Acórdão do Tribunal da Relação do Porto | |||
| Processo: |
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| Nº Convencional: | JTRP000 | ||
| Relator: | FERNANDA ALMEIDA | ||
| Descritores: | DELIBERAÇÕES DA ASSEMBLEIA DE CONDÓMINOS PROPRIEDADE HORIZONTAL PARTE COMUM OBRAS DE CONSERVAÇÃO | ||
| Nº do Documento: | RP201906033124/17.1T8MTS.P1 | ||
| Data do Acordão: | 06/03/2019 | ||
| Votação: | UNANIMIDADE | ||
| Texto Integral: | S | ||
| Privacidade: | 1 | ||
| Meio Processual: | APELAÇÃO | ||
| Decisão: | CONFIRMADA | ||
| Indicações Eventuais: | 5ª SECÇÃO, (LIVRO DE REGISTOS N.º 697, FLS.14-18) | ||
| Área Temática: | . | ||
| Sumário: | Estando em causa despesas de conservação e fruição relativas a telhado que serve em exclusivo uma fração do prédio constituído em propriedade horizontal, estabelece o art. 1424.º, n.º 3, CC, ser por elas responsável apenas o respetivo titular. | ||
| Reclamações: | |||
| Decisão Texto Integral: | Processo n.º 3124/17.1T8MTS.P1 * Acordam os juízes abaixo-assinados da quinta secção, cível, do Tribunal da Relação do Porto:RELATÓRIO AUTORA: B…, UNIPESSOAL, LDA., sita na Rua …, …, …. - …, no Porto,RÉUS: 1. C…, com domicílio na Rua …, n.º …, …, …. - …, em Matosinhos; 2. D…, com domicílio na Rua …, n.º …, …, …. - …, em Matosinhos; 3. E…, com domicílio na Rua …, n.º …, …, …. - …, em Matosinhos; 4. F…, com domicílio na Rua …, n.º …, ..., …. - …, em Matosinhos; 5. G…, com domicílio na Rua …, n.º …, …, …. - …, em Matosinhos; 6. H…, com domicílio na Rua …, n.º …, …, …. - …, em Matosinhos; 7. I…, com domicílio na Rua …, n.º …, …, …. - …, em Matosinhos; 8. J…, com domicílio na Rua …, n.º …, …, …. - …, em Matosinhos; 9. K…, com domicílio na Rua …, n.º …, …, …. - …, em Matosinhos; 10. L…, com domicílio na Rua …, n.º …, …, …. - …, em Matosinhos; 11. M…, com domicílio na Rua …, n.º …, …, …. - …, em Matosinhos; 12. N…, com domicílio na Rua …, n.º …, …, …. - …, em Matosinhos; 13. O…, com domicílio na Rua …, n.º …, …, …. - …, em Matosinhos; Por via da presente ação declarativa potestativa, pretende a A. obter a declaração de nulidade da deliberação tomada na assembleia de condóminos de 24.3.2017 a qual entendeu que o telhado da fração pertencente à A. não é parte comum do prédio em propriedade horizontal, pelo que as obras que lhe respeitam não devem ser suportadas pelo condomínio. A A. entende, ao invés, ser o telhado parte da fração e, por via disso, deverem ser suportadas por todos os condóminos as obras de conservação. Invoca o disposto nos arts. 1421.º, n.º 1 b) e 1424.º CC. * Foi apresentada contestação pelos réus C…, D…, E…, H…, I…, J…, L… e N…, na qual expuseram o seu entendimento de que o telhado da fração serve esta em exclusivo por ser cobertura apenas do respetivo interior.* Realizado julgamento, foi proferida sentença em cujo dispositivo se lê:o Tribunal decide (…) declarar a nulidade parcial da deliberação tomada pelos réus na assembleia de condóminos do prédio urbano sito na Rua …, n.ºs … e …, em Matosinhos e realizada no dia 21 de Abril de 2017, na parte em que determinaram “o telhado da fração “A” (na parte em que não serve de cobertura a nenhuma parte comum) não é parte comum do edifício”. Os factos aí dados como provados são os seguintes: 1) A autora é dona da fracção “A” correspondente ao rés-do-chão, destinado a garagem, do prédio urbano sito na Rua …, n.º … e …, em Matosinhos, do prédio urbano inscrito na matriz predial da União das … e …. sob o art. 7723º e descrito na Conservatória do Registo Predial de Matosinhos sob o nº …. 2) O prédio urbano descrito na Conservatória do Registo Predial de Matosinhos sob o nº … foi constituído em propriedade horizontal em 31 de Outubro de 1991. 3) Em Fevereiro de 2017, a administração do condomínio convocou os condóminos para uma Assembleia de Condóminos Extraordinária a realizar no dia 24 de Fevereiro de 2017, com a seguinte ordem de trabalhos: - Aprovação do relatório de contas do ano de 2016; - Eleições da administração de dois mil e dezassete; - Outros assuntos de interesse geral do condomínio. 4) Foi aditado um quarto ponto à ordem de trabalhos da referida Assembleia de Condóminos Extraordinária, a pedido da autora, designado “aprovação da realização de obras em partes comuns do edifício, nomeadamente telhados e coberturas”. 5) A aludida Assembleia de Condóminos foi reagendada para 24 de Março de 2017, por solicitação da autora. 6) Tendo lugar nessa data (24 de Março de 2017), em que se encontravam presentes 77,24% dos condóminos. 7) A pedido da administração de condomínio, a Assembleia de Condóminos foi suspensa e retomada no dia 21 de Abril de 2017, quando já se encontravam presentes todos os condóminos. 8) Relativamente ao ponto quatro da ordem de trabalhos, foi decidido por todos os condóminos à excepção da autora que o telhado daquela fracção A (na parte em que não serve de cobertura a nenhuma parte comum) não é parte comum do edifício e em consequência, foi deliberado por maioria dos condóminos que “() tais obras não devem ser comparticipadas pela Administração de Condomínio”. 9) A autora votou contra a deliberação referida em 8). 10) O telhado da fracção A, na parte em que excede a prumada do edifício, não é cobertura de coisa alguma, para além do chão da fábrica. 11) O telhado de cobertura apresenta buracos por onde entra água da chuva. * Desta sentença recorre a A., visando a sua revogação de modo a reconhecer-se que as obras a realizar como intervenção de natureza estrutural e manutenção dos materiais que asseguram a função do telhado enquanto cobertura do prédio, pelo que terão de ser suportadas pelo conjunto dos Condóminos na sua globalidade e em função da sua permilagem no valor global do edifício e, em consequência, declare a total nulidade da deliberação.Em abono desta pretensão, alinhou como conclusões do recurso: ………………………………………………………………. ………………………………………………………………. ………………………………………………………………. Foram apresentadas contra-alegações. O recurso foi recebido nos termos legais e, já nesta Relação, os autos correram Vistos. * Cumpre conhecer do mérito da apelação.Questões a decidir: Se, relativamente ao telhado de uma fábrica sita em fração integrante da propriedade horizontal e que serve apenas de cobertura a essa fração, as despesas de manutenção e conservação devem ser suportadas apenas pelo respetivo proprietário ou pelo condomínio ainda que os restantes condóminos (e as restantes frações do condomínio) não beneficiem de todo da função de cobertura daquele telhado – art. 1424.º, n.º 3 CC. FUNDAMENTAÇÃO Os factos que interessam à decisão da causa são os expostos supra e constantes da sentença recorrida.De Facto De Direito Em causa está a parte do teto da fração da A. que é um telhado constituído por placas de fibrocimento pois são estas que demandam obras de reparação, uma vez que várias placas estão danificadas, permitindo a entrada da chuva[1].Considerou a sentença que, não servindo a cobertura em causa qualquer outro espaço do prédio em propriedade horizontal, será caso de aplicação do disposto no n.º 3 art. 1424.º CC, segundo o qual As despesas relativas aos diversos lanços de escadas ou às partes comuns do prédio que sirvam exclusivamente algum dos condóminos ficam a cargo dos que delas se servem. Entende a recorrente que este telhado tem uma função de cobertura e proteção não apenas desta fração, mas de todo o edifício, destinando-se a garantir a estabilidade do prédio no seu todo. Assim – prossegue – as obras de intervenção sobre tal elemento interessam diretamente a todos, posto que não intervindo em situação de degradação é todo o imóvel que se degrada. Nos termos do disposto no art. 1421.º, n.º 1 b) CC, o telhado e os terraços de cobertura são comuns e são-no ainda que destinados ao uso de qualquer fração. Já de acordo com o art. 1424.º, n.º 1 CC, as despesas necessárias à conservação e fruição das partes comuns são pagas pelos condóminos na proporção do valor das suas fracções. Este art. 1424.º refere-se a despesas de conservação e fruição (conforme consta da sua epígrafe). Não estabelece qualquer distinção entre despesas de conservação ordinária e extraordinária[2]. Não há dúvida de que o telhado dos autos é parte comum e a sentença afirma-o. Mas também se diz – e a recorrente não põe em causa – que esta parte comum apenas serve a fração da A. e não tem uma função de cobertura relativamente a qualquer outra fração. Ou seja, a sentença separou claramente esta fração das restantes partes do imóvel e a lei também admitiu que, no imóvel em propriedade horizontal, quanto às partes comuns, apenas o condómino que delas se sirva seja responsável pelos respetivos encargos de conservação e fruição (n.º 3 do art. 1424.º CC). Não se dúvida que o legislador sabia que os prédios em propriedade horizontal constituem não só uma unidade jurídica, mas também uma unidade física e que, mesmo quando apenas utilizadas por um dos condóminos, as partes comuns precisam de manutenção de tal forma que a sua degradação não deixará de afetar o todo. Este argumento – o que de não cuidando de uma parte é o todo que pode ser afetado – não inibiu o legislador de estabelecer que pelas despesas de conservação e fruição dessa parte é apenas responsável o condómino que delas se serve em exclusividade. Assim sendo, relativamente ao telhado de uma fração que apenas serve de cobertura àquela fração e não já, mesmo que indiretamente, a todo o imóvel, é responsável pelas despesas de conservação e fruição o titular da fração em causa. Para que se considerasse de forma diferente seria mister que nos factos provados resultasse algo diferente do que consta do ponto 10, nomeadamente que existiria uma unidade ou um continuum entre o restante prédio e este telhado de tal forma que não pode fazer-se intervenção num deles sem afetar o restante, ou ainda que este telhado segue para outras frações. Porém, nada foi apurado quanto a essa situação e a alegação da recorrente segundo a qual a segurança do prédio ficará em causa se um telhado de uma sua fração, ainda que autónomo, sofrer degradação, mormente por efeito da entrada de água, é abstratamente válida para todas as situações de partes comuns que sirvam em exclusivo algum dos condóminos e que fiquem degradadas, sendo que, mesmo assim, o legislador permite que as obras de conservação e fruição que lhe respeitam não onerem quem delas se não serve. Já não assim outro tipo de obras mais profundas como sejam as despesas de reconstrução ou as que não sejam unicamente imputáveis ao uso da fração posto que a norma alude expressamente a encargos de conservação e fruição. Observando os arestos citados pela recorrente, verificamos que em ambos se trata de situações de telhados ou coberturas que, servindo imediata e diretamente uma das frações, têm uma função indireta de cobertura de outras frações (no ac. desta Relação, trata-se de um terraço exclusivo de uma das frações, mas cujo piso serve de cobertura à fração inferior; no ac. do STJ, curou-se de terraços intermédios que serviam de cobertura, ainda que parcial, a frações de pisos inferiores). Donde, estando em causa despesas de conservação e fruição relativas a telhado que serve em exclusivo uma fração, nos termos do art. 1424.º, n.º 3, CC, é por elas responsável apenas o respectivo titular[3]. Por conseguinte impõe-se manter a sentença recorrida. DISPOSITIVO Pelo exposto, decidem os Juízes desta Relação julgar a apelação improcedente e manter a sentença recorrida.Custas pela recorrente. * Porto, 3.6.2019Fernanda Almeida António Eleutério Isabel São Pedro Soeiro _________________________ [1] Cfr. auto de inspeção ao local a fls. 73 v.º. [2] Cfr. Ac. RP, de 4.12.2000, Proc. 0051266: I - São três os tipos de obras que podem ter lugar nos prédios urbanos usufruídos mediante contrato de arrendamento: a) obras de conservação ordinária - reparação e limpeza geral do prédio, obras impostas pela Administração Pública e, em geral, as destinadas a manter o prédio nas condições requeridas pelo fim do contrato e existentes à data da sua celebração; b) obras de conservação extraordinária - ocasionadas por defeito de construção do prédio ou por caso fortuito ou de força maior, e, em geral, as que não sendo imputáveis a acções ou omissões ilícitas perpetradas pelo senhorio, ultrapassem, no ano em que se tornem necessárias, dois terços do rendimento líquido desse mesmo ano; c) obras de beneficiação - todas as restantes. [3] Neste sentido, ac. STJ, de 9.6.2016, Proc. 211/12.6TVLSB.L2.S1: I- O art. 1424.º, n.º 1, do CC contém um princípio geral que se traduz na obrigação de os condóminos suportarem, na proporção do valor da sua fracção, as despesas necessárias à conservação e fruição das partes comuns do edifício. II - O n.º 3 do art. 1424.º do CC contém uma excepção ao referido princípio ao estabelecer que as despesas relativas aos diversos lanços de escadas ou às partes comuns do prédio que sirvam exclusivamente algum dos condóminos ficam a cargo dos que delas se servem, i.e., dos titulares das fracções a que dão serventia exclusiva aqueles lanços de escada ou partes comuns (como sucede com um terraço que serve de cobertura a parte do prédio). III - Há, porém, que distinguir, dentro dessas despesas, as chamadas despesas de manutenção das despesas de reparação resultantes, não do uso normal das partes comuns do edifício pelos condóminos que delas se servem, mas de deficiência na construção ou de falta de manutenção de espaços exteriores a essas partes comuns que não são utilizados por aqueles condóminos: as primeiras são a cargo dos condóminos que usam e fruem do terraço por serem eles os beneficiários exclusivos do mesmo e, em princípio, terem sido eles que deram origem ao desgaste ou deterioração dos materiais desse terraço; já as segundas são a cargo de todos os condóminos por as reparações a realizar constituírem um benefício comum de todos eles. |