Acórdão do Tribunal da Relação do Porto
Processo:
6704/21.7T8VNG.P1
Nº Convencional: JTRP000
Relator: RITA ROMEIRA
Descritores: LAPSO MATERIAL
ÓNUS DE IMPUGNAÇÃO DA MATÉRIA DE FACTO
REJEIÇÃO DO RECURSO POR INCUMPRIMENTO DESSES ÓNUS
Nº do Documento: RP202404186704/21.7T8VNG.P1
Data do Acordão: 04/18/2024
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: IMPROCEDENTE
Indicações Eventuais: 4ª SECÇÃO (SOCIAL)
Área Temática: ,
Sumário: I - O lapso material manifesto da sentença consiste em escrever algo diferente do que se pretendia escrever e tem que resultar da própria decisão como uma divergência, clara e ostensiva, entre a vontade real do juiz e o que nela veio a ser escrito, não se confundindo com os “erros de julgamento”, que ocorrem nas situações em que o julgador disse o que queria dizer mas decidiu mal, decidiu contra lei expressa ou contra os factos provados.
II - A deficiência da motivação da decisão proferida em matéria de facto não é causa de nulidade da sentença.
III - Deve ser rejeitado pela Relação o recurso sobre a matéria de facto por falta de cumprimento pelo recorrente dos ónus estabelecidos no art. 640º do Código de Processo Civil, caso aquele se limite a fazer uma indicação genérica da prova que na sua perspectiva justificaria uma decisão diversa daquela a que chegou o Tribunal recorrido, em relação a um conjunto dos factos, quer dados como provados quer dados como não provados.
IV - O cumprimento dos ónus estabelecidos naquele art. 640º exige que o recorrente concretize quer os pontos da matéria de facto sobre os quais recai a sua discordância quer, ainda, que especifique quais as provas produzidas que, por as ter como incorrectamente apreciadas, imporiam decisão diversa, quanto a cada um dos factos, ou bloco de factos relacionados entre si, sob pena de rejeição da impugnação da decisão da matéria de facto.
Reclamações:
Decisão Texto Integral: Proc. Nº 6704/21.7T8VNG.P1
Origem: Tribunal Judicial da Comarca do Porto Juízo do Trabalho de Vila Nova de Gaia - Juiz 2
Recorrente: AA
Recorrida: A..., Unipessoal Lda.

Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação do Porto

I – RELATÓRIO
O A., AA, Cartão de Cidadão nº ..., contribuinte nº ..., beneficiário da Segurança Social nº ..., residente na Rua ..., nº ..., 2º direito, ... Vila Nova de Gaia, instaurou acção declarativa sob a forma de processo comum laboral contra a Ré, A..., Unipessoal Lda., com sede na Rua ..., ... Vila Nova de Gaia, pessoa coletiva nº ..., na qual pede que, “deve a presente acção ser julgada procedente por provada e, em consequência:
A) Ser declarada a nulidade do despedimento do Autor, por ilícito, dada a falta de cumprimento de todas as fases do processo disciplinar, decretando-se que subsiste o vínculo laboral.
B) Ser a Ré condenada a pagar à autora a quantia € 1.905,00, acrescida de juros legais desde a citação até integral pagamento a título da indemnização em virtude do despedimento ilícito;
C) Ser a Ré condenada ao pagamento de € 87,45 de horas de formação não efectuada;
D) Ser a Ré condenada ao pagamento de € 166,57 de horas de trabalho suplementar realizadas e não pagas;
E) Ser a Ré condenada num total de € 109,45 relativa ao Descanso Compensatório não realizado;
F) Ser a Ré condenada ao pagamento de € 3.000,00 de danos não patrimoniais por todos os prejuízos sofridos em face ao despedimento ilícito e abusivo;
G) Ser a ré condenada a pagar ao Autor as prestações pecuniárias vencidas, relativas às retribuições que deixou de auferir desde a data do despedimento até à data da sentença.”.
Fundamenta o seu pedido alegando, em síntese, que foi admitido ao serviço da Ré, em 10 de Agosto de 2020, mediante contrato de trabalho sem termo, passando a exercer as funções de pintor, nas obras da responsabilidade da Ré, 5 dias por semana, 40 horas semanais, sendo certo que, muitas vezes tinha que laborar horas extras nomeadamente, ao Sábado e/ou Domingo em algumas obras para as quais era destacado. Em contrapartida, a R. comprometeu-se e começou a pagar ao A. uma retribuição base mensal no valor de € 635,00 a título de retribuição mensal.
Mais, alega que sempre recebeu tais remunerações, em numerário, sem nunca ter recebido qualquer recibo de vencimento. Acrescendo que, as retribuições nunca eram pagas por inteiro e eram pagas de forma faseada e muitas vezes com atraso. Acontece que, por motivos de saúde em 11 de Março de 2021, colocou baixa médica que se estendeu até ao dia 07 de Junho de 2021. Ora, durante o tempo que se encontrou de baixa médica, tentou junto da R. que lhe fossem pagas as horas suplementares em divida. Sendo certo que, a R. nunca as pagou e ameaçou o A. que só as pagaria, caso aquele apresentasse a sua carta de demissão
Alega, ainda, que nunca apresentou qualquer denúncia de contrato de trabalho e comunicou à R. que finda a baixa médica, se apresentaria ao serviço, ou seja, dia 08.06.2021. E, no dia 08.06.2021, pelas 08:00 horas, apresentou-se ao trabalho, na sede da R., sendo certo que, não lhe foi aberta a porta e ninguém lhe permitiu que regressasse ao trabalho. Acrescendo que, a R., na pessoa do seu legal representante, já lhe havia transmitido verbalmente, em 07.06.2021, que aquele se encontrava despedido.
Por fim, alega que, em virtude do horário de trabalho praticado, não lhe foi pago trabalho suplementar realizado e as horas relativas à formação profissional não efectuada pela sua entidade patronal.
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Realizada a audiência de partes, não foi possível a sua conciliação e a ré, notificada para o efeito, apresentou contestação, argumentando, em síntese, que nunca despediu o Autor, tendo sido este que abandonou a obra onde se encontrava a trabalhar e lhe comunicou que se despedia e, como tal, não iria mais trabalhar, depois apresentou a baixa médica durante vários meses e nunca mais apareceu na empresa para trabalhar.
Conclui que, “deve a ação ser julgada improcedente, por não provada, com as inerentes consequências legais.
Deve, ainda, ser julgada procedente e provada a litigância de má-fé e, consequentemente, ser o autor condenado como litigante de má-fé em multa e indemnização condigna, de valor nunca inferior a €1.000,00 (mil euros) a favor da ré.”.
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O autor apresentou resposta, reafirmando o alegado na inicial e requerendo, também, a condenação da Ré como litigante de má fé em multa e indemnização não inferior a 1.500€.
Termina, “reitera-se tudo o que foi alegado e peticionado na Petição Inicial, bem como se requer que seja o Autor absolvido do pedido de litigância de má-fé, com as demais consequências legais.
Mais se requer que a Ré seja condenada por litigância de má-fé e, por consequência, condenada no montante nunca inferior a € 1.500, a título de multa e indemnização ao Autor.”
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Nos termos do despacho datado de 25.11.2021, foi considerada não escrita a matéria alegada nos artigos 1º a 21º da resposta, fixado à causa o valor de 5.268,47€ e invocando-se a sua simplicidade da causa e a desnecessidade de fazer atuar o princípio do contraditório e de adequação especial, dispensou-se a convocação de audiência prévia, proferiu-se saneador tabelar e na consideração, de não se afigurar que a matéria controvertida revestisse complexidade, não se procedeu à identificação do objeto do litígio e à enunciação dos temas da prova.
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Os autos prosseguiram para julgamento e realizada a audiência de discussão, nos termos documentados na acta de 17.05.2022, foi proferida sentença que terminou com a seguinte: “DECISÃO:
Pelo exposto, julga-se a presente ação não provada e improcedente e, em consequência:
a) Absolve-se a Ré dos pedidos deduzidos pelo Autor, inclusivé do pedido de condenação como litigante de má fé;
b) Absolve-se o Autor do pedido de condenação como litigante de má fé deduzido pela Ré.
As custas serão suportadas pelo Autor, sem prejuízo do apoio judiciário de que beneficia – art. 527º do Código de Processo Civil.
Registe e notifique.”.
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Inconformado o A. interpôs recurso, nos termos das alegações juntas, que terminou com as seguintes: “CONCLUSÕES
A. A sentença Recorrida é nula nos termos das alíneas b), c) e d) do n.º 1 do artigo 615.º e artigo 607º todos do Código de Processo Civil, uma vez que não especifica os fundamentos de facto e de direito que justificaram a decisão.
B. Aliás nem consta da decisão quais os factos, especificamente dados como não provados, ao contrário do que acontece com os factos dados como provados.
Posto isto,
C. Na opinião do Recorrente, na decisão e fundamentação apresentada na sentença em sindicância, está em causa a violação do princípio da aquisição processual, do dever da boa administração da justiça em busca da verdade material, dos poderes de cognição do Tribunal, bem com das regras relativas às provas atendíveis para fundamentação da decisão.
D. Paralelamente, verificam-se verdadeiras contradições entre a prova produzida nos autos e a decisão final, tendo sido ignoradas muitas das declarações prestadas em audiência de discussão e julgamento, e teor de documentos, ou foram retiradas das mesmas ilações que em nada se coadunam com a realidade dos factos relatados e com a sequência dos acontecimentos.
E. Alega a Mma. Juiz a quo que “na formação da sua convicção o Tribunal atendeu aos meios de prova disponíveis(…)
F. Não pode, contudo, o aqui Recorrente, concordar com a supra transcrita fundamentação.
G. Efetivamente o Recorrente laborava nas obras da responsabilidade da Ré, 5 dias por semana, 40 horas semanais, sendo certo que, muitas vezes tinha que laborar horas extras.
H. Acresce que, do próprio teor das mensagens trocadas entre Recorrente e Legal Representante da Recorrida (Docs. 9 a 12 juntos com a PI), se verifica que a Recorrida se encontrava em divida para com o Recorrente, no que concerne às horas suplementares.
I. Sopesa que, ainda do teor de tais mensagens, decorre que o Legal representante da Ré, por já não pretender que o aqui Recorrente voltasse ao trabalho queria que aquele apresentasse uma carta de despedimento, apenas e tão só para fugir à sua responsabilidade.
J. Com efeito, ficou demonstrado e provado, ao contrário do sustentado na sentença recorrida que durante o tempo que se encontrou de baixa médica, o aqui Recorrente tentou junto da Recorrida que lhe fossem pagas as horas suplementares em divida.
K. E que, a Recorrida nunca as pagou e ameaçou o A. que só as pagaria, caso aquele apresentasse a sua carta de demissão.
L. Conforme também decorre da prova produzida em audiência de discussão e julgamento que, o aqui Recorrente nunca apresentou qualquer denúncia de contrato de trabalho e comunicou à Recorrida que finda a baixa médica, se apresentaria ao serviço, ou seja dia 08.06.2021. (cf. doc. 12 junto com a PI).
M. Com efeito, no dia 08.06.2021, pelas 08:00 horas, o aqui Recorrente apresentou-se ao trabalho, sendo certo que, não lhe foi aberta a porta e ninguém permitiu que aquele regressasse ao trabalho.
N. Contudo, o Autor comunicou por mensagem escrita (Doc. 12 junto com a PI) que iria apresentar-se ao trabalho, indicando o local, e à hora de inicio da jornada laboral (08H:00), não se encontrava lá ninguém.
O. Sendo certo que, o horário de trabalho se iniciava à 08:00 da manhã, conforme decorre das declarações do legal representante da Recorrida, bem como do depoimento da testemunha BB.
P. Ora, tendo o Legal representante da Ré, recebido a mensagem por parte do Recorrente, informando-o que se iria apresentar ao trabalho, se sabia que o inicio da jornada laboral iria começar antes das 8:00 horas, porque razão não lhe deu essa indicação, ou então não informou qual a obra para o qual aquele se devia dirigir?!
Q. Com efeito, o aqui Recorrente, perante esta atitude da Recorrida, considerou que tinha sido despedido, conforme aliás, e salvo devido respeito, qualquer trabalhador consideraria.
R. Com efeito, salvo devido respeito pelo Tribunal “a quo”, o Recorrente foi despedido verbal e ilicitamente pela Recorrida, despedimento esse, sem ter sido precedido de competente Processo Disciplinar.
S. Ficou igualmente e claramente demonstrado que a Recorrida não dava formação profissional aos seus trabalhadores, isto porquanto, decorre das declarações do legal representante da Recorrida, que a formação prestada era apenas nas obras que iriam iniciar.
T. Por fim, e salvo devido respeito, também andou mal, o dou Tribunal “a quo”, ao não dar como provados os danos não patrimoniais sofridos pelo Autor, bem como aquele face ao despedimento ilícito de que foi alvo, não ter conseguido prover ao sustento da sua filha menor.
U. Isto porquanto, durante o seu depoimento, sempre referiu o seu estado psicológico e o que o motivou a colocar baixa médica, bem como das mensagens que enviou ao legal representante da Ré, lhe falou sobre a situação em que se encontrava a filha, que aquele se encontrava a passar fome (docs. 9 a 11 juntos com a PI).
V. Com efeito, não se percebe a razão pela qual de as supra mencionadas declarações de parte não terem sido valoradas pelo Tribunal “a quo”, uma vez que em sede de motivação é referido que foram valorados todos os meios de prova.
W. Contudo, salvo devido respeito, tal valoração, não se encontra reflectida na decisão recorrida, dado que decisão tomada assenta maioritariamente nas declarações/versão trazida aos autos pela Ré, e que conforme supra melhor explanado não corresponde à verdade.
X. E claro está, que por uma questão de experiência e regras comuns, o trabalhador (parte mais frágil na relação laboral), não poderia ter outro meio de prova que corroborasse as suas declarações, o que não significa por si só que as mesmas não sejam verdadeiras.
Y. E face a tudo supra melhor descrito, não se pode concordar com a sentença “a quo” quando refere que: “Relativamente ao alegado despedimento, não resultou minimamente demonstrado que a Ré tivesse despedido verbalmente o Autor ou de qualquer outra forma lhe tivesse comunicado a intenção de despedimento, (…)
Z. Salvo devido respeito, a supra mencionada motivação é completamente contraditória com toda a prova produzida em sede de audiência de discussão e julgamento, e com as regras da experiência comum.
AA. Com o devido respeito, parece-nos que a Mma. Juiz, procurou fundamentar uma alegada e inexistente abandono do posto de trabalho apenas se baseando na versão aqui trazida pela Ré, optando por dar mais credibilidade a esta, do que ao Recorrente, trabalhador, que se encontra em clara posição de inferioridade.
BB. Assim, além da total omissão dos factos não provados, em claro incumprimento do n.º 4 do artigo 607.º do CPC, sendo que alguns assumem uma veste gritantemente relevante na descoberta da verdade material, sucede que mesmo no que concerne aos factos provados, estes contêm em si mesmos graves e insanáveis contradições, o que impede, necessariamente, que, em conjunto, possam servir para fundar a convicção do Tribunal a quo.
CC. As considerações e ilações retiradas da Contestação, carecem assim de prova bastante que as sustente e de nexo de causalidade entre os factos arguidos pela Ré, a prova produzida em sede dos articulados e audiência, e as consequentes conclusões retiradas pelo Tribunal a quo.
DD. Infelizmente a sentença em sindicância limita-se a apresentar um conjunto de factos alegadamente provados e outros alegadamente não provados sem o rigor e a fundamentação necessária e essencial para que o Recorrente possa exercer o seu direito ao contraditório na plenitude.
EE. O Tribunal a quo tinha o dever de atender a todas as provas produzidas, tivessem estas emanado, ou não, da parte que devia produzi-las, em consagração do princípio da aquisição processual (artigo 413.º do CPC) o que, conforme continuaremos a ver infra, efectivamente não aconteceu, tendo aquele mantido a sua posição estanque relativamente ao que havia sido alegado nos articulados.
FF. “O despedimento traduz-se na ruptura da relação laboral, por acto unilateral do empregador, mediante uma declaração feita por palavras, escrito ou qualquer outro meio de manifestação da vontade (declaração negocial expressa) ou que possa ser deduzida de actos equivalentes, que, com toda a probabilidade a revelem (declaração negocial tácita).
GG. Essa declaração tem sempre de ser dotada do sentido inequívoco de pôr termo ao contrato de trabalho, que deve ser apurado segundo a capacidade de entender e diligência de um normal declaratário, colocado na posição do real declaratário, e, em caso de dúvida, esta resolve-se contra o trabalhador, por ser quem tem o ónus da prova do despedimento (arts. 342.º, n.º 1 e 346.º do Código Civil e 414.º do Código de Processo Civil).” (Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães datado de 19.11.2019)
HH. No domínio do despedimento promovido pelo empregador tem-se entendido que a vontade de pôr termo ao contrato há-de ser “inequívoca” e “concludente”.
II. No caso sub judice, a Recorrida, tendo conhecimento de que o aqui Recorrente se iria apresentar ao trabalho, conforme supra melhor se expos, não se dignou a comunicar que não se iria encontrar no lugar onde habitualmente, antes de seguirem para as obras, bem como não se dignou a comunicar ao Recorrente onde se devia dirigir para trabalhar.
JJ. Portanto, salvo devido respeito, perante esta atitude do legal representante da Recorrida, revela “inequivocamente, ao trabalhador, enquanto declaratário normal, colocado na posição do real declaratário, a vontade do empregador de fazer cessar o contrato de trabalho.”
KK. Salvo devido respeito, ficou provado, que a Recorrida, na qualidade de empregadora recusou a prestação de trabalho oferecida pelo trabalhador e impediu o acesso ao seu posto de trabalho, uma vez que tendo conhecimento que aquele iria regressar após baixa médica, não se encontrava no local para que o trabalhador pudesse iniciar a sua jornada de trabalho, nem lhe deu indicações e/ou, instruções para retomar a actividade laboral.
LL. Com o devido respeito que a decisão a quo nos merece, de toda a prova produzida nos presentes autos, conforme supra melhor se expôs os artigos 4º (parte final), 6º, 9º, 10º, 13º, 14º, 24º e 40º (quanto aos problemas de saúde, filha menor e impossibilidade de lhe prover alimentos), 46º, 50º e 53º da p. i. e 5º, 11º, 14º e 17º da resposta deveriam ser dados como provados, atentas as declarações prestadas pelo legal representante da Recorrida, ( (MIN) 05:37 A 05:52(MIN), (MIN) 13:37 A 14:50(MIN) e do (MIN) 16:0 A 16:42(MIN) do ficheiro nº 20220517144505_16026173_2871615, das declarações prestadas pelo Recorrente ( (MIN) 01:38 A 02:13(MIN), (MIN) 03:50 A 04:39(MIN), (MIN) 07:50 A 08:34 (MIN), (MIN) 09:00 A 10:42(MIN), (MIN) 10:42 A 13:45(MIN) E (MIN) 14:46 A 16:31(MIN) do ficheiro nº 20220517150812_16026173_2871615).
MM. E, em contraposição os pontos 5, 6 e 13, dos factos dados como provados, deveriam ser dados como não provados.
Nestes termos e nos melhores de Direito que V/ Exa. Doutamente suprirão, deve ser concedido provimento ao presente recurso, revogando-se em consequência a sentença do Tribunal a quo, julgando procedente os pedidos vertidos na Petição Inicial do ora Recorrente, condenando-se a Recorrida nos exactos termos aí peticionados.
ASSIM FARÃO V. EXAS., COMO É HÁBITO, INTEIRA E SÃ JUSTIÇA!”.
*
Notificada a Ré veio contra-alegar, nos termos que constam das alegações juntas, terminando com as seguintes CONCLUSÕES:
1 – A Apelante viola o estabelecido na al. b) do nº 1 do art. 640º CPC, na medida em que não indica com exactidão as passagens da gravação em que se funda o seu recurso, limitando-se a indicar a hora de início e de fim do depoimento de cada uma das testemunhas, pelo que deve o recurso ser rejeitado;
Caso assim não se entenda,
2 - As alegações apresentadas pelo Recorrente, nomeadamente as suas conclusões, não cumprem o estipulado no artº 639º do CPC, pelo que a Apelante deve ser convidada a esclarecer e sintetizar as suas conclusões, sob pena de não se conhecer do recurso;
3 – Cabia ao apelante o ónus da prova do seu alegado despedimento. A circunstância de na acção em causa a Recorrida ter alegado o abandono do trabalho por parte do trabalhador não faz inverter o ónus da prova que incumbe ao trabalhador quanto ao despedimento. E quanto a essa prova, a mesma é totalmente omissa.
Nestes termos e nos melhores de direito:
a) Deve o recurso ser rejeitado com fundamento na violação do disposto na al. b) do nº 1 do art. 640º CPC;
Sem prejuízo,
b) Deve a decisão recorrida confirmada na íntegra, assim se fazendo a costumada JUSTIÇA!”.
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Nos termos que constam do despacho de 23.11.2022, o Tribunal “a quo” admitiu a apelação, com efeito meramente devolutivo e ordenou a sua remessa a esta Relação. No mesmo despacho dizendo o seguinte: “O autor, nas alegações de recurso argui a nulidade da sentença nos termos das alíneas b), c) e d) do n.º 1 do artigo 615.º e artigo 607º todos do Código de Processo Civil, uma vez que não especifica os fundamentos de facto e de direito que justificaram a decisão. E, ainda, porque não especifica os factos não provados.
Afigura-se manifesta a sem razão do autor. A sentença enumera separadamente os factos provados. Depois os não provados. E faz o seu enquadramento jurídico.
Pelo que se indefere a arguida nulidade – art. 617º, 1, CPC.
Notifique. “
*
O Ex.mo Procurador Geral Adjunto teve vista nos autos, nos termos do art. 87º nº3, do CPT, tendo emitido parecer no sentido de que deverá confirmar-se a douta sentença recorrida, no essencial, porque “cabendo ao Recorrente a prova do despedimento na base do qual instaura a acção, e não sendo conseguida, deverá esta, em consequência, improceder.”. 2. Quanto à matéria de facto, na verdade, o Recorrente impugna a matéria de facto em bloco e indica os meios de prova, mas sem indicar os concretos meios que determinavam uma decisão diversa, o que, em bom rigor, não cumpre com o disposto no art.º 640º, do CPC.”.
Notificadas, nenhuma das partes respondeu.
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Cumpridos os vistos, há que apreciar e decidir.
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Questão Prévia:
Alegando a recorrida que, “Analisadas as alegações apresentadas pelo Recorrente, nomeadamente as suas conclusões, podemos verificar que as mesmas são apresentadas de modo ostensivamente prolixo, confuso e até contraditório, pelo que não cumpre com o estipulado no art.º 639º do CPC, aplicado ex vi, artº 1º CPT” e que, “o Recorrente não cumpriu o disposto no referido preceito legal (639º CPC, aplicado ex vi, artº 1º CPT), sendo certo que o âmbito dos recursos é balizado pelas conclusões que devem ser claras e sintéticas, o que não se verificou no caso dos autos. Face ao exposto, nos termos do art.º 639º, nº 3 do CPC, aplicado ex vi, artº 1º CPT, deve o Recorrente ser convidado a esclarecer e sintetizar as suas conclusões, sob pena de não se conhecer do recurso”, importa que comecemos por dizer o seguinte.
É certo que, perfilhamos do entendimento da jurisprudência, no sentido expresso no (Acórdão do STJ de 18/06/2013, Proc. nº 483/08.0TBLNH.L1.S1, in www.dgsi.pt) citado pela recorrida em cujo sumário de lê que, “I - O recorrente deve terminar as suas alegações de recurso com conclusões sintéticas (onde indicará os fundamentos por que pede a alteração ou anulação da decisão recorrida). II - Essas conclusões devem ser idóneas para delimitar de forma clara, inteligível e concludente o objecto do recurso, permitindo apreender as questões de facto ou de direito que o recorrente pretende suscitar na impugnação que deduz e que o tribunal superior cumpre solucionar. III - Não devem valer como conclusões arrazoadas longas e confusas em que se não discriminam com facilidade as questões invocadas.”. Aliás, conforme o estipulado no art. 639º do CPC, aplicado ex vi, art. 1º CPT.
Ora, sendo desse modo e sendo certo que, no caso, as alegações do recurso não são um exemplo de perfeição. São prolixas, repetitivas, confusas e não distinguem regularmente os fundamentos de cada uma das questões suscitadas, em todo o caso, são compreensíveis. A demonstrá-lo, veja-se, desde logo, o referido pela recorrida no início da sua alegação, quando diz que, “Interpondo o recurso, o Recorrente delimitou o seu objecto a três questões, a saber: a) vicio ou falta de fundamentação; b) erro de julgamento; e c) a aplicação do direito. Pretende o ora Apelante, com o presente recurso, obter a revogação da referida sentença, arguindo e alegando, para o efeito, em síntese, diversos erros no julgamento da matéria de facto, assim como na aplicação do direito”, o que denota, sem dúvida, que a recorrida as compreendeu.
Logo, sendo verdade que ocorre alguma prolixidade, ainda assim, não obstante maior esforço da nossa parte, na consideração ainda de que a recorrida, como dissemos, se pronunciou sem dificuldade de maior, entendemos, até por razões de celeridade processual, que não se justifica, no caso, a formulação de tal convite, razão pela qual nos pronunciaremos de seguida sobre o recurso.
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O objecto do recurso é delimitado pelas conclusões das alegações da recorrente, cfr. art.s 635º, nº 4 e 639º, nºs 1 e 2 do Código de Processo Civil aprovado pela Lei nº 41/2013, de 26 de Junho, (diploma a que pertencerão os demais artigos a seguir mencionados, em outra indicação de origem) aplicável “ex vi” do art. 87º, nº 1, do Código de Processo do Trabalho, ressalvadas as questões de conhecimento oficioso que ainda não tenham sido conhecidas com trânsito em julgado.
Assim as questões a apreciar e decidir consistem em saber:
- se a sentença recorrida padece de erro material
- se a sentença é nula;
- se ocorre deficiente motivação da decisão de facto;
- se ocorre erro na decisão proferida em matéria de facto, em concreto, se o Tribunal “a quo” errou no julgamento quanto aos artigos 4º (parte final), 6º, 9º, 10º, 13º, 14º, 24º e 40º (quanto aos problemas de saúde, filha menor e impossibilidade de lhe prover alimentos), 46º, 50º e 53º da p. i. e 5º, 11º, 14º e 17º da resposta deveriam ser dados como provados e ao dar como provada a matéria constante dos pontos 5, 6 e 13, dos factos dados como provados que, deveriam ser dados como não provados.
- se deve ser revogada a sentença recorrida e julgada procedente a acção.
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II - FUNDAMENTAÇÃO
A) DE FACTO
A 1ª instância, discutida a causa fixou os seguintes factos provados:
“1. A Ré é uma empresa, cujo objeto social é a compra e venda de bens imóveis e revendados adquiridos para esse fim; promoção imobiliária; arrendamento de bens imobiliários; gestão e acompanhamento de obras; atividades de engenharia e arquitetura; construção civil - cfr. certidão permanente anexa à p. i., como documento n. 1.
2. No exercício dessa sua atividade, admitiu ao seu serviço o Autor em 10 de agosto de 2020, mediante contrato de trabalho sem termo.
3. Por força deste contrato, o Autor passou a exercer sob as ordens, direção e fiscalização da R., as funções de Pintor.
4. O Autor laborava nas obras da responsabilidade da Ré, 5 dias por semana, 40 horas semanais.
5. O Autor auferia o vencimento mensal de 665€.
6. Nem sempre o vencimento do Autor era pago por inteiro, sendo pago, por vezes, em prestações e com atraso.
7. O Autor esteve com baixa médica entre 11 de março de 2021 e 7 de junho de 2021 - cfr. certificados de incapacidade temporária para o trabalho anexos à p. i., como documentos n.ºs 3 a 8.
8. O Autor nunca apresentou à Ré documento escrito a denunciar o seu contrato de trabalho.
9. No dia 08.06.2021, pelas 08:00 horas, o Autor apresentou-se à porta da residência do gerente da Ré, CC, e ninguém abriu a porta.
10. O Autor era um trabalhador normalmente cumpridor.
11. A Ré não entregou ao Autor a declaração com vista à obtenção do subsídio de desemprego.
12. O Autor ainda estava, na data da propositura da ação, inscrito como trabalhador da Ré na Segurança Social - cfr. documento anexo à contestação.
13. O Autor, em 10.03.2021, quando se encontrava a laborar, a certa altura arrumou “as suas coisas” e disse que se ia embora e que não trabalhava mais.
14. Para além do descrito em 9), o Autor nunca mais contactou a Ré, nem se apresentou para trabalhar.
15. O Autor foi enviando à Ré as prorrogações da baixa, que a Ré aceitou.
Factos não provados:
Não se provaram os factos alegados nos artigos 4º (parte final), 6º, 9º, 10º, 13º, 14º, 24º e 40º (quanto aos prolemas de saúde, filha menor e impossibilidade de lhe prover alimentos), 46º, 50º e 53º da p. i., 18º, 19º, 20º e 23º da contestação e 5º, 11º, 14º e 17º da resposta.
Relativamente aos factos alegados no artigo 11º da p. i., provou-se apenas o que consta no ponto 8) dos factos provados.
Relativamente aos factos alegados no artigo 12º da p. i., provou-se apenas o que consta no ponto 9) dos factos provados.
Relativamente aos factos alegados nos artigos 15º e 18º da p. i., provou-se apenas o que consta no ponto 10) dos factos provados.
Relativamente aos factos alegados nos artigos 16º e 17º da contestação, provou-se apenas o que consta no ponto 13) dos factos provados.
Relativamente aos factos alegados no artigo 24º da contestação, provou-se apenas o que consta no ponto 14) dos factos provados.
Não se respondeu à restante matéria, por se tratar de matéria sem interesse para a boa decisão da causa, conclusiva ou de direito, mera impugnação ou ter ficado prejudicada pela resposta aos restantes factos, como sucedeu, nomeadamente quanto aos factos alegados no artigo 41º da p. i.”.
*
B) O DIREITO
- Do erro material da sentença
Como decorre desde logo do seu requerimento de interposição de recurso, o A. não se conforma com a sentença proferida que decidiu absolver a Ré dos pedidos por si deduzidos contra ela, sustentando a sua discordância na existência de vícios que lhe imputa, alegadamente, determinantes da sua revogação e condenação daquela nos pedidos vertidos na Petição Inicial.
Começa alegando que, “A sentença proferida pelo Tribunal a quo padece, na opinião do Recorrente, de erro material, conforme se passará a expor”.
E, prossegue, com a transcrição dos factos que foram dados como provados, afirmando de seguida, “E não consta da sentença recorrida, em sede de “relatório” quais os factos dados como não provados, contudo podemos retirar da leitura da mesma que: “ Não se provaram os factos alegados nos artigos 4º (parte final), 6º, 9º, 10º, 13º, 14º, 24º e 40º (quanto aos prolemas de saúde, filha menor e impossibilidade de lhe prover alimentos), 46º, 50º e 53º da p. i., 18º, 19º, 20º e 23º da contestação e 5º, 11º, 14º e 17º da resposta.
Relativamente aos factos alegados no artigo 11º da p. i., provou-se apenas o que consta no ponto 8) dos factos provados.
Relativamente aos factos alegados no artigo 12º da p. i., provou-se apenas o que consta no ponto 9) dos factos provados.
Relativamente aos factos alegados nos artigos 15º e 18º da p. i., provou-se apenas o que consta no ponto 10) dos factos provados.
Relativamente aos factos alegados nos artigos 16º e 17º da contestação, provou-se apenas o que consta no ponto 13) dos factos provados.
Relativamente aos factos alegados no artigo 24º da contestação, provou-se apenas o que consta no ponto 14) dos factos provados.””.
Que dizer?
Sem qualquer dúvida que, o recorrente não tem razão.
É evidente que, a sentença recorrida não padece de qualquer erro material, nem aquele o concretiza. Ao contrário, o que expõe a seguir à sua afirmação, limitada a “aventar” a existência de erro material da sentença, infirma de todo esta.
Pois, aquele, seguramente, não ocorre por da sentença não constar descrito o teor dos factos dados como não provados, (fundamento por si invocado, para alegar a existência daquele), apesar de como bem se nota, não ter tido, ele, qualquer dificuldade de perceber quais eram, através da leitura daquela, como bem o demonstra a sua alegação.
Ora, o erro material da sentença, como já bem o dissemos, em outro Acórdão, deste mesmo colectivo, de 18.10.2021, proferido no Proc. nº 1960/19.3T8VNG.P1, que aqui seguimos, é mais do que o que o recorrente invoca.
“O lapso material manifesto da sentença consiste em escrever algo diferente do que se pretendia escrever e tem que resultar da própria decisão como uma divergência, clara e ostensiva, entre a vontade real do juiz e o que nela veio a ser escrito.”, como se sumariou, no (Acórdão do TRG, de 16.05.2019, relatado pelo Desembargador, Alcides Rodrigues, Proc. nº 4527/14.9T8FNC.L1.S1, in www.dgsi.pt (sítio da internet onde se encontram disponíveis os demais acórdãos a seguir citados, sem outra indicação)).
Como se lê, também, no (Acórdão desta Relação, de 18.05.2020, Proc. nº 3338/18.7T8PNF.P1, relatado pelo Desembargador Nelson Fernandes e subscrito pelas, aqui, relatora e 1ª Adjunta), “Os “erros materiais” previstos nos artigos 613.º e 614.º do CPC traduzem-se na divergência entre a vontade real e a vontade declarada do julgador, e só a verificação de tal vício permite o afastamento da regra da intangibilidade da sentença, não se confundindo com os “erros de julgamento”, que ocorrem nas situações em que o julgador disse o que queria dizer mas decidiu mal, decidiu contra lei expressa ou contra os factos provados”.
No mesmo sentido, ensinou (Castro Mendes, in “Direito Processual Civil”, vol. II, pág. 313), “Erro material ou lapso é a inexactidão ou omissão verificada em circunstâncias tais que é patente, através dos outros elementos da sentença ou até do processo, a discrepância com os dados verdadeiros e se pode presumir por isso uma divergência entre a vontade real do juiz e o que ficou escrito”.
Ora, transpondo o que antecede para o caso, além de o recorrente não o invocar, não se vislumbra que a Mª Juíza “a quo” tenha escrito, na sentença recorrida, algo diferente do que pretendia, nem através dos seus elementos é possível observar qualquer divergência entre a vontade real do juiz e o que na sentença veio a ser escrito.
A elaboração da sentença, sem a inclusão do teor dos factos dados como não provados no “relatório”, mas devidamente identificados, naquela parte da decisão onde a Mª Juíza responde à matéria de facto alegada pelas partes, não configura qualquer divergência entre a vontade real da mesma e o que na sentença escreveu, acrescendo que o recorrente percepcionou, perfeitamente, quais os factos que foram dados como não provados, através da leitura daquela, como já dissemos. E, ainda, porque se a sentença recorrida padecesse de ausência de indicação dos factos dados como não provados – o que não se concede – nunca estaríamos perante um erro material da sentença.
Acontece que, a sentença recorrida é, absolutamente, clara na indicação dos factos que foram dados como provados e dos factos que foram dados como não provados pelo Tribunal tanto, assim, que é o próprio Recorrente que admite que da leitura da sentença “podemos retirar” quais os factos dados como não provados, (veja-se página 4 das alegações de recurso).
Obviamente, como a seguir se verifica, pela impugnação deduzida, o facto de o recorrente discordar, de factos que foram dados como não provados, é demonstrativo de que os percepcionou e questão diversa de qualquer falha ou vício imputável à sentença “a quo”.
Conclui-se, assim, que a sentença não padece de qualquer erro material e, por isso, improcede esta questão da apelação.
*
- Da nulidade da sentença
Na alegação desta questão, encabeçada pelo título “III - DO VÍCIO OU FALTA DE FUNDAMENTAÇÃO” diz o recorrente que, “a sentença recorrida enferma de falta de fundamentação em alguns pontos e, noutros casos, omite factos, concluindo de forma errónea, produzindo de forma negligente conclusões que afectam a boa decisão da causa” e prossegue dizendo, se bem o compreendemos, não compreender nem a decisão de facto, nem a de direito, com fundamento, no que expressa ser seu entendimento e citações doutrinárias e jurisprudenciais que efectua, termina a sua alegação, perante a conclusão que formula, requerendo, “Em face do exposto, e nos termos da alínea b) do nº.1 e do nº.4 do artigo 615º, conjugado com o nº. 4 do artigo 607.º, ambos do CPC, requer-se que seja declarada nula a decisão que não julgou a acção procedente e não condenou a Recorrida nos pedidos formulados, pelo Recorrente.”.
Isto, depois, de ter iniciado a questão, em apreciação, como dissemos, sob a epígrafe, “Do vício ou falta de fundamentação” e a alegação de que, “Dispõe o artigo 607.º do Código de Processo Civil (de ora em diante abreviadamente designado por CPC), no seu n.º 4, que o juiz, na fundamentação da sentença, especifica os fundamentos que foram decisivos para a sua convicção.
Complementarmente, nos termos das alíneas b), c) e d) do n.º 1 do artigo 615.º do mesmo Diploma, decorre que a sentença considerar-se-á nula quando não especifique os fundamentos de facto e de direito que justificaram a decisão, os mesmos se apresentem ambíguos ou obscuros, ou ainda que o juiz deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar ou conheça de questões de que não podia tomar conhecimento”, terminando, apenas, como se retira da conclusão A), com a afirmação de que, “A sentença Recorrida é nula nos termos das alíneas b), c) e d) do n.º 1 do artigo 615.º e artigo 607º todos do Código de Processo Civil, uma vez que não especifica os fundamentos de facto e de direito que justificaram a decisão.”.
Vejamos.
As causas de nulidade da sentença ou de qualquer decisão são as que vêm taxativamente enumeradas no nº 1 do art. 615º.
Nele se dispõe que, é nula a sentença quando: “a) não contenha a assinatura do juiz; b) não especifique os fundamentos de facto e de direito que justificam a decisão; c) os fundamentos estejam em oposição com a decisão ou ocorra alguma ambiguidade ou obscuridade que torne a decisão ininteligível; d) o juiz deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar ou conheça de questões de que não podia tomar conhecimento; e) o juiz condene em quantidade superior ou em objecto diverso do pedido.”.
Em anotação ao art. 668º do CPC de 1961, que corresponde ao actual art. 615º, refere (Abílio Neto, in “Código de Processo Civil Anotado”, 23ª ed., pág. 948), que “os vícios determinantes da nulidade da sentença correspondem a casos de irregularidades que afectam formalmente a sentença e provocam dúvidas sobre a sua autenticidade, como é a falta de assinatura do juiz, ou ininteligibilidade do discurso decisório por ausência total de explicação da razão por que decide de determinada maneira (falta de fundamentação), quer porque essa explicação conduz, logicamente, a resultado oposto do adoptado (contradição entre os fundamentos e a decisão), ou uso ilegítimo do poder jurisdicional em virtude de pretender conhecer questões de que não podia conhecer (excesso de pronúncia) ou não tratar de questões de que deveria conhecer (omissão de pronúncia). São, sempre, vícios que encerram um desvalor que excede o erro de julgamento e que, por isso, inutilizam o julgado na parte afectada.”.
Como ensinam, (Antunes Varela, J. Miguel Bezerra e Sampaio e Nora, in Manual de Processo Civil, 2.ª ed. Revista e Actualizada, 1985, pág. 686), as causas de nulidade constantes do elenco do nº1, do art. 615º, não incluem o “chamado erro de julgamento, a injustiça da decisão, a não conformidade dela com o direito substantivo aplicável, o erro na construção do silogismo judiciário”.
Ora, regressando ao caso e analisando os argumentos constantes quer das alegações quer das conclusões do recorrente, em relação ao que o mesmo invoca e diz até, não compreender, há, desde já, que dizer que, não se descortina o cometimento de qualquer vício, susceptível de configurar qualquer nulidade da sentença, em especial, as que aludem as al.s b), c) e d) do nº 1, do art. 615º que o recorrente invoca.
Senão, vejamos.
Na petição inicial, o Autor demanda a R., com os fundamentos acima mencionados no relatório inicial, salientando aqui, ter sido verbalmente despedido pelo legal representante da R., reclamando, por isso, que seja declarada a nulidade do seu despedimento e a R. condenada a indemnizá-lo em virtude daquele e a pagar-lhe os créditos que reclama derivados da execução e cessação do contrato que mantiveram.
Apreciando, na sentença recorrida, a Mª Juíza “a quo”, após ter realizado o julgamento e decidido a factualidade que não resultou provada e provada, fundamentando a sua convicção, face ao que decorre daquela considerou, inexistir qualquer elemento nos autos, que permitisse concluir que a Ré tivesse despedido verbalmente o Autor ou de qualquer outra forma lhe tivesse comunicado a intenção de despedimento, nos termos por ele alegados, não tendo sido possível retirar nenhuma conclusão segura sobre o que realmente aconteceu e, por isso, tendo absolvido a R. dos pedidos, nos seguintes termos que se transcrevem: «…, no caso, não se provando que tenha existido qualquer declaração expressa de despedimento por parte da Ré dirigida ao Autor, da aplicação do regime antes enunciado sobre a natureza da declaração recetícia, só poderia chamar-se à discussão a figura da declaração tácita, que, como se explicitou anteriormente, para que possa ser considerada eficaz terá de poder ser deduzida de atos que com toda a probabilidade a revelam (2.ª parte do n.º 1 do citado artigo 217.º doCC), estando assim dotada do sentido inequívoco de pôr termo ao contrato – exigência que se justifica para evitar o abuso de despedimentos efetuados com dificuldade de prova pelo trabalhador.
E esse sentido deverá ser apurado de acordo com a capacidade de entender e diligência de um normal declaratário, colocado na posição do real declaratário, ou seja, o sentido normal da declaração, conforme disposto no n.º 1 do artigo 236.º do CC, e como tal ser entendida pelo trabalhador.
Não se nos afigura, porém, tendo por base os factos provados, que esses sejam bastantes para, nos termos expostos, se poder concluir que o comportamento da Ré é dotado do exigido sentido inequívoco de pôr termo ao contrato do Autor.
Na verdade, o facto objetivo de o Autor se ter apresentado à porta da residência do legal representante da Ré e ninguém lhe ter aberto a porta, não se assume, como é exigido nos termos supra afirmados, como uma declaração de vontade tácita relevante, isto é, um comportamento concludente do empregador de onde se deduza, com toda a probabilidade, a sua vontade de fazer cessar o contrato de trabalho para o futuro.
Aliás, demonstrativo de que esse facto não teve esse significado é a circunstância de a Ré ter mantido o Autor inscrito na Segurança Social, como seu trabalhador, até ao presente.
Deste modo, não pode a analisada atuação da Ré ser configurada como um despedimento de facto – corporizado numa atitude inequívoca da entidade patronal, de onde decorre necessariamente a manifestação de uma vontade de fazer cessar a relação laboral.
Tão pouco é possível concluir, como defende a Ré, que o Autor abandonou o trabalho, desde logo, porque o abandono do trabalho, para valer como como denúncia do contrato, só pode ser invocado pelo empregador após comunicação ao trabalhador dos factos constitutivos do abandono ou da presunção do mesmo, por carta registada com aviso de receção para a última morada conhecida deste - cfr. artigo 403º, n. 3 do Código do Trabalho.
Não tendo o Autor logrado provar o despedimento, improcede o seu pedido quanto à peticionada indemnização por despedimento, retribuições intercalares e danos não patrimoniais peticionados.
***
Quanto ao mais,
Não logrou o Autor provar a prestação de trabalho suplementar e o trabalho prestado em dias de descanso compensatório, nem tão pouco que a Ré não lhe tivesse ministrado formação profissional, sendo certo que o respetivo ónus da prova compete ao trabalhador, por se tratarem de factos constitutivos do seu direito - cfr. art. 342º, n. 1 do Código Civil - pelo que a ação também improcede nesta parte.».
Conclui-se do que antecede que, entendeu a Mª Juíza “a quo” que o A. não fez prova do despedimento, improcedendo, assim, o seu pedido quanto à indemnização por despedimento, retribuições intercalares e danos não patrimoniais peticionados, tal como não logrou provar a prestação de trabalho suplementar e o trabalho prestado em dias de descanso compensatório, nem tão pouco que a Ré não lhe tivesse ministrado formação profissional, sendo certo que a ele competia o respetivo ónus da prova, por se tratarem de factos constitutivos dos seus alegados direitos. E, a final, decidiu julgar improcedente a acção, por não provada.
Ora, sendo deste modo, só podemos concluir, atentos os argumentos invocados pelo recorrente para sustentar a arguida nulidade da sentença, que é notório que tal não se verifica, denotando que existe por parte do mesmo nítida confusão quanto aos alegados vícios que imputa à sentença recorrida defendendo, por isso, que deve ser declarada nula e, eventual, existência de erro de julgamento de que, a mesma possa padecer que, não é gerador da nulidade daquela, nos termos expressamente previstos nas diversas al.s do nº 1, do referido art. 615º, em concreto, na al. b), conforme o que se lê, no sumário do (Ac. desta Relação, de 24.09.2020, Proc. nº 173/20.6YRPRT), “- A nulidade da falta de fundamentação de facto e de direito está relacionada com o comando do artigo 607.º, nº 3 do CPCivil que impõe ao juiz o dever de discriminar os factos que considera provados e de indicar, interpretar e aplicar as normas jurídicas correspondentes, razão pela qual só a falta absoluta de fundamentação, entendida como a total ausência de fundamentos de facto e de direito, gera a nulidade prevista na al. b) do nº 1 do citado artigo 615º”, e de modo algum a referida na al. c), já que esta, como se refere no (Ac. do STJ, de 26.01.2006, Proc. 05B2742), “só se verifica quando, no processo lógico, há um vício real no raciocínio do julgador, na medida em que a fundamentação aponta num sentido e a decisão segue caminho oposto ou, pelo menos, direcção diferente; não ocorre, por isso, mesmo nos casos de erro de julgamento, quando a decisão assenta num discurso lógico irrepreensível, limitando-se a decidir no exacto sentido preconizado pela respectiva fundamentação sem qualquer quebra ou desvio de raciocínio que permita detectar a existência de visível contradição entre as premissas e a conclusão.”, nem por último, a referida na al. d) já que, como bem se diz no, (Ac. do STJ, de 10.12.2020, Proc. 12131/18.6T8LSB.L1.S1), “I – A nulidade por omissão de pronúncia, representando a sanção legal para a violação do estatuído naquele nº 2, do artigo 608.º, do CPC, apenas se verifica quando o juiz deixe de pronunciar-se sobre as «questões» pelas partes submetidas ao seu escrutínio, ou de que deva conhecer oficiosamente, como tais se considerando as pretensões formuladas por aquelas, mas não os argumentos invocados, nem a mera qualificação jurídica oferecida pelos litigantes.”.
Ora, sempre com o devido respeito, em nosso entender, não invoca o recorrente quaisquer argumentos susceptíveis de se enquadrarem nos referidos vícios.
E, da análise da sentença verifica-se que estão especificados os fundamentos de facto e de direito que justificaram a decisão e tais fundamentos não estão em contradição com a decisão proferida, não se verificando que tenha deixado de ser apreciada qualquer questão.
O alegado pelo recorrente mais não seria que um, eventual, erro de julgamento e errada apreciação das provas produzidas, com o consequente erro na decisão da matéria de facto, o que a acontecer poderia configurar erro de julgamento, mas, jamais nulidade da sentença, nos termos do dispositivo invocado pelo mesmo.
Não há dúvidas que, a Mª Juíza “a quo” na fundamentação da sentença tomou em consideração os factos provados, procedeu à subsunção dos mesmos ao direito e explicou as razões que levaram à improcedência da acção nos termos em que o foi.
Donde só podemos concluir que a sentença, se mostra fundamentada de facto e de direito, conheceu de todas as questões que se lhe impunha apreciar, não se verificando que tenha sido cometida qualquer violação ou nulidade por os fundamentos estarem em oposição com a decisão ou ocorra alguma ambiguidade ou obscuridade que torne a decisão ininteligível, nomeadamente, de modo a violar o disposto no art. 615º nº 1, al.s b), c) e d) que o recorrente invoca.
Improcede, assim, também, este aspecto da apelação.
*
- Da deficiente motivação da decisão de facto
Na sequência da alusão ao art. 607º que faz na conclusão A., nas conclusões C., D. e E., o recorrente escreveu que em sua opinião, “…, na decisão e fundamentação apresentada na sentença em sindicância, está em causa a violação do princípio da aquisição processual, do dever da boa administração da justiça em busca da verdade material, dos poderes de cognição do Tribunal, bem com das regras relativas às provas atendíveis para fundamentação da decisão. D. Paralelamente, verificam-se verdadeiras contradições entre a prova produzida nos autos e a decisão final, tendo sido ignoradas muitas das declarações prestadas em audiência de discussão e julgamento, e teor de documentos, ou foram retiradas das mesmas ilações que em nada se coadunam com a realidade dos factos relatados e com a sequência dos acontecimentos. E. Alega a Mma. Juiz a quo que “na formação da sua convicção o Tribunal atendeu aos meios de prova disponíveis (…)” e na conclusão F., prossegue dizendo que, “Não pode, contudo, o aqui Recorrente, concordar com a supra transcrita fundamentação”.
Vejamos.
Dispõe o referido art. 607º, a propósito da elaboração da sentença, sob os nºs 3 e 4, o seguinte: “3. Seguem-se os fundamentos, devendo o juiz discriminar os factos que considera provados e indicar, interpretar e aplicar as normas jurídicas correspondentes, concluindo pela decisão final.
4. Na fundamentação da sentença, o juiz declara quais os factos que julga provados e quais os que julga não provados, analisando criticamente as provas, indicando as ilações tiradas dos factos instrumentais e especificando os demais fundamentos que foram decisivos para a sua convicção; o juiz toma ainda em consideração os factos que estão admitidos por acordo, provados por documentos ou por confissão reduzida a escrito, compatibilizando toda a matéria de facto adquirida e extraindo dos factos apurados as presunções impostas pela lei ou por regras de experiência.”.
Ora, reiterando o que já dissemos a propósito da anterior questão, é unânime o entendimento de que, a deficiência da fundamentação quanto à matéria de facto declarada provada ou não provada na sentença, nos termos previstos no nº 4 deste art. 607º, não gera nulidade de sentença, nos termos previstos naquela referida al. b), do nº 1, do art. 615º.
Como é sabido, esta deficiência, quando recaia sobre algum facto essencial para o julgamento da causa, deve ser corrigida pela 1ª instância por determinação da Relação, tendo em conta os depoimentos gravados ou registados, cfr. art. 662º, nº 2, al. d). Mas, se o facto dado, sem fundamentação, como provado ou não provado não se revelar concretamente essencial para a decisão da causa, a exigência a posteriori da fundamentação, em via de recurso, é inútil, sendo a falta de fundamentação irrelevante, ainda que da questão principal se trate.
No caso, o que se verifica é que, basicamente, a opinião do recorrente é de que o Tribunal “a quo” não fez o juízo crítico das provas, desrespeitando aquele nº 4 do art. 607º.
Nas palavras de (Lebre de Freitas, citando Antunes Varela, in “A Acção Declarativa Comum”, à Luz do Código Revisto, 2010, pág. 281), a fundamentação tem a dupla função de facilitar o reexame da causa pelo tribunal superior e de reforçar o autocontrolo do julgador, sendo um elemento fundamental na transparência da justiça, inerente ao acto jurisdicional.
Quando a prova é gravada, a sua análise crítica constitui complemento fundamental da gravação e evidencia a importância do modo como o depoente depôs, as suas reações, as suas hesitações e, de um modo geral, todo o comportamento que rodeou o depoimento, indo além do mero significado das palavras do depoente (registadas em audiência).
Pese embora isso, a motivação das respostas aos quesitos não têm de conter uma exteriorização integral de todo o percurso lógico que conduziu à formação da convicção do julgador, basta uma explicação sucinta do iter lógico-dedutivo que levou à conclusão encontrada, embora deva deixar à vista o «itinerário cognoscitivo», a razão de ser da exigência de fundamentação; pretende-se que o julgador se pronuncie quanto à relevância deste ou daquele depoimento, quanto ao valor dos depoimentos testemunhais, referindo-se à sua maior ou menor isenção, credibilidade, clareza e razão de ciência, deixando transparecer sensatez e prudência na apreciação livre da prova e afastando qualquer laivo de suspeição de arbitrariedade, neste sentido, entre outros, vejam-se os (Acórdãos, do STJ de 10.07.2008 e, desta Relação de 22.05.2019, Proc. nº 662/17.0T8AMT.P1 in www.dgsi.pt). Nada impondo que a fundamentação da decisão seja feita separadamente para cada facto.
Mas, o cumprimento da determinação legal em vigor constitui tarefa cuja execução se não revela fácil, uma vez que na formação da convicção dos juízes que integram o tribunal não intervêm apenas factores racionalmente demonstráveis.
Sendo, segundo diz, (Abrantes Geraldes in Temas da Reforma do Processo Civil, 4ª edição revista e actualizada, Volume II, pág. 249), de afastar a fundamentação que, simplesmente, indique os meios de prova, do tipo “os depoimentos prestados pelas testemunhas e a inspecção ao local”, sendo legalmente exigível que, de acordo com as circunstâncias do caso concreto, se estabeleça o fio condutor entre a decisão da matéria de facto (resultado) e os meios de prova que foram usados na aquisição da convicção (fundamentos), fazendo a respetiva apreciação crítica, nos seus aspectos mais relevantes.
Ora, no caso, verifica-se que a Mª Juíza “a quo” desenvolveu a motivação da fundamentação de facto ao longo das páginas 4 a 7 da sentença e fê-lo, não se limitando a identificar os respectivos meios de prova que alicerçaram a sua convicção referindo, quanto a cada testemunha a sua razão de ciência, réu e autor ao que responderam e apelou aos documentos, especificando-os e apreciando-os, conforme nela se lê e transcreve, em síntese: “Para além da posição vertida pelas partes nos respetivos articulados (factos admitidos por acordo), na formação da sua convicção o Tribunal atendeu aos meios de prova disponíveis, atentando nos dados objetivos fornecidos pelos documentos dos autos, e fazendo uma análise dos depoimentos prestados. Toda a prova produzida foi apreciada segundo as regras da experiência comum e lógica do homem médio, suposto pelo ordenamento jurídico, fazendo o Tribunal, no uso da sua liberdade de apreciação, uma análise crítica das provas.
Atendeu-se ao teor dos documentos supra referenciados na decisão da matéria de facto, bem como dos restantes juntos pelas partes nos respetivos articulados (os sms trocados entre o Autor e o gerente da Ré, a participação da GNR e os recibos de vencimento juntos a 28.10.2021), conjugado com o depoimento das testemunhas inquiridas e do depoimento de parte do Autor e do legal representante da Ré. O Réu, CC, prestou depoimento e declarações de parte. Disse (…).
O Autor, AA, disse (…).
A testemunha DD, foi o agente da PSP que se deslocou ao local na sequência do pedido do Autor e confirmou o teor da participação anexa à p. i., como documento n.º 13. Afirmou (…).
A testemunha BB é amigo do Autor, desde criança. Foi seu colega de trabalho na empresa da Ré, onde trabalhou alguns meses. Disse (…).
A testemunha EE trabalha para a Ré desde 2017 e é pintor. Trabalhou com o Autor. (…).
Concretizando, dir-se-à:
Relativamente ao alegado despedimento, não resultou minimamente demonstrado que a Ré tivesse despedido verbalmente o Autor ou de qualquer outra forma lhe tivesse comunicado a intenção de despedimento, pois a única pessoa que afirma tal realidade é apenas e exclusivamente o Autor.
Não se provaram também as conversas tidas entre o Autor e o referido sócio gerente da Ré, pois cada um deles apresentou versões antagónicas e não existe qualquer outro elemento probatório que possa corroborar a versão de um ou do outro, pois, por um lado, ninguém presenciou tais conversas e, por outro lado, das mensagens escritas que foram juntas aos autos não é possível retirar nenhuma conclusão segura sobre o que realmente aconteceu.
Nenhuma prova foi produzida no sentido de demonstrar que a Ré não tenha ministrado ao Autor formação profissional, nem tão pouco que o Autor tenha prestado trabalho suplementar nas datas indicadas, sendo de realçar, inclusivé, a este respeito, que a única testemunha que se pronunciou sobre tal matéria foi o amigo do Autor, BB, que referiu que “às vezes pediam-lhe para fazer mais uma hora”, o que não se conjuga com a alegação feita no artigo 50º da p.i. , razão pela qual se deram tais factos como não provados.”.
Atento o exposto e atendendo a que, como refere (A. Abrantes Geraldes, in Recursos no novo Código de Processo Civil, 2013, pág.s 242 e 243, - citando Antunes Varela, Manual de Processo Civil, 28 ed., pág. 654, -) O juiz deve justificar os motivos da sua decisão, declarando por que razão, sem perda da liberdade de julgamento garantida pela manutenção do princípio da livre apreciação das provas (art. 607º, nº 5), deu mais credibilidade a uns depoimentos e não a outros, julgou relevantes ou irrelevantes certas conclusões dos peritos ou achou satisfatória ou não a prova resultante de documentos. Não se vislumbra que mais poderia o Tribunal “a quo” dizer, a nível da análise crítica das provas que analisou, já que, de modo que julgamos suficiente, afirma as razões pelas quais acreditou mais nalgumas do que noutras e o modo porque se convenceu.
Cremos, assim, não se verificarem os apontados vícios, acrescendo que, não justifica o recorrente, não o solicitou, nem a nós se vislumbra, qualquer necessidade de obter melhor fundamentação de qualquer facto essencial, tanto mais que houve impugnação da decisão proferida em matéria de facto e, além de toda a análise que já se efectuou, para apreciação desta questão e, também, da questão referente às arguidas nulidades, ir-se-á reapreciar a prova produzida para efeito da sua possível alteração.
Sem dúvida, também quanto a esta questão, o que se verifica é que a verdadeira questão é saber se as provas produzidas implicam, necessariamente, uma decisão diferente em matéria de facto, ou seja, se ocorre erro de julgamento, o que tem a ver com o pretendido reexame das provas para modificação da matéria de facto, mas, novamente, muito longe de ser causa de nulidade da sentença ou motivo para cumprimento do disposto na al. d) do nº 2 do art. 662º.
Improcede assim, também, esta questão da apelação.
*
- Da impugnação da matéria de facto
O recorrente vem impugnar a decisão sobre a matéria de facto, quanto aos pontos que indica nas conclusões LL. e MM. da sua alegação, o que fundamenta no que indica, nesta, sob o título, “IV – DO ERRO DE JULGAMENTO DA MATÉRIA DE FACTO”, alegando ser sua opinião que, “na decisão e fundamentação apresentada na sentença em sindicância, está em causa a violação do princípio da aquisição processual, do dever da boa administração da justiça em busca da verdade material, dos poderes de cognição do Tribunal, bem com das regras relativas às provas atendíveis para fundamentação da decisão.
Paralelamente, verificam-se verdadeiras contradições entre a prova produzida nos autos e a decisão final, tendo sido ignoradas muitas das declarações prestadas em audiência de discussão e julgamento, e teor de documentos, ou foram retiradas das mesmas ilações que em nada se coadunam com a realidade dos factos relatados e com a sequência dos acontecimentos.
Não pode a aqui Recorrente deixar de apresentar as suas alegações quanto à alteração da matéria de facto.”.
E prossegue, “Com o devido respeito que a decisão a quo nos merece, de toda a prova produzida nos presentes autos, conforme supra melhor se expôs os artigos 4º (parte final), 6º, 9º, 10º, 13º, 14º, 24º e 40º (quanto aos prolemas de saúde, filha menor e impossibilidade de lhe prover alimentos), 46º, 50º e 53º da p. i. e 5º, 11º, 14º e 17º da resposta deveriam ser dados como provados.
E, em contraposição os pontos 5, 6 e 13, dos factos dados como provados, deveriam ser dados como não provados.”.
Alegando, ainda, que “Analisando toda a prova produzida nos presentes autos, tanto documental como testemunhal, é importante confrontá-la entre si, assim como com os factos dados como provados ou com algumas das afirmações descritas na douta sentença a quo. E fazendo tal exercício, não restam dúvidas que a decisão seria completamente diferente.”.
Vejamos.
Dispõe o nº 1 do art. 662º do CPC (Código de Processo Civil, diploma a que pertencerão os demais artigos a seguir referidos, sem outra menção de origem), que: “a Relação deve alterar a decisão proferida sobre a matéria de facto, se os factos tidos como assentes, a prova produzida ou um documento superveniente impuserem decisão diversa.”.
Aqui se enquadrando, naturalmente, as situações em que a reapreciação da prova é suscitada por via da impugnação da decisão de facto feita pelos recorrentes.
Nas palavas de (Abrantes Geraldes, in “Recursos no Novo Código de Processo Civil”, Almedina, Coimbra, 2013, págs. 221 e 222) “… a modificação da decisão da matéria de facto constitui um dever da Relação a ser exercido sempre que a reapreciação dos meios de prova (sujeitos à livre apreciação do tribunal) determine um resultado diverso daquele que foi declarado na 1ª instância”.
No entanto, como continua o mesmo autor (págs. 235 e 236), “… a reapreciação da matéria de facto no âmbito dos poderes conferidos pelo art. 662º não pode confundir-se com um novo julgamento, pressupondo que o recorrente fundamente de forma concludente as razões por que discorda da decisão recorrida, aponte com precisão os elementos ou meios de prova que implicam decisão diversa da produzida e indique a resposta alternativa que pretende obter.”.
Esta questão da impugnação da decisão relativa à matéria de facto e a sua apreciação por este Tribunal “ad quem” pressupõe o cumprimento de determinados ónus por parte do recorrente, conforme dispõe o art. 640º ex vi do art. 1º, nº 2, al. a) do C.P.Trabalho, nos seguintes termos:
“1. Quando seja impugnada a decisão sobre a matéria de facto, deve o recorrente obrigatoriamente especificar, sob pena de rejeição:
a) Os concretos pontos de facto que considera incorrectamente julgados;
b) Os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida;
c) A decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas.
2- No caso previsto na alínea b) do número anterior, observa-se o seguinte:
a) Quando os meios probatórios invocados como fundamento do erro na apreciação das provas tenham sido gravados, incumbe ao recorrente, sob pena de imediata rejeição do recurso na respectiva parte, indicar com exatidão as passagens da gravação em que se funda o seu recurso, sem prejuízo de poder proceder à transcrição dos excertos que considere relevantes;
b) Independentemente dos poderes de investigação oficiosa do tribunal, incumbe ao recorrido designar os meios de prova que infirmem as conclusões do recorrente e, se os depoimentos tiverem sido gravados, indicar com exatidão as passagens da gravação em que se funda e proceder, querendo, à transcrição dos excertos que considere importantes.
3 - O disposto nos n.ºs 1 e 2 é aplicável ao caso de o recorrido pretender alargar o âmbito do recurso, nos termos do n.º 2 do artigo 636.º.”.
Resulta da análise deste dispositivo que, o legislador concretiza a forma como se processa a impugnação da decisão, reforçando, neste novo regime, os ónus de alegação impostos ao recorrente, impondo-se que especifique, em concreto, os pontos de facto que impugna e os meios probatórios que considera impunham decisão diversa quanto àqueles e deixe expressa a solução que, em seu entender, deve ser proferida pela Relação em sede de reapreciação dos meios de prova.
Ou seja, tendo em conta os normativos supra citados, haverá que concluir que a reapreciação da matéria de facto por parte da Relação, tendo que ter a mesma amplitude que o julgamento de primeira instância, já que só assim, como se refere no (Ac. STJ de 24.09.2013 in www.dgsi.pt (sítio da internet onde se encontram disponíveis os demais acórdãos a seguir citados, sem outra indicação)) poderá ficar plenamente assegurado o duplo grau de jurisdição, muito embora não se trate de um segundo julgamento e sim de uma reponderação, não se basta com a mera alegação de que não se concorda com a decisão do Tribunal “a quo”, exigindo-se à parte que pretenda usar daquela faculdade, a demonstração da existência de incongruências na apreciação do valor probatório dos meios de prova que efectivamente, no caso, foram produzidos, sem limitar porém o segundo grau de sobre tais desconformidades, previamente, apontadas pelas partes, se pronunciar, enunciando a sua própria convicção - não estando, assim, limitada por aquela primeira abordagem, face ao princípio da livre apreciação da prova que impera no processo civil, art. 607º, nº 5 do CPC, cfr. (Ac. STJ de 28.05.2009).
Verifica-se, assim, que o cumprimento do ónus de impugnação da decisão de facto, não se satisfaz com a mera indicação genérica da prova que na perspectiva do recorrente justificará uma decisão diversa daquela a que chegou o Tribunal “a quo”, impõe-lhe a concretização quer dos pontos da matéria de facto sobre os quais recai a sua discordância como a especificação das provas produzidas que, por as considerar como incorrectamente apreciadas, imporiam decisão diversa, quanto a cada um dos factos que impugna sendo que, quando se funde em provas gravadas se torna, também, necessário que indique com exactidão as passagens da gravação em que se baseia, sem prejuízo da possibilidade de, por sua iniciativa, proceder à respectiva transcrição.
Além disso, nas palavras, novamente, de (Abrantes Geraldes in “Recursos no Novo Código de Processo Civil”, Almedina, 2014, 2ª edição, págs. 132 e 133), “O recorrente deixará expressa a decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas, como corolário da motivação apresentada, tendo em conta a apreciação crítica dos meios de prova produzidos, exigência nova que vem na linha do reforço do ónus de alegação, por forma a obviar à interposição de recursos de pendor genérico ou inconsequente, também sob pena de rejeição total ou parcial da impugnação da decisão da matéria de facto;”.
Sobre este assunto, no (Ac.STJ de 27.10.2016) pode ler-se: “…Como resulta claro do art. 640º nº 1 do CPC, a omissão de cumprimento dos ónus processuais aí referidos implica a rejeição da impugnação da matéria de facto. …”. E, do mesmo Tribunal no (Ac. de 07.07.2016) observa-se o seguinte: “… para que a Relação possa apreciar a decisão da 1ª instância sobre a matéria de facto, tem o recorrente que satisfazer os ónus que lhe são impostos pelo art. 640º, nº 1 do CPC, tendo assim que indicar: os concretos pontos de facto que considera incorrectamente julgados, conforme prescreve a alínea a); os concretos meios de prova que impõem decisão diversa, conforme prescrito na alínea b); e qual a decisão a proferir sobre as questões de facto que são impugnadas, conforme lhe impõe a alínea c).”.
Neste mesmo sentido, lê-se no (Ac. desta Relação de 15.04.2013, relatora Desembargadora Paula Leal de Carvalho) que, “Na impugnação da matéria de facto o Recorrente deverá, pois, identificar, com clareza e precisão, os concretos pontos da decisão da matéria de facto de que discorda, o que deverá fazer por reporte à concreta matéria de facto que consta dos articulados (em caso de inexistência de base instrutória, como é a situação dos autos).
E deverá também relacionar ou conectar cada facto, individualizadamente, com o concreto meio de prova que, em seu entender, sustentaria diferente decisão, designadamente, caso a discordância se fundamente em depoimentos que hajam sido gravados, identificando as testemunhas por referência a cada um dos factos que impugna (para além “de indicar com exatidão as passagens da gravação em que se funda, sem prejuízo da possibilidade de, por sua iniciativa, proceder à respetiva transcrição.”, (sublinhado nosso).
Transpondo o regime exposto para o caso, verifica-se que houve gravação dos depoimentos prestados em audiência e o apelante impugna a decisão da matéria de facto, com indicação dos pontos que tendo sido considerados não provados e provados, em seu entender, se mostram incorrectamente julgados e a resposta que considera deverá ser dada aos mesmos, atentos os documentos (Docs. 9 a 12 juntos com a PI), os depoimentos do autor e do legal representante da ré, os quais identifica no registo áudio (nos termos que decorrem da conclusão LL.) e cujos trechos que, supostamente, considera cruciais e em que funda o recurso, transcreve e refere, ainda, o depoimento da testemunha, BB (veja-se conclusão O), mas, sem que proceda a qualquer identificação deste depoimento, no registo gravado.
Ou seja, se atentarmos nas alegações e conclusões do recorrente, verificamos que quanto aos factos objecto de impugnação, só em relação aos factos (artigos 4º (parte final), 6º, 9º, 10º, 13º, 14º, 24º e 40º (quanto aos problemas de saúde, filha menor e impossibilidade de lhe prover alimentos), 46º, 50º e 53º da p. i. e 5º, 11º, 14º e 17º da resposta) que foram dados como não provados na sentença, que alega e conclui em LL., “deveriam ser dados como provados, atentas as declarações prestadas pelo legal representante da Recorrida, ((MIN) 05:37 A 05:52(MIN), (MIN) 13:37 A 14:50(MIN) e do (MIN) 16:0 A 16:42(MIN) do ficheiro nº20220517144505 _16026173_2871615, das declarações prestadas pelo Recorrente ((MIN) 01:38 A 02:13(MIN), (MIN) 03:50 A 04:39(MIN), (MIN) 07:50 A 08:34 (MIN), (MIN) 09:00 A 10:42(MIN), (MIN) 10:42 A 13:45(MIN) E (MIN) 14:46 A 16:31(MIN) do ficheiro nº 20220517150812 _16026173 _2871615)”, procede à identificação das referidas declarações e nas alegações à transcrição daqueles minutos das declarações prestadas pelo próprio e pelo legal representante da ré.
Pois, como dissemos, apesar de fazer, também, referência ao depoimento da testemunha BB, em relação a este, não procede a qualquer identificação do seu depoimento, no registo áudio, ou transcrição.
E, como diz na conclusão MM., quanto aos pontos (5, 6 e 13, dos factos dados como provados), limita-se a dizer que, “em contraposição”, deveriam ser dados como não provados.
Ora, sendo deste modo, analisadas quer as alegações quer as conclusões do recorrente, verificamos que não é possível dizer, como bem o invocam a recorrida e o Ex.mo Procurador, no parecer emitido, que o recorrente cumpre, ainda que minimamente, os ónus a seu cargo para que neste Tribunal se admita a reapreciação da decisão proferida pelo Tribunal “a quo” e, em relação a todos aqueles factos, os dados como não provados e os dos pontos dados como provados. Os quais, para melhor compreensão do que diremos a seguir, importa proceder à sua transcrição, começando pelos não provados: “4.
O A. laborava nas obras da responsabilidade da Ré, 5 dias por semana, 40 horas semanais, sendo certo que, muitas vezes tinha que laborar horas extras nomeadamente, ao Sábado e/ou Domingo em algumas obras para as quais era destacado.
6.
Ora, o A. sempre recebeu tais remunerações, em numerário, sem nunca ter recebido qualquer recibo de vencimento.
9.
Ora, durante o tempo que se encontrou de baixa médica, o aqui A. tentou junto da R. que lhe fossem pagas as horas suplementares em divida.
10.
Sendo certo que, a R. nunca as pagou e ameaçou o A. que só as pagaria, caso aquele apresentasse a sua carta de demissão (cf. docs. 9 a 11 que aqui se juntam e se dão por inteiramente reproduzidos para todos os devidos e legais efeitos).
13.
Acresce que, a R. na pessoa do seu legal representante, já havia transmitido verbalmente ao aqui A., em 07.06.2021, que aquele se encontrava despedido.
14.
Com efeito, o A. foi despedido verbal e ilicitamente pela R., despedimento esse, sem ter sido precedido de competente Processo Disciplinar.
24.
Além disso, existiam inúmeras obrigações administrativas decorrentes da relação laboral, em que a ré não procedia ao seu cumprimento, nomeadamente formação profissional que não foi assegurada ao aqui A., a emissão dos competentes recibos de vencimento e férias não gozadas no corrente ano, por isso se requerendo a junção aos autos dos mesmos, conforme peticionado no fim da presente acção.
40.
A título de danos não patrimoniais, o A. requer 3.000,00 Euros, pois é uma pessoa que tem problemas de saúde e desde o despedimento sofreu bastante, até porque ficou desempregado, sem direito a qualquer subsídio, tendo uma filha menor a quem não consegue prover alimentos de forma condigna.
46.
Acontece que, o aqui A. trabalhou muitas vezes aos sábados e/ou Domingos (dias correspondentes ao descanso semanal).
50.
Acontece que, o aqui trabalhador, trabalhou os seguintes dias correspondentes a dias de descanso:
a) Dia 21 de Novembro 2020 (sábado) em obra realizada em Lisboa – 7 horas;
b) Dia 22 de Novembro 2020 (Domingo) em obra realizada em Lisboa – 9 horas;
c) Em 28 Novembro em 20 (Sábado) em Obra denominada ... – 11 horas;
d) Em Fevereiro 2021 um Sábado – cuja data não se recorda, em obra realizada em Vila do Conde – 4 horas;
e) No dia de Carnaval 2021 (16.02.2021) – 5 horas;
f) Em 05 Março 2021 (Sexta – Feira) – 1:30 horas,
g) Em 08 Março 2021 (Segunda Feira) – 2 horas, e
h) Em 09 de Março 2021 (Terça Feira) – 2 horas.
53.
Mais se refere que é devido 41:30 Horas de descanso compensatório que não lhe foi pago, nem usufrui do mesmo (art. 229 CT), pelo que tem direito a receber 109,45 Euros.
5.
No dia 10 de Março de 2021, e no decorrer do seu contexto laboral, em Vila do Conde, o aqui Autor já não se encontrava bem psicologicamente, em virtude das pressões exercidas pela sua Entidade Patronal, aqui Ré, tendo se sentido mal, motivo pelo qual teve de abandonar a obra onde se encontrava a exercer funções.
11.
E, nesse seguimento, foi a Ré que não lhe concedeu a entrada, nem o regresso ao seu trabalho, e não o contrário, como é alegado.
14.
Acresce, ainda, que foi a Ré na pessoa do seu legal representante que, no dia 07 de Junho de 2021, isto é, no último dia da baixa médica do aqui Autor, lhe transmitiu verbalmente que este se encontrava despedido.
17.
Ou seja, o descrito no artigo 15.º da Contestação da Ré, no sentido do Autor ainda vigorar como trabalhador da Ré, tal apenas sucedeu, porque a Ré, ao longo do período em que vigorou a baixa médica do aqui Autor, o pressionou a apresentar a sua carta de demissão, o que nunca veio a acontecer, por não ser essa a vontade do Autor. (cf. docs. 9 a 11, já juntos com a Petição Inicial)” e os provados: “5. O Autor auferia o vencimento mensal de 665€.
6. Nem sempre o vencimento do Autor era pago por inteiro, sendo pago, por vezes, em prestações e com atraso.
13. O Autor, em 10.03.2021, quando se encontrava a laborar, a certa altura arrumou “as suas coisas” e disse que se ia embora e que não trabalhava mais.”.
Verifica-se, assim, que o que decorre da motivação e conclusões do recorrente, no que se refere à prova que indica para fundar a alteração que pretende, é que essa é indicada de modo genérico, em bloco, ou seja, para todo aquele conjunto de factos, os que entende deveriam ser dados como não provados, os pontos 5, 6 e 13, dos factos dados como provados e os que entende deveriam ter sido dados como provados: os artigos 4º (parte final), 6º, 9º, 10º, 13º, 14º, 24º e 40º (quanto aos prolemas de saúde, filha menor e impossibilidade de lhe prover alimentos), 46º, 50º e 53º da p. i. e 5º, 11º, 14º e 17º da resposta, o que bem o demonstra a sua alegação constante da referida conclusão LL., quando diz que todos, assim, deveriam ter sido dados, respectivamente, provados e não provados, alegadamente, porque é o que considera decorre “de toda a prova produzida nos presentes autos, …” e, por isso, requer a alteração daquela referida factualidade, não concretizando pois, por referência a cada facto impugnado, nem para cada bloco de factos relacionados, quais os meios probatórios que no seu entender, dentro dos que genericamente indicou, para aquele conjunto de factos, imporiam decisão diversa daquela que foi dada pelo Tribunal “a quo”, de modo a permitir que, este Tribunal “ad quem”, face a tais provas indicadas, procedesse à reapreciação de cada um deles, em cumprimento ao que dispõe o art. 640º, nº 1, al. b), referido.
Ou seja, impugna a matéria de facto em bloco e indica os meios de prova, mas sem indicar os concretos meios que determinavam uma decisão diversa, sendo que aqueles blocos de factos, de um lado os dados como não provados, de outro os dados como provados, retratam realidades diferentes. Sendo deste modo, em consequência do que se disse, resulta que este Tribunal vê-se afinal, confrontado com uma pretensão do recorrente para que seja reapreciada genericamente a prova, em particular a que o mesmo considera que serve a sua pretensão, como se de um novo julgamento se tratasse, neste caso em 2ª instância, em relação a todo um conjunto de factos, a demonstrá-lo basta atender à sua alegação como já referido, especificamente, na conclusão LL., quando após, as considerações que tece, defende que todos aqueles factos objecto de impugnação, merecem a resposta que indica como sendo a correcta nas conclusões LL. e MM., alegadamente, com fundamento em “toda a prova produzida nos presentes autos”.
Mas, não é esta a solução estabelecida na lei, nem defendida na doutrina e acolhida na jurisprudência, como se deixou exposto anteriormente, em que o entendimento é no sentido de que a reapreciação da matéria de facto no âmbito dos poderes conferidos pelo art. 662º, não pode confundir-se com um novo julgamento, pressupondo que o recorrente fundamente de forma concludente as razões por que discorda da decisão recorrida, aponte com precisão os elementos ou meios de prova que implicam decisão diversa da produzida, indique a resposta alternativa que pretende obter e, com particular relevo no caso, “quando a impugnação se fundar em meios de prova constantes do processo ou que nele tenham sido registados, o recorrente deve especificar aqueles que, em seu entender, determinam uma decisão diversa quanto a cada um dos factos”, como refere (Abrantes Geraldes in “Recursos no Novo Código de Processo Civil”, Almedina, 2014, 2ª edição, pág. 132).
Ou seja, deveria relacionar ou conectar cada facto, individualizadamente, com o concreto meio de prova que, em seu entender, sustentaria diferente decisão, o que é manifesto não fez, em relação a todos aqueles factos referidos, nem em relação àquele conjunto de factos que estejam entre si relacionados.
Daí que, só possamos concordar com o entendimento da recorrida e do Ex.mo Procurador e não possamos dizer que o apelante, como era seu ónus e se lhe impunha, tenha cumprido o que dispõe o art. 640º, nº 1, al b), quanto a cada um dos factos, ou conjunto relacionado de factos, que impugna e considera deveriam fazer parte da factualidade provada e aqueles que, em seu entender, deveriam ser dados como não provados, por não se satisfazer aquele, como se referiu, com a mera indicação genérica da prova que na sua perspectiva justificará uma decisão diversa daquela a que chegou o Tribunal recorrido, em relação a todos os factos provados e não provados que impugna, como é a situação,. Pois exige-se segundo aquele, o que aqui não ocorre, que o apelante concretize quer os pontos da matéria de facto sobre os quais recai a sua discordância quer, ainda, que especifique quais as provas produzidas quanto a cada um dos factos ou conjunto de factos relacionados que, por as ter como incorrectamente apreciadas, imporiam decisão diversa, fazendo a apreciação crítica das mesmas.
Assim, porque não o fez nem nas conclusões nem na motivação destas, por inobservância do disposto no art. 640º, nº 1, al. b), o recurso tem de ser rejeitado quanto à pretendida reapreciação da matéria de facto dada como provada nos pontos: 5, 6 e 13 e a dada como não provada, os artigos 4º (parte final), 6º, 9º, 10º, 13º, 14º, 24º e 40º (quanto aos prolemas de saúde, filha menor e impossibilidade de lhe prover alimentos), 46º, 50º e 53º da p. i. e 5º, 11º, 14º e 17º da resposta, importando, assim, que se mantenha inalterada e definitivamente assente a factualidade dada como provada pela 1ª instância.
*
Pese embora, aquela conclusão, importa que se diga que, ainda que por aquela razão não fosse, face à análise que, já referimos, tivemos de efectuar, nos presentes autos, para apreciação das questões antes analisadas, em concreto, quanto às invocadas nulidades e, alegada, deficiência da decisão de facto, é nossa firme convicção, que não assistia razão ao recorrente, quanto a esta concreta questão da impugnação de facto.
Vejamos.
Como decorre das suas alegações, o apelante discorda da fundamentação da decisão de facto, supra transcrita, no essencial, por considerar que das provas produzidas, com particular destaque para as que indica e transcreve, deveria ter-se dado, respectivamente, como provada e não provada aquela factualidade que impugna. Pugnando, assim, pela alteração da decisão recorrida e da factualidade, dada como provada e não provada e, consequentemente, pela revogação da sentença e procedência do pedido.
Mas, sempre com o devido respeito adiantamos, desde já, sem razão.
Importa que se diga que, da análise que fizemos, o que se constata é que, o recorrente está a pôr em causa a convicção do Tribunal “a quo”, mas, fazendo apelo, apenas, a parte dos mesmos meios de prova que são referidos na fundamentação da decisão sobre a matéria de facto quanto àqueles pontos. Fá-lo, no entanto, descurando que o Tribunal “a quo”, além de referir os elementos de prova que foram relevantes para cada um dos grupos de facto que efectua ou para prova de cada facto, isoladamente, refere expressamente outra prova para além das declarações que o apelante indica, mas, ainda assim, este deixa claro que, apenas, face aos depoimentos cuja transcrição junta, dele próprio e do legal representante da ré, impunha-se que os factos que impugna fossem considerados, os não provados, como provados e os provados como não provados”, querendo significar, com isso, que a prova foi bastante para dar os primeiros como provados e insuficiente para se darem como provados, os demais pontos.
Mas, como dizem, (Antunes Varela, J. Miguel Bezerra e Sampaio e Nora, in Manual de Processo Civil, 2.ª Edição, Coimbra Editora, Coimbra, 1985, pág. 436), para que um facto se considere provado é necessário que, à luz de critérios de razoabilidade, se crie no espírito do julgador um estado de convicção, assente na certeza relativa do facto. A prova “assenta na certeza subjectiva da realidade do facto, ou seja, no (alto) grau de probabilidade de verificação do facto, suficiente para as necessidades práticas da vida”.
Essa certeza subjectiva, com alto grau de probabilidade, há-de resultar da conjugação de todos os meios de prova produzidos sobre um mesmo facto, ponderando-se a coerência que exista num determinado sentido e aferindo-se esse resultado convergente em termos de razoabilidade e lógica.
Já, (Manuel de Andrade in Noções Elementares de Processo Civil Coimbra Editora, Coimbra, 1979, pág. 191), dava como definição de “Meio de Prova (instrumento ou fonte de prova”. É todo o elemento (quid) sensível, através do qual, mediante actividade perceptiva ou simplesmente indutiva, o juiz pode, segundo a lei, formar a sua convicção acerca dos factos (afirmações de facto) da causa.”.
Ora, como resulta claramente da fundamentação, o Tribunal “a quo” entendeu que a prova produzida, em concreto, aquelas que refere, permitiu dar como provados aqueles pontos, 5,6 e 13, ou seja, aquela foi suficiente para criar no espírito do julgador um estado de convicção, assente na certeza relativa do facto. E, por outro lado não se revelou cabal para dar como provados os demais factos impugnados.
Logo, sendo desse modo e atento o que se deixou dito, só nos resta dizer que não é, pois, a invocação de parte, apenas, dos mesmos meios de prova que constituem fundamento bastante para sustentar a pretendida alteração. Ou seja, a prova do primeiro facto e a eliminação dos factos constantes daqueles pontos 5, 6 e 13.
Pelo que, por esta razão, também, a pretensão do apelante não poderia proceder. Acrescendo que, ainda, que não fosse desse modo, não aponta o A. qualquer erro na apreciação das provas que foram produzidas nos autos (todas elas, provas sujeitas à livre apreciação do julgador), limitando-se a dizer que a Mª Juíza “a quo” o que fez foi dar mais credibilidade à versão trazida pela ré, do que à dele, o que desde logo revela que, do que o recorrente discorda, é da convicção que a Mª Juíza “a quo” firmou, fundamentada na globalidade e apreciação conjunta de todas as provas produzidas nos autos, considerando aquele que não é a correcta, indicando como fundamento da sua alegada convicção, como já se disse, apenas, algumas das mesmas provas que fundamentaram a convicção expressa na decisão recorrida, especificamente parte, que identifica e transcreve, das suas próprias declarações e do legal representante da ré, e invocando todas as demais genericamente.
Mas, da simples leitura daqueles trechos que transcreve, o que é, claramente, evidente é que não sustentam, eles, a alegada convicção do A.. Não convencendo de modo diverso, do que consta na decisão recorrida, assente na globalidade das provas produzidas.
Ao contrário do que defende o apelante, em nosso entender, só podemos adiantar que o Tribunal “a quo” fundamentou e bem a decisão de facto quanto aos factos provados que se mostram impugnados, todos, no sentido em que foram decididos e nenhuma prova em contrário foi produzida nos autos, susceptível de impor a sua alteração nos termos sugeridos, ou seja, dados como não provados, e “em contraposição” provados, os demais, nem o demonstra a transcrita pelo apelante. Não bastando para convencer sobre o que não foi dado como provado e infirmar o que se mostra provado, o que disseram ele e o legal representante da ré. Nem as suas declarações, contrariamente ao que defende, tiveram a virtualidade de convencer quanto àqueles concretos factos do modo que o mesmo o considera na conclusão LL.
Ou seja, em nossa convicção, ao contrário do que o A. sustenta, aquelas provas que indica e que o mesmo, alegadamente, defende mereceram diferente credibilidade por parte da Mª Juíza “a quo”, não têm a virtualidade de infirmar o que decorre da decisão recorrida com base na interpretação integrada e conjugada de todas as provas produzidas, não resultando que esteja incorrecta a decisão proferida, quanto àqueles factos. Não tendo, as provas por ele indicadas, a virtualidade, por si só, de convencer do modo que o mesmo pretende, demostrar e infirmar, nos termos que ele considera que resultaram provados, os primeiros que indica e não provados os demais.
Sem dúvida, o que este Tribunal apreciou e leu, em particular, nos trechos das declarações transcritas, não se revela credível de modo a firmar em nós a alegada convicção do recorrente ou infirmar convicção diversa da que consta da decisão recorrida. Coincidindo, a nossa convicção, com o que a Mª Juíza “a quo” transcreveu na motivação da decisão de facto (que, diga-se, revela a análise crítica e apreciação das provas, que se lhe impunha, nos termos prescritos, no art. 607º, nº 4, do CPC), e não com a apreciação que consta do recurso, razão porque, também, por esta via, não ocorreriam motivos para que se alterassem aqueles factos impugnados.
Cremos, assim que, também, pela via da reapreciação, a pretensão do recorrente não teria acolhimento, já que é nossa convicção que não tinha aquela outro fundamento que não fosse a sua própria convicção, evidentemente, diversa da que foi a livre convicção da Mª Juíza julgadora.
Em suma, também, por o que se acaba de expor, a decisão de facto fixada na 1ª instância haveria de manter-se inalterada.
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E, aqui chegados, fixada que está, definitivamente, a matéria de facto provada, precisamente nos termos considerados na decisão recorrida e supra transcritos, improcedem, também, sem necessidade de outras considerações, as conclusões referentes à decisão de direito, já que como delas e da alegação do recorrente decorre a análise das questões colocadas pelo mesmo, no que toca à decisão de direito, tinham como premissa a confirmação, por este Tribunal, da conclusão expressa de que deveriam ser alterados os pontos de facto impugnados, fruto da alegada incorrecta apreciação da prova produzida nos autos, com a consequente alteração da factualidade dada como provada pelo Tribunal “a quo”, o que não aconteceu.
Pese embora isso, diga-se, apenas, que face à factualidade que se apurou nos presentes autos e que ficou, definitivamente, assente, nesta sede, a conclusão a retirar, feita a subsunção jurídica daquela factualidade, é que a decisão recorrida, não merece qualquer censura, sendo de elogiar, o modo ponderado e fundamentado como a Mª Juíza “a quo”, abordou a questão colocada, além do acerto com que o fez, por isso, só podemos subscrever aquela, não tendo os argumentos, reiterados pelo recorrente, em sede de recurso, qualquer virtualidade para que seja revogada a decisão recorrida, como pretende, desde logo, sob a conclusão, que se provou o seu despedimento, com as consequências peticionadas na p.i..
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Improcedem, assim, todas ou são irrelevantes as conclusões da apelação.
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III - DECISÃO
Pelo exposto, acorda-se nesta secção em julgar improcedente a apelação e, em consequência, confirma-se a sentença recorrida.
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Custas pelo A/apelante.
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Porto, 18 de Abril de 2024
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O presente acórdão é assinado electronicamente pelos respectivos,
Rita Romeira
Teresa Sá Lopes
António Luís Carvalhão