Acórdão do Tribunal da Relação do Porto
Processo:
247/20.3T8GDM-A.P1
Nº Convencional: JTRP000
Relator: JUDITE PIRES
Descritores: RESPONSABILIDADES PARENTAIS
GUARDA CONJUNTA
Nº do Documento: RP20240111247/20.3T8GDM-A.P1
Data do Acordão: 01/11/2024
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: CONFIRMAÇÃO
Indicações Eventuais: 3.ª SECÇÃO
Área Temática: .
Sumário: I - As responsabilidades parentais devem ser exercidas na prossecução do “interesse dos filhos”, e nos casos em que é demandada a intervenção do poder judicial, este deve decidir assegurando igualmente o interesse do menor, ainda que o faça em prejuízo dos pais ou de terceiros.
II - A guarda conjunta do filho menor, com alternância de residências, permitindo uma mais ampla paridade no desempenho das funções parentais por ambos os progenitores e constituindo meio de incentivo a uma maior cooperação entre estes e sua responsabilização pelo processo de desenvolvimento dos filhos menores, não depende da concordância de ambos os progenitores: tal regime, apesar dessa falta de acordo, pode ser fixado pelo tribunal quando, em face da situação concreta a ponderar, conclua que a mesma promove o interesse do menor.
Reclamações:
Decisão Texto Integral: Processo nº 247/20.3T8GDM-A.P1
Tribunal Judicial da Comarca do Porto
Juízo de Família e Menores de Gondomar – Juiz 3




Acordam no Tribunal da Relação do Porto:


I. RELATÓRIO

1. AA, progenitor de BB, nascido em .../.../2015, instaurou contra CC, também progenitora do BB, processo de alteração da regulação das responsabilidades parentais, em matéria de guarda e residência habitual do filho de ambos, por forma a que se decida:
“a) Estabelecer um regime quanto à regulação do exercício das responsabilidades parentais do menor BB;
b) Estabelecer o regime de guarda partilhada do menor BB.
c) Fixar a residência alternada do menor BB permitido que este passe o período de uma semana seguida junto de cada um dos progenitores.”
Fundamenta a sua pretensão, em síntese, nas seguintes circunstâncias supervenientes, relativamente ao momento da anterior alteração:
O menor manifesta vontade de estar mais tempo com o progenitor;
O menor tem um quarto próprio em casa do pai.
A requerida foi citada nos termos do artigo 42.º n.º 3 do RGPTC, vindo a pronunciar-se em 08.09.2021, sustentando, em resumo, que não se verificam circunstâncias supervenientes ou incumprimento de ambos os progenitores, como pressupõe o artigo 42.º do RGPTC e impugnando parte do alegado no requerimento inicial.
Mais alega que:
O BB, por vezes, quando está com o pai falta à escola para ir para o café, não lava os dentes e ocupa o tempo a ver vídeos, sem acompanhamento adequado;
Quando está com o pai ignora e não cumprimenta familiares maternos, com receio de retaliações do pai, o qua já lhe disse que não pode gostar do marido da mãe;
Quando o menor está com o pai, este recusa-se a atender o telefone à mãe e não devolve chamadas, passando-se várias vezes três dias sem que a mãe consiga contacto com o menor;
O BB vem várias vezes do pai com tosse;
O pai tem uma arma em casa, ao alcance do BB.
O pai troca unilateralmente os seus fins-de-semana com o BB.
Procedeu-se à conferência nos termos do artigo 35.º, ex vi do artigo 42.º n.º 5, do RGPTC, não tendo sido possível qualquer acordo, sendo determinada a realização de audição técnica especializada– cf. acta de 04.11.2021 –, cujo relatório informativo foi junto em 11.03.2022.
Mantendo-se a ausência de consenso, determinou-se a elaboração de relatórios sociais – juntos em 19.08.2022, com complemento informativo em 17.11.2022, na sequência de requerimento da progenitora.
Os progenitores foram notificados para os fins previstos no artigo 39.º n.º 4 do RGPTC, tendo a requerida apresentado alegações em 28.11.2022, e o requerente, em 02.12.2022.
Procedeu-se a audiência de julgamento, e, concluída, proferiu-se sentença com o seguinte dispositivo:
Julga-se a presente ação parcialmente procedente por provada e, por via disso, altera-se a regulação do exercício das responsabilidades parentais de requerente e requerida sobre a criança BB, nascido em .../.../2015, nos seguintes termos:
- na semana em que o BB não passa o fim-de-semana com o pai este passará a poder ir buscar o filho à quarta-feira ao final das actividades escolares, entregando-o no colégio na sexta-feira de manhã.
No mais, absolve-se a requerida do pedido.
Registe e notifique.
Comunique à Conservatória (artigos 1920º-B, al. a), do CC e artigo 78º do CRC).
Custas pelos progenitores na proporção dos seus decaimentos, que se fixam em 9/10 pelo
requerente e 1/10 pela requerida.
Notifique e registe”.
2. Por discordar da referida decisão, interpôs o requerente progenitor recurso para esta Relação, admitido como de apelação, findando as suas alegações com as seguintes conclusões:
“A. O Tribunal a quo decidiu julgar parcialmente procedente por provada e, por via, disso, alterou-se a regulação do exercício das responsabilidades parentais do requerente e requerida sobre a criança BB, no sentido em que na semana em que o BB não passa o fim-de-semana com o pai este passará a poder ir buscar o filho à quarta-feira ao final das atividades escolares, entregando-o no colégio na sexta-feira de manhã. Ademais, o tribunal a quo, decidiu absolver a requerida do pedido.
B. O presente recurso visa sindicar quer a matéria de direito quer a matéria de facto dada como provada, bem como a matéria dada como não provada, pelo Tribunal a quo, nos termos dos artigos 639.º e 640.º, respetivamente, ambos do CPC, e em consequência, a averiguação dos pressupostos que levaram a improcedência parcial do presente pedido de alteração do exercício das responsabilidades parentais, com os quais o Apelante de maneira nenhuma se conforma.
C. Da exposição dos concretos pontos de facto incorretamente julgados, mormente no ponto 14) dos Factos Provados, podemos concluir que o Tribunal a quo, considerou o apelante não ser corporativo na troca de fins de semana
D. Na qual o Tribunal a quo, realça uma contradição com o ponto 14) da douta sentença, sobre a troca dos fins de semana, à qual o progenitor solicita à Apelada esta mesma troca, quando este não possui disponibilidade, devido a formações de trabalho ou horários que já teve e que venha a possuir no futuro.
E. Ora, a testemunha DD, amiga da Apelada, vem demonstrar um cenário onde não existe a necessidade de haver a troca de fins-de-semana, tendo em conta o facto que o Apelante poderia efetuar a tarefa parental, ao levar o menor à festa de aniversário da filha da testemunha.
F. As atividades de aniversário que o menor venha a participar não são restringidas pelo Apelante, mas sim pela própria Apelada, já que esta possui o desejo de passar tempo com a testemunha DD, (com a qual possui laços de amizade como mencionado), durante festas de aniversário. Sujeitando uma troca de fins de semana, por motivo egoísta.
G. No ponto 17) dos factos provados, sobre a falta de comunicação entre os progenitores, quando o menor está doente, o Tribunal a quo indica que a culpa se permanece no Apelante, onde se sustenta com as testemunhas da apelada, cuja qual possuem depoimentos parciais e irracionais.
H. A testemunha EE, demonstra uma falta colossal de ter mesmo presenciado o menor doente e as tentativas de contacto, ao não apresentar certeza e assistir apenas a um desabafo da Apelada.
I. A testemunha FF, irmã da Apelada, na sua incongruência, alega que no dia que o menor se apresentava doente, coincidentemente efetua a tarefa parental da apelada ao ir buscar o menor à escola, à qual é necessário questionário se a inaptidão da apelada em efetuar as tarefas parentais perante o menor é algo constante.
J. A testemunha DD, uma terceira que possui fortes laços de amizade com a Apelada, vem mencionar que não consegue especificar os factos e os momentos em concretos, concluindo assim a sua falta de certeza em relação à comunicação entre o Apelante e a Apelada.
K. A testemunha GG, marido de DD e padrinho do menor, mostra diretamente que nunca presenciou qualquer interação entre os progenitores do menor, concluindo assim a inaptidão do seu depoimento ser usado como motivação do facto provado.
L. O ponto 17), as testemunhas supramencionadas, demonstram claramente a falta de veracidade dos factos expostos.
M. O tribunal a quo, decidiu dar como provado o ponto 27), ao motivar que o Apelante não é colaborante com as atividades religiosas à qual o menor está inserido, onde careceu a necessária autorização formal e de forma a não criar problemas nunca chegou a responder sobre esta atitude desrespeitosa.
N. Para além de não possuir a autorização formal por parte de ambos os progenitores, o Apelante veio a sofrer uma falta de respeito por parte da Apelada ao vincular como o progenitor deverá organizar o Dia do Pai, em virtude de uma missa que iria ser realizada pela paróquia da catequese a comemorar o Pai Nosso.
O. A Apelada ao não proporcionar a escolha e evidenciar por via email que o Apelante não possui a opção, a Apelada está a ir contra uma obrigação contratual do Acordo de Regulação Parental, ao não ceder ao progenitor de como deverá organizar o Dia do Pai.
P. Tendo em conta o facto 38) na douta sentença, o Tribunal a quo, ao verifica que o Apelante apresenta falta de segurança no domicílio, uma vez que possui porte de arma, apresenta uma discrepância irrealista mediante a legislação e a profissão do progenitor, como também as inspeções das autoridades competentes, para além disso dos pareceres da segurança social, ao provarem a existência de um cofre com o intuito de guardar a arma.
Q. Portanto será notável que tal facto se não seja considerado como provado.
R. Em relação ao facto 39), o Tribunal a quo, prova a progenitora ter conhecimento do momento de o menor ter um problema no pé pelo próprio, ao referir a falta de comunicação, que ocorreu no dia 29 de Janeiro, motivado por três de testemunhas (FF, DD e GG) que apresentam uma falta de clareza estonteante nos depoimentos.
S. As testemunhas afirmam que a Apelada foi informada sobre este evento pelo próprio BB, contudo existe uma comunicação por parte do pai no dia 30 de janeiro de 2023, pela manhã.
T. Estes depoimentos só vêm demonstrar a falta de imparcialidade existente, onde sujeitam os laços de afinidade entre um pai e um filho.
U. Para além disso, este facto provado, só foi mencionado na Audiência de Discussão e de Julgamento, nunca foi mencionado na fase dos articulados, sujeitando ao Apelante a falta do direito do contraditório a provar de forma documental de como comunicou com a Apelada, sobre o que aconteceu com o menor.
V. Todos estes factos que o tribunal a quo decidiu provar são só meras suposições, onde não existe um único momento de prova testemunhal à qual venha demonstrar certeza e lógica nos momentos relatados.
X. A prova produzida transparece uma falácia, onde o Apelante nunca obteve hipótese de receber uma imparcialidade justa na prova testemunhal.
Z. E Por falta de momento ao Apelante exercer o princípio do contraditório, por culpa da Apelada, não veio a existir qualquer oportunidade de exercer a prova documental necessária, a fim de comprovar este mesmo facto.
AA. O Tribunal a quo, prova que a residência possui as condições a fim do menor pernoitar.
BB. Não nos é possível conformar que não foram reunidas as provas necessárias para todos os factos alegados por parte a Apelada designadamente, a contradição no acordo das trocas do fim-de-semana, sobre as comunicações do Raio-X, a habitação, em relação à segurança do porte de arma, da catequese e do Pai Nosso sendo esta ultima importante no que concerne as responsabilidades parentais de particular relevância, como o dispõe o art. 1886.º do Código Civil, não se encontra por isso o Tribunal a quo em condições para tomar uma decisão.
Nestes termos e nos Demais de Direito aplicáveis, deverá ser dado provimento ao presente recurso e, em consequência, deverá ser revogada a Douta Sentença ora recorrida, devendo o mesmo recurso ser julgado procedente e provado e após a reanálise da prova testemunhal produzida e da apreciação crítica da prova junta aos autos à luz das mesmas testemunhas e conclusões, tendo como fito a guarda partilhada por ambos”.
A recorrido e o Ministério Público apresentaram contra-alegações, pugnando pela improcedência do recurso e confirmação da sentença recorrida.
Colhidos os vistos, cumpre apreciar.

II. OBJECTO DO RECURSO.
A. Sendo o objecto do recurso definido pelas conclusões das alegações, impõe-se conhecer das questões colocadas pelo recorrente e as que forem de conhecimento oficioso, sem prejuízo daquelas cuja decisão fique prejudicada pela solução dada a outras, importando destacar, todavia, que o tribunal não está obrigado a apreciar todos os argumentos apresentados pelas partes para sustentar os seus pontos de vista, sendo o julgador livre na interpretação e aplicação do direito.
B. Considerando, deste modo, a delimitação que decorre das conclusões formuladas pelo recorrente, no caso dos autos cumprirá apreciar:
- se ocorreu erro na apreciação da matéria de facto;
- se existe fundamento para alterar a regulação das responsabilidades parentais relativas a BB, quanto à sua guarda e residência.


III - FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO.
A. Em primeira instância foram considerados provados os seguintes factos com relevância para a decisão:
1. O Requerente e a Requerida foram casados, sendo que desta relação, a 15 de Abril de 2015, nasceu BB.
2. Aquando do divórcio os progenitores acordaram um regime de visitas livre.
3. No ano de 2020, o Requerente propôs uma alteração ao regime de responsabilidades parentais, a fim de ver fixado o regime de guarda partilhada almejando estar mais tempo com o seu filho.
4. No entanto, não logrou sucesso, tendo sido outorgado acordo no processo principal, em 02.07.2020, pelo qual se manteve a residência do BB com a mãe, estipulando-se:
“Visitas
O pai poderá estar com o filho, aos fins de semana, de 15 em 15 dias, indo buscá-lo à quinta-feira, ao colégio, no fim das actividades escolares, entregando-o na segunda-feira de manhã no colégio.
Na semana em que a criança não está com o pai, este poderá ainda estar com o filho, um dia por semana, à quinta-feira, indo buscar o filho ao colégio, no fim das actividades escolares, entregando-o na sexta-feira de manhã igualmente no colégio devendo o progenitor assegurar a frequência escolar da criança.
Férias de Natal / Passagem de Ano
A criança nas férias escolares de Natal passará desde o término das actividades escolares até às 10:30 horas do dia 25.12 com o progenitor e das 10:30 horas do dia 25 até ao dia 01.01 com a mãe que o entregará ao pai que ficará com a criança até o reínicio do ano escolar, alternando nos anos seguintes.
Férias escolares da Páscoa
Na Páscoa, a criança passará a primeira parte das férias escolares até às 10.30 horas de segunda-feira de Páscoa, com o pai e, a segunda parte das férias com a mãe.
Dia da Mãe, Dia do Pai, aniversário da mãe e aniversário do pai
A criança passará com cada um dos progenitores os respectivos dias, sem prejuízo das actividades escolares e do período de descanso da criança.
Aniversários
Cada um dos progenitores deverá providenciar que a criança possa assistir ao festejo dos aniversários dos avós, tios e padrinhos.
No dia de aniversário da criança, esta almoça ou janta alternadamente com cada um dos progenitores, nos termos que vierem a ser combinados por estes, sem prejuízo das actividades educativas e do período de descanso da criança.
Férias de Verão
No período das férias escolares de Verão da criança, esta passará 15 dias seguidos com cada um dos progenitores, devendo o progenitor avisar a progenitora, qual o período que pretende, até final do mês de Maio.
Este ano a criança passará a última semana de Julho e a primeira semana de Agosto com a progenitora e a segunda quinzena de Agosto com o progenitor.
Na falta de acordo, a mãe, nos anos pares, escolherá as datas dos períodos de férias e o pai nos anos ímpares.”
5. O Requerido trabalha como GNR – Guarda Nacional Republicano, auferindo mensalmente € 1239,00.
6. O Requerente já era GNR tanto quando casou, como quando foi pai.
7. Actualmente, em casa do pai, o BB tem um quarto para si, estando o mesmo decorado e equipado de acordo com os seus gostos, faixa etária e necessidades.
8. O quarto está ainda mobilado com cómoda e roupeiro onde estão arrumadas de forma organizada apenas roupas de criança correspondentes à faixa etária do BB”.
9. As residências dos progenitores situam-se ambas em ..., Gondomar.
10. A habitação do progenitor é composta por dois quartos, sendo que o avô paterno do BB pernoita no quarto contíguo. O progenitor isolou o salão contíguo à sala de estar por uma estrutura de biombo onde pernoita no sofá-cama, e onde dispõe de roupeiro próprio.
11. O BB dorme sozinho no seu quarto; no entanto, o BB pede para adormecer com o pai ora na cama de casal de que dispõe, ora no sofá-cama onde dorme, pernoitando toda a noite pontualmente com o filho.
12. A empregada de limpeza de seu nome EE encontrou em dia não concretamente apurado, anterior a Fevereiro de 2022, um móvel novo no quarto do progenitor pai e recebeu instruções para passar a roupa do BB das sacas plásticas para este mesmo móvel.
13. Em casa do pai regista-se ausência de secretária onde efetuar os trabalhos de casa.
14. O Pai não cede à troca de quaisquer fins-de-semana.
15. Daí que apesar de tentativas várias, a requerida viu-se obrigada a intentar a respetiva acção de suprimento de autorização de viagem, que correu termos no apenso B pois o requerente foi inflexível na questão de troca dos fins de semanas.
16. Quando o menor está com o pai, este recusa-se a atender o telefone, ou a devolver chamadas à mãe, designadamente, nas férias grandes onde durante alguns dias a mãe não teve quaisquer notícias do BB, não obstante telefonemas e mensagens várias ao pai.
17. De igual forma, em fim de semana em que o BB esteve doente, o pai recusou-se a atender o telefone, não conseguindo a mãe estabelecer contacto com o menor mesmo estando ele doente.
18. Esta ausência de comunicação é especialmente prejudicial em contextos de doença, pois o pai não explica quando fez febre pela última vez, que medicação foi tomada e tal prejudica em muito a terapêutica do BB.
19. O BB é uma criança feliz em todos os quadrantes da sua vida, perfeitamente inserido na escola, na catequese e nos diversos grupos sociais em que gravita.
20. Adora viver com a mãe e com o actual marido da mesma, HH, com quem aliás tem uma excelente relação.
21. Está entusiasmadíssimo com o recente nascimento da nova irmã e com o papel de irmão mais velho que está a assumir.
22. O BB sofreu durante algum tempo sem saber como iria dar a notícia ao pai de que iria ter uma mana, pois sente que ao estar feliz com estes episódios, o pode estar a trair.
23. A rotina do menor quando está com o pai, inclui passar parte dos dias no café “O A...”.
24. Bem como ver vídeos em dispositivos móveis no canal Youtube, sem qualquer acompanhamento ou estímulo próprio para a idade;
25. Assim, quando se encontra na presença do pai o BB ignora e não cumprimenta familiares directos e/ou amigos maternos, nomeadamente o padrinho e esposa deste e até mesmo a madrinha e tia de quem gosta e é muito próximo, enquanto olha para o pai, procurando aprovação e sempre com receio de retaliações que o pai lhe possa impor.
26. Do mesmo modo, o BB já desabafou à mãe que o pai lhe disse que ele não pode gostar do marido da mãe, HH.
27. Tudo isto deixa o BB confuso e perdido, acreditando o menor que para ter a aprovação do pai, não pode gostar ou dar-se bem com o marido da mãe ou cumprimentar familiares maternos.
28. Frequentemente o BB vem do pai com tosse ou constipado sem qualquer medicação ou explicação de quando começaram os sintomas.
27. O pai várias vezes não leva o BB à catequese, que tem regularidade semanal, no sábado que o menor passa com o pai e não respondeu ao contacto efectuado pela progenitora sobre a autorização ou não para que o filho participasse na festa do Pai Nosso, inerente a tal actividade e que está agendada para o dia do Pai.
28. Da mesma forma, o BB já faltou a vários jogos de futebol (que frequenta semanalmente ao sábado), por o pai não o levar.
29. Tudo isto sem qualquer motivo ou justificação.
30. Em momento não concretamente apurado de 2022, o pai enviou um SMS à mãe a dizer que não poderia ficar com o BB, sem qualquer outra justificação.
32. Posteriormente, a mãe acabou por ter conhecimento que o motivo foi fazer os caminhos de Santiago e durante todo esse tempo (30 dias no total) o requerente não ligou uma única vez ao BB.
33. Por causa disso, em dia incerto de 2022, o BB verbalizou: “sinto-me abandonado pelo meu pai!” (palavras dele).
34. Por vezes o progenitor solicita à mãe que fique com o menor.
35. Nos dias supra mencionados a mãe simplesmente recebe uma lacónica mensagem a dizer: “Não vou buscar o BB, ficas tu com ele!”
36. De igual forma, as férias do requerente com o menor foram justamente a fazer os caminhos de Santiago, sendo que o BB deu nota à mãe de se ter sentido obrigado a caminhar e entediado por apenas caminhar e não fazer mais nada.
37. Quando chegou das alegadas férias, o cansaço do menor era evidente, tendo confidenciado que não tinha gostado nada do programa escolhido.
38. Na residência do pai existe uma arma de fogo ao alcance de quem quer que seja, nomeadamente do BB.
39. A progenitora chegou a ter conhecimento de que o BB teria tido um problema num pé que o levou a ir ao hospital fazer um RX quando estava com o pai, pelo próprio BB.
40. Embora a progenitora valorize a preservação da continuidade dos vínculos entre BB e a figura paterna, foca ainda os padrões educativos diferenciados em termos de rotinas e imposição de limites que revestirão dimensões mais permissivas no meio familiar paterno e que acabam por ser relativizadas com a actual organização familiar.
41. Embora o progenitor também assuma um discurso valorizante sobre as competências parentais maternas, considera que também tem capacidade de se organizar em termos logísticos.
42. A progenitora trabalha como responsável de departamento, auferindo mensalmente €1128; vive com o marido, que é responsável comercial e aufere mensalmente €1065, bem como com uma filha bebé comum do casal, e o BB.
43. O agregado familiar materno reside em moradia cedida pelos avós maternos da criança.
44. A pensão de alimentos é revertida diretamente pelo pai do BB no pagamento da mensalidade do colégio.
45. Embora a habitação seja propriedade dos pais de CC, o casal assume os encargos com tal espaço habitacional nomeadamente o seguro da habitação.
46. O progenitor reside com o seu pai, que é reformado, auferindo mensalmente €663,18, em moradia bi-familiar, que evidencia preocupação com o seu arranjo e conforto.
47. O progenitor minimiza o impacto da ausência de contacto telefónicos cuja responsabilidade atribui à progenitora face à ausência de privacidade com o filho aquando de tais chamadas. Considera assim a sua postura de evitamento a tais telefonemas/videochamadas como factor de preservação da estabilidade para o descendente.
48. Ambos os progenitores descrevem o filho como uma criança alegre e autónoma que evidencia manter com ambas as figuras parentais uma vinculação segura e gratificante. Tais características da personalidade também são salientadas nos registos de avaliação escolar em que BB é descrito como um aluno participativo, alegre, organizado que se destaca pelo seu interesse na aprendizagem do conjunto das actividades lectivas. Transitou para o 2º ano de escolaridade com aproveitamento muito bom.
B. A mesma instância considerou não provados os seguintes factos:
- que o BB manifeste vontade de passar mais tempo com o pai;
- que a Requerida tenha matriculado o BB em actividades extracurriculares sem comunicar previamente com o Requerente;
- que sempre que o Requerente solicitou uma troca ou uma pernoita a Requerida tenha recusado;
- que a Requerida constantemente agende eventos nas datas fixadas para o menor estar com o progenitor.
- que o BB continue a não ter quarto próprio em casa do progenitor pai e que falte à escola quando está com este.

IV. FUNDAMENTAÇÃO DE DIREITO.
Dispõe o n.º 1 do artigo 662.º do Código de Processo Civil que “a Relação deve alterar a decisão proferida sobre a matéria de facto, se os factos tidos como assentes, a prova produzida ou um documento superveniente impuserem decisão diversa”, estabelecendo o seu nº 2:
A Relação deve ainda, mesmo oficiosamente:
a) Ordenar a renovação da produção da prova quando houver dúvidas sérias sobre a credibilidade do depoente ou sobre o sentido do seu depoimento;
b) Ordenar, em caso de dúvida fundada sobre a prova realizada, a produção de novos meios de prova;
c) Anular a decisão proferida na 1.ª instância, quando, não constando do processo todos os elementos que, nos termos do número anterior, permitam a alteração da decisão proferida sobre a matéria de facto, repute deficiente, obscura ou contraditória a decisão sobre pontos determinados da matéria de facto, ou quando considere indispensável a ampliação desta”.
Como refere A. Abrantes Geraldes[1], “a Relação deve alterar a decisão da matéria de facto sempre que, no seu juízo autónomo, os elementos de prova que se mostrem acessíveis determinem uma solução diversa, designadamente em resultado da reponderação dos documentos, depoimentos e relatórios periciais, complementados ou não pelas regras de experiência”… “afastando definitivamente o argumento de que a modificação da decisão da matéria de facto deveria ser reservada para casos de erro manifesto” ou de que “não é permitido à Relação contrariar o juízo formulado pela 1ª instância relativamente a meios de prova que foram objecto de livre apreciação”, acrescentando que este tribunal “deve assumir-se como verdadeiro tribunal de instância e, por isso, desde que, dentro dos seus poderes de livre apreciação dos meios de prova, encontre motivo para tal, deve introduzir as modificações que se justificarem”.
Importa notar que a sindicância cometida à Relação quanto ao julgamento da matéria de facto efectuado na primeira instância não poderá pôr em causa regras basilares do ordenamento jurídico português, como o princípio da livre apreciação da prova[2] e o princípio da imediação, tendo sempre presente que o tribunal de 1ª instância encontra-se em situação privilegiada para apreciar e avaliar os depoimentos prestados em audiência. O registo da prova, pelo menos nos moldes em que é processado actualmente nos nossos tribunais – mero registo fonográfico –, “não garante a percepção do entusiasmo, das hesitações, do nervosismo, das reticências, das insinuações, da excessiva segurança ou da aparente imprecisão, em suma, de todos os factores coligidos pela psicologia judiciária e dos quais é legítimo ao tribunal retirar argumentos que permitam, com razoável segurança, credibilizar determinada informação ou deixar de lhe atribuir qualquer relevo”[3].
Também é certo que, como em qualquer actividade humana, sempre a actuação jurisdicional comportará uma certa margem de incerteza e aleatoriedade no que concerne à decisão sobre a matéria de facto. Mas o que importa é que se minimize tanto quanto possível tal margem de erro, porquanto nesta apreciação livre o tribunal não pode desrespeitar as máximas da experiência, advindas da observação das coisas da vida, os princípios da lógica, ou as regras científicas[4].
De todo o modo, a construção da realidade fáctica submetida à discussão não se poderá efectuar de forma parcelar e desconexa, atendendo apenas a determinado meio de prova, ou a parte dele, e ignorando todos os demais, ainda que expressem realidade distinta, a menos que razões de credibilidade desacreditem estes.
Ou seja: nessa tarefa não pode o julgador conformar-se com a análise parcelar e parcial transmitida pelos litigantes, mas antes submetê-la a uma ponderação dialéctica, avaliando a força probatória do conjunto dos meios de prova destinados à demonstração da realidade submetida a debate.
Assinale-se que a construção – ou, melhor dizendo, a reconstrução, pois que é dela que se deve falar quando, como no caso, se procede à ponderação dos factos que por outros foram apreendidos e transmitidos com o filtro da interpretação própria de quem processa essa apreensão – da realidade fáctica não pode efectuar-se de forma parcelar e desconexa, antes reclamando o contributo conjunto de todos os elementos que a integram.
Quer isto dizer que a realidade surge de um conjunto coeso de factos, entre si ligados por elos de interdependência lógica e de coerência.
A realidade não se constrói apenas a partir de um depoimento isolado ou de um conjunto disperso de documentos, ainda que confirmadores de uma determinada versão factual, antes se deve conformar com um património fáctico consolidado de forma sólida, coerente, transmitido por elementos probatórios com idoneidade e aptidão suficientes a conferir-lhe indiscutível credibilidade.
Como se escreveu no acórdão da Relação de Lisboa de 21.12.2012 Processo nº 5797/04.2TVLSB.L1-7, l1-7, www.dgsi.pt. , “…a verdade judicial traduz-se na correspondência entre as afirmações de facto controvertidas, relevantes e pertinentes, aduzidas pelas partes no processo e a realidade empírica, extraprocessual, que tais afirmações contemplam, revelada pelos meios de prova produzidos, de forma a lograr uma decisão oportuna do litígio. Sobre as doutrinas da verdade judicial como mera coerência persuasiva ou como correspondência com a realidade empírica, vide Michele Taruffo,La Prueba, Marcial Pons, Madrid, 2008, pag. 26-29. Quanto à configuração do objecto da prova e a sua relação com o thema probandum, vide Eduardo Gambi, A Prova Civil – Admissibilidade e relevância, Editora Revista dos Tribunais, São Paulo, Brasil, 2006, pag. 295 e seguintes; LLuís Muñoz Sabaté, Fundamentos de Prueba Judicial Civil L.E.C. 1/2000, J. M. Bosch Editor, Barcelona, 2001, pag. 101 e seguintes.
Por isso mesmo, a “reconstrução” cognitiva da verdade, por via judicial, não tem, nem jamais poderia ter, a finalidade exclusiva de obter uma explicação exaustiva e porventura quase irrefragável do acontecido, como sucede, de certo modo, nos domínios da verdade história ou da verdade científica, muito menos pode repousar sobre uma crença inabalável na intuição pessoal e íntima do julgador. Diversamente, tem como objectivo conseguir uma compreensão altamente provável da realidade em causa, nos limites de tempo e condições humanamente possíveis, que satisfaça a resolução justa e legítima do caso (…)”.
1.1. Reclama o recorrente que, procedendo esta instância ao reexame da prova, se altere a matéria constante dos pontos 14.º, 17.º, 27.º, 38.º e 39.º da decisão aqui escrutinada, nela dada como provados, de forma a terem-se como não provados, convocando, para o efeito, prova testemunhal produzida em audiência.
Satisfatoriamente cumpridos os ónus a que se referem o artigo 640.º do Código de Processo Civil, importa indagar se a prova foi incorrectamente apreciada e, ocorrendo erro de julgamento, se a decisão da matéria de facto deve ser alterada, designadamente no sentido defendido pelo recorrente.
A testemunha DD, amiga da progenitora do BB, relatou ter assistido a troca de mensagens entre a sua amiga e o pai do BB, questionando-o aquela se ele acedia em trocar o fim de semana em que tinha o filho na sua companhia para que este pudesse ir à festa de aniversário da filha da depoente, II, de quem o BB é muito próximo, e que o progenitor recusou essa troca.
Pretendendo a progenitora viajar com o filho para visitar a Disneyland, em Paris, num fim de semana, de 25 a 27 de Março de 2022, período que o progenitor teria a companhia do BB, aquele não anuiu em trocar esse fim de semana por outro, o que fez com que a progenitora tivesse de recorrer ao procedimento de Suprimento de Autorização para a Prática de Acto – como resulta do apenso B.
Estes elementos factuais são, todavia, manifestamente insuficientes para se poder concluir que o “pai não cede à troca de quaisquer fins-de-semana”, como consta do ponto 14.º dos factos provados.
Como tal, altera-se a redacção deste segmento decisório, que passará a ser a seguinte:
Ponto 14: O pai nem sempre acede na troca de fins-de-semana.
Relatou ainda a mesma testemunha ter o BB, quando estava com o pai, efectuado um RX, no hospital, a um pé, facto de que a sua progenitora só tomou conhecimento através de contacto do próprio hospital, o que se verificou quando estava junto da depoente, vindo, mais tarde, pelo próprio BB, a inteira-se do que acontecera.
Também o marido da testemunha, GG, padrinho do menor, esclareceu que numa ocasião em que se achavam a jogar futebol, informou-o o BB que se achava lesionado num pé.
A testemunha EE, tia da progenitora do BB, que, até Fevereiro de 2022, prestou para o progenitor do menor, em casa deste, serviços de limpeza, com carácter regular, mencionou que, estando em casa da sobrinha, viu algumas vezes esta ligar para o pai do BB para falar com o filho ou saber do mesmo, designadamente em alturas em que este estava doente, sem que o apelante atendesse as chamadas, facto também confirmado pelo depoimento das testemunhas GG e FF, irmã da progenitora e madrinha do BB.
As testemunhas DD e GG referiram ainda que numa altura em que encontraram o afilhado BB na companhia do pai, aquele evitou cumprimentá-los, apesar do relacionamento afectuoso que mantém com os mesmos. Relataram ainda as mesmas testemunhas que o BB está muito feliz com o nascimento da sua irmã – filha da progenitora de ambos e do marido da mesma -, evitando, contudo, revelá-lo ao pai.
A testemunha EE mencionou que, enquanto trabalhou em casa do pai do BB, se deparou, por diversas vezes, com uma arma de fogo, acessível a qualquer pessoa que se encontrasse no interior da habitação, facto que a incomodou, tendo chegado a advertir o avô paterno do BB que se voltasse a encontrar a arma deixaria de prestar serviços de limpeza na habitação. Ainda de acordo com o depoimento da mesma testemunha, não existe em casa do pai do BB qualquer cofre onde possa ser guardada a arma.
JJ, avô paterno do BB, e residente com o pai deste, esclareceu que o neto costuma frequentar a catequese, não sabendo precisar se o faz com assiduidade, confirmando a testemunha EE que constatou que o pai, pelo menos uma vez, foi buscar o filho à catequese.
A testemunha DD referiu ter tomado conhecimento, pela própria mãe do BB, que contactou o progenitor daquele para saber se o mesmo autorizava que o filho comparecesse à cerimónia do Pai Nosso, no fim de semana que coincidia com o dia do pai, não obteve dele qualquer resposta. Tratando-se de depoimento indirecto, sem confirmação através de outro meio de prova, o mesmo não poderá fundamentar resposta positiva à última parte do ponto 27.º.
Deste modo, deve considerar-se não provada a matéria incluída no ponto 27.º (2.º), sendo a mesma eliminada dos factos provados.
Em conclusão: procede, parcialmente a impugnação da decisão relativa à matéria de facto, alterando-se a mesma quanto aos pontos 14.º e 27.º (2.º) nos termos antes afirmados, mantendo-se sem alteração a mesma decisão quanto aos demais segmentos impugnados.
2. Da aplicação do Direito aos factos apurados.
Segundo o n.º 1 do artigo 1878.º do Código Civil, “compete aos pais, no interesse dos filhos, velar pela segurança e saúde destes, prover ao seu sustento, dirigir a sua educação, representá-los, ainda que nascituros, e administrar os seus bens”.
Deste preceito decorre que as responsabilidades parentais devem ser exercidas na prossecução do “interesse dos filhos”, e nos casos em que é demandada a intervenção do poder judicial, este deve decidir assegurando igualmente o interesse do menor, ainda que o faça em prejuízo dos pais ou de terceiros[6].
As responsabilidades parentais constituem uma resposta, a dar por quem está mais próximo da criança e por isso também melhor habilitado a conhecer as suas necessidades, a uma situação de imaturidade (física, emocional, psíquica) decorrente da menoridade.
Cabe, assim, aos pais, em primeira linha, desempenhar esse papel protectivo, exercendo os poderes funcionais que integram as responsabilidades parentais, zelando pelo desenvolvimento integral da criança, proporcionando-lhe alimentação, afecto, condições de saúde, de educação, de segurança, promovendo a sua autonomia e independência.
Como é afirmado por Filipa Daniela Ramos de Carvalho[7], “o interesse do menor, embora se consubstancie numa dificuldade prática acrescida, resultante da indeterminação do critério, absorve ou deve absorver todas as orientações vertidas no Código Civil, nomeadamente os artigos 1878º (segurança, saúde, sustento e autonomia do menor), 1885º, nº1 (desenvolvimento físico, intelectual e moral dos filhos), 1878º, nº2 (opinião dos filhos). Outrossim, a natureza dos processos de regulação das responsabilidades parentais como processos de jurisdição voluntária atribuem ao juiz um papel fundamental na adequação, in casu, das orientações legais sobre o conteúdo do exercício das responsabilidades parentais e o critério do interesse do menor”, que, assim, conclui: “Deste modo, é da intercepção entre as orientações legais e das orientações jurisprudenciais que se alcança, paulatinamente, um conteúdo do conceito indeterminado em questão”.
Desde o Código Civil de 1967 várias foram as alterações introduzidas no ordenamento jurídico nacional quanto à regulação das ora designadas responsabilidades parentais, na tentativa de acompanhamento da evolução social ocorrida nas últimas décadas em Portugal, designadamente na concepção da família, sua estrutura e papel atribuído aos progenitores no âmbito das relações filiais.
Se em 1967 as funções assumidas por cada um dos progenitores eram pré-definidas e reguladas de forma estanque, a partir de 2008, com a reforma introduzida pela Lei n.º 61/2008, de 31 de Outubro, operou-se uma maior flexibilização na regulação das responsabilidades parentais e uma clara preocupação em igualizar e equilibrar as posições entre os progenitores e entre estes e os filhos, em casos de ruptura das relações afectivas dos primeiros.
No que especificamente concerne ao regime de guarda do filho menor – uma das vertentes das responsabilidades parentais -, os pretéritos artigos 1901.º e 1906.º do Código Civil previam que o exercício do então designado poder paternal cabia a ambos os pais, sem qualquer distinção, estabelecendo como regra, em caso de divórcio, separação judicial ou anulação do casamento, o regime de guarda única ou exclusiva do filho ao progenitor a quem aquele fosse confiado, posição mantida até à entrada em vigor da mencionada Lei n.º 61/2008[8].
A atribuição da guarda física do filho menor e a definição do respectivo regime constitui um dos pontos mais melindrosos da regulação das responsabilidades parentais, sendo ele foco de tensão e de conflito entre os progenitores que reclamam para si essa atribuição.
Constituindo a guarda única ou exclusiva o regime regra das responsabilidades parentais e dominando, embora cada vez menos, na jurisprudência dos tribunais portugueses preferência pela figura materna como destinatária dessa atribuição, constituía tal regime fonte de indiscutível desequilíbrio na posição de cada um dos progenitores em relação ao filhos, situação que se vem tendencialmente a desvanecer após a reforma de 2008.
Como dá conta Filipa Daniela Ramos de Carvalho[9], “...a evolução sócio-económica verificada nas últimas décadas nas sociedades modernas tem-se manifestado, no âmbito do Direito da Família, na assunção de uma ideia de igualdade entre os progenitores. Efectivamente, assiste-se à necessidade de definição de novos mecanismos e soluções que promovam a responsabilização, o comprometimento e a igualdade de ambos os progenitores na definição do respectivo regime de exercício das responsabilidades parentais. Outrossim, o surgimento do regime de exercício conjunto das responsabilidades parentais pretende, em certa medida, obviar a determinadas críticas que foram sendo feitas ao regime da guarda única ou exclusiva, nomeadamente ao progressivo e, em certos casos inevitável, corte de laços afectivos entre o progenitor não guardião e o seu filho. É, por conseguinte, uma ideia de desarmonia e de desequilíbrio entre os direitos/deveres de ambos os progenitores que consubstancia uma das principais críticas formuladas quanto ao regime de guarda única”.
De acordo com a mesma autora[10], “A guarda conjunta apresenta três modelos diferenciados: o exercício conjunto com fixação da residência principal da criança com um dos progenitores, que foi o sistema introduzido pela Lei n.º 61/2008; o exercício conjunto com residência alternada, também denominada guarda alternada, onde os progenitores para além da responsabilidade de tomar, conjuntamente, determinadas decisões de importância extrema em relação ao seu filho, detêm igualmente o direito a permanecer com a criança alternadamente por determinados períodos de tempo, não sendo determinada uma residência habitual do menor, já que este viverá entre a residência de um e de outro; e, finalmente, o chamado “Birds´Nest Arrangement” onde se mantém a alternatividade do modelo anterior, mas ao invés de serem os filhos a viverem de tempos a tempos em casa de cada um dos progenitores, aqui são estes que vão viver determinados períodos de tempo na casa de morada de família onde os menores continuaram a viver desde a separação ou divórcio dos seus progenitores”.
Para Maria Clara Sottomayor[11], “A guarda conjunta física, implicando uma divisão da responsabilidade quotidiana pelos dois pais, evita a fadiga psicológica e emotiva geralmente sentida pela mãe, quando é a única a cuidar da criança e a exercer o poder paternal.
Diz-se ainda que a igualização dos direitos e responsabilidades dos pais diminui a conflitualidade e encoraja a cooperação entre estes, pois, deixa de haver um perdedor e um vencedor, o que reduz a tentativa de denegrir a imagem um do outro através de acusações mútuas. Por outro lado, mesmo que num período inicial subsista alguma conflitualidade entre os pais estes tendem, com a passagem do tempo, a ultrapassarem os seus conflitos, adaptando-se à nova situação e relacionando-se de uma forma pragmática.
Diferentemente, os opositores da guarda conjunta afirmam que esta, quando envolve alternância de residências, provoca à criança uma grande instabilidade, sensações de ansiedade e de insegurança. O contacto com ambos os pais é susceptível de gerar conflitos de lealdade na criança, tentativas de manipulação dos pais, problemas de disciplina, devido à exposição destes a diferentes modelos de educação e de estilos de vida. Alguns autores salientam ainda que a guarda conjunta física faz a criança viver uma fantasia de reconciliação dos pais, dificultando a sua adaptação ao divórcio daqueles”.
Tomé D´Almeida Ramião[12], divergindo embora da imposição do regime regra actual de guarda conjunta, admite as vantagens da sua aplicação em situações em que ocorra um bom relacionamento e fácil comunicação entre os pais, o que, entre o mais, pressupõe identidade de estilos de vida e projectos educativos para o filho; de contrário, será fonte de tensão e potenciador de um agravamento da conflitualidade já existente entre os progenitores.
Só uma visão idílica permitirá conceber que a guarda conjunta constitui remédio para todas as consequências nefastas desencadeadas pela separação dos progenitores. Constitui, no entanto, solução que permite uma mais ampla paridade no desempenho das funções parentais por ambos os progenitores, constituindo meio de incentivo a uma maior cooperação entre os pais e sua responsabilização pelo processo de desenvolvimento dos filhos menores.
Não tem sido inteiramente consensual o entendimento na jurisprudência quanto à admissibilidade e vantagens do regime de guarda conjunta com alternância de residência da criança.
Assim:
No sentido de fazer depender do acordo dos pais um regime dessa natureza pronunciaram-se, entre outros, os acórdãos da Relação de Lisboa de 20.10.2010, processo n.º 134/04.2TBOVR-C e de 14 de Fevereiro de 2015, processo n.º 1463/14.2TBCSC, e acórdão da Relação de Coimbra de 6 de Outubro de 2015, processo n.º 1009/11.4TBFIG-A.C1, todos em www.dgsi.pt.
Diferentemente se pronunciou o acórdão da Relação de Lisboa de 7 de Agosto de 2017 - processo n.º 835/17.5T8SXL-A, www.dgsi.pt- ao sustentar que “no exercício em comum das responsabilidades parentais relativas às questões de particular importância para a vida do filho, os pais podem estar em desacordo quanto à residência do filho; nesse caso o tribunal decidirá a questão da residência de acordo com o interesse do filho tendo em conta todas as circunstâncias relevantes.
A decisão, quer provisória, quer definitiva, pode ser, se isso for do interesse do filho, a da residência alternada com cada um dos pais por um certo período de tempo, sendo as responsabilidades parentais relativas aos actos da vida corrente do filho exercidas por aquele dos pais com quem o filho estiver a residir nesses períodos”.
Dispõe hoje o artigo 1906.º do Código Civil:
1 - As responsabilidades parentais relativas às questões de particular importância para a vida do filho são exercidas em comum por ambos os progenitores nos termos que vigoravam na constância do matrimónio, salvo nos casos de urgência manifesta, em que qualquer dos progenitores pode agir sozinho, devendo prestar informações ao outro logo que possível.
2 - Quando o exercício em comum das responsabilidades parentais relativas às questões de particular importância para a vida do filho for julgado contrário aos interesses deste, deve o tribunal, através de decisão fundamentada, determinar que essas responsabilidades sejam exercidas por um dos progenitores.
3 - O exercício das responsabilidades parentais relativas aos actos da vida corrente do filho cabe ao progenitor com quem ele reside habitualmente, ou ao progenitor com quem ele se encontra temporariamente; porém, este último, ao exercer as suas responsabilidades, não deve contrariar as orientações educativas mais relevantes, tal como elas são definidas pelo progenitor com quem o filho reside habitualmente.
4 - O progenitor a quem cabe o exercício das responsabilidades parentais relativas aos actos da vida corrente pode exercê-las por si ou delegar o seu exercício.
5 - O tribunal determinará a residência do filho e os direitos de visita de acordo com o interesse deste, tendo em atenção todas as circunstâncias relevantes, designadamente o eventual acordo dos pais e a disponibilidade manifestada por cada um deles para promover relações habituais do filho com o outro.
6 - Ao progenitor que não exerça, no todo ou em parte, as responsabilidades parentais assiste o direito de ser informado sobre o modo do seu exercício, designadamente sobre a educação e as condições de vida do filho.
7 - O tribunal decidirá sempre de harmonia com o interesse do menor, incluindo o de manter uma relação de grande proximidade com os dois progenitores, promovendo e aceitando acordos ou tomando decisões que favoreçam amplas oportunidades de contacto com ambos e de partilha de responsabilidades entre eles.
A Lei n.º 61/2008 veio, no domínio da guarda do filho, inverter a posição quanto ao regime regra até então vigente. Como se retira da exposição dos motivos da mencionada Lei, “isso aconteceu por terem sido verificados os efeitos perversos da guarda única, nomeadamente pela tendência de maior afastamento dos pais homens do exercício das suas responsabilidades parentais e correlativa fragilização do relacionamento afectivo com os seus filhos [...]”. Concluindo, assim, que “impõe-se o exercício conjunto das responsabilidades parentais, salvo quando o tribunal entender que esse regime é contrário aos interesses do filho”.
Segundo o artigo 42.º do RGPTC, “Quando o acordo ou a decisão final não sejam cumpridos por ambos os pais ou por terceira pessoa a quem a criança haja sido confiada, ou quando circunstâncias supervenientes tornem necessário alterar o que estiver estabelecido, qualquer um dele ou o Ministério Público podem requerer ao tribunal, que no momento for territorialmente competente, nova regulação do exercício das responsabilidades parentais”.
A regulação das responsabilidades parentais pode, assim, ser alterada, designadamente, quando circunstâncias supervenientes o imponham ou aconselhem, sempre, todavia, na salvaguarda do interesse da criança.
No caso em apreço, no âmbito do processo de regulação do exercício das responsabilidades parentais relativo ao menor BB, aquando do divórcio dos seus progenitores acordaram estes em fixar um regime de visitas livre.
Mais tarde, no ano de 2020, o progenitor, ora recorrente, propôs acção de alteração das responsabilidades parentais com o propósito de vir a ser estabelecido um regime de guarda partilhada, sem que, todavia, lograsse obter tal objectivo.
No processo principal foi, no mesmo ano, outorgado minucioso acordo relativo às responsabilidade parentais do BB, mantendo-se a residência deste com a sua progenitora.
Uma vez mais, veio o progenitor instaurar processo de alteração das responsabilidades parentais relativamente ao filho BB, pretendendo com este procedimento a fixação de um regime de guarda partilhada e residência alternada, de forma a que o mesmo passe o período de uma semana completa com cada um dos progenitores.
Fundamenta o pedido de alteração proposto em circunstâncias supervenientes que reconduz ao facto de o menor manifestar vontade de estar mais tempo na companhia do pai e no facto de este dispor em sua casa de um quarto próprio para o filho.
Quanto à primeira daqueles circunstâncias invocadas, não resultou nos autos demonstrado que o BB manifeste vontade de passar mais tempo com o pai, não sendo razão suficiente para justificar a pretendida alteração a circunstância da criança dispor de quarto próprio em casa do progenitor.
E tal como refere a sentença recorrida, “verifica-se que o BB se encontra a residir com a progenitora, mantendo convívio regular com o progenitor e é, neste contexto, uma criança feliz, bem integrada na família, na escola e em outros contextos sociais, apresentando bom aproveitamento escolar.
A criança detém uma relação de vinculação securizante com ambos os progenitores e beneficia ainda de convívio próximo e retaguarda de membros da família alargada.
Não evidencia qualquer problema de higiene ou outra deficiência digna de nota na prestação dos necessários cuidados básicos por parte de qualquer dos progenitores.
Dir-se-ia então que nada obstaria à implementação da residência alternada.
Contudo, não se nos afigura, salvo melhor opinião, que possa concluir-se nesse sentido.
Com efeito, a ausência de comunicação e de prestação de informações entre os progenitores, no caso dos autos, assume proporções tais que se revelam prejudiciais ao superior interesse da criança. Com efeito, não pode deixar de considerar-se que assim é se a mãe não obtém, mesmo após procurar contactar o pai, as necessárias informações sobre a saúde do filho, de modo a, por seu turno, prosseguir com a adequada prestação a este dos cuidados que se revelem pertinentes.
Também se conclui nesse sentido na medida em que o progenitor não considera necessário fornecer resposta a solicitações da progenitora em situações como sejam a participação, ou não, da criança, em festa religiosa inserida na actividade da catequese, que o BB frequenta, ficando este, a poucos dias do evento, sem saber se nele irá participar ou não, o que, objectivamente, é de molde a provocar instabilidade na criança.
Importa ainda considerar que, não obstante haja logrado adaptar a sua residência de modo a proporcionar um quarto para o filho, ainda assim tal contexto não se mostra suficientemente organizado em termos de evitar a existência de uma arma de fogo que poderá ser acessível ao menor, com os inerentes e conhecidos perigos.
Finalmente, não obstante mantenha boa relação com o progenitor, tal relação não é, ainda assim, de molde a proporcionar ao BB a segurança necessária para cumprimentar amigos e familiares maternos quando está acompanhado do pai, o que demonstra que este não logra diligenciar pela eliminação do conflito de lealdade em que o filho se encontra colocado, conflito igualmente manifestado no receio revelado pelo BB de contar ao pai sobre o nascimento da irmã. Ora tal situação de conflito de lealdade (a que acresce o decorrente da relação com o padrasto), naturalmente, é situação propiciadora de danos ao bem-estar psicológico da criança.
Neste ponto, afigura-se que haverá ainda um caminho a percorrer para que o progenitor efectivamente priorize o superior interesse do BB”. Longo caminho, ousaríamos mesmo acrescentar...
Se a guarda conjunta e a residência alternada se revelam vantajosas na prossecução dos interesses da criança quando os pais mantêm entre si uma relação cordial e dialogante, e estes revelam maturidade emocional bastante para priorizarem o bem estar, físico e psicológico, do filho, inexistindo essa capacidade de diálogo e de colaboração entre os pais, do estabelecimento de um tal regime pode não só não resultar quaisquer vantagens para a criança, como, até, revelar-se prejudicial aos seus interesses.
Ora, no caso aqui em debate não só essa ausência de diálogo e de colaboração entre os progenitores se manifesta de forma gritante - designadamente a ponto de o progenitor se recusar a atender o telefone, ou a devolver chamadas à mãe, designadamente, nas férias grandes, impedindo esta de, por vários dias, obter notícias do filho, ou, em fim de semana passado pelo BB na companhia do pai, em que a mãe foi impedida de manter qualquer contacto com o filho, apesar deste se achar doente -, como o progenitor nem sequer mostra capacidade para avaliar as consequências negativas desse seu comportamento para o menor, minimizando aquele o impacto da ausência de contacto telefónicos cuja responsabilidade atribui à progenitora face à ausência de privacidade com o filho aquando de tais chamadas.
Ora, perante um quadro factual como o que resultou comprovado nos autos a guarda conjunta, com residência alternada do menor BB, não só não evidencia quaisquer benefícios para este, como, pelo contrário, se antevê prejudicial aos seus interesses, sendo antes factor de destabilização e de perturbação do seu desenvolvimento, que até hoje se tem processado de forma harmoniosa e equilibrada.
Nenhum reparo merece, pois, a sentença recorrida, que, por isso, se mantém, improcedendo o recurso.
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Síntese conclusiva:
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Pelo exposto, acordam os juízes desta Relação, na improcedência da apelação, em confirmar a sentença recorrida.

Custas da apelação: pelo recorrente.


[Acórdão elaborado pela primeira signatária com recurso a meios informáticos]


Porto, 11.01.2024
Judite Pires
Paulo Dias da Silva
António Paulo de Vasconcelos
__________________
[1] “Recursos no Novo Código de Processo Civil”, 2013, Almedina, pág. 224 e 225.
[2] Artigos 396º do C.C. e 607º, nº5 do Novo Código de Processo Civil.
[3] Abrantes Geraldes, “Temas da Reforma do Processo Civil”, vol. II, 1997, pág. 258. Cfr. ainda, o Acódão Relação de Coimbra de 11.03.2003, C.J., Ano XXVIII, T.V., pág. 63 e o Ac. do STJ de 20.09.2005, proferido no processo 05A2007, www.dgsi.pt, podendo extrair-se deste último: “De salientar a este propósito, como se faz no acórdão recorrido, que o controlo de facto em sede de recurso, tendo por base a gravação e/ou transcrição dos depoimentos prestados em audiência não pode aniquilar (até pela própria natureza das coisas) a livre apreciação da prova do julgador, construída dialecticamente na base da imediação e da oralidade.
Na verdade, a convicção do tribunal é construída dialecticamente, para além dos dados objectivos fornecidos pelos documentos e outras provas constituídas, também pela análise conjugada das declarações e depoimentos, em função das razões de ciência, das certezas e ainda das lacunas, contradições, hesitações, inflexões de voz, (im) parcialidade, serenidade, "olhares de súplica" para alguns dos presentes, "linguagem silenciosa e do comportamento", coerência do raciocínio e de atitude, seriedade e sentido de responsabilidade manifestados, coincidências e inverosimilhanças que, por ventura transpareçam em audiência, das mesmas declarações e depoimentos (sobre a comunicação interpessoal, RICCI BOTTI/BRUNA ZANI, A Comunicação como Processo Social, Editorial Estampa, Lisboa, 1997)”.
[4] Anselmo de Castro, “Direito Processual Civil”, Vol. 3º, pág. 173 e L. Freitas, “Introdução ao Processo Civil”, 1ª Ed., pág. 15 7.ve
[5] Processo nº 5797/04.2TVLSB.L1-7, l1-7, www.dgsi.pt.
[6] Cfr. Acórdão desta Relação, 19.04.88, C.J., tomo II, pág. 68.
[7] “A (Síndrome de) Alienação Parental e o Exercício das Responsabilidades Parentais: Algumas Considerações”, Coimbra Editora.
[8] Se bem que as reformas de 1995 e de 1999, introduzidas, respectivamente, pelas Leis n.ºs 84/95, de 31 de Agosto e 59/99, de 30 de Junho, já consentissem um regime de exercício conjunto do poder paternal, desde que os progenitores nisso anuíssem.
[9] Obra citada, págs. 101 a 108.
[10] Obra citada, pág. 104, nota 109.
[11] “Regulação do Exercício das Responsabilidades Parentais nos Casos de Divórcio”, 6.ª edição. Almedina, 2014, págs. 253-254.
[12] “O Divórcio e Questões Conexas – Regime Jurídico Actual”, Quid Juris, 2009, pág. 144.