Acórdão do Tribunal da Relação do Porto
Processo:
0443165
Nº Convencional: JTRP00036963
Relator: PINTO MONTEIRO
Descritores: PRAZO DE INTERPOSIÇÃO DE RECURSO
RECURSO PENAL
MATÉRIA DE FACTO
Nº do Documento: RP200406090443165
Data do Acordão: 06/09/2004
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: REC PENAL.
Decisão: NEGADO PROVIMENTO.
Área Temática: .
Sumário: Em processo penal não tem aplicação o acréscimo do prazo de recurso previsto no artigo 698 n.6 do Código de Processo Civil de 1995.
Reclamações:
Decisão Texto Integral: Acordam em conferência no Tribunal da Relação do Porto:

O arguido B.......... foi condenado no Tribunal Judicial de Bragança pela prática de um crime de homicídio qualificado, na forma tentada, na pena de cinco anos de prisão.
O acórdão condenatório foi depositado na secretaria no dia 26/02/04.
De tal acórdão interpôs recurso o arguido, enviado através de telecópia recebida no tribunal no dia 17/03/04.
Por requerimento entrado no tribunal no dia 18/03/04, o arguido, invocando a aplicação ao caso do art. 698.º, n.º6, do C. P. Civil, requereu que o recurso fosse considerado tempestivo e não praticado no 3.º dia útil após o termo do prazo, não estando por isso sujeito ao pagamento da multa a que alude o art. 145.º, n.º5, do C. P. Civil, aplicável ex vi art. 107.º, n.º5, do C. P. Penal.
Por despacho de 22/03/04, foi o requerimento indeferido, com o fundamento de que aos recursos em processo penal não é aplicável o n.º6 do art. 698.º do C. P. Civil, e foi ordenada a liquidação, pela secção, da multa a que alude o n.º6 do 145.º do mesmo código.
Notificado deste despacho, por requerimento entrado no tribunal no dia 06/04/2004, requereu o arguido a rectificação do despacho acima referido, alegando que só por mero lapso é que se compreende que tenha sido ordenada a liquidação da multa nos termos do n.º6 do art. 145.º do C. P. Civil e, para o caso de assim não vir a ser decidido, a redução da multa ao abrigo do disposto no art. 145.º, n.º7, do mesmo código.
Com data de 07/04/2004, foi proferido despacho a indeferir tal requerimento e a rejeitar o recurso interposto do acórdão, por intempestivo.
Pelo arguido foi interposto recurso do despacho que considerou não aplicável aos recursos em processo penal o n.º6 do art. 698.º do C. P. Civil e ordenou a liquidação da multa nos termos do n.º6 do art. 145.º do mesmo código, e do despacho que considerou não ter havido lapso na indicação da liquidação da multa nos termos desta disposição legal e rejeitou o recurso interposto do acórdão.
O recurso foi rejeitado na parte em que põe em causa o despacho que rejeitou o recurso do acórdão, por a sua forma de impugnação ser a reclamação, e admitido na parte em que põe em causa as restantes decisões.

XXX
Concluiu o recorrente a motivação nos seguintes termos:
1 – “É aplicável em processo penal o disposto no artigo 698º, nº6, do C.P.C., “ex vi” artigo 4º do C.P.P., no que respeita ao alargamento do prazo de recurso, se o recorrente pretende impugnar a matéria de facto, solicitando a reapreciação da prova”. – Acórdãos do S.T.J. de 27/11/2002 (in C.J. S.T.J., Ano X, 2002, Tomo III, pág. 236) e de 10/7/02 (no Pº nº 1.088/02, 3ª Secção, inédito, naquele citado).
2 – “O direito ao recurso, corporizando-se como um dos elementos das garantias fundamentais da defesa, não só pressupõe como mesmo reclama que o recorrente disponha não apenas dos elementos indispensáveis à própria decisão de recorrer ou não, mas ainda daqueles dados e elementos necessários à elaboração e apresentação da própria motivação, aliás simultânea em processo penal”, o que “tratando-se de impugnação da matéria de facto, não deixa de determinar e de envolver todo um particular e muito especial circunstancialismo, a requerer e a exigir consequentemente a devida atenção, face ao ónus da especificação prevenido nos nºs 3 e 4 do artº 412º do C.P.P., com as implicações e consequências que se adivinham”, situação “que de modo nenhum foi contemplada nem prevenida nas alterações introduzidas pela Lei nº59/98”.
3 – “No nosso actual sistema processual penal, a consideração única do prazo geral de 15 dias para interposição do recurso não satisfaz as referidas exigências, decorrentes desse sistema, no caso específico de o recurso poder ter como objecto a impugnação da decisão sobre a matéria de facto envolvendo a reapreciação de prova gravada”.
4 – Já a aplicação do artº 698º, nº6 do C. P. C., por força do artº 4º do C.P.P., “se harmoniza com a natureza e as regras do processo penal referentes ao recurso tendo como objecto a impugnação da matéria de facto com base em elementos decorrentes da gravação das declarações prestadas em audiência”.
5 – Acresce que só este entendimento é compatível com os direitos de defesa do arguido, que neste ponto, merecem ver preteridos os interesses reclamados por princípios de ordem pública de improrrogabilidade dos prazos ou de celeridade processual.
6 – Deve pois, o recurso apresentado pelo arguido no caso “sub judice”, interposto em 17/03/2004, do Acórdão condenatório de 26/2/2004, do Tribunal Colectivo de Bragança e tendo por objecto a reapreciação da prova produzida em audiência e gravada em suportes magnetofónicos, ser considerado tempestivo e não praticado no 3º dia útil após o termo do prazo, não estando sujeito ao pagamento de qualquer multa processual, prescrita nos artigos 107º, nº5 do C. P. P., por referência ao 145º, nº5 do C. P. C..
7 – Sem conceder, caso se considere inaplicável ao caso “sub judice”, o art. 698º, nº6, do C. P. C., a apresentação pelo arguido, logo em 18/3/04, quando ainda se encontrava em tempo para proceder ao pagamento da multa prevista no artº 145º, nº5, do C. P. C., de requerimento no sentido de ser considerado tempestivo o recurso apresentado, por acrescer ao prazo de 15 dias , o prazo de 10 dias concedido pelo art. 698º, nº6, do C. P. C., não devendo por isso, considerar-se o acto praticado sujeito ao pagamento da multa devida pela apresentação no 3º dia útil posterior ao termo do prazo, suscita questão que necessariamente há-de ter-se como prévia quanto ao acto de liquidação e pagamento da multa eventualmente devida pela prática do acto fora do respectivo prazo.
8 – Com efeito, o eventual pagamento nesse dia 18/3/04, da multa devida pela prática do acto no 3º dia, retiraria toda a utilidade e interesse processual ao requerimento do arguido de consideração do recurso como tempestivo, por aplicação do artº 698º, nº6 do C. P. C..
9 – Acresce que a dita questão prévia suscitada pelo arguido é, do ponto de vista jurídico, discutível e susceptível de merecer acolhimento, não se tratando de questão meramente dilatória nem de “lana caprina”, tanto assim que o arguido invocou logo, em favor da sua posição, o já citado Acórdão do S.T.J. de 27/11/2002, que expressamente considera aplicável ao processo penal, o acréscimo de 10 dias, ao prazo de interposição de recurso, quando este tenha por objecto a reapreciação da prova gravada produzida em audiência.
10 – De resto, se a multa processual em causa é devida pela prática do acto no 3º dia útil posterior ao termo do prazo, não pode achar-se que a mesma é devida e deve ser liquidada e paga, quando legitimamente e com fundadas razões de índole jurídica, se questiona precisamente o termo do prazo processual.
11 – Mesmo que se considere que o dito artº 698º, nº6 do C.P.C. não é aplicável ao caso dos autos, deve portanto, ser ordenada a liquidação pela Secção da multa estipulada no artº 145º, nº5 do C.P.C., “ex vi” do artº 107º, nº5, do C. P.P..
12 – Sem prescindir, a entender-se que o arguido está sujeito ao pagamento da multa a liquidar nos termos do nº6, do artº 145º, do C. P. C.. pode e deve admitir-se a redução do respectivo montante, de €712,00, por manifesta carência económica do arguido e por se revelar aquele montante manifestamente desproporcionado, ao abrigo do nº7 daquele mesmo preceito.
13 – Tal questão da redução da multa não foi equacionada nos despachos recorridos, nem apreciada nem decidida fundamentadamente no despacho de 7/04/2004, que por isso, é nulo, por absoluta falta de fundamentação de facto e de direito, nos termos dos artigos 379º, nº1 alíneas a) e c) e 374º, nº2 e nº3, alínea a), do C. P. P..
14 – O arguido está reformado e trabalhava no transporte de fruta, auferindo €500,00 mensais, é de humilde condição social e tem razoável situação económica, estando preso preventivamente à ordem destes autos desde 6/10/2003, a que acresce o concreto circunstancialismo que motivou o não pagamento, em 18/03/04, da multa devida pela prática do acto no 3º dia útil, no montante de €267,00, equivalente a ¼ da taxa de justiça mínima por cada dia útil de atraso.
15 – A multa liquidada nos termos do nº6 do artº 145º, é de facto, muito elevada e onerosa, pelo que, quer por manifesta carência económica do arguido, quer por se revelar manifestamente desproporcionado o montante liquidado de €712,00, equivalente ao dobro da taxa de justiça mínima aplicável ao presente processo, é razoável que o valor da multa, a ser devida, seja reduzido àquela referida quantia de €267,00, correspondente a ¾ da taxa de justiça mínima aplicável neste processo.
16 – No despacho recorrido de 7/04/2004, a decisão de rejeição do recurso interposto pelo arguido do Acórdão condenatório do Tribunal Colectivo de Bragança, não atendeu à tramitação processual ocorrida nos autos.
17 – Se o arguido pagasse as guias liquidadas e remetidas pela Secção, nos termos do artº 145º, nº6 do C.P.C., no valor de €712,00, perderia todo o sentido e revelar-se-ia completamente despropositado e manifestamente infundamentado, o requerimento que simultaneamente apresentasse, ao abrigo do preceito legal plasmado no artº 145º, nº7 do C.P.C., para redução da multa, por carência económica sua ou por desproporção do respectivo valor.
18 – A consideração de que, por não ter satisfeito o arguido o pagamento das guias liquidadas a fls. 332, deve ser rejeitado o recurso por si apresentado nos autos de fls. 314 a 322 é, absolutamente infundada e despropositada.
19 – Mesmo a entender-se que ao caso “sub judice”, não é aplicável o acréscimo de 10 dias ao prazo de 15 dias para a interposição de recurso, que o arguido está sujeito ao pagamento da multa prescrita no artº 145º, nº6 do C. P. C. e que tal multa, no valor de €712,00 não deve ser reduzida, por não gozar o arguido de manifesta carência económica e por não ser o respectivo montante manifestamente desproporcionado, então deve simplesmente, ser ordenado que a Secção, após o trânsito em julgado da decisão que em definitivo julgar aquelas questões, proceda de novo, à emissão das guias necessárias ao pagamento da multa naquele aludido montante e as remeta ao arguido ou ao seu mandatário, para proceder ao respectivo pagamento, sob pena, então sim, de se considerar perdido o direito de praticar o acto.
20 – Foram violados os artigos 698º, nº6 e 145º, nºs 5, 6 e 7, do C. P. C., 4º, 107º, nº5, 379º, nº1 alíneas a) e c) e 374º, nº2 e nº3, alínea a), do C. P. Penal.
XXX
Terminou pedindo a revogação dos despachos recorridos e que seja ordenada a sua substituição por outro que considere aplicável em processo penal o disposto no art. 698.º, n.º6, do C. P. C., ex vi art. 4.º do C. P. Penal, se o recorrente puser em causa a matéria de facto, e, em consequência, que se considere tempestivo o recurso interposto do acórdão condenatório e não praticado no 3.º dia útil após o termos do prazo, não sujeito, portanto, ao pagamento de qualquer multa processual.
Para o caso de assim não vir a ser decidido, pediu que a liquidação da multa seja feita nos termos do art. 145.º, n.º5, do C. P. Civil; no caso de vir a ser decidido que é aplicável o nº6 desta última disposição legal, a redução da multa para a quantia de €267,00; e para o caso de ainda assim também se não entender, que seja ordenado que a secção, após o trânsito em julgado das questões suscitadas, proceda de novo à emissão das guias necessárias ao pagamento da multa no montante acima referido, e que as remeta ao arguido ou ao seu mandatário, para procederem ao respectivo pagamento, sob pena de, então, se considerar perdido o direito de praticar o acto.
XXX
Na 1.ª instância respondeu o M.º P.º pugnando pelo não provimento do recurso.
Neste tribunal, pela Exm.ª Procuradora Geral Adjunta foi emitido parecer no sentido de que o recurso merece provimento na parte em que põe em causa o indeferimento do requerimento no sentido da redução da multa a que alude o n.º7 do art. 145.º do C. P. Civil, por o pedido nesse sentido ter sido formulado em tempo, e em que põe em causa a rejeição liminar do recurso por intempestividade, devendo, por isso, o despacho recorrido ser revogado nessa parte.
Cumprido o disposto no art. 417.º, n.º2, do C. P. Penal, respondeu o recorrente rectificando algumas das datas aludidas na resposta do M.º P.º.
Foram colhidos os vistos legais.
Cumpre decidir.
XXX
Os elementos constantes dos autos com interesse para a decisão são os acima referidos.
Deles resulta que o recurso do despacho que não admitiu o recurso do acórdão condenatório foi rejeitado, por o mesmo só poder ser impugnado por via de reclamação, não constando dos autos que o arguido tenha reclamado, pelo que não nos vamos pronunciar sobre tal questão.
XXX
Tendo em conta as conclusões da motivação do recurso e que estas delimitam o seu objecto, são as seguintes as questões suscitadas a merecerem apreciação: a) aplicação do n.º6 do art. 698º do C. P. Civil aos prazos para interposição dos recursos em processo penal; b) aplicação ao caso do n.º5 do art. 145.º do C. P. Civil e prejudicialidade do requerimento do arguido no sentido da não exigência do pagamento daquela multa, face ao seu requerimento no sentido de ser considerado aplicável aos recursos em processo penal o n.º6 do art. 698.º do C. P. Civil ; c) caso assim não venha a ser decidido, nulidade do despacho por não se ter pronunciado sobre o pedido de redução da multa a que alude o n.º7 do art. 145.º do C. P. Civil; d) redução da multa.
XXX
a) Dispõe o n.º1 do art. 411.º do C. P. Penal que o prazo para a interposição do recurso é de quinze dias e que se conta a partir da notificação da decisão ou, tratando-se de sentença, do respectivo depósito na secretaria.
O acórdão do Tribunal Judicial de Bragança de que o arguido interpôs recurso foi depositado na secretaria no dia 26/02/04, pelo que o termo do prazo normal para a interposição do recurso ocorreu no dia 12 de Março.
O arguido interpôs recurso do acórdão, que enviou para o tribunal por telecópia, tendo esta ali sido recebida no dia 17 do mesmo mês e ano, considerando-se assim o recurso interposto nesta data e, consequentemente, no 3.º dia útil após o termo do prazo de 15 dias (13, sábado; 14, domingo).
Defende o arguido que por ter impugnando a matéria de facto, pretendendo a sua reapreciação, ao prazo fixado no n.º1 do art. 411.º do C. P. Penal se aplica o n.º6 do art. 698.º do C. P. Civil, ou seja que o prazo de interposição do recurso é acrescido de 10 dias, pelo que não haveria lugar ao pagamento de qualquer multa, nos termos do art. 145.º, n.º5, deste último código.
Não se trata de uma questão pacífica, como, aliás, resulta dos acórdãos do STJ citados pelo recorrente na 1.ª conclusão e de um acórdão deste tribunal e da decisão de uma reclamação citados na resposta do M.º P.º junto da 1.ª instância.
Pese embora a douta fundamentação do referido acórdão do STJ, não concordamos com a decisão nele proferida, sendo certo que, por não se tratar de um acórdão de fixação de jurisprudência, a decisão nele proferida não nos vincula.
Como se refere na resposta do M.º P.º junto da 1.ª instância, citando Maia Gonçalves, o Código de Processo Penal em vigor procurou estabelecer uma regulamentação total e autónoma do processo penal, tornando-a mais independente do processo civil, o que é notório ao longo de todo o código e atinge a máxima expressão em matéria de recursos.
Neste sentido, Ac. deste tribunal e secção, de 29/10/2003, no qual se refere, além do mais, que “Se assim não entendesse o legislador, tê-lo-ia dito clara e expressamente, atribuindo ao recorrente, que impugnasse o julgamento da matéria de facto, o benefício do prazo de dez dias, tanto mais que na mesma reforma processual (Lei n.º59/98, de 25/08) se alterou de dez para quinze dias o prazo de interposição de recurso, no art. 411º, nº1, e assim, introduzindo um nº4 no art. 412º, ambos do CPP, impondo a transcrição dos suportes técnicos com a gravação das provas, nas partes em que se impunha decisão diferente”.
Conclui-se assim que, tendo o recurso dado entrada no tribunal no 3.º dia útil subsequente ao do termo do prazo, a sua validade estava dependente do pagamento imediato de uma multa, nos termos do n.º5 do art. 145.º do C. P. Civil, multa essa que, por o requerimento ter sido enviado por telecópia e ter sido recebido no tribunal já depois do horário de expediente, podia ser paga no primeiro dia útil seguinte, ou seja no dia em que deu entrada o requerimento do arguido a pedir a aplicação ao processo penal do n.º6 do art. 698.º do C. P. Civil.
XXX
b) Não tendo o arguido efectuado o pagamento da multa e tendo, em vez disso, requerido que se considerasse que ao recurso por si interposto do acórdão condenatório era aplicável o n.º6 do art. 698.º do C. P. Civil, por ter posto em causa a matéria de facto, e tendo tal despacho sido indeferido, a multa a pagar por ele é a prevista no n.º5 do art. 145.º daquele código, como ele defende, ou a prevista no n.º6, como foi decidido?
Como acima foi decidido, o arguido carecia de razão quando veio invocar a aplicação ao recurso por si interposto do n.º6 do art. 698.º do C. P. Civil.
Tendo tal requerimento sido indeferido, é óbvio que, não lhe assistindo razão e não tendo a multa sido paga de imediato nos termos do n.º5 do art. 145.º do C. P. Civil, a multa a pagar tinha de ser necessariamente a estabelecida no n.º6 daquela disposição legal.
É que, tendo o requerimento sido indeferido, o seu indeferimento não podia ter como efeito o não pagamento da multa nos termos do n.º5 do art. 145.º do Código de Processo Civil, mas a prevista no n.º6 desta disposição legal. Caso contrário, estaria encontrada a fórmula para que qualquer pessoa, tendo praticado o acto num dos 3 dias úteis posteriores ao do termo do prazo normal sem que tivesse pago de imediato a multa a que alude o n.º5 do art. 145.º do C. P. Civil, não pagasse a multa nos termos do n.º6. Bastaria para tanto que, mesmo sabendo à partida carecer de razão, invocasse um qualquer motivo para considerar o acto praticado dentro do prazo. Então o n.º6 do art. 145º. do C. P. Civil deixaria de ter aplicabilidade. Praticado um acto num dos três dias úteis seguintes ao do termo normal do prazo, bastaria a formulação de um qualquer requerimento no 4.º dia, independentemente da decisão que sobre ele viesse a recair, para que a multa fosse sempre a prevista no n.º5.
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c) Requereu o arguido a redução da multa nos termos do n.º7 do art. 145.º do C. P. Civil no requerimento em que arguiu o lapso do despacho que lhe indeferiu o requerimento no sentido de ser aplicável ao recurso em causa o n.º6 do art. 698.º do C. P. Civil.
Tal requerimento deu entrada no tribunal no último dia do prazo para o pagamento da multa nos termos do n.º6 do art. 145.º do C. P. Civil.
Estatui o n.º7 do art. 145.º que o juiz pode determinar a redução ou dispensa da multa nos casos de manifesta carência económica ou quando o respectivo montante se revelar manifestamente desproporcionado.
A redução ou dispensa da multa nos termos da norma acima citada não pode ser da iniciativa oficiosa do juiz e, muito menos, da secretaria, já que não é suposto que tenham conhecimento da situação económica de quem a deve pagar, devendo ser requerida por quem tem de praticar o acto, ou seja o impulso processual impende sobre a parte que pretenda beneficiar da redução ou dispensa da multa.
Embora a lei não o diga expressamente, tal requerimento tem, quanto a nós, de ser formulado simultaneamente com a prática do acto, no caso do n.º5 do art. 145.º do C. P. Civil, ou então até ao termo do prazo do pagamento da multa, nos termos do n.º6 da mesma disposição legal, não podendo ficar ao critério da pessoa que tem de praticar o acto.
E não poderia ser de outra maneira.
Caso contrário, poder-se-ia dar a circunstância de ser requerida a isenção ou redução da multa já depois de proferido despacho a rejeitar o recurso por intempestivo, o que, como é óbvio, subverteria todas as regras do processo.
O arguido requereu a redução da multa no requerimento em que arguiu o lapso do despacho que ordenou a sua liquidação nos termos do n.º6 do art. 145.º do C. P. Civil.
Fê-lo dentro do prazo para o pagamento da multa nos termos desta disposição legal.
Sobre esta concreta questão escreveu-se no despacho recorrido que “Por outro lado, também a aplicação da redução da taxa de justiça prevista no n.º7 do aludido preceito deveria ser equacionada nesse despacho, sendo certo, que concordamos com o mesmo e a consideramos proporcionada à situação económica do arguido”.
Como resulta deste segmento do despacho recorrido, a senhora juíza que o proferiu, embora manifestando o entendimento de que a questão da redução da multa deveria ter sido equacionada no despacho cuja rectificação foi requerida, decidiu que a multa devida era proporcionada à situação económica do arguido, deste modo se pronunciando sobre o requerimento, que indeferiu.
Pronunciou-se, assim, sobre o requerimento do arguido no sentido de lhe ser reduzida a multa, pelo que carece de fundamento o recurso na parte em que invoca a nulidade de tal despacho.
Acresce que, ao contrário do que refere o arguido, as normas dos arts. 374.º e 379.º do C. P. Penal, por ele invocadas, como delas resulta expressamente, aplicam-se apenas às sentenças, não havendo qualquer disposição que preveja a sua aplicação aos despachos, e a situação em apreço não é cominada como nulidade nos arts. 119.º e 120º. do C. P. Penal.
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d) No que diz respeito à situação económica e social do arguido, consta da matéria de facto provada do acórdão do Tribunal Judicial de Bragança que os factos aconteceram nas instalações do Mercado Municipal de Bragança, por razões relacionadas com a actividade de venda de frutas e porque a vítima se encontrava a oferecer fruta junto do arguido, que este está reformado e trabalhava ainda no transporte de fruta, para C.........., armazenista de fruta, auferindo 500,00 euros mensais, que vivia com a companheira e um filho de ambos, de 16 anos, e que tem razoável situação económica.
A multa a pagar pelo arguido, nos termos do n.º6 do art. 145.º do C. P. Civil, não pode ultrapassar as 10 UC.
Nos termos do n.º7 da mesma disposição legal, o juiz pode determinar a redução ou dispensa da multa nos casos de manifesta carência económica ou quando o respectivo montante se revelar manifestamente desproporcionado.
Tendo em conta a matéria de facto provada no que diz respeito à situação económica do arguido, que não pôs em causa, como resulta da motivação do recurso que interpôs do acórdão condenatório, não se pode dizer que o arguido se encontra numa situação de manifesta carência económica. Para além da reforma, cujo montante se desconhece, o arguido dedicava-se à venda de fruta no Mercado Municipal de Bragança e ao transporte de fruta, auferindo 500,00 euros mensais no exercício desta última actividade, sendo considerada razoável a sua situação económica. Também o montante da multa, face a tais elementos de facto, não pode ser considerada desproporcionada. Carece assim de fundamento o recurso quando nele se põe em causa o despacho recorrido na parte em que considerou não ser desproporcionada à situação do arguido a multa a pagar.
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Tendo o arguido requerido a redução da multa a que alude o n.º6 do art. 145.º do C. P. Civil dentro do prazo para efectuar o seu pagamento e tendo interposto recurso do despacho que lhe indeferiu tal requerimento, a improcedência do recurso tem como efeito a possibilidade de efectuar o pagamento da multa a partir do trânsito desta decisão e, uma vez efectuada, o recebimento do recurso, tal como vem requerido nas conclusões da motivação do recurso.
Em conformidade com o decidido, deve o arguido ser notificado para efectuar o pagamento da multa a que alude o n.º6 do art. 145.º do C. P. Civil e, uma vez decorrido o prazo para o fazer, deverá ser proferido despacho sobre a admissão ou não do curso, consoante a multa tenha, ou não, sido paga.
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Nesta conformidade, nega-se provimento aos recursos, embora com as consequências supra referidas.
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Condena-se o arguido na taxa de justiça que se fixa em 4 (quatro) UC.
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Porto, 9 de Junho de 2004
David Pinto Monteiro
Agostinho Tavares de Freitas
José João Teixeira Coelho Vieira