Acórdão do Tribunal da Relação do Porto
Processo:
5243/21.0T8MTS-A.P1
Nº Convencional: JTRP000
Relator: JERÓNIMO FREITAS
Descritores: PROCESSO LABORAL
ACÇÃO COMUM DECLARATIVA
NULIDADE DA CITAÇÃO
ARGUIÇÃO
Nº do Documento: RP202212144243/21.0T8MTS-A.P1
Data do Acordão: 12/14/2022
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: RECURSO IMPROCEDENTE; CONFIRMADA A DECISÃO
Indicações Eventuais: 4ª SECÇÃO (SOCIAL)
Área Temática: .
Sumário: I - No processo laboral, na acção comum declarativa, atento o disposto nos artigos 54.º n.º3 e 56.º al. a), do CPT, o momento da citação do Réu para a audiência de partes, bem como para a acção, na medida em que concomitantemente lhe é remetido ou entregue duplicado da petição inicial e cópia dos documentos que a acompanhem, é um acto distinto e temporalmente separado do momento da notificação do Réu para contestar, com indicação do prazo de dez dias.
II - Mas a lei processual não obsta a que, conjuntamente com a citação e para a hipótese de falta à audiência de partes, se proceda logo à notificação do réu nos termos e para os efeitos da al. a), do art.º 56.º CPT.
III - Resultando a nulidade da citação da falta de indicação de prazo para a defesa, a mesma podia ser arguida “quando da primeira intervenção do citado no processo”[art.º 191.º n.ºs1 e 2, do CPC].
IV - 4. Trata-se de uma nulidade processual secundária, dado estar sujeita a arguição pela parte interessada [art.º 197.º], quanto à oportunidade para tal sujeita ao regime do aludido n.º2, do artigo 191.º., e dela não podendo conhecer oficiosamente o Tribunal, atento o disposto no art.º 196.º [todos do CPC].
V - A expressão “primeira intervenção do citado no processo”, abrange a possibilidade referida pela recorrente ré - presença pessoal do legal representante da Ré e da ilustre mandatária na audiência de partes, ou pelo menos desta, em caso de justificada falta daquele - mas também as situações em que a parte intervenha no processo, pela primeira vez, praticando qualquer acto processual, compaginando-se com a regra geral sobre o prazo de arguição das nulidades secundárias, estabelecida no n.º1, do art.º 199.º do CPC.
VI - Constando da acta da audiência de partes, que previamente ao início desse acto, a ilustre mandatária da Ré apresentou um “requerimento via citius com a ref.ª 40781327”, requerendo “a justificação da sua falta e do legal representante da ré, solicitando o agendamento de nova data de audiência de partes”, a apresentação do mesmo consubstancia uma intervenção da citada Ré no processo, no caso, a primeira, pelo que se o entendesse necessário, deveria então ter feito uso do disposto no art.º 191.º n.º2, arguindo a nulidade da citação por falta de indicação do prazo para apresentação da contestação.
Reclamações:
Decisão Texto Integral: APELAÇÃO n.º 5243/21.0T8MTS-A.P1
Secção Social

ACORDAM NA SECÇÃO SOCIAL DO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DO PORTO

I. No Tribunal Judicial da Comarca do Porto, Juízo do Trabalho de Matosinhos, AA intentou a presente acção declarativa de condenação sob a forma de processo comum contra T..., Lda, pedindo que julgada procedente por provada, seja a Ré condenada a:
a) Reconhecer a ilicitude do despedimento de que o A. foi vítima;
b) Pagar ao A. todas as prestações pecuniárias que ele deixar de auferir, desde a data do despedimento, até à data do trânsito em julgado da decisão a proferir nos autos;
c) Readmitir o A. no seu posto e local de trabalho, ou se este assim optar,
d) Pagar-lhe a indemnização por antiguidade no valor que vier a ser fixado, até à data do trânsito em julgado da decisão a proferir nos autos, mas que por ora se cifra em 5.824,02€;
e) E pagar ao A. as férias vencidas e não gozadas bem como os proporcionais de férias no montante de 2.426,67 €;
f) Pagar ao A. a título de indemnização pelos danos não patrimoniais sofridos a importância de 3.000,00 €.
g) Pagar ao A. as horas de formação profissional em falta dos últimos três anos posteriores ao seu vencimento, no valor de 1.344,00 €.
h) Pagar juros de mora, à taxa legal, desde a data da citação até efectivo e integral pagamento.
Apresentados os autos para o despacho liminar, a Senhora Juíza proferiu a decisão seguinte:
- «Para a realização da audiência de partes a que alude o artº 54º, nº 2 do Código de Processo do Trabalho (CPT) designo o próximo dia 20.12.2021 pelas 9.30 horas.
Notifique e cite, respetivamente o(a/s) autor(a/es) e a(o)s ré(u/s) para comparecerem pessoalmente ou, em caso de justificada impossibilidade de comparência, se fazerem representar por mandatários com poderes especiais para confessar, desistir ou transigir, sob pena de ficarem sujeitos às sanções do Código de Processo Civil para a litigância de má fé, artº 54º, nºs 3 e 4 do CPT).
Advirta ainda a(o) ré(u), que se não comparecer, ou se a tentativa de conciliação se frustrar, o prazo de contestação se inicia no dia seguinte ao da audiência de partes, tendo a falta de contestação os efeitos previstos no artº 57º, nº 1 do CPT, considerando-se confessados os factos articulados pelo(a/s) autor(a/es)».
Em cumprimento do determinado, a secção de processos procedeu à citação da Ré, dela constando o seguinte:
Fica citado(a) para, comparecer pessoalmente neste tribunal, no dia 20-12-2021, às 09:30 horas, a fim de se proceder a audiência de partes, no processo acima referido.
Mais fica citado de que, em caso de justificada impossibilidade de comparência, se deve fazer representar por mandatário judicial com poderes de representação e os especiais para confessar, desistir ou transigir, ficando sujeito às sanções previstas no CPC para a litigância de má fé (Artº 54º, nº 5 do CPT e 542.º CPC, se faltar injustificadamente à audiência).
Fica ainda advertido, que se não comparecer, ou se a tentativa de conciliação se frustrar, o prazo de contestação se inicia no dia seguinte ao da audiência de partes, tendo a falta de contestação os efeitos previstos no artº 57º, nº 1 do CPT, considerando-se confessados os factos articulados pelo(a/s) autor(a/es)».
No dia designado para a realização da audiência de partes, o Tribunal a quo procedeu àquele acto, tendo sido lavrada a respectiva acta, dela constando, para além do mais, o seguinte:
Previamente ao inicio da audiência, foi enviado um requerimento via citius com a ref:º 40781327 pela ilustre mandatária Dr.ª BB, dando conhecimento que o legal
representante da ré Sr.º CC padece de patologia relacionada com o sistema respiratório e tem atualmente 70 anos. Informa ainda, que por motivos profissionais (escritura de partilha agendada à mesma hora) se encontra impossibilitada de comparecer na audiência de partes agendada para o dia de hoje. Requer assim, a justificação da sua falta e do legal representante da ré, solicitando o agendamento de nova data de audiência de partes. Mais referiu, que entrou em contacto com o ilustre mandatário do autor que não se opôs ao adiamento.
*
Feita a chamada à hora designada, responderam os intervenientes infra identificados no campo dos presentes:
PRESENTES: O autor, acompanhado do seu ilustre mandatário da ré Dr. º DD.
****
Seguidamente, pela Mm.ª Juiz foi proferido o seguinte:
DESPACHO
“No que concerne à justificação apresentada para a ausência do legal representante da ré, atenta a cópia do cartão de cidadão junta aos autos, atendendo-se à mesma julga-se justificada a falta, não se condenando aquele em multa.
Relativamente aos motivos invocados pela ilustre mandatária da ré, - não obstante ainda [não] se mostrar junta procuração aos autos - apraz-nos referir que o motivo invocado (escritura de partilha) a par de não ter sido tempestivamente invocado (no prazo a que alude o art. 151º do CPC) não constitui justo impedimento que fundamente o adiamento da audiência de partes.
Considerando-se a notificação já efetuada, o prazo de apresentação da contestação iniciar-se-á no dia seguinte ao da audiência de partes, sendo que a falta de contestação atento o disposto no artº 57º, nº 1 do CPT importará a confissão dos factos articulados pelo autor.
Desconhecendo-se a amplitude dos articulados, nomeadamente da contestação e eventual resposta, na hipótese de pode ser deduzida matéria de exceção e ainda os requerimentos probatórios não se designa, por ora, data para realização da audiência de discussão e julgamento.
Mostrando-se junta a contestação, e após a sua notificação ao autor abra conclusão.»
A Ré veio apresentar contestação em 4.2.2022.
I.1 Concluídos o autos, o tribunal a quo proferiu a decisão seguinte:
Conforme resulta dos autos, a ré foi citada para contestar a ação, contando-se o prazo de 10 dias para contestar a ação da data da audiência de partes, a qual se realizou em 20-12-2021.
O prazo de 10 dias para contestar terminou, pois, no dia 12 de janeiro de 2022 podendo, ainda, a parte apresentar a contestação até 17 de janeiro de 2022, por corresponder ao terceiro dia útil subsequente ao termo do praz mediante o pagamento de multa, art. 139 n.º 5 do Código de Processo Civil aplicável ex vi do art. 1 n.º 2 al.a) do Código de Processo de Trabalho.
Assim sendo, a contestação apresentada em 4.2.2022 é claramente extemporânea, pelo que, por intempestiva, não admito a mesma.
*
Em conformidade, atenta a citação da ré para a audiência de partes e sua regular notificação para contestar a ação, face à falta de contestação – em face da não admissão, por intempestiva da contestação apresentada - consideram-se confessados os factos alegados pelo autor na petição inicial, em conformidade com o disposto no artigo 57.º, n.º 1 do CPT.
*
Notifique e oportunamente conclua a fim de ser proferida sentença.
[..]».
I.2 Inconformada com essa decisão, a Ré apresentou recurso de apelação, encerrando as alegações de recurso com as conclusões seguintes:
1. Por despacho da Meritíssima Juiz “a quo” datado 14 de fevereiro de 2022, constante de fls. dos autos, não foi admitida a contestação apresentada nos autos pela Ré aqui recorrente com fundamento na sua alegada extemporaneidade, considerando como confessados os factos alegados pelo autor na petição inicial,
2. A Ré aqui recorrente não aceita tal decisão, pois é nossa opinião que não pode a Meritíssima Juiz “ a quo” não admitir a contestação apresentada pela R. aqui recorrente com fundamento na extemporaneidade de tal peça processual, quando nem do despacho que ordena a citação da Ré datado de 29 de novembro de 2021, nem citação datada de 30 de novembro de 2021, nem do despacho exarado na ata de audiência de partes realizada a 20 de dezembro de 2021, consta especificamente o prazo para apresentação de contestação por parte da Ré aqui recorrente.
3. Da citação levada a cabo pela secretaria judicial por carta registada com aviso de receção remetida à Ré para comparecer pessoalmente na audiência de partes a realizar no dia 20-12-2021 às 9:30 horas, com as devidas advertências quanto à impossibilidade e ou falta comparência, constata-se que não há qualquer referência ao prazo de 10 dias para a Ré aqui recorrente apresentar a sua contestação.
4. A citação realizada pela secretária teve por base o cumprimento do despacho proferido pela Meritíssima Juiz “a quo” datado de 29 de novembro de 2021, constante de fls. dos autos, que ordena a respetiva situação, no texto do qual se verifica a omissão da indicação do prazo para defesa.
5. Na ata de audiência de partes realizada a 20 de dezembro de 2021, em concreto no despacho onde a Meritíssima Juiz “a quo” manda notificar a Ré para contestar nada refere quanto ao prazo para apresentação de defesa, indicando apenas que tal prazo se inicia do dia posterior realização da audiência de partes.
6. Repetida e sucessivamente nos seus despachos a Meritíssima Juiz “ a quo” omitiu a indicação do prazo de defesa de 10 dias para a Ré aqui recorrente apresentar a sua defesa, tanto no despacho que ordenou a citação da Ré datado de 29 de novembro de 2021, omissão essa também levada a cabo pela secretaria que não referência a tal prazo aquando o cumprimento do indicado despacho, bem como no despacho proferido na audiência de partes que notifica o Ré aqui recorrente do início da contagem do prazo para apresentação de contestação.
7. Sendo competência da Meritíssima Juiz “ a quo” nos termos do art.º 6.º do Código de Processo Civil o dever de gestão processual, em concreto a gestão do presente processo, sempre deveria providenciar oficiosamente pelo suprimento de tal falta; e no seu despacho emanado aquando a realização da audiência de partes a 20 de dezembro de 2021, notificar expressamente a Ré aqui recorrente do respetivo prazo de 10 dias para apresentação de defesa, sanando assim a falta de tal pressuposto processual.
8. A não indicação à Ré, em sede de citação, nem na notificação do despacho exarado na audiência de partes, do prazo para apresentação para contestação, investe a Ré na possibilidade de apresentação da sua defesa para além dos 10 dias legalmente previstos, pois não tendo sido observadas as formalidades previstas na lei, pode mesmo a mencionada citação ser considerada nula.
9. Pese embora o disposto no art.º 198 n.º 2 do Código de Processo Civil quanto à possibilidade de arguição da nulidade da citação por não indicação do prazo de defesa, a ser arguida aquando a primeira intervenção do citado no processo, tal possibilidade foi vedada à Ré aqui recorrente, já que solicitado o adiamento da audiência de partes, tal pedido foi indeferido, tendo sido realizada a mencionada conferência na sua ausência, apenas com a devida justificação de falta.
10. A Meritíssima Juiz “ a quo” ao invés colmatar oficiosamente a omissão da falta de indicação do prazo concreto para apresentação de defesa por parte da Ré, no uso do dever de gestão processual reiterou, por despacho exarado na audiência de partes a notificação da Ré não indicando qual o prazo para contestar, mas apenas que o prazo se iniciava no dia posterior ao da realização da audiência de partes.
11. Sem prazo definido por despacho de 29 de novembro de 2021, citação de 30 de novembro de 2021 e novamente por despacho e 20 de dezembro 2021 para contestar a Ré aqui recorrente apresentou a sua contestação a 4 de fevereiro de 2022, a qual foi considerada extemporânea pela Meritíssima Juiz “ a quo”, mesmo com conhecimento oficioso da reiterada omissão no que toca à indicação do prazo para apresentação da defesa por parte da Ré aqui recorrente.
12. Com a prolação do despacho aqui posto em crise, não admitindo a contestação apresentada pela Ré aqui recorrente, a Meritíssima Juiz “a quo” veta a hipótese à Ré de esgrimir a sua defesa em audiência de julgamento, já que nunca a prova por si apresentada e requerida será objeto de apreciação e viola o princípio basilar do contraditório.
13. Constata-se assim uma clara violação do princípio do contraditório, que com a indevida não admissão da contestação apresentada pela Ré aqui recorrente obsta o exercício pleno do seu direito de contradizer a versão dos fatos apresentados pelo Autor, ficando sujeita a uma decisão que será tomada sem qualquer conhecimento pela Meritíssima Juiz “a quo” da versão apresentada pela Ré dos fatos.
14. O princípio do contraditório afirma que cada uma das partes envolvidas seja admitida a apresentar os fundamentos de fato e de direito, oferecendo toda a prova que achar pertinente, que sempre deverá ser analisada, dando assim cumprimento ao absoluto exercício de tal princípio.
15. A não admissão da contestação apresentada pela Ré, irá traduzir decisão baseada apenas no alegado pelo A sem qualquer possibilidade da Ré aqui recorrente ver a prova por si apresentada e requerida apreciada e as suas testemunhas prestarem o seu depoimento sobre tal matéria.
16. A violação do disposto no nº 3 do artigo 3º do Código de Processo Civil, como violação do princípio do contraditório, é suscetível de consubstanciar a prática de uma nulidade processual, quando a subjacente irregularidade cometida se mostre capaz de influir no exame ou decisão da causa, o que se verifica no caso em apreço.
17. Constata-se ainda uma violação do princípio da igualdade das partes previsto no art.º 4 do Código de Processo Civil, já que com a decisão proferida pela Meritíssima Juiz “a quo” de não admissão da contestação da Ré, não se encontra assegurado o legalmente previsto estatuto de igualdade substancial das partes.
18. A defesa da Ré é prejudicada com a não admissão da sua contestação perante o despacho da Meritíssima Juiz “a quo”, que mesmo incumbida do dever de gestão processual, oficiosamente não colmatou a falha e ou erro de não indicação nos seus despachos do prazo para apresentação de contestação, fomentando assim a desigualdade das partes, no que respeita aos meios defesa da Ré, ao contrário de sanar tal irregularidade num dos despachos que proferiu.
19. Assim, só a revogação do despacho que não admitiu nos autos a contestação da Ré aqui recorrente por alegada extemporaneidade, substituindo-se por outro que admitida a contestação apresentada, promove não só o exercício do dever de gestão processual por parte da Meritíssima Juiz “a quo”, mas também primordialmente o respeito e aplicação dos princípios legalmente previstos do contraditório e da igualdade das partes.
Nestes termos e nos demais de direito deve ser dado provimento ao presente recurso, revogando-se a decisão de não admissão da contestação apresentada pela Ré aqui recorrente e substituindo-se por outra que admitida a contestação apresentada, seguindo-se os autos os demais termos.
I.3 O autor apresentou contra-alegações, encerrando-as com as conclusões seguintes:
1.º O presente recurso não foi tempestivamente apresentado pelo que não deve ser admitido.
Sem prescindir,
2.º O despacho do Tribunal “a quo” não merece qualquer censura,
3.º Razão pela qual, deverá ser mantido na íntegra o despacho aqui recorrido.
I.4 O Digno Procurador-Geral Adjunto junto desta Relação emitiu o parecer a que alude o art.º 87.º3, do CPT, pronunciando-se no parecer no sentido de que o recurso não deve ser admitido, ou sendo-o, deverá ser julgado improcedente, na consideração do seguinte:
Nos termos do disposto no art.º 79º-A, n.º 2, al. d), do CPT, “cabe recurso de apelação do despacho de admissão ou rejeição de articulado ou meio de prova.”
O que, entende-se, pressupõe que não foi ainda proferida sentença, o que é o caso dos autos.
Dispõe o art.º 80º que nos casos previstos nos n.ºs 2 e 5 do art.º 79º-A, o prazo para a interposição de recurso é de 15 dias.
A decisão que não admitiu a Contestação foi proferida a 14.02.2022.
Foi notificado à Recorrente a 15 de fevereiro de 2022 – ref. 433458520.
O prazo para apresentação do recurso terminaria a 02.03.2022.
O recurso foi apresentado a 10.03.2022, oito (8) dias depois.
Salvo melhor opinião, cremos que o foi fora do prazo legal, sendo, por isso, intempestivo e, em consequência, não deveria ser admitido.
O despacho a admitir o recurso proferido, não vincula o Tribunal da Relação, podendo sempre considerar que foi intempestivamente apresentado.
3. Assim não se entendendo, entende-se, ainda, que, salvo melhor opinião, o recurso não deveria proceder.
4. Ora neste caso, o referido prazo para apresentação da contestação iniciou-se a 21.12.2021, dia seguinte ao da Audiência de partes.
O prazo de contestação é de 10 dias, como determina o art.º 56º, al. a) do CPT, o que a Mma Juiz ordenou, estando presente a ilustre mandatária da Recorrente.
Sabia, pois, que o prazo terminaria a 12.01.2022.
Sendo a contestação apresentada a 04.02.2022, estava sem qualquer dúvida, fora de prazo, era claramente extemporânea.
4.1. Alega a Recorrente, quase como único argumento, que da citação e notificação não constava o prazo para contestar, e, por isso, estes actos nulos devendo ser revogada a decisão que não admitiu a contestação substituindo-o por outro que a admita.
Porém, como referem Abrantes Geraldes, Paulo Pimenta e Luis Filipe Silva, CPC anotado, vol. I, Almedina, Coimbra, p. 230, “considerando que a citação se destina a dar ao Réu conhecimento da acção contra si proposta e conceder-lhe oportunidade de defesa (219º n.º 1), só serão tidos como geradores de nulidade os vícios que prejudiquem realmente a defesa. O que aqui temos é a salvaguarda, em termos substanciais e não meramente formais, do princípio do contraditório.”
Por isso só há falta de citação nos casos mais graves. Nos demais o vício gera nulidade da citação.
Não lhe sendo indicado prazo, deveria a Recorrente arguir a nulidade no momento em que interviesse pela primeira vez no processo.
A Recorrente, através da sua mandatária interveio na Audiência de Partes a 20.12.201, devendo, nesta data, salvo melhor opinião, ter tomado posição e arguir a nulidade, o que não fez; requereu a justificação da falta, o que não lhe foi deferido e foi notificada para apresentar a contestação iniciando-se o prazo no dia seguinte ao desta diligência frustrada.
Tendo a Recorrente constituído mandatária e estando esta presente na Audiência de Partes, que se frustrou, que foi indeferido o requerimento de justificação da falta do legal representante da Ré e que fosse designada nova data para a Audiência, sabia que o prazo se iniciava no dia seguinte e terminava decorridos 10 dias.
*
Cremos assim, que não assiste razão à Recorrente, devendo o douto despacho em recurso, ser confirmado.
[..]».
I.5 Concluídos os autos ao aqui relator, foi proferido o despacho seguinte:
Verifica-se que no despacho que admitiu o recurso não foi fixado o valor da causa, nos termos do art.º 306.º n.º3, do CPC.
Por outro lado, consultado o processo principal constata-se que o ilustre mandatário do autor, por requerimento apresentado via citius no dia 22-06-2022, veio renunciar ao mandato, sendo que nessa mesma data foi aquele notificado nos termos e para os efeitos do art.º 47.º 3, do CPC, ou seja, para constituir mandatário.
Neste quadro, determino o seguinte:
1. Baixam os autos à 1.ª instância para ser cumprido o disposto no art.º 306.º /3, do CPC, para retornarem a esta instância após o trânsito da decisão que vier a ser proferida.
2. Solicite-se à 1.ª instância que informe sobre a constituição, ou não, de novo mandatário pelo autor.
[..]».
I.5.1 Os autos baixaram à 1.ª instância para os efeitos determinados, vindo o Tribunal a quo a fixar o valor da acção em € 12.594,69.
Entretanto, o autor constituiu novo mandatário, tendo sido junta a respectiva procuração aos autos.
I.6 Foram cumpridos os vistos legais, remetido o projecto aos excelentíssimos adjuntos e determinada a inscrição do processo para julgamento em conferência.
I.7 Delimitação do objecto do recurso
Sendo o objecto do recurso delimitado pelas conclusões das alegações apresentadas, salvo questões do conhecimento oficioso [artigos 87.º do Código do Processo do Trabalho e artigos 639.º, 640.º, 635.º n.º 4 e 608.º n.º2, do CPC, aprovado pela Lei n.º 41/2013, de 26 de Junho], as questões que se colocam para apreciação são as seguintes:
i) Questão prévia – admissibilidade do recurso;
ii) A de saber se o Tribunal a quo errou na aplicação do direito ao não ter admitido a contestação da Ré, por extemporânea, em consequência considerando confessados os alegados pelo autor na petição inicial, nos termos do disposto no artigo 57.º, n.º 1 do CPT.
II. FUNDAMENTAÇÃO
II.1 MOTIVAÇÃO DE FACTO
Os factos relevantes para a apreciação do recurso são os que constam do relatório.
II.2 Questão prévia – admissibilidade do recurso
Como flui das conclusões das contra alegações, o recorrido suscitou a questão da admissibilidade do recurso, na sua perspectiva extemporâneo.
Nas alegações, refere o seguinte:
-«[..]
…o presente recurso tem como objeto o douto despacho da Meritíssima Juíza “a quo” de 14 de fevereiro de 2022, notificado à R. e sua ilustre Mandatária no dia 15 de fevereiro de 2022, referência Citius 433458520.
O presente recurso foi entregue no passado dia 10 de março de 2022, referência Citius
31626672.
Atendendo que o presente recurso, conforme referido pela recorrente, é apresentado nos termos do artigo 79 -A n.º 2 alínea d) do Código de Processo do Trabalho;
Atendendo que o n.º 2 do artigo 80.º do Código do Processo do Trabalho fixa o prazo de 15 dias para a interposição do recurso nos casos previstos no n.º 2 e 5 do artigo 79.º-A,
Forçoso será de concluir que o presente recurso foi apresentado fora do prazo legal pelo que o mesmo não deve ser admitido e consequentemente deve ser mantido o despacho recorrido».
Nesse mesmo sentido pronunciou-se o Digno Magistrado do Ministério Público, na consideração das razões acima transcritas no relatório.
Apreciando o ponto, cabe atentar no despacho que admitiu o recurso, cujo teor é o seguinte:
O recurso de apelação interposto pela ré mostra-se tempestivo, porquanto foi interposto no 3º dia útil subsequente ao termo do prazo tendo o autor liquidado a multa a que se alude no art. 139 n.º5 al c) do Código de Processo Civil (CPC) aplicável ex vi do art. 1º, n.º 2 al. a) do Código de Processo de Trabalho (CPT)
O recurso subirá, no entanto, em separado – cfr. art.s 83 A do CPT – pelo que se determina a notificação da ré para, no prazo de cinco dias, dar cabal cumprimento ao disposto no art. 646 n.º 1 do CPC aplicável ex vi do art. 1º, n.º 2 al. a) do CPT».
Diremos, desde já, que o recurso foi apresentado tempestivamente, designadamente, pelas razões enunciadas, ainda que singelamente, no despacho da 1ª instância. Cabe justificar esta asserção.
Resulta dos autos, que o despacho que não admitiu a contestação foi notificado a 15-02-22 – uma terça-feira -, Via Citius, ref. 433458520, pelo que se presume a notificação efectuada no 3.º dia útil seguinte, ou seja, a 18, uma sexta-feira [art.º 248.º do CPC].
Da decisão em causa, que se traduziu em não ter sido admitido o articulado da Ré, cabe recurso de apelação autónomo, conforme decorre da previsão do n.º2, al. d), do art.º 79-A, do CPT.
O prazo de interposição do recurso é, pois, de 15 dias [art.º 80.º n.º2, do CPT].
Esse prazo iniciou-se a 19 de Fevereiro de 22 e atingiu o seu termo a 5 de Março. Mas sendo esse dia um sábado, conforme o seu termo transferiu-se para o 1.º dia útil seguinte, o dia 7, segunda-feira [art.º 138.º 1 e 2, do CPC].
Contudo, nos termos do disposto no art.º 139.º n.º 5, do CPC, independentemente de justo impedimento, o acto podia ainda ser praticado até ao 3.º dia útil seguinte, mediante o pagamento da multa correspondente, conforme previsto nas alíneas a), b) e c), daquela disposição, o que nos leva, no caso concreto, até ao dia 10 de Março de 2022.
Ora, as alegações de recurso deram entrada em juízo justamente nesse dia e a recorrente pagou a multa devida, pelo que resta concluir pela tempestividade do recurso.
II.3 MOTIVAÇÃO DE DIREITO
A recorrente discorda da decisão do tribunal a quo por alegado erro, por não ter admitido a contestação por si apresentada com fundamento na extemporaneidade de tal peça processual.
Alega que nem do despacho de 29 de Novembro de 2021, que ordena a sua citação, nem da citação datada de 30 de novembro de 2021, nem do despacho exarado na ata de audiência de partes, realizada a 20 de dezembro de 2021, consta especificamente o prazo para apresentação de contestação. Diz que, repetida e sucessivamente nos seus despachos a Meritíssima Juiz a quo omitiu a indicação do prazo de defesa de 10 dias para a Ré aqui recorrente apresentar a sua defesa.
Mais alega, que a não indicação à Ré, em sede de citação, nem na notificação do despacho exarado na audiência de partes, do prazo para apresentação para contestação, investe-a na possibilidade de apresentação da sua defesa para além dos 10 dias legalmente previstos, pois não tendo sido observadas as formalidades previstas na lei, pode mesmo a mencionada citação ser considerada nula.
Refere, ainda, que embora o disposto no art.º 198 n.º 2 do Código de Processo Civil quanto à possibilidade de arguição da nulidade da citação por não indicação do prazo de defesa, a ser arguida aquando a primeira intervenção do citado no processo, tal possibilidade foi-lhe vedada, já que solicitado o adiamento da audiência de partes, tal pedido foi indeferido, tendo sido realizada a mencionada conferência na sua ausência, apenas com a devida justificação de falta.
Defende que há uma violação do princípio do contraditório - nº 3 do artigo 3º do Código de Processo Civil -, dado que a não admissão da contestação apresentada, irá traduzir decisão baseada apenas no alegado pelo A sem qualquer possibilidade da Ré aqui recorrente ver a prova por si apresentada e requerida apreciada e as suas testemunhas prestarem o seu depoimento sobre tal matéria. Assim com o há violação do princípio da igualdade das partes previsto no art.º 4 do Código de Processo Civil.
Pretende a revogação do despacho que não admitiu nos autos a contestação por alegada extemporaneidade, substituindo-se por outro que admitida a contestação apresentada.
II.3.1 Em jeito de enquadramento e com vista à abordagem das questões suscitadas, mostra-se pertinente começar por deixar algumas considerações essenciais.
Enuncia o art.º 219.º do CPC que “[A] citação é o acto pelo qual se dá conhecimento ao réu de que foi proposta contra ele determinada ação e se chama ao processo para se defender (..)” [n.º1], enquanto “[A) notificação serve para, em quaisquer outros casos, chamar alguém a juízo ou dar conhecimento de um facto” [n.º2].
No domínio do processo laboral, no que respeita à forma de processo comum, a citação, em regra, é sempre precedida de despacho liminar do Juiz, disciplinado pelo art.º 54.º do CPT, nos termos seguintes:
1 - Recebida a petição, se o juiz nela verificar deficiências ou obscuridades, deve convidar o autor a completá-la ou esclarecê-la, sem prejuízo do seu indeferimento nos termos do disposto no n.º 1 do artigo 590.º do Código de Processo Civil.
2 - Estando a ação em condições de prosseguir, o juiz designa uma audiência de partes, a realizar no prazo de 15 dias.
3 - O autor é notificado e o réu é citado para comparecerem pessoalmente ou, em caso de justificada impossibilidade de comparência, se fazerem representar por mandatário judicial com poderes especiais para confessar, desistir ou transigir.
4 - Com a citação é remetido ou entregue ao réu duplicado da petição inicial e cópia dos documentos que a acompanhem.
5 - Se a falta à audiência for julgada injustificada, o faltoso fica sujeito às sanções previstas no Código de Processo Civil para a litigância de má-fé.
Em comum com o processo civil [art.ºs 227.º/1 do CPC] a citação é acompanhada da petição inicial, bem como da cópia dos documentos que a acompanham [art.º54.º/ 4, do CPT]. Diversamente pode acontecer no que toca à indicação dos elementos relativos ao prazo da defesa e cominações para a falta de contestação, que no processo civil acompanham a citação [art.º 227.º/2, do CPC], enquanto no processo laboral, na acção declarativa comum, poderá só ocorrer após a audiência de partes – como adiante explicaremos -, de realização obrigatória, referida no n.º2, do art.º 54º e que se rege pelo disposto nos artigos 55.º e 56.º, deles constando estabelecido o seguinte:
[Artigo 55.º Audiência de partes]
1 - Declarada aberta a audiência, o autor expõe sucintamente os fundamentos de facto e de direito da sua pretensão.
2 - Após a resposta do réu, o juiz procurará conciliar as partes, nos termos e para os efeitos dos artigos 51.º a 53.º
[Artigo 56.º Outros atos da audiência]
Frustrada a conciliação, a audiência prossegue, devendo o juiz:
a) Ordenar a notificação imediata do réu para contestar no prazo de 10 dias;
b) Determinar a prática dos atos que melhor se ajustem ao fim do processo, bem como as necessárias adaptações, depois de ouvidas as partes presentes;
c) Fixar a data da audiência final, com observância do disposto no artigo 151.º do Código de Processo Civil.

A audiência de partes constituiu uma novidade introduzida pelo Código de Processo do Trabalho aprovado pelo Decreto-Lei n.º 480/99, apontando o legislador no preâmbulo do diploma como objectivos, os seguintes:
- permitir uma mais fácil conciliação mediante acordo equitativo, antes da radicalização do litígio, pressupondo a existência de maior disponibilidade das partes para o consenso, tanto mais que se desenrola perante o juiz;
- contribuir para a simplificação da tramitação e para a rápida definição do verdadeiro objecto do processo, funcionando como uma primeira fase de saneamento do processo e como factor de diminuição de burocratização, como p. ex. o agendamento de actos processuais com a participação de todos os interessados (menos expediente para o juiz e menos actos de secretaria).
Não releva para o caso entrar em maior detalhe sobre este acto, bastando assinalar que ouvidas ambas as partes o juiz procurará conciliá-las mediante acordo equitativo e, caso se fruste a conciliação, ordenará a imediata notificação do R. para contestar, em dez dias [art.º 56.º/al. a].
Como se disse a audiências de partes constituiu uma novidade e, como tal, não deixou de suscitar questões quanto à aplicação da sua disciplina. Uma delas prendia-se com precisamente com o disposto na alínea a) do art.º 56.º, isto é, determinando-se aí que caso se fruste a conciliação, o juiz ordena a “notificação imediata do réu para contestar no prazo de dez dias”, preceito que entretanto não sofreu qualquer alteração, nomeadamente por via da revisão operada ao CPT pelo Decreto-Lei nº 295/2009 de 13 de Outubro, ou da Lei n.º 107/2019, de 09/09.
Decorre do que se vem expondo, que atento o disposto nos artigos 54.º n.º3 e 56.º al. a), o momento da citação do Réu para a audiência de partes, bem como para a acção, na medida em que concomitantemente lhe é remetido ou entregue duplicado da petição inicial e cópia dos documentos que a acompanhem, é um acto distinto e temporalmente separado do momento da notificação do Réu para contestar, com indicação do prazo de dez dias.
Refira-se, que ainda antes do entrada em vigor do então novo CPT, colocou-se logo a questão de saber se para obstar aos inconvenientes resultantes da falta do réu à audiência de partes, seria possível, sem pôr em causa o regime legal, ordenar esta notificação logo conjuntamente com a citação para a audiência de partes, mencionando-se que nesse caso, ou seja, que faltando àquele acto o prazo para contestar começaria logo a correr no dia seguinte ao da audiência de partes. Com esse procedimento, evitar-se-ia a necessidade de proceder àquela notificação por via postal caso o Réu faltasse, com óbvio retardamento do processo em prejuízo do autor, tanto mais que estando aquele já citado e, logo, alertado para a existência da acção e para os seus termos, poderia enveredar por uma atitude de procurar furtar-se à notificação.
Prevaleceu o entendimento de que a lei não obsta a esta solução, nomeadamente porque os direitos a acautelar, desde logo no interesse do demandado, ficavam plenamente salvaguardados. Para além disso, a solução contribuía para a simplificação da tramitação e para a rápida definição do verdadeiro objecto do processo. Daí que, nesse pressuposto, é prática instituída nos tribunais de trabalho procederem, conjuntamente com a citação e para a hipótese de falta à audiência de partes, à notificação do réu nos termos e para os efeitos da al. a), do art.º 56.º CPT.
Ilustra o que vimos afirmando o Acórdão da Relação de Lisboa, de 01-06-2011 [Proc.º 1818/10.1TTLSB.L1, Desembargador Ferreira Marques, disponível em www.dgsi.pt], onde a dado passo, reportando-se aos artigos 54.º a 56.º do CPT, se lê o seguinte:
- «Decorre dos referidos preceitos que o momento da citação do Réu para a audiência de partes e o momento da notificação do Réu para contestar são actos distintos e temporalmente separados. Todavia, como frequentemente, os demandados não comparecem à audiência de partes (alguns, para, dessa forma, protelarem a data da notificação para contestar), há juízes que, por razões de economia e celeridade processual, determinam, logo, no despacho liminar, que aqueles, no momento da citação para a referida audiência de partes, sejam notificados e advertidos de que, caso não compareçam nem se façam representar na audiência de partes por mandatário judicial com poderes especiais para confessar, desistir ou transigir, devem contestar a acção no prazo de 10 dias a contar da data designada para a audiência, sob pena de se considerarem confessados os factos articulados pelo autor.
Foi o que sucedeu no caso em apreço, como se pode constatar no despacho liminar exarado a fls. 12, que a recorrente não impugnou.
Esta é, aliás, uma prática seguida por alguns tribunais que, em nossa opinião, não enferma de qualquer irregularidade, pois visa apenas simplificar, desburocratizar e imprimir celeridade ao processo, não restringindo nem pondo minimamente em causa qualquer direito ou garantia das partes».
Nesse sentido, pronunciou-se também o acórdão da Relação de Lisboa, de 20-11-2013 [Proc.º 4520/12.6TTLSB.L1-4, relatado pelo também aqui relator, disponível em www.dgsi.pt], cuja fundamentação, nessa parte, aqui vimos acompanhando. E, mais recentemente, o acórdão da Relação de Guimarães, de 17-12-2019 [Proc.º 506/19.3T8VNF.G1, Desembargador Antero Veiga, disponível em www.dgsi.pt], em cujo sumário pode ler-se “I - No domínio do processo laboral, nada obsta a que logo no ato de citação se inteire o citando de todos os elementos e advertências prescritos na lei e relativos ao exercício do direito de defesa, com indicação do prazo para contestar, data de início e respetivas cominações”.
Revertendo ao caso, deve assinalar-se que a recorrente não põe em causa essa possibilidade, antes vindo insurgir-se pelo facto de com a citação para a audiência de partes constar que se “não comparecer, ou se a tentativa de conciliação se frustrar, o prazo de contestação se inicia no dia seguinte ao da audiência de partes, tendo a falta de contestação os efeitos previstos no artº 57º, nº 1 do CPT, considerando-se confessados os factos articulados pelo(a/s) autor(a/es)”, sem que constasse especificamente o prazo para apresentação de contestação.
Não obstante, importava afirmar aquele entendimento, dado que por decorrência do mesmo, o ponto fulcral para apreciação consiste em retirar os efeitos da falta daquela menção no acto de citação para a audiência de partes e, num momento seguinte, em saber se a recorrente vem reagir em tempo útil, como defende invocando que “tal possibilidade foi-lhe vedada, já que solicitado o adiamento da audiência de partes, tal pedido foi indeferido, tendo sido realizada a mencionada conferência na sua ausência, apenas com a devida justificação de falta”.
II.3.2 Feitas as considerações que antecedem, vejamos se assiste razão à recorrente.
O artigo 191.º do CPC, com a epígrafe “Nulidade da citação”, no que aqui releva, estabelece o seguinte:
1 - Sem prejuízo do disposto no artigo 188.º, é nula a citação quando não hajam sido, na sua realização, observadas as formalidades prescritas na lei.
2 - O prazo para a arguição da nulidade é o que tiver sido indicado para a contestação; sendo, porém, a citação edital, ou não tendo sido indicado prazo para a defesa, a nulidade pode ser arguida quando da primeira intervenção do citado no processo.
3- [.]
4 - A arguição só é atendida se a falta cometida puder prejudicar a defesa do citado.
Admite-se que o despacho da senhora Juíza designado dia para a audiência de partes e determinando a notificação para o dever de comparência pessoal e efeitos em caso de injustificada comparência, bem assim para que a Ré fosse advertida “que se não comparecer, ou se a tentativa de conciliação se frustrar, o prazo de contestação se inicia no dia seguinte ao da audiência de partes, tendo a falta de contestação os efeitos previstos no artº 57º, nº 1 do CPT, considerando-se confessados os factos articulados pelo(a/s) autor(a/es)”, seria mais explicito e, logo, mais correcto, se mencionasse expressamente o prazo de contestação ou remetesse para a lei para esse efeito.

Todavia, certo é que o prazo para contestação está expressamente previsto na al. a), do art.º 56.º, do CPT, não estando a secção de processos dependente daquela indicação mais precisa para que pudesse efectuar correctamente a notificação no que concerne ao ónus de contestação no prazo legal.
No que aqui releva, nessa parte da citação e notificação, consta o seguinte:
- “Fica ainda advertido, que se não comparecer, ou se a tentativa de conciliação se frustrar, o prazo de contestação se inicia no dia seguinte ao da audiência de partes, tendo a falta de contestação os efeitos previstos no artº 57º, nº 1 do CPT, considerando-se confessados os factos articulados pelo(a/s) autor(a/es)”.
Pois bem, embora constem todos os demais elementos relevantes para assegurar à Ré a possibilidade de exercer o seu direito ao contraditório, designadamente em que circunstâncias se iniciava o prazo para contestar, quando se iniciava e os efeitos cominatórios da falta de contestação, como a recorrente refere, falta a indicação do prazo para a apresentação da contestação.
Significa isso que a citação - aqui mais rigorosamente, a notificação -, por preterição dessa indicação, enferma da nulidade prevista no n.º1, do acima transcrito art.º 191.º do CPC. No caso, resultando a nulidade precisamente da falta de indicação de prazo para a defesa, a mesma podia ser arguida “quando da primeira intervenção do citado no processo”[n.º2, do mesmo artigo].
Trata-se de uma nulidade processual secundária, dado estar sujeita a arguição pela parte interessada [art.º 197.º,], quanto à oportunidade para tal sujeita ao regime do aludido n.º2, do artigo 191.º., e dela não podendo conhecer oficiosamente o Tribunal, atento o disposto no art.º 196.º [todos do CPC].
A recorrente tem essa noção, como deixou expressamente vertido nas suas conclusões, mas vem defender que “tal possibilidade foi-lhe vedada, já que solicitado o adiamento da audiência de partes, tal pedido foi indeferido, tendo sido realizada a mencionada conferência na sua ausência, apenas com a devida justificação de falta”.
Como bem se percebe face a essa alegação, a recorrente parte do pressuposto que a “primeira intervenção do citado no processo” [n.º2, do art.º 191.º] passaria pela presença pessoal do legal representante da ré e da ilustre mandatária na audiência de partes, ou pelo menos desta, caso tivesse sido deferido o requerimento que apresentou para que fosse adiada a audiência de partes.
Esta posição não pode ser acolhida. A expressão “primeira intervenção do citado no processo”, abrange a possibilidade referida pela recorrente, mas também as situações em que a parte intervenha no processo, pela primeira vez, praticando qualquer acto processual, compaginando-se com a regra geral sobre o prazo de arguição das nulidades secundárias, estabelecida no n.º1, do art.º 199.º do CPC.
Ora, como consta da acta da audiência de partes, previamente ao início desse acto a ilustre mandatária da Ré apresentou um “requerimento via citius com a ref.ª 40781327” -aquele a que aqui faz alusão referindo que requereu o adiamento da audiência de partes -,[..] dando conhecimento que o legal representante da ré Sr.º CC padece de patologia relacionada com o sistema respiratório e tem atualmente 70 anos. Informa ainda, que por motivos profissionais (escritura de partilha agendada à mesma hora) se encontra impossibilitada de comparecer na audiência de partes agendada para o dia de hoje. Requer assim, a justificação da sua falta e do legal representante da ré, solicitando o agendamento de nova data de audiência de partes. [..]».
A apresentação desse requerimento consubstancia inequivocamente uma intervenção da citada Ré no processo, no caso, a primeira, pelo que se o entendesse necessário, deveria então ter feito uso do disposto no art.º 191.º n.º2, arguindo a nulidade da citação por falta de indicação do prazo para apresentação da contestação.
Como assim não procedeu, deve considerar-se que a nulidade ficou suprida.
Diga-se, ainda, que contrariamente ao que defende, não cabia ao Tribunal a quo verificar a nulidade na audiência de partes, anular a notificação efectuada para a Ré contestar caso faltasse, e determinar a sua repetição. A razão já ficou acima explicada: trata-se de uma nulidade secundária excluída do poder/dever de conhecimento oficioso [art.º 196.º do CPC].
Por último, também contrariamente ao que defende, não há violação do princípio do contraditório, nem do princípio da igualdade das partes. Justamente para preservar esses princípios, a lei estabelece claramente que a falta de menção do prazo para contestação consubstancia nulidade arguível pela parte “quando da primeira intervenção do citado no processo” [art.º 191.º /1 e 2]. Se a Ré não usou dessa faculdade processual tempestivamente, só a si é imputável.
Na verdade, sendo a única falha da citação/notificação a falta de indicação do prazo para contestar, tal significa que bem sabia estar a ser demandada na acção, quais os pedidos, fundamentos e provas apresentadas pelo autor, bem assim quais as consequências para a falta de contestação, pelo que se dúvidas tinha quanto àquele aspecto, designadamente, no caso de faltar à audiência de partes, ou poderia ter diligenciado por as esclarecer oportunamente, ou se por alguma razão entendesse não ser tal bastante e justificar-se a arguição da nulidade, então, deveria ter acautelado que o fazia tempestivamente.
Concluindo, improcede o recurso, devendo ser confirmada a decisão recorrida.
III. DECISÃO
Em face do exposto, acordam os Juízes desta Relação em julgar o recurso improcedente, confirmando a decisão recorrida.

Custas a cargo da recorrente, atento o decaimento (art.º 527.º CPC).

Porto, 14 de Dezembro de 2022
Jerónimo Freitas
Nelson Fernandes
Rita Romeira