Acórdão do Tribunal da Relação do Porto
Processo:
3360/22.9T8VNG.P1
Nº Convencional: JTRP000
Relator: JOSÉ EUSÉBIO ALMEIDA
Descritores: RESPONSABILIDADE POR ACIDENTE DE VIAÇÃO
DANOS PATRIMONIAIS FUTUROS
VALOR INDEMNIZATÓRIO
Nº do Documento: RP202405063360/22.9T8VNG.P1
Data do Acordão: 05/06/2024
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: REVOGADA PARCIAL
Indicações Eventuais: 5ª SECÇÃO
Área Temática: .
Sumário: I - Atualmente, nada justifica que o valor indemnizatório, encontrado para ressarcir os danos patrimoniais futuros, seja descontado de algum montante, em razão do recebimento imediato do respetivo montante.
II - Pelo contrário – e ainda que seja de ter por base a retribuição líquida – o que se justifica é que o valor indemnizatório encontrado (a que se chega ponderando a esperança de vida e não apenas o limite da idade laboral) seja acrescido da natural e previsível melhoria de rendimentos ou carreira profissional do lesado.
Reclamações:
Decisão Texto Integral: Processo n.º 3360/22.9T8VNG.P1

Recorrente/recorrido – AA
Recorrente/recorrida – A..., SA

Relator: José Eusébio Almeida; Adjuntos: Ana Paula Amorim e Manuel Fernandes.

Acordam na 3.ª Secção Cível (5.ª Secção) do Tribunal da Relação do Porto:

I – Relatório
AA intentou a presente ação contra A..., SA, pedindo a condenação da ré a pagar-lhe a quantia de 83.268,04€, acrescida de juros.  

Alegou, para tanto e em síntese, ter sofrido um acidente de viação no dia 15.11.2020, em que foram intervenientes o veículo automóvel ligeiro de passageiros, com matrícula ..-XC-.., por si conduzido e o ligeiro de passageiros, com matrícula ..-..-NI, conduzido por BB, segurado na ré; alegou o circunstancialismo em que o acidente ocorreu, aduzindo factos suscetíveis de demonstrar que ocorreu por culpa do veículo segurado e, bem assim, os factos demonstrativos de ter sofrido danos patrimoniais e não patrimoniais, em consequência desse acidente.

A ré contestou. Aceitou os factos atinentes à responsabilidade do veículo seu segurado na eclosão do acidente, mas impugnou os danos alegados pelo autor. Requereu a Intervenção da Companhia de Seguros B..., SA, alegando que o sinistro constituiu simultaneamente um acidente de viação e de trabalho, e que a mesma tem direito a ser reembolsada dos montantes já pagos, bem como daqueles que vier a liquidar ao autor, em consequência do acidente.

A intervenção foi admitida por despacho proferido a 23.09.22. Por requerimento de 27.10.22 a Interveniente veio alegar ter despendido a quantia global de 24.414,19€ com o acidente e que já foi reembolsada dessa quantia pela ré. Em consequência, por despacho de 17.11.22, foi, relativamente à interveniente, julgada extinta a instância.

Foi elaborado despacho saneador, no âmbito do qual se fixou o objeto do litígio e  se enunciaram os temas da prova. Teve lugar a audiência de julgamento e foi proferida sentença com o seguinte dispositivo: “Por tudo o exposto, decido julgar a ação parcialmente procedente por provada e, em consequência: - Condenar a Ré A..., S.A. a pagar ao Autor a quantia de €17.500,00 (dezassete mil e quinhentos euros), acrescida de juros de mora, à taxa legal de 4% ou outra que legalmente venha a estar em vigor, desde a citação (05.05.2022) sobre o capital de €7.500,00 (sete mil e quinhentos euros) e desde a presente data sobre o capital de €10.000,00 (dez mil euros) até efetivo e integral pagamento; - Absolver a Ré A..., S.A. do restante pedido”.

II – Do Recursos
Autor e ré, ambos inconformados com a sentença, vieram apelar.
II.I – Recurso interposto pelo autor
O autor pretende a alteração do decidido e conclui:
1 - Os valores fixados pelo tribunal são manifestamente miserabilísticos se tivermos em consideração as concretas lesões sofridas.
2 - O recurso é delimitado à questão dos danos sofridos pelo autor e sua quantificação, pugnando o recorrente pela sua alteração quanto ao montante indemnizatório fixado para o dano patrimonial futuro e danos morais.
3 - O autor foi submetido a exame pericial no INML do Porto que, no relatório elaborado a fls., lhe atribuiu uma incapacidade parcial geral de 3 pontos.
4 - As sequelas descritas no relatório pericial manifestam-se na atividade profissional do autor, implicando esforços acrescidos.
5 - Que se repercutem na vida profissional, implicando inevitavelmente não só um esforço acrescido, como também um maior cansaço, desgaste físico e, por isso, uma diminuição de rentabilidade e da capacidade de trabalho.
6 - Que impedirão, por certo, o autor de ter o mesmo desempenho profissional que tinha antes do acidente.
7 - Como se refere no Acórdão do S.T.J. de 12.09.2013 (in dgsi) “Mesmo que não haja retração salarial, a IPP dá lugar a indemnização por danos patrimoniais, pois o dano físico determinante da incapacidade exige do lesado um esforço suplementar, físico e psíquico, para obter o mesmo resultado de trabalho”.
8 - O autor tinha 47 anos de idade, à data do acidente.
9 - Foi-lhe atribuída uma Incapacidade Parcial Geral de 3 pontos, com esforços acrescidos.
10 - Assim sendo, não se mostra exagerada a verba aqui pedida para tal dano, verba que este Tribunal da Relação deve fixar no montante de 15.000,00€.
11 - Por outro lado, o valor fixado para os danos morais, também dever ser alterado, na medida em que: - O autor sofreu fratura do cotovelo esquerdo; - Sete fraturas do arco costal direito; - Esteve em imobilização gessada; - Esteve internado; - Foi submetido a uma intervenção cirúrgica; - Realizou tratamentos de fisioterapia; - Foi sujeito a extração do material de osteossíntese; - Durante os primeiros 3 meses após o acidente esteve dependente dos cuidados de terceira pessoa; - Apresenta cicatriz vertical com 13cm de comprimento e 1 cm de largura na face posterior do cotovelo; - Ficou com flexo do cotovelo de 30º e défice de flexão do cotovelo de 30º; - Sente dor nos arcos finais da pronação, flexão e extensão; - O dano estético foi-lhe fixado em 2/7; - O quantum doloris foi fixável em 4/7; - Apresentando, ainda, repercussão permanente nas atividades Desportivas e de Lazer de 2/7 e - De igual modo a repercussão permanente na Atividade Sexual fixável em 2/7.
12 - Como se pode ver, sofreu graves danos que ficaram inequivocamente provados.
13 - Danos que indubitavelmente merecem a tutela do direito, tanto mais que as sequelas de que o mesmo ficou a padecer são irreversíveis e altamente incapacitantes.
14 - Devendo a indemnização desses danos morais ser fixada com base na equidade.
15 - No que se refere ao juízo de equidade, tem a jurisprudência entendido de modo uniforme que não deve confundir-se a equidade com a pura arbitrariedade ou com a total entrega da solução a critérios assentes em puro subjetivismo do julgador, devendo a mesma traduzir “a justiça do caso concreto, flexível, humana, independente de critérios normativos fixados na lei”, devendo o julgador “ter em conta as regras da boa prudência, do bom senso prático, da justa medida das coisas e da criteriosa ponderação das realidades da vida...”.
16 - Como tal, para fixar a indemnização por danos não patrimoniais o julgador deve aferir a gravidade do dano atendendo a padrões objetivos e não a padrões subjetivos.
17 - Danos esses que pela sua gravidade mereçam a tutela do direito (art. 496/1 do CC).
18 - E nesta medida a título de danos morais deverá ser-lhe fixada a quantia de 20.000,00€ em vez dos 10.000,00€ fixados na decisão recorrida.
19 - Por tudo, deverá alterar-se a decisão quanto às verbas e nos termos enunciados.
20 - A decisão violou os artigos 496, 562, 563, 564 e 566 do Código Civil, preceitos que assim, por errada interpretação e aplicação, se encontram violados pela sentença recorrida, e os mais que V. Exas, doutamente, vierem a considerar.
21 - Em consequência, não restará outra alternativa senão alterar a decisão no que concerne ao valor arbitrado por todos os danos decorrentes do acidente.

II.II – Recurso interposto pela ré
A ré pretende a sua absolvição no que respeita à condenação relativa aos danos patrimoniais futuros e apresenta as seguintes Conclusões:
1 - O recurso visa discutir a decisão proferida acerca da matéria de direito, no que tange a condenação a pagar ao autor a quantia de 7.500,00€, a título de dano biológico pela perda futura de capacidade de ganho, visando sua a reapreciação e a sua substituição por decisão que absolva a recorrente desta parcela da sua condenação.
2 - Conhecendo do pedido de indemnização deduzido pelo autor a título de perda de capacidade de ganho, resultante da incapacidade de que ficou a padecer, a sentença recorrida arbitrou ao recorrido a quantia de 7.500,00€, a título de indemnização pela diminuição da sua condição física, resultante da dita incapacidade permanente.
3 - Para tanto, e no essencial, o tribunal considerou que: da matéria de facto provada resulta que a incapacidade do autor não é impeditiva do exercício da atividade habitual, mas implica esforços suplementares; não está demonstrada perda efetiva de rendimento após alta definitiva, tal facto não permite afirmar que no futuro a quebra de rendimento não ocorrerá; em provado que o autor ficou portador de um défice funcional permanente de integridade físico-psíquica fixável em 3 pontos; se provou que o autor nasceu em 21.05.1973, tendo, portanto, 48 anos na data de 08.11.2021 (da alta definitiva); a esperança média de vida à nascença em Portugal, para o ano de 2021, se situava em 78,1 anos, para os homens; ficou demonstrado que o rendimento auferido pelo autor correspondia a valor médio anual de 13.107,20€; Os montantes recebidos pelo autor em sede de acidente de trabalho e já reembolsados pela ré, sendo, neste âmbito, de relevar, para a sentença, que não há total correspondência entre as indemnizações atribuídas a título de incapacidade permanente e a título de dano biológico;
4 - Suportada nestes factos, a sentença conjugou o rendimento médio anual auferido pelo autor aquando do acidente, que se apurou ser no valor de 13.107,20€, com a sua esperança média de vida (31 anos) e com a incapacidade permanente de que este ficou portador (3 pontos), ponderando assim um valor indemnizatório de cerca de 12.189,70€ (13.107,20 x 31 x 3%).
5 - A este montante, o tribunal expressou a necessidade de o deduzir em cerca de 1⁄4, a título de equidade, para compensação do efeito antecipatório da entrega imediata de uma indemnização reportada a um período de 31 anos (expectativa de vida).
6 - “Feitas as contas”, o montante indemnizatório encontrado pelo tribunal ascenderia a um valor aproximado de 9.142,28€.
7 - Refere ainda a sentença que o julgador tomou em consideração, também, outros fatores (imponderáveis), concluindo ser devido ao autor o montante indemnizatório de 7.500,00€, a título de ressarcimento da diminuição da capacidade física, ou seja, a título da perda de capacidade de ganho.
8 - Por outras palavras, a sentença recorrida teria fixado a indemnização devida ao autor pela sua perda de capacidade de ganho no montante de 17.731,96€, a qual, deduzida do montante de 10.231,96€, por ele recebida a título de capital de remição em sede de acidente de trabalho, atinge o montante líquido de 7.500,00€.
9 - Ora, a ré não se conforma o método perfilhado para arbitramento da indemnização devida a título de perda futura de capacidade de ganho, o qual, salvo o devido respeito, revela-se opaco e pouco esclarecedor do peso de cada fator enunciado na sentença para arbitramento da pretendida indemnização por perda futura de capacidade de ganho.
10 - A isto acresce a dúvida que resulta da sentença, quanto à exigibilidade, ou não, da dedução da totalidade da indemnização já recebida pelo recorrido a título de capital de remição em sede de acidente de trabalho, à indemnização ora arbitrada a título de perda futura de capacidade de ganho.
11 - Com efeito, a afirmação constante da sentença, segundo a qual, não existe total correspondência entre as indemnizações atribuídas a título de incapacidade permanente e a título de dano biológico, permite suscitar a dúvida de saber se o Julgador considerou, ou não, a totalidade da indemnização já recebida pelo autor em sede de acidente de trabalho ao arbitrar-lhe agora a indemnização de 7.500,00€ a título de perda de capacidade de ganho. O que não é aceitável.
12 - Tal dedução deve ser operada integralmente, sob pena de duplicação de indemnizações pelo mesmo dano.
13 - Como é sabido, vem sendo entendimento da jurisprudência que a incapacidade permanente constitui sempre um dano patrimonial, que deve ser ressarcido como tal. Vide Ac. STJ de 19.05.2009, no processo 298/06.0TBSJM.S1, relatado pelo Sr. Conselheiro Fonseca Ramos e o Ac. STJ de 04/10/2007, no processo 07B2957;
14 - No caso, demonstrou-se que a incapacidade permanente de que o autor ficou portador implica esforços acrescidos no desempenho da sua profissão, mas não se provou ter ocorrido uma efetiva perda de rendimentos; a sua quantificação deve assentar sobretudo na equidade, sem esquecer alguns elementos coadjuvantes.
15 - Entre eles estarão, por exemplo, as tabelas financeiras de cálculo de danos patrimoniais que se repercutam no futuro, que podem servir como critério coadjuvante, que permite aferir o máximo da indemnização que seria devida para o caso de se verificar uma efetiva perda de rendimentos. Vide Acórdão do STJ de 10.10.2012 (relatado pelo Sr. Conselheiro Lopes do Rego, proc. 632/2001.G1.S1, in dgsi);
16 - A comparação dos valores atribuídos noutras decisões judiciais em casos análogos, também poderá contribuir para uma justa quantificação da indemnização (cfr nesse sentido douto acórdão da RC de 28/05/2013 (Proc. 1721/08.5TBAVR.C1).
17 - E não será de desprezar o contributo dos critérios estabelecidos na legislação respeitante à quantificação das indemnizações devidas pelas Seguradoras na fase extra- judicial em resultado de um acidente de viação.
18 - De facto, como é sabido, a diretiva 2005/14/CE do Parlamento Europeu e do veio introduzir na diretiva 09/232/CEE normas relativas à regularização de sinistros, já transposta para o direito português.
19 - Um dos contributos preponderantes do legislador nacional para a prossecução desse fim foi a criação da “proposta razoável”, que as seguradoras devem apresentar ao lesado em cumprimento do disposto nos artigos 38.º e 39.º do DL 291/2007 (e, anteriormente, nos termos previstos no DL 83/2006).
20 - Nesse âmbito, a portaria 679/2009 prevê a compensação do dano biológico do autor uma quantia entre os 1.723,68€ e os 2.246,88€.
21 - Por outro lado, numa perspetiva de ressarcimento de uma efetiva perda de rendimentos, considerando uma retribuição anual de 13.107,20€, uma esperança de vida ativa de 31 anos, a incapacidade de 3 pontos e uma taxa de capitalização de 3%, chegaríamos a verba de 7.854,17€, a que sempre seria de reduzir em cerca de 1⁄4, título de equidade, para anular o efeito da antecipação de capital com a entrega imediata da indemnização;
22 - Já procurando na jurisprudência, encontram-se, entre outras, decisões que arbitram um montante situado entre os 10.000,00€ e os 5.000,00€ para ressarcimento de um défice de 2 e de 3 pontos; Vide Ac. 22.03.2021, processo n.º 735/16.6T8STS.P1, disponível em dgsi, e Ac. STJ de 16.11.2017 (processo n.º 576/14.5TBSJM.P1.S1);
23 - Perante todos os elementos coadjuvantes acima invocados, entende a recorrente que, em equidade, a indemnização pelo dano biológico que afeta o autor, encarado como um dano patrimonial futuro decorrente de perda de capacidade de ganho, não deveria ser superior à de 10.000,00€.
24 - Estabelecida a natureza patrimonial do dano biológico, deve agora ser analisada a questão do abatimento a essa verba do montante pago ao apelado a título de indemnização pela incapacidade permanente no âmbito laboral, no caso, o valor de 10.231,96€.
25 - Ora, como vem sendo entendido de forma unânime pelos nossos Tribunais Superiores, as indemnizações por incapacidade permanente atribuídas no âmbito viário e laboral não são cumuláveis, mas antes complementares. Vide Ac. de 30.04.2013, disponível em dgsi; Ac. STJ de 14.04.2011, no processo 3075/05.2TBPBL.CLS;
26 - O n.º 4.º do artigo 17.º da Lei 98/2009 prevê mesmo a subrogação da seguradora de acidente de viação nos direitos do lesado, na medida desse mesmo pagamento;
27 - Assim, deve ser abatida à indemnização atribuída por incapacidade permanente, a quantia que lhe foi paga a título de capital de remição, ou seja, 10.231,96€.
28 - Em face do exposto e sendo a quantia recebida pelo título de capital de remição superior à que lhe seria devida pelo seu dano biológico/perda futura de rendimentos, deve a apelante ser absolvida nessa parte (no que toca aos 7.500,00€ atribuídos).
29 - E mesmo que se entenda que deve ser reconhecido ao autor o direito a indemnização superior a 10.000,00€, a este título, deve ser sempre abatida à verba que vier a ser atribuída o montante do capital de remição (10.231,96€), o que se requer.
30 - A decisão viola o preceituado nos artigos 483, 495, 562 e 564 do Código Civil.

A seguradora ré, também recorrente, respondeu ao recurso do autor e defendeu a sua improcedência.

Ambos os recursos foram legalmente recebidos, por despacho cujo sentido não se modificou nesta instância. Os autos correram Vistos, e não vemos motivos que obstem ao conhecimento de ambas as apelações. O objeto dos recursos, tendo em conta as respetivas conclusões, traduz-se em saber: 1) No recurso do autor, a) se a quantia indemnizatória atribuída a título de dano patrimonial futuro deve ser outra e superior, fixando-se em 15.000,00€ e b) se o valor arbitrado a título de danos não patrimoniais peca por ser escasso, devendo fixar-se em 20.000,00€; 2) No recurso interposto pela ré, c) se o montante fixado a título de indemnização pelo dano patrimonial futuro se mostra excessivo, pois não atende à reparação do sinistro em sede laboral, que deve ser abatida.

III – Fundamentação
III.I – Fundamentação de facto
O tribunal recorrido deu como assente a factualidade provada e não provada que se transcreve, ainda que limitando tal transcrição aos factos relevantes à apreciação dos recursos, ou seja, desconsiderando a factualidade relativa à dinâmica do acidente, porquanto a ré assume a respetiva responsabilidade (artigo 663, n.º 6 do Código de Processo Civil – CPC, por maioria de razão).  
Factos Provados:
5 - Em consequência do acidente o Autor sofreu fratura do cotovelo esquerdo e sete fraturas do arco costal direito.
6 - Foi socorrido pelo INEM e transportado para o Hospital ..., onde ficou internado até ao dia 16.11.2020.
7 - Foi-lhe aplicada uma imobilização gessada.
8 - Depois da alta hospitalar passou a ser seguido nos serviços clínicos da B..., por acidentes de trabalho.
9 - Nos serviços clínicos da B..., no Hospital 1..., foi operado ao cotovelo.
10 - Realizou tratamentos de fisioterapia.
11 - Foi-lhe feita a extração do material de osteossíntese.
12 - Teve alta em 08.11.2021.
13 - Ficou a padecer de cicatriz vertical com 13 cm de comprimento e 1 cm de largura na face posterior do cotovelo.
14 - Em consequência das lesões sofridas com o acidente ficou com flexo do cotovelo de 30º e défice da flexão do cotovelo de 30º.
15 - Sente dor nos arcos finais da pronação, flexão e extensão.
16 - A data da consolidação médico-legal das lesões ocorreu em 09.11.2021.
17 - O período de Défice Funcional Temporário Total decorreu entre 15.11.2020 e 19.11.2020 e entre 15.05.2021 e 16.05.2021, num período de 7 dias.
18 - O período de Défice Funcional Temporário Parcial decorreu entre 20.11.2020 e 14.05.2021 e entre 17.05.2021 e 08.11.2021, durante o período de 352 dias.
19 - O período de Repercussão Temporária na Atividade Profissional Total verificou-se de 15.11.2020 a 31.08.2021, num período de 290 dias.
20 - O período de Repercussão Temporária na Atividade Profissional Parcial verificou-se de 01.09.2021 a 08.11.2021, num período de 69 dias.
21 - O quantum doloris é fixável no grau 4, numa escala crescente de 7 graus.
22 - As sequelas decorrentes das lesões sofridas no acidente determinam ao autor um défice funcional permanente de integridade físico-psíquica fixável em 3 pontos.
23 - As sequelas de que ficou a padecer são, em termos de Repercussão Permanente na Atividade Profissional, compatíveis com o exercício da atividade habitual, mas implicam esforços suplementares.
24 - O Dano Estético Permanente é fixável no grau 2, de uma escala crescente de 7 graus.
25 - A repercussão permanente nas Atividades Desportivas e de Lazer é fixável no grau 2, de uma escala crescente de 7 graus.
26 - A repercussão permanente na Atividade Sexual é fixável no grau 2, de uma escala crescente de 7 graus.
27 - O autor nasceu no dia ../../1973.
28 - Trabalhava como distribuidor de pizzas, auferindo de vencimento anual de 13.107,20€.
30 - O acidente foi participado pela entidade patronal do autor à Companhia de Seguros B..., SA, seguradora para a qual aquela havia transferido a responsabilidade laboral decorrente dos sinistros que envolvessem os seus empregados, mediante contrato de seguro de acidentes de trabalho titulado pela apólice n.º ....
31 - O autor recebeu da Companhia de Seguros B..., SA a quantia global de 24.414,19€, sendo 10.231,96€ a título de capital de remição.
32 - O autor durante os primeiros 3 meses após o acidente esteve dependente dos cuidados de terceira pessoa.
33 - Passou por momentos de dor e sofrimento.

Facto não provado
1 – O autor realizou tratamentos de fisioterapia durante 8 meses. 

III.II – Fundamentação de Direito
Para melhor compreensão das discordâncias dos recorrentes em relação ao decidido, transcrevemos, com síntese e sublinhados nossos, a fundamentação da sentença: “(...) conclui-se, no caso concreto, que o Autor – portador de um défice funcional permanente fixável em 3 pontos - tem direito a ser indemnizado pela diminuição da sua condição física em que se traduz aquela incapacidade. Nesta situação, mais do que o recurso ao método auxiliar de utilização de tabelas financeiras (não o deixando, contudo, de ter presente, mais não seja como termo de comparação), o cálculo da indemnização haverá de ancorar-se primordialmente na equidade (...) há que ter em conta que nasceu em 21.05.1973, tendo, portanto, 48 anos na data da alta definitiva (...) Há que considerar ainda a evolução da esperança média de vida à nascença em Portugal, a qual, no ano de 2021, se situava em 78,1 anos para os homens e 83,5 anos para as mulheres, situando-se a geral em 81,0 anos (...)  Há que considerar o rendimento auferido pelo lesado que nos autos se apurou ser um valor médio anual de € 13.107,20. Considerando este valor, a esperança média de vida e tendo em consideração o valor de 3 pontos suprarreferido, chegaríamos a um valor de €12.189,70 (13.107,20 x 31 x 3%). Há, no entanto, que tomar em consideração igualmente, como o exige o recurso à equidade, a circunstância de existir uma antecipação do pagamento da totalidade do capital e, como tal, em decorrência dessa antecipação de pagamento, decide-se reduzir em 1⁄4 o montante apurado. (...) tem-se em consideração os montantes já recebidos em sede de acidente de trabalho, sendo, neste âmbito, de relevar que não há total correspondência entre as indemnizações atribuídas a título de incapacidade permanente e a título de dano biológico. Pelo exposto, ponderados todos os fatores supra descritos, afigura-se adequado e equitativo fixar em €7.500,00 (...) a título de compensação por danos não patrimoniais (...)  apuraram-se os seguintes factos: à data do acidente o Autor tinha 47 anos de idade; em consequência do acidente, o Autor sofreu fratura do cotovelo esquerdo e sete fraturas do arco costal direito; foi-lhe aplicada imobilização gessada; foi submetido a uma intervenção cirúrgica e realizou tratamentos de fisioterapia. Mais resulta que ficou a padecer de cicatriz vertical com 13 cm de comprimento e 1 cm de largura na face posterior do cotovelo; que ficou com flexo do cotovelo de 30º e défice da flexão do cotovelo de 30º; sente dor; o sofrimento que suportou até à consolidação das lesões é fixável no grau 4 da escala de quantum doloris; devido às cicatrizes, ficou com um dano estético fixável no grau 2; teve uma repercussão da atividade desportiva e de laser de grau 2; teve repercussão permanente na Atividade Sexual fixada no grau 2 e teve os períodos de défice funcional já referidos. (...) deve operar o juízo de equidade por forma a encontrar a justa compensação para o caso, ressarcindo devidamente o lesado. (...) É, aqui de relevar que estes danos não são contemplados na indemnização devida pelo acidente de trabalho. Analisando o caso concreto à luz das considerações expostas e tendo em conta todos os factos supra referidos, considerando a idade do Autor, a natureza das lesões por si sofridas e das sequelas daí resultantes, as limitações que as mesmas trouxeram à sua vida, a natureza e a duração dos tratamentos que teve de efetuar, as dores, o abalo e todos os incómodos que sofreu, bem como a jurisprudência mais recente nesta matéria (citando-se apenas a título de exemplo o já referido Ac. da RP. de 12.07.2021), afigura-se-nos ser adequada a quantia de € 10.000,00, a título de compensação pelos danos não patrimoniais (...)”.

No caso em apreço, e tal como já se referiu, a seguradora (também recorrente) aceitou a ocorrência do acidente, a dinâmica deste e a culpa, nos termos configurados pelo autor (recorrente), apenas impugnando os concretos danos alegados e os montantes indemnizatórios peticionados. Daí que, tal como na ação, também em recurso as questões a apreciar têm esse objeto e concretamente, agora, o montante relativo a danos patrimoniais (objeto de ambos os recursos) e o respeitante a danos não patrimoniais (de que discorda recorrente autor).

A sentença, conforme resulta da sua leitura e transparece do respetivo dispositivo, atribuiu à indemnização por aqueles primeiros danos a quantia de 7.500,00€ e como compensação dos danos não patrimoniais o montante de 10.000,00€.  

Quanto à dogmática que enforma a compensação ou indemnização dos danos, escusamo-nos de acrescentos aos fundamentos da sentença[1], cientes de aquela não se mostrar questionada e certos que, no nosso sistema jurídico, o que mais releva é que a obrigação de reparar um dano impõe a reconstituição da situação anterior ao evento (artigo 562 do Código Civil – CC), ou seja, todos os danos sofridos pelo lesado, atuais e futuros, patrimoniais e não patrimoniais carecem de ser integralmente reparados: indemnizados, no caso dos danos patrimoniais e compensados no caso dos não patrimoniais. Tenha-se presente, por outro lado, que o tribunal, na fixação da indemnização, pode “atender aos danos futuros, desde que sejam previsíveis” (artigo 564, n.º 2 do CC)[2] e, além destes – tomando em atenção de um dos recursos – aos danos patrimoniais, enquanto merecedores da tutela do direito (artigo 496, n.º 1 do CC).

Quanto aos danos patrimoniais futuros (questão a) e c)) há que, no caso, encontrar um valor que, entregue imediatamente ao lesado, o indemnize pelos esforços adicionais que a sua incapacidade traduz no exercício profissional, ponderando a sua idade e esperança de vida, bem como a retribuição que auferia. Esperança de vida e não vida ativa/profissional, porque o lesado não está impedido de exercer atividade remunerada, mesmo depois da sua reforma, e esperança de vida que, sendo um dado objetivável, não deixa de ser variável, habitualmente em acréscimo ao longo da própria vida. E o montante assim encontrado, havemos de o cotejar com decisões jurisprudenciais recentes, pois daí resulta o respeito pela igualdade entre cidadãos, sem se perder de vista que a equidade é sempre um olhar ao concreto de cada caso[3].

No caso, os dados ponderados no tribunal recorrido (idade, esperança de vida, retribuição e grau incapacitante) justificam a nossa[4] aproximação ao valor indemnizatório, nos termos e com as correções que se seguem.

Em primeiro lugar – e conjugando, desde já, o objeto relevante de ambos os recursos – podemos constatar que, se calculássemos o dano patrimonial futuro de acordo com a legislação relativa aos acidentes de trabalho[5], o recorrido seria beneficiário de uma pensão anual de (13.107,20 x 0,7 x 0,03) de 275,25€, a que correspondia um capital, recebido imediatamente e de uma só vez, de (275,25 x 14,063) 3.870.85€.

Primeira nota relevante que resulta do valor indemnizatório acabado de referir e que não corresponde ao capital de remição comprovadamente entregue ao autor em sede laboral (10.231,96€ - facto provado n.º 31): o valor entregue em sede laboral, atendendo às mesmas regras de cálculo e à mesma retribuição ilíquida anual, ponderou, necessariamente, outro grau de incapacidade permanente. Aliás, revertendo matematicamente o valor do capital de remição facilmente se alcança (RA x 0,7 x Inc.= 10.231,96/ fator remição (48 anos). Inc. = 727,58/0,7/RA) que a incapacidade permanente ponderada foi de 7,93% (0,0793)[6]. Efetivamente, se a incapacidade parcial permanente fosse de 3% e não de 7,93% - como efetivamente sucedeu – o valor do capital de remição equivalia ao por nós anteriormente calculado, ou seja, (10.231,96/0,0793 x 0,03) 3.870,8549€.

Em suma, devemos ter presente que o tribunal do trabalho não reparou a mesma incapacidade do autor, mas uma incapacidade necessariamente diferente e quantitativamente superior.
    
Mas, por outro lado, a reparação laboral não se pode confundir com a reparação cível[7], atentas as regras da primeira, objetivamente fixadas. Para além de, nesta sede cível, nada justificar o abatimento de 30%, ainda que os valores ponderáveis em sede laboral sejam ilíquidos, é também inequívoco que o regime dos acidentes de trabalho e o cálculo legalmente fixo que o mesmo consagra são alheios à progressão previsível na carreira profissional, à esperança de vida e seu aumento previsível e, mais relevante, o cálculo do capital de remição obedece a uma tabela claramente afastada da realidade, mormente em tempos de inflação e de pouca produtividade do capital (juros). Veja-se que, num caso como o que apreciamos e ponderando a idade e a esperança de vida do autor, enquanto se tem por adequada a multiplicação pelo fator 31 (número de anos de esperança de vida) em sede cível, na reparação do sinistro laboral o fator de multiplicação é de 14,063 (tabela de cálculo do capital de remição para 48 anos de idade à data da alta[8]), ou seja, menos de metade.

No cálculo cível já se justificará, no entanto, e porque os valores remuneratórios devem ser líquidos, descontar, na falta de outra informação, pelo menos, as contribuições obrigatórias para a Segurança Social, ou seja, o abatimento de 11%[9]. Assim, usando a mesma fórmula utilizada em primeira instância alcançaríamos o valor de (13.107,20 – (13.107,20 x 0,11) x 0,03 x 31) 10.848,83.

Sucede que este valor não pondera a progressão na carreira ou profissão, a melhoria projetável das condições remuneratórias e mesmo a alteração profissional, tendencialmente positiva[10]. Daí que seja de acrescer àquele valor uma outra ponderação que, numa quantificação de equidade, temos por adequada numa percentagem de 15%[11]. Assim, o capital devido ao autor seria de 12.476,15€.  

Vejamos, agora, se este montante, por referência a outras decisões dos tribunais superiores, se mostra equilibrado, atendendo à Jurisprudência mais recente.


- Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 29.02.2024 [Processo n.º 2146/20.0T8VCT.G1.S1, Relatora, Conselheira Ana Paula Lobo, dgsi]: “Mostra-se ajustado o valor de 30.000,00€ para indemnizar o dano patrimonial futuro do lesado nascido em 1988, com um rendimento laboral médio mensal de 1015,26€, que ficou a padecer de um défice funcional permanente da integridade físico-psíquica de 8 pontos cujas sequelas implicam esforços suplementares que não o impedem de exercer toda e qualquer profissão”.

- Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 6.02.2024 [Processo n.º 2012/19. 1T8PNF.P1.S1, Relator, Conselheiro Pedro Lima Gonçalves, dgsi]: “I - O dano biológico integrado por défice funcional permanente da integridade físico-psíquica de 6 pontos, compatível com o exercício de atividade profissional, mas que implica esforços suplementares para o exercício da mesma, é indemnizável sob uma vertente patrimonial, como dano patrimonial futuro que tem em conta a expressão daquele défice. II - Tratando-se de calcular um quantitativo indemnizatório que traduza o capital de que o lesado se veja privado para o futuro em virtude do défice funcional sofrido, para tal há que ter em conta o período de tempo que, considerando a idade do lesado aquando da data da consolidação médico-legal das lesões (pois é a partir desta que fica definido o défice funcional), tem em conta a sua esperança média de vida, e a consideração do salário médio mensal nacional dos trabalhadores por conta de outrem por referência ao ano da consolidação médico-legal das lesões, isto no caso de o lesado ser estudante, pois neste caso não existe qualquer elemento que indicie que o mesmo se iria situar no patamar mais baixo de uma carreira profissional ou que iria conformar-se com o recebimento do salário que qualquer empresa é obrigada a pagar independentemente das habilitações ou da profissão exercida pelo trabalhador”[12].

- Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 16.01.2024 [Processo n.º  15898/16.2T8LSB.L1.S1, Relatora, Conselheira Maria Olinda Garcia, dgsi]: “I - Não é desconforme com os atuais parâmetros indemnizatórios, correspondentes à aplicação de critérios de equidade, a decisão de atribuir €20.000 a título de danos não patrimoniais à 1ª autora, farmacêutica de 35 anos de idade à data do acidente, que foi sujeita a duas intervenções cirúrgicas, ficou com um défice funcional permanente da integridade físico-psíquica de 9 pontos em 100, apresenta um dano estético permanente de grau 2, numa escala de 7 e também grau 2, numa escala de 7, no que respeita à repercussão permanente nas atividades desportivas e de lazer, além de outras limitações. Continua a poder desenvolver a sua atividade de farmacêutica, mas com esforços acrescidos. II - Também não é desconforme com os atuais padrões indemnizatórios a indemnização de €10.000 por danos morais, atribuída à 2ª autora que ficou com um défice funcional permanente da integridade físico-psíquica de 2 pontos em 100, apresenta um dano estético permanente de grau 5, numa escala de 7, e uma repercussão permanente nas atividades desportivas e de lazer de grau 3, numa escala de 7, além de outras limitações. Continua a poder desempenhar a sua atividade de fisioterapeuta, mas com esforços acrescidos”.

- Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 16.01.2024 [Processo n.º 3527/18.4T8PNF.P2.S1, Relator, Conselheiro Luís Correia de Mendonça, dgsi]: “IV- O julgador deve recorrer à equidade para fixar a indemnização devida pelo dano biológico, ainda que se sirva, num primeiro momento, do auxílio de tabelas financeiras ou de fórmulas matemáticas. V- Esta operação inicial consiste na utilização de um instrumento de carácter objetivo, a ajustar ulteriormente às situações ocorrentes na vida. VI- O ideal de justiça exige um tratamento dos casos concretos que tenha em conta o valor das pessoas concretas, na sua circunstância. VII- É adequado fixar uma indemnização de €180.000,00 (cento e oitenta mil euros) para ressarcir dano patrimonial futuro sofrido por um jovem de 27 anos, que, por virtude das sequelas de que ficou a padecer como consequência das lesões que lhe resultaram de uma colisão estradal, ficou impossibilitado de exercer a sua profissão habitual (carpinteiro de cofragem), na qual auferia retribuição anual global de €20.636,70, ainda que continuando a poder trabalhar, com menor remuneração, noutro ramo de atividade (motorista), com uma incapacidade funcional de 15 pontos”[13].

- Acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 5.02.2024 [Processo n.º 340/19.8T8PRT.P1, Relatora, Desembargadora Ana Olívia Loureiro, dgsi]: “A lesada, com 37 anos de idade à data do sinistro, que ficou portadora de sequelas avaliadas em 6 pontos de acordo com a Tabela Nacional de Incapacidades em Direito Civil (TNI), teve período de repercussão o temporária na Atividade Profissional Total fixável num período de 132 dias e um período de repercussão temporária na Atividade Profissional Parcial fixável num período de 124, que tem de empregar esforços acrescidos para exercício da sua atividade profissional, não tendo perda de capacidade de ganho e cujo quantum doloris foi fixado no grau 4 e o dano estético no grau 2 de acordo com a TNI, é adequada a fixação de indemnização global de 55.000 € de acordo com a equidade”[14].

- Acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 30.01.2024 [Processo n.º 22988/17.2T8 PRT.P1, Relator, Desembargador João Proença, dgsi]: “I - Tendo a autora ficado afetada por um défice funcional permanente de integridade físico-psíquica fixável em 3 pontos, mas sendo as sequelas sofridas compatíveis com o exercício da sua atividade profissional, embora impliquem para o efeito esforços suplementares, tal limitação é suscetível de integrar um dano futuro de natureza patrimonial. II – Considerando o caso da autora, mostra-se equilibrado o valor indemnizatório de €13.655,00”.

Somos a concluir que o valor por nós considerado, e que ora arredondamos para 12.500,00€ se mostra conforme e é enquadrável na jurisprudência mais recente.

Sucede que a ré seguradora entende que deve ser descontado o valor recebido em sede laboral, concretamente o montante correspondente ao capital de remição entregue.

No sumário do acórdão do Supremo Tribunal de Justiça proferido a 11.07.19 [Relator, Conselheiro Henrique Araújo, Processo n.º 1456/15.2T8FNC.L1.S1, dgsi] evidenciando-se a especificidade e particularidade desta questão refere-se no ponto I que “Em caso de acidente de viação e de trabalho, as respetivas indemnizações não são cumuláveis, mas antes complementares, assumindo a responsabilidade infortunística laboral carácter subsidiário” e logo se acrescenta, no ponto II que “Na condenação da seguradora no pagamento da indemnização devida por acidente de viação não se deve deduzir a indemnização devida por acidente de trabalho já paga ao sinistrado em processo de acidente de trabalho”.

A questão, efetivamente, implica com a própria natureza e abrangência, a própria conceção do dano indemnizável e não pode esquecer o princípio consagrado no artigo 562 do CC, o qual apenas se mostra derrogado pela possibilidade de redução, não de aumento, do valor indemnizatório em relação ao dano provado ou presumível, tal como decorre do artigo 494 do mesmo diploma legal.

No caso presente, já se disse que a própria incapacidade considerada nos dois distintos processos e tribunais foi diferente e o dano futuro, na sua integralidade é reparado de modo diverso num e no outro tribunal. Ainda assim, entendemos, em obediência ao disposto no artigo 562 do CC que deve descontar-se à indemnização aqui calculada o montante correspondente (apenas) à incapacidade permanente de 3%.

Em conformidade, o valor indemnizatório devido ao autor é de (12.500 – 3870) 8.630 euros, que arredondamos para 8.700,00

Atento o decidido, procede parcialmente o recurso do autor (na vertente respeitante ao dano patrimonial futuro) e improcede o recurso da ré.

Quanto aos danos não patrimoniais (questão b)) permitimo-nos, desde já, transcrever o sumariado no acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra de 21.03.2013 [Processo n.º 793/07.4TBAND.C1, relator, Desembargador Henrique Antunes, dgsi], pois mantem toda a atualidade: “VII - O dano diz-se não patrimonial quando a situação vantajosa lesada tenha natureza espiritual; o dano não patrimonial é o dano insuscetível de avaliação pecuniária, reportado a valores de ordem espiritual, ideal ou moral; é o prejuízo que não atinge em si o património, não o fazendo diminuir nem frustrando o seu acréscimo. Há uma ofensa a bens de carácter imaterial – desprovidos de conteúdo económico, insuscetíveis verdadeiramente de avaliação em dinheiro; é o prejuízo que, sendo insuscetível de avaliação pecuniária, porque atinge bens que não integram o património do lesado que apenas podem ser compensados com a obrigação pecuniária. VIII - No tocante à determinação do quantum da indemnização do dano não patrimonial, a lei aponta nitidamente para uma valoração casuística, orientada por critérios de equidade (art.º 494, ex-vi art.º 493, 1ª parte, do Código Civil). IX - Entre as outras circunstâncias do caso, devem indicar-se o carácter do bem jurídico atingido e a natureza e a intensidade do dano causado, o género e a idade da vítima – exceto, talvez, no tocante ao cômputo do dano morte stricto sensu - etc. X - Em qualquer caso, a ponderação sobre a gravidade do dano não patrimonial e, correspondentemente, do valor da sua reparação deve ocorrer sob o signo do princípio regulativo da proporcionalidade – de harmonia com o qual a danos mais graves deve corresponder uma indemnização mais generosa – e numa perspetiva de uniformidade: a indemnização deve ser fixada tendo em conta os parâmetros jurisprudenciais geralmente adotados para casos análogos (artº 8º, nº 3 do Código Civil). XI - A única condição de ressarcibilidade do dano não patrimonial é a sua gravidade (artº 496º, nº 1 do Código Civil). XII - Na impossibilidade de concretizar um critério geral, porque nesta matéria o casuísmo é infindável, apenas importa acentuar que danos consequentes a lesões a direitos de personalidade devem ser considerados mais graves do que os resultantes de violação de direitos referidos a coisas”.

E, quanto ao quantum, fazemos referência a decisões mais recentes dos tribunais superiores: 
- Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 11.01.2024 [Processo n.º 76/13.0TBTVD.L2.S1, Relator, Conselheiro Emídio Francisco Santos, dgsi]: “I - A indemnização de danos não patrimoniais deve ser proporcional à gravidade dos danos. II – A indemnização de 45 000 euros é proporcional ao seguinte quadro de danos não patrimoniais: quantum doloris avaliado no grau 4 numa escala de sete graus de gravidade; défice funcional da integridade física e psíquica de nove (9) pontos; consolidação das lesões cerca de três anos após o acidente; durante cerca de um ano a lesada esteve submetida a terapêutica medicamentosa agressiva; por força das lesões a lesada desistiu do projeto de ser mãe; a lesada deixou de conviver com amigos e de sair com estes, devido às dores que sente, passou a apresentar um quadro de humor depressivo, com episódios de ansiedade, tendo recorrido a apoio psicológico, e deixou de praticar desportos que praticava, nomeadamente corrida e bicicleta”.

- Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 8.11.2022 [Processo n.º 2133/16.2T8CTB.C1.S1, Relator, Conselheiro António Magalhães, dgsi]: “II. Tendo sido atribuído ao lesado um quantum doloris de 6 numa escala de 7, um dano estético relevante de 4 em 7 e repercussão permanente nas atividades desportivas e de lazer de 6 em 7 pontos - uma vez que, quanto a este índice, ficou privado de continuar a praticar o motociclismo, o que fazia com regularidade, participando em diversas provas, incluindo federadas e, ainda, impossibilitado de praticar desportos que também fazia, como bicicleta BTT, esqui na neve e esqui aquático, tendo ficado, ainda, condicionado no exercício da atividade desportiva de mergulho, que também praticava -a tudo acrescendo a circunstância de ter sido submetido a cinco intervenções cirúrgicas, com um pós-operatório prolongado (com uma  repercussão temporária na atividade profissional total de 870 dias), de continuar a necessitar de medicamentos, consultas e tratamentos no futuro e de continuar padecer de dores,  afigura-se ajustada a indemnização de  €70.000 por danos não patrimoniais que foi atribuída pela Relação”.

- Acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 23.11.2023 [Processo n.º  1548/21.9T8PVZ.P1, Relator, Desembargador Paulo Duarte Teixeira, dgsi]: “Considera-se adequado fixar em 40 mil euros o valor da indemnização por danos não patrimoniais de uma lesada atropelada na passadeira, que foi submetida a uma operação e fisioterapia durante quase um ano, apresenta uma IPP de 18%, quantum doloris de 4/7, dano estético 2/7, e terá de ser submetida a medicação e consultas o resto da sua vida”.

- Acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 30.01.2024 [Processo n.º 22988/17.2T8PRT.P1, Relator, Desembargador João Proença, dgsi]: “III - Para o cálculo do dano não patrimonial é razoável que se tenha em atenção, além da natureza e intensidade do dano causado, as outras circunstâncias do caso concreto que a equidade aconselha sejam tomadas em consideração e, em especial, a situação patrimonial das partes e o grau de culpa do lesante. E será ainda de atender aos padrões de indemnização geralmente adotados na jurisprudência. IV - Não obstante a autora não ter suportado internamentos hospitalares e cirurgias, as sequelas permanentes são de equivalente gravidade, em razão da região atingida – a cervical -, com importantes limitações de mobilidade, dores e mal estar que condicionam a marcha, movimentação de objetos, a higiene pessoal e as lides domésticas, a vida sexual, obrigando à toma de medicação para controlar parestesias e cervicalgias, com os inerentes efeitos secundários para a saúde geral e perda significativa de qualidade de vida, o montante fixado de €25.000,00, reputa-se equilibrado e alinhado com os quantitativos arbitrados pelo Supremo em circunstâncias de idêntica gravidade”.

Olhando ao caso presente, impor atender à materialidade dada como provada. Da mesma decorre o que se transcreve e sublinha:
- O autor foi socorrido pelo INEM e transportado para o Hospital ..., onde ficou internado até ao dia 16.11.2020[15]. Foi-lhe aplicada uma imobilização gessada. Foi operado ao cotovelo. Realizou tratamentos de fisioterapia. Foi-lhe feita a extração do material de osteossíntese. Teve alta em 08.11.2021[16].
- Ficou a padecer de cicatriz vertical com 13 cm de comprimento e 1 cm de largura na face posterior do cotovelo. Ficou com flexo do cotovelo de 30º e défice da flexão do cotovelo de 30º.
- Sente dor nos arcos finais da pronação, flexão e extensão. O quantum doloris é fixável no grau 4, numa escala crescente de 7 graus. O Dano Estético Permanente é fixável no grau 2, de uma escala crescente de 7 graus. A repercussão permanente nas Atividades Desportivas e de Lazer é fixável no grau 2, de uma escala crescente de 7 graus. A repercussão permanente na Atividade Sexual é fixável no grau 2, de uma escala crescente de 7 graus.
- O autor durante os primeiros 3 meses após o acidente esteve dependente dos cuidados de terceira pessoa. Passou por momentos de dor e sofrimento.

Analisando os factos antes narrados, importa ter presente, que o autor esteve com défice funcional, até à data da alta, de quase um ano; teve de ser submetido a cirurgia e de fazer tratamentos de fisioterapia; apresenta dano estético permanente; o quantum doloris foi, significativamente, de grau 4, em 7; apresenta repercussão permanente para as atividades de lazer e desportivas e tem, ainda, repercussão permanente na atividade sexual. O autor teve as inerentes dores e sofrimento e, durante três meses, precisou dos cuidados de terceira pessoa.

Entendemos, na ponderação de decisões judiciais factualmente equiparadas, e com recurso à equidade, que, ao momento presente, deve atribuir-se ao autor como compensação pelos danos não patrimoniais o montante de 20.000,00€.

Assim, e nesta parte, procede o recurso do autor.

As custas dos recursos, com reflexo nas da ação, são as que resultam do vencimento e decaimento aqui decidido.

IV – Dispositivo
Pelo exposto, acordam na 3.ª Secção Cível (5.ª Secção) do Tribunal da Relação do Porto em julgar parcialmente procedente o recurso de apelação interposto pelo autor e improcedente o recurso de apelação interposto pela ré e, em conformidade, revoga-se a decisão recorrida e, do mais a absolvendo, condena-se a ré A..., SA, no pagamento ao autor AA:  
1 - Da quantia indemnizatória de 8.700,00€ (oito mil e setecentos euros), a título de danos patrimoniais, pelo dano patrimonial futuro, resultante do défice funcional permanente de integridade físico–psíquica com repercussão permanente na atividade profissional que ficou a padecer, acrescida de juros de mora, à taxa legal, desde a citação (5.05.22) até integral e efetivo pagamento.
2 - Da quantia indemnizatória, pelo dano não patrimonial sofrido, equivalente a 20.000,00€ (vinte mil euros), acrescida de juros de mora, à taxa legal, desde a presente data e até integral e efetivo pagamento.

Custas dos recursos a cargo de recorrente e recorrido, atendendo-se ao respetivo vencimento e decaimento.

Porto, 6.05.2024
José Eusébio Almeida
Ana Paula Amorim
Manuel Domingos Fernandes
_______________
[1] Acompanhamos, pois, e além do mais, o conceito de dano biológico, aceitando a sua utilidade abrangente para significar a afetação da integridade físico-psíquica da pessoa. E, no que aqui mais releva, a sua dimensão patrimonial, enquanto afetação da capacidade laboral e, genericamente, da capacidade do lesado em criar/auferir proventos, mesmo que – e com mais relevo nessas situações – apenas no futuro.
[2] Como refere Henrique Sousa Antunes (Comentário ao Código Civil – Direito das Obrigações, Universidade Católica Editora, 2018, pág. 561) A previsibilidade dos danos futuros “sugere um elevado grau de probabilidade, considerando os efeitos comuns associados à lesão causada e às especificidades das circunstâncias particulares do lesado e do evento (...) Nesse sentido, «a certeza do dano futuro pode resultar do facto de ser o desenvolvimento seguro de um dano atual, mesmo que o montante dele seja incerto (v.g., o dano derivado de lesões corporais a um indivíduo que trabalhava ou de deterioração de um prédio com diminuição do rendimento deste» (Vaz Serra, 1959: 253-254). Entre certeza e a elevada probabilidade resta, ainda, uma margem significativa de apreciação para os tribunais, de acordo com as regras da experiência comum”.
[3] Como decorre do artigo 4.º, alínea a) do Código Civil, os tribunais “podem resolver segundo a equidade”, ainda que, apenas, e no que aqui importa, “Quando haja disposição legal que o permita”. Como refere Pedro Múrias (Comentário ao Código Civil – Parte Geral, 2.ª edição revista e atualizada, UCP Editora, 2023, pág. 32), “O sentido desta expressão, como de “ex aequo et bono” é retirado da cultura jurídica. É comum entre nós qualificar a equidade como a “justiça do caso concreto”. Aristóteles contrapunha a equidade (epieikeia, passada a latim como aequitas) à lei, vendo a primeira como possível modo de retificação da rigidez da segunda, atentas as particularidades dos casos”.
[4] A “nossa”, porquanto o Tribunal da Relação é, ainda e diferentemente do Supremo Tribunal de Justiça, um tribunal de instância. Daí que acompanhemos o sumariado no acórdão deste Tribunal da Relação do Porto de 8.05.2023 [Processo n.º 3323/2020.9T8VNG.P1, Relator, Desembargador Carlos Gil, dgsi], com foco em relação aos danos não patrimoniais, mas com o mesmo relevo para os danos patrimoniais futuros: “O Tribunal da Relação tem poderes amplos de cognição em matéria de facto e de direito, ao contrário do que sucede com o Supremo Tribunal de Justiça que apenas conhece de questões de direito, não tendo por isso base legal, em segunda instância, a orientação restritiva na sindicação do juízo de equidade de que resulta a fixação da compensação por danos não patrimoniais, devendo antes a Relação proceder à fixação autónoma da compensação devida tendo em conta todos os fatores relevantes para o efeito”.
[5] A utilização da legislação laboral é apenas uma primeira aproximação, porquanto, como se refere no acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 16.01.2024 [Processo n.º 3527/18.4T8PNF.P2.S1, Relator, Conselheiro Luís Correia de Mendonça, dgsi], “V- O julgador deve recorrer à equidade para fixar a indemnização devida pelo dano biológico, ainda que se sirva, num primeiro momento, do auxílio de tabelas financeiras ou de fórmulas matemáticas. V- Esta operação inicial consiste na utilização de um instrumento de carácter objetivo, a ajustar ulteriormente às situações ocorrentes na vida”.
[6] A operação matemática a que procedemos pretendeu igualmente tornar evidente que o valor do capital de remição, atenta a retribuição do sinistrado, manifestamente não poderia corresponder a uma IPP de 3%. No entanto, também decorre dos documentos juntos pela interveniente, e concretamente a fls. 480 do processo eletrónico, que a IPP do autor foi fixada em 7.93%.
[7] Como se sumaria no recente acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 12.04.24 (Relator, Conselheiro Mário Belo Morgado, Processo n.º 34/14.8T8PNF-A.P1.S1, dgsi): “I - Sendo o acidente simultaneamente de viação e de trabalho, a indemnização das perdas salariais associadas à incapacidade laboral, fixada no processo por acidente de trabalho, não exclui o ressarcimento pelo dano biológico, na sua vertente patrimonial, por serem distintos os danos a ressarcir. II- A indemnização pelo dano biológico, além de compensar a perda de capacidade de ganho, visa ainda compensar o lesado pelas limitações funcionais que se refletem na maior penosidade e esforço no exercício da atividade diária e na privação de futuras oportunidades profissionais.
[8] Portaria 11/2000, de 13 de janeiro.
[9] E não mais. Como se refere no acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 6.03.2024 [Processo n.º 13390/18.0T8PRT.P1.S1, Relator, Conselheiro Luís Espírito Santos, dgsi], “I – A redução relacionada com a circunstância do capital relativo ao direito indemnizatório por danos com projeção no futuro ser recebido pelo lesado de uma só vez, antecipadamente (possibilitando a sua eventual rentabilização), tendo em vista evitar, por essa via e nessa perspetiva, o seu enriquecimento indevido, só se justifica em termos moderados e apenas se a materialidade concreta que foi provada nos autos a justificar indubitavelmente” (sublinhado nosso).
[10] A propósito, refere-se no acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 11.01.2024 [Processo n.º 25713/ 15.9T8SNT.L1.S1, Relatora, Conselheira Catarina Serra, dgsi]: “I. A ressarcibilidade do dano patrimonial futuro não depende da comprovada perda de rendimentos do lesado, podendo e devendo o julgador ponderar, designadamente, os constrangimentos a que o lesado fica sujeito no exercício da sua atividade profissional corrente e na consideração de oportunidades profissionais futuras. II. Em relação aos danos patrimoniais, designadamente aos danos patrimoniais futuros, o princípio é o de que a indemnização deve calcular-se de acordo com as regras dos artigos 562.º e seguintes do CC, funcionando a equidade como último recurso, para ajustar o montante da indemnização às particularidades do caso concreto”.
[11] Percentagem empírica e que tem em conta a idade do lesado.
[12] O citado acórdão confirma o decidido por este Tribunal da Relação do Porto, em acórdão onde se escreveu: “Pelo nosso lado, entendemos ser de optar pelo cálculo da indemnização tendo por base o montante de perda de rendimento anual correspondente ao seu défice funcional com base no referido salário médio mensal, que ascende a 792,12 € (13.202,00 € x 6%), e os acima referidos 67 anos, e depois, por via do seu recebimento a pronto, a proceder a uma dedução ao montante do capital assim encontrado na proporção de 1/4, dada a idade bastante jovem da lesada [no sentido do cálculo da indemnização do dano futuro por défice funcional por esta forma e com a dedução de uma sua proporção por ocorrer uma antecipação do seu pagamento, vide o artigo do Sr. Conselheiro Joaquim José de Sousa Dinis “Dano Corporal em Acidentes de Viação”, publicado na CJ, Acórdãos do STJ, ano IX, tomo I, 2001, págs. 9 e 10, e Rita Mota Soares, in “O dano biológico quando da afetação funcional não resulte perda da capacidade de ganho – o princípio da igualdade”, revista “Julgar” nº33, Setembro-Dezembro de 2017, pág. 126; também no sentido da referida dedução pelo motivo indicado, vide, entre variados outros, os acórdãos do STJ de 5/7/2007 (proc. nº07A1734) e 10/12/2019 (proc. nº 32/14.1TBMTR.G1.S1)]. Fazendo as contas, encontra-se o valor de capital de 53.072,04 € (792,12 € x 67) e deduzindo-lhe 1/4 (13.268,01 €) chega-se ao valor final de 39.804,03 €, que entendemos ser de arredondar para 39.810€. Assim, fixa-se a indemnização pelo dano biológico, enquanto dano patrimonial, naquela quantia de 39.810 € (trinta e nove mil, oitocentos e dez euros)”.
[13] Tenha-se presente que, neste caso, o lesado tinha um vencimento 20% superior ao dos autos; apresentava uma incapacidade 2,5 vezes superior e, relevantemente também, uma idade de 27 anos, ou seja, uma esperança de vida de mais 16 anos.
[14] O acórdão em causa fixa um valor global, que compreende quer os danos patrimoniais futuros quer os danos não patrimoniais.
[15] O acidente ocorreu no dia anterior, pelas 15H00.
[16] Uma semana antes de completar um ano, desde a data do acidente.