Acórdão do Tribunal da Relação do Porto
Processo:
22569/18.3T8PRT.P1
Nº Convencional: JTRP000
Relator: CARLOS GIL
Descritores: CONTRATO DE SEGURO
RESPONSABILIDADE SOLIDÁRIA
DANO DA PERDA DE CHANCE
CÔMPUTO DO DANO
Nº do Documento: RP2024020522569/18.3T8PRT.P1
Data do Acordão: 02/05/2024
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: REVOGAÇÃO
Indicações Eventuais: 5. ª SECÇÃO
Área Temática: .
Sumário: I - A circunstância de existir um seguro obrigatório apenas faculta ao lesado o direito de ação direta (artigo 146º, nº 1, da Lei do Contrato de Seguro aprovada pelo decreto-lei nº 72/2008 de 16 de abril) mas não lhe retira o direito de demandar o lesante, nos termos gerais e que responderá solidariamente com a seguradora para a qual foi transferida a obrigação de indemnizar, na parte em que valha a garantia do seguro, tratando-se de solidariedade imprópria na medida em que o responsável poderá fazer repercutir na seguradora o que for obrigado a cumprir e dentro da cobertura do seguro.
II - O dano da perda de chance ou de perda de oportunidade enquanto dano autónomo por isso distinto da dano final sofrido, especialmente quando na sua origem está uma atuação de um profissional forense, não obstante a sua seriedade e consistência, reveste-se sempre de alguma incerteza na sua concreta delimitação na medida em que nunca há uma segurança total de que se tivesse sido adotada a conduta devida o dano final teria sido evitado.
III - Seja por força das contingências probatórias, seja pelas diversas valorações que podem ser feitas do mesmo material probatório, seja pelas variadas qualificações jurídicas dos factos provados que podem ser convocadas, seja ainda pelas divergências na identificação, interpretação e aplicação dos normativos pertinentes à resolução do caso concreto, o resultado final na área do trabalho jurídico é particularmente incerto.
IV - Essa incerteza projeta-se necessariamente na problemática do cômputo do dano da perda de chance ou de perda de oportunidade, pois que o grau ou percentagem de evitamento do dano final será determinante na fixação do dano da perda de oportunidade e quando não se lograr alcançar essa fixação, restará a liquidação do dano com recurso à equidade e nos termos previstos no nº 3 do artigo 566º do Código Civil.
V - Não obstante esta incerteza congénita ao labor jurídico, parece poder sustentar-se com alguma segurança que nem todos os domínios do jurídico têm a mesma incerteza, havendo áreas em que o grau de incerteza é menor, como sucede relativamente a algumas questões sucessórias, no que respeita à determinação em abstrato dos quinhões hereditários e bem assim em matéria de graduação de créditos, ao menos nos casos em que se mostra estabilizada doutrinal e jurisprudencialmente a interpretação e aplicação dos preceitos jurídicos pertinentes.
VI - Por força do disposto no artigo 550º do Código Civil, a obrigação pecuniária é, em regra, não atualizada e sendo a indemnização por perda de oportunidade feita com referência a uma obrigação pecuniária, não resultando que no seu cômputo se haja procedido a uma qualquer atualização do seu valor, afigura-se-nos que a indemnização arbitrada não se pode considerar atualizada.
Reclamações:
Decisão Texto Integral: Processo nº 22569/18.3T8PRT.P1

Sumário do acórdão proferido no processo nº 22569/18.3T8PRT.P1 elaborado pelo seu relator nos termos do disposto no artigo 663º, nº 7, do Código de Processo Civil:

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Acordam os juízes subscritores deste acórdão, da quinta secção, cível, do Tribunal da Relação do Porto:

1. Relatório[1]

Em 26 de outubro de 2018, nos Juízos Cíveis do Porto, Comarca do Porto, A... – Sociedade de Advogados, SP, RL, anteriormente designada por B... – Sociedade de Advogados, RL instaurou ação declarativa sob forma comum contra C..., S.A. (atualmente “D... – Companhia de Seguros, S.A.[2]) e, subsidiariamente, nos termos do artigo 39º do Código de Processo Civil, contra a Sra. Dr.ª AA, requerendo a intervenção principal do lado ativo[3] do Banco 1..., S.A. pedindo, a título principal, que a C..., S.A. seja condenada a reconhecer que o sinistro e os danos por este causados está coberto pelo contrato de seguro de responsabilidade civil profissional titulado pela apólice nº ...35, em que inicialmente era seguradora E... Companhia de Seguros, S.A., incorporada pela F..., S.A., tendo-se esta fundido com a companhia de seguros G..., S.A. adotando então a firma C..., S.A. e, em consequência, deve esta ré ser condenada a liquidar ao Banco 1..., S.A. o montante de €62.364,35 (sessenta e dois mil trezentos e sessenta e quatro euros e trinta e cinco cents) acrescido dos juros de mora à taxa legal, contados desde a data em que lhe foi participado o sinistro descrito nos presentes autos.

Caso o pedido deduzido contra a ré a título principal não proceda, deve a ré subsidiária ser condenada a reconhecer que o sinistro e que os danos por este causados, a que respeitam os factos alegados nesta petição, emergem da sua responsabilidade profissional enquanto mandatária ao serviço da autora e, em consequência, deve a ré subsidiária ainda ser condenada a liquidar ao interveniente principal Banco 1..., S.A. o montante de €62.364,35 (sessenta e dois mil trezentos e sessenta e quatro euros e trinta e cinco cents) acrescido dos juros de mora à taxa legal, contados desde a data em que lhe foi participado o sinistro descrito nos presentes autos.

Para fundamentar as suas pretensões a autora alegou, em síntese, que é uma sociedade de advogados cujo objeto exclusivo é o exercício em comum da profissão de advogado e que a fim de prevenir o risco da prática de qualquer ato ou omissão que no exercício da sua atividade a pudesse constituir em responsabilidade civil perante os seus constituintes, celebrou com a E... Companhia de Seguros, S.A. um contrato de seguro titulado pela apólice nº ...35 do ramo Responsabilidade Civil Geral/Profissional, até ao limite do capital de € 160.000,00 e com início em 22 de março de 1995; a E... Companhia de Seguros, S.A fundiu-se por incorporação na F..., S.A. e esta, por sua vez fundiu-se com a G..., S.A., adotando a firma C..., S.A.; de acordo com a informação que a E... Companhia de Seguros, S.A transmitiu à autora o seguro em causa garante a responsabilidade civil pelos danos patrimoniais que possam ser causados a terceiros em consequência de erro ou falta profissional decorrente do exercício da atividade profissional dos seus sócios, associados estagiários, agentes ou mandatários; o Banco 1..., S.A. faz parte da carteira de clientes da autora e em março de 2012, a autora foi incumbida de patrocinar o Banco 1..., S.A. nos autos de insolvência que corriam termos no 3º Juízo Cível do Tribunal Judicial de Gondomar, sob o nº 447/12.0TBGDM, onde eram requeridos BB e CC, nomeadamente para apresentar a reclamação de créditos do banco; no dia 11 de março de 2013, a autora, em representação do Banco 1..., S.A. reclamou créditos hipotecários e comuns, juntando, além do mais, procuração forense e substabelecimento com reserva a favor da mandatária que apresentou a reclamação, a Sra. Dra. AA; os créditos reclamados pelo Banco 1..., S.A. foram reconhecidos pelo Administrador da Insolvência; a Sra. Advogada subscritora da aludida reclamação de créditos informou o Banco 1..., S.A. que de acordo com a lista de credores elaborada pelo Administrador da Insolvência, relativamente aos imóveis dados em hipoteca ao banco e apreendidos nessa insolvência, apenas preferia o IMI no montante de € 3.065,15, devendo ser graduado atrás das custas do processo e do IMI, mas à frente dos restantes credores, face às garantias existentes; atendendo ao facto de o crédito reclamado pelo Banco 1..., S.A. se encontrar na maior parte garantido por hipoteca sobre dois imóveis apreendidos para a massa insolvente e com base no parecer da Sr. Advogada quanto à possível graduação, o Banco 1..., S.A. requereu a adjudicação dos imóveis em causa pelo valor de € 111.600,00, convicto de que apenas teria de proceder ao depósito do valor correspondente ao crédito do Estado por IMI e custas; após ter apresentado a proposta de aquisição dos dois imóveis hipotecados, o banco liquidou o valor previsto no artigo 164º do CIRE[4], depositando o montante de € 22.320,00 na conta aberta em nome da Massa Insolvente, tendo sido emitidos os títulos de adjudicação e tendo o banco procedido ao registo das aquisições a seu favor; em 21 de março de 2013 foi proferida sentença de graduação de créditos, sendo o crédito do Banco 1..., S.A. garantido por hipoteca graduado após o crédito da Fazendo Nacional por IMI, no montante de € 3.065,15, bem como do crédito do IEFP – Instituto do Emprego e Formação Profissional, no montante de € 62.364,35, sentença que foi notificada à ré subsidiária, com substabelecimento emitido pela autora; em 23 de março de 2014 a autora foi notificada do mapa de rateio no qual constava que o Banco 1..., S.A. tinha de proceder ao depósito de € 55.692,96; só nesta data é que a autora se apercebeu da existência de um lapso na sentença de verificação e graduação de créditos, já transitada em julgado e que havia graduado o crédito hipotecário do Banco 1..., S.A. depois do crédito do IEFP – Instituto do Emprego e Formação Profissional; em 30 de abril de 2014 a autora requereu a retificação do mapa de rateio e da sentença de verificação e graduação de créditos, requerimento indeferido por decisão notificada ao Banco 1..., S.A. em 05 de maio de 2016; em 23 de maio de 2016, a autora interpôs recurso para o Tribunal da Relação do Porto da decisão que lhe foi notificada em 05 de maio de 2016, recurso a que foi negado provimento por acórdão notificado no dia 03 de outubro de 2016; nessa sequência, o Banco 1..., S.A. procedeu ao depósito da quantia de € 55.692,96 na conta da Massa Insolvente; a sentença de verificação e graduação de créditos foi proferida com violação da lei aplicável, não se tendo a autora apercebido da incorreta graduação de créditos relativamente aos bens imóveis sobre os quais o Banco 1..., S.A. detinha hipoteca, não tendo recorrido tempestivamente da referida sentença; por carta de 08 de fevereiro de 2017, a coberto do contrato de seguro celebrado com a ré principal, a autora participou o sinistro ocorrido e por carta de 07 de julho de 2017, a ré comunicou à autora que declinava assumir as consequências do sinistro, em virtude da Sra. Dra. AA não constar da listagem de pessoas seguras pela apólice.

Sem que se observasse o disposto no artigo 226º, nº 4, alínea d) do Código de Processo Civil, procedeu-se à citação das rés.

AA contestou impugnando muita da matéria alegada pela autora requerendo a intervenção principal do lado passivo das seguradoras Companhia de Seguros G..., S.A, H..., I..., S.A. e J... alegando que o sinistro dos autos está coberto pelo seguro obrigatório celebrado pela autora com a ré principal e, além disso, afirmou que ela própria celebrou com a Companhia de Seguros G..., S.A. um contrato de seguro para garantir os danos eventualmente decorrentes do exercício da sua atividade profissional e um outro para reforço da garantia com a Companhia de Seguros H... e que vigorava na data em que foi proferida a sentença de verificação e graduação de créditos e na data em que foi notificado o mapa de rateio vigorava contrato de seguro celebrado com a I... e um outro para reforço da garantia com a Companhia de Seguros J...; participou o sinistro à I... e à G..., invocando a primeira a exclusão do sinistro da cobertura do seguro enquanto a segunda também recusou assumir o sinistro afirmando que para o efeito não relevava a data da sua ocorrência mas sim o momento da sua participação.

A ré C..., S.A. contestou impugnando alguns dos factos e todos os documentos em que não teve intervenção, excecionou a exclusão do sinistro da garantia do seguro em virtude de o dano que se pretende ver ressarcido não ter sido causado por uma das pessoas indicadas nas condições particulares do contrato de seguro, invocou a existência de uma franquia correspondente a 10% do valor da indemnização, com um mínimo de €150,00, impugnou o sinistro por desconhecimento e requereu a intervenção principal de I..., S.A., na qualidade de seguradora da ré subsidiária e, a não se entender assim, deve ser admitida na qualidade de parte acessória, concluindo pela total improcedência da ação na parte que lhe diz respeito.

Em 21 de janeiro de 2019 determinou-se a audição da autora sobre os incidentes de intervenção provocada de “I..., S.A.”, “Companhia de Seguros J...”, “Companhia de Seguros G...” e “Companhia de Seguros H...”.

Em 11 de fevereiro de 2019, na falta de qualquer oposição por parte da autora, admitiu-se a intervenção principal provocada, como associados dos réus, de “I..., S.A.”, “Companhia de Seguros J...”, “Companhia de Seguros G...” e “Companhia de Seguros H...”, determinando-se a citação destas e bem assim a audição das partes sobre a intervenção do Banco 1..., S.A. requerida pela autora na petição inicial.

H..., Lda. veio requerer que seja dada sem efeito a sua citação porquanto é corretora de seguros e não uma seguradora, não tendo nem podendo assumir quaisquer riscos na qualidade de seguradora.

Por seu turno, J..., S.A. contestou excecionando a sua ilegitimidade passiva por não ser uma empresa de seguros mas sim um empresa de corretagem de seguros, não tendo celebrado qualquer contrato de seguro com a ré subsidiária e, à cautela, impugnou a generalidade da factualidade vertida na petição inicial e na contestação da ré subsidiária concluindo que na eventualidade de não ser julgada procedente a exceção dilatória de ilegitimidade passiva, sempre a ação deve ser julgada totalmente improcedente e a contestante absolvida do pedido.

H..., Lda., na sequência de notificação para pagamento de multa e taxa de justiça pelo oferecimento do requerimento anteriormente aludido veio contestar, afirmando, de novo, ser uma empresa corretora de seguros, não podendo assumir em nome próprio a cobertura de quaisquer riscos, concluindo pela sua absolvição do pedido.

I..., S.A. contestou suscitando a ilegitimidade ativa da autora, sustentando que quem tem legitimidade ativa tal como o litígio se acha delineado é o Banco 1..., S.A., invocou a exclusão da garantia dos seguros celebrados com a Ordem dos Advogados e com a ré subsidiária por força do pré-conhecimento do sinistro, alegou que atuando a ré Advogada ao abrigo de uma Sociedade de Advogados, sempre a responsabilidade civil da ora contestante estará excluída e/ou limitada nos termos previstos na referida “Cláusula de Limitação de Segurados atuando ao abrigo de sociedade de advogados”, apenas podendo responder na falta e/ou insuficiência do capital seguro contratado pela autora com a congénere C..., S.A., impugnou a generalidade da factualidade articulada na petição inicial, negando que possa ser imputado à ré Advogada a prática de qualquer erro ou omissão profissional passível de a constituir na obrigação de indemnizar decorrente de responsabilidade civil e, ainda que se viesse a apurar tal erro ou omissão, sempre seria necessário determinar os danos daí resultantes e estabelecer um nexo causal entre o erro ou omissão e o dano, concluindo pela procedência das exceções deduzidas, ou não se entendendo assim, pela improcedência da ação e pela sua absolvição do pedido.

C..., S.A. contestou arguindo a inexistência de seguro na data de ocorrência do sinistro por falta de apresentação de reclamação na vigência do contrato de seguro e caso assim não se entenda, a exceção de limitação da sua responsabilidade ao montante de € 150.000,00 por sinistro e por efeito da existência de franquia no montante de € 5.000,00, também por sinistro, impugnou a generalidade da factualidade vertida na petição inicial e na contestação da ré subsidiária, concluindo pela improcedência da ação e pela sua consequente absolvição do pedido.

A ré subsidiária, invocando o princípio do contraditório, pronunciou-se sobre a defesa das seguradoras de inexistência de seguro e sobre a limitação da responsabilidade suscitada pela C..., S.A.

Designou-se dia para realização de audiência prévia e nesta data as partes foram notificadas, de novo, para se pronunciarem sobre o requerimento de intervenção do Banco 1..., S.A. (veja-se o despacho de 11 de fevereiro de 2019). 

Por despacho proferido em 18 de setembro de 2019 foi admitida a intervenção principal do lado ativo do Banco 1..., S.A., vindo este interveniente, após a sua citação, requerer a junção aos autos de procuração forense e posteriormente ofereceu articulado aderindo à petição inicial.

A autora foi convidada a exercer o contraditório relativamente “ao(s) último(s) articulado(s) apresentados aos autos”, tendo oferecido articulado pronunciando-se pela improcedência das exceções deduzidas pelas rés e intervenientes.

Em 12 de fevereiro de 2020 fixou-se o valor da causa no montante de € 62.364,35, proferiu-se despacho saneador julgando-se improcedente a exceção dilatória de ilegitimidade ativa, julgou-se procedente a exceção de ilegitimidade passiva das demandadas J..., S.A. e H..., Lda., julgaram-se as rés seguradoras partes legítimas, identificou-se o objeto do litígio, enunciaram-se os temas da prova, concedendo-se às partes dez dias para, querendo, alterarem os seus meios de prova.

A I..., S.A. reclamou contra os temas da prova, invocando a sua insuficiência, enquanto a C... S.A. reclamou pugnando pela sua absolvição do pedido por efeito da procedência da exceção perentória de inexistência de seguro vigente na data do sinistro e, assim não se entendendo, sempre devia ter sido julgada parte ilegítima[5].

Em 07 de setembro de 2020, julgou-se procedente a reclamação da I..., S.A. e quanto à reclamação da C... S.A. sustentou-se que os autos ainda não dispunham dos elementos necessários para permitir o conhecimento da exceção dilatória de ilegitimidade, quando em sede de despacho saneador já houvera pronúncia no sentido da legitimidade passiva das rés seguradoras.

A audiência final realizou-se numa sessão e em 27 de outubro de 2021 foi proferida sentença[6] que terminou com o seguinte dispositivo:

Pelo exposto, julga-se a presente acção procedente por provada e consequentemente, condenam-se solidariamente a Ré AA e a interveniente “I..., S.A.” no pedido, e absolve-se a Ré Seguradora.

No mesmo dia 27 de outubro de 2021 corrigiu-se a numeração dos factos provados na sentença.

Em 09 de novembro de 2021, inconformada com a decisão que precede, AA interpôs recurso de apelação, terminando as suas alegações com as seguintes conclusões:

 “A) Salvo melhor opinião em contrário, a Douta Sentença Recorrida, padece de erro de interpretação dos documentos e articulados juntos pelas partes, assim como erro na aplicação do Direito, tendo alcançando, inevitavelmente uma decisão que, com o devido respeito, contraria não só o normativo legal aplicável, como toda a fundamentação da própria sentença

B) A Autora elaborou os seguintes pedidos na PI a) seja a 1ª Ré condenada a reconhecer que o sinistro e os danos por este causados está coberto pelo contrato de seguro de responsabilidade civil profissional melhor identificado nos artºs 3, 4 e 5 da petição inicial; b) E em consequência deve a 1º Ré ainda ser condenada a liquidar à Chamada Banco 1..., S.A. o montante de € 62.364,35 (sessenta e dois mil trezentos e sessenta e quatro euros e trinta e cinco cêntimos) acrescida dos juros de mora à taxa legal, contados desde a data em que lhe foi participado o sinistro descrito nos presentes autos, que corresponde ao valor do prejuízo sofrido pelo Banco 1.... E ainda SUBSIDIARIAMENTE,a) Caso o Pedido deduzido contra a 1ª Ré não proceda, deve a 2ª Ré ser condenada a reconhecer que o sinistro e que os danos por este causados, a que respeitam os factos alegados nesta petição, emergem da sua responsabilidade profissional enquanto Mandatária ao serviço da Autora; b) Em consequência, deve a 2º Ré ainda ser condenada a liquidar à Chamada Banco 1..., S.A. o montante de € 62.364,35 (sessenta e dois mil trezentos e sessenta e quatro euros e trinta e cinco cêntimos) acrescida dos juros de mora à taxa legal, contados desde a data em que lhe foi participado o sinistro descrito nos presentes autos, que corresponde ao valor do prejuízo sofrido pelo Banco 1... que se encontra a ser imputado à Autora

C) A Autora confessou a sua responsabilidade pelos actos causadores do dano que originou o pagamento de uma indemnização ao Banco 1....

D) Alegou em suma, que a sua apólice de seguro, contratada junto da 1ª Ré, garantia a responsabilidade, de indemnizar o Banco 1..., apurada nos autos.

E) Tal alegação/confissão, teve como fundamento, entre outros, o teor das cláusulas e documentos anexos à sua apólice de seguro contratada com a 1ª Ré.

F) Apólices e documentos anexos que também fundamentaram a convicção da decisão do Tribunal a quo.

G) Estes fundamentos invocados pela Autora improcederam, uma vez que o Tribunal a quo, e conforme expressamente na referido na Douta Sentença ora recorrida, entendeu que a dita apólice de seguro contratada pela Autora com a 1ª Ré, abrangia apenas os sócios identificados na apólice e fichas anexas (doc 1 da PI), que foram preenchidas pela Autora e devolvidos à seguradora, os auxiliares e empregados da Autora

H) A Recorrente não é auxiliar nem empregada da Autora;

I) Tribunal não teve em consideração a al) d) da Cl) 2ª do supra referido contrato/anexo, que refere expressamente que a apólice abrange ainda a responsabilidade emergente da actuação de advogado substabelecido pelo tomador em caso de impedimento deste – neste caso, impedimento dos sócios da sociedade tomadora do seguro

J) a responsabilidade emergente da actuação da 2ª Ré, analisada nos presentes autos, enquadra-se expressamente na al) d) da Cl) 2ª da apólice de seguro (e respectivos anexos) contratada pela Autora com a 1ª Ré, uma vez que a Recorrente actuou em representação da tomadora com substabelecimento, porque a tomadora do seguro assim o pretendeu, e fê-lo bem conhecendo o contratado com a 2ª Ré.

K) O Tribunal a quo não levou em consideração o teor integral do contrato de seguro e anexos, importando tal actuação da errada absolvição da 1ª Ré

L) O Tribunal a quo apurou que a responsabilidade de indemnizar o Banco 1... caberia solidariamente à 2ª Ré e à I... SA

M) O Tribunal a quo fundamentou a condenação solidaria da 2ª ré, escrevendo na Douta sentença recorrida: Assim sendo, e uma vez que esta demandada tinha a sua responsabilidade civil profissional garantida por seguros abrangendo tal responsabilidade, importa apurar qual das seguradoras chamadas deve assumir o pagamento da indemnização devida ao Banco 1.... Assim sendo, apesar de à data da ocorrência do facto gerador de responsabilidade profissional da 2.ª ré não estar em vigor o seguro por ela ajustado com a I..., S.A., é inevitável ser esta a companhia de seguros a responsável pelo pagamento ao Banco 1... da indemnização devida pela omissão, pela 2.ª ré, da interposição de recurso da sentença de graduação de créditos, uma vez que foi aquela seguradora a primeira a ser interpelada pela Dr.ª AA em como havia ocorrido um sinistro gerador de responsabilidade civil profissional desta, coberta pelo contrato de seguro ajustado entre ambas

N) Aliás, pela simples leitura da fundamentação da sentença, resulta que a responsabilidade da 2ª Ré será assumida pela Seguradora I... SA por via do contrato de segura celebrado entre ambas

O) A fundamentação da sentença é contraria à decisão proferida.

P) a 2ª Ré pugnou pela sua absolvição e pela condenação da 1ª Ré e caso assim não se entendesse fosse admitida a intervenção principal provocada das seguradoras G... SA e I... SA para assumirem, a sua (da 2ª Ré e aqui Recorrente) responsabilidade de indemnizar o Banco 1...

Q) A intervenção foi admitida

R) Nenhuma das partes, intervenientes nos autos pediu a condenação solidaria da 2ª Ré

S) A 2ª Ré contratou seguro de responsabilidade civil profissional obrigatório

T) são admissíveis três cenários: (i) o lesado demanda o segurado; (ii) o lesado demanda diretamente o segurador, isoladamente e (iii) o lesado demanda o segurador em conjunto com o segurado.(sumário da Relatora).” No caso de seguro obrigatório, como vimos, a possibilidade de o lesado demandar directamente o segurador nem depende de prévio clausulado contratual nesse sentido

U) A Autora optou por demandar apenas e só a 2ª Ré

V) A aqui Recorrente tem a sua actividade profissional segurada por seguro profissional de grupo contratado pela O.A. celebrado entre a I..., S.A. K..., S.A. e a Ordem dos Advogados de Portugal titulado pela apólice de seguro ...58 e com data de início a 1 de Janeiro de 2014.

W) Foi pela 2.ª Ré, Dra. AA, subscrita uma proposta de seguro de reforço de capital, pela qual a Ré advogada manifestou a sua intenção de aumentar em € 150.000,00, o capital seguro previsto no âmbito da apólice de RC profissional base da Ordem dos Advogados (apólice n.º ...58);

X) Pretendendo a 2.ª Ré, igualmente, eliminar o valor devido a título de franquia contratual por qualquer eventual sinistro coberto/indemnizável nos termos previstos no contrato de seguro titulado pela apólice ...58, ...5. Com data de início em 01.01.2014, a ora I..., S.A. K..., S.A emitiu a apólice de seguro de reforço n.º ...38, a qual esteve em vigor entre 01/01/2014 e 01/01/201[?]

Y) Apurada a responsabilidade na obrigação de indemnizar o lesado, a mesma é transferida para uma das Seguradora Chamadas, por força do contrato de seguro de responsabilidade civil obrigatório com estas celebrado.

Z) a condenação solidária da 2ª Ré com a seguradora I... SA, excede qualquer pedido efetuado nos presentes autos

AA) a sentença recorrida é nula no que tange à condenação da Recorrente, por ter excedido os diversos pedidos dos autos, devendo ser revogada, absolvendo-se a Recorrente do pedido com todas as consequências legais;

BB) A sentença recorrida encontra-se igualmente ferida de nulidade pois a fundamentação é oposta à decisão.

CC) a Douta sentença recorrida violou o disposto nos artigos 140º n.º 2 e 146º do DL 72/2008 de 16 de Abril , o artigo 104 da Lei 145/2015 de 09 de Setembro e suas atualizações, o artigo 38º da Lei 2/2013 de 10 de Janeiro, artigo 513º do código Civil e o artigo art. 615º, nº 1, alínea e), do CPC, por desrespeito pelo princípio do nº 1, do art. 609º, do CPC

Em 02 de dezembro de 2021, também inconformada com a sentença, I..., S.A. interpôs recurso de apelação, terminando as suas alegações com as seguintes conclusões:

1. O presente recurso vem interposto da douta sentença proferida nos autos, a qual, tendo julgado a pretensão da Autora integralmente procedente, por provada, entendeu absolver a 1.ª Ré D..., S.A. dos pedidos contra si deduzidos, julgando, contudo, integralmente procedente o pedido subsidiário deduzido contra a Ré advogada e a ora Recorrente I..., condenando estas na totalidade dos pedidos formulados nos autos, determinando, assim, o pagamento ao Interveniente Banco 1..., S.A. do montante de € 62.364,35, acrescido dos juros de mora à taxa legal, contados desde a data em que lhe foi participado o sinistro descrito nos presentes autos, que corresponde ao valor do prejuízo sofrido pelo Banco 1... que se encontra a ser imputado à Autora;

2. Entende, contudo, a Recorrente que se encontram nos autos elementos, de facto e de direito, que impunham, in casu, uma decisão em sentido diverso, designadamente do que respeita:

(v) à procedência do pedido subsidiário e consequente condenação da 2.ª Ré Dra. AA e da Interveniente I... S.A. nos pedidos, em decorrência da (pretensa) responsabilização civil da Ré advogada;

(vi) à absolvição da 1.ª Ré D..., S.A., por via da delimitação subjectiva de cobertura da apólice de seguro n.º ...35;

(vii) ao alegado dano de perda de chance, fixado pelo douto Tribunal a quo na totalidade do pedido indemnizatório deduzido;

(viii) aos juros de mora considerados devidos pela Recorrente ao Interveniente Banco 1....

3. Ressalvando o devido respeito, ao decidir do modo como decidiu, violou o douto Tribunal a quo, salvo o devido respeito, as normas legais previstas nos artigos 264.º, n.ºs 1 e 2, 483.º, 562.º, 563.º, 564º, 570.º, n.º 1, 800.º, n.º 1, 1157.º, 1165.º, do Código Civil, e bem assim nos artigos 37.º, n.ºs 1 e 4 do DL 229/2004 de 10 de dezembro (vigente à data dos factos), 213.º, n.º 14 da Lei n.º 145/2015, de 09 de Setembro (actual Estatuto da Ordem dos Advogados), e 146º, n.º 5 do Regime Jurídico do Contrato de Seguro (Decreto-lei nº 72/2008, de 16 de Abril), conjugados com as cláusulas contratuais previstas nas apólices de seguro em apreço, designadamente a cláusula 2.ª (artigo 2.º), alínea d) das condições especiais da apólice de seguro n.º ...35, contratada com a 1.ª Ré D..., S.A., os quais, tendo sido – salvo o devido respeito – desconsiderados e/ou incorrectamente interpretados e aplicados pelo Tribunal a quo na douta sentença recorrida, implicaram uma decisão materialmente injusta e juridicamente desajustada.

4. Com efeito, atenta a factualidade alegada e demonstrada nos autos, resultou claro que a 2.ª Ré, Dra. AA, actuou nos autos do processo de insolvência n.º 447/12.0TBGDM, de acordo com as concretas instruções transmitidas pela sociedade de advogados, aqui Autora, e bem assim no seu interesse e sob sua coordenação;

5. Aliás, do depoimento de parte do legal representante da autora resultou confessado que no âmbito dos processos da autora, a 2ª Ré intervém sempre com poderes forenses substabelecidos com reserva pela Autora; utiliza sempre o papel timbrado da Autora; segue orientações da Autora no que tange ao acompanhamento do processo – cfr. douta sentença recorrida;

6. Conforme resultou do depoimento de parte prestado em sede de Audiência de Julgamento pelo Representante Legal da Autora, Dr. DD, o Interveniente Banco 1... emitiu unicamente procuração forense à sociedade de advogados Autora, tendo sido por esta emitido um substabelecimento com reserva para a 2.ª Ré, em papel timbrado da A., mantendo os sócios da A. o controle e a coordenação de todos os processos e actos jurídicos praticados pelos advogados substabelecidos, nomeadamente pela 2.ª Ré.

7. De facto, a 2.ª Ré apenas assumiu a condução do aludido processo 447/12.0TBGDM, através de substabelecimento com reserva, tendo única e estritamente em vista a apresentação da reclamação de créditos em apreço nos autos, conforme previsto no artigo 1165.º do CC;

8. Para além disso, a 2ª Ré utilizava, nos serviços que prestava à Autora, os meios e recursos da Sociedade de Advogados, cumprindo as instruções e orientações transmitidas pelos sócios, tendo o seu endereço de e-mail o domínio da sociedade de advogados, aqui A..

9. Mais, no caso concreto, quem perguntava ao Cliente Banco se deveria ou não recorrer de qualquer decisão, não era a 2º Ré, mas sim os dois sócios da sociedade que acompanhavam este Cliente.

10. Sendo que, conforme resultou ainda do depoimento prestado nos autos pela testemunha EE, o Banco não tinha qualquer relação com a Ré advogada, Dra. AA, a quem sequer conheciam pessoalmente, não desenvolvendo ainda quaisquer contactos, nomeadamente telefónicos, regulares, sendo que todos os contactos e instruções do Banco 1... eram exclusivamente transmitidos a dois dos sócios da sociedade de advogados Autora.

11. Resultou assim claro que a 2.ª Ré não estabeleceu, directamente, com a Mandante, in casu, com o Banco 1..., qualquer relação de mandato – nos termos e para os efeitos previstos no artigo 1157.º do CC;

12. Tendo esta relação de mandato sido estritamente estabelecida entre a Autora Sociedade de Advogados e o Interveniente Banco 1....

13. Não tendo a 2.ª Ré auferido, directamente, os proveitos, nomeadamente a título de honorários, devidos em decorrência do exercício da sua actividade profissional ao abrigo da sociedade de advogados aqui A..

14. Verifica-se assim de toda a prova produzida, bem como da posição sobejamente manifestada pela própria Autora Sociedade de Advogados nos autos, que a mesma assumiu sempre o controle e a responsabilidade, perante o seu Cliente, Banco 1..., por todos os actos praticados (e presumíveis omissões incorridas) no âmbito do patrocínio forense em apreço;

15. Respondendo, assim, a Autora sociedade de advogados, perante o Terceiro Lesado, in casu, o Interveniente Banco 1..., nos termos previstos no artigo 800.º, n.º 1 do Código Civil, pelos actos das pessoas que utilize para o cumprimento da obrigação, como se tais actos fossem praticados pelo próprio devedor, in casu, da 2.ª Ré;

16. Via de regra, em virtude da autonomia técnica e independência inerentes ao exercício da profissão, os advogados, ainda que integrados em sociedades, não mantém com estas qualquer vínculo de dependência e/ou subordinação laboral;

17. Trata-se, como se sabe, de uma realidade distinta, normalmente intitulada por um contrato de prestação de serviços, no âmbito da qual se verificam, ainda assim, instruções e orientações por parte dos sócios, os quais assumem, perante os Clientes a condução dos processos, e bem assim, no limite, a responsabilidade civil decorrente do exercício da advocacia;

18. Recebendo os sócios, in casu a aqui Autora, em contrapartida, os lucros/benefícios financeiros decorrentes da assumpção dos patrocínios forenses, nomeadamente através do pagamento dos honorários, que são devidos e pagos à sociedade de advogados, e não directamente aos advogados a quem se incumbiu o tratamento e acompanhamento pontual dos processos/assuntos, designadamente através de substabelecimentos com reserva, tal como ocorreu no caso em apreço nos autos.

19. No que diz respeito ao mandato judicial, a lei disponibiliza uma solução expressa relativamente ao submandato por via de substabelecimento: o substabelecimento sem reserva implica a exclusão do anterior mandatário, conforme resulta do artigo 44.º, nº 3 do CPC.

20. Contudo, e no caso do substabelecimento com reserva, o advogado que o outorga mantém os seus poderes de representação, passando a parte a ficar representada por mais um advogado, em regra, com idênticos poderes – veja-se nesse sentido Acórdão proferido pelo Tribunal da Relação de Coimbra em 25.10.2011, no processo 1006/10.7TBCVL.C1;

21. Sendo certo que, in casu, a A. Sociedade de Advogados continuou a ser notificada de todos os actos jurídicos inerentes ao processo judicial em curso, mantendo-se, aliás, como exclusiva Mandatária, cujas orientações e instruções eram única e exclusivamente transmitidas pelo Cliente/Mandante, Banco 1....

22. Ora, tal como entendeu o douto Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 16.04.2009, “Da procuração em si mesma não resulta nenhuma obrigação de prestar contas – tal como não decorre, como se disse já, nenhuma obrigação de praticar os actos para os quais foram concedidos poderes ao procurador”;

23. Assim, sendo a outorga de procuração forense um acto jurídico unilateral, será através da concreta relação (bilateral) de mandato, que as partes poderão estabelecer os limites e/ou extensão dos poderes, atribuições e deveres conferidos ao mandatário, e bem assim a contraprestação exigível ao mandante.

24. No caso em apreço nos autos, nunca tendo o (pretenso) Lesado Banco 1..., S.A., outorgado qualquer procuração e/ou estabelecido qualquer relação de mandato forense com a aqui 2.ª Ré, tendo esta relação de mandato sido estabelecida exclusivamente entre a Autora sociedade de advogados, e o Interveniente, Banco 1..., tendo sido a Autora Sociedade de Advogados a auferir exclusivamente os proveitos/lucros/honorários decorrentes do exercício do patrocínio forense posto em crise nos autos, nunca poderá a 2.ª Ré ser responsabilizada pelos (pretensos) prejuízos peticionados nos autos;

25. Porquanto, no limite, verificando-se a efectiva existência de danos e/ou prejuízos sofridos pelo Interveniente Banco 1..., em decorrência do patrocínio forense assumido pela A. (ainda que com recurso a um submandato/substabelecimento com reserva, outorgado à 2.ª Ré, para o específico acto de apresentação da reclamação de créditos nos autos do processo 447/12.0TBGDM) sempre deverá ser a Autora a suportar tais danos e/ou prejuízos, improcedendo assim a presente acção.

26. Consequentemente, não se podendo responsabilizar a 2.ª Ré, Dra. AA, pela reparação de quaisquer danos, presumivelmente, decorrentes da sua conduta profissional, não impenderá sobre a Companhia de Seguros, ora Recorrente, qualquer obrigação indemnizatória decorrente da transferência de responsabilidades operada pelas apólices de seguro ...58 e ...38.

27. Para além disso, entendeu o douto Tribunal a quo absolver a 1.ª Ré dos pedidos formulados pela A. sociedade de advogados, considerando que o risco inerente à actuação profissional da 2.ª Ré, Dra. AA, não estaria transferido para aquela seguradora;

28. De facto, sustentou a douta sentença recorrida tal conclusão em dois aspectos: (i) a 2.ª Ré não consta da listagem de pessoas seguras indicadas pela A. aquando do preenchimento do questionário, e constantes das condições particulares da apólice; (ii) a 2.ª Ré não poderá ser considerada pessoa segura, por não ter estabelecido uma relação/vínculo laboral com a A., operando assim (presumivelmente) a cláusula de exclusão constante na nota anexa à apólice n.º ...35 (fl. 159 dos autos);

29. Não poderá a ora Recorrente concordar com tal entendimento, na medida em que o mesmo esvaziaria por completo as cláusulas contratuais previstas nas alíneas c) e d) do artigo 2.º das Condições Especiais da apólice n.º ...35.

30. Com efeito, e nos termos previstos na citada cláusula constante do artigo 2.º das condições especiais da apólice ...35 (em vigor à data dos factos e aplicável ao pretenso sinistro profissional em apreço), a qual delimita o âmbito de cobertura do contrato:

“A garantia deste contrato abrange:

a. Os danos patrimoniais e/ou não patrimoniais causados aos clientes em consequência de erros, omissões ou negligência cometidos pelo Segurado no exercício da sua profissão e no âmbito de vigência do presente contrato;

b. Os danos por que seja responsável na qualidade de proprietário, arrendatário ou usufrutuário do edifício ou local onde se desenvolvia a sua actividade profissional, bem como das suas instalações;

c. Os actos ou omissões de auxiliares e empregados quando ao seu serviço e no exercício das suas funções;

d. A responsabilidade legal do segurado, derivado da sua substituição em férias, doença ou outro impedimento, por outro profissional legalmente habilitado.” – cfr. apólice de seguro n.º ...35, junta aos autos;

31. De facto, prevê a referida nota anexa à apólice ...35 que, “Para além das exclusões referidas nas Condições Gerais da Apólice, este seguro não garante ainda: (…) Perdas ou danos decorrentes da responsabilidade das pessoas que não tenham com o segurado uma relação de dependência laboral, ainda que actuem por ele ou por conta dele;

32. Contudo, atendendo à natureza e especificidade do exercício da profissão de advogado, por via da qual é possível e habitual a outorga de submandatos/substabelecimentos a outros profissionais legalmente habilitados, designadamente em casos de impedimentos para a prática de certos actos pelo Mandatário titular, parece evidente que a referida exclusão não se pretendeu aplicável aos profissionais forenses substabelecidos pela A. sociedade de advogados, mas sim, exclusivamente aos funcionários e colaboradores forenses, como sejam, o secretariado e /ou qualquer outros funcionários que exerçam funções junto da Autora.

33. É que, como parece evidente, atendendo à independência e autonomia técnica inerente ao exercício da advocacia, os advogados não exercem as suas funções, no âmbito de uma sociedade de advogados, sob qualquer vínculo de natureza laboral;

34. Não sendo assim crível que, tratando-se de um seguro de natureza obrigatória – cfr. disposto no artigo 37.º do DL 229/2004 de 10 de dezembro (vigente à data dos factos e actualmente prevista no artigo 213.º da Lei n.º 145/2015, de 09 de Setembro – actual Estatuto da Ordem dos Advogados) – pudessem as partes convencionar a existência de tal exclusão de cobertura, nomeadamente quando tenha, como prática corrente, o exercício das suas funções por via de auxiliares – designadamente advogados substabelecidos pelos sócios da Sociedade Autora;

35. Sendo certo que, nos termos previstos no n.º 4 do artigo 37.º do DL 229/2004 de 10 de dezembro, o não cumprimento da obrigação prevista no n.º 1 da citada norma legal – de contratação do seguro obrigatório por parte das sociedades de advogados – sempre implicará a responsabilidade ilimitada dos sócios pelas dívidas sociais geradas durante o período do incumprimento do dever de celebração do seguro, ou seja, in casu, a exclusiva responsabilidade da sociedade de advogados, aqui Autora, na pessoa dos seus sócios – conduzindo, consequentemente, à improcedência da presente acção;

36. Parece assim evidente que a interpretação da citada cláusula de exclusão – constante da nota anexa à apólice ...35 – no sentido de excluir a responsabilidade da Seguradora perante terceiros, nos casos em que a Autora, sociedade de advogados (segurada e tomadora de seguro) recorra a advogados substabelecidos para o exercício das suas funções, é manifestamente contrária a natureza obrigatória do seguro, e bem assim aos princípios do equilíbrio e boa-fé contratual.

37. Nesse sentido, entendeu o douto Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra de 10-12-2019, considerando que “… é sempre possível ao tribunal na apreciação interpretativa das cláusulas do contrato apreciar se, juridicamente, alguma delas é ou não excessivamente limitativa da cobertura aparentemente dada pelo contrato de seguro celebrado (e, portanto, abusiva), porque essa tarefa cabe no âmbito dos poderes de conhecimento do tribunal, sendo de natureza oficiosa.”

38. Nessa medida, atendendo ao âmbito de cobertura previsto nas alíneas a, c, e d do artigo 2.º das condições especiais da apólice de seguro º ...35, contratada pela A. e em vigor à data do sinistro em apreço nos autos, outra conclusão não se poderá retirar se não a de que, encontra-se o aludido sinistro profissional incorrido pela Autora (ainda que por via da actuação de uma advogada substabelecida, in casu, a 2.ª Ré) abrangido pelas garantias e coberturas previstas na apólice de seguro n.º ...35, celebrada com a 1.ª Ré D...;

39. Devendo a referida cláusula de exclusão, com a interpretação dada pelo douto Tribunal a quo, ser oficiosamente julgada nula, na medida em que a sua inclusão no contrato de seguro em apreço afigura-se excessivamente limitativa da cobertura aparentemente dada pelo contrato de seguro celebrado (e, portanto, abusiva), e bem assim frontalmente contrária à natureza da obrigação prevista no citado artigo 37.º, n.º 1 do DL 229/2004 de 10 de dezembro (vigente à data dos factos) e conforme artigo 146.º, n.º 5 do Regime Jurídico do Contrato de Seguro (DL 72/2008 de 16 de Abril), o que, de todo o modo e à cautela de patrocínio, se alega e requer para os devidos e legais efeitos.

40. Nos termos do disposto na “CLÁUSULA DE LIMITAÇÃO DE SEGURADOS ACTUANDO AO ABRIGO DE SOCIEDADE DE ADVOGADOS” prevista nas apólices ...58 e ...38 contratadas junto da ora Recorrente I..., “Nos casos em que a actividade profissional dos SEGURADOS seja desenvolvida ao abrigo de uma Sociedade de Advogados, fica entendido que a cobertura providenciada pela presente APÓLICE, sem prejuízo dos respetivos Limites de Indemnização, funcionará apenas na falta ou insuficiência de Apólice de Responsabilidade Civil Profissional que garanta a dita Sociedade de Advogados, entendendo-se esta última como celebrada primeiro” – cfr. cláusula 12.1 das Condições Particulares das citadas apólices de seguro.

41. Dispondo ainda a referida cláusula contratual que, caso as apólices contratadas pela Sociedade, ao abrigo da qual a Ré advogada exerceu o seu patrocínio, “contenham uma provisão respeitante à concorrência de seguros em termos idênticos à presente, entende-se que esta APÓLICE atuará em concorrência com as mesmas, cada uma respondendo proporcionalmente aos limites garantidos” – cfr. n.º 2 da cláusula 12.1 das Condições Particulares das referidas apólices juntas aos autos.

42. Assim, resultando manifestamente evidente dos autos que o patrocínio forense em apreço, foi exercido pela 2.ª Ré, Dra. AA, ao abrigo e em representação da sociedade de advogados (aqui Autora), e não contendo a apólice de seguro n.º ...35, celebrada com a congénere D..., aqui 1.ª Ré, previsão idêntica à cláusula supra referida, sempre a responsabilidade civil da ora Recorrente I... S.A. estará expressamente excluída nos termos previstos na referida “Cláusula de Limitação de Segurados atuando ao abrigo de sociedade de advogados”;

43. Devendo-se assim concluir pela responsabilização da 1.ª Ré D..., por via da apólice de seguro ...35, absolvendo-se a ora Recorrente I... de todos os pedidos deduzidos nos autos pela Autora.

44. Não obstante, e ainda que assim não se entenda (o que apenas se equaciona por mera cautela de patrocínio), tendo o mandato forense em apreço nos autos sido outorgado pelo Interveniente Banco 1... à Autora, ainda que se conclua pela co-existência de responsabilidades – atenta a outorga de um substabelecimento com reserva – sempre se concluirá pela concorrência de responsabilidades entre a Autora e a 2.ª Ré – sendo aliás evidente nos autos que a Autora assume expressamente essa responsabilidade perante o Cliente, aqui Interveniente, Banco 1... – o que, no limite, implicará a redução de responsabilidade da 2.ª Ré (e consequentemente da ora Recorrente I...), ou mesmo a sua exclusão, nos termos previstos no artigo 570.º, n.º 1 do CC, o que se alega para os devidos e legais efeitos.

45. Acresce ainda que, não obstante todas as referidas ponderações tecidas pelo Tribunal a quo sobre a denominada doutrina da perda de chance, e bem assim sobre a previsibilidade do Banco 1... não ter incorrido no pagamento do montante de €55.692,96 naquele processo de insolvência, entendeu o Tribunal condenar a 2.ª Ré e a Interveniente I... nos pedidos deduzidos nos autos, a título subsidiário, nomeadamente no pagamento do montante de € 62.364,35 acrescida dos juros de mora à taxa legal, contados desde a data em que lhe foi participado o sinistro descrito nos presentes autos, que corresponde ao valor do prejuízo sofrido pelo Banco 1... que se encontra a ser imputado à Autora.

46. Entendimento com o qual não poderá a ora Recorrente concordar, quer no que respeita ao valor em si (€ 62.364,35), quer no que respeita à aplicação da teoria da perda de chance.

47. Com efeito, e conforme tem sido amplamente entendido pela actual jurisprudência, “… o que deve ser indemnizado é a ausência da possibilidade de o constituinte ter tido a sua pretensão apreciada pelo Tribunal, e não o valor que esse processo lhe poderia eventualmente propiciar ou, pelo menos, obrigar a despender” - Cfr. Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, proferido a 15.05.2008, e disponível in www.dgsi.pt;

48. No caso em apreço nos autos, ainda que se admita a existência de uma “chance perdida” sofrida pelo Banco 1... em decorrência da não interposição de recurso pela Autora, da sentença de graduação de créditos nos autos do processo 447/12.0TBGDM, sempre deverá ser ainda aplicado, sobre o valor obtido pela avaliação do (pretenso) “dano final”, o grau de probabilidade de sucesso daquela pretensão ter sido julgada de forma favorável, não fosse a pretensa actuação omissiva que a impediu.

49. De facto, atenta a aleatoriedade inerente às decisões jurisdicionais, as quais implicam a análise e ponderação de toda a prova produzida nos autos, e bem assim a interpretação e aplicação de um conjunto de normas jurídicas (que se alteram e modificam ao longo dos tempos), nunca se poderá afirmar, salvo melhor e douta opinião em contrário, a existência de uma inequívoca e total probabilidade de ganho – 100% – nos termos fixados pelo douto Tribunal a quo na sentença recorrida.

50. Tal como considerou o douto Acórdão do STJ de 2010.04.29, “Se um recurso não foi alegado, e em consequência ficou deserto, não pode afirmar-se ter havido dano de perda de oportunidade, pois não é demonstrada a causalidade já que o resultado do recurso é sempre aleatório por depender das opções jurídicas, doutrinárias e jurisprudenciais dos julgadores chamados a reapreciar a causa.”;

51. Neste sentido, e conforme salientou o douto Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra de 20.01.2015 (disponível in www.dgsi.pt): “O dano da “perda de chance” que se indemniza não é o dano final, mas o dano “avançado”, constituído pela perda de chance, que deve ser medida em relação à chance perdida e não pode ser igual à vantagem que se procurava, nem superior nem igual à quantia que seria atribuída ao lesado, caso se verificasse o nexo causal entre o facto e o dano final.”

52. De modo que, sempre deveria o douto Tribunal a quo ter aplicado, sobre o aludido montante/”dano final” alcançado, a taxa/grau de probabilidade de sucesso da pretensão do Banco 1... ver o seu recurso satisfeito (e/ou julgado mais favoravelmente à sua pretensão), não fosse a actuação omissiva que se imputa à aqui Autora, sociedade de advogados.

53. Sendo certo que, à falta de melhor critério, tem a jurisprudência actual considerado que, a probabilidade (quando séria e credível) a considerar, deverá ser, tendo por base critérios de equidade, fixada em 50%;

54. Algo que, in casu (e hipoteticamente), conduziria à fixação de um dano de perda de chance (presumivelmente) sofrido pelo Chamado Banco 1... no montante de € 27.846,48 (50% de 55.692,96€).

55. Caso contrário, estaríamos perante um ressarcimento integral, contrário às normas legais contidas nos citados artigos 562.º, 563.º e 564.º do CC, sem qualquer ponderação sobre o grau de “chance” alegadamente perdido – o qual deverá ter sempre em consideração, salvo melhor e douta opinião em contrário, atenta a alea própria e inerente às decisões judiciais.

56. Entendeu, por fim, a douta sentença recorrida condenar a 2.ª Ré e a Interveniente I... no pagamento do “montante de € 62.364,35 acrescida dos juros de mora à taxa legal, contados desde a data em que lhe foi participado o sinistro descrito nos presentes autos, que corresponde ao valor do prejuízo sofrido pelo Banco 1... que se encontra a ser imputado à Autora”, sendo certo que não resulta da factualidade julgada provada nos autos a data em que o (pretenso) sinistro profissional foi participado à ora Recorrente – mas apenas à 1.ª Ré, D...;

57. Razão pela qual, nunca poderá a Recorrente I... ser condenada no pagamento de juros de mora, desde a data da participação de sinistro efectuada pela Autora junto da congénere Seguradora.

58. Dispõe o artigo 805.º, n.º 1, do Código Civil “O devedor só fica constituído em mora depois de ter sido judicial ou extrajudicialmente interpelado para cumprir”, dispondo ainda o n.º 3 da citada norma legal que: “se o crédito for ilíquido, não há mora enquanto não se tornar líquido, salvo se a falta de liquidez for imputável ao devedor; tratando-se, porém de responsabilidade por facto ilícito ou pelo risco, o devedor constitui-se em mora desde a citação, a menos que já haja então mora nos termos da primeira parte deste número”;

59. Tal como entendeu o douto Acórdão Uniformizador de Jurisprudência 4/2002 (publicado em Diário da República n.º 146/2002, Série I-A de 2002-06-27, e disponível in www.dgsi.pt), “Sempre que a indemnização pecuniária por facto ilícito ou pelo risco tiver sido objecto de cálculo actualizado, nos termos do n.º 2 do artigo 566.º do Código Civil, vence juros de mora, por efeito do disposto nos artigos 805.º, n.º 3 (interpretado restritivamente), e 806.º, n.º 1, também do Código Civil, a partir da decisão actualizadora, e não a partir da citação”;

60. No caso em apreço nos autos, estando em causa a apreciação de um (pretenso) acto ilícito e culposo imputado à Ré advogada no âmbito do exercício da sua actividade profissional – fundando-se assim a presente acção no instituto da responsabilidade civil, e tendo a decisão proferida pelo Tribunal a quo apreciado o valor do pretenso dano sofrido pelo Chamado Banco 1... em decorrência daquela responsabilidade e com base na teoria da perda de chance – tratando-se assim de uma decisão actualizadora, a manter-se a decisão proferida nos autos relativamente aos juros de mora considerados devidos – desde a data da participação de sinistro à 1.ª Ré D... – tal circunstância consubstanciará um desproporcionado e manifesto enriquecimento ilícito do pretenso Lesado (in casu, do Chamado Banco 1...);

61. Motivo pelo qual, deverá a referida decisão ser revogada, sendo considerados apenas devidos juros de mora (o que não se admite, mas apenas se equaciona por mera cautela de patrocínio, atendendo à toda a argumentação supra explicitada), a partir da decisão final proferida nos autos, o que desde logo se alega para os devidos e legais efeitos.

D..., S.A. ré principal nestes autos na posição anteriormente ocupada por C..., S.A. respondeu ao recurso interposto pela ré subsidiária, pugnando pela sua total improcedência.

Em 07 de janeiro de 2022, o Banco 1..., S.A. respondeu ao recurso interposto por I... S.A e interpôs o que denominou como recurso subordinado subsidiário.

A ré D..., S.A. respondeu ao recurso interposto pela ré I..., S.A. pugnando pela sua total improcedência.

Os recursos interpostos pela Sra. Dra. AA e pela I..., S.A. foram admitidos como de apelação, com subida imediata[7], nos próprios autos e no efeito meramente devolutivo.

Neste Tribunal da Relação não se admitiram as respostas oferecidas pela ré D..., S.A. aos recursos interpostos pela Sra. Dra. AA e pela I..., S.A. e qualificou-se o recurso subordinado subsidiário interposto pelo Banco 1..., S.A. como ampliação do âmbito do recurso, tal como previsto no nº 2 do artigo 636º do Código de Processo Civil, corrigindo-se oficiosamente o erro na qualificação do meio processual.

Dispensaram-se os vistos e após a determinação da inscrição dos autos em tabela, D..., S.A. e I..., S.A. vieram reclamar para a conferência, a primeira requerendo que o despacho que não admitiu as suas respostas aos recursos interpostos pela ré Sra. Dra. AA e pela I..., S.A. seja revogado, “substituindo-se por decisão que admita as contra-alegações de recurso apresentadas pela aqui Reclamante e ali Recorrida e com as referências da Plataforma Citius n.os 31096244 e 30787226” e a segunda requerendo que recaia acórdão, em particular sobre as considerações sobre o trânsito em julgado da decisão absolutória da corré D..., S.A..

Em 27 de junho de 2022 foi proferido acórdão que terminou com o seguinte dispositivo:

Pelo exposto, os juízes subscritores deste acórdão, da quinta secção, cível, do Tribunal da Relação do Porto acordam em indeferir as reclamações para a conferência deduzidas por D..., S.A. e I..., S.A. e em julgar procedentes os recursos de apelação interpostos por AA e por I..., S.A. e ainda a ampliação do âmbito do recurso em sede estritamente factual requerida pelo Banco 1..., S.A. e, em consequência, revoga-se a sentença recorrida proferida em 27 de outubro de 2021 e absolvem-se AA e I..., S.A. dos pedidos contra ambas deduzidos.

As custas das reclamações para a conferência são da responsabilidade das reclamantes, por terem decaído, enquanto as do recurso de apelação da ré subsidiária são da responsabilidade desta recorrente por não ter havido resposta legalmente admissível a tal recurso e ser a recorrente quem tira proveito do mesmo (artigo 527º, nº 1, do Código de Processo Civil); as custas do recurso de apelação interposto pela interveniente I... são da responsabilidade do recorrido Banco 1..., S.A. por ter ficado vencido na resposta ao recurso; as custas da ação são da responsabilidade da autora e do banco interveniente do lado ativo, a meias, pois que a ação improcede totalmente, sendo todas as rés e a interveniente do lado passivo I... absolvidas dos pedidos contra elas deduzidos, sendo aplicável a secção B, da tabela I, anexa ao Regulamento das Custas Processuais, às taxas de justiça dos recursos.”

Em 05 de setembro de 2022, inconformada com a decisão que precede, A... – Sociedade de Advogados, SP, RL interpôs recurso de revista que foi admitido por despacho proferido em 08 de outubro de 2022.

Recebidos os autos no Supremo Tribunal de Justiça, em 22 de junho de 2023 foi proferido acórdão que terminou com o seguinte dispositivo:

a) Reconhecer a imputação à esfera jurídica da Ré AA da responsabilidade pelo dano de perda de chance processual causado ao Interveniente Banco 1..., S.A. pela sua conduta omissiva;

b) Determinar a baixa do processo ao Tribunal da Relação para apreciar as questões tidas por prejudicadas no acórdão recorrido, de acordo com o enunciado no parágrafo final do ponto 11. Supra, e, em decorrência disso, e à luz do referido no ponto 12. Supra, decidir qual ou quais, de entre as Seguradores (D... – Companhia de Seguros, S.A. e I..., S.A.) e a Ré AA, deve ou devem ser condenadas, e a que título (se exclusiva, conjunta ou solidariamente, sendo o caso).

Em 11 de julho de 2023, D... – Companhia de Seguros, S.A. veio arguir a nulidade por excesso de pronúncia do acórdão cujo dispositivo antes se reproduziu na medida do necessário para a economia deste acórdão.

Em 16 de novembro de 2023 veio a ser proferido acórdão pelo Supremo Tribunal de Justiça que terminou com o seguinte dispositivo:

5. Deste modo, decide-se:
a) Julgar verificada a nulidade por excesso de pronúncia (art. 615.º, n.º 1, alínea d), 2ª parte, do CPC) e, em consequência, anular a parte do acórdão de 22 de Junho de 2023 que determinou a baixa do processo ao Tribunal da Relação para, além do mais, decidir se a Seguradora D... – Companhia de Seguros, S.A. deve ou não ser condenada no pedido e a que título;
b) Alterar a decisão do acórdão de 22 de Junho de 2023, substituindo-a pela seguinte:

Pelo exposto, julga-se o recurso parcialmente procedente, revogando-se a decisão, e, em sua substituição, decide-se:

a) Reconhecer a imputação à esfera jurídica da Ré AA da responsabilidade pelo dano de perda de chance processual causado ao Interveniente Banco 1..., S.A. pela sua conduta omissiva;

b) Determinar a baixa do processo ao Tribunal da Relação para apreciar as questões tidas por prejudicadas no acórdão recorrido, de acordo com o enunciado no parágrafo final do ponto 4. do presente acórdão[[8]], determinar o regime de responsabilização (responsabilidade exclusiva, conjunta ou solidária) da 2.ª Ré AA e da interveniente I..., S.A. e resolver as questões enunciadas no recurso de apelação interposto por esta última, relativas ao cômputo do dano da perda de chance e ao termo inicial da contagem dos juros de mora.” 

Recebidos os autos neste Tribunal da Relação, atenta a cessação de funções do segundo juiz-adjunto, procedeu-se a sorteio para determinação de novo segundo juiz-adjunto.

Face à recomposição do coletivo e aos desenvolvimentos processuais da lide, os autos foram a vistos, cumprindo agora apreciar e decidir.

2. Questões a decidir tendo em conta o determinado no acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 16 de novembro de 2023

2.1 Do regime da responsabilização da ré subsidiária e da sua seguradora I...;

2.2 Do cômputo do dano da perda de chance;

2.3 Do termo inicial da contagem dos juros de mora.

3. 1 Fundamentos de facto exarados na sentença recorrida que não foram impugnados que se mantêm por não se divisar fundamento legal determinante da sua alteração oficiosa, sem prejuízo das clarificações e observações que os mesmos suscitem de que se dará conta em texto contido entre parênteses retos e em notas de rodapé e da reprodução dos documentos para que seja feita remissão

3.1.1 Factos provados


3.1.1.1

A autora é uma sociedade de advogados que tem por objeto exclusivo o exercício em comum da profissão de advogado[9].

3.1.1.2

No exercício do mencionado escopo social, a autora, entre outros serviços próprios da advocacia, patrocina os seus constituintes em juízo, defendendo os seus direitos e interesses, seja na qualidade de autores/exequentes/reclamantes, seja na qualidade de réus/executados.

3.1.1.3

A fim de prevenir o risco da prática de qualquer ato ou omissão que, no exercício da sua atividade, a pudesse constituir em responsabilidade civil perante os seus constituintes, a autora celebrou com a aqui ré, então denominada E..., S.A., um contrato de seguro titulado pela apólice nº ...35 do ramo Responsabilidade Civil Geral/Profissional[10].

3.1.1.4

A F... adquiriu por incorporação a E... Companhia de Seguros, S.A. com a sua consequente extinção jurídica, e após fusão com a seguradora G... alterou a sua designação para C..., S.A., pelo que a ré é parte legítima para ser demandada nos autos[11].

3.1.1.5

Por via deste contrato de seguro, a ré, contra o recebimento do respetivo prémio, que a autora sempre liquidou pontualmente, obrigou-se e obriga-se a cobrir, até ao limite de capital de cento e sessenta mil euros (€ 160.000,00), a responsabilidade civil profissional, os danos corporais e/ou materiais resultantes do exercício profissional da atividade de advocacia levada a cabo pela autora.

3.1.1.7

O contrato em apreço teve o seu início em 22-03-1995 e mantém-se válido[12] e em vigor até à presente data.

3.1.1.8

Em março de 2012 a autora foi incumbida de patrocinar o Banco 1... nos autos da ação de insolvência que corria termos no 3º Juízo Cível do Tribunal Judicial de Gondomar sob o registo nº. 447/12.0TBGDM, onde eram requeridos/insolventes BB e CC, nomeadamente para apresentar a competente reclamação dos créditos do Banco.

3.1.1.9

Para o efeito, o Banco 1... remeteu à autora, além da informação e dos elementos necessários para instruir a competente reclamação de créditos, o respetivo anúncio para efeitos de intervenção na citada insolvência.

3.1.1.10

A autora, em representação do Banco 1..., reclamou os seus créditos de natureza hipotecária e comum, no dia 11.03.2013, juntando para o efeito os documentos referentes às operações de crédito reclamadas (... ...693, ... ...793, ... ...663 e ... ...316 – três mútuos com hipoteca e um mútuo sem garantia real) – bem como a competente procuração forense e substabelecimento com reserva a favor da mandatária que apresentou o referido articulado, a Exma. Sr.ª Dr.ª AA.

3.1.1.11

As hipotecas desses mútuos eram sobre as frações autónomas designadas pelas letras “A” e “B” do prédio descrito na Conservatória do Registo Predial de Gondomar sob o registo nº. ...11.

3.1.1.12

O montante dos créditos reclamados por esses mútuos garantidos por hipoteca ascende a €191.668,51.

3.1.1.13

Por seu turno o Instituto de Emprego e Formação Profissional, IP, reclamou créditos nesse processo 447/12.0TBGDM no montante de € 62.364,35.

3.1.1.14

Os créditos reclamados pelo Banco 1... foram reconhecidos pelo Administrador de Insolvência na lista prevista no art.º 129º CIRE – onde são aí identificados todos os credores, respetivos privilégios e garantias.

3.1.1.15

Com base na natureza do crédito reclamado pelo Banco 1... o qual, na sua maior parte se encontrava garantido por hipoteca sobre os dois imóveis apreendidos para a massa insolvente, o mesmo Banco requereu a adjudicação dos imóveis em causa pelo valor de € 111.600,00 (= 74.400,00 + 37.200,00), na convicção de que apenas teria de proceder ao depósito do valor correspondente ao crédito do Estado por IMI (e custas), o qual, gozando de um privilégio imobiliário especial, seria o único que prevaleceria sobre o crédito por si reclamado.

3.1.1.16

E, nesse sentido, após ter apresentado a proposta de aquisição desses dois imóveis dados de hipoteca, o Banco 1... liquidou o valor previsto no artigo 164º do CIRE, depositando o respetivo montante de € 22.320,00, na conta de depósitos aberta em nome da Massa Insolvente.

3.1.1.17

Pelo que foram emitidos os títulos de adjudicação, tendo o Banco 1... procedido ao registo dos imóveis a seu favor.

3.1.1.18

Em 21.03.2013 foi proferida a sentença de graduação de créditos, na qual o crédito do Banco 1... garantido por hipoteca é graduado após o crédito da fazenda por I.M.I. (€ 3.065,15) bem como do crédito do IEFP - Instituto do Emprego e Formação Profissional o qual ascendia ao montante de € 62.364,35.

3.1.1.19

Em 23.04.2014 a aqui 2ª ré é notificada do mapa de rateio onde consta que o Banco tem de proceder ao depósito de € 55.692,96, valor que abrangia o crédito da Fazenda por I.M.I. e do IEFP, e que já tinha em consideração a liquidação da verba já depositada ao abrigo do previsto no disposto do artigo 164º do CIRE.

3.1.1.20

Só nesta data é que a autora e a 2ª ré, se apercebem da existência de um lapso na decisão proferida pelo Tribunal, ou seja, a sentença de verificação e graduação de créditos, oportunamente proferida e já transitada em julgado, havia, indevidamente, graduado o crédito do Banco 1..., S.A. atrás do crédito do IEFP.

3.1.1.21

Em 30.04.2014, a autora requereu a retificação do mapa de rateio e da sentença de verificação e graduação de créditos, tentando reverter a situação em apreço, invocando que a decisão proferida enfermava de erros materiais e impugnando o mapa de rateio invocando a respetiva nulidade.

3.1.1.22

Em 05.05.2016 o Banco 1... foi notificado da decisão proferida, sobre a reclamação apresentada em 30.04.2014, a qual não dá provimento à reclamação.

3.1.1.23

Em 23.05.2016 a autora, no âmbito do mandato que lhe havia sido atribuído, interpôs recurso para o Tribunal da Relação do Porto, da decisão mencionada no artigo [aliás ponto] anterior.

3.1.1.24

Foi negado provimento à apelação e, no dia 03.10.2016, a autora foi notificada do acórdão proferido o qual manteve a decisão da 1ª Instância.

3.1.1.25

O Banco 1... viu-se na obrigação de efetuar o depósito da quantia de € 55.692,96 na conta da massa insolvente, uma vez que a outra parte do valor reconhecido ao IEFP encontrava-se já abrangido pelo valor por si depositado.

3.1.1.26

O Banco 1..., efetuado o referido depósito, insistiu com a autora, para que esta proceda à liquidação do valor referido ou que interpele a ré [ré a título principal] para que esta assuma as consequências do sinistro decorrente da omissão acima descrita.

3.1.1.27

Por carta de 08 de fevereiro de 2017, a autora, fazendo-o a coberto do contrato de seguro celebrado com a ré [ré a título principal] participou o sinistro ocorrido.

3.1.1.28

Recebida a participação, a ré [ré a título principal], por carta de 07 de julho de 2017, comunicou à autora que declinava assumir as consequências do sinistro por “…, apesar de ter sido confirmado o erro profissional, verificamos que a Dra. AA não consta da listagem de pessoas seguras pela apólice”.

3.1.1.29

Em resposta à mencionada carta da seguradora a autora respondeu que “…Não concordamos, nem aceitamos o exposto na V. carta de 07.07.2017. De facto, não existe qualquer cláusula, na apólice acima identificada, que exclua os actos praticados por esta sociedade que deram origem à participação em apreço”.

3.1.1.30

A esta nova carta da autora a ré [ré a título principal] não respondeu pelo que certamente não terá alterado a sua posição de recusar assumir as suas obrigações constantes do contrato de seguro.

3.1.1.31

A aqui ré [a ré a título subsidiário ou segunda ré] acompanhava e acompanha alguns processos que a autora patrocina.

3.1.1.32

No âmbito dos referidos processos, a 2ª ré:

- intervém sempre com poderes forenses substabelecidos com reserva pela autora;

- utiliza sempre o papel timbrado da autora;

- segue orientações da autora no que tange ao acompanhamento do processo.


3.1.1.33

A aqui 2ª ré tem a sua atividade profissional segurada por seguro profissional de grupo contratado pela Ordem dos Advogados celebrado entre a I..., S.A. K..., S.A. e a Ordem dos Advogados de Portugal titulado pela apólice de seguro ...58 e com data de início a 1 de janeiro de 2014.

3.1.1.34

Foi pela 2.ª ré, Dra. AA, subscrita uma proposta de seguro de reforço de capital, pela qual a ré advogada manifestou a sua intenção de aumentar em € 150.000,00, o capital seguro previsto no âmbito da apólice de responsabilidade civil profissional base da Ordem dos Advogados (apólice n.º ...58).

3.1.1.35

Pretendendo a 2.ª ré, igualmente, eliminar o valor devido a título de franquia contratual por qualquer eventual sinistro coberto/indemnizável nos termos previstos no contrato de seguro titulado pela apólice ...58.

3.1.1.36

Com data de início em 01.01.2014, a ora I..., S.A. emitiu a apólice de seguro de reforço n.º ...38, a qual esteve em vigor entre 01/01/2014 e 01/01/2018.

3.1.1.37

Participado o sinistro pela 2ª ré[13], a Companhia de Seguros I..., S.A. Seguros informou que não poderia regularizar os danos reclamados por terceiro (Banco 1... SA) por ficarem expressamente excluídas da cobertura da apólice as reclamações: “a) Por qualquer facto ou circunstância conhecidos do segurado, à data de início do período de seguro, e que já tenha gerado, ou possa razoavelmente vir a gerar, reclamação”.

3.1.1.38

Participado o sinistro pela 2ª ré à companhia de seguros cuja apólice vigorava à data da notificação da sentença de graduação de créditos (31/03/2013), respondeu a Seguradora G... que para aplicação da apólice contratada releva a data da “Primeira Reclamação” (participação do sinistro) e não a data da verificação dos factos que eventualmente sejam suscetíveis de gerar responsabilidade profissional.

3.1.1.39

Confrontada com esta última resposta, a ré [a ré subsidiária ou segunda ré] interpelou novamente a companhia de seguros I..., S.A., tendo obtido como resposta a confirmação do anteriormente decidido.

3.1.1.40

A 2.ª ré não integrava à data os quadros da sociedade de advogados, ora autora.

3.1.1.41

Não era sócia da autora, nem tampouco associada, ou sequer alguma vez celebrara ou mantinha qualquer contrato de trabalho com esta.

3.1.1.42

Esta apólice de seguro do ramo Responsabilidade Civil Geral[14], com início em 22.03.1995, titulado pela apólice n.º ...35[15] começou por ser titulada pelo Exmo. Senhor Dr. FF, tendo início em 04.10.1995[16].

3.1.1.43

Ao longo dos já longos anos da sua vigência, foi sofrendo sucessivas vicissitudes, seja em termos de alteração e designação do respetivo tomador, seja por via do aumento do capital máximo seguro.

3.1.1.44

Em 17.03.2003, o tomador e segurado deixou de ser um advogado pessoa singular e em prática isolada, para passar a ser a sociedade de advogados, aqui autora.

3.1.1.45

Foram preenchidos e remetidos à seguradora 1.ª ré, os questionários identificativos dos Advogados que integravam a referida sociedade, e para efeitos de análise de risco e fixação das pessoas integrantes da sociedade de advogados e cuja responsabilidade estaria a coberto pelo âmbito da apólice de seguro.

3.1.1.46

A partir desse momento, de acordo com a indicação que lhe foi prestada pela aqui autora, a seguradora 1.ª ré integrou no âmbito de cobertura da apólice de responsabilidade civil profissional os Exmos. Senhores Advogados:

- GG;

- DD;

- FF;

- HH.

3.1.1.47

Na versão vigente à data do sinistro dos autos, a apólice de seguro aqui em causa vigorava com as seguintes condições:

- Tomador: “A..., Sociedade de Advogados de Responsabilidade Limitada”;

- Limite máximo do capital seguro: €160.000,00, por anuidade/sinistro;

- Listagem de Advogados que integram a sociedade:

- GG;

- DD;

- FF;

- HH.

3.1.2 Factos não provados


3.1.2.1

Conforme a informação que a então E..., SA transmitiu à ora autora, o seguro em causa garante a responsabilidade civil pelos danos patrimoniais que possam ser causados a terceiros em consequência de erro ou falta profissional decorrente do exercício da atividade profissional dos seus sócios, associados estagiários, agentes ou mandatários.

3.1.2.2

Foi com base na sobredita informação que a autora celebrou com a ré o mencionado contrato de seguro titulado pela apólice nº ...35, que tinha por principal objeto a garantia da cobertura dos riscos associados à atividade profissional da autora.

3.1.2.3

De acordo com a lista do 129º do CIRE apresentada pelo Sr. Administrador de Insolvência, em 22.02.2013, a mandatária subscritora da reclamação de créditos informou o Banco, no sentido de que ao crédito do Banco e, relativamente aos imóveis dados de hipoteca ao Banco e apreendidos nessa insolvência, apenas preferia o crédito de IMI no montante de € 3.065,15, ou seja, para efeitos de graduação de créditos, o crédito do Banco deveria ser graduado atrás das custas do processo e do IMI, mas à frente dos restantes credores, face às garantias existentes.

4. Fundamentos de direito

4.1 Do regime da responsabilização da ré subsidiária e da sua seguradora I...

Em cumprimento do douto acórdão do Supremo Tribunal de Justiça que revogou o acórdão por nós relatado em 27 de junho de 2022, concluindo pela imputação à ré subsidiária AA da responsabilidade pelo dano de perda de chance processual causado ao Interveniente Banco 1..., S.A. pela sua conduta omissiva, cumpre agora determinar o regime de responsabilização (responsabilidade exclusiva, conjunta ou solidária) da 2.ª Ré AA e da interveniente I..., S.A.

Embora a ré I..., S.A. tenha na sua contestação suscitado a questão de o contrato de seguro em que é seguradora não abranger o sinistro objeto destes autos em virtude de a segurada ter conhecimento do sinistro no momento em que o referido contrato começou a produzir efeitos, “deixou” cair esta questão na apelação que interpôs, pelo que dela não cuidaremos.

Em bom rigor, se não erramos, depois de assente nestes autos a formação de caso julgado material quanto à absolvição do pedido da ré D... Companhia de Seguros, S.A., o que neste momento importa determinar é se a ré I... responde exclusivamente pelo dano de perda de chance processual causado ao Interveniente Banco 1..., S.A. pela conduta omissiva da ré subsidiária ou se a seguradora e a pessoa cuja responsabilidade é segurada respondem ambas, a título conjunto ou a título solidário.

Neste enquadramento, retomando o que se escreveu em nota de rodapé no acórdão anteriormente proferido neste Tribunal da Relação, dir-se-á que a circunstância de existir um seguro obrigatório apenas faculta ao lesado o direito de ação direta (artigo 146º, nº 1, da Lei do Contrato de Seguro aprovada pelo decreto-lei nº 72/2008 de 16 de abril) mas não lhe retira o direito de demandar o lesante[17], nos termos gerais e que responderá solidariamente com a seguradora para a qual foi transferida a obrigação de indemnizar, na parte em que valha a garantia do seguro, tratando-se de solidariedade imprópria na medida em que o responsável poderá fazer repercutir na seguradora o que for obrigado a cumprir e dentro da cobertura do seguro.

Nos seguros obrigatórios, como é o caso da responsabilidade profissional dos advogados, nada obsta, ressalvado o caso do seguro obrigatório automóvel por força de lei expressa (veja-se o artigo 64º, nº 1, alínea a) do decreto-lei nº 291/2007 de 21 de agosto), a que o lesado demande o responsável e a sua seguradora.

Assim, no que esta questão respeita, conclui-se que a ré subsidiária AA e a seguradora I... respondem solidariamente pelo dano de perda de chance sofrido pelo banco Banco 1... em consequência da conduta omissiva da aludida ré subsidiária, dentro do montante coberto pelo contrato de seguro, respondendo unicamente a ré subsidiária na parte não coberta pelo contrato de seguro.

4.2 Do cômputo do dano da perda de chance

A recorrente I... suscitou a problemática do cômputo da indemnização devida no caso do dano da perda de chance, insurgindo-se quer quanto ao dano final que se considera sofrido pelo Banco 1..., considerando que esse dano é no montante de €  55.692,96 e não de € 62.364,35, quer quanto à fixação concreta do dano da perda de chance que, na sua perspetiva, nunca pode corresponder ao aludido dano final, isto é, o dano que o Banco 1... não teria sofrido se acaso tivesse sido revogada a sentença de verificação e graduação de créditos, não podendo ir além de 50% desse dano final.

Cumpre apreciar e decidir.

Não se questiona nos autos a existência do denominado dano da perda de chance mas sim apenas a sua quantificação[18], seja porque a recorrente I... considera que o dano final é no montante de € 55.692,96, seja porque o dano da perda de chance nunca pode coincidir com o montante do dano final sofrido pelo lesado, propondo que esse montante seja fixado em 50% do dano final, ou seja em € 27.846,48.

Vejamos então, começando por determinar qual o prejuízo que o Banco 1... não teria sofrido se tivesse sido interposto recurso de apelação da sentença de verificação e graduação de créditos proferida em 21 de março de 2013 e, nessa sequência, tivesse sido revogada parcialmente a aludida sentença, passando o crédito do Banco 1... a ser pago em segundo lugar em vez do crédito do Instituto do Emprego e Formação Profissional.

A nosso ver, nesta eventualidade, o Banco 1..., titular de créditos hipotecários reconhecidos no montante de € 191.668,51 (ponto 3.1.1.12 e 3.1.1.14 dos factos provados), com a graduação do crédito reclamado pelo Instituto de Emprego e Formação Profissional, IP no montante de € 62.364,35 (ponto 3.1.1.13 dos factos provados), em segundo lugar e à sua frente e a consolidação dessa graduação na ordem jurídica por força da não interposição de recurso de apelação por parte da ré subsidiária da aludida sentença de verificação e graduação de créditos, tendo prioridade sobre este Instituto por ser titular de uma garantia real, perdeu a oportunidade desse valor ser computado a seu favor, ou seja, o seu dano final é de facto no montante de € 62.364,35.

Ao contrário do que sustenta a recorrente I..., o prejuízo final sofrido pelo Banco 1... não é apenas de € 55.692,96, valor que teve de pagar em 23 de abril de 2014, na sequência da notificação do mapa de rateio, já que tal valor além de abranger os dois créditos graduados antes do crédito hipotecário do Banco 1..., tinha também em consideração a liquidação da verba já depositada ao abrigo do previsto no disposto do artigo 164º do CIRE, no montante de € 22.320,00 (vejam-se os factos provados em 3.1.1.16 e 3.1.1.19).

O montante global de € 78.012,96 (€ 55.692,96 + € 22.320,00 = €78.012,96) depositado pelo Banco 1... com toda a certeza não se destinou apenas à satisfação dos créditos que foram graduados antes do seu crédito e no montante global de € 65.429,50 (€62.364,35 + € 3.065,15 = € 65.429,50), mas também à garantia do pagamento das custas do processo de insolvência, tal como resulta da conjugação dos artigos 46º e 51º, nº 1, alínea a), ambos do CIRE.

Determinado o dano final sofrido pelo Banco 1... no montante de €62.364,35, valor correspondente ao crédito indevidamente graduado antes do crédito hipotecário daquela entidade bancária, cumpre agora computar o dano da oportunidade perdida pelo Banco 1... em consequência da não interposição de recurso de apelação contra a sentença de verificação e graduação de créditos proferida em 21 de março de 2013.

O dano da perda de chance ou de perda de oportunidade enquanto dano autónomo por isso distinto da dano final sofrido[19], especialmente quando na sua origem está uma atuação de um profissional forense, não obstante a sua seriedade e consistência, reveste-se sempre de alguma incerteza na sua concreta delimitação na medida em que nunca há uma segurança total de que se tivesse sido adotada a conduta devida o dano final teria sido evitado.

De facto, seja por força das contingências probatórias, seja pelas diversas valorações que podem ser feitas do mesmo material probatório, seja pelas variadas qualificações jurídicas dos factos provados que podem ser convocadas, seja ainda pelas divergências na identificação, interpretação e aplicação dos normativos pertinentes à resolução do caso concreto, o resultado final na área do trabalho jurídico é particularmente incerto.

Essa incerteza projeta-se necessariamente na problemática do cômputo do dano da perda de chance ou de perda de oportunidade, pois que o grau ou percentagem de evitamento do dano final será determinante na fixação do dano da perda de oportunidade e quando não se lograr alcançar essa fixação, restará a liquidação do dano com recurso à equidade e nos termos previstos no nº 3 do artigo 566º do Código Civil[20].

Não obstante esta incerteza congénita ao labor jurídico, parece poder sustentar-se com alguma segurança que nem todos os domínios do jurídico têm a mesma incerteza, havendo áreas em que o grau de incerteza é menor, como sucede relativamente a algumas questões sucessórias, no que respeita à determinação em abstrato dos quinhões hereditários e bem assim em matéria de graduação de créditos, ao menos nos casos em que se mostra estabilizada doutrinal e jurisprudencialmente a interpretação e aplicação dos preceitos jurídicos pertinentes.

No caso dos autos está em causa a aplicação do privilégio creditório conferido pela alínea b) do artigo 7º do decreto-lei nº 437/78 de 28 de dezembro[21].

Trata-se de um privilégio imobiliário geral, figura que era desconhecida na redação primitiva do Código Civil (vejam-se os artigos 735º, nº 3, 743º, 744º e 751º, todos do Código Civil). E porque assim era, o artigo 751º do Código Civil não podia ser aplicado acriticamente aos novos privilégios imobiliários gerais, já que se tratava de uma previsão legal que decorria do pressuposto legal de que os privilégios imobiliários eram sempre especiais, como constava expressamente do nº 3 do artigo 735º do Código Civil.

O propósito do legislador civil de uma “concentração” dos privilégios creditórios admissíveis em sede fiscal expresso no artigo 8º do decreto-lei nº 47 344 de 25 de novembro de 1966 foi rapidamente esquecido tendo vindo a criar-se novas figuras de privilégios creditórios, como é o caso do privilégio imobiliário geral criado pelo decreto-lei nº 512/76 de 03 de julho e é também o caso do crédito que foi graduado antes do crédito hipotecário do Banco 1....

Neste quadro legislativo, antes ainda das alterações introduzidas ao Código Civil pelo decreto-lei nº 38/2003, de 08 de março, tendo em conta que o privilégio imobiliário geral não incide sobre bens imóveis certos e determinados, sendo assim destituído da nota de “realidade” típica dos privilégios creditórios especiais, era defensável a aplicação por identidade de razão do artigo 749º do Código Civil, assim gozando de prioridade o crédito hipotecário sobre o crédito garantido por privilégio imobiliário geral.

Porém, após as alterações introduzidas pelo decreto-lei nº 38/2003, de 08 de março, ao artigo 751º do Código Civil, ficou positivamente estabelecido que apenas o privilégio imobiliário especial reúne as condições para gozar de prioridade no pagamento sobre a consignação de rendimentos, a hipoteca ou o direito de retenção[22].

 Assim, no caso em apreço, é notório que foi cometido um erro de direito na sentença de graduação e verificação de créditos que graduou o crédito hipotecário do Banco 1... depois do crédito do Instituto do Emprego e da Formação Profissional e que as hipóteses de revogação dessa sentença em via de recurso de apelação eram fortes, dado o direito positivo aplicável e a sua assertividade, afigurando-se-nos adequada a fixação da percentagem do dano final correspondente à oportunidade processual perdida pelo Banco 1... em 90%.

Aplicando esta percentagem ao dano final, o Banco 1... tem a haver, em regime de solidariedade imprópria, da ré responsável por falta profissional e da seguradora de grupo que abrange esta profissional, o montante global de €57.751,56 (€62.364,35x 0,9= €5.612,7915; €62.364,35- €5.612,7915= €57.751,5585).

Esta decisão aproveita à ré subsidiária, ex vi artigo 634º, nº 2, alínea c) do Código de Processo Civil.

4.3 Do termo inicial da contagem dos juros de mora

A recorrente I... insurge-se contra a decisão recorrida que a condenou ao pagamento de juros de mora desde a participação do sinistro descrito nos autos, pois que, na sua perspetiva, não resulta dos autos a data em que o alegado sinistro lhe foi participado e, além disso, porque a indemnização arbitrada foi atualizada, sendo por isso apenas devidos juros de mora a contar da decisão que fixou a indemnização por perda de chance.

Cumpre apreciar e decidir.

Na sentença recorrida a ré subsidiária e a I..., S.A. foram condenadas no pedido, ou seja, ao pagamento da quantia de €62.364,35, acrescida de juros de mora a contar da participação do sinistro[23].

Ao contrário do que afirma a I..., a data da participação do sinistro objeto dos autos resulta do ponto 3.1.1.37 dos fundamentos de facto deste acórdão, no qual ficou a constar que “[p]articipado o sinistro pela 2ª ré, a Companhia de Seguros I..., S.A. Seguros informou que não poderia regularizar os danos reclamados por terceiro (Banco 1... SA) por ficarem expressamente excluídas da cobertura da apólice as reclamações: “a) Por qualquer facto ou circunstância conhecidos do segurado, à data de início do período de seguro, e que já tenha gerado, ou possa razoavelmente vir a gerar, reclamação”. Em nota de rodapé escreveu-se que “[a] participação foi enviada como anexo em mensagem de correio eletrónico em 09 de fevereiro de 2017 como bem se vê do documento nº 3 oferecido pela ré subsidiária com a sua contestação.”

Pode assim concluir-se que resulta dos factos provados, conjugados com a documentação que os suporta, que a participação à I... foi feita pela ré subsidiária em 09 de fevereiro de 2017.

Será que a indemnização arbitrada é atualizada, como pretende a recorrente I..., pelo que os juros de mora apenas poderão ser contados a partir da data da decisão que fixou a indemnização?

A indemnização foi fixada com referência a uma obrigação pecuniária que constitui o dano final sofrido pelo Banco 1..., entendendo-se que a oportunidade processual perdida por este corresponderia a noventa por cento desse montante.

Ora, por força do disposto no artigo 550º do Código Civil, a obrigação pecuniária é, em regra, não atualizada e sendo a indemnização por perda de oportunidade feita com referência a uma obrigação pecuniária, não resultando que no seu cômputo se haja procedido a uma qualquer atualização do seu valor, afigura-se-nos que a indemnização arbitrada não se pode considerar atualizada.

Nesta instância, a fixação da indemnização correspondente à oportunidade processual perdida teve apenas em conta a probabilidade de sucesso do meio processual desaproveitado, não se tendo procedido a qualquer atualização desse valor.

Neste contexto, AA e I..., S.A. vão condenadas a pagar solidariamente o montante de € 57 751,56, a que acrescem juros de mora contados à taxa supletiva legal (artigo 806º, nº 2, do Código Civil e Portaria nº 291/2003 de 08 de abril)) desde 10 de fevereiro de 2017[24], até efetivo e integral pagamento, taxa que se tem mantido desde a interpelação em 4% ao ano e sem prejuízo da aplicação de ulteriores taxas de juros de mora legais e supletivas que venham a vigorar aos juros corridos na sua vigência.

As custas dos recursos e da ação são da responsabilidade de AA e I..., S.A. e bem assim de B... – Sociedade de Advogados, RL e Banco 1..., S.A. na exata proporção do decaimento (artigo 527º, nºs 1 e 2, do Código de Processo Civil).

5. Dispositivo

Pelo exposto, os juízes subscritores deste acórdão, da quinta secção, cível, do Tribunal da Relação do Porto acordam em julgar parcialmente procedentes as apelações interpostas por AA e I..., S.A. e, em consequência, vão ambas condenadas, solidariamente, a pagarem ao Banco 1..., S.A. a quantia de cinquenta e sete mil setecentos e cinquenta e um euros e cinquenta cents, acrescida de juros de mora vencidos desde 10 de fevereiro de 2017 até efetivo e integral pagamento, contados à taxa de 4% ao ano e sem prejuízo da aplicação de ulteriores taxas de juros de mora legais e supletivas que venham a vigorar aos juros corridos na sua vigência.

As custas dos recursos e da ação são da responsabilidade de AA e I..., S.A. e bem assim de B... – Sociedade de Advogados, RL e Banco 1..., S.A. na exata proporção do decaimento (artigo 527º, nºs 1 e 2, do Código de Processo Civil).


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O presente acórdão compõe-se de trinta e sete páginas e foi elaborado em processador de texto pelo primeiro signatário.



Porto, 05 de fevereiro de 2024
Carlos Gil
Mendes Coelho
Manuel Domingos Fernandes
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[1] Segue-se, com alterações, o relatório da decisão recorrida.
[2] De facto, por requerimento de 22 de março de 2021, veio esta seguradora dar conta de fusão por incorporação da D... Companhia de Seguros S.A. na C..., S.A. e da adoção da denominação social “D... – Companhia de Seguros, S.A.”, indicando o código de certidão permanente para comprovação destes factos.
[3] Porém, no último parágrafo da petição inicial formula-se o pedido de que sempre seja admitida a intervenção acessória provocada do Banco 1..., S.A. para, além do mais, intervir na causa como parte principal, como se uma parte acessória pudesse ser uma parte principal e olvidando as condições legais em que pode ser deduzida a intervenção acessória e as suas finalidades (vejam-se os artigos 321º e 323º, nº 4, ambos do Código de Processo Civil).
[4] Acrónimo com que doravante se designará o Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas.
[5] Se bem lemos e interpretamos o disposto no artigo 596º, nº 2, do Código de Processo Civil, as partes apenas podem reclamar do despacho que identifica o objeto do litígio e enuncia os temas da prova. Independentemente disso, esta reclamante foi julgada parte legítima no despacho saneador pelo que relativamente à decisão que recaiu sobre esta exceção dilatória apenas podia reagir como previsto no nº 3 do artigo 644º do Código de Processo Civil.
[6] Notificada às partes mediante expediente eletrónico elaborado em 27 de outubro de 2021.
[7] Uma vez que no sistema atual de recursos em processo civil não há recursos com subida diferida, não tem sentido afirmar que o recurso sobe imediatamente, pois que todos sobem imediatamente. Não se desconhece, contudo, que no nº 3, do artigo 853º do Código de Processo Civil, em sede de ação executiva, se alude à subida imediata de certos recursos, sem que nessa mesma sede se prevejam recursos com subida diferida. A nosso ver, a subida imediata refere-se na realidade à autonomia para efeitos recursórios das decisões previstas no citado nº 3, do artigo 853º do Código de Processo Civil.
[8] O aludido ponto 4 do acórdão tem o seguinte conteúdo: “Dando-se como verificada a nulidade por excesso de pronúncia (art. 615.º, n.º, alínea d), 2.ª parte, do CPC), impõe-se, em consequência, anular a parte do acórdão reclamado que determinou a baixa do processo ao Tribunal da Relação para, além do mais, decidir se a seguradora D..., S.A. deve ou não ser condenada no pedido e a que título. De modo a suprir a referida nulidade, importa começar por sublinhar que a Relação, ao considerar que a A. sociedade de advogados não é titular de qualquer direito sobre a R. subsidiária AA, por força do entendimento quanto à interpretação e aplicação do art. 37.º do DL n.º 229/2004 de 10 de dezembro, concluiu que necessariamente a mesma A. não era também titular de qualquer direito sobre a seguradora dessa R. subsidiária, a aqui interveniente I..., S.A.. Pelo exposto, tendo o Supremo Tribunal de Justiça reconhecido a imputação à esfera jurídica da R. AA da responsabilidade pelo dano de perda de chance processual causado ao interveniente Banco 1... pela sua conduta omissiva, face à ressalva da parte final do art. 679.º do CPC, que determina a inaplicabilidade ao recurso de revista da regra da substituição ao tribunal recorrido prevista no art. 665.º do CPC, continua a justificar-se a baixa do processo ao Tribunal da Relação para apreciação das questões tidas por prejudicadas no acórdão recorrido, que não envolvam a responsabilidade da R. D..., mas envolvam, por um lado a determinação do regime de responsabilização (responsabilidade exclusiva, conjunta ou solidária) da 2.ª R. advogada e da interveniente I...; e, por outro lado, a resolução das questões enunciadas no recurso de apelação interposto por esta última, relativas ao cômputo do dano da perda de chance e ao termo inicial da contagem dos juros de mora.”
[9] Recorde-se a firma da autora: A... – Sociedade de Advogados, SP, RL. Trata-se por isso de uma sociedade de advogados de responsabilidade limitada.
[10] Desta apólice de seguro de responsabilidade civil geral destacam-se nas suas condições gerais as seguintes cláusulas: “ARTIGO 2º OBJECTO DO CONTRATO 1. O presente contrato tem por objecto a garantia da responsabilidade extracontratual, que nos termos da lei civil, seja imputável ao Segurado, somente enquanto na qualidade ou no exercício da actividade expressamente referida nas Condições Especiais e Particulares desta apólice. (…) ARTIGO 5º EXCLUSÕES 1. Não ficam garantidos em caso algum, ainda que o Segurado possa ser civilmente responsável: (…) m) Prejuízos ou danos que resultem do incumprimento ou cumprimento defeituoso de obrigações de qualquer natureza, emergentes de contratos celebrados pelo Segurado; (…) ARTIGO 14º COEXISTÊNCIA DE CONTRATOS (…) 2. Existindo, à data do sinistro, mais de um contrato de seguro com o mesmo objecto e garantia, a presente apólice apenas funcionará em caso de inexistência, nulidade, ineficácia ou insuficiência de seguros anteriores. Na condição especial relativa à responsabilidade civil profissional sublinham-se as seguintes cláusulas: “ARTIGO 1º OBJECTO DO CONTRATO Fica expressamente convencionado que a cobertura concedida por esta apólice se limita a garantir, nos termos e limites das Condições Gerais, Particulares e da presente Condição Especial, a responsabilidade civil legal imputável ao Segurado que derive exclusivamente do exercício da sua actividade profissional. ARTIGO 2º ÂMBITO DO CONTRATO A Garantia deste contrato abrange (…) a) Os danos patrimoniais e/ou não patrimoniais causados aos clientes em consequência de erros, omissões ou negligência cometidos pelo Segurado no exercício da sua profissão e no âmbito de vigência do presente contrato; (…) c) Os actos ou omissões de auxiliares e empregados quando ao seu serviço e no exercício das suas funções; d) A responsabilidade legal do Segurado, derivado da sua substituição em férias, doença ou outro impedimento, por outro profissional legalmente habilitado.” Na nota anexa à apólice nº ...35 consta, além do mais, o seguinte: “Para além das exclusões referidas nas Condições Gerais da Apólice, este seguro não garante ainda: (…) Perdas ou danos decorrentes da responsabilidade das pessoas que não tenham com o Segurado uma relação de dependência laboral, ainda que actuem por ele ou por conta dele”.
[11] Este segmento da parte final deste ponto da factualidade julgada provada pelo tribunal a quo integra matéria de direito devendo como tal considerar-se excluído dos fundamentos de facto que, por definição, integram apenas matéria de facto (veja-se a primeira parte do nº 4, do artigo 607º do Código de Processo Civil).
[12] Manter-se “válido” é uma afirmação de cariz jurídico que não devia constar dos factos provados, e especialmente quando se discute a validade de algumas cláusulas contratuais. Por isso, por não constituir matéria de facto, se desconsiderará este segmento deste ponto de facto (veja-se o nº 4, do artigo 607º do Código de Processo Civil que delimita o que deve constar da fundamentação de facto da sentença).
[13] A participação foi enviada como anexo em mensagem de correio eletrónico em 09 de fevereiro de 2017 como bem se vê do documento nº 3 oferecido pela ré subsidiária com a sua contestação.
[14] Este ponto de facto refere-se de novo à ré seguradora demandada a título principal.
[15] Certamente se pretendeu dizer que a apólice tem o nº ...35, sendo a expressão “titulado pela apólice” uma excrescência que não concorda com o sujeito da oração.
[16] Este ponto de facto contém elementos incompatíveis no que respeita ao início do contrato, reproduzindo acriticamente o que consta do artigo 7º da contestação de C..., S.A., pois que ou bem que o contrato teve início em 22 de março de 1995, data da proposta ou em 04 de outubro de 1995, data que figura num dos dois carimbos da E... apostos na proposta, tendo o outro carimbo a data de 10 de outubro de 1995. O aviso de cobrança de 13 de outubro de 1995 oferecido pela ré C..., S.A. indica como data de início do contrato o dia 22 de março de 1995 e também nas Condições Particulares do contrato de seguro se indica como data de início do contrato o dia 22 de março de 1995, pelo que é esta data que se deve relevar.
[17] A propósito veja-se Lei do Contrato de Seguro Anotada, 3ª Edição Aumentada, Almedina 2020, Pedro Romano Martinez, Leonor Cunha Torres, Arnaldo da Costa Oliveira, Maria Eduarda Ribeiro, José Pereira Morgado, José Vasques e José Alves de Brito, quinto parágrafo da anotação III ao artigo 146º da referida lei, páginas 462 e 463, anotação da responsabilidade de José Vasques.
[18] Neste quadro, não é pertinente a citação do Acórdão de Uniformização de Jurisprudência nº 2/2022 do Supremo Tribunal de Justiça publicado na primeira série do Diário da República nº 18 de 26 de janeiro de 2022 em que se resolve a questão de alguns dos requisitos necessários à existência do dano da perda de chance, tendo sido proferida a seguinte decisão uniformizadora: “O dano da perda de chance processual, fundamento da obrigação de indemnizar, tem de ser consistente e sério, cabendo ao lesado o ónus da prova de tal consistência e seriedade.”
[19] Na obra coletiva intitulada “Droit de la Responsabilité et des Contrats Régimes D´Indemnisation”, 10e Edition, sob a direção de Philippe le Tourneau, Dalloz, fevereiro 2014, página 606, ponto 1423, Cyril Bloch escreve o seguinte: “Ce ne sont pas les sommes convoitées qui constituent le dommage, mais simplement l´espoir de les gagner. Encore faut-il que cet espoir soit sérieux, que la chance soit véritable et non point une quelconque chimère”. Numa tradução livre destes períodos para português: “Não são os montantes pretendidos ou ambicionados que constituem o dano, mas simplesmente a esperança de os ganhar. É ainda necessário que a oportunidade perdida seja verdadeira, real e não uma qualquer quimera”.
[20] Sobre esta problemática, na jurisprudência do nosso mais alto tribunal, a título meramente exemplificativo, vejam-se os seguintes acórdãos acessíveis na base de dados da DGSI: acórdão de 30 de maio de 2019, relatado pela Sra. Juíza Conselheira Rosa Tching, no processo nº 6720/14.5T8LRS.L2.S2; acórdão de 05 de maio de 2020, relatado pelo Sr. Juiz Conselheiro António Magalhães, no processo nº 27354/15.1T8LSB.L1.S2.
[21] Sobre este privilégio veja-se Dos Privilégios Creditórios: Regime Jurídico e sua Influência no Concurso de Credores, Almedina 2004, Miguel Lucas Pires, páginas 327 a 330.
[22] Esta alteração legislativa decorreu da declaração de inconstitucionalidade com força obrigatória geral do artigo 11º do decreto-lei nº 103/80 de 09 de maio, na interpretação de que o privilégio imobiliário geral aí previsto preferia à hipoteca (acórdão do Tribunal Constitucional nº 363/2002, de 17 de setembro de 2002, publicado na primeira série A, nº 239/2002, do Diário da República de 16 de outubro de 2002).
[23] A referência à participação do sinistro no que tange a lesante parece, salvo melhor opinião, despropositada, mas atentas as regras que disciplinam o pedido (artigo 609º, nº 1, do Código de Processo Civil), ter-se-á que relevar a data da participação do sinistro à I... para dar conteúdo a este segmento do petitório inicial.
[24] Na realidade, tendo a participação sido feita em 09 de fevereiro de 2017, nada impedia que nesse dia fosse paga a indemnização devida. Daí que o próprio dia da participação não seja incluído no cômputo dos juros de mora, iniciando-se a contagem destes no primeiro dia subsequente ao da participação.