não integram o conceito de retribuição, não tendo, por isso, que ser considerados para cálculo da retribuição das férias e dos subsídios de férias e de Natal.”
O Tribunal da Relação do Porto em acórdão de 10.09.2018, versou sobre esta temática da seguinte forma (com citação de doutrina): “Na definição da retribuição (stricto sensu), atento o carácter sinalagmático que informa o contrato de trabalho, só se considera retribuição aquilo a que nos termos do contrato, das normas que o regem ou dos usos, o trabalhador tem direito como contrapartida do seu trabalho.
Não integram aquele conceito de retribuição, pela ausência do elemento constitutivo da contrapartida pelo trabalho prestado, os suplementos remuneratórios recebidos pelo trabalhador a título de “Subsídio de Prevenção” pois, este, é pago para estar disponível para uma eventual chamada, fora das horas normais de serviço.
(…) Deduz-se destes preceitos que a retribuição é constituída pelo conjunto de valores (pecuniários ou não) que a entidade empregadora está obrigada a pagar, regular e periodicamente ao trabalhador, em razão da actividade por ele desenvolvida, ou, mais rigorosamente, da força de trabalho por ele oferecida (Monteiro Fernandes, “Direito do Trabalho”, Almedina, 12.ª edição, ano de 2005, pág. 455).
Quanto às atribuições patrimoniais de carácter variável, para estas integrarem o conceito de retribuição, para além de constituírem a contrapartida do trabalho, devem ser auferidas regular e periodicamente, conforme resulta do n.º 2 dos preceitos supra mencionados.
(…) E embora a lei consagre que a retribuição compreende a remuneração de base e todas as outras prestações regulares e periódicas, presumindo-se constituir retribuição toda e qualquer prestação da entidade patronal ao trabalhador, este critério assente na regularidade e periodicidade dos benefícios patrimoniais auferidos pelo trabalhador pode não se revelar suficiente, pois o intérprete deve ter sempre presente se a atribuição patrimonial paga ao trabalhador deriva duma causa específica e individualizável, diversa da remuneração do trabalho ou da disponibilidade deste.
Efectivamente, e seguindo Monteiro Fernandes, num primeiro momento, a retribuição, constituída por um conjunto de valores, é determinada pelo clausulado do contrato, por critérios normativos (como sejam o salário mínimo e o princípio da igualdade salarial) e pelos usos da profissão e da empresa; num segundo momento, a retribuição global - no sentido de que exprime o padrão ou módulo do esquema remuneratório do trabalhador, homogeneizando e sintetizando em relação à unidade de tempo a diversidade de atribuições patrimoniais realizadas ou devidas - engloba não só a remuneração de base, como também prestações acessórias, que preencham os requisitos de regularidade e periodicidade e se possam considerar como contrapartida do trabalho, ou da força de trabalho que o trabalhador disponibiliza, o que revela que o conceito civilístico da contrapartida do trabalho foi ultrapassado no moderno direito do trabalho, que passou a integrar no domínio da retribuição outros beneficias outorgados pelo empregador, regular e periodicamente concedidos.
Ora, constituindo critério legal da determinação da retribuição, a obrigatoriedade do pagamento da(s) prestação(ões) pelo empregador, dele devem ser excluídas as meras liberalidades, porque não correspondem a um dever do empregador.
Mas também temos de excluir da determinação da retribuição aquelas prestações cuja causa determinante não seja a prestação da actividade pelo trabalhador, ou a sua disponibilidade para o trabalho, mas tenham uma causa específica e individualizável, diversa da remuneração do trabalho ou da disponibilidade para este. (Monteiro Fernandes, obra citada, 457).
Assim é necessário que se possa detectar uma contrapartida específica diferente da disponibilidade da força de trabalho para que se possa colocar determinada prestação do empregador à margem do salário global. (Mesmo autor, pgª 458).
E isto apesar de, no que respeita à prova da verificação dos respectivos pressupostos, o trabalhador gozar da presunção de integrar a retribuição qualquer prestação que lhe é paga pelo empregador (n° 3 do artigo 82° da LCT e 249° n° 3 do CT), regime extremamente favorável em termos probatórios, pois bastar-lhe-á provar a percepção duma prestação pecuniária, competindo à entidade patronal a prova da não verificação dos elementos integrantes do conceito legal de retribuição.
No entanto, será sempre necessário apurar, prova que pertence ao empregador, se determinada prestação paga ao trabalhador resulta duma causa específica e perfeitamente individualizável, diversa da contrapartida do trabalho, ou da disponibilidade para o trabalho.”
No caso dos autos provou-se o seguinte quanto a esta matéria:
- Entre 4 Agosto de 2009 (data que corresponde à sua transferência para a base do …) e Abril de 2019, o Autor CC, aí já com a categoria de CSS (chefe de cabine), ocupou também o cargo de Base Supervisor.
- O mais alto cargo funcional atribuído na base do …, que corresponde a funções de chefia em terra.
- O “Complemento Base Supervisor 2009-2019” apenas foi pago o autor CC, o qual teve a categoria de Base Supervisor, constando essa componente retributiva dos seus recibos de vencimento exatamente com a descrição “Base Supervisor”.
- Os Autores, à data do seu despedimento auferiam um vencimento base ao qual acrescia um valor a título de complemento CSS (mencionado como Number One nos recibos de vencimento) e outro valor a título de Uni/Med.
- Auferindo ainda valor variável pelas horas de voo.
- Um segundo valor variável por comissão de vendas.
- Algumas das componentes variáveis, bem como o esquema de escala de trabalho/folga, eram negociados por períodos de cerca de 5 anos entre os trabalhadores (Autores) e a Ré, estabelecendo-se em adendas.
- Todos os Autores, recebiam mensalmente o complemento de chefia e de fardamento (uni/med).
- Os Autores auferiam/auferem ainda componente variável e regularmente paga, relativa às horas de voo efetivamente prestadas.
- Este valor era inicialmente pago em recibo autónomo (comumente apelidado de recibo “Inflight”- ver canto inferior esquerdo dos documentos) àquele de onde constava a retribuição base e outros complementos, como se pode constar dos documentos juntos a título de recibos de vencimento dos Autores.
- A partir do ano de 2015 todas as componentes retributivas dos Autores, incluindo as horas de voo, passaram a constar de um só documento mensal, tendo as horas de voo pagas o descritivo “Gross Sectors” nesses recibos.
- Quanto ao subsídio de CSS, trata-se de um subsídio pago aos trabalhadores da Ré que assumem, e enquanto assumem, funções de chefia a bordo das aeronaves.
- Assim, não exercendo os trabalhadores estas funções, ou deixando de as exercer – temporariamente ou permanentemente – este subsídio é retirado.
-O subsídio de CSS tinha um valor anual de € 2500.
- À semelhança da retribuição mensal, era pago em 12 prestações mensais de € 208,33, sendo que, com a passagem para a aplicação da lei portuguesa, este passou a ser pago em 14 prestações mensais de € 178,58.
- O subsídio Uni/Med/Id, é pago aos trabalhadores da Ré para os compensar dos gastos com fardamento e com os valores necessários à manutenção e renovação das identificações aeroportuárias.
- Os AA. poderiam ainda receber comissões pelas vendas a bordo do avião.
- A atribuição desta comissão estava diretamente relacionada com o desempenho do trabalhador e não estava antecipadamente garantida.
Fazendo uso dos ensinamentos vertidos nas decisões supra citadas e considerando o teor das normas é seguro afirmar que a componente “Base Supervisor” deve ser considerada como remuneração do autor CC.
Deu-se como provado que este foi o único autor que recebeu essa componente pelo que nenhum dos outros autores terá direito a ela. Contudo, relativamente ao autor CC, deu-se como provado que recebeu essa componente com carácter de regularidade e sempre como contrapartida pelo exercício de funções mais exigentes. Assim, procede esta pretensão do autor CC.
O mesmo se diga quanto ao componente “Unimed” que sempre foi pago aos autores e que visava compensa-los pelas despesas com o fardamento. Ora, esta quantia era indissociável do trabalho prestado pelos autores e sempre foi paga ao longo dos respectivos contratos de trabalho. Por conseguinte, os autores têm direito a ver integrados nos seus vencimentos a aludida quantia intitulada “Unimed”.
Finalmente, pensamos que a solução a adoptar quanto à componente “Number One CSS” deve trilhar o mesmo caminho. Trata-se de uma quantia paga regularmente e como contrapartida directa de trabalho prestado e que correspondia a funções com maior responsabilidade. O argumento da ré de que se trata de uma componente dependente do exercício de determinadas funções corrobora justamente a nossa convicção no sentido de que esta componente deve ser considerada como fazendo parte do salário. No nosso ordenamento jurídico vigora o princípio da irredutibilidade do salário consagrado no artigo 129º, n.º 1, al. d) do Código do Trabalho. Está vedada à ré, salvo em situações excepcionais, despromover os autores e, com isso, reduzir o respectivo salário.
Pelo exposto, procede também esta pretensão dos autores».
Alegam os recorrentes que o Tribunal a quo apenas deu como procedente parte do pedido ao reconhecer que os subsídios CSS e Uni/med integram o vencimento base dos AA, na lógica (errada) de que aceitaram receber a sua retribuição anual em 14 vezes, o que nunca aconteceu, considerou os valores atualmente pagos mensalmente como corretos. No entanto, provado que tal não ocorreu, e que os subsídios de férias e de Natal não integram o montante do “salário anual bruto de base” (“basic gross anual salary” na redação em inglês) mas sim, acrescem ao mesmo, deveria ter procedido o pedido dos AA nesta parte, reconhecendo-se que a retribuição mensal dos AA é €1.486,16 ilíquidos, o que incluí apenas as componentes “Basic”, “number one” e “Uni/Med”, excluindo desse valor os subsídios de férias e de natal.
Pedem que a sentença seja parcialmente revogada nesta parte, sendo substituída por outra que reconheça que a retribuição fixa dos AA. tem o valor total de €1486,16, valor que engloba as componentes “Basic”, “Number One”, “Base Supervisor” e “Uni/Med”.
Contrapõe a recorrida, no essencial, que tendo sido decidido que os subsídios de férias e Natal não são devidos, naturalmente, este pedido estava votado ao insucesso, pois conceder o requerido pagamento de € 1247,50 + € 208,33 * 14 seria atribuir aos Apelantes o pagamento dos referidos subsídios, o que seria contraditório com a decisão sobre esse tema. Ao atender-se, por completo, o pedido dos Apelantes (pretendem os apelantes receber 14 vezes 1.247,50 + 208,33 e ainda receber os subsídios de férias e de Natal), o Tribunal estaria a condenar a Apelada a pagar os subsídios de férias e de Natal 2 vezes, o que não tem qualquer cabimento.
Conclui, que “Este pedido, e referência a redução retributiva a que os Apelantes se dedicam à exaustão na sua peça, não tem outro fim que não confundir o Tribunal, tentando sempre afastar a discussão lógica”.
Passando à apreciação, devemos começar por assinalar que a questão é colocada de forma confusa, não só pelos recorrentes, como também pela recorrida. Procurando tornar o ponto mais claro, na sua apreciação o Tribunal a quo não afirmou, em termos expressos e claros, as consequências decorrentes de ter concluído que os subsídios “Unimed” e “Number One CSS” integram a retribuição dos Autores, nomeadamente, não precisou o valor da retribuição mensal. Não obstante, uma coisa resulta clara: na apreciação deste ponto o Tribunal a quo não apreciou nem nada decidiu quanto aos subsídios de Natal e Férias, apenas tendo concluído que os subsídios CSS e Uni/med integram a retribuição dos AA.
Resulta também claro que o Tribunal a quo entendeu que «[..] a componente “Base Supervisor” deve ser considerada como remuneração do autor CC», mas que resultou provado «[..] que este foi o único autor que recebeu essa componente pelo que nenhum dos outros autores terá direito a ela».
Daí que, com o devido respeito, sejam aqui despropositados os argumentos discordantes dos AA e concordantes da Ré sobre o que o Tribunal a quo decidiu quanto ao direito aos subsídios de Natal e Férias, que é questão diversa, assim como também é a de saber qual a retribuição a considerar para determinar os respectivos valores.
O que está aqui em causa é saber se face ao decidido pelo Tribunal a quo é de concluir que a retribuição mensal dos AA tem o valor ilíquido total de € 1 486,16, como pediram fosse declarado [al. A), dos pedidos], em resultado de englobar as componentes “as componentes “Basic”, “Number One”, “Base Supervisor” e “Uni/Med”. Para não se perder de vista, repete-se o pedidos dos autores: “A) Ser reconhecido que a retribuição fixa dos AA. tem o valor total de €1486,16, valor que engloba as componentes “Basic”, “Number One”, “Base Supervisor” e “Uni/Med”.
Como segunda nota, cabe deixar esclarecido não olvidarmos que na ampliação do objecto do recurso a Recorrida põe em causa essa decisão quanto ao subsídio “Unimed”. Porém, por se nos afigurar que facilita a compreensão das questões colocadas aqui pelos recorrentes e ali pela recorrida, optamos por a apreciar de seguida, após nos debruçarmos sobre os argumentos das partes quanto ao decidido pelo Tribunal a quo quanto a este pedido.
Com relevo para o ponto está provado, tal como refere o tribunal a quo o seguinte:
7. E os Tripulantes de Cabine que exercem funções de Chefe de Cabine, designam-se como “Costumer Service Supervisor - CSS” ou “Number one” (Número um, em português).
8. A autora AA desempenhou funções da categoria de CSS (chefe de cabine) desde o ano de 2011.
13. O Autor BB ocupa a categoria de CSS (chefe de cabine) desde a data de outorgação do contrato junto cuja execução teve início a 1 de Novembro de 2015.
16. Entre 4 Agosto de 2009 (data que corresponde à sua transferência para a base do …) e Abril de 2019, o Autor CC, aí já com a categoria de CSS (chefe de cabine), ocupou também o cargo de Base Supervisor.
19. A partir de 03/09/2009 o Autor DD passou a prestar ininterruptamente a sua atividade diretamente à Ré A... a partir do Aeroporto ... com a categoria de CSS (definitivo a partir de 2010).
24. A partir de 25/10/2009 a Autora [EE] passou a prestar ininterruptamente a sua atividade diretamente à Ré A..., a partir do Aeroporto ..., com a categoria de CSS.
37. Os Autores, à data do seu despedimento auferiam um vencimento base ao qual acrescia um valor a título de complemento CSS (mencionado como Number One nos recibos de vencimento) e outro valor a título de Uni/Med.
59. Os Autores são Tripulantes de Cabine, com categoria de chefe de cabine
127. Nos termos da lei irlandesa, a remuneração dos trabalhadores é paga em 12 mensalidades anuais, pelo que a retribuição mensal dos AA. foi estipulada em € 1.247,50.
130. Não tendo os AA. manifestado a sua vontade, a Ré, passou a retribuir os AA. 14 vezes por ano, mantendo o valor global anual (€ 14.970,00) mas passando o valor mensal para € 1.069,29.
132. Quanto ao subsídio de CSS, trata-se de um subsídio pago aos trabalhadores da Ré que assumem funções de chefia a bordo das aeronaves.
134. O subsídio de CSS tinha um valor anual de € 2500.
135. À semelhança da retribuição mensal, era pago em 12 prestações mensais de € 208,33, sendo que, com a passagem para a aplicação da lei portuguesa, este passou a ser pago em 14 prestações mensais de € 178,58.
136. O subsídio Uni/Med/Id, é pago aos trabalhadores da Ré para os compensar dos gastos com fardamento e com os valores necessários à manutenção e renovação das identificações aeroportuárias.
190. O subsídio de CSS tinha um valor anual de € 2500.
191. À semelhança da retribuição mensal, era pago em 12 prestações mensais de € 208,33, sendo que, com a passagem para a aplicação da lei portuguesa, este passou a ser pago em 14 prestações mensais de € 178,58.
193. No que diz respeito ao subsídio Uni/Med/Id, este é pago aos trabalhadores da Ré para os compensar dos gastos com fardamento e com os valores necessários à manutenção e renovação das identificações aeroportuárias.
Procurando objectivar a questão com o rigor devido, a remuneração mensal dos AA, que foi estipulada em € 1.247,50, e lhes era paga em 12 mensalidades anuais [facto 127], totaliza ao ano o valor global anual de € 14.970,00, referido no facto 130.
Sucede, como se retira dos factos 140 a 145 e 196 a 197 – onde constam os quadros dos valores anuais pagos a cada um dos autores ao longo dos anos- , que esse montante anual de € 14.970,00, só lhes passou a ser pago a partir do ano de 2016, inclusive, mantendo-se até ao ano de 2020. Nos anos anteriores, os valores são inferiores: 2009 a 2011, o montante anual de 12 270 €; e, 2012 e 2013, o montante anual de 13 770.
Tal resulta dos factos acima enunciados e, também, dos quadros dos factos 140 a 145 e 196 a 197.
Por outro lado, como também se retira daqueles mesmos quadros, o montante de € 2 500, referido nos factos 134 e 190 como valor do subsídio CSS, só passou a ser pago no ano de 2018, mantendo-se em 2019 e 2020. Anteriormente tinha valores inferiores.
Dividido aquele valor por 12, obtém-se o resultado de € 208,33, de resto como provado no facto 191. Mas como decorre do que se deixou dito, esse valor só é válido a partir de 2018.
No que concerne ao valor do subsídio Uni/Med/Id, não há um facto provado que refira o valor em termos similares ao que se encontra quando ao subsídio CSS nos factos 134 e 190. Não obstante, decorre dos quadros dos factos 140 a 145 e 196 a 197, que o valor anual entre 2010 e 2021, foi sempre de € 400. Assim, dividindo esse valor por 12, encontra-se o valor mensal de € 33,33.
Servindo-nos dos valores anuais e mensais mais recentes, nomeadamente, dos que se mantiveram constantes desde 2018, apura-se que o valor da retribuição mensal era de € 1.247,50, ao que acresciam os valores mensais de € 208,33, relativo ao Subsídio CSS, e € 33,33, este respeitante ao subsídio Uni/Med/Id..
A soma desses valores totaliza 1.489,16 €. Mas como se retira do que vem sendo explicado, a soma da retribuição mensal com os subsídios CSS e Uni/Med/Id., só tem esse valor a partir de 2018.
Aqui chegados já se vê que o pedido formulado pelos AA enferma de um erro e de uma imprecisão. Erro, dado que o alegado valor de € 1486,16 – referido no pedido e reiterado no recurso – não pode englobar todas as componentes salariais que mencionaram e agora repetem, ou seja, «“Basic”, “Number One”, “Base Supervisor” e “Uni/Med”», mas apenas duas delas: CSS (mencionado como Number One nos recibos de vencimento) e Uni/Med/Id. Imprecisão, na medida em que aquele valor (que também contém um erro, mas resultante de manifesto lapso de escrita), só foi atingido a partir de 2018.
Daí que o pedido formulado pelos AA., não pudesse ser atendido nos termos em que foi formulado, ou seja, declarando-se que a sua retribuição mensal tem o valor ilíquido total de € 1 486,16.
Atento o que se expôs, verifica-se que o Tribunal a quo acolheu a pretensão dos AA. ao declarar “I. [..] que a componente salarial “Base Supervisor” faz parte da retribuição fixa mensal do autor CC” e “II. [..] que as componentes salariais “Unimed” e “Number One CSS” fazem parte da retribuição fixa mensal dos autores”, apenas não a acolhendo quanto ao “valor total de 1 486,16 €”, nem a podendo ter acolhido pelas razões explicadas.
No entanto, e esse é um aspecto fulcral, note-se que pelo facto de não ter sido “[..] reconhecido que a retribuição fixa dos AA. tem o valor total de €1486,16 [..]”, não resulta qualquer decaimento para os AA, já que o demais decidido, reconhecendo que aquelas componentes salariais “fazem parte da retribuição fixa mensal dos autores”, são a premissa para chegar aos valores auferidos – com essa qualificação – ao longo das respectivas relações laborais dos autores.
Por conseguinte, contrariamente ao que defendem os recorrentes, porventura por não terem interpretado devidamente a sentença enredados no imbróglio que eles próprios criaram, não há o alegado erro de julgamento do Tribunal a quo quanto à apreciação do pedido da alínea A. Poderá dizer-se que o Tribunal a quo poderia ter tido o cuidado de tornar mais clara a fundamentação, mas isso é coisa diferente.
Por conseguinte, improcede esta parte do recurso.
II.3.4.1 Ampliação do objecto recurso
Aqui chegados, importa ter presente o que começámos por deixar assinalado no inicio da apreciação do ponto imediatamente antecedente, ou seja, que na ampliação do objecto do recurso a Recorrida põe em causa o decidido pelo tribunal a quo quanto ao subsídio “Unimed”, questão que passamos a apreciar de já de seguida.
Defende a recorrida que o subsídio Uni/Med constitui uma ajuda para suporte de custos que não tem a natureza de retribuição pois não é contrapartida do trabalho. Este subsídio é pago aos trabalhadores para os compensar dos gastos com fardamento e com os valores necessários à manutenção e renovação das identificações aeroportuárias, pelo que não se trata de uma contrapartida da execução do trabalho mas sim uma compensação por despesas incorridas pelos trabalhadores. E isto mesmo foi dado como provado pelo Tribunal a quo, devendo a decisão do Tribunal a quo ser revogada quanto a esta matéria e ser substituída por outra que decida que o subsídio Uni/Med não integra o vencimento base dos AA.
Invoca o acórdão do TRL de 12.03.2009 [Proc. n. 2195/05.8TTLSB-4, Desembargador Ferreira Marques, disponível em www.dgsi.pt], transcrevendo o respectivo sumário, onde se lê o seguinte:
“1. As prestações regulares e periódicas pagas pelo empregador ao trabalhador, independentemente da designação que lhes seja atribuída no contrato ou no recibo, só não serão consideradas parte integrante da retribuição se tiverem uma causa específica e individualizável, diversa da remuneração do trabalho.
2. Compete ao empregador provar que as quantias que paga mensalmente ao trabalhador, a título de ajudas de custo, constituem verdadeiras ajudas de custo, ou seja, se destinam a ressarcir o trabalhador de despesas efectuadas ao serviço ou no interesse da empresa.
3. Se conseguir provar que o pagamento dessas quantias tinha aquele destino ou tinha uma causa específica e individualizável, diversa da remuneração do trabalho, tais importâncias não podem considerar-se parte integrante da retribuição, a não ser que o trabalhador consiga provar que as mesmas excediam as despesas por ele realmente efectuadas e a medida em que excediam, bem como que essas importâncias tinham sido previstas no contrato e devem considerar-se (na parte respeitante a esses excedentes) pelos usos da empresa como
elemento integrante da sua retribuição.”
Vejamos.
A noção legal de retribuição, actualmente no art.º 258.º do CT/09, com a epígrafe “Princípios gerais sobre a retribuição”, é a seguinte:
1 - Considera-se retribuição a prestação a que, nos termos do contrato, das normas que o regem ou dos usos, o trabalhador tem direito em contrapartida do seu trabalho.
2 - A retribuição compreende a retribuição base e outras prestações regulares e periódicas feitas, directa ou indirectamente, em dinheiro ou em espécie.
3 - Presume-se constituir retribuição qualquer prestação do empregador ao trabalhador.
4 - À prestação qualificada como retribuição é aplicável o correspondente regime de garantias previsto neste Código.
Como sintetizado no sumário do acórdão desta Relação e secção de 23-01-2023, relatado pelo aqui relator [Proc.º 1883/21.6T8MAI.P1, Disponível em www.dgsi.pt]: «I - A noção de retribuição, abrange quer a retribuição base, isto é, “aquela que, nos termos do contrato ou instrumento de regulamentação colectiva de trabalho, corresponde ao exercício da actividade desempenhada pelo trabalhador de acordo com o período normal de trabalho que tenha sido definido”, quer todas as demais prestações que tenham caráter regular e periódico, feitas directa ou indiretamente, em dinheiro ou espécie, quer seja por força da lei, quer por imposição de instrumento de regulamentação colectiva ou, ainda, decorrente de prática da empresa, também elas correspondendo ao direito do trabalhador como contrapartida do seu trabalho».
Servindo-nos da fundamentação do citado aresto, a esse propósito, refere-se o seguinte:
Da noção legal de retribuição retira-se que a mesma compreende o conjunto de valores que a entidade empregadora está obrigada a pagar regular e periodicamente ao trabalhador em contrapartida da actividade por ele desempenhada, presumindo-se, até prova em contrário, constituir retribuição toda e qualquer prestação da entidade patronal ao trabalhador (art.º 82.º LCT/art.º 249.º CT/03/art.º 258.º CT/09). De acordo com as regras gerais da repartição do ónus de prova, cabe ao empregador ilidir a presunção.
Como melhor elucida Monteiro Fernandes, reportando-se ao actual art.º 258.º do CT/09 - correspondente ao art.º 249.º do CT/03 e 82.º da LCT -, a noção legal de retribuição consiste no conjunto de valores (pecuniários ou não) que a entidade patronal está obrigada a pagar regular e periodicamente ao trabalhador em razão da actividade por ele desempenhada (ou, mais rigorosamente, da disponibilidade da força de trabalho por ele oferecida) [Direito do Trabalho, 14.ª Edição, Almedina, Coimbra, 2009, p. 479].
Assim, esta noção mais ampla de retribuição, abrange quer a retribuição base, isto é, “aquela que, nos termos do contrato ou instrumento de regulamentação colectiva de trabalho, corresponde ao exercício da actividade desempenhada pelo trabalhador de acordo com o período normal de trabalho que tenha sido definido”, quer todas as demais prestações que tenham caráter regular e periódico, feitas directa ou indiretamente, em dinheiro ou espécie, quer seja por força da lei, quer por imposição de instrumento de regulamentação colectiva ou, ainda, decorrente de prática da empresa, também elas correspondendo ao direito do trabalhador como contrapartida do seu trabalho.
A Lei não diz quando deve considerar-se que uma prestação é regular e periódica nem estabelece um critério para calcular um valor médio. Mas não se vê sequer que o pudesse fazer, pois a regularidade e a periodicidade dependerá sempre da prestação em concreto, que não se limita à retribuição base.
Com a expressão “regular”, a lei refere-se a uma prestação não arbitrária, que segue uma regra permanente, sendo, pois, constante. E ao exigir o carácter “periódico” para que a prestação se integre na retribuição, a lei considera que ela deve ser paga em períodos certos no tempo ou aproximadamente certos, de forma a inserir-se na própria ideia de periodicidade típica do contrato de trabalho e das necessidades recíprocas dos dois contraentes [Cfr. Ac. do STJ de 13.01.93 CJ/STJ, Ano I, Tomo 1º, pág. 226; e, Acórdão da Relação de Lisboa, de 08-11-2006, proc.º n.º 7257/2006-4 FERREIRA MARQUES, disponível em www.dgsi.].
À luz desse entendimento, admitia-se, p. ex. que uma prestação paga, pelo menos, 6 vezes ao ano fosse susceptível de ser considerada regular e periódica, integrando o conceito de retribuição. Mas como é sabido, acontece que o entendimento da jurisprudência divergiu quanto a saber quando deve considerar-se, atentos os pagamentos efectuados ao longo de um ano, que determinada prestação é regular e periódica.
O Acórdão de 1 de Outubro de 2015, do STJ, com o valor do proferido em julgamento ampliado da revista, em processo civil, que fixou a interpretação da cláusula 12.ª do Regulamento de Remunerações, Reformas e Garantias Sociais, integrado no AE entre a D..., S. A. e o SNPVA, para chegar a essa interpretação acabou por “estabelecer um critério orientador que permita aferir o que é e o que não é regular e periódico”, em concreto: “considerar-se regular e periódica e, consequentemente, passível de integrar o conceito de retribuição, para os efeitos em causa, a atribuição patrimonial cujo pagamento ocorre todos os meses de atividade do ano”.
Dito por outras palavras, há luz deste critério, que vem sendo seguido pela jurisprudência, segundo cremos quase unanimemente, considera-se regular e periódica uma prestação pecuniária que seja paga ao trabalhador pelo menos 11 meses no período de um ano de trabalho.
Dando de novo a palavra a Monteiro Fernandes, assinala este autor que “O problema da qualificação jurídica de cada uma das atribuições patrimoniais feitas pelo empregador ao trabalhador, por referência ao conceito de retribuição, ganhou uma acuidade singular com a amplificação do leque daqueles atribuições, na contratação colectiva e na prática das empresas. (.. ). Em muitos casos, com efeito, o trabalhador não recebe apenas da entidade patronal a quantia certa, paga no fim de cada semana, quinzena ou mês, que vulgarmente se designa salário, ordenado ou vencimento (e a que, tecnicamente, se costuma aplicar o rótulo de vencimento base). Certo é que essa prestação regular e periódica é aquela que não só pretende corresponder directamente a uma certa «medida» da prestação de trabalho, mas também acompanha um dado «ritmo» de satisfação de necessidades – a das necessidades correntes, do dia a dia – do trabalhador e da sua família” [Op. cit. pp. 476/477].
Na verdade, é sabido existir um vasto leque de outras prestações complementares que tanto poderão ser regulares e periódicas – p. ex. acompanhando o pagamento da retribuição base ou, trimestral, semestral ou anual – como nem sequer terem periocidade – p. ex. por estar dependente de serem atingidos determinados resultados pela empresa. Por um lado, por efeito da lei ou de instrumento de regulação colectiva, a par da retribuição base são devidas outras prestações pecuniárias de diversa natureza e periodicidade. Por outro, como também assinala Monteiro Fernandes, «(..) por razões diversas – desde as que se relacionam com propósitos de aligeiramento da carga fiscal e para-fiscal até às derivadas da intenção de ladear limitações governamentais em matéria de políticas de rendimentos – se registou, sobretudo a partir dos anos oitenta do século passado, uma considerável proliferação de «títulos» pelos quais são efectivadas vantagens económicas aos trabalhadores. Essa proliferação originou uma nebulosa de conceitos (subsídios, abonos, compensações, indemnizações, prémios, complementos de prestações de segurança social, valores de uso de bens da empresa) que, referidos ou não ao pilar central do «sistema» remuneratório (a retribuição «certa» ou «de base» que o empregador está obrigado a pagar por mês ou com diferente periodicidade, transportam consigo uma certa indeterminação quanto ao nexo de correspectividade com a prestação de trabalho» [Op. cit, p. 476].
Essas prestações complementares, embora não se possa dizer que essa seja a regra, em muitos casos estão ligadas a particularidades da prestação do trabalho. Assim acontece, com mais evidência, entre outros, nos casos da prestação de trabalho suplementar, da prestação de trabalho nocturno, da deslocação em trabalho, do trabalho com penosidade ou com perigo ou, ainda, com determinados níveis de produtividade.
Nesses casos, em que são pagas como contrapartida da prestação de trabalho em determinadas condições, por regra, essas prestações complementares apenas são devidas quando se verifique uma efectiva prestação de trabalho no condicionalismo que justificou o seu estabelecimento e apenas integrarão o conceito de retribuição se forem percebidas com uma regularidade e periodicidade tal que criem no trabalhador uma legítima expectativa quanto ao seu recebimento.
Nesse pressuposto, de acordo com o entendimento pacífico dos tribunais superiores, mormente do Supremo Tribunal de Justiça - assinalado no acórdão de 22-09-2011 - consistem em “(..) prestações complementares auferidas em função da natureza das funções ou da especificidade do desempenho (subsídio nocturno, isenção de horário e outros subsídios) [que] apenas são devidas enquanto persistirem as situações que lhes servem de fundamento, podendo a entidade empregadora suprimir as mesmas logo que cesse a situação específica que esteve na base da sua atribuição, sem que isso implique violação do princípio da irredutibilidade da retribuição“ [proc.º 913/08.1TTPNF.P1.S1, SAMPAIO GOMES, disponível em www.dgsi.pt].
Recorrendo mais uma vez ao ensinamento de Monteiro Fernandes, pronunciando-se sobre a especifica função desempenhada pelo critério legal de retribuição, conclui que o mesmo «(..) constitui, assim, o instrumento de despiste dos valores que, no seu conjunto, têm um nexo de correspectividade com a posição obrigacional do trabalhador, encarada também na sua globalidade. Ele serve, então, para definir a posteriori uma base de cálculo para certos valores derivados.», mas assinalando «que isso não legitima que o mesmo critério seja linearmente utilizado como chave-mestra de todo o regime jurídico da retribuição. Uma prestação abarcável no amplo padrão retributivo definido pelo art.º 258.º pode ter que ser afastada do campo de aplicação deste ou daquele preceito referente a retribuição. Pode ser, por exemplo, que um certo subsídio, embora pertencente à estrutura da retributiva de harmonia com o art.º 258.º, não tenha que ser incluído no cálculo do subsídio de férias ou de Natal (..)». Conclui mais adiante, nestes termos:
- “Há, pois, que assentar no seguinte: a qualificação de certa atribuição patrimonial como elemento padrão retributivo definido pelo art.º 258.º CT não afasta a possibilidade de se ligar a essa atribuição patrimonial uma cadência própria, nem a de se lhe reconhecer irrelevância para o cálculo deste ou daquele valor derivado da «retribuição».
O «ciclo vital» de cada elemento da retribuição depende do seu próprio regime jurídico, cuja interpretação há-se pautar-se pela específica razão de ser ou função desse elemento na fisiologia da relação de trabalho” [Op. cit., pp. 487/488].
Estes ensinamentos permitem retirar uma ideia fulcral [..], em suma, não basta o mero recebimento regular e periódico de uma dada prestação para lhe atribuir a natureza de retribuição, por força da presunção (ilidível) estabelecida na lei (n.º3, do art.º 82.º da LCT; n.º 3 do artigo 249.º do CT/03; e, n.º3, do art.º 258.º CT/09), impondo-se, concomitantemente, num trabalho de interpretação sobre a sua fonte legal ou convencional, indagar sobre a razão de ser da sua atribuição.».
No caso em apreciação, está provado que [136]” O subsídio Uni/Med/Id, é pago aos trabalhadores da Ré para os compensar dos gastos com fardamento e com os valores necessários à manutenção e renovação das identificações aeroportuárias”.
Para além disso, como referido no ponto antecedente, resulta provado dos factos 140 a 145 e 196 a 197, que o valor anual pago aos trabalhadores AA a título de subsídio Uni/Med/Id, ente 2010 e 2021, foi sempre de € 400, o que conduz ao valor mensal de € 33,33.
Assim, destes factos não decorre, como vem defender a recorrente, que aquele pagamento não seja uma contrapartida da forma específica da prestação da actividade, mas sim uma compensação por despesas incorridas pelos trabalhadores. Não basta a expressão “compensar” contida na redacção do facto, para se extrair essa ideia, antes sendo necessário atender às razões que justificam esse pagamento.
Ademais, o ónus de prova dos factos necessários à ilisão da presunção legal do art.º 258.º/3, do CT, recaía sobre a Ré.
Como é do conhecimento geral, os AA, tal como quaisquer outros trabalhadores que exercem o mesmo tipo de actividade usam um fardamento próprio, que tem a função de os identificar perante os passageiros como tripulantes de bordo e de os relacionar com a uma determinada companhia aérea, designadamente, aquela a quem prestam a sua actividade e que realiza determinado trajecto aéreo, ou melhor dizendo, rota aérea que lhe está. Por outro lado, pressupondo a actividade dos trabalhadores em causa que terminem ou iniciem os voos em aeroportos de diferentes países, para a poderem exercer a partir desses países e, também, para transitarem nas instalações com condições próprias, carecem de assegurar a manutenção e renovação das identificações aeroportuárias.
Os trabalhadores que prestam esta actividade estão sujeitos a cumprirem essas condições para exercerem a actividade contratada, razão que explica o pagamento regular e periódico - mensal - de uma quantia certa - € 33,33, no total de € 400 -, como contrapartida do modo específico da prestação de trabalho. Note-se, que não é paga uma quantia variável e para reembolsar os AA, por despesas efectivamente realizadas, antes lhes sendo paga esta componente remuneratória naquele valor certo.
Concluindo, não se reconhece razão à recorrente, antes merecendo a nossa concordância o entendido e decidido pelo tribunal a quo.
Improcede, pois, a ampliação do objecto do recurso.
E, logo, pode agora confirmar-se que o Tribunal a quo decidiu bem esta questão.
II.3.5 Retomando o recurso dos AA, resta apreciar a questão suscitada na conclusão K, onde se lê o seguinte:
Por último, quanto às diferenças salariais devidas aos Autores AA, BB e CC após a sua reintegração, reconhecido o pedido que antecede, passa a R. a ser igualmente devedora das diferenças salariais por desde a sua reintegração, até ao momento, vir a liquidar o vencimento desses AA em valor inferior ao que este era devido. Razão pela qual deverá a sentença a quo ser revogada nesta parte e substituída por outra que condene a R. a pagar os montantes reclamados, bem como os vencidos e vincendos deste a propositura da ação até ao seu trânsito em julgado”.
Contrapõe a recorrida que esta questão está relacionada com o pedido referente aos Subsídios de Férias e de Natal e que “[D]uplicando o seu ensejo, os Apelantes vêm mais uma vez insistir numa pretensão que lhes é sonegada por via da improcedência do seu pedido quanto aos subsídios (i.e. caso lhes fosse reconhecida razão nessa matéria, o valor reclamado já estaria aí incluído)”.

Percorrida a fundamentação da sentença, não se encontra qualquer referência a este pedido concreto.
Como as partes referem em concordância, o pedido prende-se com o reconhecimento do direito a subsídio de férias e de Natal, não reconhecido pelo Tribunal a quo. Deduz-se que o Senhor Juiz nada disse expressamente, em razão do que decidiu quanto àquela matéria inviabilizar esta pretensão destes AA.
Diga-se, ainda, que os AA. alegam sem terem tido o devido cuidado de alicerçar a sua pretensão recursiva em factos provados, nem tão pouco de concretizar com rigor o que lhes é devido.
Não obstante, passando à apreciação, começaremos por atentar na PI, dela constando, sob o título “V - Das diferenças salariais devidas aos Autores AA, BB e CC após a sua reintegração”, com relevo para o ponto, o seguinte:
279.º. Conforme ponto inicial, o valor da retribuição dos AA. é de €1247,50+€208,33+€33,33.
A título de retribuições intercalares e nos meses que se deram desde a reintegração dos AA. [..] foram liquidados os seguintes montantes ilíquidos em cada um desses meses: €1.069,29 (Basic) + €178,58 (CSS Allowance), ambos ilíquidos.
280.º. Num total de €1247,87.
281.º Quando deveria ter liquidado o valor retributivo de €1489,16 mensais.
284.º. Assim, além dos montantes já constantes nestes autos de execução, a Ré veio a tornar-se devedora de €178,21 a título de diferença salarial na componente Basic, por cada mês e Autor e €29,75.
285.º. Como tal, a Ré deve €241,29 mensais desde 1 de Dezembro de 2020 por cada um dos AA. AA, BB e CC, além dos montantes já indicados anteriormente, sem prejuízo dos juros de mora.
286.º. O que significa que à presente data a R. deve a cada um desses AA. o valor total de €2.654,19 (11 meses entre Dezembro 2020 e Outubro de 2021), montante no qual deverá ser condenada a pagar a estes Autores.
Nos factos provados, com relevo para a questão encontra-se o seguinte:
3. Depois de um despedimento colectivo os Autores AA, BB, CC e EE foram reintegrados na Ré.
37. Os Autores, à data do seu despedimento auferiam um vencimento base ao qual acrescia um valor a título de complemento CSS (mencionado como Number One nos recibos de vencimento) e outro valor a título de Uni/Med.
128. A partir de 2019 a Ré passou a aplicar a legislação portuguesa à relação laboral com todos os seus trabalhadores afetos a bases portuguesas (onde se incluíam os AA.).
129. Foi comunicado a todos os trabalhadores da Ré (incluindo os AA), que devido à transição para a lei laboral portuguesa o salário anual que vinham auferindo em 12 prestações mensais iria passar a ser pago em 14 prestações mensais, a não ser que os trabalhadores informassem a preferência pela manutenção do pagamento em 12 prestações mensais (aqui se incluindo o proporcional do subsídio de Natal e férias).
130. Não tendo os AA. manifestado a sua vontade, a Ré, passou a retribuir os AA. 14 vezes por ano, mantendo o valor global anual (€ 14.970,00) mas passando o valor mensal para € 1.069,29.
131. Com esta alteração não foi feita qualquer redução da retribuição dos AA., mantendo estes a mesma remuneração anual que sempre vinham auferindo.
Conjugando as alegações dos AA. com os factos provados – e tendo também presente o que já ficou explicado na apreciação do ponto relativo aos subsídios “Unimed” e “Number One CSS” - retira-se que a Ré ao invés de pagar a retribuição base, acrescida desses subsídios, no total mensal de € 1 489,16 [€1247,50+€208,33+€33,33], 12 vezes ao ano, passou a pagar este mesmo montante em 14 prestações.
Note-se que o valor global anual (€ 14.970,00) referido no facto 130, respeita apenas à retribuição base de € 1247,50. Com efeito € 1247,50 x 12 totaliza € 14.970,00, o mesmo valor global que passou a ser pago 14 vezes ao ano.
Como bem se percebe, e de resto foi alegado pela Ré na contestação e reiterado no recurso, entendia a Ré que desta forma cumpria a lei nacional portuguesa quando ao dever de pagamento de subsídios de férias e de Natal.
Tenha-se presente que os AA. reclamaram [art.º 281.º/pi] que a Ré, ao invés, lhes deveria ter liquidado o valor retributivo de €1489,16 mensais.
Mas concomitantemente, pediram a condenação da Ré a reconhecer o direito aos Autores receberem os Subsídios de Natal que nunca auferiram ao longo da relação laboral e a condenação no respectivo pagamento.
Tendo o recurso dos AA procedido quanto ao reconhecimento do direito a Subsídios de Natal e de Férias, por consequência lógica têm direito a ser pagos dos mesmos também desde a reintegração, atendendo ao valor da retribuição apurada. Ou seja, esta pretensão não deixa de integrar o pedido já reconhecido no recurso de condenação da Ré a pagar aos Autores os subsídios de férias e de Natal durante os períodos de vigência do contrato em que prestaram a sua actividade em território nacional, sendo os montantes a apurar em liquidação posterior nos termos dos art.ºs 609º, nº 2 e 358º, nº 2 do Código de Processo Civil.
Como referido, os o próprios AA reconhecem que este pedido prende-se com o reconhecimento do direito a subsídio de férias e de Natal. Não tendo o Tribunal a quo reconhecido tal direito, embora se tenha entendido que quanto a essa questão errou o julgamento, em coerência não poderia julgar este pedido procedente.
Por conseguinte, embora seja certo que os AA têm razão ao reclamarem estes créditos, não poderá atender-se esta pretensão de novo, ou seja, vista aqui isoladamente e descurando que estes AA, nesta parte duplicaram o pedido, o qual foi já julgado procedente neste recurso pela decisão acima referida. De outro modo, estar-se-ia a conferir-lhes uma indevida duplicação do reconhecimento do mesmo crédito.
Nesta consideração, improcede esta parte do recurso.
III. DECISÃO
Em face do exposto, acordam os Juízes desta Relação em julgar o recurso nos termos seguintes:
i) Improcedente a impugnação da decisão sobre a matéria de facto;
ii) Parcialmente procedente a impugnação por erro na aplicação do direito, revogando-se parcialmente a sentença, para em substituição:
a) Reconhecer o direito dos Autores receberem os Subsídios de Férias que nunca auferiram ao longo da relação laboral;
b) Em consequência, condenando-se a Ré a pagar aos Autores os subsídios de férias e de Natal durante os períodos de vigência do contrato em que prestaram a sua actividade em território nacional, sendo os montantes a apurar em liquidação posterior nos termos dos art.ºs 609º, nº 2 e 358º, nº 2 do Código de Processo Civil.
iii) Quanto ao mais, improcede o recurso, confirmando-se a sentença.
Custas do recurso a cargo dos recorrentes e da recorrida, na proporção do decaimento (art.º 527.º do CPC).

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Porto, 18 de Setembro de 2023
Jerónimo Freitas
Nelson Fernandes
Rita Romeira