Acórdão do Tribunal da Relação do Porto | |||
| Processo: |
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| Nº Convencional: | JTRP000 | ||
| Relator: | MANUELA MACHADO | ||
| Descritores: | CONTRATO DE ARRENDAMENTO SUCESSÃO DE LEIS NO TEMPO TRANSMISSÃO DO DIREITO AO ARRENDAMENTO TRANSMISSÃO DA POSIÇÃO DE LOCATÁRIO | ||
| Nº do Documento: | RP202401255945/21.1T8VNG.P1 | ||
| Data do Acordão: | 01/25/2024 | ||
| Votação: | UNANIMIDADE | ||
| Texto Integral: | S | ||
| Privacidade: | 1 | ||
| Meio Processual: | APELAÇÃO | ||
| Decisão: | CONFIRMADA | ||
| Indicações Eventuais: | 3ª SECÇÃO | ||
| Área Temática: | . | ||
| Sumário: | I - O NRAU (Lei nº 6/2006, de 27-02) resolveu o problema da sua aplicabilidade aos contratos de arrendamento constituídos antes da sua entrada em vigor, mas vigentes nessa data, mediante uma disposição transitória, ao dispor no art. 59.º, nº 1, sob a epígrafe “aplicação no tempo”, que “o NRAU aplica-se aos contratos celebrados após a sua entrada em vigor, bem como às relações constituídas que subsistam nessa data, sem prejuízo do previsto nas normas transitórias”. II - Para que o art. 1068.º do Código Civil (comunicabilidade do arrendamento ao cônjuge), na redação da Lei n.º 6/2006, de 27/02, se aplique a um contrato de arrendamento celebrado antes dessa Lei n.º 6/2006, é indispensável que a relação conjugal do arrendatário ainda subsistisse na data em que entrou em vigor a referida redação do art. 1068.º do Código Civil. III - A transmissão da posição de arrendatário por morte do anterior titular tem de ser aferida em função da lei em vigor no momento em que ocorre o facto constitutivo desse direito: o óbito do titular do arrendamento, sendo que, tendo o contrato de arrendamento sido celebrado antes da aprovação do RAU, aplica-se à transmissão por morte o regime do artigo 57.º do NRAU, uma vez que o contrato de arrendamento ficou sujeito ao regime transitório do Capítulo II do Título II do NRAU. IV - O NRAU consagrou duas soluções aplicáveis aos contratos de arrendamento: uma aplicável aos arrendamentos celebrados após a sua entrada em vigor – a do art. 1106.º, do CC; outra aplicável aos arrendamentos celebrados antes da sua entrada em vigor – a prevista no art. 57.º, do NRAU. | ||
| Reclamações: | |||
| Decisão Texto Integral: | Apelação 5945/21.1T8VNG.P1 Acordam na 3.ª Secção do Tribunal da Relação do Porto: I - RELATÓRIO AA, viúva, titular do Cartão de Cidadão n.º ..., número de identificação fiscal ...; BB, solteira, maior, titular do Cartão de Cidadão n.º ..., número de identificação fiscal ..., e CC, solteira, maior, titular do Cartão de Cidadão n.º ..., número de identificação fiscal ..., intentaram ação declarativa de condenação, sob a forma de processo comum, contra DD, número de identificação fiscal ..., residente na Rua ..., ..., ... ..., Vila Nova de Gaia, formulando o seguinte pedido: «(a) A reconhecer que a herança indivisa de EE, representada pelas Autoras enquanto únicas e universais herdeiras daquele, é legítima proprietária do prédio urbano, sito à Rua ..., ..., ..., prédio esse inscrito na matriz predial urbana da União de Freguesias ... e ... sob o artigo matricial ..., e descrito na Conservatória do Registo Predial de Vila Nova de Gaia sob a ficha ..., do qual faz parte a casa n.º ...; (b) A restituir de imediato o imóvel identificado em (a), que vem ocupando sem título, livre de pessoas e bens, e em bom estado de conservação, à referida herança indivisa; (c) A pagar uma indemnização à herança indivisa de EE pelos prejuízos que a ocupação que o Réu vem promovendo do imóvel identificado em (a) tem causado à dita herança, no montante de € 200,00 (duzentos euros) mensais, indemnização essa que deve contabilizar-se desde o dia 17 de maio de 2021, por ser o termo do sexto mês posterior ao óbito da mãe do Réu, até efetiva entrega do imóvel, nos termos aludidos em (b), tudo acrescido de juros de mora desde a data de vencimento de cada mês de ocupação, até efectivo e integral pagamento; (d) Ao pagamento de sanção pecuniária compulsória, de montante não inferior a € 10,00 (dez euros), por cada dia de atraso no cumprimento da decisão de restituição do imóvel por si ocupado, valor que se mostra devido, independentemente da indemnização aludida em (c), e que respeita, em termos de razoabilidade, o valor mensal apurado pela ocupação que o Réu vem promovendo.». Alegam, as autoras, que são as únicas e universais herdeiras de EE, o qual adquirira por herança, e já em estado de casado com a Primeira Autora em comunhão de adquiridos, um imóvel, sito à Rua ..., com entrada pelos n.ºs ... e ..., correspondente a um prédio em propriedade total com quatro divisões suscetíveis de utilização independente, todas elas afetas a habitação, e devidamente identificadas como casas ... a ..., imóvel que, em virtude do decesso havido, passou a integrar património da herança. Mais alegam que o Réu vem ocupando o imóvel melhor identificado como casa n.º ..., que tem entrada pelo n.º ... e ..., fazendo-o sem título, porquanto louva-se do decesso da sua mãe, FF, ocorrido em 17 de novembro de 2020, para aí permanecer, pretendendo arrogar-se na sucessão na qualidade de arrendatário daquela. Referem que o imóvel em questão foi, no que à divisão mencionada se refere, arrendado, há mais de 40 anos, ao pai do Réu, GG, com quem foi celebrado o contrato de arrendamento, sendo em nome do pai do Réu que eram emitidos os respetivos recibos. Verificado o óbito do arrendatário, sucedeu-lhe na qualidade de arrendatária, a pessoa da sua esposa, FF, em nome de quem os então Senhorios passaram a emitir os recibos, na qualidade de viúva do primitivo arrendatário. A partir do momento em que se verificou o óbito desta última, a 17 de novembro de 2020, estava o Réu obrigado a, no prazo de 6 meses, proceder à restituição do imóvel que se achava a ocupar. Em vez disso, porém, o Réu procurou obstar à materialização desse fito, o que vem fazendo até ao momento atual. O Réu, após comunicar e documentar o falecido da sua saudosa mãe, pretendeu ver efetivado o que então apelidou de “direito de lhe suceder na qualidade de arrendatário”, o que não é aceite pelas autoras. Concluem que a manutenção do réu no imóvel impõe às autoras, desde a morte da arrendatária, a impossibilidade de o utilizar, dali recolhendo proventos, que em face do mercado circundante nunca seria inferior a €200,00 (duzentos euros) por mês. O réu contestou, impugnando o alegado pelas autoras e excecionando a transmissão do arrendamento operada pela morte da sua mãe, alegando que os pais, GG e FF, entretanto falecidos, eram titulares de contrato de arrendamento do imóvel sito à Rua ..., em Vila Nova de Gaia, sendo estes casados no regime da comunhão geral, sem convenção antenupcial. Alega o réu que com a morte do cônjuge marido não caducou o direito ao arrendamento nem tão pouco se transmitiu ao cônjuge sobrevivo, antes subsiste o direito na titularidade do cônjuge do arrendatário. Só agora, com a morte do cônjuge mulher é que o arrendamento se transmite ao filho, o réu, porquanto o mesmo residia com os pais, arrendatários, há mais de 40 anos. Perante a recusa das autoras em receber a renda do local arrendado, o réu vem procedendo, desde fevereiro de 2021, ao seu depósito mensal da mesma na Banco 1.... * Realizada a audiência de julgamento, foi proferida sentença, onde se decidiu:“Assim, em face ao que tudo supra fica dito e com aqueles fundamentos, julga-se que a herança indivisa de EE, representada pelas Autoras enquanto únicas e universais herdeiras daquele, é legítima proprietária do prédio urbano, sito à Rua ..., ..., ..., prédio esse inscrito na matriz predial urbana da União de Freguesias ... e ... sob o artigo matricial ..., e descrito na Conservatória do Registo Predial de Vila Nova de Gaia sob a ficha ..., do qual faz parte a casa n.º .... Condena-se o réu a restituir de imediato à referida herança indivisa o imóvel vindo de identificar, que vem ocupando sem título, livre de pessoas e bens, e em bom estado de conservação. Condena-se o réu a pagar uma indemnização à herança indivisa de EE, cuja liquidação se relega para execução de sentença até ao limite do pedido e de que devem ser descontados os depósitos que hajam sido consignados pelo réu, pelos prejuízos que a ocupação que o Réu vem promovendo do imóvel identificado supra tem causado à dita herança, à razão de €200,00 (duzentos euros) mensais e contada desde o dia 17 de maio de 2021 (termo do sexto mês posterior ao óbito da mãe do Réu) e até efetiva entrega do imóvel, tudo acrescido de juros de mora desde a data de vencimento de cada mês de ocupação, até efetivo e integral pagamento. Condena-se o réu a pagar às autoras a sanção pecuniária compulsória, de €100,00 – cem euros – mensais, por cada mês de atraso no cumprimento da decisão de restituição do imóvel por si ocupado id. supra. Custas pelo réu. Registe e notifique.”. * Não se conformando com o assim decidido, veio o réu interpor o presente recurso, que foi admitido como apelação, a subir nos próprios autos e com efeito suspensivo, formulando as seguintes conclusões:“I. A Mma. Juiz a quo não efectuou a correcta aplicação do direito na decisão recorrida, pelo que deve a mesma, por essa razão, ser revogada e proferido Acórdão que julgue improcedente por não provada, determinando, em consequência, transmissão do contrato de arrendamento ao Réu/Recorrente, operada pela morte da sua mãe, uma vez que este não caducou; II. À data do óbito do pai do Réu/Recorrente já se encontrava em vigor a Lei nº 6/2006, de 27 de Fevereiro, pelo que ao abrigo da versão em vigor, à data, do art. 1068º do Código Civil, estava instituída na ordem jurídica portuguesa o princípio da comunicabilidade do arrendamento habitacional ao cônjuge do arrendatário; III. À data da entrada em vigor da Lei nº 6/2006, de 27 de Fevereiro, a relação conjugal do arrendatário ainda subsistia, condição indispensável para a sua aplicação – relação constituída antes (06/10/1949) e que terminou em 04/12/2006, com o óbito do primitivo arrendatário; IV. Arrendamento que foi celebrado apenas por um membro do casal já constituído; V. Existindo apenas uma transmissão, de mãe para filho, consigo residente há mais de 40 anos; VI. Reconhecendo a comunicabilidade do contrato de arrendamento do imóvel sito à Rua ..., em ..., Vila Nova de Gaia, à mãe do Réu/Recorrente, FF, por morte do seu cônjuge (04/12/2006), e consequentemente a transmissão do mesmo, por sua morte, a seu filho, DD, por estarem preenchidos os pressupostos dos arts. 57º nº 1 de NRAU e 1068º e 1106º do Código Civil; VII. A decisão proferida não aplica correctamente e viola o disposto no artigo 57.º do Novo Regime do Arrendamento Urbano, aprovado pela Lei n.º 6/2006, de 27 de Fevereiro e nos artigos 1068.º e 1106.º, do Código Civil; VIII. Nesta conformidade, tendo em consideração os fundamentos aduzidos para o presente recurso, e que não foram devidamente apreciados pela Mma Juiz a quo, bem como o teor da decisão colocada em crise, deve a mesma ser revogada e substituída por outra que reconheça a transmissão do contrato de arrendamento para o Réu/Recorrido por óbito de sua mãe, por não ter o mesmo caducado por morte do primitivo arrendatário. IX. mantendo-se o contrato de arrendamento tal como oportunamente peticionado nos autos, fazendo-se a acostumada JUSTIÇA!» * As Autoras/Recorridas apresentaram contra-alegações, concluindo pela manutenção da decisão recorrida.* Após os vistos legais, cumpre decidir.* II - DO MÉRITO DO RECURSO * 1. Objeto do recurso O objeto do recurso é delimitado pelas conclusões da alegação do recorrente, não podendo este tribunal conhecer de matérias nelas não incluídas, a não ser que as mesmas sejam de conhecimento oficioso – cfr. arts. 635º, nº 4, 637º, nº 2, 1ª parte e 639º, nºs 1 e 2, todos do Código de Processo Civil. Atendendo às conclusões das alegações apresentadas pelo apelante, a questão a apreciar é apenas de direito e prende-se com decidir se deve considerar-se, ou não, que com a morte da mãe do réu, caducou o contrato de arrendamento em causa, por ter já havido uma primeira transmissão do arrendamento, do primitivo arrendatário para o respetivo cônjuge, mãe do réu, pelo que não é possível uma nova transmissão, agora, para o réu que com a sua mãe vivia, ou se, pelo contrário, ocorrem os fundamentos para a transmissão do arrendamento, como o recorrente pretende. * 2. Matéria de facto com relevância para a decisãoO tribunal de 1ª instância considerou provada a seguinte matéria de facto (que não foi impugnada): A) As Autoras são as únicas e universais herdeiras de EE, respetivamente, marido e pai daquelas, falecido que foi o mesmo no dia 27 de outubro de 2020. B) O falecido EE adquirira por herança, e já em estado de casado com a Primeira Autora em comunhão de adquiridos, um imóvel, sito à Rua ..., com entrada pelos n.ºs ... e ..., correspondente a um prédio em propriedade total com quatro divisões suscetíveis de utilização independente, todas elas, afetas a habitação, e devidamente identificadas como casas ... a .... C) Este imóvel, em virtude do decesso havido, passou igualmente a integrar património da herança aberta por óbito do dito marido da Primeira Autora, sendo esta, conjuntamente com as suas filhas, aqui Segunda e Terceira Autoras, as únicas herdeiras e legítimas interessadas. D) O imóvel acima identificado, encontra-se inscrito na matriz predial urbana da União de Freguesias ... e ... sob o artigo ..., e descrito na Conservatória do Registo Predial de Vila Nova de Gaia sob a ficha n.º ..., a favor da sobredita herança e do marido e pai das Autoras, respetivamente. E) O imóvel em questão foi, em data que se desconhece, mas há mais de 40 anos, (arrendado) ao pai do aqui Réu, GG, com quem foi celebrado o contrato de arrendamento. F) Quando o dito imóvel foi adquirido pelo falecido marido e pai das Autoras, já se encontrava há longos anos arrendado, sendo que, aquando da sua aquisição, tendo-lhe sido disponibilizados os recibos de renda até então emitidos, sendo em nome do pai do Réu que eram emitidos os respetivos recibos. G) Verificado o óbito do pai do réu, sucedeu-lhe na qualidade de arrendatária, a pessoa da sua esposa, FF, tendo os senhorios passado a emitir os recibos em seu nome. H) FF faleceu a 17 de novembro de 2020. I) O réu, com a falecida convivente, não procedeu à entrega do imóvel, nem nos seis meses posteriores ao óbito, nem até à presente data. J) Por via duma primeira comunicação, datada de 09 de dezembro de 2020, e recebida no dia subsequente, após comunicar e documentar o falecido da sua mãe, pretendeu ver efetivado o que então apelidou de “direito de lhe suceder na qualidade de arrendatário”. K) A tal comunicação foi dada resposta pela cabeça-de-casal, primeira Autora, em 16 de dezembro de 2020, que recusou reconhecer ao Réu o direito a que o mesmo procurava arrogar-se, destacando que “a transmissão do arrendamento para habitação por morte do arrendatário só se processa por uma vez”, sendo que ela já ocorrera do seu pai em relação à sua mãe, motivo que, perante a verificação do decesso desta última, conduziu a que “o contrato de arrendamento [tenha caducado] (…)”, mais se instando o Réu “(…) a proceder à restituição do imóvel no prazo de 6 meses. L) O Réu voltou a persistir na tese da propugnada transmissão da posição de arrendatário, por comunicação datada de 20 de janeiro de 2021, a que foi dada resposta, datada de 25 de janeiro de 2021, nos mesmos termos da anterior resposta e insistindo pela restituição do imóvel, no prazo legalmente estipulado. M) O réu manteve, em troca de correspondência entre as partes, a posição já expressa anteriormente, informando que concretizou a 05 de fevereiro de 2021 o depósito de €39,00 (trinta e nove euros), por a “Senhoria não reconhece[r] como inquilino por transmissão por morte». N) As autoras responderam mantendo a posição anteriormente expressa, em carta datada de 17 de fevereiro de 2021. O) Na perspetiva de resolução consensual do litígio foi hipotisada a celebração de um contrato de arrendamento cuja minuta, por carta datada de 04 de maio, as Autoras fizeram dirigir ao Réu, fixando como data limite para a sua subscrição o dia 10 de maio, e estipulando que, caso a mesma não fosse aceite, o imóvel devia ser entregue nas condições inicialmente esclarecidas até 17 de maio do corrente. P) O réu propôs novas alterações ao previsto pelas Autoras, no que estas não anuíram, tendo renovado, por escrito, ao Réu a necessidade de ser promovida a entrega do imóvel, o que o réu não efetuou. Q) A manutenção do réu no imóvel impõe às autoras, desde a morte da arrendatária, a impossibilidade de o utilizar, dali recolhendo proventos, que em face do mercado circundante nunca seria inferior a €200,00 (duzentos euros) por mês. * 3. Decidindo:* 3.1. Alteração oficiosa da matéria de facto O recurso do Apelante versa apenas sobre a matéria de direito. Contudo, ao abrigo da norma enunciada no n.º 1 do art. 662.º do Cód. Proc. Civil, bem como por força do disposto na al. c) do n.º 2 do mesmo art. 662.º (interpretado a contrario), impõe-se alterar a decisão de facto, concretamente o facto dado como provado sob a alínea G), facto que se afigura ser conclusivo, por conter a resolução de uma das questões de direito em discussão na ação. Efetivamente, discute-se nos autos se com a morte do pai do réu, o arrendamento se transmitiu à sua esposa, mãe do réu, ou se tal transmissão não ocorreu por estarmos perante uma situação de comunicabilidade conjugal. Ora, o facto em causa tem o seguinte teor: G) Verificado o óbito do pai do réu, sucedeu-lhe na qualidade de arrendatária, a pessoa da sua esposa, FF, tendo os senhorios passado a emitir os recibos em seu nome. O facto, tal como se mostra dado como provado resulta ser conclusivo, uma vez que ao referir que verificado o óbito do pai do réu, a esposa “sucedeu-lhe” na qualidade de arrendatária, o facto encerra em si a decisão da questão referida, a qual cabe decidir em sede de apreciação do mérito. Assim, altera-se, oficiosamente, tal facto, o qual deve passar a ter a seguinte redação: G) Verificado o óbito do pai do réu, os senhorios passaram a emitir os recibos em nome da esposa, FF. Sobre a admissibilidade da alteração oficiosa, cfr. o Ac. do STJ de 17-10-2019, processo 3901/15.8T8AVR.P1.S1, Ac. do Tribunal da Relação de Guimarães, Processo 381/18.0T8VRL.G1, de 21-11-2019, bem como ANTÓNIO ABRANTES GERALDES, Recursos em Processo Civil, Coimbra, Almedina, 2022, pp. 357 e 358. Para além da alteração do facto referido, impõe-se, ainda, acrescentar um outro, que não consta da matéria de facto dada como provada, mas foi alegado e resulta do assento de casamento junto aos autos, na sequência de despacho que determinou a respetiva junção, já durante a audiência de julgamento, relativo ao casamento dos pais do réu. Assim, acrescenta-se à matéria de facto provada, uma alínea com a seguinte redação: R) GG e FF celebraram casamento católico, sem convenção antenupcial, no dia 6 de outubro de 1949. * Posto isto:3.2. Entende o recorrente que se verificou uma errónea interpretação do Tribunal a quo, na análise da questão da transmissão do direito ao arrendamento para o réu, na sequência do óbito da arrendatária, sua mãe, com quem vivia. Isto porque, considera que aquando do decesso de seu pai, primitivo arrendatário, não ocorreu uma transmissão do arrendamento para a sua mãe, uma vez que se verificava a comunicabilidade do arrendamento entre o casal. Vejamos. Refere a decisão recorrida, a este respeito: “No caso destes autos o contrato de arrendamento foi celebrado há mais de 40 anos pelo pai do réu. No dia 04.12.2006 faleceu o pai do réu. O réu era, desde 1949, casado com FF. FF faleceu no dia 17 de novembro de 2020. O contrato de arrendamento foi celebrado antes do início de vigência do Regime do Arrendamento Urbano (RAU), aprovado pelo Decreto-Lei n.º 321-B/90, de 15 de Outubro, sendo que o facto constitutivo do direito à transmissão do arrendamento por morte do pai do réu (o seu óbito) ocorreu na vigência do Novo Regime do Arrendamento Urbano (NRAU), aprovado pela Lei n.º 6/2006, de 27 de Fevereiro) e iii) o facto constitutivo do direito invocado pelo réu a transmissão do arrendamento por morte da mãe (o óbito da mãe) ocorreu depois da entrada em vigor das alterações ao Novo Regime do Arrendamento Urbano (NRAU) introduzidas pela legislação nos anos de 2012 (Lei n.º 31/2012, de 14-08, em vigor a partir de 12-11-2012), de 2014 (Lei n.º 79/2014, de 19-129, em vigor a partir de 18-01-2015) e de 2019 (Lei n.º 13/2019, de 12-02, em vigor a partir de 13-02-2019). Antes de mais, a questão da comunicabilidade do direito ao arrendamento no âmbito de um casamento não se coloca porque até à alteração do artigo 1068.º do Código Civil pela Lei n.º 6/2006, de 27/02, não existia norma legal da qual resultasse aquela comunicabilidade (bem ao «invés, quer a redacção inicial do artigo 1110.º do Código Civil de 1966, quer posteriormente a redacção do artigo 83.º do RAU, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 321 -B/90, de 15/10, afastavam de forma expressa da comunhão de bens no casamento o direito ao arrendamento para habitação». Portanto, «[a]fastada a qualidade de co-titular do contrato de arrendamento (por comunicabilidade) da mãe d[o] ré[u], alcança-se que a mesma adquiriu a posição de arrendatária ao suceder nessa posição por morte do seu marido e titular originário do contrato. É com base nesse pressuposto que se deve decidir a outra questão suscitada, qual seja a se por morte da mãe, essa posição contratual se transmitiu de novo para [o] ré[u].»”. Não nos parece, contudo, que se mostre corretamente apreciada esta questão da comunicabilidade do arrendamento ao cônjuge, no caso concreto. É certo que quando o contrato de arrendamento dos autos foi celebrado, há mais de 40 anos, e até 2006, quando entrou em vigor a Lei 6/2006, de 27-02 (NRAU), o direito do arrendatário de prédios urbanos para habitação não se comunicava ao cônjuge, conforme decorria, primeiro, do então art. 1110.º, nº 1 do Código Civil e, depois, do art. 83.º do RAU, nos quais se dispunha: “seja qual for o regime matrimonial, a posição do arrendatário [urbano para habitação] não se comunica ao cônjuge e caduca por sua morte (…)”. Contudo, em 2006, com a Lei n.º 6/2006 (que aprovou o NRAU) a matéria do arrendamento de prédios urbanos regressou ao Código Civil, onde, o seu art. 1068.º passou a dispor (até hoje) que “o direito do arrendatário [seja para fins habitacionais ou não] comunica-se ao seu cônjuge, nos termos gerais e de acordo com o regime de bens vigente”. Acresce que, o legislador do NRAU resolveu o problema da aplicabilidade aos contratos vigentes à data da sua entrada em vigor, mediante uma disposição transitória, ao dispor no art. 59.º, nº 1 da lei 6/2006 (NRAU), sob a epígrafe “aplicação no tempo”, que “o NRAU aplica-se aos contratos celebrados após a sua entrada em vigor, bem como às relações constituídas que subsistam nessa data, sem prejuízo do previsto nas normas transitórias”, pelo que, por interpretação, resulta do art. 59.º, nº 1 do NRAU que o art. 1068.º do C. Civil se aplica às relações constituídas que subsistam nessa data. Acresce, também, que, ainda que o NRAU (Lei Nova) nada estabelecesse quanto à sua aplicação no tempo, a solução não seria diferente. A doutrina do facto passado – segundo a qual seria retroativa toda a lei que se aplicasse a factos passados (e aos seus efeitos) antes do seu início de vigência – é complementada pelo chamado princípio da aplicação imediata da lei nova às situações em curso no momento do seu início de vigência. A lei, segundo o art. 12.º, nº 1 do C. Civil, dispõe só para o futuro, quando não lhe seja atribuída eficácia retroativa pelo legislador; e, mesmo nesta hipótese, presumem-se ressalvados os efeitos já produzidos pelos factos que a lei se destina a regular. Mas, no art. 12.º, nº 2 do C. Civil, a lei distingue dois tipos de leis ou de normas: aquelas leis que dispõem sobre os requisitos de validade (substancial ou formal) de quaisquer factos ou sobre os efeitos de quaisquer factos – 1.ª parte – que só se aplicam a factos novos; e aquelas leis que dispõem sobre o conteúdo de certas situações jurídicas e o modelam sem olhar aos factos que a tais situações deram origem – 2.ª parte – leis essas que se aplicam a relações jurídicas constituídas antes da lei nova, mas subsistentes ou em curso à data do seu início de vigência. Ora, o art. 1068.º do C. Civil tutela os interesses duma generalidade de pessoas (os cônjuges dos arrendatários) que se achem ou possam vir a achar ligadas por uma certa relação jurídica, de modo a poder dizer-se que tal disposição atinge essas pessoas/cônjuges, não enquanto contraentes, mas enquanto pessoas ligadas (por intermédio do seu cônjuge) a um certo tipo de vínculo contratual (no caso, o arrendamento). Mais, da interpretação da Lei Nova (do art. 1068.º do C. Civil) resulta que tal disposição visa o conteúdo ou os efeitos da situação jurídica contratual em si mesmos, abstraindo-se do facto que lhe deu origem, pelo que é de aplicação imediata. Assim, a partir de 27 de junho de 2006, com a entrada em vigor do NRAU, faz parte do estatuto jurídico do cônjuge (não casado no regime da separação de bens) do arrendatário a comunicação da qualidade de arrendatário (pois que este é o efeito da comunicação do direito ao arrendamento ao cônjuge): por força do art.º 1068, dá-se a conversão de um contrato de arrendamento que, quanto ao arrendatário, era singular num contrato de arrendamento plural. (cfr. Acórdão do STJ, de 17-10-2023, Processo 4184/21.6T8FNC.L1.S1, disponível em dgsi.pt). Na decisão recorrida faz-se referência ao que foi decidido no Acórdão deste Tribunal da Relação do Porto e desta mesma secção, de 13-07-2022, no Processo 2503/22.7T8PRT.P1 (Relator: ARISTIDES RODRIGUES DE ALMEIDA). Sucede que, a situação dos autos não se afigura ser idêntica à que foi apreciada nesse acórdão, ocorrendo, antes, uma diferença significativa e que consiste no facto de o primitivo arrendatário, pai do réu, ter falecido no dia 04-12-2006, ou seja, já na vigência do NRAU (Lei 6/2006, de 27-02). Assim, aplicando-se o art. 1068.º do Código Civil, na redação da Lei n.º 6/2006, de 27/02, aos contratos celebrados após a entrada em vigor do NRAU, bem como aos contratos celebrados anteriormente, para tal norma jurídica se aplicar a um contrato de arrendamento celebrado antes da Lei n.º 6/2006 é indispensável que a relação conjugal do arrendatário ainda subsistisse na data em que entrou em vigor a mencionada redação do art. 1068.º do Código Civil. É precisamente o que ocorre no caso, já que os pais do réu estariam já casados quando teve início o arrendamento, e a relação conjugal manteve-se, ou subsistiu, até ao óbito do cônjuge marido, já na vigência do NRAU, ou seja, quando já estava em vigor o art. 1068.º com a redação da Lei n.º 6/2006, de 27/02, que determina a comunicabilidade do arrendamento entre o casal, pelo que se pode concluir que a mãe do réu era cotitular do arrendamento, o que, por sua vez, leva a concluir que com a morte do marido, o arrendamento não se transmitiu para a mesma que já era cotitular no arrendamento. Concretizando, os dados temporais relevantes para a decisão da questão colocada nos autos são os seguintes: - O contrato de arrendamento foi celebrado pelo pai do réu há mais de 40 anos, ou seja, foi celebrado antes do início de vigência do Regime do Arrendamento Urbano (RAU), aprovado pelo Decreto-Lei n.º 321-B/90, de 15 de outubro; - A morte do pai do réu ocorreu no dia 04-12-2006, ou seja, o facto constitutivo do direito à transmissão do arrendamento por morte do pai do réu (o seu óbito) ocorreu já na vigência do Novo Regime do Arrendamento Urbano (NRAU), aprovado pela Lei n.º 6/2006, de 27 de fevereiro) e - A morte da mãe do réu ocorreu no dia 17-11-2020, ou seja, o facto constitutivo do direito invocado pelo réu à transmissão do arrendamento por morte da mãe (o óbito da mãe) ocorreu depois da entrada em vigor das alterações ao Novo Regime do Arrendamento Urbano (NRAU) introduzidas pela legislação nos anos de 2012 (Lei n.º 31/2012, de 14-08, em vigor a partir de 12-11-2012), de 2014 (Lei n.º 79/2014, de 19-129, em vigor a partir de 18-01-2015) e de 2019 (Lei n.º 13/2019, de 12-02, em vigor a partir de 13-02-2019). Assim, face à comunicabilidade do direito ao arrendamento no âmbito de um casamento, tal como se encontra prevista no artigo 1068.º do Código Civil, na versão introduzida pela Lei n.º 6/2006, de 27/02, que aprovou o NRAU, aplicável à situação em discussão, como decidido, o direito do arrendatário comunica-se ao seu cônjuge, nos termos gerais e de acordo com o regime de bens vigente. E tendo os pais do réu sido casados num regime de comunhão de bens, casamento que perdurou até ao óbito do cônjuge marido, já na vigência do NRAU, afigura-se possível sustentar a aplicação da referida normal legal à situação dos autos, para com base na mesma concluir que a mãe do réu também era «arrendatária primitiva» (em resultado da comunicabilidade do direito). * Posto isto, vejamos, então, se o direito ao arrendamento se transmitiu para o réu, por morte de sua mãe, considerada arrendatária primitiva por via da comunicabilidade conjugal.A transmissão da posição de arrendatário por morte do anterior titular tem de ser aferida em função da lei em vigor no momento em que ocorre o facto constitutivo desse direito, ou seja, o óbito do titular do arrendamento, que, no caso, ocorreu no dia 17-11-2020, data do falecimento da mãe do réu. Parece não haver dúvidas de que é aplicável o regime do artigo 57.º do NRAU, uma vez que o contrato de arrendamento foi celebrado há mais de 40 anos, ou seja, antes da aprovação do RAU, pelo que ficou sujeito ao regime transitório do Capítulo II do Título II do NRAU. Por sua vez, o art. 57.º aplicável ao caso, é o da redação com as alterações introduzidas, sucessivamente, pelo artigo 4.º da Lei n.º 31/2012, de 14.08, em vigor a partir de 12.11.2012, pelo artigo 3.º da Lei n.º 79/2014, de 19.12, em vigor a partir de 18.01.2015, e pelo artigo 4.º da Lei n.º 13/2019, 12.02, em vigor a partir de 13.02.2019. Este aspeto é determinante no caso em virtude da modificação que a Lei n.º 13/2019 introduziu no aludido artigo 57.º do NRAU.”. Na sua versão inicial, quanto à transmissão por morte no arrendamento para habitação, o artigo 57.º dispunha do seguinte modo, quanto aos filhos, que é o que para o caso interessa: 1 - O arrendamento para habitação não caduca por morte do primitivo arrendatário quando lhe sobreviva: (…) d) Filho ou enteado com menos de 1 ano de idade ou que com ele convivesse há mais de um ano e seja menor de idade ou, tendo idade inferior a 26 anos, frequente o 11.º ou 12.º ano de escolaridade ou estabelecimento de ensino médio ou superior; e) Filho ou enteado maior de idade, que com ele convivesse há mais de um ano, portador de deficiência com grau comprovado de incapacidade superior a 60%. 2 - Nos casos do número anterior, a posição do arrendatário transmite-se, pela ordem das respetivas alíneas, às pessoas nele referidas, preferindo, em igualdade de condições, sucessivamente, o ascendente, filho ou enteado mais velho. 3 - Quando ao arrendatário sobreviva mais de um ascendente, há transmissão por morte entre eles. 4 - A transmissão a favor dos filhos ou enteados do primitivo arrendatário, nos termos dos números anteriores, verifica-se ainda por morte daquele a quem tenha sido transmitido o direito ao arrendamento nos termos das alíneas a), b) e c) do n.º 1 ou nos termos do número anterior. Com a Lei n.º 13/2019, de 12-02, a redação do preceito passou a ser a seguinte: 1 - O arrendamento para habitação não caduca por morte do primitivo arrendatário quando lhe sobreviva: (…) d) Filho ou enteado com menos de 1 ano de idade ou que com ele convivesse há mais de 1 ano e seja menor de idade ou, tendo idade inferior a 26 anos, frequente o 11.º ou o 12.º ano de escolaridade ou estabelecimento de ensino médio ou superior; e) Filho ou enteado, que com ele convivesse há mais de um ano, com deficiência com grau comprovado de incapacidade igual ou superior a 60 /prct.. f) Filho ou enteado que com ele convivesse há mais de cinco anos, com idade igual ou superior a 65 anos, desde que o RABC do agregado seja inferior a 5 RMNA. (…). É do regime fixado pela Lei nº 13/2019 que o réu pretende beneficiar, nomeadamente das alterações introduzidas por esse diploma legal ao art. 57.º do NRAU e a reposição de vários artigos do Código Civil, concretamente do art. 1106.º, que dispõe: “Artigo 1106.º Transmissão por morte 1 - O arrendamento para habitação não caduca por morte do arrendatário quando lhe sobreviva: a) Cônjuge com residência no locado; b) Pessoa que com ele vivesse em união de facto há mais de um ano; c) Pessoa que com ele vivesse em economia comum há mais de um ano. (…)”. Entende o Recorrente que o Tribunal a quo deveria ter considerado a al. c), do n º 1, do art. 1106º do Código Civil (“O arrendamento para habitação não caduca por morte do arrendatário quando lhe sobreviva pessoa que com ele vivesse em economia comum há mais de um ano.”), na redação dada pela Lei nº 13/2019, de 12-02-2019, que estabeleceu medidas destinadas a corrigir situações de desequilíbrio entre arrendatários e senhorios, reforçar a segurança e a estabilidade do arrendamento urbano e a proteger os arrendatários em situações de especial fragilidade, e, fazendo uma melhor subsunção da factualidade provada e melhor interpretação das normas previstas no artigo 57.º, do NRAU, e nos artigos 1068.º e 1106º do Código Civil, deve a douta Sentença de que se recorre ser revogada e substituída por outra que declare o direito do Ré/Recorrido ao arrendamento, por transmissão por óbito de sua mãe. Ora, o art. 1051.º, alínea d), do Código Civil estabelece a regra de que o contrato de locação caduca por morte do locatário. Por sua vez, o art. 1106.º do mesmo diploma legal, introduzido pelo NRAU, dispõe sobre a transmissão por morte do arrendamento para habitação, prevendo as situações em que o mesmo não caduca por morte do arrendatário, quando lhe sobreviva, entre outras e no que para o caso interessa, “pessoa que com ele vivesse em economia comum há mais de um ano”. Como já se referiu, foi este preceito que o recorrente invocou para ver proceder a sua pretensão. Sucede que, como também já se mencionou, o NRAU previu uma regulamentação específica para os contratos de arrendamento com início na vigência do RAU ou anteriores, prevendo expressamente as situações em que há lugar à transmissão do arrendamento por morte do primitivo arrendatário, precisamente no referido art. 57.º. Esse regime transitório e, em concreto, o art. 57.º, n.º 1, do NRAU, continua a manter-se em vigor enquanto subsistirem os contratos de arrendamento para habitação celebrados antes ou durante a vigência do RAU. O direito de transmissão do arrendamento por morte é um direito de gozo que só existe a partir da data do falecimento do arrendatário. No atual regime do contrato de arrendamento para habitação a regra para os novos contratos é a de que o arrendamento se transmite aos sucessores do arrendatário – cfr. art. 1106º, do Código Civil – não sendo tal preceito aplicável aos contratos celebrados antes do NRAU, valendo, para estes, como acabou de se analisar, o regime transitório previsto no art. 57º, da Lei nº 6/2006, de 27/2, que estabelece condições muito restritivas para a transmissão mortis causa do arrendamento habitacional. Assim, quanto aos descendentes, que é o que para o caso concreto interessa, o art. 57.º do NRAU, apenas admite a transmissão (ou seja, o arrendamento para habitação não caduca) quando ao primitivo arrendatário sobreviva filho ou enteado com menos de 1 ano de idade ou que com ele convivesse há mais de 1 ano e seja menor de idade ou, tendo idade inferior a 26 anos, frequente o 11.º ou o 12.º ano de escolaridade ou estabelecimento de ensino médio ou superior; filho ou enteado, que com ele convivesse há mais de um ano, com deficiência com grau comprovado de incapacidade igual ou superior a 60 %; ou filho ou enteado que com ele convivesse há mais de cinco anos, com idade igual ou superior a 65 anos, desde que o RABC do agregado seja inferior a 5 RMNA. Diremos, ainda, que o novo regime do Código Civil (art. 1106.º), que liberalizou a transmissão do arrendamento por morte do arrendatário, encontra justificação no facto de nos novos contratos o prolongamento da relação contratual já não pode ser imposto unilateralmente pelo arrendatário (o senhorio pode opor-se à renovação do contrato no termo do prazo acordado – arts. 1096.º, nº 2 e 1097.º, do C. Civil – ou, não tendo sido fixado qualquer prazo, pode denunciá-lo com uma antecedência de 5 anos – art. 1101.º, al. c), do C. Civil). Já quanto aos contratos celebrados anteriormente à entrada em vigor do NRAU, como na maioria dos casos, o senhorio não pode denunciar o contrato no termo do prazo acordado, estando vinculado a renovações sucessivas, enquanto for essa a vontade do arrendatário, considerou-se justificado diminuir, em algumas circunstâncias, a possibilidade de transmissão do arrendamento. Aos contratos de arrendamento para habitação celebrados antes da entrada em vigor do RAU, aprovado pelo DL nº 321-B/90, de 15/10, e em que o primitivo arrendatário tenha falecido na vigência do NRAU, aprovado pela Lei nº 6/2006, de 27/5, aplica-se, pois, o regime de transmissão por morte do locatário previsto nas normas transitórias do art. 57º, dessa Lei. Posto isto, constata-se que a pretensão do Recorrente apenas pode ser enquadrável na al. f), do nº 1, do art. 57.º do NRAU, ou seja, na possibilidade de transmissão para filho do primitivo arrendatário, que com este convivesse há mais de cinco anos, exigindo-se, contudo, que o filho tenha idade igual ou superior a 65 anos e que o RABC (rendimento anual bruto corrigido) do agregado seja inferior a 5 RMNA (Retribuição Mínima Nacional Anual). Ora, da matéria de facto considerada como assente, e que não foi impugnada, nada consta sobre a idade ou os rendimentos do réu, pelo que não estando provadas as condições previstas na al. f), do nº 1, do art. 57.º do NRAU, não se lhe transmite o arrendamento para habitação. Por sua vez, não ocorrendo a transmissão do contrato de arrendamento por morte da arrendatária, mãe do réu, a morte da mesma constitui causa legal de caducidade automática desse contrato, com a consequente obrigação de restituição do locado ao senhorio após o decurso de seis meses sobre a data da morte do locatário – arts. 1051.º, al. d) e 1053.º, do Código Civil. Improcedem, assim, as conclusões da apelação, devendo, por isso, a decisão recorrida ser mantida. * III. DISPOSITIVO* Pelos fundamentos expostos, os Juízes desta Secção Cível do Tribunal da Relação do Porto acordam em julgar a apelação improcedente e, em consequência, confirmam, integralmente, a decisão recorrida. Custas pelo apelante – art. 527º, nº1 e 2, do CPC. Porto, 2024-01-25 Manuela Machado Isoleta de Almeida Costa Paulo Duarte Teixeira |