Acórdão do Tribunal da Relação do Porto | |||
Processo: |
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Nº Convencional: | JTRP000 | ||
Relator: | PAULA LEAL DE CARVALHO | ||
Descritores: | REAPRECIAÇÃO DA DECISÃO DA MATÉRIA DE FACTO DECLARAÇÕES DE PARTE CONTRATO DE TRABALHO DE SERVIÇO DOMÉSTICO FÉRIAS E SUBSÍDIO DE FÉRIAS SUBSÍDIO DE NATAL FERIADOS OBRIGATÓRIOS DESCANSO SEMANAL OBRIGATÓRIO VIOLAÇÃO DO DIREITO A FÉRIAS | ||
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Nº do Documento: | RP2023092710418/20.7T8PRT.P1 | ||
Data do Acordão: | 09/27/2023 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Texto Integral: | S | ||
Privacidade: | 1 | ||
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Meio Processual: | APELAÇÃO | ||
Decisão: | RECURSO PARCIALMENTE PROCEDENTE; ALTERADA A SENTENÇA | ||
Indicações Eventuais: | 4ª SECÇÃO (SOCIAL) | ||
Área Temática: | . | ||
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Sumário: | I - A reapreciação da decisão da matéria de facto pela Relação não está circunscrita à verificação de erros ostensivos, manifestos ou clamorosamente evidentes, antes cumprindo à Relação proceder à reapreciação da matéria impugnada com base nos meios de prova produzidos, formando a sua própria convicção, II - As declarações de parte são um meio de prova válido, estando sujeitos, tal como a prova testemunhal, à livre convicção do julgador, tudo se reconduzindo à avaliação e ponderação que hajam de ser feitas. III - Na formação da convicção haverá também que se atender às regras da experiência e senso comuns, da lógica e da normalidade da vida. IV - A A., que estava vinculada à Ré por contrato de trabalho de serviço doméstico, tinha direito, nos termos do DL 235/92 [na redação anterior à introduzida pela Lei 13/2023, de 03.04]: ao gozo de 22 dias úteis de férias por ano; a subsídio de férias de valor igual ao da remuneração correspondente ao período de férias, não podendo esta ser inferior à que receberia se estivesse em serviço efetivo; a subsídio de Natal correspondente a um mês de retribuição; a gozar os dias feriados obrigatórios; bem como um dia de descanso semanal, no caso o domingo. V - Pagando a Ré à A., mensalmente, a quantia de €1.640,00, dos quais €1580,00 como contrapartida do trabalho prestado pela A. [em síntese, de 2ª feira a sábado, das 9h00 às 18h00 e das 23h00 às 9h00 do dia seguinte e das 00h00 às 13h00 e, pelo menos, das 23h00 às 24h00 de domingo] e, os restantes €60,00 a título de compensação por domingos e feriados não gozados, o subsídio de férias deve corresponder a €1.640,00 e, o subsídio de Natal, a €1.580,00, este nos termos do art. 12º, nº 2, do DL 235/92, conjugado com os arts. 263º e 262º, nº 1, do CT/2009, subsidiariamente aplicáveis ex vi do art. 9º deste. VI. Não tendo a A. gozado os feriados obrigatórios, nem gozado os feriados em qualquer outro dia, tem aquela direito ao pagamento da retribuição correspondente aos feriados não gozados. VII. Não tendo a A. gozado o descanso semanal obrigatório (no caso o domingo), nem gozado descanso compensatório correspondente, e não podendo este vir a ser gozado dada a cessação do contrato de trabalho, tem aquela direito a receber a retribuição correspondente aos descansos semanais não gozados. VIII - Tendo-se provado que a A. não gozou férias dada a necessidade, nos termos da matéria de facto provada, da prestação da assistência à Ré de que esta carecia e uma vez que esta e sua família não a substituíram por outra pessoa que a prestasse, há que concluir que a Ré obstou a que a A. haja gozado férias, verificando-se, por consequência, a violação do direito a férias, o que confere o direito a receber, a título de indemnização, o dobro da retribuição correspondente ao período em falta (art. 21º do DL 235/92). | ||
Reclamações: | |||
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Decisão Texto Integral: | Procº nº 10418/20.7T8PRT.P1 Relator: Paula Leal de Carvalho (Reg. nº 1350) Adjuntos: Des. Rui Penha Des. Jerónimo Freitas Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação do Porto: I. Relatório AA intentou ação declarativa de condenação, sob a forma de processo comum, contra BB tendo formulado os seguintes pedidos: “A – ser reconhecida a existência de um contrato de serviço doméstico entre a Autora e a Ré com início a 23 de Fevereiro de 2005, contra a remuneração mensal ilíquida de 1.640,00 Euros; E 1. Ser a Ré condenada a pagar à Autora a quantia de 7.986,80 Euros a título da compensação prevista no n.º 3 do artigo 28.º do DL 235/92, de 24 de Outubro; 2. Ser a Ré condenada a pagar à Autora 1.230,00 Euros correspondentes ao pagamento do remanescente da retribuição por inteiro do mês de Outubro de 2019, nos termos do n.º 3 do artigo 28.º do DL 235/92, de 24 de Outubro; 3. Ser a Ré condenada a pagar à Autora 15.332,82 Euros a título de Subsídio de Férias não pago nos anos de 2005, 2006, 2007, 2008, 2009, 2010, 2011, 2012, 2013, 2014, 2015, 2016, 2017, 2018 e 2019; 4. Ser a Ré condenada a pagar à Autora 13.502,82 Euros a título de Subsídio de Natal não pago nos anos de 2005, 2006, 2007, 2008, 2009, 2010, 2011, 2012, 2013, 2014, 2015, 2016, 2017, 2018 e 2019; 5. Ser a Ré condenada a pagar à Autora a quantia de 15.625,64 Euros a título de indemnização pela violação do direito a férias nos anos de 2015, 2016, 2017, 2018 e 2019. 6. Ser a Ré condenada a pagar à Autora a quantia de 42.305,12 Euros em virtude da violação do descanso semanal da Autora e da prestação de trabalho em dias feriados, entre 1 de Janeiro de 2011 e 5 de Outubro de 2019 E 7. Ser a Ré condenada a pagar à Autora a quantia de 2.500,00 Euros a título de danos não patrimoniais sofridos por esta última, tudo acrescido dos juros vincendos até ao efectivo e integral pagamento do montante a que vier a ser condenada; Para tanto, e em síntese: invocou a existência de contrato de trabalho celebrado com a R. para exercer funções como empregada doméstica da mesma, tendo-se este contrato iniciado em 2005 e passado por várias alterações, nomeadamente quanto ao horário de trabalho que foi acordado entre ambas e que, a partir de 2006, passou a ser de 2ª a 6ª feira entre as 09h00 e as 17h00 horas e depois integrando também trabalho prestado aos sábados entre as 09h00 e as 14h00 horas; sendo que, a partir de Janeiro de 2011, a A. passou a pernoitar em casa da R. trabalhando na sua residência todos os dias da semana, dada a idade avançada da mesma. Alega também a A. que não lhe foram liquidados os montantes devidos a título de subsídio de férias e de Natal, nem jamais lhe foi permitido gozar férias, pelo que deverão ser fixados os respetivos montantes e condenada a R. no respetivo pagamento; acrescem ainda a estes valores, as quantias devidas pelo trabalho prestado aos domingos e feriados, trabalhando a demandante de forma contínua. Mais invocou que este vínculo laboral cessou por vontade unilateral da demandada, pelo que deverá ser fixada a respetiva compensação, peticionando a condenação da R. no pagamento das quantias peticionadas a título indemnizatório, aqui integrada quantia que peticiona a título de indemnização pelos danos não patrimoniais e de créditos laborais, bem como os respetivos juros moratórios. Regularmente notificada a R. veio deduzir oposição ao peticionado, impugnando a factualidade descrita pela A. e alegando que, quanto à ausência de recibos de vencimento, a mesma se ficou a dever apenas à insistência da A. neste sentido, já que a mesma não pretendia declarar os seus rendimentos, sendo que os valores peticionados a título de subsídio de férias e de Natal foram sempre pagos em duodécimos, recebendo-os conjuntamente com os seus vencimentos pagos em numerário, uma vez que para além do seu vencimento a A. gozava também de alojamento e de alimentação suportados pela R. Invoca ainda que nos montantes mensais liquidados, que nos últimos anos ascendia a €1.200,00 já se incluíam também as compensações devidas pelo trabalho prestado aos domingos e feriados. Já no que se refere ao gozo de férias, considera a R. que as mesmas nunca foram solicitadas pela A., nem negadas pela R., pelo que não lhe são devidos os montantes peticionados a este título, sendo certo que era a demandante quem não pretendia gozar qualquer período de férias. Acrescenta ainda a demandada que, a partir do momento em que passou a pernoitar em casa da R. a aqui demandante passou a definir autonomamente o seu horário de trabalho, pausas e dias de descanso, gozando de total autonomia neste aspeto, ausentando-se de casa da demandada quanto assim o entendia. Já no âmbito dos danos não patrimoniais invocados pela A. entende a R. que os mesmos não lhe são devidos, já que a deslocação desta última para uma residência de idosos, se ficou a dever à falta de competência da A. para lhe prestar os cuidados necessários e era assunto recorrente de que a demandante tinha conhecimento. Atento os motivos acima expostos considera a R. que a ação deverá ser julgada improcedente e a mesma absolvida de todos os pedidos formulados, devendo ainda a A. ser considerada como litigante de má-fé e em conformidade ser condenada a pagar multa e indemnização. Mais peticiona, em sede de pedido reconvencional, a condenação da A. no pagamento da quantia de € 90.000,00 a título de indemnização pelos danos morais causados pela conduta negligente daquela mesma demandante. Em sede de articulado de resposta à contestação a A. veio impugnar a versão dos acontecimentos tal como relatada pela R. na sua oposição, reiterando os factos já vertidos na petição inicial e concluindo no sentido do indeferimento da reconvenção, que considera inadmissível, devendo ainda, caso assim não se entenda, julgar improcedente aquele pedido reconvencional e condenar-se a R. por litigância de má-fé em multa e indemnização à A. Foi proferido despacho saneador, tendo sido indeferida liminarmente a reconvenção deduzida pela R.; foi dispensada a seleção dos temas da prova e fixado à ação o valor de €98.483,20. Foi realizada produção antecipada de prova – cfr. acta de 30/06/2021 – a qual teve por objeto o depoimento de parte da R. Procedeu-se à realização da audiência de julgamento, após o que foi proferida sentença que julgou a ação “parcialmente procedente por provada e em consequência condena-se a R. a pagar à A. a quantia de € 13.690,00 (treze mil seiscentos e noventa euros) a título de créditos laborais vencidos e não liquidados e de compensação pela caducidade do contrato que vigorou entre as partes, acrescida dos respectivos juros de mora vencidos à taxa legal, desde a citação e nos vincendos, até integral pagamento, absolvendo-se a R. do demais peticionado. Custas por ambas as partes na proporção do respectivo decaimento.” Inconformada, a A. recorreu, tendo formulado as seguintes conclusões: ……………………………… ……………………………… ……………………………… A Ré/Recorrida contra-alegou, não tendo formulado conclusões, pugnando pelo não provimento do recurso. O Exmº Sr. Procurador Geral Adjunto emitiu douto parecer no sentido que se passa a transcrever: “2. Da leitura da sentença e demais elementos constantes do processo, entende-se que, salvo melhor opinião, assiste razão à Recorrente no que diz respeito à violação do direito a férias. Com efeito nas declarações prestadas e transcritas na alegação de recurso, da testemunha indicada, apesar de filha da Autora, afirma que a mãe não gozava férias e por culpa da Ré. Não se vê razão para não ser acreditada. Assim, entende-se que os três primeiros, dos Factos não provados, deveriam ser dados como provados. E, sendo certo que a partir de certa altura – 2011 – a Autora passou a pernoitar em casa da Ré, e foi a A. que passou a definir autonomamente o seu horário de trabalho, os dias de descanso, as pausas para ir a casa, para ir passear, visitar os amigos e a família ou fazer as suas tarefas pessoais, … não competia à trabalhadora marcar férias e fazer-se substituir nas suas funções. Cabe à entidade empregadora e ao trabalhador marcar férias, mediante acordo, e, não sendo alcançado, cabe ao empregador marca-las – art.º 241º do CT. A Ré não marcava férias, recebia o trabalho da Autora e não se mostra que houvesse qualquer acordo de não gozo de férias mediante pagamento de quantia monetária. Assim, dando-se como provados, o três primeiros, dos factos não provados, e entendendo-se que foi violado o direito a férias, deveria a Ré ser condenada no pagamento à Autora da compensação a que se refere o art.º 246º do C.T. 3. Quanto ao mais, (subsidio de férias e de Natal, pagamento do trabalho em dias de descanso semanal, danos não patrimoniais), a douta sentença em recurso trata todas as questões suscitadas, e a ela aderimos, bem como às razões que determinaram a decisão e para ela se remete, devendo, com a alteração referida, ser confirmada. * Nestes termos, ressalvando sempre diferente e melhor opinião, emite-se parecer no sentido de ser dado provimento parcial ao recurso da Autora, nos termos referidos e confirmando-se, no mais, a douta sentença recorrida.” A Ré respondeu ao mencionado parecer, dele discordando. Colheram-se os vistos legais. *** II. Decisão da matéria de facto proferida pela 1ª instância [a decisão da matéria de facto dada como provada e não provada proferida pela 1ª instância não se encontra elencada com referência a números ou alíneas, pelo que a indicação da numeração, quanto aos factos provados, e de alíneas, quanto aos não provados, que a seguir se fará, é da nossa autoria por maior facilidade de exposição e compreensão]:“Após a discussão da causa, os factos que se consideram provados são os seguintes: 1. A Autora foi admitida pela Ré, mediante contrato verbal, para exercer as funções de empregada doméstica, na sua residência (apartamento T2), sita na Rua ..., n.º ..., 3.º Direito, ..., ..., a partir do dia 23 de Fevereiro de 2005. 2. Num momento inicial, no exercício das funções da Autora cabiam, entre outras, as tarefas de preparar refeições, proceder à lavagem de roupas, arrumar e limpar a casa da Ré e ir às compras. 3. Nessa altura (2005), a Autora trabalhava duas tardes por semana, em concreto, à segunda e à quinta-feira, durante quatro horas em cada tarde, auferindo a quantia mensal de €160,00, a qual lhe era paga em numerário. 4. Já no decurso do ano de 2006, a Autora, de comum acordo com a Ré, começou a trabalhar de segunda a sexta-feira, das 09:00 às 17:00, e passou a auferir a quantia mensal de €800,00 (também paga em numerário). 5. Em face do horário praticado, a Autora almoçava em casa da Ré. 6. Em Fevereiro de 2007, e por determinação expressa da Ré, além do horário que a Autora cumpria de segunda a sexta-feira, conforme já se aludiu supra, começou, ainda, a trabalhar ao Sábado entre as 09:00 e as 14:00 o que sucedeu até 2011. 7. Em virtude dessa alteração, a partir do mês de Fevereiro de 2007, a Autora passou a auferir €900,00 (novecentos euros) mensais, que eram liquidados em numerário. 8. Até ao ano de 2010, a Autora não recebeu qualquer montante a título de subsídio de férias ou a título de subsídio de Natal, tendo auferido em 2010 os subsídios de férias e de Natal e a partir de 2011 estas mesmas quantias em duodécimos juntamente com os seus vencimentos. 9. A partir de 1 de Janeiro de 2011, atendendo à idade avançada da Ré e aos cuidados constantes que era necessário prestar-lhe, a Autora começou a trabalhar diariamente, pernoitando em casa da aqui R. 10. No período compreendido entre as 18:00 e as 23:00, a Autora ia habitualmente até a sua casa visitar a sua família, tratar da sua mãe e preparar o jantar para o marido e netos, ausentando-se ainda durante o dia de acordo com as suas necessidades, sendo por vezes substituída pela sua filha, a quem a R. remunerava no valor de € 5,00/hora. 11. A partir dessa data (2011), a Autora era, além do mais, a cuidadora informal da Ré. 12. A Ré, de idade avançada (actualmente, tem 92 anos de idade) e viúva, vivia sozinha na sua casa, sita em ..., na Rua ..., n.º ..., 3.º Direito. 13. Durante o dia, a Autora ajudava a Ré nas suas actividades da vida diária, fazia-lhe companhia e realizava as tarefas domésticas/ os recados de que esta última lhe incumbisse. 14. Em 2010, em data que a Autora não pode precisar, mas por volta do mês de Junho, a Autora solicitou expressamente à Ré que esta lhe pagasse, finalmente, os montantes que lhe eram devidos àquele título. 15. A Ré comunicou então à Autora que, a partir daí, lhe pagaria € 400,00 a título de subsídio de férias e igual montante a título de subsídio de Natal, o eu sucedeu no decurso desse ano. 16. A partir de 1 de Janeiro de 2011, e em virtude da alteração no seu horário de trabalho, a Autora passou a auferir € 1.640,00 por mês. 17. A Ré nunca comunicou a situação da Autora à Segurança Social ou às Finanças; a Ré nunca entregou à Autora qualquer recibo de vencimento, o qual era sempre liquidado em numerário. 18. Durante todo o lapso temporal em que trabalhou para a Ré, a Autora nunca teve nenhum seguro de acidentes de trabalho. 19. No dia 14 de Setembro de 2019, a Ré e a sua sobrinha, a D. CC comunicaram verbalmente à Autora que a Ré iria passar a residir num lar, termos em que o contrato de trabalho da Autora caducaria no dia 5 de Outubro de 2019, altura em que a Ré deixaria de viver na sua casa. 20. Até à data em que alegadamente caducou o seu contrato (no dia 5 de Outubro de 2019) a Autora continuou a apresentar-se ao serviço e a desempenhar as suas tarefas habituais. 21. A A. não efectou contribuições para a Segurança Social no período em apreço e apresentou as declarações de rendimentos para efeitos fiscais, conjuntamente com o seu cônjuge, que constam dos documentos juntos aos autos a seguir à acta de 09/02/2022, não tendo ali indicado quaisquer rendimentos por si auferidos entre 2015 e 2019. 22. A partir de 2011, inclusive, os subsídios de férias e de Natal foram pagos em duodécimos, ou seja, a quantia que a A. recebia todos os meses, em numerário, incluía também uma verba referente aos subsídios de férias e de Natal e uma compensação pelo trabalho aos domingos e feriados em que a mesma trabalhasse. 23. A A. não possui qualquer formação em enfermagem ou geriatria. 24. Desde que passou a pernoitar em casa da Ré, foi a A. que passou a definir autonomamente o seu horário de trabalho, os dias de descanso, as pausas para ir a casa, para ir passear, visitar os amigos e a família ou fazer as suas tarefas pessoais, sendo que pernoitava e fazia a maioria das suas refeições em casa da Ré, a expensas desta. * FACTOS NÃO PROVADOS Com relevo para a decisão de mérito a proferir, os factos que se consideram como não provados, são os seguintes: a. Até ao ano de 2010, a Autora não gozou férias. A Autora, ao longo dos quase 15 anos em que trabalhou para a Ré, não gozou férias, como tanto queria. E não as gozou porque sucessivamente ao longo dos anos a Ré, de forma consciente e voluntária, o impediu. b. De resto, a quantidade de trabalho que era imposta à Autora não o permitia, sequer. c. Quando, todos os anos, a Autora tentava marcar as suas férias, a Ré insistia que não seria possível, uma vez que naquele período tinha de desempenhar determinadas tarefas domésticas como, por exemplo, limpezas profundas a determinadas divisões da casa. d. A Ré, em resposta, disse apenas à Autora que não iria aceder ao que lhe era pedido, abstendo-se de lhe fornecer qualquer fundamentação. e. Acontece que, nas palavras da Ré, aqueles montantes apenas seriam pagos à Autora se esta continuasse a trabalhar diariamente (incluindo no período de férias). f. Caso faltasse, os valores aqui em causa, concernentes ao subsídio de férias e ao subsídio de Natal, jamais lhe seriam pagos. g. Apesar de estar cognitivamente íntegra, a Ré necessita de auxílio para praticamente todas as actividades da vida diária1, pelo menos já desde 2011, pelo que carece, desde então, de cuidados constantes, os quais, a partir de 2011, foram prestados pela Autora. h. Nessa medida, desde Janeiro de 2011, a Autora passou a pernoitar na casa da Ré, para que lhe pudesse prestar assistência (também) durante a noite. i. Desde já se esclareça que a Autora não necessitava do passe mensal na sua vida diária e que o mesmo só servia para fazer face as necessidades da Ré. j. Não obstante todas as circunstâncias que se descreveram, a verdade é que a Autora sempre prestou o seu trabalho com zelo e diligência, tendo agido sempre no interesse da Ré e sendo a sua grande companhia até ao passado dia 5 de Outubro de 2019, altura em que foi despedida. k. Sem que nada o fizesse suspeitar, e contra todas as suas expectativas, a Autora viu-se despojada da sua fonte de subsistência, inexistindo quaisquer indícios que indicassem que, de um modo para o outro, iria ser despedida, sentindo-se injustiçada, humilhada, violentada na sua dignidade após quase 15 anos de dedicação àquela que era já a sua “segunda casa”, onde passava praticamente todas as horas do seu dia. l. Em suma, a Autora sente que passou de fantástica e imprescindível a descartável…Tanto mais porque a Autora sempre desempenhou as suas funções com extremo rigor e dedicação, tratando-se de uma pessoa educada, leal e honesta, bem reputada no meio social em que se movimenta. m. Foi sempre a Autora que acompanhou a Ré em todos os episódios de urgências em que esta se viu envolvida. n. Acontece que a Autora, nos últimos oito anos de duração do seu contrato nunca gozou o dia de descanso semanal a que tinha legalmente direito. o. Ademais, nunca foi permitido à Autora o gozo dos feriados legalmente previstos que ocorreram nesse período. Sendo certo que também não gozou o descanso correspondente a esses dias noutros períodos. p. Sempre que a Autora tentava marcar as suas férias a Ré lhe respondia: “Só pode ir de férias quando eu morrer. Aliás, a AA devia era divorciar-se e vir morar definitivamente para cá!”. q. Viu-se, a Autora desempregada numa idade em que dificilmente arranjará emprego, o que lhe traz ansiedade e medo de nunca mais voltar ao mercado de trabalho. r. A Autora continua a acordar praticamente todas as noites julgando ouvir a voz da Ré a chamá-la e a pedir auxílio, como estava habituada nos últimos anos. s. Além disso, desenvolveu, nos últimos meses, episódio depressivo, com anedonia, humor depressivo, cansaço, diminuição no autocuidado, ansiedade somática e psíquica, anorexia com perda de peso e perturbação do sono, tudo causado pelo despedimento de que foi alvo. t. Por prestar trabalho em semelhantes termos, a Autora viu-se, ao longo de anos a fio, impossibilitada de exercer actividades lúdicas, de lazer, de convívio com a família e os amigos, de celebração de eventos – como o Natal e a passagem de ano, que passava a trabalhar. u. Não se podem, ainda, olvidar os danos causados à saúde por interrupção ou falta de dormir o tempo necessário, com todas as consequências daí inerentes, como a indisposição física e psíquica pessoais (e ao nível do relacionamento com terceiros). *** III. Objeto do recursoO objeto do recurso é delimitado pelas conclusões formuladas pelo recorrente, não sendo lícito ao tribunal ad quem conhecer de matérias nelas não incluídas, salvo porém as matérias que sejam de conhecimento oficioso, (arts. 635, nº 4, e 639º, nº 1, do CPC aprovado pela Lei 41/2013, de 26.06, aplicável ex vi do art. 1º, nº 2, al. a), do CPT aprovado pelo DL 295/2009, de 13.10, alterado, designadamente, pela Lei 107/2019). Assim, são as seguintes as questões suscitadas pela Recorrente: a. Impugnação da decisão da matéria de facto: a.1. Factos dados como não provados que deveriam ter sido dados como provados [als. a, c, f, g e h, j, m, n, o, p, q, r, s, t e u]; a.2. Factos provados que o não poderiam ter sido [nºs 8 e 22, 10, 24]. b. Subsídios de férias e de Natal; c. Descanso semanal e feriados; d. Violação do direito a férias; e. Danos não patrimoniais. *** IV. Fundamentação1. Impugnação da decisão da matéria de facto A Recorrente impugnou a decisão da matéria de facto, tendo dado cumprimento aos requisitos previstos no art. 640º, nºs 1 e 2, al. a), do CPC, pelo que cumpre apreciar. Nas contra-alegações a Recorrida, para além do mais, deduz diversa argumentação de natureza mais genérica no sentido, em síntese, de que: é necessário, para a alteração da decisão da matéria de facto, que a prova “imponha” decisão diversa, sendo que o “Tribunal superior não dispõe das mesmas “armas” que se encontram ao dispor da primeira instância”, invocando o princípio da imediação; as declarações prestadas pela Autora, só por si, nunca seriam suficientes para provarem tais factos, para além de que seria necessário que fossem prestadas “de modo seguro, convincente e credível, o que também não sucedeu”; a testemunha DD, filha da Autora, possui um manifesto interesse no desfecho da causa, pelo que, tal como referido na sentença, não merece credibilidade, não tendo convencido o Tribunal. Assim, previamente à concreta apreciação dos pontos impugnados e sem prejuízo desta, cumpre tecer as considerações que se seguem. Segundo entendemos, a reapreciação da decisão da matéria de facto não está circunscrita à verificação de erros ostensivos, manifestos ou clamorosamente evidentes, antes cumprindo à Relação proceder à reapreciação da matéria impugnada com base nos meios de prova produzidos, formando a sua própria convicção, entendimento que, de resto, corresponde ao que tem vindo a ser adotado pelo STJ conforme se extrai do seu Acórdão de 11.11.2020, Proc. 28813/17.7T8LSB.L1.S1, in www.dgsi.pt, de cujo sumário consta que: “A reapreciação da matéria de facto pelo Tribunal de 2.ª instância não se limita à verificação da existência de erro notório por parte do tribunal a quo, antes implicando uma reapreciação do julgado sobre os pontos impugnados e a formação de uma convicção própria” e, no respetivo texto, que: “Como afirma o Acórdão deste Tribunal proferido a 31/05/2016 no processo n.º 1572/12.2TBABT.E1.S1 (Relator GARCIA CALEJO) “o tribunal da Relação deve exercer um verdadeiro e efetivo 2.º grau de jurisdição da matéria de facto e não um simples controlo sobre a forma como a 1.ª instância respondeu à matéria factual, limitando-se a intervir nos casos de flagrante desconformidade entre os elementos de prova e a decisão, pois que só assim se assegurará o duplo grau de jurisdição, em matéria de facto, que a reforma processual de 1995 (Decreto-Lei n.º 329-A/95 de 12-12) visou assegurar e que o atual Código confirmou e reforçou”. Acresce que “a reapreciação da matéria de facto por parte da Relação tem de ter a mesma amplitude que o julgamento de primeira instância, pois só assim poderá ficar plenamente assegurado o duplo grau de jurisdição” como se pode ler no Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 07/06/2016 proferido no âmbito do processo n.º 155/13.4TCGMR.G1.S1 (Relatora ANA PAULA BOULAROT). Como destacou o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 09/02/2017, proferido no processo n.º 8228/03.5TVLSB.L1.S2 (Relator TOMÉ GOMES), “[n]o que respeita à reapreciação da decisão de facto pelo tribunal de 2.ª instância, é, hoje, jurisprudência seguida pelo STJ que essa reapreciação não se limita à verificação da existência de erro notório por parte do tribunal a quo, antes implicando uma reapreciação do julgado sobre os pontos impugnados, em termos de formação, por parte do tribunal de recurso, da sua própria convicção, em resultado do exame das provas produzidas e das que lhe for lícito ainda renovar e produzir, para, só em face dessa convicção, decidir sobre a verificação ou não do invocado erro, mantendo ou alterando os juízos probatórios que tenham sido feitos (art. 662.º, n.º 1 do CPC). Em suma, e como também destacou o Acórdão deste Tribunal proferido a 24/09/2013, proferido no processo 1965/04 (Relator AZEVEDO RAMOS), “a Relação não pode remeter para o juízo de valoração da prova feito na 1.ª instância, pois tem de fazer, com autonomia, o seu próprio juízo de valoração, que pode ser igual ao primeiro ou diferente dele”. E como refere MIGUEL TEIXEIRA DE SOUSA, em anotação favorável ao referido Acórdão, “o que se podia dizer no âmbito da anterior redação do Código de Processo Civil continua a valer, até de forma acrescida, para a versão atualmente vigente deste diploma”[1]. No mesmo sentido cfr. também, e entre outros, Acórdão do STJ 11.02.2016, 907/13.5TBPTG.E1.S1, in www.dgsi.pt, de cujo sumário consta o seguinte “1. Impugnada a decisão da matéria de facto com base em meios de prova sujeitos à livre apreciação (in casu, documentos particulares, testemunhas ou presunções), com cumprimento dos requisitos previstos no art. 640º do NCPC, cumpre à Relação proceder à reapreciação desses meios de prova e reflectir na decisão da matéria de facto a convicção que formar, nos termos do art. 662º”, bem como o Acórdão do STJ de 15.09.2010, Proc. 241/05.4TTSNT.P1.S1, também in www.dgsi.pt, de cujo sumário consta o seguinte: “1. A garantia de duplo grau de jurisdição, em sede de matéria de facto, que os artigos 690.º-A, n.º 5, e 712.º, n.º 1, alínea a), e n.º 2, ambos do Código de Processo Civil consagram, assume a amplitude de um novo julgamento em matéria de facto, no preciso sentido de que a Relação, na reapreciação das provas gravadas, dispõe dos mesmos poderes atribuídos ao tribunal de primeira instância, com vista à detecção e correcção de pontuais e concretos erros de julgamento, que o recorrente sempre terá o ónus de apontar e fundamentar na sua minuta de recurso. 2. O estipulado nos artigos 655.º, 690.º-A e 712.º do Código de Processo Civil não comporta o entendimento de que o recurso quanto à matéria de facto fixada pelo tribunal de primeira instância é restrito aos casos de manifestos ou notórios erros de julgamento. (…)” No que toca ao depoimento ou declarações de parte, no Acórdão desta Relação de 13.03.2017, Proc. nº 407/15.9T8AVR.P1[1], referiu-se o seguinte: “Desde já se afirma que a impugnação da decisão sobre a matéria de facto não tem propriamente a ver com o teor das declarações/depoimentos das testemunhas mas antes com a indevida valorização das declarações prestadas pelo Autor em audiência de discussão e julgamento e que se mostram espelhadas na fundamentação da decisão quanto à matéria de facto. Consideramos oportuno aqui transcrever as considerações feitas pelo Juiz de Direito Luís Filipe Pires de Sousa [em as «Malquistas declarações de parte»] defendendo este Magistrado: (…) “(i) as declarações de parte integram um testemunho de parte; (ii) a degradação antecipada do valor probatório das declarações de parte não tem fundamento legal bastante, evidenciando um retrocesso para raciocínios típicos e obsoletos de prova legal; (iii) os critérios de valoração das declarações de parte coincidem essencialmente com os parâmetros de valoração da prova testemunhal, havendo apenas que hierarquizá-los diversamente. Em última instância, nada obsta a que as declarações de parte constituam o único arrimo para dar certo facto como provado desde que as mesmas logrem alcançar o standard de prova exigível para o concreto litígio em apreciação”. Igualmente o Conselheiro António Abrantes Geraldes refere, acerca da declarações de parte, “admite-se a prestação de declarações de parte, por sua própria iniciativa, opção que encontra especial justificação nos casos em que, por não ser admissível a confissão de factos (designadamente quanto estejam em causa direitos indisponíveis), está vedada prestação de depoimento com tal objectivo especifico” (…) “admite-se, assim, que a parte enfrente o juiz que aprecia a causa, possibilitando que na formação da convicção este pondere o teor das declarações emitidas, ainda que sem natureza confessória, passo essencial para que se reduza o recurso, frequentemente abusivo ou desviante a depoimentos de testemunhas que não tiveram conhecimento directo, e atenuando o relevo excessivo que pelas partes ou pelos tribunais vem sendo atribuído aos depoimentos testemunhais” (…) – Revista Julgar, nº16, Temas da nova Reforma do Processo Civil, páginas 75/76. Nos termos do artigo 466º, nº1 do CPC “As partes podem requerer, até ao início das alegações orais em 1ª instância, a prestação de declarações sobre factos em que tenham intervindo pessoalmente ou de que tenham conhecimento directo”, sendo que “O tribunal aprecia livremente as declarações das partes, salvo se as mesmas constituírem confissão” [nº3 do mesmo artigo]. Perante as declarações de parte o Juiz valoriza, ou não, as mesmas, em conjugação com os demais elementos de prova, nomeadamente recorrendo às regras da experiência e às presunções judiciais, assim formando a sua livre convicção, nada impedindo que essa mesma convicção seja favorável ao próprio declarante/parte. (…) E, no mesmo sentido, se pronunciou o referido coletivo no Acórdão de 06.04.2017, proferido no Proc. nº 2367/15.7T8MTS.P1[2], bem como o Acórdão desta Relação de 07.11.2016[3], www.dgsi.pt., em cujo sumário de refere que: “I - Em face do disposto no art.º 466.º do NCPC, actualmente é inequívoco que as declarações de parte sobre factos que lhe sejam favoráveis devem ser apreciadas pelo tribunal, sendo valoradas segundo o princípio da livre apreciação da prova, nomeadamente, a prova testemunhal, consagrado nos artigos 396.º do Código Civil e 607.º n.º 5, do CPC. II - Não merece qualquer censura a decisão recorrida ao ter entendido valorar as declarações feitas pelo autor ao prestar o depoimento de parte requerido pela Ré, relativamente a factos que lhe são favoráveis, conjugando-as com outros meios de prova. (…)”. Com efeito e como decorre dos acórdãos acima citados, é atualmente adquirido que as declarações de parte são um meio de prova válido, estando sujeitos, tal como a prova testemunhal, à livre convicção do julgador, bem podendo a prova assentar em tais declarações, tudo se reconduzindo à avaliação e ponderação que haja de ser feita, tendo presente, naturalmente, o menor distanciamento que a parte tem em relação ao objeto do litígio dado o seu interesse no desfecho da causa, menor distanciamento esse que, de resto, também se pode verificar em relação à prova testemunhal como, aliás e de resto, ocorre no caso em apreço, quer quanto à testemunha DD, filha da A., mas também quanto às testemunhas CC (sobrinha da Ré), EE (sobrinha da Ré, filha de CC) e FF (sobrinho da Ré). Tecidas tais considerações, cumpre apreciar. 1.1. Começaremos pelos nºs 10 e 24 dos factos provados, e als. g) e h) dos factos não provados, que apreciaremos em conjunto por estarem relacionados. De tais pontos consta que: “10. No período compreendido entre as 18:00 e as 23:00, a Autora ia habitualmente até a sua casa visitar a sua família, tratar da sua mãe e preparar o jantar para o marido e netos, ausentando-se ainda durante o dia de acordo com as suas necessidades, sendo por vezes substituída pela sua filha, a quem a R. remunerava no valor de € 5,00/hora.” [o, por nós sublinhado, corresponde à parte impugnada] “24. Desde que passou a pernoitar em casa da Ré, foi a A. que passou a definir autonomamente o seu horário de trabalho, os dias de descanso, as pausas para ir a casa, para ir passear, visitar os amigos e a família ou fazer as suas tarefas pessoais, sendo que pernoitava e fazia a maioria das suas refeições em casa da Ré, a expensas desta.” Quanto ao nº 10, pretende que seja alterado para o seguinte: “No período compreendido entre as 18:00 e as 22:30, a Autora ia habitualmente até a sua casa visitar a sua família, tratar da sua mãe e preparar o jantar para o marido e netos, sendo por vezes substituída pela sua filha, a quem a R. remunerava no valor de € 5,00/hora”, o que assenta no seu depoimento. Quanto ao nº 24, pretende que seja dado como não provado, o que assenta nos factos provados 9 e 16, na necessidade de cuidados permanentes e nos depoimentos das testemunhas DD (filha da A.) e GG (pedologista, que ia a casa da Ré uma vez por mês prestar-lhe assistência de pedologia). Quanto às als. g) e h) dos factos não provados delas consta que: “g. Apesar de estar cognitivamente íntegra, a Ré necessita de auxílio para praticamente todas as actividades da vida diárias, pelo menos já desde 2011, pelo que carece, desde então, de cuidados constantes, os quais, a partir de 2011, foram prestados pela Autora. h. Nessa medida, desde Janeiro de 2011, a Autora passou a pernoitar na casa da Ré, para que lhe pudesse prestar assistência (também) durante a noite. Pretende a Recorrente que sejam os mesmos dados como provados, para o que invoca o nº 9 dos mesmos, com o qual tais alíneas estariam em contradição, e o doc. 1 da p.i. Por sua vez, alega a Recorrida que: “Sucede que, a Recorrente faz um uso descontextualizado da expressão “a Autora começou a trabalhar diariamente”, constante da factualidade dada como provada, o que não se pode aceitar. Na verdade, importar analisar este facto em conjugação com a demais factualidade dada como provada. E, o que se provou, foi que em 2005 a Autora trabalhava duas tardes por semana, em 2006 passou a trabalhar de segunda a sexta-feira, em 2007 começou a trabalhar também ao sábado de manhã e, finalmente, a partir de 2011, começou a trabalhar “diariamente”. Mas, trabalhar diariamente, não significa, como pretende a Recorrente, que a mesma trabalhasse 365 dias por ano!!! Nada disso!!! O que se diz, e o que resultou da prova, foi que a A., ao longo dos anos, foi aumentando os dias de trabalho semanal ao serviço da Ré. Mas isto não quer dizer, naturalmente, que a A. não tivesse descansos semanais, férias, etc. Assim, se nos afastarmos de uma interpretação literal e enviesada daquele concreto facto, facilmente concluímos que, na verdade, nenhuma contradição existe.”, Na fundamentação da decisão da matéria de facto foi referido o seguinte [a fundamentação não é feita por referência aos concretos pontos da decisão da matéria de facto, pelo que se consigna o que se nos afigura que se poderá prender com a matéria em causa]: “No mais, consideraram-se os seguintes depoimentos: - DD, filha da aqui A. afirmou que desconhece em que ano é que a esta começou a trabalhar em casa da R., mas de início apenas trabalhava duas vezes por semana, depois passou a ir diariamente, confecionando as refeições e ajudando a demandante com várias tarefas, fazendo as compras com uso do cartão multibanco da A., marcando consultas, etc.; a partir de certo momento, que teria sido por volta do ano de 2010, a A. passou a pernoitar em casa da R., por se encontrar mais debilitada e recear ficar sozinha durante a noite. Acrescentou que a sua avó materna residia em sua casa e encontrava-se doente, pelo que a sua mãe se tinha de deslocar com frequência a casa para lhe dar apoio; (…). Disse também que por vezes ia a casa da R. de forma a substituir a A. quando esta se ausentava, o que sucedeu ao longo de pelo menos 4 anos, sendo remunerada pela R., sendo que habitualmente a sua mãe saía de casa da R. pelas 18h00 horas para ir a casa, regressando pelas 22h00 horas, tendo trabalhado todos os dias do ano; (…). - HH, disse ter sido empregada doméstica em casa da irmã da aqui R., em Cascais, e afirmou que considera que a A. terá trabalhado em casa da R. (com quem manteve contacto telefónico esporádico) durante cerca de 14 anos, sendo aquela quem atendia o telefone quando contactava a demandada, sendo substituída pela sua filha quando se ausentava de casa da R.; - GG, disse ter sido podologista da R. durante cerca de 6 a 7 anos (antes da sua ida para o Lar) e afirmou que era a A. quem a contactava para marcar os desmarcar as suas idas a casa da demandada e quem lhe efectuava o correspondente pagamento; (…) confirmando que era a demandante quem tratava da higiene pessoal da R. e das suas refeições, sendo substituída quando se ausentava, pela sua filha; - CC, disse ser sobrinha da R. e afirmou que quando veio viver para o Porto a R. teve necessidade de ter uma empregada doméstica, sendo a própria demandada quem tratava de todas as questões relativas a este contrato de trabalho; disse ainda que aos domingos visitava sempre a R. e que a A. nunca lá estava nessas ocasiões, sendo que a filha da demandante chegava por vezes, nesses dias, ao final da tarde; (…)confirmou ainda que o valor da retribuição acordada entre A. e R. inseria todos os montantes devidos, férias, subsídio de férias e de Natal, bem como as noites a partir do momento em que passou lá a pernoitar; confirmou que era a A. quem levava a R. ao Hospital e a acompanhava às consultas (…) acrescentou que a A. tinha autonomia no exercício das suas tarefas, sendo a própria quem decidia onde e quando ia às compras e o horário de trabalho que cumpria, (…); - II, disse ser cunhada da aqui R. e que ia com frequência a casa da mesma, (…); acrescentou que visitava habitualmente a R. as domingos e nem sempre a A. se encontrava em casa daquela, dizendo-lhe a demandada que a A. se demorava muito na rua; - EE, disse ser sobrinha-neta da R. e afirmou que quando visitava a R. o que habitualmente sucedia aos domingos, nem sempre encontrava a A., dizendo-lhe a R. que esta estaria ausente nas compras, (…); - FF disse ser sobrinho da R. e confirmou que a A. trabalhou em casa da R. durante cerca de 10 anos, primeiro a tempo parcial e depois a tempo inteiro, passando a pernoitar em casa da demandada a partir de data que já não soube indicar, sendo que quando saía de casa era substituída pela sua própria filha, desconhecendo se a A. gozava férias ou se auferia subsídio de férias e de Natal, já que a R. geria a sua vida sem a sua interferência, pagando as suas contas; (…); disse também que nos últimos anos a A. tinha total autonomia na gestão das suas tarefas, (…), sendo que não tinha qualquer horário de trabalho que lhe fosse imposto pela R. que dependia, ultimamente, em exclusivo dos cuidados prestados pela A. e pela sua filha, (…); No âmbito do depoimento de parte a aqui demandante admitiu os factos que constam da assentada – cfr. acta de 09/02/2021 – salientando-se aqui que a própria admitiu o valor mensal que mensalmente lhe foi sendo pago a título de retribuição, a autonomia de que beneficiava, sobretudo a partir do momento em que passou a pernoitar em casa da R., quanto à gestão das suas tarefas e dos seus tempos de trabalho. (…) O Tribunal baseou a sua convicção, tal como acima descrito, no contexto da relação pessoal e de trabalho que foi descrita pelas testemunhas acima identificadas, as quais descreveram, quase de forna unânime, um quadro relativo ao exercício de funções por parte da A. que revela um grau de elevada autonomia quanto ao modo como estas eram diariamente cumpridas e como a R. face à sua idade e dificuldades motoras ficou numa situação de quase total dependência da mesma. (…).” Antes de mais, importa esclarecer o seguinte quanto à expressão “diariamente” que consta do nº 9 dos factos provados: “9. A partir de 1 de Janeiro de 2011, atendendo à idade avançada da Ré e aos cuidados constantes que era necessário prestar-lhe, a Autora começou a trabalhar diariamente, pernoitando em casa da aqui R.” Não nos resta a menor duvida de que, a expressão “diariamente”, no contexto do caso concreto, significa que a A. prestava o seu trabalho à Ré de segunda-feira a domingo, incluindo o domingo, ainda que, neste, por período inferior aos dos restantes dias. Com efeito, tanto a A., como a testemunha DD, sua filha, cujos depoimentos se ouviram integralmente, referiram que aquela pernoitava em casa da Ré (para além dos outros dias) de sábado para domingo, tendo esta testemunha referido que os domingos eram o único dia que a sua mãe ia almoçar a casa, sendo a testemunha que, à hora de almoço e jantar, ia para casa da Ré substitui-la (durante cerca de uma hora em cada uma das refeições). Decorre também desse nº 9 (que não foi impugnado, designadamente pela Ré em sede de ampliação do âmbito do recurso, que não deduziu) que a Ré necessitava dos cuidados permanentes da A., assim designadamente para locomoção, deitar e levantar, higiene, preparação e servir as refeições, tal como o referiram a A., a mencionada testemunha e bem assim a testemunha GG (pedologista que prestava tais serviços, uma vez por mês, desde há cerca de seis anos). Dos depoimentos das testemunhas CC (sobrinha da Ré), II (cunhada da Ré), EE (sobrinha da Ré., filha de CC) e FF (sobrinho da Ré), cujos depoimentos se ouviram integralmente, também não resulta o contrário, sendo que o que delas se extrai, em síntese, é que visitavam a Ré ao domingo (as primeira e segunda com maior frequência, os demais com menor frequência, tendo até a última – FF- referido que já há algum tempo que havia deixado de o fazer pois a Ré não mostrava grande disponibilidade para receber visitas) mas que não viam a A. Tal não significa, porém, que a A. não prestasse a sua atividade, pernoitando de sábado para domingo e demais assistência à Ré, saindo contudo à hora de almoço. Acresce que de todos os mencionados depoimentos não decorre que, para além da A. e da sua filha (DD), tivesse existido outra pessoa a trabalhar, em substituição daquelas, em casa da Ré e prestar a assistência de que esta necessitava diariamente. De dizer que a testemunha CC referiu que a sua própria empregada doméstica chegou a ir a casa da Ré; fê-lo, todavia, de forma totalmente vaga, sem concretização do número de vezes em que tal teria ocorrido, não decorrendo do seu depoimento que o fizesse com regularidade mas, antes, esporadicamente e, muito menos ao domingo. Assim e para concluir que a expressão “diariamente” significa, no caso, todos os dias, incluindo o domingo nos termos apontados. Retomando a reapreciação do nº 10 dos factos provados, pretende a Recorrente que a hora de chegada – “23h00” seja substituída por “22h30” e que seja dado como não provado o segmento em que se refere “ausentando-se ainda durante o dia de acordo com as suas necessidades”. Quanto à hora – 22h30 -, pese embora a A. a tenha referido no seu depoimento, certo é que, na petição inicial, o que ela própria invocou como hora de chegada foram as “23h00”. Ora, assim sendo, não se vê razão para alterar tal facto. Quanto às “ausências durante o dia de acordo com as suas necessidades”: no ponto em causa (nº 10), para além da ausência entre as 18h00 e as 23h00, não se concretizam ou indicam, minimamente que seja, as necessidades pessoais da A. que a levavam a ausentar-se de casa e períodos de tempo correspondentes, referência aquela que tem natureza senão mesmo conclusiva, pelo menos vaga e genérica. De acordo com a A. e com a testemunha DD, a A. saia quando ia ao médico ou fazer algum exame médico, ficando esta última (DD) a substitui-la. Mais decorre que, para além dessas saídas, as demais ausências eram no interesse da Ré, designadamente, para compras de supermercado (para a casa da Ré), farmácia, marcação no Centro de Saúde de consultas ou exames, ida à lavandaria e que as compras de supermercado do interesse pessoal da A. ou eram feitas quando ia ao supermercado fazer as compras para a Ré ou quando saia às 18h00. Mais resulta que a testemunha DD, no período das 18h00 às 23h00, ia para casa da Ré onde lhe dava o jantar, substituindo a A. durante cerca de uma hora. Resulta ainda do referido depoimento que a A., ao domingo, ia almoçar a sua (da A.) casa, sendo substituída pela sua filha DD que, assim, fazia cerca de 2 horas (1 ao almoço e 1 ao jantar) Por sua vez a Recorrida não indica, no recurso, quaisquer outras necessidades pessoais da A., designadamente que resultassem da prova, sendo que dos depoimentos prestados por CC, EE, II ou FF não decorrem também quaisquer necessidades, mas tão só e no essencial, que a A., nas saídas que efetuava no exercício da sua atividade para a Ré, demoraria muito tempo e/ou que a Ré disso se queixava, designadamente no supermercado (depoimento de CC). De referir que as ausências da A. reportadas pela testemunha CC e sua filha, testemunha EE, se referem ao domingo à tarde (mas em horas não concretamente apuradas), dia em que visitavam a Ré (menos vezes a testemunha EE que, segundo disse, apenas por vezes acompanhava a mãe). Assim, quanto ao nº 10, altera-se a sua redação, que passa a ter o seguinte teor: 10. No período compreendido entre as 18:00 e as 23:00 (de segunda-feira a domingo), a Autora ia habitualmente até a sua casa visitar a sua família, tratar da sua mãe e preparar o jantar para o marido e netos, assim como, ao domingo, durante período de tempo que não se logrou apurar, ia também almoçar a sua casa e, nos demais dias, ausentando-se ainda durante o dia quando, pelo menos, tivesse consultas e/ou exames médicos, ausências em que era substituída pela sua filha, sendo que, no que se reporta ao período das 18h00 às 23h00 de segunda a sábado, esta a substituía durante cerca de uma hora (para o jantar) e, ao domingo, durante cerca de duas horas (uma para o almoço e uma para o jantar) a quem a Ré remunerava no valor de €5,00 / hora. No que se reporta ao nº 24 dos factos provados, não se nos afigura ter sido feita prova de que tenha sido a A. quem “passou a definir autonomamente o seu horário de trabalho, os dias de descanso, as pausas para ir a casa, para ir passear, visitar os amigos e a família ou fazer as suas tarefas pessoais”. O horário de trabalho era definido em função das necessidades da Ré a que a A. tinha que atender, sendo esta a única pessoa que prestava trabalho em casa da Ré, salvo quando era substituída pela sua filha DD. Quanto aos dias de descanso e pausas para ir a casa, para além dos períodos referidos no nº 10, nada é concretizado pela Recorrida quanto a outros dias de descanso que a A. gozasse, nem tal resulta da prova, designadamente da indicada pela Recorrida, assim como não resulta que os períodos mencionados no nº 10 não fossem com autorização ou por acordo das partes ou que fosse contra a vontade da Ré e/ou dos familiares desta, mormente da testemunha CC (que era quem mais acompanhava a vida da Ré e a quem a A. dava conta de alguma necessidade) não sendo de crer que aquela, bem como as testemunhas EE, FF e II, disso não tivessem conhecimento, tanto mais tendo em conta o longo período em que tal se verificou (desde que a A., em 2011, começou a pernoitar em casa da Ré). E quanto aos descansos para ir passear, visitar amigos, família ou fazer tarefas pessoais nada resulta de concreto dos mencionados depoimentos e do alegado pela Recorrida nas contra-alegações (que visitas e amigos ou família? Que tarefas pessoais? Quando? Durante quanto tempo?) Tendo, ainda em conta que, na fundamentação da decisão da matéria de facto se refere que “No âmbito do depoimento de parte a aqui demandante admitiu os factos que constam da assentada – cfr. acta de 09/02/2021 – salientando-se aqui que a própria admitiu (…) a autonomia de que beneficiava, sobretudo a partir do momento em que passou a pernoitar em casa da R., quanto à gestão das suas tarefas e dos seus tempos de trabalho” [sublinhado nosso] é de esclarecer que assentada do depoimento da A., assim como do seu depoimento, não resulta que gerisse com “autonomia” a gestão dos seus tempos de repouso. Fazia sim a gestão das tarefas que tinha que realizar ao serviço da Ré, o que fazia dentro dos períodos em que não se ausentava para sua casa (este das 18h00 às 23h00 e ao domingo hora de almoço) como já acima referido. Quanto ao segmento em que se refere que a A. “pernoitava e fazia a maioria das suas refeições em casa da Ré, a expensas desta”, já decorre do nº 9 dos factos provados que a A. pernoitava em casa da Ré, não sendo necessário repetir. Quanto ao mais, resulta dos depoimentos da A. e da testemunha DD que a A. tomava o pequeno-almoço, almoço e lanche em casa da Ré a expensas desta, o que deve ser concretizado em tal ponto ao invés da expressão conclusiva “maioria” que consta de tal ponto. Assim, altera-se o nº 24 dos factos provados, que passa a ter a seguinte redação: 24. Desde que passou a pernoitar em casa da Ré a A. tomava o pequeno –almoço, almoço e lanche em casa da Ré, a expensas desta. Quanto às als. g) e h) dos factos não provados [relembrando, deles consta que: “g. Apesar de estar cognitivamente íntegra, a Ré necessita de auxílio para praticamente todas as actividades da vida diária1, pelo menos já desde 2011, pelo que carece, desde então, de cuidados constantes, os quais, a partir de 2011, foram prestados pela Autora. h. Nessa medida, desde Janeiro de 2011, a Autora passou a pernoitar na casa da Ré, para que lhe pudesse prestar assistência (também) durante a noite”.]: os mesmos estão, na verdade, em contradição com o nº 9 [“9. A partir de 1 de Janeiro de 2011, atendendo à idade avançada da Ré e aos cuidados constantes que era necessário prestar-lhe, a Autora começou a trabalhar diariamente, pernoitando em casa da aqui R.”], que não foi impugnado. Aliás a própria fundamentação da matéria de facto constante da sentença a Mmª Juiz alude à quase total dependência da Ré, ao dizer que: “O Tribunal baseou a sua convicção, tal como acima descrito, no contexto da relação pessoal e de trabalho que foi descrita pelas testemunhas acima identificadas, as quais descreveram, quase de forna unânime, (…) e como a R. face à sua idade e dificuldades motoras ficou numa situação de quase total dependência da mesma”. Acresce que da prova produzida [depoimentos da A. e das testemunhas DD, CC, EE, II e FF], bem como do documento 1 junto com a petição inicial [relatórios hospitalares], resulta que a Ré, apesar de estar cognitivamente integra, foi necessitando, a partir de 2011, de auxílio para praticamente todas as atividades diárias (designadamente levantar-se e deitar-se, locomoção, higiene, preparação de refeições, marcação e acompanhamento a consultas e exames médicos, compras), passando a A. a pernoitar em casa da Ré para que lhe pudesse prestar assistência também durante a noite caso dela necessitasse. E, desde já se diga, que, para além da A. (e da filha DD nos termos já referidos), mais ninguém, seja contratada para o efeito, seja da família, lhe prestava essa assistência. Assim, e, oficiosamente e pelo que acima se disse, altera-se o nº 9 dos factos provados por forma a esclarecer qualquer eventual ambiguidade ou obscuridade da expressão “diariamente” ou contradição designadamente com o nº 10, concretizando-se que tal expressão se reporta ao período de segunda feira a domingo [7 dias, pois], o qual passa a ter a seguinte redação: 9. A partir de 1 de janeiro de 2011, atendendo à idade avançada da Ré e aos cuidados constantes que era necessário prestar-lhe, a Autora começou a trabalhar diariamente, de domingo a segunda feira, sem prejuízo do referido no nº 10, pernoitando em casa da Ré. E adita-se à matéria de facto provada o nº 9-A com a seguinte redação: 9.A. Apesar de estar cognitivamente integra, a Ré necessita, desde 2011, de auxílio para praticamente todas as atividades da vida diária, designadamente levantar-se, deitar-se, higiene, locomoção, preparação de refeições, compras e marcação e acompanhamento a consultas e exames médicos, carecendo, desde então de cuidados constantes que eram prestados pela A., incluindo durante a noite, para que, também durante esta, lhe pudesse prestar a assistência de que a Ré necessitasse. 1.2. Quanto aos nºs 8 e 22 dos factos provados: Dos mesmos consta que: “8. Até ao ano de 2010, a Autora não recebeu qualquer montante a título de subsídio de férias ou a título de subsídio de Natal, tendo auferido em 2010 os subsídios de férias e de Natal e a partir de 2011 estas mesmas quantias em duodécimos juntamente com os seus vencimentos. 22. A partir de 2011, inclusive, os subsídios de férias e de Natal foram pagos em duodécimos, ou seja, a quantia que a A. recebia todos os meses, em numerário, incluía também uma verba referente aos subsídios de férias e de Natal e uma compensação pelo trabalho aos domingos e feriados em que a mesma trabalhasse.” Diz a Recorrente que “LXXVIII. Destarte, deve ser dado como não provada a parte do facto (8) na qual se afirma que a Recorrente recebeu os subsídios de férias e de Natal em 2010 e de 2011 em diante”, e, bem assim que o nº 22 deve ser dado como não provado [cfr. conclusões LXXIX e LXXV]. Sustenta a impugnação no seu depoimento de parte, bem como no demais que alega nas conclusões LXIII a LXXIV e LXXVII. A Recorrida invoca o seu depoimento e, bem assim, os das testemunhas EE e CC, no sentido de que os valores liquidados a título de vencimento à A. incluíam todos os montantes remuneratórios devidos, como os subsídios, bem como as regras da experiência comum. Na sentença recorrida referiu-se o seguinte: “(…) No mais, consideraram-se os seguintes depoimentos: - DD, filha da aqui A. afirmou que desconhece em que ano é que a esta começou a trabalhar em casa da R., mas de início apenas trabalhava duas vezes por semana, depois passou a ir diariamente, confecionando as refeições e ajudando a demandante com várias tarefas, fazendo as compras com uso do cartão multibanco da A., marcando consultas, etc.; a partir de certo momento, que teria sido por volta do ano de 2010, a A. passou a pernoitar em casa da R., por se encontrar mais debilitada e recear ficar sozinha durante a noite. Acrescentou que a sua avó materna residia em sua casa e encontrava-se doente, pelo que a sua mãe se tinha de deslocar com frequência a casa para lhe dar apoio; acrescentou que o valor do vencimento da A. era levantado pela própria no multibanco, com o cartão bancário da R. (esclarecendo que a R. tinha dois cartões bancários que a A. utilizava) de acordo com as indicações dadas por esta última. Disse também que por vezes ia a casa da R. de forma a substituir a A. quando esta se ausentava, o que sucedeu ao longo de pelo menos 4 anos, sendo remunerada pela R., sendo que habitualmente a sua mãe saía de casa da R. pelas 18h00 horas para ir a casa, regressando pelas 22h00 horas, tendo trabalhado todos os dias do ano; quanto aos subsídios de férias e de Natal afirmou que apenas passaram a ser pagos à A. a partir de 2010, no montante de € 400,00 cada subsídio. (…) - CC, disse ser sobrinha da R. e afirmou que quando veio viver para o Porto a R. teve necessidade de ter uma empregada doméstica, sendo a própria demandada quem tratava de todas as questões relativas a este contrato de trabalho; disse ainda que aos domingos visitava sempre a R. e que a A. nunca lá estava nessas ocasiões, sendo que a filha da demandante chegava por vezes, nesses dias, ao final da tarde; confirmou ainda que o valor da retribuição acordada entre A. e R. inseria todos os montantes devidos, férias, subsídio de férias e de Natal, bem como as noites a partir do momento em que passou lá a pernoitar; (…) - II, disse ser cunhada da aqui R. e que ia com frequência a casa da mesma, tendo tido conhecimento que o salário acordado entre ambas A. e R. era para cobrir todas as despesas relativas ao contrato de trabalho que vigorou entre as mesmas; (…) - EE, disse ser sobrinha-neta da R. e afirmou que quando visitava a R. o que habitualmente sucedia aos domingos, nem sempre encontrava a A., dizendo-lhe a R. que esta estaria ausente nas compras, confirmando que de acordo com o que lhe foi dito pela R. os valores liquidados a título de vencimento à A. incluíam todos os montantes remuneratórios devidos (como os subsídios) desconhecendo as quantias concretas em causa; - (…) - FF disse ser sobrinho da R. e confirmou que a A. trabalhou em casa da R. durante cerca de 10 anos, primeiro a tempo parcial e depois a tempo inteiro, passando a pernoitar em casa da demandada a partir de data que já não soube indicar, sendo que quando saía de casa era substituída pela sua própria filha, desconhecendo se a A. gozava férias ou se auferia subsídio de férias e de Natal, já que a R. geria a sua vida sem a sua interferência, pagando as suas contas; (…), desconhecendo ainda o valor da sua retribuição mensal, sendo que não tinha qualquer horário de trabalho que lhe fosse imposto pela R. que dependia, ultimamente, em exclusivo dos cuidados prestados pela A. e pela sua filha, (…). No âmbito do depoimento de parte a aqui demandante admitiu os factos que constam da assentada – cfr. acta de 09/02/2021 – salientando-se aqui que a própria admitiu o valor mensal que mensalmente lhe foi sendo pago a título de retribuição, a autonomia de que beneficiava, sobretudo a partir do momento em que passou a pernoitar em casa da R., quanto à gestão das suas tarefas e dos seus tempos de trabalho. Em sede de depoimento de parte (na produção antecipada da prova) é notório a dificuldade da R. de se expressar, atenta certamente a sua idade avançada, tendo sido perceptível que considera que pagava um vencimento muito elevado à A. e que tinha razões de queixa da mesma. O Tribunal baseou a sua convicção, tal como acima descrito, no contexto da relação pessoal e de trabalho que foi descrita pelas testemunhas acima identificadas, as quais descreveram, quase de forna unânime, um quadro relativo ao exercício de funções por parte da A. que revela um grau de elevada autonomia quanto ao modo como estas eram diariamente cumpridas e como a R. face à sua idade e dificuldades motoras ficou numa situação de quase total dependência da mesma. Estas circunstâncias particulares à situação em apreço, foram determinantes para que o Tribunal pudesse concluir que os valores liquidados à A. a título de remuneração incluíam já todos os montantes que decorriam do cumprimento do seu vínculo laboral, como sucede quanto aos subsídios de férias, subsídios de Natal e compensação pelos dias feriados trabalhados, já que de outra forma não seria compreensível, atendendo-se às regras da experiência comum, que a demandante auferisse desde o momento em que começou a pernoitar em casa da R. um vencimento mensal várias vezes superior ao salário mínimo nacional, a que acrescia o montante relativo ao alojamento da mesma e às refeições que lhe eram igualmente proporcionadas. Quem movimentava a conta bancária da R. era a própria A., já que era ela quem detinha dois cartões bancários que lhe permitiam aceder à mesma a partir de qualquer terminal de multibanco, pelo que se tivessem ficado por liquidar quaisquer montantes seria crível que a demandante tivesse feito com que os mesmos lhe fossem efectivamente entregues, quando se dirigia a um desses terminais para levantar as quantias respectivas aos seus salários. Aliás, a A. tendo reclamado junto da R. o pagamento destes mesmos subsídios em 2010 que nesse ano já lhe foram liquidados, certamente não teria acatado a circunstância dos mesmos, no ano imediatamente a seguir, lhe serem novamente retirados, sendo esta atitude da sua parte apenas compatível com o pagamento em duodécimos acima indicados.” Na contestação, a Ré alegou que: “34º. Sucede que, a quantia que a A. auferia todos os meses incluía também os subsídios de férias e de natal e uma compensação pelo trabalho aos domingos e feriados em que a mesma trabalhasse, o que nem sempre acontecia, como também se irá provar. 35º Assim, e por exemplo, nos últimos anos, o salário base da A. correspondia a Eur. 1200,00 (mil e duzentos euros), 36º Aos quais acresciam as quantias de Eur. 100, 00 a título de subsídio de férias e Eur. 100, 00 a título de subsídio de natal e ainda a quantia de Eur. 240,00 como compensação pelo trabalho aos domingos e feriados. 37º De facto, a elevadíssima quantia que a A. recebia todos os meses apenas tem explicação pelo facto de incluir outras verbas, que não apenas o salário base. Não poderia ser de outra forma.” Apreciando: Não eram emitidos recibos de vencimento, nem existe qualquer prova documental de onde constassem os montantes pagos à A. e a que título. De acordo com os depoimentos da A. e da testemunha DD, aquela auferia €5,00 por hora e, quando passou a pernoitar em casa da Ré, passou também a auferir €15,00 por noite, sendo que a retribuição era paga semanalmente. E, de acordo com a prova produzida pela Ré, nada resulta, em concreto, quanto aos montantes, e a que título, integravam o valor mensal de €1.640,00 que a A., a partir de 2011, passou a receber, sendo que, de tal prova, apenas consta que a Ré pagava à A. uma quantia elevada e que nela estariam incluídas todas as prestações que lhe fossem devidas, como os subsídios de férias e de Natal e compensação pelo trabalho prestado aos domingos e feriados, prova esta que, salvo e sem prejuízo do que se dirá, é manifestamente insuficiente, mesmo com apelo as regras da experiência e senso comuns, da lógica e da normalidade das coisas, no sentido de que tal quantia mensal tudo incluiria. Aliás, do apelo a estas, o que decorre é o contrário nos termos e conforme se dirá. Com efeito: Dos factos provados decorre, e não foi impugnado, que: - A partir de 2010, a Ré passou a pagar à A. as quantias de €400,00 a título de subsídio de férias e a de €400,00 a título de subsídio de Natal (nº 15 dos factos provados). - Em 2006, a A. trabalhava das 9h00 às 17h00, de segunda a sexta feira, e auferia a retribuição de €800,00 (valor mensal) (nº 4 dos factos provados), o que, tendo em conta o nº de horas por dia (8h), 5 dias por semana e 4 semanas num mês, corresponde a uma retribuição horária de €5,00 (€5,00 x 8hx 5 dias x 4 semanas = €800,00), montante por hora este que foi precisamente o referido pela A. e pela testemunha DD. - Em 2007, a A. trabalhava das 9h00 às 17h00, de segunda a sexta feira e, ainda, das 9h00 às 14h00, tendo passado a auferir €900,00 (valor mensal) (nº 6 dos factos provados), o que, tendo em conta o nº de horas por dia de segunda a 6ª feira (8h/dia x 5 dias) mais as 5h ao sábado e 4 semanas num mês, corresponde a uma retribuição horária de €5,00 (€5,00 x 45 horas semana x 4 semanas = €900,00), montante por hora este que foi precisamente o referido pela A. e pela testemunha DD. . Ou seja, o referido corrobora a retribuição horária de €5,00 que a A. e a testemunha DD mencionaram. Ora, quanto a 2010, não se descortina por que razão se considera, no ponto 8 dos factos provados, que, no ano de 2010, foram auferidos os subsídios de férias e de Natal, afirmação que, para além do mais, é conclusiva. O que do referido resulta é que, nesse ano (2010), a Ré pagou à A. €400,00 a título de subsídio de férias e €400,00 a título de subsídio de Natal (nº 15 dos factos provados), não se vendo que na quantia de €900,00 (bem como na de €800,00) estivesse incluída qualquer outra verba que tivesse sido paga à A. a título de subsídios de férias e de Natal. Assim, o segmento do nº 8 dos factos provados em que se refere “tendo auferido em 2010 os subsídios de férias e de Natal” deve ser eliminado. Agora quanto ao período a desde 2011 em diante (segmento final do nº 8 e nº 22): A A. passou a receber, a partir desse ano (2011), um valor mensal de €1.640,00. É, na verdade, um valor elevado, tendo em conta a remuneração mínima mensal em 2011, de €485,00. Porém: i) Já em 2006, em que trabalhava apenas 40 horas semana (das 9h00 às 17h00 de segunda a sexta feira), a A. auferia a retribuição mensal de €800,00 quando a retribuição mínima mensal era de €385,00 e, em 2007, em que passou a trabalhar 45 horas por semana (das 9h00 às 17h00 de segunda a sexta feira e ao sábado, das 9h00 às 14h00), auferia a retribuição mensal de 900,00 quando a retribuição mínima mensal era de €403,00. Ou seja, a sua retribuição mensal, nesses anos, sempre foi consideravelmente superior à retribuição mínima mensal. ii) A partir de 2011, a A., para além do horário que já praticava (acima referido), passou também: - a trabalhar ao sábado das 14h00 até às 18h00 (hora a que saía para sua casa), ou seja, mais 4h por dia, o que totaliza, mensalmente, €80,00 (€5,00 x 4h por sábado x 4 semanas) [o trabalho das 23h00 às 24h00 de sábado consideramo-lo incluído na “pernoita” como adiante se dirá]; - a pernoitar em casa da Ré todos os dias da semana, incluindo de sábado para domingo (ou seja, 7 dias). Considerando o valor de €15,00 por noite referido pela A. e testemunha DD, sendo que outro qualquer não resulta da demais prova produzida, valor esse que também não se nos afigura exagerado e não se vendo razão para desvalorizar aqueles depoimentos [os quais, no que se reporta ao valor de €5,00 hora que foi por elas afirmado estão em consonância com o que era auferido], afigura-se-nos que, pelas noites/”pernoita”, a A. passou a auferir €420,00 mensais (€15,00 x 7 noites x 4 semanas). De esclarecer que se desconhece, e não resulta da prova e a testemunha DD não o soube dizer, qual o período de tempo entre um dia e o outro que estaria incluído nesses €15,00 por noite/”pernoita”. Assim, consideraremos que em cada “pernoita” estava incluído o período das 23h00 de um dia (hora a que a A. regressava), incluindo sábado, às 9h00 do dia seguinte (hora a que a A., anteriormente, iniciava o trabalho), e incluindo o domingo. E, tendo em conta tal período, que abrange 10 horas, ainda que não necessariamente de trabalho efetivo, a quantia de €15,00 por noite não se nos afigura, como acima se disse, exagerada considerando que, sendo a retribuição de €5,00 à hora, os €15,00 por noite corresponderiam a 3 horas de trabalho, para além de que, com a pernoita, tinha a A. que prescindir de o fazer em sua casa, com a sua família e mantendo, durante todo o mencionado período, a sua disponibilidade para a Ré. E, a este propósito, é ainda de dizer que não desconhecemos que, nos termos do art. 223º, nº 2, do CT/2009, se considera como trabalho noturno o compreendido entre as 22 horas de um dia e as 7h00 do dia seguinte, de onde, a aplicar-se tal norma, decorreria, no caso, que apenas seria considerado noturno, ou seja compreendido no montante de €15 por noite, o prestado entre as 23h00 de sábado e as 7h00 da manhã, mas não já o período entre as 7h00 e as 9h00. Acontece porém que, se assim fosse e tendo em conta o valor hora de €,500, a conclusão seria a de que, mensalmente, a A. auferiria por essas duas horas diárias / 60 h mensais, a quantia global de €300,00 o que, e tendo em conta o mais que a seguir se dirá, ultrapassaria os €1.640,00 mensais, pois totalizaria €1.880,00 [€1.580, valor a que adiante chegaremos + €300,00]. Ora, tal leva-nos a crer que não foi isso o acordado entre as partes, mas sim que a quantia de €15,00 por noite abrangeria todo o período das 23h00 de um dia às 9h00 do dia seguinte. E até porque, a especificidade própria do trabalho doméstico leva-nos a afastar a coincidência entre o “período noturno” no serviço doméstico e o “período noturno” previsto no CT para a generalidade dos trabalhadores. É que, no serviço doméstico, o facto do trabalhador alojado dormir na residência do empregador e poder ter que atender às necessidades deste, não significa, nem coincide, contudo, com a prestação de trabalho efetivo durante todo esse período (cfr. arts. 13º, nº 2, e 14º, nº 2, do DL 235/92). - Tendo em conta que, anteriormente, a A. saia às 17h00, tendo passado a sair, de segunda-feira a sexta-feira, às 18h00, daí resulta que a A. passou a trabalhar mais uma hora por dia (das 17h00 às 18h00) [o período das 17h00 às 18h00 de sábado já está acima incluído], a que corresponde o montante mensal de €100,00 (€5,00 x 1h/dia x 5 dias x 4 semanas), o qual está também incluído no valor mensal de €1.640,00. - E passou também, por via do referido, a trabalhar ao domingo (para além da “pernoita”), das 9h00 até à hora de almoço, em que saía para ir almoçar a casa [mas aí permanecendo, pelo menos e tal como nos restantes dias, no período das 18h00 às 23h00 já que não foi feita prova de que assim não fosse, mais se remetendo para o que disse a propósito do nº 10 dos factos provados, sendo que, de acordo com a testemunha DD, esta também substituía a A. ao jantar de domingo]. Desconhecendo-se (o que não decorre da prova) a hora exata a que, no domingo, a A. sairia de casa da Ré, tomaremos como tal as 13h00, pela normalidade das coisas – hora de almoço - e das tarefas que a A. teria que executar antes de sair em matéria designadamente de higiene e pequeno almoço da Ré (a testemunha GG referiu que, várias vezes, quando ia prestar os seus serviços de pedologia, chegava por volta das 14h00, tendo de aguardar que a Ré ficasse pronta). Assim, pelo período de trabalho relativo ao domingo (das 9h00 às 13h00 = 4 horas), consideramos estar incluída na quantia mensal de €1.640, a de €80,00 (€5,00 x 4 h x 4 semanas). Ou seja, e concluindo, afigura-se-nos, face ao referido, que no montante global de €1.640,00 estavam incluídas as mencionadas quantias de €80,00 + €420,00 + 100€ + €80,00, bem como a de €900,00 que a A. já recebia anteriormente, tudo num total de €1.580,00, esta a retribuição/contrapartida correspondente ao período de trabalho que a A. passou a prestar a partir de 2011. Quanto ao remanescente, no valor mensal de €60,00, afigura-se-nos que se destinavam a compensar os domingos e feriados em que a A. trabalhava, mas não já, pelas regras da experiência, lógica e normalidade das coisas, a pagar duodécimos dos subsídios de férias e de Natal. Com efeito, pagando a Ré, a título de subsídios de férias e de Natal, as quantias de €400,00 e de €400,00, não faria qualquer sentido deixar por pagar a quantia de, apenas, €30,00 e €30,00 por cada um deles, considerando-os como duodécimos, quantias estas que, se fosse esse o desiderato (pagamento de subsídios de férias e de Natal), seriam certamente pagas em conjunto com os €400,00. Assim sendo, alteram-se os nº 8 e 22 dos factos provados, que se aglutinam num único ponto – o nº 8º- , que passa a ter a seguinte redação [eliminando-se o nº 22]: 8. Até ao ano de 2010, a A. não recebeu qualquer montante a título de subsídios de férias e de Natal; em 2010 auferiu, a tais títulos, as quantias mencionadas em 15 dos factos provados; e, a partir de 2011, o montante mensal de €1.640,00 que a A. recebia incluía €1.580,00 a título de remuneração pelo trabalho referido no nº 10 que a A. passou a prestar, reportando-se o restante, no valor de €60,00, ao pagamento de compensação pelos domingos e feriados em que a A. trabalhava. Importa, por fim e ainda a propósito desta questão, salientar que é ao empregador, no caso a Ré, que compete o ónus da prova do pagamento por constituir matéria de exceção (art. 342º, nº 2, do Cód. Civil). E, por outro lado e tendo em conta a fundamentação aduzida pela 1ª instância em que se refere que: “O apelo às regras da experiência comum e o elevado montante mensal que a Ré passou a pagar ao A. não conduzem à prova de que em 2010 a A. tenha auferido os subsídios de férias e de Natal (até porque, a essa data, ainda a A. não recebia €1.640), nem à prova de que, desde 2011, tal quantia, até ao montante que acima referimos (€1.580) incluía duodécimos de subsídios de férias e de Natal e compensação por trabalho prestado aos domingos e feriados. Pese embora esse aumento, também aumentou substancialmente o período de trabalho diário e semanal da A. como acima demonstramos, não porcedendo, pois, o apelo às regas da experiência. E, por outro lado, não procede também o fundamento, retirado da circunstância de a A. ter acesso e utilizar os cartões de multibanco da Ré, “de que se tivessem ficado por liquidar quaisquer montantes seria crível que a demandante tivesse feito com que os mesmos lhe fossem efectivamente entregues, quando se dirigia a um desses terminais para levantar as quantias respectivas aos seus salários”, há que dizer o seguinte: a A. utilizava, efetivamente, dois cartões multibanco da Ré para as despesas desta, entre as quais, o pagamento da sua retribuição, nada autorizando, porém, a conclusão de que, por tal facto, se “faria pagar” daquilo que consideraria estar em dívida. De acordo com o depoimento da A., tudo o que levantava, incluindo a sua retribuição, era entregue à Ré que, depois, lhe pagava, nem resultando (nem tendo sido alegado pela Ré) da prova produzida qualquer indício ou sugestão de que a A. ficaria, para si, com quantias superiores àquelas que a Ré lhe entenderia ser de pagar, nem de que a Ré não soubesse controlar os levantamentos e/ou contas, antes pelo contrário, como decorre, designadamente, dos depoimentos das testemunhas CC e FF, dos quais resulta que a Ré era capaz de tal controlo. 1.3. Quanto às als. a), b), c), f) e p) dos factos não provados que, porque relacionados, serão apreciados em conjunto. Delas consta o seguinte: “a. Até ao ano de 2010, a Autora não gozou férias. A Autora, ao longo dos quase 15 anos em que trabalhou para a Ré, não gozou férias, como tanto queria. E não as gozou porque sucessivamente ao longo dos anos a Ré, de forma consciente e voluntária, o impediu. b. De resto, a quantidade de trabalho que era imposta à Autora não o permitia, sequer. c. Quando, todos os anos, a Autora tentava marcar as suas férias, a Ré insistia que não seria possível, uma vez que naquele período tinha de desempenhar determinadas tarefas domésticas como, por exemplo, limpezas profundas a determinadas divisões da casa. f. Caso faltasse, os valores aqui em causa, concernentes ao subsídio de férias e ao subsídio de Natal, jamais lhe seriam pagos. p. Sempre que a Autora tentava marcar as suas férias a Ré lhe respondia: “Só pode ir de férias quando eu morrer. Aliás, a AA devia era divorciar-se e vir morar definitivamente para cá!”. A A/Recorrente, embora reconhecendo que a falta de gozo de férias não se devia à necessidade de limpezas profundas, pretende todavia que a matéria das mencionadas alíneas seja dada como provada tendo em conta, em síntese, que, perante a necessidade de cuidados permanentes, a Ré não lhe permitia tal gozo. Sustenta a alteração no seu depoimento e no da testemunha DD, bem como no nº 9 dos factos provados. Na sentença recorrida, para além do que já fomos transcrevendo, foi ainda referido o seguinte: “No ponto relativo ao invocado impedimento de gozo de férias, salienta-se ainda que as dimensões da residência da R (apartamento de tipologia T2) e a circunstância da demandada residir sozinha não determina, de acordo com as regras da experiência comum, que quem ali exerce funções de serviço doméstico tenha de abdicar das suas férias para executar serviços de limpeza, quando ali se encontra a trabalhar diariamente, e a tempo integral, e a circunstância da A. ter autonomia para se ausentar sem o prévio consentimento da R., fazendo-se substituir por quem por si foi indicado, determina, em nosso entender, a possibilidade da A. de gozar férias sempre que assim lhe fosse conveniente.” A necessidade de prestação de “serviços profundos de limpeza” não justificam, na verdade, que a A. fosse, por isso, impedida de gozar férias, sendo que, como decorre de toda a prova produzida, a casa da Ré era um apartamento tipo T2, nem foi feita qualquer prova da necessidade da prestação de serviços de limpeza em período que fosse de férias. Mas já o mesmo não se dirá quanto à necessidade de prestação de assistência à Ré. Esta carecia, diariamente, dessa assistência, como decorre dos nºs 9 e 9-A dos factos provados e do demais que já acima se disse, designadamente a propósito dos mesmos, sendo que, para além da A., e da filha desta que a substituía no jantar da Ré (e no almoço de domingo), não existia, como decorre de toda a prova produzida, mais ninguém que prestasse tal assistência mormente durante todo o período de 22 dias úteis de férias. Não existia qualquer outra trabalhadora para o efeito e não era também, a assistência, prestada pela família, sendo que nem a Ré, nem a família, diligenciaram ou cuidaram no sentido de substituir a A. para que esta gozasse férias. E não era à A. que incumbia a obrigação de arranjar quem a substituísse, nem tinha a filha desta, testemunha DD, qualquer obrigação de a substituir no período de férias da A. Uma coisa é a A. fazer-se substituir pela filha nas ausências entre as 18h00 e as 23h00 para prestar assistência ao jantar da Ré, ou ao almoço de domingo ou a alguma ausência pontual da A. durante o seu período de trabalho, outra, completamente distinta, é substituir a A. durante 22 dias úteis para gozo de férias da A. Acresce dizer que dessa necessidade de prestação diária de assistência, bem como dos depoimentos da A. e da testemunha DD, resulta que aquela nunca gozou férias, sendo que dos demais depoimentos prestados não resulta qualquer contraprova, muito menos credível e suficiente, quer de que a A. as tivesse gozado, quer de que tivesse sido substituída por alguém da família ou outra trabalhadora, quer de que a Ré ou família tivessem diligenciado nesse sentido. Diga-se que a testemunha CC referiu que a A. dizia que não precisava de férias o que, só por si, não se nos afigura suficiente no sentido de concluir que haja sido a A. quem recusou gozar férias cujo gozo lhe tivesse sido proporcionado pela Ré, tanto mais que, do referido depoimento, não decorre que tivesse sido apresentada à A. qualquer “proposta” concreta de gozo de férias e de alternativa a quem cuidasse da Ré. Assim, adita-se à matéria de facto provada o nº 25 com a seguinte redação: 25. Até ao ano de 2010 e, após 2011, a A. não gozou férias dada, pelo menos a partir deste ano (2011), a necessidade da prestação, pela A., da assistência à Ré de que esta, nos termos dos nºs 9 e 9-A dos facto provados, carecia e uma vez que a Ré e sua família não a substituíram por outra pessoa que a prestasse. Quanto ao mais que consta das als. a), b), c), f) e p) ou não se mostra necessário ou disso não se fez prova que se nos afigurasse suficientemente convincente, designadamente quanto às als. f) e p), ainda que a A. e a testemunha DD o hajam referido. 1.4. Quanto à al. m) dos factos não provados: Dela consta que: “m. Foi sempre a Autora que acompanhou a Ré em todos os episódios de urgências em que esta se viu envolvida.” Pretende a Recorrente que seja dado como provado, o que sustenta no depoimento da testemunha DD e no documento 1 junto com a p.i. A mencionada testemunha corrobora o referido, assim como do documento 1 (relatórios hospitalares) resulta que a foi a A. quem acompanhou a Ré nos episódios hospitalares nele referidos. E, por outro lado, não foi feita contraprova de que assim não fosse, não tendo as testemunhas CC, EE, II ou FF, referido que tivessem levado a Ré ao hospital (o que a testemunha CC referiu foi que foi, depois, ia lá ter e/ou visitar a R ao Hospital). Assim adita-se à matéria de facto provada o nº 26 com o seguinte teor: 26. Foi sempre a Autora que acompanhou a Ré em todos os episódios de urgências em que esta se viu envolvida. 1.5. Quanto às als. n) e o) dos factos não provados: Deles consta que: “n. Acontece que a Autora, nos últimos oito anos de duração do seu contrato nunca gozou o dia de descanso semanal a que tinha legalmente direito. o. Ademais, nunca foi permitido à Autora o gozo dos feriados legalmente previstos que ocorreram nesse período. Sendo certo que também não gozou o descanso correspondente a esses dias noutros períodos.” Pretende a Recorrente que sejam dados como provados, para o que invoca contradição entre aqueles e os nºs 9 e 22 dos factos provados. Relembrando, dos nºs 9 (com a alteração por nós introduzida) e 9-.A (por nós aditado) e nº 8 (por nós alterado, nele se aglutinado o nº 22, que foi eliminado) consta que: 9. A partir de 1 de janeiro de 2011, atendendo à idade avançada da Ré e aos cuidados constantes que era necessário prestar-lhe, a Autora começou a trabalhar diariamente, de domingo a segunda feira, sem prejuízo do referido no nº 10, pernoitando em casa da Ré. 9.A. Apesar de estar cognitivamente integra, a Ré necessita, desde 2011, de auxílio para praticamente todas as atividades da vida diária, designadamente levantar-se, deitar-se, higiene, locomoção, preparação de refeições, compras e marcação e acompanhamento a consultas e exames médicos, carecendo, desde então de cuidados constantes que eram prestados pela A., incluindo durante a noite, para que, também durante esta, lhe pudesse prestar a assistência de que a Ré necessitasse. 8. Até ao ano de 2010, a A. não recebeu qualquer montante a título de subsídios de férias e de Natal; em 2010 auferiu, a tais títulos, as quantias mencionadas em 15 dos factos provados; e, a partir de 2011, o montante mensal de €1.640,00 que a A. recebia incluía €1.580,00 a título de remuneração pelo trabalho referido no nº 10 que a A. passou a prestar, reportando-se o restante, no valor de €60,00, ao pagamento de compensação pelos domingos e feriados em que a A. trabalhava Não existe propriamente contradição pois que, não obstante o referido em tais pontos, tal não é necessariamente incompatível com a possibilidade de gozo pela A. de algum dia de descanso semanal e/ou feriados, ainda que não de todos. Quanto ao gozo de dias de descanso semanal, foi feita prova, pelos depoimentos da A. e da testemunha DD, que a A. não gozou qualquer dia de descanso semanal [facto que foi por elas referido], sendo que no domingo apenas acontecia que saía à hora de almoço e regressando, pelo menos, às 23h00 (não foi feita prova segura se, no período entre fim de almoço e as 18h00 regressaria e, em caso afirmativo, quando). Também não foi, pela Recorrida, feita contraprova desse facto, não tendo as testemunhas por esta arroladas concretizado qualquer dia de descanso semanal (domingo) que a A. tivesse gozado, ou referido a existência de qualquer outra pessoa que, para além da filha da A., a substituísse para que esta (A) gozasse esse dia de descanso semanal e/ou indicado outra pessoa, mas que a A. o tivesse recusado. E o mesmo se diga quanto ao gozo, em substituição do domingo, de qualquer outro dia de descanso semanal. E o mesmo se diga quanto aos feriados, à exceção do dia 25 de Dezembro, em que dos depoimentos da A. e da testemunha DD resulta que era o único feriado que a A. gozava. Assim, adita-se à matéria de facto provada o nº 27 com a seguinte redação: 27. A A., desde janeiro de 2011, mas sem prejuízo do referido no nº 10, nunca gozou o dia de descanso semanal por inteiro, nem outro em substituição, assim como, salvo no que se reporta ao dia 25 de Dezembro, nunca gozou dos dias feriados legalmente previstos, assim como não gozou, em substituição, qualquer dia de descanso em outro período. 1.6. Quanto à al. j) dos factos não provados, dela consta que: “j. Não obstante todas as circunstâncias que se descreveram, a verdade é que a Autora sempre prestou o seu trabalho com zelo e diligência, tendo agido sempre no interesse da Ré e sendo a sua grande companhia até ao passado dia 5 de Outubro de 2019, altura em que foi despedida.” Pretende a Ré que o facto seja dado como provado, o que sustenta no depoimento da testemunha DD. Na sentença recorrida referiu-se o seguinte: “Quanto à qualidade da prestação das funções prestadas à R. não só a A. não apresentou qualquer meio de prova (para além do depoimento da sua filha que neste ponto, pouca credibilidade pode apresentar dado o evidente interesse em defender a versão apresentada pela sua mãe) que pudesse evidenciar o zelo e categoria da sua actividade profissional, como o Tribunal considerou diversas indicações das testemunhas acima indicadas que desabonaram a sua prestação profissional”. O segmento onde se refere “Não obstante todas as circunstâncias que se descreveram, a verdade é que” tem natureza valorativa e conclusiva, não devendo constar da decisão da matéria de facto. O segmento em que se refere “altura em que foi despedida” tem natureza jurídica, já que, aí, se qualifica a causa de cessação do contrato de trabalho como consubstanciando um despedimento, pelo que também não pode constar da decisão da matéria de facto. Quanto ao trabalho “com zelo e diligência” tem natureza conclusiva, consubstanciando-se em factos de onde se pudesse extrair tal conclusão. De todo o modo, é de referir que, pese embora resulte, no essencial, da conjugação dos depoimentos as testemunhas que a Ré era bem tratada fisicamente pela A., designadamente em termos de higiene, resulta todavia que, de acordo com os mesmos, a A. exerceria “pressão psicológica” sobre a Ré no sentido de que lhe dizia que se esta fosse para um lar seria “maltratada”. Quanto ao facto de A. ser a “grande companhia da Ré” tal decorre dos depoimentos da A. e da testemunha DD, dos quais resulta que a Ré, salvo quanto às visitas da sobrinha CC, ao domingo, e da cunhada II, não recebia outras visitas, até porque não o pretendia. E, no essencial, tal decorre também dos depoimentos das mencionadas testemunhas CC, EE, II e FF, dos quais resulta que a A. não recebia outras visitas, sendo as de CC ao domingo, as de II, algumas vezes durante a semana e/ou ao domingo, EE mais esporadicamente e quando acompanhava a mãe (CC) e FF que deixou de as fazer uma vez que a Ré não mostrava vontade de visitas. Não decorre, também, que a Ré recebesse outras visitas, antes pelo contrário, não gostava nem as queria receber visitas (depoimentos da A. e de DD, e não contrariados pelos das demais testemunhas). Assim, adita-se à matéria de facto provada o nº 28, com a seguinte redação: 28. A A. era a grande companhia da Ré até 05.10.2019. No mais, improcede a impugnação. 1.7. Quanto às als. q), r), s), t) e u), delas consta que: “q. Viu-se, a Autora desempregada numa idade em que dificilmente arranjará emprego, o que lhe traz ansiedade e medo de nunca mais voltar ao mercado de trabalho. r. A Autora continua a acordar praticamente todas as noites julgando ouvir a voz da Ré a chamá-la e a pedir auxílio, como estava habituada nos últimos anos. s. Além disso, desenvolveu, nos últimos meses, episódio depressivo, com anedonia, humor depressivo, cansaço, diminuição no autocuidado, ansiedade somática e psíquica, anorexia com perda de peso e perturbação do sono, tudo causado pelo despedimento de que foi alvo. t. Por prestar trabalho em semelhantes termos, a Autora viu-se, ao longo de anos a fio, impossibilitada de exercer actividades lúdicas, de lazer, de convívio com a família e os amigos, de celebração de eventos – como o Natal e a passagem de ano, que passava a trabalhar. u. Não se podem, ainda, olvidar os danos causados à saúde por interrupção ou falta de dormir o tempo necessário, com todas as consequências daí inerentes, como a indisposição física e psíquica pessoais (e ao nível do relacionamento com terceiros). Quanto às als. q), r). t) e u) pretende que sejam dadas como provadas. Quanto à al. s) pretende que seja dado como provado, pelo menos, que a Recorrente “LV. Daqui resulta que se deveria ter provado, no menos, que a Recorrente “é acompanhada em consulta de Psiquiatria no Hospital ... por perturbação de ansiedade generalizada. Adicionalmente, desenvolveu episódio depressivo nos últimos meses, com anedonia, humor depressivo, cansaço, diminuição do autocuidado, ansiedade somática e psíquica, anorexia com perde de peso e perturbação do sono”, sendo cero que a própria Recorrente reconheceu que todas estas maleitas advieram do fim da sua relação laboral, como resulta do aludido relatório médico.” [cfr. conclusão LV]. Sustenta as alterações: da al. q), no relatório médico que constitui o doc 6 junto com a p.i.; da al. r) no depoimento da testemunha DD; da al. s), no mencionado doc. 6; da al. t), no nº 9 dos factos provados; da al. u), invocando tratar-se de facto notório. Na fundamentação da decisão da matéria de facto aduzida na sentença recorrida referiu-se o seguinte: “(…) já no que toca ao relatório médico, junto sob o doc. nº 6 com aquele mesmo articulado, entende-se que a ligação ali estabelecida entre os sintomas reconhecidos á A. e o despedimento aqui em apreço resulta apenas do relatado pela própria, como, aliás, ali expressamente se deixou consignado, pelo que não poderá estabelecer o necessário nexo de causalidade. Acresce ainda, no que ao impacto do despedimento diz respeito, que atenta a idade muito avançada da ora R. constitui, em nosso entender, facto notório que o contrato de trabalho que vigorava entre as aqui intervenientes teria uma duração expectável mais encurtada, por força das circunstâncias. (…) Acresce ainda que a conduta da demandante ao não declarar este rendimento mensal, que auferiu durante mais de 10 anos, para efeitos de IRS demonstra uma clara conduta reprovável, que merecerá infra consequências legais, mas que igualmente indicia que a omissão no cumprimento das contribuições devidas à Segurança Social não será exclusivamente imputável à R. Destaca-se ainda, neste ponto, a circunstância da demandante vir deduzir pedido de fixação de indemnização por danos morais decorrentes da dificuldade de encontrar novo emprego, por via da sua idade, quando a circunstância de nunca ter declarado os vencimentos que foi auferindo ao longo dos anos, a impedir de ter acesso às prestações sociais a que teria certamente direito em virtude da situação de desemprego, e bem assim a inexistência de contribuições à Segurança Social, ao longo de mais de 14 anos, a impede de aceder a seu tempo a pensão de reforma por velhice. Também a descrição efectuada pelas testemunhas arroladas pela R. foi unânime quanto à previsibilidade da necessidade de transferência da mesma para um Lar, dada a frequência com que tinha de se deslocar ao Hospital, por problemas gástricos, e porque a sua idade exigia cuidados médicos permanentes, o que era incompatível com a manutenção da situação em que se encontrava, dado que a A. não tem formação em geriatria ou em cuidados médicos, pelo que a decisão que lhe veio a ser comunicada não terá constituído qualquer surpresa.” Apreciando. O documento nº 6 junto com a p.i. constitui um relatório médico, datado de 18.12.2019, emitido em consulta médica da especialidade de psiquiatria do Hospital ..., EPE, no qual se refere o seguinte: “A utente supracitada é acompanhada em consulta de Psiquiatria no Hospital ... por perturbação de ansiedade generalizada. Comorbidamente desenvolveu episódio depressivo nos últimos meses, com anedonia, humor depressivo, sansaço, diminuição de autocuidado, ansiedade somática e psíquica, anorexia com perda de peso e perturbação do sono. A doente aponta, como factor precipitante, um despedimento recente. Á data da redação desta declaração, ajusta-se a medicação para alívio sintomático.” Quanto à al. q), dos nºs 19 e 20 dos factos provados decorre que o contrato de trabalho entre a A. e a Ré cessou aos 05.10.2019, decorrendo das regras da experiência e senso comuns, da lógica e da normalidade da vida que a A., perante o referido, se haja sentido ansiosa e com receio de não conseguir voltar ao mercado trabalho, tanto mais que, como declarou no início do seu depoimento de parte, tem 64 anos de idade. Assim, adita-se à matéria de facto provada o nº 29, com o seguinte teor: 29. A A., por virtude da cessação do contrato de trabalho, e atenta a sua idade (cerca de 61 anos a essa data), sentiu-se ansiosa e com receio de não mais voltar ao mercado de trabalho. Quanto à al. r), foi referido pela testemunha DD que o seu pai, marido da A., lhe diz que a A. acorda durante a noite julgando ouvir a voz da Ré a chamá-la. O marido da A. não depôs em julgamento, não se sabendo as circunstâncias, número de vezes e período de tempo em que tal se terá verificado, não se nos afigurando suficiente a mencionada prova. Assim, e nesta parte, improcede a impugnação. Quanto à al. s) não temos razões para por em causa o que é atestado no relatório médico que consta do documento nº 6 junto com a p.i. relativamente à sintomatologia e/ou estado que a A. apresenta. Já quanto às razões do referido, de tal relatório apenas consta que é a A. “quem aponta como fator precipitante um despedimento recente”. Tal causalidade não é, pois, atestada pelo médico, mas sim pela A., pelo que se nos afigura insuficiente no sentido da prova de que a sintomatologia e estado relatados em tal relatório resultem da cessação do contrato de trabalho. E concorda-se com a fundamentação aduzida pela sentença na parte em que se diz que, mais cedo ou mais tarde, face à idade avançada da Ré e problemas de saúde que apresentava, seria ou poderia ser expetável que fosse para um lar. Assim, adita-se à matéria de facto provada o nº 30 com a seguinte redação: 30. Aos 18.12.2019, a A. era acompanhada em consulta de Psiquiatria no Hospital ... por perturbação de ansiedade generalizada, tendo desenvolvido episódio depressivo nos últimos meses, com anedonia, humor depressivo, cansaço, diminuição de autocuidado, ansiedade somática e psíquica, anorexia com perda de peso e perturbação do sono. Quanto à al. t), a impossibilidade de a A., ao longo dos anos, exercer atividades lúdicas, de lazer, de convívio com a família e de celebração de eventos, à exceção do Natal, por estar a trabalhar é uma consequência lógica e necessária dos nºs 9, 9-A, 25 e 27 dos factos provados. Assim, adita-se à matéria de facto provada o nº 31, com a seguinte redação: 31. Em consequência do referido nos nºs 9, 9-A, 25 e 27 dos factos provados e por virtude da prestação da sua atividade para a Ré, a A. viu-se impossibilitada de exercer atividades lúdicas, de lazer, de convívio com a família e amigos e de celebrar eventos, à exceção do Natal, no dia 25 de dezembro. Finalmente, quanto à a. u) dos factos não provados, diz a Recorrente tratar-se o mesmo de facto notório. Dispõe o art. 412º, nº 1, do CPC/2013, que “1 - Não carecem de prova nem de alegação os factos notórios, devendo considerar-se como tais os factos que são do conhecimento geral.” Não assiste razão à Recorrente. Desde logo, o que consta da al. u), não é mais do que uma conclusão, retirada de forma genérica e não relacionada com a concreta situação da A., dela não constando factos que permitam concluir que esta não dormia e/ou não dormia o tempo suficiente, que era interrompida durante a noite, nada se dizendo relativamente ao tempo que dormia e ao número de vezes em que era interrompida durante a noite. E tal não se retira, muito menos necessariamente, da circunstância de a A. pernoitar em casa da Ré, nem isso resulta da prova, que aliás a A. não invocou para sustentar a impugnação. Assim como não se retira que a A. tivesse, muito menos por isso, sentido indisposição física e psíquica e ao nível de relacionamento com terceiros. E não é manifestamente um facto notório, que seja, designadamente no que concretamente sucedeu com a A. (e é isso que releva), do conhecimento geral. Improcede, assim e nesta parte, a impugnação. 1.8. Oficiosamente, procede-se às seguintes alterações à decisão da matéria de facto: No nº 14 dos factos provados elimina-se a expressão “finalmente” que tem natureza valorativa, pelo que tal ponto passará a ter a seguinte redação: 14. Em 2010, em data que a Autora não pode precisar, mas por volta do mês de Junho, a Autora solicitou expressamente à Ré que esta lhe pagasse os montantes que lhe eram devidos àquele título. No nº 11 do elenco dos factos provados consta que: “11. A partir dessa data (2011), a Autora era, além do mais, a cuidadora informal da Ré.” Tal ponto tem natureza meramente conclusiva, retirando-se (ou não) de factualidade que a suporte, para além de que tem também natureza jurídica, correspondendo a um conceito jurídico. Assim, elimina-se o nº 11 dos factos provados. 2. Em face do exposto, são as seguintes as alterações introduzidas à decisão da matéria de facto provada: 8. Até ao ano de 2010, a A. não recebeu qualquer montante a título de subsídios de férias e de Natal; em 2010 auferiu, a tais títulos, as quantias mencionadas em 15 dos factos provados; e, a partir de 2011, o montante mensal de €1.640,00 que a A. recebia incluía €1.580,00 a título de remuneração pelo trabalho referido no nº 10 que a A. passou a prestar, reportando-se o restante, no valor de €60,00, ao pagamento de compensação pelos domingos e feriados em que a A. trabalhava [Alterado, aglutinando-se os nºs 8 e 22, sendo este eliminado] 9. A partir de 1 de janeiro de 2011, atendendo à idade avançada da Ré e aos cuidados constantes que era necessário prestar-lhe, a Autora começou a trabalhar diariamente, de domingo a segunda feira, sem prejuízo do referido no nº 10, pernoitando em casa da Ré. [alterado] 9.A. Apesar de estar cognitivamente integra, a Ré necessita, desde 2011, de auxílio para praticamente todas as atividades da vida diária, designadamente levantar-se, deitar-se, higiene, locomoção, preparação de refeições, compras e marcação e acompanhamento a consultas e exames médicos, carecendo, desde então de cuidados constantes que eram prestados pela A., incluindo durante a noite, para que, também durante esta, lhe pudesse prestar a assistência de que a Ré necessitasse. [Aditado] 10. No período compreendido entre as 18:00 e as 23:00 (de segunda-feira a domingo), a Autora ia habitualmente até a sua casa visitar a sua família, tratar da sua mãe e preparar o jantar para o marido e netos, assim como, ao domingo, durante período de tempo que não se logrou apurar, ia também almoçar a sua casa e, nos demais dias, ausentando-se ainda durante o dia quando, pelo menos, tivesse consultas e/ou exames médicos, ausências em que era substituída pela sua filha, sendo que, no que se reporta ao período das 18h00 às 23h00 de segunda a sábado, esta a substituía durante cerca de uma hora (para o jantar) e, ao domingo, durante cerca de duas horas (uma para o almoço e uma para o jantar) a quem a Ré remunerava no valor de €5,00 / hora. [alterado] 14. Em 2010, em data que a Autora não pode precisar, mas por volta do mês de Junho, a Autora solicitou expressamente à Ré que esta lhe pagasse os montantes que lhe eram devidos àquele título. 24. Desde que passou a pernoitar em casa da Ré a A. tomava o pequeno –almoço, almoço e lanche em casa da Ré, a expensas desta. [alterado] 25. Até ao ano de 2010 e, após 2011, a A. não gozou férias dada, pelo menos a partir deste ano (2011), a necessidade da prestação, pela A., da assistência à Ré de que esta, nos termos dos nºs 9 e 9-A dos facto provados, carecia e uma vez que a Ré e sua família não a substituíram por outra pessoa que a prestasse. [Aditado] 26. Foi sempre a Autora que acompanhou a Ré em todos os episódios de urgências em que esta se viu envolvida. [Aditado] 27. A A., desde janeiro de 2011, mas sem prejuízo do referido no nº 10, nunca gozou o dia de descanso semanal por inteiro, nem outro em substituição, assim como, salvo no que se reporta ao dia 25 de Dezembro, nunca gozou dos dias feriados legalmente previstos, assim como não gozou, em substituição, qualquer dia de descanso em outro período. [Aditado] 28. A A. era a grande companhia da Ré até 05.10.2019. [Aditado] 29. A A., por virtude da cessação do contrato de trabalho, e atenta a sua idade (cerca de 61 anos a essa data), sentiu-se ansiosa e com receio de não mais voltar ao mercado de trabalho. [Aditado] 30. Aos 18.12.2019, a A. era acompanhada em consulta de Psiquiatria no Hospital ... por perturbação de ansiedade generalizada, tendo desenvolvido episódio depressivo nos últimos meses, com anedonia, humor depressivo, cansaço, diminuição de autocuidado, ansiedade somática e psíquica, anorexia com perda de peso e perturbação do sono. [Aditado] 31. Em consequência do referido nos nºs 9, 9-A, 25 e 27 dos factos provados e por virtude da prestação da sua atividade para a Ré, a A. viu-se impossibilitada de exercer atividades lúdicas, de lazer, de convício com a família e os amigos e de celebrar eventos, à exceção do Natal, no dia 25 de dezembro. [Aditado] E, eliminam-se, como referido, os nºs 11 e 22 dos factos provados. 3. Dos subsídios de férias e de Natal Na petição inicial a A. reclamou o pagamento dos subsídios de férias e de Natal relativos aos anos de 2005 a 2019, sendo de esclarecer que, quanto aos subsídios de Natal relativos aos cinco primeiros anos (de 2005 a 2009) o fez à razão de €80,00, €400, €450,00, €450 e €450,00 (2005, 2006, 2007, 2008 e 2009, respetivamente), o que totaliza €1.830,00, sendo que, para tanto, teve em conta o art. 12º, nº 1, do DL 435/92, de 24.09[4], no qual se refere que “1 - O trabalhador do serviço doméstico tem direito a um subsídio de Natal não inferior a 50/prct. da parcela pecuniária da retribuição correspondente a um mês, o qual deve ser pago até ao dia 22 de Dezembro de cada ano.” [já quanto aos subsídios de natal de 2010 e seguintes e o nº 2 do citado art. 12º, teve em conta, quanto a 2010, a retribuição de €900,00 e a de €1640,00 quanto aos anos subsequentes, reclamando, quanto a 2019, o proporcional, no montante de €1.252,82] Quanto ao subsídio de férias relativo as esses anos de 2005, 2006, 2007, 2008 e 2009 reclamou, na p.i., o pagamento das quantias de, respetivamente, €160,00, €800,00, €900,00, €900,00 e €900,00, que totaliza €3.660,00. 3.1. No que toca aos subsídios de férias e de Natal relativos ao período de 2005 a 2009, a sentença recorrida condenou a Ré a pagar à A. a quantia global de € 5.490,00, acrescida dos respetivos juros de mora, tendo referido o seguinte: “Quanto ao período de 2005 a 2009, inclusive, temos que distinguir entre os subsídios de férias e o subsídio de Natal, já que de acordo com o disposto no art. 12º do Dec.-Lei nº 235/92 de 24/10 (com as alterações introduzidas pela Lei nº 114/99 de 03/08) este subsídio deverá ser equivalente a ½ do vencimento mensal e após perfazer a antiguidade de 5 anos, passará a ser equivalente à retribuição, pelo que a este título a A. terá direito às quantias de € 80,00 (referente ao ano de 2005); € 400,00 (referente ao ano de 2006) e € 450,00 relativamente aos anos de 2007, 2008 e 2009, pelo que o total ascende a € 1.830,00 (mil oitocentos e trinta euros). Já quanto ao subsídio de férias temos que atender ao disposto no art. 18º do mesmo diploma legal, que determina o pagamento de retribuição equivalente à retribuição, pelo que quanto aos anos de 2005 a 2009, temos as quantias de € 160,00, € 800,00, € 900,00, € 900,00 e € 900,00, pelo que o seu total ascende € 3.660,00. Isto posto, temos que a título de subsídios de férias e de Natal e relativamente ao período temporal entre 2005 e 2009 o total em dívida pela R. ascende a € 5.490,00 (cinco mil quatrocentos e noventa euros).” E, no recurso, alega a Recorrente que: “XC. Neste conspecto, a sentença padece de erro de julgamento que deve ser suprido, condenando-se a Recorrida no pagamento dos montantes peticionados a título de subsídio de férias e de Natal vencidos e não pagos – que expressamente se invoca –, a saber: • 15.332,82 Euros a título a título de subsídio de férias não pago nos anos de 2005, 2006, 2007, 2008, 2009, 2010, 2011, 2012, 2013, 2014, 2015, 2016, 2017, 2018 e 2019 e • 13.502,82 Euros a título a título de subsídio de Natal não pago nos anos de 2005, 2006, 2007, 2008, 2009, 2010, 2011, 2012, 2013, 2014, 2015, 2016, 2017, 2018 e 2019.” No que toca aos mencionados anos de 2005 a 2009, como decorre do que a A. reclamou e do que foi reconhecido na sentença, verifica-se que esta, nessa parte, julgou procedente o pedido, tendo condenado a Ré nos termos peticionados pela A., tendo, pois, a sentença, nessa parte, transitado em julgado. Ora, assim sendo, deveria esta, no recurso, ter autonomizado essa parte e abstido-se de, quanto a ela, recorrer, pois que não ficou vencida, tendo-lhe sido reconhecido o que havia, nessa parte, peticionado. E, assim sendo, quanto aos subsídios de férias e de Natal relativos ao período de 2005 a 2009, nada há a conhecer no recurso. 3.2. Estão pois em causa os subsídios de férias e de Natal relativos aos anos de 2010 a 2019. Na sentença, quanto a estes, referiu-se o seguinte: “Já a partir de 2010 e tal como a própria reconhece no seu petitório, passaram a ser-lhe liquidados os valores referentes a estes subsídios no montante de € 400,00 cada e a partir de 2011 a demandante passou a trabalhar todos os dias e a pernoitar em casa da R. passando a auferir o vencimento mensal de € 1.640,00 acrescido de alojamento e de alimentação, o que se traduz num valor mensal superior a € 2.000,00 (tomando em conta um valor de alojamento mínimo de € 300,00). Quanto a este montante entende-se (tal como se deixou já exposto na motivação de facto acima consignada) que já inclui os valores, em duodécimos, referentes às férias, subsídios de férias e de Natal, aqui incluído o ano de cessação do contrato de trabalho – 2019 em que os proporcionais de férias, subsídios de férias e de Natal foram sendo liquidados ao longo do ano com excepção do montante referente aos 5 dias do mês de Outubro que não foram liquidados à aqui A. Na verdade, temos que atender ao facto de que, em 2011, o salário mínimo fixado para a categoria profissional para o serviço doméstico era de € 485,00 (vide dados da Pordata.pt) pelo que o montante mensal liquidado pela R. incluiria certamente os duodécimos destes subsídios, bem como as compensações pelo trabalho prestado em dias feriados. Mesmo atendendo-se a um valor base remuneratório de € 1.200,00 (superior ao que lhe era liquidado em 2010 de € 900,00) temos que os duodécimos de subsídio de férias e de subsídio de Natal importariam em € 100,00 cada, o que perfazeria uma retribuição mensal de € 1.400,00 a que acresciam ainda € 240,00 para compensação do trabalho prestado aos domingos e em dias feriados, sem prejuízo do alojamento e alimentação. Cumpre ainda salientar que a demandante, a partir de 2011, tendo ficado sozinha com a R. e gerindo inclusivamente as suas contas bancárias, no que aos pagamentos da sua retribuição diz respeito, passou a ter não só total domínio do modo como geria o cumprimento das suas tarefas, como também o tempo de trabalho em que estava presente/ausente de casa da demandada. Este grau de autonomia da demandante é, em nosso entender, fulcral para que o Tribunal pudesse determinar da imposição à mesma do trabalho aos domingos e nos dias feriados, dado que a A. podia-se fazer substituir nas suas ausências, pela sua filha, sem que a R. tivesse registado qualquer oposição e remunerando a filha da A. pelo serviço prestado em substituição daquela. Temos, assim, que a demandada demonstrou que o pagamento do valor mensal a título de retribuição incluía igualmente estes subsídios de férias e de Natal a partir do ano de 2011 e até ao ano de 2019.” 3.3. Ao caso, é aplicável o já citado DL 235/92, de 24.10, que estabelece o regime jurídico do contrato de serviço doméstico, com as alterações introduzidas pela Lei nº 114/99 de 03/08. É de referir que, no âmbito da Agenda para o Trabalho Digno, a Lei 13/2023, de 03.04, veio introduzir alterações ao mencionado diploma, alterações essas que não são, contudo, aplicáveis ao caso em apreço dado a relação laboral ter, toda ela, vigorado e cessado, em momento anterior ao da publicação da Lei 13/2023 (e, por consequência, ao da sua entrada em vigor, que apenas ocorreu aos 01.05.2023). Tendo em conta a alteração à decisão da matéria de facto, impõe-se, o que desde já se dirá, revogar a sentença recorrida, assistindo à A. parcial razão. Com efeito: Nos mencionados anos a A. tem direito, em cada ano, a receber: os subsídios de férias de valor igual ao da remuneração correspondente ao período de férias e, esta, não pode ser inferior à que receberia se estivesse em serviço efetivo (arts. 17º e 18º), bem como os subsídios de Natal correspondente a um mês de retribuição (art. 12º, nº 2), direito este que, diga-se, já era assegurado pelo DL 88/96, de 03.07, que concedeu o subsídio de Natal a todos os trabalhadores, incluindo do serviço doméstico. De referir ainda que o ónus de alegação e prova do pagamento incumbe ao empregador, por se tratar de matéria extintiva do direito do trabalhador (art. 342º, nº 2, do Cód. Civil). No caso, do nº 8 dos factos provados decorre que: em 2010, a A. auferiu, a tais títulos, as quantias mencionadas em 15 dos factos provados; e, a partir de 2011, o montante mensal de €1.640,00, que incluía €1.580,00 a título de remuneração pelo trabalho referido no nº 10 que a A. passou a prestar, reportando-se o restante, no valor de €60,00, ao pagamento de compensação pelos domingos e feriados em que a A. trabalhava. Quanto a 2010, a A. tinha direito a receber de subsídios de férias e de Natal as quantias de, respetivamente, €900,00 e de €900,00, sendo que recebeu as de €400,00 e de €400,00. E, por outro lado, em relação a esse ano, nada se provou no sentido de que na remuneração mensal de €900,00 estivessem incluídas quaisquer verbas por conta de “duodécimos” dos mesmos (e/ou por compensação dos dias de descanso e feriados que não gozou). Assim, relativamente ao ano de 2010, tem a A. direito à receber as quantias de €500,00 e de €500,00, a título, respetivamente, de subsídios de férias e de Natal vencidos nesse ano [900-400 x 2]. E sobre estas quantias, tem direito a juros de mora, à taxa legal, até efetivo e integral pagamento – arts. 804º, 805º, nº 2, al. a), 806º e 559º do CC. Quanto à data desde a qual tais juros são devidos, por se tratarem de prestações com prazo certo de vencimento, são as mesmas devidas desde a data em que tais subsídios deviam ter sido pagos – art. 805º, nº 2, al. a), do CC. O DL 235/92 não dispõe sobre a data em que o subsídio de Natal é devido, pelo que, nos termos do art. 263º, nº 1, do CT/2009, aplicável subsidiariamente ex vi do art. 9º, do mesmo, o subsídio de Natal deve ser pago até ao dia 15 de dezembro, assim constituindo-se a Ré em mora, quanto ao subsídio de Natal de 2010, no dia 16.12.2010. Quanto ao subsídio de férias, deve o mesmo ser pago até ao início das férias. No caso, e tendo em conta que a A. não gozou férias, mas que as férias vencidas nesse ano poderiam ser gozadas no mês de dezembro, entendemos que a Ré se constituiu em mora a 01.12.2010 (dado que o subsídio deve ser pago no seu início). Quanto aos subsídios de férias e de Natal vencidos em 2011 e seguintes: Provou-se que, embora a A. recebesse mensalmente €1.640,00, a remuneração pelo trabalho referido no nº 10 que a A. passou a prestar correspondia a €1.580,00, reportando-se o restante, no montante de €60,00 ao pagamento de compensação pelos domingos e feriados em que a A. trabalhava. Quanto ao subsídio de férias, o art. 17º, nº 1, do já citado DL 235/92 equipara a retribuição auferida em férias à que o trabalhador auferiria se estivesse ao serviço efetivo, devendo o subsídio de férias ser idêntico ao da retribuição em férias, conforme art. 18º do mesmo. Ora, assim sendo, e tendo em conta que a retribuição a que a A. teria direito em período de férias seria a de €1.640,00 por ser esta a correspondente à que auferiria em serviço efetivo, tanto mais que o remanescente (€60,00 mensais) consubstancia prestação regular e periódica (compensação pelo trabalho prestado nos dias de descanso semanal e feriados), que era recebida em todos os meses do ano e que, assim, integra o subsídio de férias, deve este corresponder à quantia de €1.640,00. Já quanto ao subsídio de Natal, reporta-se o art. 12º, nº 2, ao valor de um mês de retribuição. No âmbito do CT/2009 (e já desde o CT/2003), tem vindo a ser entendido que, nos termos conjugados dos arts. 263º e 262º, nº 1, e salvo acordo em contrário, que o conceito de retribuição a ter em conta para efeitos de tal subsídio será o correspondente à retribuição base (e diuturnidades), excluindo pois outras prestações, ainda que de natureza retributiva. Pese embora a natureza especial do DL 235/92 e tratando-se, como se trata, de interpretar e integrar o conceito de retribuição para efeitos do subsídio de Natal, sendo que, aquele, não o define e nada determina em contrário, afigura-se-nos ser de aplicar a mencionada disposição [art. 262º, nº 1)] do CT/2009, ex vi do art. 9º do mesmo. Ora, assim sendo, entendemos que, no caso, a retribuição a atender para efeitos de subsídio de Natal será a de €1.580,00. Por conta desses subsídios, a Ré pagou, nos anos de 2011 a 2018, a quantia de €400,00 em relação a cada um deles, sendo que, relativamente a 2019 e tendo a A. alegado que a Ré nada lhe pagou, não fez esta prova do seu pagamento, prova essa que, como referido, sobre esta impendia. Assim: A título de subsídios de férias vencidos desde 01.01.2011 a 01.01.2019, tem a A. direito à quantia global de €11.560,00 [(1.640 – 400) x 8 + 1640]; A título de subsídios de Natal vencidos desde 2011 a 2018, tem direito à quantia global de €9.440,00 [(1580 – 400) x 8], bem como à quantia de €1.203,40 [1.580 : 365 x 278 dias] proporcional a 278 dias de 2019. Ou seja, a título de subsídios de Natal de 2011 a 2019, tem a A. direito ao montante global de €10.643,40. Sobre as quantias devidas a título de subsídios de férias e de Natal são devidos juros de mora, à taxa legal, até efetivo e integral pagamento e desde: Quanto aos subsídios de férias, os juros de mora são devidos desde a data em que cada uma das prestações vencidas de 2011 a 2018 deveria ter sido paga, ou seja, desde, respetivamente, 01.12.2011, 01.12.2012, 01.12.2013, 01.12.2014, 01.12.2015, 01.12.2016, 01.12.2017, 01.12.2018 [art. 805º, nº 2, al. a)]. Quanto ao subsídio de férias vencido em 2019, dado que o contrato de trabalho cessou antes do termo do ano civil em que as férias correspondentes poderiam ter sido gozadas, os juros são devidos desde a data da citação [art. 805º, nº 1]. Quanto aos subsídios de Natal vencidos a 15/12 de cada um dos anos de 2011 a 2018, os juros de mora são devidos desde o dia 16/12 de cada um desses anos [art. 805º, nº 2, al. a)] e, quanto ao subsídio de Natal de 2019, dado que o contrato de trabalho cessou antes da data em que se venceria, são devidos desde a data da citação [art. 805º, nº 1]. 4. Dos feriados e dias de descanso semanal não gozados Dispunha o art. 24º do DL 235/92 que: “1 - O trabalhador alojado e o não alojado a tempo inteiro têm direito, sem prejuízo da retribuição, ao gozo dos feriados obrigatórios previstos no regime geral do contrato individual de trabalho. 2 - Com o acordo do trabalhador pode haver prestação de trabalho de duração normal nos feriados obrigatórios, que deve ser compensado com tempo livre, por um período correspondente, a gozar na mesma semana ou na seguinte. 3 - Quando, por razões de atendível interesse do agregado familiar, não seja viável a compensação com tempo livre, o trabalhador tem direito à remuneração correspondente. 4 - Os trabalhadores de serviço doméstico cuja retribuição seja fixada com referência à semana, à quinzena ou ao mês não podem sofrer redução na retribuição por motivo do gozo de feriados obrigatórios.” No caso, provou-se que a A., desde janeiro de 2011, salvo no que se reporta ao dia 25 de Dezembro, nunca gozou os feriados legalmente previstos, assim como não gozou, em substituição, qualquer dia de descanso (pelo feriado) em outro período [nº 27 dos factos provados por nós aditado] Tinha, pois, a A. direito a gozar os feriados obrigatórios, pelo que, nunca os tendo gozado (salvo o dia 25 de Dezembro), e não tendo, em substituição, gozado o feriado em qualquer outro dia, tem pois direito ao pagamento da retribuição correspondente a cada dia feriado não gozado no período compreendido entre 01.01.2011 e 05.10.2019. Quanto aos dias de descanso semanal dispõe o art. 15º que “1 — O trabalhador não alojado a tempo inteiro e o trabalhador alojado têm direito, sem prejuízo da retribuição, ao gozo de um dia de descanso semanal. 2 — Pode ser convencionado entre as partes o gozo de meio-dia ou de um dia completo de descanso, além do dia de descanso semanal previsto no número anterior. 3 — O dia de descanso semanal deve coincidir com o domingo, podendo recair em outro dia da semana, quando motivos sérios e não regulares da vida do agregado familiar o justifiquem.” O mencionado diploma não dispõe, no que se reporta ao descanso semanal, de norma idêntica ao citado art. 24º, nº 3, certamente porque entende o legislador que o descanso semanal consubstancia direito indisponível que não pode, por acordo das partes, ser substituído por uma compensação pecuniária. Porém, não poderá deixar de ser aplicável, ex vi do art. 9º do CT/2009, o disposto no art. 229º, nº 3, do mesmo, nos termos do qual o trabalhador que presta trabalho em dia de descanso semanal obrigatório tem direito a um dia de descanso compensatório remunerado, a gozar num dos três dias úteis seguintes. Não tendo o descanso semanal obrigatório (no caso o domingo) sido gozado, nem gozado o descanso compensatório, e não podendo vir a sê-lo dada a cessação do contrato de trabalho, tem o trabalhador, incluindo o domestico, direito a receber a retribuição correspondente ao descanso semanal não gozado sob pena de enriquecimento sem causa do empregador que beneficiou do trabalho do trabalhador em dia de descanso semanal deste sem lhe conferir qualquer outro dia de descanso compensatório e sem qualquer contrapartida ou custo por esse trabalho indevidamente prestado em dia que devia ser de descanso. No caso, provou-se que a A., desde janeiro de 2011, sem prejuízo do referido no nº 10, nunca gozou o dia de descanso semanal por inteiro, nem outro em substituição, sendo que permanecia ao serviço da Ré, e na disponibilidade para o mesmo, no período das 00h00 de domingo às 13h00 e, pelo menos, das 23h00 às 24h00 do mesmo, ou seja, durante 14 horas em cada um dos domingos. Tinha pois a A. direito a gozar os dias de descanso semanal (domingo), pelo que, nunca os tendo gozado, nem tendo, em substituição, gozado qualquer outro dia de descanso compensatório, tem a mesma direito ao pagamento da retribuição correspondente a cada um dos domingos no período compreendido entre 01.01.2011 e 05.10.2019. Os domingos e feriados compreendidos em tal período a ter em conta decorrem do calendário (facto público e notório), sendo os indicados no art. 112º da p.i., porém com as seguintes ressalvas: - no que se reporta aos feriados do período de 01.01.2013 a 01.04.2016, os dias correspondentes aos feriados do Corpo de Deus, 05/10, 01/11 e 01/12, os quais foram eliminados pela Lei 23/2012, de 25.06 e que, no que concerne, entrou em vigor a 01.01.2013, pelo que não serão atendidos. Tais feriados foram repostos pela Lei 8/2016, de 01.04, que entrou em vigor aos 02.04.2016 e que, assim e a partir desta data, deverão ser novamente atendidos. - Atender-se-á, também, ao dia 24 de junho, feriado municipal do Porto. - Tendo o contrato cessado aos 05.10.2019 (nºs 19 e 20), não há que contabilizar o feriado de 05.10.2019. - os feriados e/ou domingos que coincidam com o dia 25 de dezembro, dia de Natal, não serão atendidos uma vez que a A. os gozou, como decorre da matéria de facto provada. - a terça feira de Carnaval não deverá ser atendida uma vez que não se trata de feriado, mas de tolerância de ponto, não aplicável ao serviço doméstico; - os dias feriados que coincidam com o domingo, será atendido apenas uma vez, contabilizado como domingo. Assim, o número de feriados não gozados é, no total, de 80 [11, 8, 7, 8, 8, 10, 11, 9 e 8 feriados nos anos de, respetivamente, 2011, 2012, 2013, 2014, 2015, 2016, 2017, 2018 e 2019] O número de domingos não gozados [incluindo os que coincidem com feriado] é, no total, de 454[5] [49+3, 49+4, 49+2, 51 + 1, 52 + 0, 50 + 1, 52 + 1, 49 + 3, 39 + 8 domingos, nos anos de, respetivamente, 2011, 2012, 2013, 2014, 2015, 2016, 2017, 2018 e 2019]. A retribuição a ter em conta é a retribuição diária de €52,67 [1.580 : 30]. Assim, a título de feriados não gozados tem a A. direito à quantia global de €4.213,60. A título de domingos não gozados tem a A. direito à quantia global de €23.912,18. Tendo, porém, em conta que a Ré pagou, mensalmente, à A. €60,00 por conta dos domingos e feriados não gozados, haverá que descontar às mencionadas quantias a quantia global de €6.360 [€60 x 106 meses]. É de esclarecer que, relativamente a outubro de 2019, ano da cessação do contrato de trabalho, a sentença recorrida condenou a Ré no pagamento, por inteiro, da retribuição, no montante de €1.640,00 e, daí, haver que descontar, também, a quantia de €60,00 referente a esse mês. Assim, tem a A. direito a receber a título feriados e dias de descanso semanal (domingos) não gozados a quantia global, de €21.765,78 [€4.213,60 + €23.912,18 - €6.360]. Sobre as mencionada quantia incidem juros de mora, à taxa legal, desde a data em que cada uma das prestações deveria ter sido paga, até efetivo e integral pagamento (arts. 804º. 805º, nº 2, al. a), 806º e 559º todos do CC). 5. Da violação do direito a férias A A., nos termos dos arts. artigo 21.º do DL 235/92 e do n.º 2 do artigo 337.º do CT/2009, reclamou o pagamento da quantia global de €15.625,64 a título de violação do direito a férias correspondente aos anos de 2015, 2016, 2017, 2018 e 2019, nos montantes parcelares de €3.280,00, €3.280,00. €3.280,00, €3.280,00 e de €2.505,64, respetivamente, pelo que, e atento o principio do dispositivo, serão apenas estes os considerados. Dispunha o art. 16º do DL 235/92, que o trabalhador doméstico tem direito a 22 dias úteis de férias, que se vence no dia 1 de janeiro de cada ano e, o art. 20º, que “1 - As férias devem ser gozadas no decurso do ano civil em que se vencem, podendo, por acordo, ser gozadas em dois períodos interpolados, sem que, neste caso, qualquer dos períodos possa ter duração inferior a 10 dias úteis consecutivos. 2 - A marcação do período de férias deve ser feita por acordo entre a entidade empregadora e o trabalhador. 3 - Na falta de acordo, cabe à entidade empregadora fixar as férias no período que medeia entre 1 de Maio e 31 de Outubro.” Por sua vez, nos termos do art. 21º do citado diploma que “No caso de a entidade empregadora obstar ao gozo das férias nos termos previstos no presente diploma, o trabalhador tem direito a receber, a título de indemnização, o dobro da retribuição correspondente ao período em falta, que deverá, obrigatoriamente, ser gozado no 1.º trimestre do ano civil subsequente.” No caso, e no que se reporta às férias vencidas em 01.01.2019, não se nos afigura existir violação do direito a férias uma vez que o contrato cessou aos 05.10.2019, ou seja, antes do termo do ano civil de 2019 pelo que, não fosse essa cessação, as férias poderiam ainda vir a ser gozadas, não se podendo, pois, dizer que a Ré tenha obstado ao gozo dessas férias. No que se reporta aos anos de 2015 a 2018, decorre da matéria de facto provada que a A. não gozou férias dada a necessidade da prestação à Ré da assistência, nos termos da matéria de facto provada (nºs 9 e 9-A), de que esta carecia e uma vez que a Ré e sua família não a substituíram por outra pessoa que a prestasse [nº 25 dos factos provados aditado]. Ora, tendo em conta tal factualidade, não podemos deixar de considerar que a Ré obstou a que a A. gozasse o seu direito anual a férias. Com efeito, a Ré carecia da assistência da A., sendo que, como entidade empregadora, lhe competia, e não à A., diligenciar por arranjar quem a substituísse por forma a poder facultar-lhe a possibilidade de exercer o seu direito ao gozo das férias a que tinha direito, não podendo ser à A. assacada a responsabilidade por não as ter gozado. E, diga-se, fê-lo a Ré culposamente na medida em que, como empregadora, sabia, ou devia saber, que à A. assistia o direito, aliás indisponível, de gozar férias, sendo de salientar que, para o efeito, não é exigível o dolo. Tem assim a A. direito a título de indemnização, ao dobro da retribuição correspondente ao período em falta que, no caso, é de 22 dias úteis por cada um dos mencionados anos de 2015 a 2018 tal como peticionado, mas não pelo valor pedido. Como já se disse, o valor da retribuição mensal da A. era de €1.580,00 e não de €1.640,00. Assim, a tal título, tem a A. direito à quantia global de €12.640,00 [1580 x 2 x 4 anos]. Sobre esta quantia acrescem juros de mora, à taxa legal, desde a data da citação até efetivo e integral pagamento – arts. 804º, 805º, nº 1, 806º e 559º do CC. 6. Da indemnização por danos não patrimoniais A A. reclamou o pagamento da quantia de €1.500,00 a título de indemnização por danos não patrimoniais decorrentes, por virtude do que alega, da cessação do contrato de trabalho, bem como, a quantia de €1.000,00, a título também de danos não patrimoniais, decorrente da violação do direito ao gozo dos dias de descanso e feriados o que a impediu de “exercer actividades lúdicas, de lazer, de convívio com a família e os amigos, de celebração de eventos – como o Natal e a passagem de ano, que passava a trabalhar”, mais dizendo que “não se podem, ainda, olvidar os danos causados à saúde por interrupção ou falta de dormir o tempo necessário, com todas as consequências daí inerentes, como a indisposição física e psíquica pessoais (e ao nível do relacionamento com terceiros)”. 6.1. Dispõe o art. 483º do Cód. Civil que “1. Aquele que, com dolo ou mera culpa, violar ilicitamente o direito de outrem ou qualquer disposição legal destinada a proteger interesses alheios fica obrigado a indemnizar o lesado pelos danos resultantes da violação” e, o art. 496º do mesmo diploma que “1- Na fixação da indemnização deve atender-se aos danos não patrimoniais que, pela sua gravidade, mereçam a tutela do direito”. São quatro os requisitos da tutela dos danos não patrimomniais: (a) comportamento ilícito e culposo do agente; (b) existência de danos; (c) que esses danos, pela sua gravidade, mereçam a tutela do direito; (d) que se verifique um nexo causal entre aquele comportamento e o dano, por forma a que este seja daquele consequência. 6.2. No que se reporta à indemnização pelos alegados danos decorrentes da cessação do contrato de trabalho: Na sentença recorrida referiu-se o seguinte quanto à cessação do contrato de trabalho: “Quanto ao modo de cessação do contrato de trabalho, que vigorou entre as partes temos que considerar o preceituado no art. 28º nº 1 al. d), ainda do regime jurídico do Contrato de Serviço Doméstico que dispõe “O contrato de serviço doméstico caduca nos casos previstos neste diploma e nos termos gerais de direito, nomeadamente (…) d) Ocorrendo alteração substancial das circunstâncias de vida familiar do empregador que torne imediata e praticamente impossível a subsistência da relação de trabalho.”, pelo que não se pode deixar de concluir que a R. tendo decidido passar a residir num Lar deixou de ter necessidade dos serviços prestados pela A. o que determinou a caducidade do seu contrato de trabalho, mas de acordo com o nº 3 daquele mesmo preceito legal esta caducidade determina o pagamento de compensação correspondente a um mês de retribuição “…por cada três anos de serviço, até ao limite de cinco, independentemente da retribuição por inteiro do mês em que se verificar a caducidade do contrato.”, pelo que atenta a antiguidade da A. indicada na factualidade acima dada como assente – de 14 anos - temos que será devida à mesma demandante a quantia de € 6.560,00 (seis mil quinhentos e sessenta euros) a que acresce a retribuição por inteiro referente ao mês de cessação do contrato (Outubro de 2019), isto é, € 1.640,00 (mil seiscentos e quarenta euros), num total de compensação de € 8.200,00 (oito mil e duzentos euros).” Decorre, pois, do referido, que o contrato de trabalho cessou por caducidade do mesmo nos termos do art. 28º nº 1 al. d), do DL 235/92 dado a Ré ter ido residir para um lar, ou, o mesmo é que dizer, que cessou de forma lícita, segmento esse que não foi aliás posto em causa no recurso. Ora, assim sendo, falece desde logo o primeiro dos pressupostos de procedência do mencionado pedido de indemnização por danos não patrimoniais, qual seja a prática de ato ilícito por parte da Ré. E também não se verifica o necessário nexo causal entre o referido no nº 30 dos factos provados, pressuposto esse também necessário à procedência do pedido. Quanto à ansiedade e receio de não mais voltar ao mercado de trabalho que a A. sentiu, é de salientar que não consubstancia o mesmo, muito menos só por si, dano suficientemente grave a merecer a tutela do direito. De todo o modo, tal é consequência da cessação lícita do contrato de trabalho, não acarretando tal cessação, porque lícita, qualquer obrigação de reparação do dano. 6.3. No que se reporta à indemnização pelos alegados danos decorrentes da violação do direito ao descanso e gozo de feriados: É certo que a A. não gozou os descansos semanais e feriados que deveria ter gozado e que a Ré não lhos facultou, sendo tal factualidade suscetível de conferir, em abstrato, o direito à indemnização por danos não patrimoniais porém desde que, dela, decorressem danos indemnizáveis. Ora, no caso, não se provaram danos, de natureza não patrimonial que hajam sido sofridos pela A., não se nos afigurando que como tal deva ser considerada a impossibilidade de a A. exercer atividades lúdicas, de lazer, de convívio com a família e os amigos e de celebrar eventos, sendo que daí não resulta, nem da matéria de facto resulta, a repercussão que isso teve na saúde, física e/ou mental da A., ou no seu estado emocional. Quanto à interrupção do sono, desde logo, nada decorre da matéria de facto provada quanto às interrupções do sono e das consequências que tal possa ter tido para a A., não se encontrando provado, pois, qualquer dano. E tanto basta, sem necessidade de considerações adicionais, no sentido da não verificação de um dos pressupostos (dano) do alegado direito indemnizatório. Assim sendo e concluindo, sem necessidade de considerações adicionais, deve o recurso improceder no que toca ao pedido de indemnização por danos não patrimoniais. *** V. DecisãoEm face do exposto, acorda-se, na parte impugnada, em julgar o recurso parcialmente procedente e, em consequência: A. Condena-se a Ré, BB, a pagar à A., AA, as quantias a seguir referidas e, assim, e nesta parte, revogando-se a sentença recorrida em que absolveu a Ré de tais pedidos: a.1. a quantia de €500,00 a título de subsídio de Natal vencido em 2010, bem como juros de mora, à taxa legal, desde 16.12.2010, até efetivo e integral pagamento. a.2. a quantia de €500,00 a título de subsídio de férias vencido em 2010, bem como juros de mora, à taxa legal, desde 01.12.2010; a.3. a título de subsídios de férias vencidos desde 01.01.2011 a 01.01.2019, a quantia global de €11.560,00, bem como a pagar juros de mora desde a data em que cada uma das prestações vencidas de 2011 a 2018 deveria ter sido paga (01.12.2011, 01.12.2012, 01.12.2013, 01.12.2014, 01.12.2015, 01.12.2016, 01.12.2017, 01.12.2018, respetivamente) e, quanto ao subsídio de férias vencido em 2019, desde a data da citação. a.4. a quantia global de €9.440,00 a título de subsídios de Natal vencidos desde 2011 a 2018, acrescida de juros de mora, à taxa legal, desde 16 de dezembro de cada um desses anos, bem como a pagar a quantia de €1.203,40 a título de subsídio de Natal de 2019, acrescida de juros de mora, à taxa legal, desde a data da citação até efetivo e integral pagamento. a.5. as quantias de €4.213,60, a título de retribuição por feriados não gozados e a de €23.912,18 a título de descansos semanais não gozados, ambos, no período de 01.01.2011 a 04.10.2019, bem como a pagar-lhe, sobre as mencionada quantias, juros de mora, à taxa legal, desde a data em que cada uma das prestações integradas nas mencionadas quantias deveria ter sido paga, até efetivo e integral pagamento . a.6. a quantia global de €12.640,00 a título de indemnização por violação do direito a férias referente aos anos de 2015 a 2018, bem como a pagar-lhe, sobre tal quantia, juros de mora, à taxa legal, desde a data da citação até efetivo e integral pagamento. B. No mais impugnado no recurso, julga-se o mesmo improcedente, confirmando-se a sentença recorrida. Custas pela Recorrente e Recorrida na proporção dos respetivos decaimentos. Porto, 27.09.2023 Paula Leal de Carvalho Rui Penha Jerónimo Freitas ________________ [1] Relatado pela Exmª Desembargadora Fernanda Soares e em que a ora relatora interveio como segunda adjunta, acórdão não publicado, ao que se supõe. [2] Não publicado, ao que se supõe. [3] Relatado pelo Exmº Sr. Desembargador Jerónimo Freitas. [4] Que regula o regime jurídico do contrato de trabalho de serviço doméstico, na redação original, alterada pela Lei nº 114/99 de 03/08 [5] 439 domingos + 15 domingos que coincidem com feriados. |