Acórdão do Tribunal da Relação do Porto | |||
Processo: |
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Nº Convencional: | JTRP000 | ||
Relator: | JOSÉ EUSÉBIO ALMEIDA | ||
Descritores: | CONDOMÍNIO DANOS CAUSADOS POR COISAS RESPONSABILIDADE CIVIL | ||
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Nº do Documento: | RP202310235609/18.3T8MTS.P1 | ||
Data do Acordão: | 10/23/2023 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Texto Integral: | S | ||
Privacidade: | 1 | ||
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Meio Processual: | APELAÇÃO | ||
Decisão: | RECURSO IMPROCEDENTE | ||
Indicações Eventuais: | 5ª SECÇÃO | ||
Área Temática: | . | ||
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Sumário: | I - Na definição do âmbito aplicativo do artigo 493 n.º 1 do CC, deve entender-se que o proprietário é possuidor e, por isso, responsável pela vigilância da coisa, a menos que, independentemente da sua qualidade de proprietário, que eventualmente mantenha, se demonstre que tenha perdido, para outrem, o efetivo controlo dessa coisa. II – O artigo 483 do CC pressupõe uma ação ou omissão causal de um dano e, no caso, a ação ou omissão (no caso omissão) só pode ser imputada à administração do Condomínio, e não a este, pois não há que confundir as duas entidades e nem se vislumbra, não estando em causa qualquer deliberação do Condomínio, como poderia imputar-se a este a violação do direito de outrem, omitindo tal, e eventual, imputação a quem administra. III – Resultando da factualidade que esta em causa a violação de um dever funcional, a mesma só pode ser assacada à administração e não à entidade Condomínio. | ||
Reclamações: | |||
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Decisão Texto Integral: | Processo n.º 5609/18.3T8MTS.P1 Recorrentes – AA e BB Recorridos - Herança Ilíquida aberta por óbito de CC e outros Relator: José Eusébio Almeida; Adjuntas: Ana Paula Amorim e Teresa Fonseca. Acordam na 3.ª Secção Cível (5.ª Secção) do Tribunal da Relação do Porto: I - Relatório Herança Ilíquida aberta por óbito de CC, representada pela sua cabeça de casal DD, EE e mulher FF instauraram a presente ação contra AA e BB e (contra) o Condomínio do Edifício ..., representado pela sua administração A..., SA, pedindo: 1 - a condenação dos primeiros réus a realizar, no prazo máximo de 30 dias após o transito em julgado da sentença e a suas exclusivas expensas, todas as obras de construção no interior da fração autónoma designada pela letra “K” e melhor identificada no artigo 9.º da petição, que sejam necessárias e adequadas a reparar a canalização interna de abastecimento de água daquela sua fração autónoma e ainda a implementar todas as medidas técnicas necessárias a eliminar a ocorrência de infiltrações de água no interior da fração autónoma inferior designada pela letra “I” e pertencente à primeira coautora, e melhor identificada no artigo 3.º da petição[1]; 2 - a condenação solidária dos réus a pagar à primeira coautora, a quantia de 8.064,25€ (posteriormente ampliada para 10.151,30€), para ressarcimento de todos os danos materiais por si sofridos no interior da sua casa de habitação, nos termos alegados nos artigos 15.º a 49.º da petição; 3 - a condenação solidária dos réus a pagar aos segundos coautores a quantia de 5.000,00€ para ressarcimento de todos os danos patrimoniais e não patrimoniais por estes sofridos e alegados nos artigos 50.º a 68.º da petição; 4 - a condenação solidária dos primeiros corréus numa sanção pecuniária compulsória no montante de 80,00€ por cada dia de atraso no cumprimento da sentença que venha a ser proferida; 5 - a condenação solidária dos réus a pagar juros de mora calculados à taxa supletiva legal de 4% a contar da citação e até efetivo e integral das quantias a que venham a ser condenados. Fundamentando as suas pretensões, vieram alegar que, a herança é dona da fração autónoma “I”, correspondente ao 1.º andar esquerdo do edifício poente do “Edifício ...”, sito na rua ..., n.ºs ... e ... e Estrada ..., ..., ..., Matosinhos, fração que, desde 15.01.2006, se encontra comodatada pela cabeça de casal e seu falecido marido aos segundo e terceiro coautores (EE e FF), que nela têm vindo a residir com as suas duas filhas menores. Por sua vez, os primeiros corréus são donos da fração “K”, que constitui o 2.º andar esquerdo do mesmo prédio, imediatamente por cima da fração habitada por aqueles coautores, e cujo condomínio é administrado pela sociedade A..., SA. Em data não apurada do final de 2016, começaram a detetar o surgimento de infiltrações de água no interior da sua habitação e a observar várias manchas no teto e paredes do corredor de acesso à cozinha e lavandaria bem como no interior do roupeiro existente no mesmo corredor, que se foram agravando e alastrando, tendo comunicado essa situação à administradora do condomínio, que participou o sinistro à Companhia de Seguros B... com a qual o condomínio havia celebrado um contrato de seguro multirriscos, que garantia todo e qualquer dano, quer nas zonas comuns quer nas frações. No âmbito de peritagem realizada a 29.12.2016 por ordem da seguradora, foi detetado uma fuga na rede interna de abastecimento de água na fração “K”, pelo que a seguradora autorizou que os réus realizassem trabalhos de pesquisa na rede de abastecimento de água da sua habitação de modo a que se apurasse o local exato da rotura e cessassem as infiltrações. Nos termos solicitados pela seguradora, os primeiros corréus diligenciaram também pela obtenção de dois orçamentos que remeteram à seguradora, que aceitou a responsabilidade do sinistro e procedeu ao pagamento da quantia de 750,00€ ao réu condomínio, quantia equivalente ao valor de um dos orçamentos, mas que não foi entregue aos autores e nem a reparação da fuga e danos da sua fração foi efetuada, pelo que os danos se agravaram pelo decurso do tempo. Como consequência, os segundos coautores têm vivido verdadeiros tormentos, pois que a situação tem causado graves problemas respiratórios à coautora FF que padece de asma crónica e causa bastante ansiedade e sofrimento aos segundos coautores, pois veem a sua habitação deteriorar-se. Por outro lado, todo o comportamento dos réus causa grande consternação e tristeza aos autores, uma vez que não vislumbram quando terão a habitação reparada e eles e os filhos menores têm de recorrer por várias vezes a ajuda médica para poder debelar problemas respiratórios que têm frequentemente vindo a surgir, sentindo-se ainda profundamente defraudados e injustiçados; inclusivamente, esta situação interfere com sua saúde não só mental como física. Devidamente citados, quer os primeiros réus quer o segundo vieram contestar. Os primeiros réus, em sede questão previa, alegam que, embora em termos registais a fração esteja inscrita em nome de ambos, foi adquirida com fundos próprios da ré, que esta divorciada desde 1997 e só ela habita a fração. Impugnando, sustenta que a rede de abastecimento de água da sua habitação não padeceu nem padece de qualquer rotura e não existe qualquer evidência física dessa “rotura”. De resto, confiou que o assunto estaria resolvido com a sua intervenção e com a participação ao seguro efetuada pelo réu Condomínio na sequência das queixas dos autores, franqueou a sua porta para a entrada do perito da Seguradora, cuidou de obter dois orçamentos, que lhe foram solicitados pela administração do condomínio e pediu insistentes esclarecimentos a este acerca da solução e decisão da Seguradora e só agora soube que os autores não terão aceitado os termos dessa solução, recusando receber o montante indemnizatório arbitrado pela Seguradora. Alega que, de qualquer modo, o quadro traçado pelos autores se apresenta hiperbolizado quanto às causas e quanto aos danos, sendo que parte destes, a existirem, radicarão em infiltrações de humidade comprovadamente originárias de fachadas e infraestruturas comuns do prédio, cuja resolução foi (parcialmente) alcançada, com obras na fachada e coberturas do prédio (partes comuns desse), situação que é conhecida de todos os condóminos e que os autores omitem. Mais alegam que, no caso de proceder a pretensão dos autores contra si formulada, terá (a ré) direito de regresso sobre a Seguradora (Companhia de Seguros B..., SA) pois tinha transferido para esta, à data dos factos, os riscos, e a cobertura da obrigação indemnizatória pela apólice n.º ..., apólice que foi cancelada/ transferida para outra Seguradora em 1.02.2017 - cujas coberturas abrangem não só as partes comuns do prédio urbano, como todas as frações autónomas que o integram como ainda os riscos por danos por água. Requereu, em conformidade, a intervenção provocada dessa Companhia de Seguros. O segundo réu, a título prévio, informa que desde 12.11.2018 é representado pela empresa C... Lda., empresa que foi eleita para administrar as partes comuns do edifício até dezembro de 2019, e veio defender-se por exceção, alegando a sua ilegitimidade passiva na medida em que são os próprios autores a confirmar que a origem da infiltração de água na sua fração advém da rede interna de água da fração “K” titulada pelos primeiros réus. Sem prescindir, alega que promoveu a participação do sinistro em causa porque existe um seguro coletivo, cujo tomador é o condomínio, mas que abrange igualmente o interior das frações, tendo-o feito unicamente com o fim de colaborar com os condóminos, no sentido de agilizar a resolução do problema, sem que se lhe possa imputar qualquer responsabilidade. Pelo facto de ser o Condomínio o tomador do seguro, foi quem recebeu o montante de 750,00€, pagos a título de indemnização relativa ao sinistro. O período de tempo que mediou entre o momento da transferência para a conta bancária do Condomínio e o momento em que este logrou informar os autores, deveu-se ao facto de a transferência não ter sido identificada de imediato, só identificada aquando da conferência bancária pela gestora do condomínio (GG), que assim que se apercebeu se deslocou ao estabelecimento dos autores dando conta da existência desse montante na posse do Condomínio e da sua intenção de entrega, que estes recusaram receber e depois devolveram o cheque que lhes foi enviado. Os autores apresentaram resposta espontânea às exceções invocadas pelos primeiros réus, alegando que ambos são proprietários da fração K, conforme resulta do registo. Acrescentaram que os danos inicialmente de pequena dimensão foram-se alastrando e esse facto foi sucessivamente comunicado à ré AA e os danos provenientes das infiltrações de água provenientes das fachadas do edifício apenas se verificaram nas paredes das divisões que confinavam com a fachada do edifício sendo certo que todas as fachadas foram integralmente reparadas e os danos nos interiores das habitações eliminados. Declaram não se oporem à intervenção provocada da Companhia de Seguros. Mais respondem à exceção de ilegitimidade invocada pelo réu Condomínio, porquanto, de harmonia com o foi alegado ocorreu um agravamento dos danos decorrente da demora da realização dos trabalhos de reparação, para a qual contribuiu a atuação do segundo corréu, que recebeu o montante necessário à realização dos trabalhos de pesquisa em março de 2017 e não só não realizou qualquer obra como guardou para si o dinheiro recebido, e apenas se dispôs a entrega-lo aos autores em 15.03.2018. Recusaram o pagamento de tal importância por entenderem, e de forma sustentada e justificada, que tal montante pecuniário proposto não é suficiente para reparar a canalização danificada bem como o interior da sua casa de habitação. Por despacho de 27.02.2019 foi admitida a intervenção acessória da Companhia de Seguros B..., SA, a qual, citada, veio invocar a ilegitimidade ativa dos autores, designadamente porque a herança ilíquida não tem personalidade judiciária, é apenas representada pela cabeça de casal e da habilitação junta constata-se que existem outros herdeiros. Confirma a celebração de um contrato de seguro com o condomínio e entre as coberturas contratadas encontrava-se as designadas por “danos por água”, pelo capital de 4.432.871,58€ e por “responsabilidade civil cruzada”, pelo capital de 25.000,00€ por sinistro e anuidade. Confirma a participação do sinistro pelo réu Condomínio, ter encarregue empresa para proceder à averiguação do sinistro e determinar os prejuízos. Tendo concluído que a quantia de 750,00€ se mostrava adequada aos danos, no dia 3.03.2017, remeteu um cheque indemnizando integralmente tomador de seguro /segurado. Sucede que, em 12.02.2018, cerca de um ano após o aludido pagamento, foi surpreendida pela mensagem de correio eletrónico da A..., Lda. através da qual solicitava informação relativamente ao valor indemnizado qual a repartição do mesmo pelas frações intervenientes no processo, tendo respondido que a verba de 750,00€ correspondia nos termos apurados pela averiguadora, concretamente: 550,00€ para pesquisa e reparação de rotura da fração 2.º Esq. Poente; 100,00€ para pintura do teto do corredor da fração 1.º Est. Poente; 100,00€ para pintura da porta do corredor da fração 1.º Est. Poente. Em resposta, vieram os autores alegar que a ação é intentada de modo a fazer cessar o agravamento de um dano que vem ocorrendo num bem imóvel pertencente à herança que por isso constitui, o exercício de atos de administração, que constitui obrigação do cabeça de casal nos termos da alínea b) do n.º 1 do artigo 2086, a contrario. Vieram ainda os autores requerer a inutilidade superveniente da lide quanto ao primeiro pedido, porque os primeiros corréus repararam a canalização interna da sua casa. Mais requereram a ampliação do pedido formulado em 2, alegando que, em consequência da agravação dos danos, e pediram a condenação solidária dos réus a pagar-lhes a quantia de 10.151,30€ acrescido de IVA calculado à taxa legal em vigor. A Companhia de Seguros veio reiterar o alegado na contestação, salientando que não lhe é oponível que nenhuma ação tenha sido efetuada pelo seu segurado nem tendo poderes para impor a reparação a terceiros. Os primeiros réus afirmaram nada opor à constatação da inutilidade superveniente da lide quanto ao primeiro pedido formulado pelos autores. Por despacho de 26.09.2019 foi admitida a ampliação do pedido e foi proferido despacho saneador, pelo qual se julgou o réu condomínio parte legítima, e atenta a habilitação notarial junta nas fls. 20 e 21 e a conclusão de que a herança já foi aceite, foram os autores convidados a sanar a ilegitimidade da autora, desacompanhada de todos os herdeiros. Por requerimento de 12.10.2019 vieram os herdeiros HH e II deduzir incidente de intervenção espontânea pelo qual declaram antecipadamente aderir à petição inicial, réplica e respostas apresentadas pela autora herança. Por despacho de 18.11.2019 foi liminarmente admitida tal intervenção e notificadas as partes primitivas nos termos e para os efeitos previstos no artigo 315.º, n.º 1 do Código de Processo Civil (CPC) e vieram todas as partes dar por integralmente reproduzidas o por si alegado em sede de contestação e demais articulados, sendo admitido o incidente de intervenção espontânea por despacho de 29.01.2020 e declarada sanada a ilegitimidade processual ativa. Completou-se o saneamento dos autos com a fixação do objeto do litígio e a enunciação dos temas da prova. Teve lugar a audiência de julgamento e foi proferida sentença. Nesta, em sede de questão prévia, constatando-se “uma inutilidade superveniente da lide” e declarou-se “a extinção da instância quanto ao o pedido formulado em 1. da petição inicial.” E, em sede de dispositivo, ficou decidido: “Em face do exposto, o Tribunal decide julgar a presente ação parcialmente procedente, por parcialmente provada e em consequência: 1. Absolver o 2.º Corréu Condomínio do Edifício ... dos pedidos contra si formulados pelos 1.ºs Coautores EE, e mulher FF. 2. Condenar os Réus AA a pagar aos 1.ºs Coautores EE, e mulher FF, a quantia de €10.151,30 (dez mil cento e cinquenta e um euros e trinta cêntimos), para ressarcimento de todos os danos materiais por si sofridos no interior da sua casa de habitação. 3. Condenar os 1.ºs Corréus AA a pagar aos 1.ºs Coautores EE, e mulher FF a quantia de € 3.000,00 (três mil euros) para ressarcimento de todos os danos patrimoniais e não patrimoniais por estes sofridos. 4. Absolver 1.º Corréus AA e 2.º Corréus Condomínio do Edifício ... do pedido de condenação numa sanção pecuniária compulsória no montante de € 80,00 por cada dia de atraso no cumprimento da douta sentença que venha a ser proferida nos presente autos”. II – Do Recurso Inconformados com o decidido, os primeiros réus vieram recorrer. Pretendem, tal como referem na parte final das suas conclusões, que, revogando-se a sentença, seja proferida decisão “absolutória do corréu BB, em suprimento da omissão de pronúncia quanto a esse” e “acórdão pelo qual seja a condenação da ré recorrente expurgada da condenação por danos patrimoniais e não patrimoniais operada, por serem esses exclusivamente imputáveis ao Condomínio, devendo este ser igualmente condenado solidariamente à reparação dos danos comprovadamente verificados na esfera dos autores, por lhe serem exclusivamente imputáveis a duração e o agravamento de tais danos, e a falta da sua reparação atempada”. Para tanto formula as seguintes Conclusões: 1 - Vem o presente recurso interposto da sentença, reconduzindo-se o inconformismo dos recorrentes com o teor daquela, e a motivação deste recurso a três aspetos fundamentais. 2 - Os recorrentes reproduziram integralmente, no contexto destas alegações, a factualidade dada como provada – acervo factual que, com especial ênfase nos pontos 6, 11, 16 a 23, 29 a 32, 48, e 51 a 54 dos factos provados, é essencial para balizar essas três vertentes da fundamentação e do mérito do recurso. 3 - A primeira dessas vertentes funda-se e radica na total ausência, na sentença, de qualquer menção, condenatória ou absolutória, ao corréu BB – relativamente ao qual se afirmou na contestação e se provou no julgamento ser “...falso, no que ao R. BB respeita ... tudo o que, de factualmente relevante, consta da douta p.i., no sentido de imputar ao mesmo qualquer intervenção, atuação ou omissão pessoal, relacionada com a matéria e fundamentos da presente ação.” 4 - Tal alegação é confirmada em 6) da factualidade dada como provada, e da motivação dessa prova, constante da sentença – sendo necessariamente em tributo a essa factualidade, e ao único entendimento possível sobre a mesma, que não foi feita na sentença, nem no segmento condenatório da mesma, qualquer menção ao réu BB, a quem não é de facto possível imputar qualquer responsabilidade pelos danos sofridos pelos autores. 5 - Impõe-se assim suprir – por via deste recurso, ou eventualmente ainda em primeira instância, a manifesta nulidade de que enferma a sentença ao omitir pronúncia expressa sobre a absolvição do corréu BB, 6 - Deixando-se aqui expressamente invocada a nulidade, quanto a esse aspeto – nulidade que se tem por claramente enquadrada na previsão legal do artigo 615, n.º 1, al. d), do C.P.C., e cujo suprimento se pede possa ter lugar nos termos disposto no artigo 617 do mesmo Código. ISTO POSTO, 7 - A sentença recorrida, subsumindo a situação dos autos à previsão legal do artigo 493 do Código Civil, e à presunção de culpa que dessa disposição emerge, vem a condenar e absolver em desconformidade com factualidade que se provou e foi dada como provada nesta ação – incorrendo em erro de julgamento ao imputar exclusivamente à ré recorrente a culpa dos danos invocados pelos autores, em desconsideração e mesmo contradição com os próprios fundamentos e pedidos formulados pelos mesmos. 8 - Na verdade, os pedidos formulados pelos autores, e principalmente os seus fundamentos, de facto e de direito – e só esses deverão balizar as consequentes condenações – são substancialmente diversos no que respeita ao Condomínio réu, e aos recorrentes. 9 - Porém, a sentença desconsidera totalmente a responsabilidade do Condomínio nos danos que os autores lograram provar, e no seu substancial agravamento – não chegando a pronunciar-se (senão conclusivamente), sobre os pedidos, e sobre os fundamentos desses, formulados pelos autores contra o Condomínio réu. 10 - Na perspetiva dos recorrentes a situação dos autos emerge primordialmente de uma sucessão infeliz de mal entendidos, para que foram determinantes a atuação e as omissões do réu Condomínio. 11 - Se vem nos autos reclamada dos recorrentes a reparação de uma fuga de água proveniente da sua habitação (relativamente a esse pedido se tendo depois verificado inutilidade superveniente), a reparação dos danos materiais causados por essa fuga de água, e ressarcimento de todos os danos patrimoniais e não patrimoniais sofridos pelos autores, em decorrência daquela fuga de água, e do seu prolongamento no tempo, 12 - Não pode ser escamoteado que iguais e solidárias obrigações de reparação e ressarcimento foram peticionadas do Condomínio réu, como cristalinamente consta da p. i., como se extrai de 79.º e 80.º da petição, 13 - Em que estes afirmam expressamente que “E o 2.º Corréu, enquanto tomador do seguro, recebeu o montante indemnizatório necessário à realização de tais trabalhos e ao invés de promover a execução de tais trabalhos, não informou nenhuma das partes e locupletou-se desse dinheiro sem que tivesse causa justificativa para o efeito ... E foi a sua inércia injustificada que causou graves prejuízos patrimoniais aos autores pois potenciou o agravamento dos danos sofridos”. 14 - Que assim foi de facto foi demonstrado e dado como provada nos autos – vejam-se os pontos 16, 19 a 23, 29 a 32 e 48 da factualidade dada como provada. 15 - Ora, o tribunal deixou de pronunciar-se, de todo, sobre os pedidos formulados pelos autores contra o Condomínio réu, nada refere e sobre a assumida, demonstrada e dada como provada responsabilidade desse na demora e agravamento dos danos sofridos pelos mesmos autores. 16 - Com efeito, estribando-se na “via facilitadora” da presunção de culpa atribuída aos recorrentes, em função da origem da fuga de água provada na sua fração, a sentença limita-se a enunciar a disciplina da administração do condomínio em propriedade horizontal, para assim deixar de avaliar e ponderar, condenando em conformidade, a responsabilidade objetiva do Condomínio na demora e no agravamento dos prejuízos dos autores - o que não pode ser, pois essa repartição de responsabilidades é manifesta no caso concreto! 17 - O seguro multirriscos contratado entre as partes destes autos e a chamada seguradora B... tem o efetivo teor do Doc. 1 apresentado com a contestação dos recorrentes, Apólice de Seguro n.º ..., contratada junto da chamada COMPANHIA DE SEGUROS B..., SA. 18 - O teor integral desse documento, aliás, deve ser aditado à a factualidade dada como provada – o que se pede e requer por via deste recurso – pois esse teor é essencial à descoberta da verdade, e tal documento não foi objeto de qualquer impugnação ou contradita. 19 - O tomador desse seguro multirriscos condomínio era o Condomínio réu – e o mesmo seguro, e todas as suas coberturas, abrangia as partes comuns, mas também todas as frações autónomas – o que vale por dizer que todas as partes intervenientes nesta acção estavam e estão seguras por aquela Apólice – ou seja, são segurados os autores, os recorrentes, e o próprio Condomínio, aqui assumindo especial pertinência as coberturas de “danos por água”, e de responsabilidade civil cruzada. 20 - Ou seja, sob qualquer ótica, seja por acionamento do seguro por parte dos autores, enquanto lesados pela fuga de água verificada na fração dos réus; seja por ação destes, como titulares da fração onde ocorrera a avaria – seria sempre à chamada B... que cumpriria custear a reparação da avaria e dos danos, fazendo as peritagens e averiguações de responsabilidade inerentes ao sinistro, e apontando a resolução desse. 21 - Ao Condomínio, enquanto tomador do seguro, cabia e coube o seu acionamento – por forma a obter por essa via ressarcimento dos restantes segurados, condóminos que lhe participaram e efetivamente confiaram a resolução do assunto. 22 - Porém, o Condomínio foi absolutamente negligente no cumprimento dessas obrigações – apesar de, conforme autores e os recorrentes expressamente alegaram, ambos terem confiado no, e ao, Condomínio o acionamento do seguro e a resolução do assunto. 23 - E tanto assim foi que a seguradora B... – mal embora, e na atuação de egoísta conveniência económica que é habitual neste tipo de situações – “resolveu” o sinistro pela forma mais expedita e barata que se lhe ofereceu, “concluindo” o processo com o pagamento de 750,00€ ao Condomínio – para entrega aos autores lesados. 24 - O Condomínio, ao invés de contestar essa atuação da B..., entregar o valor recebido aos autores, ou pelo menos dar conhecimento do sucedido aos autores e à recorrente, quedou-se inerte e silencioso entre 3.03.2017 e 21.03.2018. 25 - Nesse período, agravaram-se significativamente os danos sofridos pelos autores na sua habitação, como resulta da factualidade provada já atrás evidenciada. 26 - Assim, mal se compreende, e não se aceita, que a sentença, reconhecendo expressamente a responsabilidade do comportamento omissivo do Condomínio nos danos sofridos pelos autores, nenhuma consequência condenatória retire dessa responsabilidade, 27 - Sendo que a responsabilidade do Condomínio não se reconduzirá naturalmente aos “danos por água” cuja reparação o tribunal reconduz para a disciplina dos artigos 492 e 493 do Código Civil, 28 - Mas encontra pleno enquadramento no regime geral da responsabilidade por factos ilícitos, tal como consagrada nos arts. 483 e 486 do mesmo Código, 29 - Estando demonstrada e dada como provada nos autos a relação de direta causalidade entre a conduta e a omissão do Condomínio e os danos materiais – e, com especial ênfase, os danos patrimoniais e não patrimoniais, e o respetivo agravamento – sofridos pelos autores, que exclusivamente devem ser imputados ao Condomínio réu. 30 - Impõe-se, assim, que a condenação da sentença seja repartida entre o Condomínio e a recorrente, por forma a espelhar - a par da responsabilidade presumida que vem imputada a esta última, e que é inerente à demonstração do sinistro ocorrido na sua habitação – a responsabilidade civil por factos ilícitos que decorre da conduta negligente e omissiva que o mesmo Condomínio protagonizou, relativamente às suas obrigações de tomador do seguro que contratualizara com a chamada, e que, nessa qualidade, lhe cabia assumir e assegurar. 31 - Assinale-se que essa repartição de responsabilidade assume especial importância quando está em causa o acionamento de responsabilidade da seguradora chamada pelos “danos por água” verificados, mas também a cobertura da mesma apólice em sede de “responsabilidade civil cruzada”. 32 - Importa finalmente evidenciar, relativamente ao mérito do recurso, que a sentença – embora daí não retirando qualquer consequência cujo alcance seja percetível, e muito menos refletida no julgamento condenatório formulado - parece reconduzir a situação dos autos, e a apólice contratada com a chamada seguradora B..., ao mero “seguro de danos” – citando expressamente o Regime Jurídico do Contrato de Seguro, estatuído pelo Dec.-Lei n.º 72/2008, de 18.04. 33 - Porém, como está documentado e dado como provado, o Contrato de Seguro que justificou o chamamento da referida seguradora, e legitimará o exercício do direito de regresso que a recorrente seja forçada a exercitar, na (con)sequência da presente demanda, contempla a cobertura de “responsabilidade civil cruzada”, nos termos consignados na Apólice de Seguro documentada com a contestação da recorrente, e que se enquadra no disposto no artigo 137 e seguintes do Regime Jurídico do Contrato de Seguro. 34 - Pelo que deverão ser expurgadas, ou corretamente completadas, as asserções da sentença que enquadram a situação dos autos e a obrigação indemnizatória sentenciada à recorrente apenas no regime do simples “seguro por danos”, 35 - Remetendo exclusiva e expressamente para eventual ação de regresso que a recorrente tenha de exercitar contra a aqui chamada seguradora a discussão das coberturas e da concreta incidência do seguro contratado com aquela, à data do sinistro dos autos – tendo-se presente que a cobertura de “responsabilidade civil cruzada” assume especial relevância e utilidade em situações como a dos autos, em que um sinistro ocorre envolvendo segurados da mesma apólice. 36 - Por todo o exposto, e nos melhores de Direito que doutamente serão supridos, deve a sentença ser revogada, por ter, para além do mais atrás evidenciado, feito deficiente ou imprecisa interpretação e integração do disposto nos arts. 492, 493, 483 e 486, todos do Código Civil. Apenas a interveniente acessória respondeu ao recurso. Defendendo a sua improcedência, veio a concluir: 1 - Deve a alteração da matéria de facto peticionada pelos Recorrentes ser julgada procedente, mas apenas quanto à inclusão da matéria contratual pertinente para os presentes autos, concretamente quanto às coberturas “danos por água”, “responsabilidade civil”, “responsabilidade civil cruzada” e as disposições contratuais referentes ao agravamento do risco presentes nos artigos 19.º n.º 1 a) e 23.º n.º 1 das cláusulas contratuais tituladas pela apólice n.º ...; 2 - Deve ser verificado o abuso de direito dos Recorrentes quanto imputam responsabilidade à Recorrida pelo pagamento do orçamento apresentado pelos próprios; 3 - No objeto dos presentes autos, não se inclui o aprofundamento do regime jurídico aplicável ao eventual (mas inexistente) direito de regresso dos Recorrentes. 4 - Caso seja do entendimento de V. Exas. existir a necessidade de enquadramento da situação dos autos e a obrigação indemnizatória sentenciada aos Recorrentes no regime dos contratos de seguro de responsabilidade civil e na cobertura de responsabilidade civil cruzada, 5 - Sempre se dirá, com o devido respeito por opinião contrária, que tal enquadramento (não concretizado pelos Recorrentes) tem necessariamente de incluir (i) a responsabilidade dos mesmos pelo agravamento dos danos, (ii) a exclusão dos danos causados pelo agravamento provocado pelos Recorrentes e (iii) a existência de direito de regresso da seguradora ao abrigo do regime dos contratos de seguro de da responsabilidade civil. O recurso foi admitido nos termos legais e, na mesma ocasião, foi proferido despacho sobre a nulidade arguida pelos apelantes: “Atendendo a que os réus AA e BB, no recurso que interpuseram, invocaram a nulidade da decisão recorrida, cabe, antes de mais, apreciar e decidir, nos termos do disposto no artigo 617.º, do Código de Processo Civil. Os réus AA e BB defendem que a sentença recorrida é nula porque é omissa quanto à condenação ou absolvição do corréu BB, nulidade que enquadraram no artigo 615.º, n.º 1, alínea d), do Código de Processo Civil. Esta nulidade encontra-se intimamente ligada à regra estabelecida no artigo 608.º, n.º 2, 1.ª parte, do Código de Processo Civil, de acordo com a qual o «juiz deve resolver todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação excetuadas aquelas cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras». Apenas existe omissão de pronúncia quando o Tribunal deixe de apreciar questões submetidas pelas partes à sua apreciação, mas já não quando deixe de apreciar os argumentos invocados a favor da posição por si sustentada, não sendo de confundir o conceito de “questões” com o de “argumentos” ou “razões”. Constitui igualmente entendimento pacífico, tanto na doutrina como na jurisprudência, que a noção de “questões” em torno das quais gravita a referida infração processual se reporta aos fundamentos convocados pelas partes na enunciação da causa de pedir e/ou nas exceções e, também, aos pedidos formulados. Neste contexto, salvo o devido respeito, não vemos que a sentença recorrida enferme desta nulidade pois que o Tribunal não omitiu a sua pronúncia sobre o corréu BB, o que acontece é uma omissão do seu nome. De facto, analisada a sentença na sua totalidade, constata-se que o Tribunal ao se referir aos 1.ºs corréus apenas refere-se expressamente a AA, falando, no entanto, no plural (corréus e réus). Pelo que entendemos que o despacho recorrido não padece da nulidade que lhe foi apontada”. No mesmo despacho, em sentido retificativo (e ao abrigo do disposto no artigo 614, n.ºs 1 e 2 do CPC), mais se determina: “Da sentença proferida nestes autos consta «1.ºs corréus AA» e «réus AA», omitindo o nome do corréu marido BB. Assim sendo, resulta manifesto a omissão do nome do corréu BB. Pelo exposto e ao abrigo do artigo 614.º, n.ºs 1 e 2, do Código de Processo Civil, determino que se proceda à retificação do aludido erro no sentido de onde consta «1.ºs corréus AA» e «réus AA» passe a constar «1.ºs corréus AA e BB» e «réus AA e BB»”. Os autos correram Vistos e nada obsta à apreciação do recurso. Tendo presentes as conclusões apresentadas pelos recorrentes, o objeto do recurso traduz-se em saber a) se a sentença padece de nulidade por omissão de pronúncia; b) se deve ser aditada à factualidade provada o teor integral do documento n.º 1, apresentado com a contestação dos apelantes (Apólice de Seguro n.º ...); c) Se, havendo um seguro de responsabilidade civil (e não um “seguro de danos”) sempre seria a Seguradora a custear a reparação do evento; d) Se o corréu BB deve ser absolvido dos pedidos e e) Se há erro de julgamento ao imputar-se exclusivamente à ré (ou primeiros corréus) a culpa pelos danos sofridos, desconsiderando-se a responsabilidade do réu Condomínio, esta fundada no disposto nos artigos 483 e 486 do Código Civil (CC). III - Fundamentação III.I – Fundamentação de facto Os apelantes pretendam impugnar a decisão relativa à matéria de facto, mas apenas na medida em que entendem que lhe deve ser aditado o teor integral de determinado documento. Uma vez que tal pretensão se reconduz (apenas) a um aditamento à factualidade dada como provada, desde já transcrevemos a matéria de facto, provada e não provada, fixada na primeira instância: Factos provados 1 - A herança aberta por óbito de CC, falecido a 5 de dezembro de 2017, de que são herdeiros os 2.ºs autores, EE e mulher FF, e as Intervenientes, HH e II, é dona e legítima possuidora da fração autónoma designada pela letra “I” que constitui o 1.º andar esquerdo poente, do prédio urbano constituído no regime de propriedade horizontal denominado “Edifício ...” sito na rua ..., n.º ... e ... e Estrada ..., ..., freguesia ..., desta cidade de Matosinhos, destinado a habitação, com a área de 144 m2, inscrito na respetiva matriz urbana no artigo ...... e descrita na Conservatória do Registo Predial na ficha n.º ... /...-I, da freguesia .... 2 - Tal fração autónoma adveio ao património do falecido CC em virtude de aquele a ter adquirido por compra, através de escritura pública celebrada no dia 8 de julho de 1994 pelo Notário da Comarca de Matosinhos e exarada desde fls. 143 verso a 144 verso do Livro de Escrituras Diversas n.º ... do Cartório Notarial de Matosinhos. 3 - Por contrato verbal celebrado em data não concretamente apurada, mas logo a seguir ao casamento dos 2.ºs coautores EE e FF, em 2005, o falecido CC e sua esposa deram de comodato àqueles, para a sua habitação permanente, a identificada fração autónoma. 4 - Desde essa data que os coautores, EE e FF, residem habitualmente nessa fração com as suas duas filhas menores, JJ, respetivamente de 12 e 9 anos de idade (à data da entrada da ação). 5 - Por sua vez, os 1.ºs corréus, AA e BB, são donos e legítimos possuidores da fração autónoma designada pela letra “K” correspondente ao 2.º andar esquerdo poente do identificado prédio urbano denominado “Edifício ...”. 6 - Na fração autónoma pertencente aos 1.ºs corréus, AA e BB, habita habitualmente apenas a ré desde o seu divórcio com o corréu BB, situando-se esta sua fração imediatamente por cima da fração autónoma “I” habitada pelos 2.ºs coautores, EE e FF. 7 - O condomínio do identificado prédio constituído em regime de propriedade horizontal denominado Edifício ..., foi administrado pela sociedade A..., SA até 12.11.2018. 8 - A 19.12.2016, os 2.ºs coautores, EE e FF, começaram a detetar o surgimento de infiltrações de água no interior da sua habitação. 9 - Perante tal situação, os 2.ºs coautores entraram de imediato em contacto quer com a ré quer com a A..., SA, para que estes diligenciassem pela deteção da origem das aludidas infiltrações. 10 - Na sequência dessa denúncia, a 19.12.2016 foi realizada uma vistoria técnica à habitação dos coautores EE e FF – fração I –, tendo sido detetada presença de água, supostamente devido a uma fuga de água, com origem em local desconhecido na rede de abastecimento de água da fração autónoma pertença dos 1.ºs corréus. 11 - Em consequência, o condomínio, 2.º corréu participou o sinistro à Companhia de Seguros B... SA, a 26.12.2016, com a qual havia celebrado um contrato de seguro multirriscos, titulado pela Apólice de Seguro n.º ..., contrato de seguro esse que garante todo e qualquer dano que ocorra quer nas zonas comuns do edifício quer nas frações autónomas que compõem esse mesmo edifício. 12 - Após participação do sinistro, foi realizada a 29.12.2016, uma peritagem ao local pelo perito da empresa D... a pedido da Companhia de Seguros B... com referência ao processo de sinistro n.º .... 13 - Na peritagem realizada foi detetada uma rotura de canalização de abastecimento de água da fração habitação K, pertencente aos 1.ºs corréus, correspondente ao 2.º esquerdo poente e verificados danos no teto do corredor da fração dos autores, no 1.º esquerdo poente. 14 - Perante essa evidência, a referida Companhia de Seguros B..., através do referido perito, autorizou que a ré realizasse trabalhos de pesquisa na rede de abastecimento de água da sua casa de habitação de modo a que se apurasse o local exato da rotura da sua canalização e solicitou-lhes que apresentasse um orçamento para a realização de reparação devidamente descriminado por trabalhos. 15 - A 1.ª ré AA diligenciou pela obtenção de dois orçamentos e remeteu-os para a Companhia de Seguros B... SA. 16 - Em consequência, a Companhia de Seguros B... a 2.03.2017 aceitou a responsabilidade do sinistro de harmonia com o orçamento apresentado pela 1.ª corré AA que previa para a pesquiza e reparação de rotura na canalização da fração K (2.º andar esquerdo poente) efetuada pela fração I (1.º andar esquerdo poente), reparação do teto do corredor e porta de entrada de acesso ao corredor, o valor estimado de 750,00€, quantia que pagou ao 2.º corréu a 3.03.2017. 17 - Decorrido mais de um ano sem que os 1.ºs réus procedessem à pesquiza e reparação da rotura da canalização da sua fração e danos da fração dos autores, por intermédio do seu mandatário, interpelaram a 1.ª corré mulher, por carta registada datada de 15.01.2018 e rececionada pela ré em 18-01-2018, para que esta, com a urgência que o caso reclamava, procedesse à reparação da referida canalização 18 - A ré AA, por intermédio do seu mandatário, respondeu à supra identificada interpelação, solicitando, entre o mais, que lhe fosse concedido algum tempo com vista a apurar a posição assumida pela Companhia de Seguros B... à qual havia sido participado o sinistro em apreço e interpelou o 2.ª corréu no sentido de ser informada do estado do processo de reclamação junto da seguradora. 19 - Em consequência, foi possível apurar [que] o processo de sinistro na Companhia de Seguros B... estava encerrado devido a ter procedido ao pagamento da quantia de 750,00€ ao condomínio 2.º corréu e que este não dera disso conhecimento aos autores. 20 - Os autores EE e FF, através do seu mandatário interpelaram então o 2.º corréu a 15.03.2018 para que este, no prazo de 5 dias uteis, iniciasse a realização das obras necessárias à reparação do tubo de abastecimento de água da habitação dos 1.ºs corréus de modo a cessar, por definitivo, as sucessivas infiltrações de água no interior da habitação dos atores. 21 - Em resposta datada de 21.03.2018, o 2.ª réu, através da empresa A..., Lda., refere ter informado os autores no início do corrente ano de 2018 do valor de indemnização e orçamento apresentado e de que estes afirmaram não querer tal indemnização e que iriam resolver o assunto via judicial. 22 - Por esta carta, a identificada empresa administradora do condomínio remeteu cheque com o valor da indemnização, referida como antes negada pelos autores, reafirmando não ser da sua competência a resolução de situações relacionadas com a canalização no interior das frações. 23 - Em resposta, datada de 12.04.2018, o mandatário dos autores refere não aceitar aquele valor e devolve o cheque justificando que para reparação dos danos da fração aquele valor de 750,00€ é manifestamente insuficiente, imputando à referida empresa de administração de condomínios a responsabilidade na agravação dos danos por omissão de realização da obra considerando que desde o dia 2.03.2017, data do envio pela Chamada do valor indemnizatório, estaria em condições de executar a obra. 24 - Na mesma data, os autores, através do seu mandatário, interpelaram ainda os 1.ºs corréus, estes últimos na pessoa do seu mandatário, para que procedessem à pesquiza da rotura e reparação da canalização da sua casa de habitação de modo a fazer cessar as infiltrações de água no interior da casa de habitação dos autores face ao estado de conservação e condições de habitabilidade desta fração, fazendo-o pela fração dos mesmos devido a ser impraticável fazê-lo pela fração dos autores sem comprometimento serio da estabilidade da laje do teto. 25 - Em resposta da mesma data, o mandatário da 1.ª ré AA pediu aos autores para aguardarem 15 dias pois pretendiam que a resolução do assunto se funda-se numa posição inequívoca da Companhia de Seguros B... sobre o que, e como, indemnizará ambos as frações seguras, considerando a falta de evidencia de danos na sua fração e a possibilidade de os danos na fração dos Autores poderem ser imputáveis a infiltrações provenientes das fachadas e coberturas do prédio ainda por sanar. 26 - O 2.º corréu, em resposta datada apenas de 18.06.2018, manteve a sua posição de que não é da sua responsabilidade a reparação dos danos na fração dos autores resultantes das infiltrações de águas não provenientes de partes comuns do edifício, mas sim da fração imediatamente superior à dos autores tendo apenas por força do seguro coletivo colaborado com a 1.ª ré na participação à seguradora. 27 - Apenas em meados de abril de 2019, a ré AA reparou a canalização interna da fração de habitação dos autores EE e FF que fez cessar a queda de água no interior da casa de habitação dos autores. 28 - Até à presente data não foi efetuada pelos 1.ºs corréus BB e AA a reparação dos danos existentes no interior da fração autónoma pertencente aos autores, que se agravaram pelo decurso do tempo decorrido entre a sua denúncia à ré em dezembro de 2016 e a data referida em 27. 29 - O agravamento dos danos na fração dos autores foi ainda potenciado quer pela recusa dos 1.ºs corréus em, no período referido em 28 em efetuar qualquer trabalho de pesquisa de fuga no interior da sua casa de habitação alegando que, como não visionam qualquer dano na sua habitação, a referida fuga não será proveniente da sua canalização, 30 - Quer pela conduta do 2.º corréu, que, enquanto tomador do seguro, recebeu o montante indemnizatório necessário à realização de tais trabalhos e quedou-se inerte injustificadamente por cerca de um ano. 31 - Na verdade, se no início da denuncia dos autores, apenas os tetos do corredor e da cozinha da habitação dos autores estavam com humidades, 32 - Decorrido um ano, tais danos já se tinham agravado substancialmente, pois as infiltrações de água alastraram-se e os tetos e paredes da cozinha e do corredor de acesso à cozinha e à lavandaria ficaram totalmente cobertos por humidade, tendo caído parte do estuque do teto. 33 - Da laje do teto pingava água, incessantemente, e para não agravar os danos os autores tiveram que colocar uma bacia para recolha dessa mesma água. 34 - A queda de água do teto causou o surgimento de um elevado grau de humidade em todo o interior da casa de habitação que, pese arejada, potenciou o surgimento de fungos e bolores das paredes da casa e ainda no interior dos armários, 35 - Fungos e bolores esses que se agarram à roupa de cada um dos elementos do agregado familiar dos 2.ºs coautores e que se encontra guardada no interior desses armários, e levaram a que estes tivessem que frequentemente tido de transportar a sua roupa para a lavandaria a fim de lavar e limpar, tendo-se estragado muita roupa. 36 - A humidade também se alastrou para os rodapés e para o pavimento em madeira de algumas áreas, tendo afetado a zona do quarto, e que terá de ser obrigatoriamente substituído. 37 - As paredes ficaram e estão pretas com a tinta a levantar e todos os livros das estantes existentes na divisão destinada a escritório estão com caruncho e bolores. 38 - As portas do roupeiro localizado no corredor de acesso à cozinha e à lavandaria, estão totalmente deformadas, pelo que passaram a fechar com dificuldade. 39 - Os armários da cozinha ficaram totalmente danificados, podres por baixo sendo a sua recuperação impossível tecnicamente. 40 - Danos esses melhor identificados no relatório de peritagem efetuado ao imóvel dos autores por engenheiro civil credenciado para o efeito datado de 30 de agosto de 2018, e cuja reparação a essa data orçava a quantia de 8.064,25€. 41 - Decorridos mais cinco meses, em resultado de forte e abundante queda de água, a habitação dos autores ficou afetada por completo, 42 - verificando-se que a 14.05.2019, todas as divisões da habitação se encontravam afetadas. 43 - E ainda, grande parte dos armários da cozinha se encontram irremediavelmente danificados, designadamente o armário embutido no corredor de acesso à cozinha e onde ocorriam, com mais intensidade, as referidas infiltrações de água está totalmente podre, 44 - Tal como se encontra agora danificado o chão de soalho em madeira existente e as portas e guarnições em madeira no hall de entrada e no referido corredor, sendo certo que também todas as massas desses tetos estão podres, tendo que ser substituídas. 45 - Reparações que passaram nessa data a orçar a quantia de 10.151,30€. 46 - Como consequência dos acontecimentos supra relatados, os 2.ºs coautores EE e FF têm vivido verdadeiros tormentos. 47 - Tal situação causa bastante ansiedade e sofrimento aos 2.ºs coautores, pois veem a sua habitação a deteriorar-se de dia para dia, sentindo-se envergonhados por não festejarem os aniversários das suas filhas menores e nem poderem receber em casa familiares e amigos. 48 - Por outro lado, todo o comportamento dos 1.ºs e 2.º corréus causa grande consternação e tristeza aos autores, uma vez que não vislumbram quando terão a sua habitação reparada. 49 - Sentindo-se ainda profundamente defraudados e injustiçados. 50 - E os autores sentem, inclusivamente, que esta situação interfere com sua saúde não só mental como física, que tem vindo a agravar-se com o decurso do tempo. 51 - O contrato referido em 11 celebrado entre o corréu Condomínio do Edifício ..., na qualidade de tomador de seguro e segurado, e a Companhia de Seguros B..., SA, do ramo multirriscos condomínio, designado por “B... Condomínio” entrou em vigor pelas 12H46 do dia 19.02.2014 e foi celebrado até às 24H00 horas do dia 31.01.2015, automática e anualmente renovável, a partir de 01/02/2015, e, 52 - Como consta das condições contratuais da apólice em causa, o objeto e local de risco consiste no edifício constituído no regime de propriedade horizontal, sito na rua ... ..., 53 - Com as coberturas contratadas de “danos por água”, pelo capital de 4.432.871,58€ e por “responsabilidade civil cruzada”, pelo capital de 25.000,00€ por sinistro e anuidade. 54 - O tomador do seguro conhecia as condições contratuais da apólice, que recebeu e aceitou. Factos não provados a) A registo de aquisição da fração identificada em 1) a favor do cujus aí identificado. b) Os 2.ºs coautores e os seus filhos menores têm de recorrer por várias vezes a ajuda médica para poder debelar problemas respiratórios que frequentemente surgiram. c) O período de tempo que mediou entre o momento da transferência para a conta bancária do Condomínio e o momento em que este logrou informar os autores, deveu-se ao facto de a transferência não ter sido identificada de imediato, só identificada aquando da conferencia bancária pela gestora do condomínio GG, que assim que deu conta se deslocou ao estabelecimento dos autores dando conta da existência desse montante na posse do Condomínio e da sua intenção de entrega, e estes recusaram receber o cheque desse valor. III.II – Fundamentação de Direito Da nulidade por omissão de pronúncia Sustentam os apelantes que a sentença não se pronunciou sobre o corréu BB, que não condenou nem absolveu e, desse modo, incorreu na nulidade prevista na alínea d) do n.º 1 do artigo 615 do Código de Processo Civil (CPC), ainda que entendam que tal nulidade possa ser suprida nos termos do disposto no artigo 617 do mesmo diploma. Sustentam, igualmente, que do suprimento da aludida nulidade há de resultar a absolvição daquele corréu, “a quem não é de facto possível imputar qualquer responsabilidade pelos danos sofridos pelos autores”. São, como decorre, duas questões distintas: a omissão de pronúncia e o sentido da pronúncia (se a referido corréu deve ser condenado ou absolvido) alegadamente omitida, reservando-se para momento posterior a apreciação desta segunda questão. O artigo 615, n.º 1, alínea d), na parte da sua redação que aqui importa, comina com nulidade a sentença que não se pronuncie sobre questões que devesse apreciar. Pronunciando-se, nos termos do artigo 617 do CPC (normativo expressamente citado pelos apelantes com vista ao suprimento, ainda na primeira instância, da nulidade que invocaram) o tribunal recorrido sustentou a inexistência da referida nulidade, na medida em que, efetivamente, o tribunal se pronunciou sobre o [a condenação do] corréu BB, porquanto, embora nomeie apenas a corré AA, escreve e elabora no plural, referindo réus e corréus. Simplesmente – reconhece – foi omitido o nome daquele corréu, concretamente no dispositivo da sentença que, por isso, e ao abrigo do disposto no artigo 614, n.º 1 e n.º 2, foi retificado, conforme despacho proferido na mesma ocasião. Da leitura da sentença, concluímos, tal como refere a primeira instância, que ocorreu apenas uma omissão do nome do corréu, não ocorrendo a nulidade invocada. Sempre se diga, ainda assim, que, sustentando os apelantes a absolvição deste corréu – concretamente, com fundamento na factualidade levada ao ponto 6 dos factos dados como provados – a questão da responsabilidade do corréu BB sempre teria de ser (re)apreciada nesta instância, o que sempre redundaria na irrelevância jurídica daquela omissão que, repetimos, em rigor não ocorre. Do aditamento à decisão relativa à matéria de facto do teor integral do documento n.º correspondente à Apólice de Seguro n.º ... No corpo das suas alegações, os apelantes sob a epígrafe “Apólice de Seguro n.º ..., contratada junto da chamada COMPANHIA DE SEGUROS B..., S.A.” diz o seguinte: “Documento cujo teor integral - apesar de a sua existência vir referida em 11. dos factos provados da douta sentença recorrida - deve ser aditado à factualidade dada como provada nos autos – o que se pede e requer por via deste recurso – pois esse teor é essencial à descoberta da verdade, e tal documento não foi objeto de qualquer impugnação ou contradita” (sublinhado nosso). Já nas suas conclusões (17 e 18) os apelantes escrevem (renovam): “17 - O seguro multirriscos contratado entre as partes destes autos e a chamada seguradora B... tem o efetivo teor do Doc. 1 apresentado com a contestação dos recorrentes, Apólice de Seguro n.º ..., contratada junto da chamada COMPANHIA DE SEGUROS B..., SA. 18 - O teor integral desse documento, aliás, deve ser aditado à a factualidade dada como provada – o que se pede e requer por via deste recurso – pois esse teor é essencial à descoberta da verdade, e tal documento não foi objeto de qualquer impugnação ou contradita”. Quem pretenda impugnar a decisão relativa à matéria de facto, em obediência ao disposto no artigo 640 do CPC, bem como à imposição de especificação (nas conclusões) do objeto do recurso, há de identificar os pontos de facto que pretende ver alterados ou concretizar os que pretende ver aditados e, além disso, terá que identificar os elementos probatórios que sustentam essa pretensão e motivá-la, ou seja, fundamentar, dizer as razões pelas quais determinada factualidade deve ser alterada ou aditada. No caso presente, estando em causa um documento constante dos autos (e não impugnado), é esse documento a prova (não o facto, pois os documentos não são factos, mas meios de prova) que os recorrentes invocam e, como referem, pretendem ver aditado o seu teor, ou seja, os factos que nele se evidenciam. Simplesmente, as razões, a fundamentação para justificar o aditamento não se mostra verdadeiramente alegada pelos apelantes, que se limitam a invocar que o teor do documento é essencial para a descoberta da verdade. A descoberta da verdade, naturalmente da verdade processual, é inerente a qualquer prova, porquanto é esse o desiderato de todas elas e a essencialidade é uma conclusão, sem suporte em qualquer outro fundamento alegado. Assim, ao não terem os apelantes fundamentado a pretensão de aditamento factual, de imediato devia improceder a impugnação da decisão relativa à matéria de facto. Sempre se diga, em acrescento, que a reapreciação da prova (mesmo que apenas documental, como sucederia) redundaria num ato inútil e, por isso, processualmente proibido (artigo 130 do CPC). Por um lado, a questão do seguro e das suas condições e cláusulas não é objeto desta ação, na qual – e como melhor se dirá adiante – não se discute o direito de regresso, invocado pelos réus para fundamentarem o chamamento da Seguradora. Por outro – e também como adiante se dirá – a relevância, nesta ação, dos factos que sustentam um eventual direito de regresso, prendem-se com a natureza do contrato de seguro celebrado, essencialmente – e nas palavras dos apelantes – na dicotomia entre (simples) seguro de danos ou (também) seguro de responsabilidade civil. Simplesmente, o ponto 57 da matéria de facto dada como provada mostra-se já, além de inequívoco, bastante a tal propósito. Seja por falta de fundamentação, seja por inutilidade, não vemos razão para deferir a pretensão dos apelantes de ser aditado à matéria de facto dada como provada o teor do documento que consubstancia o seguro celebrado com a chamada. Se, havendo um seguro de responsabilidade civil (e não um “seguro de danos”) sempre seria a Seguradora a custear a reparação do evento A questão que ora epigrafámos prende-se indelevelmente com a problemática do direito de regresso e com a posição processual da Seguradora e complementa o que já fomos avançando no ponto anterior. Efetivamente, os apelantes, por um lado, pretendiam o aditamento do teor do contrato de seguro e, por outro lado, consideram que a sentença devia ser expurgada das considerações que remetem para a existência de um mero seguros de danos e não propriamente de responsabilidade civil. Não têm razão, porém. Além do que já referimos no ponto anterior, importa acentuar que a Seguradora foi chamada ao processo por ser um terceiro relativamente a quem os corréus/recorrentes têm ou podem ter direito (ação) de regresso (artigo 321 do CPC). A Seguradora passou a ser interveniente acessória e, quanto a si, a sentença constitui caso julgado relativamente às questões “de que depende” o direito de regresso (artigo 323, n.º 4 do CPC), não já a ação de regresso, a correr posteriormente. O fundamento do direito de regresso não se confunde com este e com a sua oportuna apreciação. Acresce que a discordância essencial dos apelantes, relativamente à caraterização do seguro não é afetada por considerações jurídicas da sentença, quando, como se frisou, a matéria de facto já permite concluir que o seguro em causa é, ou é também, um seguro de responsabilidade civil. Não há, assim, que apreciar em concreto o direito de regresso ou fazer qualquer correção à sentença ou, como se disse no ponto anterior, à matéria de facto. Se o corréu BB deve ser absolvido dos pedidos A condenação dos primeiros corréus fundou-a o tribunal no disposto no artigo 493, n.º 1 do Código Civil (CC) que assim prescreve: “Quem tiver em seu poder coisa móvel ou imóvel com o dever de a vigiar, e bem assim quem tiver assumido o encargo de vigilância de quaisquer animais, responde pelo dano que a coisa ou os animais causarem, salvo se provar que nenhuma culpa houve da sua parte ou que os danos se teriam igualmente produzido ainda que não houvesse culpa sua”. Se bem vemos, os apelantes não censuram a fundamentação jurídica da sentença, nessa parte, mas sustentam, atento o facto provado em 6 [Na fração autónoma pertencente aos 1.ºs corréus, AA e BB, habita habitualmente apenas a ré desde o seu divórcio com o corréu BB, situando-se esta sua fração imediatamente por cima da fração autónoma “I” habitada pelos 2.ºs coautores, EE e FF] que ao corréu BB “não é de facto possível imputar qualquer responsabilidade pelos danos sofridos pelos autores”. A questão a conhecer liga-se ao âmbito subjetivo da norma citada. É inegável que esse âmbito radica “no puro controlo da coisa, contradizendo também a solução acolhida no artigo 2394.º do Código de Seabra, que consagrava a culpa presumida do proprietário, dado se considerar agora que esta modalidade de responsabilidade não deve constituir um encargo correspetivo de situações de soberania jurídica ou económica, mas apenas de presumir a culpa daquele que, pela sua situação de facto em relação à coisa, deve guardá-la”[3]. Acompanhando a citação que antecede e, consequentemente, exigindo um corpus possessório na aplicação do preceito, importa ter presente que a alteração operada no atual CC, por comparação ao Código de Seabra, não corresponde a uma restrição de âmbito, mas a uma clarificação que pode ser, em múltiplos casos, e basta pensar na composse, um alargamento. O proprietário é possuidor e responsável pela vigilância da coisa, a menos que, independentemente da sua qualidade de proprietário, que eventualmente mantenha, tenha perdido o controlo da coisa. No caso presente, da circunstância de habitualmente apenas a corré habitar na fração (registada em nome do corréu, também) não resulta que o ex-marido tenha perdido o controlo da fração e tanto basta para improceder, nessa parte, o recurso, nada havendo a censurar à condenação de ambos os primeiros demandados. Se há erro de julgamento ao imputar-se exclusivamente à ré (ou primeiros corréus) a culpa pelos danos sofridos, desconsiderando-se a responsabilidade do réu Condomínio, esta fundada no disposto nos artigos 483 e 486 do Código Civil Dando realce aos pontos de facto dados como provados 11, 16 a 23, 29 a 32, 48 e 51 a 54 [11 - Em consequência, o condomínio, 2.º corréu participou o sinistro à Companhia de Seguros B... SA, a 26.12.2016, com a qual havia celebrado um contrato de seguro multirriscos, titulado pela Apólice de Seguro n.º ..., contrato de seguro esse que garante todo e qualquer dano que ocorra quer nas zonas comuns do edifício quer nas frações autónomas que compõem esse mesmo edifício (...) 16 - Em consequência, a Companhia de Seguros B... a 2.03.2017 aceitou a responsabilidade do sinistro de harmonia com o orçamento apresentado pela 1.ª corré AA que previa para a pesquiza e reparação de rotura na canalização da fração K (2.º andar esquerdo poente) efetuada pela fração I (1.º andar esquerdo poente), reparação do teto do corredor e porta de entrada de acesso ao corredor, o valor estimado de 750,00€, quantia que pagou ao 2.º corréu a 3.03.2017. 17 - Decorrido mais de um ano sem que os 1.ºs réus procedessem à pesquiza e reparação da rotura da canalização da sua fração e danos da fração dos autores, por intermédio do seu mandatário, interpelaram a 1.ª corré mulher, por carta registada datada de 15.01.2018 e rececionada pela ré em 18-01-2018, para que esta, com a urgência que o caso reclamava, procedesse à reparação da referida canalização. 18 - A ré AA, por intermédio do seu mandatário, respondeu à supra identificada interpelação, solicitando, entre o mais, que lhe fosse concedido algum tempo com vista a apurar a posição assumida pela Companhia de Seguros B... à qual havia sido participado o sinistro em apreço e interpelou o 2.ª corré no sentido de ser informada do estado do processo de reclamação junto da seguradora. 19 - Em consequência, foi possível apurar [que] o processo de sinistro na Companhia de Seguros B... estava encerrado devido a ter procedido ao pagamento da quantia de 750,00€ ao condomínio 2.º corréu e que este não dera disso conhecimento aos autores. 20 - Os autores EE e FF, através do seu mandatário interpelaram então o 2.º corréu a 15.03.2018 para que este, no prazo de 5 dias uteis, iniciasse a realização das obras necessárias à reparação do tubo de abastecimento de água da habitação dos 1.ºs corréus de modo a cessar, por definitivo, as sucessivas infiltrações de água no interior da habitação dos atores. 21 - Em resposta datada de 21.03.2018, o 2.ª réu, através da empresa A..., Lda., refere ter informado os autores no início do corrente ano de 2018 do valor de indemnização e orçamento apresentado e de que estes afirmaram não querer tal indemnização e que iriam resolver o assunto via judicial. 22 - Por esta carta, a identificada empresa administradora do condomínio remeteu cheque com o valor da indemnização, referida como antes negada pelos autores, reafirmando não ser da sua competência a resolução de situações relacionadas com a canalização no interior das frações. 23 - Em resposta, datada de 12.04.2018, o mandatário dos autores refere não aceitar aquele valor e devolve o cheque justificando que para reparação dos danos da fração aquele valor de 750,00€ é manifestamente insuficiente, imputando à referida empresa de administração de condomínios a responsabilidade na agravação dos danos por omissão de realização da obra considerando que desde o dia 2.03.2017, data do envio pela Chamada do valor indemnizatório, estaria em condições de executar a obra (...) 29 - O agravamento dos danos na fração dos autores foi ainda potenciado quer pela recusa dos 1.ºs corréus em, no período referido em 28) em efetuar qualquer trabalho de pesquisa de fuga no interior da sua casa de habitação alegando que, como não visionam qualquer dano na sua habitação, a referida fuga não será proveniente da sua canalização, 30 - Quer pela conduta do 2.º corréu, que, enquanto tomador do seguro, recebeu o montante indemnizatório necessário à realização de tais trabalhos e quedou-se inerte injustificadamente por cerca de um ano. 31 - Na verdade, se no início da denuncia dos autores, apenas os tetos do corredor e da cozinha da habitação dos autores estavam com humidades, 32 - Decorrido um ano, tais danos já se tinham agravado substancialmente, pois as infiltrações de água alastraram-se e os tetos e paredes da cozinha e do corredor de acesso à cozinha e à lavandaria ficaram totalmente cobertos por humidade, tendo caído parte do estuque do teto (...) 48 - Por outro lado, todo o comportamento dos 1.ºs e 2.º corréus causa grande consternação e tristeza aos autores, uma vez que não vislumbram quando terão a sua habitação reparada (...) 51 - O contrato referido em 11) celebrado entre o corréu Condomínio do Edifício ..., na qualidade de tomador de seguro e segurado, e a Companhia de Seguros B..., SA, do ramo multirriscos condomínio, designado por “B... Condomínio” entrou em vigor pelas 12H46 do dia 19.02.2014 e foi celebrado até às 24H00 horas do dia 31.01.2015, automática e anualmente renovável, a partir de 01/02/2015, e, 52 - Como consta das condições contratuais da apólice em causa, o objeto e local de risco consiste no edifício constituído no regime de propriedade horizontal, sito na rua ... ..., 53 - Com as coberturas contratadas de “danos por água”, pelo capital de 4.432.871,58€ e por “responsabilidade civil cruzada”, pelo capital de 25.000,00€ por sinistro e anuidade. 54 - O tomador do seguro conhecia as condições contratuais da apólice, que recebeu e aceitou], salientando a pretensão condenatória formulada pelos autores relativamente ao Condomínio e acentuando que este, tomador do seguro, foi negligente, ficou silencioso durante um ano e a sua omissão foi causa do agravamento do dano, os recorrentes entendem não serem responsáveis pelo ressarcimento dos danos patrimoniais e não patrimoniais e que, quanto à reparação (danos materiais), a condenação deve ser solidária. A sentença, relativamente ao Condomínio, veio a entender o que, com síntese, ora se transcreve e sublinha: “(...) 1 - São funções do administrador, além de outras que lhe sejam atribuídas pela assembleia: (...) 3 - O administrador de condomínio que não cumprir as funções que lhe são cometidas neste artigo, noutras disposições legais ou em deliberações da assembleia de condóminos é civilmente responsável pela sua omissão, sem prejuízo de eventual responsabilidade criminal, se aplicável. O artigo 1421.º, n.º 1 do Código Civil enumera de forma taxativa e imperativa as partes comuns de um edifício, definindo como tal: (...) Em resultado da factualidade apurada, há que concluir que a situação de infiltração respeita à fração da Ré e não às partes comuns pelo que, desde logo, nenhuma responsabilidade a esse título pode ser assacada ao Réu condomínio. E mesmo a concluir-se pela verificação de uma conduta ilícita do condomínio ou da sua administração que não se vislumbra, os prejuízos indemnizáveis aos AA. seriam tão só os prejuízos causados com essa conduta e não os prejuízos causados com a infiltração de água na fração dos Autores. E também não se diga que há responsabilidade objetiva da administração ou dos condóminos e que não se aplica ao caso o art. 509.º, do C. Civil, por analogia, ou por via de interpretação extensiva, consentida pelo art. 11.º, do mesmo Código. Dir-se-á, por último, que daquela matéria de facto resulta que o contrato de seguro celebrado com a Ré e condomínio foi feito em função de uma proposta de seguro apresentada e aprovada em assembleia de condóminos. O seguro contra qualquer outro risco designadamente por danos de água é facultativo, podendo o mesmo incidir sobre a totalidade do prédio mediante deliberação dos condóminos, nos termos do art. 1432.º, n.º3, do C. Civil, e podendo qualquer condómino efetuá-lo, embora restrito à sua fração (cfr. Rui Vieira Miller, A Propriedade Horizontal no Código Civil, pág. 244). O que significa que os Autores aprovaram a celebração do seguro, concordando com o valor fixado e que, por outro lado, sendo segurados, ainda que não tomadores do seguro, nada impedia que quer a Ré quer os Autores diligenciassem junto da Seguradora pelo pagamento da indemnização a que entendiam ter direito. Por sua vez a empresa administradora, A..., Lda., que representava o Réu condomínio ao não dar conhecimento da decisão da Chamada Companhia de Seguros B... não só impediu que a opção desta companhia por orçamento minimalista, fosse objeto de reclamação quer pela Ré quer pelos Autores, como contribuiu para o agravamento dos danos na fração dos Autores, pois que, quedou-se inerte durante 10 a 11 meses, mas a verdade é que, mesmo a concluir-se pela verificação de uma conduta ilícita da administração de condomínio que não se vislumbra que os prejuízos indemnizáveis aos AA. seriam tão só os prejuízos causados com essa sua conduta e não os prejuízos causados pela infiltração e inércia da Ré na reparação da fuga da canalização da sua fração. Ademais, tendo em conta quer o valor indemnizatório em causa tendo por base o orçamento mais barato apresentado pela Ré e com a obra de pesquiza e reparação da fuga da canalização da Ré a fazer-se pelo teto da fração dos Autores partindo a laje, fácil é concluir que os Autores que não aceitaram em Março de 2018 não aceitariam em Março de 2017 pelos mesmos motivos, ainda que os danos da fração fossem como se provou, menos graves. Haverá, deste modo, que concluir que, face à matéria de facto considerada assente, não pode o Réu Condomínio ser responsabilizado pelo pagamento das quantias pedidas pelos Autores, seja a título de responsabilidade por factos ilícitos, seja a título de responsabilidade pelo risco, enquanto demandado na qualidade de representante dos condóminos. Por outro lado, no caso sub judice está provado que a queda de água do teto, as manchas de humidade e humidade, danos do teto, paredes, armários, madeiras tiveram origem na fração que pertence aos 1.ºs Co-réus concretamente, em fuga/rotura na rede de canalização de abastecimento de água que causou inundação, que não foram reparadas pelos 1.ºs Co-Réus, pese as várias interpelações para o efeito, provocando o agravamento dos danos da fração dos Autores. Assim, de acordo com a factualidade apurada e acima evidenciada, a reparação pretendida pela Autora compete aos Réus, por serem os proprietários da fração onde têm origem as patologias. Acresce que os Réus não efetuaram qualquer prova no sentido de mostrar terem tomado as necessárias cautelas a fim de impedir a continuidade das infiltrações na fração dos AA., situada no piso inferior, sendo certo que em causa já não está a verificação de infiltrações que sem culpa do Réu sempre se teriam verificado”. Ainda que a factualidade dada como provada aponte ao Condomínio (tal como aos primeiros corréus) a responsabilidade pelo agravamento dos danos sofridos pelos autores, fazendo-o, aliás, de modo conclusivo, desde logo no ponto 30 da factualidade dada como provada, no que ao 2.º réu respeita, importa ter presente que, nesta sede, os apelantes imputam a este segundo réu a responsabilidade extracontratual decorrente da violação do disposto no artigo 483 do CC. Este preceito pressupõe uma ação ou omissão causal de um dano e embora os factos pudessem ser mais esclarecedores (tendo em conta o alegado pelas partes) não nos parece haver qualquer dúvida que a ação ou omissão (no caso omissão) só pode ser imputada à administração do Condomínio, e não a este. Não há que confundir as duas entidades e nem se vislumbra, não estando em causa qualquer deliberação do Condomínio, como poderia imputar-se a este a violação do direito de outrem, omitindo tal, e eventual, imputação a quem administra. Tenha-se presente que, nos termos do n.º 3 do citado (na sentença) artigo 1436 do CC, o administrador de condomínio que não cumprir as funções previstas no mesmo preceito, em deliberação da assembleia ou noutras disposições legais é civilmente responsável pela sua omissão. O que resulta da factualidade (omissão de comunicação da resposta do seguro durante cerca de um ano) a ser violação de algum dever, é necessariamente a violação de um dever funcional que só pode ser assacada à administração e não à entidade Condomínio. Não por acaso, diga-se por fim, e tal como resulta do ponto 9 da matéria de facto, os autores entraram em contacto com a administradora do condomínio, não pediram a convocação de uma assembleia dos condóminos. Há que concluir que, por razões não exatamente coincidentes, mas até acrescidas, a pretensão recursória de imputar ao 2.º corréu a responsabilidade solidária no ressarcimento dos danos matérias é claramente improcedente. Há que, em conformidade, confirmar a sentença, pois o recurso é improcedente. Atento o decaimento, as custas são devidas pelos apelantes. IV - Dispositivo Pelo exposto, acorda-se na 3.ª Secção Cível (5.ª Secção) do Tribunal da Relação do Porto em julgar o recurso improcedente e, em conformidade, confirma-se a sentença apelada. Custas pelos apelantes. Porto, 23.10.2023 José Eusébio Almeida Ana Paula Amorim Teresa Fonseca _______________ [1] Pedido em relação ao qual, invocada a inutilidade superveniente, veio a ser declarada a extinção da instância. [2] Onde incluímos a questão do aditamento à matéria de facto, pretendida pelos recorrentes. [3] Rui Paulo Coutinho Mascarenhas de Ataíde, Responsabilidade Civil por Violação de Deveres no Tráfego, Almedina, 2015, págs. 387/388. |