Acórdão do Tribunal da Relação do Porto | |||
| Processo: |
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| Nº Convencional: | JTRP000 | ||
| Relator: | ISABEL MONTEIRO | ||
| Descritores: | SUSPENSÃO PROVISÓRIA DO PROCESSO PRESSUPOSTOS COMPETÊNCIA MINISTÉRIO PÚBLICO JIC FORMALIDADES CONSEQUÊNCIAS | ||
| Nº do Documento: | RP20251008129/25.2PTPRT.P1 | ||
| Data do Acordão: | 10/08/2025 | ||
| Votação: | UNANIMIDADE | ||
| Texto Integral: | S | ||
| Privacidade: | 1 | ||
| Meio Processual: | RECURSO PENAL (CONFERÊNCIA) | ||
| Decisão: | NEGADO PROVIMENTO AO RECURSO INTERPOSTO PELO ARGUIDO | ||
| Indicações Eventuais: | 4ª SECÇÃO | ||
| Área Temática: | . | ||
| Sumário: | I – Atenta a alteração emprestada ao artigo 281º do Código de Processo Penal pela Lei 48/2007, de 29/08, foi afastado o mecanismo da oportunidade na aplicação da suspensão provisória do processo, pois que, uma vez verificados os pressupostos formais exigidos para a sua aplicação, em abstrato, previstos pelo legislador, o Ministério Público deve suspender o processo em vez de acusar, o que se integra no seu dever de promover a ação penal, orientado pelo princípio da legalidade, em resultado da politica criminal definida pelo legislador. II – Significa isto que, recolhidos indícios suficientes, o Ministério Público só pode suspender se não puder arquivar por ser um caso de dispensa de pena e só pode acusar se não puder arquivar, nem suspender. III – O legislador atribuiu a competência exclusiva de decidir suspender o processo ao Ministério Público, na medida em que ao juiz de instrução cabe apenas um papel fiscalizador da legalidade, isto é, verificar os pressupostos legais da suspensão. IV – Assim, para crimes de menor gravidade, o Ministério Público suspende a promoção do processo para julgamento, condicionando-o, mediante aceitação do arguido, a sujeitar-se a injunções e regras de conduta, durante determinado tempo, as quais se forem cumpridas pelo mesmo, determinam o arquivamento do processo, não podendo aquele ser reaberto, mas, em caso de incumprimento, a suspensão poderá vir a ser revogada pelo Ministério Público. V – No entanto, as injunções propostas não resultam de uma solução consensualizada entre o Ministério Público, arguido, assistente e Juiz de instrução, mas de meras concordâncias perante propostas ou requerimentos de um ou mais sujeitos processuais a outro ou outros. VI – O Juiz de Instrução Criminal sindica a legalidade formal da suspensão provisória do processo e a sua conformidade com a dignidade pessoal do arguido, que ocorre quando as injunções ou regras de conduta atingirem o núcleo dos direitos fundamentais, forem de cumprimento impossível, ou desproporcionado, revelando uma restrição excessiva e injustificada desses direitos individuais. VII – No que respeita às nulidades insanáveis vigora o princípio da tipicidade, que implica que a lei as designe, enquanto que as demais são dependentes de arguição, sendo que a regra geral é a de que as nulidades relativas e as irregularidades ficam sanadas se não forem arguidas nos prazos legalmente fixados. VIII – No caso em que, proposta a suspensão provisória do processo, em interrogatório, perante a sua defensora, o arguido não aceitou, alegando dificuldades económicas para cumprir a injunção pecuniária, não se mostra cominada com nulidade a falta de remessa ao JIC da proposta de suspensão provisória do processo não aceite, como não se mostra prevista legalmente a possibilidade de o arguido contrapor injunções ou negociá-las com o Ministério Público e, não estando em causa a revogação da suspensão, inexistiu preterição da sua audição. | ||
| Reclamações: | |||
| Decisão Texto Integral: | Processo nº 129/25.2PTPRT.P1 Origem: Tribunal Judicial da Comarca de Porto, Juízo Local de Pequena Instância Criminal do Porto J3 Recorrente: AA Referência documento citius nº 470075532 Acordam, em conferência, os juízes da 4ª Secção (Criminal) do Tribunal da Relação do Porto. I - RELATÓRIO 1. No dia 19.03.2025, sob a referência citius nº 470075532 foi proferida sentença no Tribunal de 1ª instância, à margem identificado com o seguinte teor e que terminou com o seguinte dispositivo, [transcrição]: “DISPOSITIVO DA SENTENÇA Pelo exposto, decide-se: a) Condenar o arguido AA pela prática, em 04/03/2025, em autoria material e na forma consumada, de um crime de condução de veículo em estado de embriaguez, previsto e punido pelo artigo 292.º, n.º 1, do Código Penal, na pena de 70 (setenta) dias de multa, à razão diária de €5,50 (cinco euros e cinquenta cêntimos), sendo de descontar 1 (um dia) nos termos do art.º 80.º n.º2 do CP, fixando-se a pena a cumprir em 69 (sessenta e nove) dias de multa, à razão diária de €5,50 (cinco euros e cinquenta cêntimos), o que perfaz o montante global de €379,50 (trezentos e setenta e nove euros e cinquenta cêntimos). b) Condenar o arguido AA na pena acessória de proibição de conduzir veículos motorizados, prevista no artigo 69.º, n.º 1, alínea a), do Código Penal, pelo período de 4 (quatro) meses. c) Condenar o arguido AA no pagamento das custas do processo, fixando-se a taxa de justiça em 1 (uma) UC já reduzida a metade atenta a confissão integral e sem reservas. * 2. Inconformado com a sua condenação, o arguido interpôs recurso do despacho e da sentença, apresentando a respetiva motivação com as seguintes conclusões, [transcrição]II – Conclusões A. O Recorrente foi condenado pela prática, de um crime de condução de veículo em estado de embriaguez, previsto e punido pelo artigo 292º/1, do Código Penal. B. Sucede que, em fase de inquérito, e encontrando-se preenchidos os pressupostos para a sua aplicação, foi proposta a suspensão provisória do processo, mediante o cumprimento de duas injunções: proceder ao pagamento imediato da quantia de €450,00 ao Estado Português, e proceder à entrega de todos os títulos que o habilitassem a conduzir, no prazo de dez dias a contar da notificação do despacho de suspensão, devendo os mesmos ficar nesses autos pelo período de 3 meses e 15 dias, período durante o qual arguido não poderia conduzir qualquer veículo a motor. C. Ora, o Recorrente desconhecia a figura da suspensão provisória do processo, não antecipando que a mesma lhe iria ser proposta, e não dispondo da quantia exigida para efetuar o pagamento imediato. D. Uma vez que não pôde cumprir com a injunção apresentada, devido à exigência do pagamento imediato, impunha o despacho proferido pelo Ministério Público que os autos prosseguissem instantaneamente, tendo sido o Recorrente sujeito a julgamento. E. Em sede de julgamento foram arguidas nulidades, que sob melhor entendimento, padece a proposta de suspensão provisória do processo, devido à injunção determinada, no entanto, foram as mesmas julgadas improcedentes, vindo a ser proferida sentença condenatória. F. Porém, não se conforma o Recorrente com a sentença proferida pelo Tribunal a quo, dado que entende que a proposta de suspensão provisória do processo, devido à injunção de pagamento imediato da quantia já mencionada, padece de nulidade nos termos do artigo 119º/c) do CPP. G. Nesse sentido, quando foi exigido o cumprimento da injunção como condição para a determinação da suspensão provisória do processo, deu-se uma adulteração dos pressupostos para a aplicação da mesma, e foi criada numa verdadeira “taxa de acesso” ao benefício da suspensão provisória do processo. H. Deste modo, ao invés de o Arguido concordar com a proposta, mas eventualmente incumprir com a injunção, seguindo-se os trâmites legais, esta adulteração processual resultou em que fossem eliminadas diligências de audição do Arguido fruto desse eventual incumprimento, sujeitando-o diretamente a julgamento por não dispor, num prazo inexistente, e irrazoável, da quantia em causa. I. Ora, uma vez que ao eventual incumprimento das regras ou injunções da decretada suspensão provisória do processo e na ausência de previsão legal de um mecanismo próprio, deve ser aplicado analogicamente o regime próprio da suspensão da execução da pena, constante dos artigos 492º a 495º do C.P.P e nos artigos 55º e 56º do C. Penal, em tal situação, deve proceder-se à audição do condenado, audição presencial do mesmo, sempre que tenham sido fixadas regras de conduta condicionantes daquela, conforme ainda disposto no artigo 495º/2 do C.P.P. J. Tendo os autos prosseguido imediatamente, no seguimento da exigência do cumprimento instantâneo da injunção, o Ministério Público decidiu atos de inquérito suscetíveis de afetar o Arguido, sem o ouvir, em violação direta do princípio do contraditório consagrado na Constituição da República Portuguesa, no art. 32º/ 1 e 5, e incumprindo com a audição obrigatória do arguido derivada do incumprimento das condições de suspensão. K. Caso assim não se entenda, e por mera cautela, entende o Recorrente que a proposta de suspensão provisória do processo, devido à injunção de pagamento imediato da quantia já mencionada, padece de nulidade nos termos do artigo 120º/2/d) do C.P.P. L. Uma vez que, tendo sido exigido o cumprimento da injunção de pagamento imediato da quantia de €450,00 no âmbito da proposta de suspensão provisória do processo, sem ter sido obtida a concordância do juiz de instrução criminal quanto à mesma, e tendo este o poder-dever de fiscalização, nos termos do art. 384º/1 C.P.P, o Ministério Público sobrepôs-se a essa decisão, carecendo da concordância do juiz de instrução para, por si só, exigir o cumprimento da injunção. M. A condição do pagamento imediato para, na prática, “aceder” à suspensão provisória do processo, assume-se como um método dúbio para aferir a concordância do arguido, e não tendo tido o Recorrente a possibilidade de realizar esse pagamento, evadiu-se o Ministério Público de requerer a concordância do juiz de instrução criminal, bem como o seu poder-dever de fiscalização, sujeitando o Recorrente a julgamento. N. Para mais, verifica-se nos autos do processo sub judice, que foi afastada a possibilidade de o Recorrente efetuar prestação de serviço de interesse público, conforme se encontra previsto no artigo 281º/2/c) do C.P.P. O. Importa ressalvar ainda, que a exigência do pagamento imediato da quantia determinada, impossibilita o pagamento em prestações, prerrogativa que também assiste ao Recorrente, e foi à priori descartada. P. Ainda no que respeita à exigência do pagamento imediato da quantia em causa, não se afigura possível a inexistência de um prazo para o cumprimento da injunção, uma vez que se tem entendido na jurisprudência, unanimemente, que o Arguido tem até ao final do período de suspensão para cumprir com as injunções impostas. Q. Entende ainda o Recorrente que a injunção pecuniária proposta consubstancia, no seguimento do art. 281º/5 do C.P.P, uma ofensa da dignidade do arguido, não tendo sido acautelada a conservação de um rendimento minimamente condigno do Recorrente ao propor o pagamento da injunção no imediato, com a agravante da situação económica frágil de que padece. R. Por fim, e mais uma vez por mera cautela, invoca-se ainda o regime da irregularidade previsto no artigo 123º do C.P.P, tendo em conta a motivação exposta, e ainda a violação dos princípios constitucionais que representa a proposta de suspensão provisória do processo, devido à imposição de uma injunção de pagamento imediato da quantia já mencionada. S. Esta conduta é violadora do Princípio da Igualdade, consagrado no artigo 13º da Constituição da República Portuguesa, permitindo que determinados arguidos possam beneficiar da suspensão provisória do processo, por possuírem, no imediato, o valor para o pagamento da injunção, enquanto outros sejam prejudicados por não o conseguirem fazer, fazendo depender a sujeição a julgamento de um critério económico. T. Nessa mesma senda, a exigência do cumprimento da injunção imposta ao Recorrente pela proposta de suspensão provisória do processo, demonstra-se incompatível com o Princípio da Proporcionalidade, no sentido estrito do mesmo, e no seu elemento da necessidade e adequação, uma vez que é irrazoável a inexistência de um prazo para o cumprimento da injunção e exigência do cumprimento imediato, dispondo o Ministério Público de medidas menos gravosas e menos excessivas para garantir o cumprimento das injunções propostas. U. Por todo o supra exposto, requer-se que seja dado total provimento ao presente recurso julgando procedentes as nulidades invocadas, e subsidiariamente, a irregularidade dos atos praticados e, em consequência, seja revogada com efeitos imediatos a sentença condenatória proferida pelo Tribunal a quo, substituindo-a por outra que ordene a invalidade dos atos posteriores à proposta de suspensão provisória do processo e a repetição da mesma. Nestes termos e nos mais de Direito aplicável, deve o presente Recurso ser julgado procedente e, em consequência: a) Ser revogada a sentença proferida pelo Tribunal a quo. b) Ser declarada a nulidade nos termos do artigo 119º/c) do CPP e determinada a ordenação de invalidade dos atos posteriores à proposta de suspensão provisória do processo e repetição da mesma. c) Subsidiariamente, ser declarada a nulidade nos termos do artigo 120º/2/d) do CPP, e determinada a ordenação de invalidade dos atos posteriores à proposta de suspensão provisória do processo e repetição da mesma. d) Caso ainda assim não se entenda, ser declarada a Irregularidade da suspensão provisória do processo proposta em fase de inquérito, nos termos do artigo 123º do CPP, e determinada a ordenação de invalidade dos atos posteriores à proposta de suspensão provisória do processo e repetição da mesma. Por assim ser de JUSTIÇA! * 3. O recurso foi liminarmente admitido no tribunal “a quo”, subindo imediatamente, nos próprios autos e com efeito suspensivo, ou seja, nos termos legais. * 4. O Ministério Público, em 1º instância, apresentou resposta à motivação do recurso, concluindo pela sua improcedência, essencialmente, sustentando as seguintes“CONCLUSÕES: Pelo exposto, o recurso interposto pelo arguido não deve proceder pelo seguinte: 1. Nos presentes autos o arguido foi detido pela prática um crime de condução de veículo em estado de embriaguez, previsto e punido, pelas disposições conjugadas do artigo 292º, n.º 1 e artigo 69º, n.º 1 alínea a), ambos do Código Penal. 2. Atendendo a que o arguido não possuía suspensão provisória registada em seu nome, nem antecedentes criminais pela prática do aludido crime foi proposta ao arguido a suspensão provisória do processo pelo período de seis meses, com as seguintes injunções: - proceder ao pagamento da quantia de €450,00 ao Estado Português, através de documento único de cobrança, juntando aos autos documento a comprovar o aludido pagamento de imediato e - proceder à entrega de todos os títulos que o habilitem a conduzir neste Tribunal no prazo de dez dias a contar da notificação do despacho de suspensão, devendo os mesmos ficar nestes autos pelo período de 3 meses e 15 dias, período durante o qual arguido não poderá conduzir qualquer veículo a motor. 3. Aquando do interrogatório o arguido referiu não concordar com a suspensão provisória do processo, uma vez que não tem possibilidades económicas para efetuar o pagamento de imediato. 4. O arguido nada junta aos autos a comprovar o por si alegado, nomeadamente que despesas possui e que rendimentos possui, não indica a composição do seu agregado familiar, limitando-se a referir que não possui possibilidades económicas para fazer face ao cumprimento da primeira injunção. 5. Conforme refere a Mma. Juiz: “Compulsados os autos, foi proposta pelo Ministério Público ao arguido a aplicação do Instituto da Suspensão Provisória do Processo, mediante o cumprimento das seguintes injunções: a) pagamento da quantia de 450,00€ de imediato ao Estado, através de DUC e b) entrega de todos os títulos de condução que o habilitem a conduzir no prazo de 10 dias a contar da notificação do despacho de suspensão provisória do processo, ficando os mesmos nos autos pelo período de 3 meses e 15 dias, durante o qual o arguido não poderia conduzir qualquer veículo a motor. Ainda em sede de inquérito, o arguido foi ouvido em interrogatório e com a presença da sua Ilustre Defensora tendo manifestado a sua discordância com as injunções propostas pelo Ministério Público, o que inviabiliza de imediato a determinação pelo Ministério Público da suspensão dos autos e a remessa dos mesmos ao Juiz de Instrução para apreciação. Ora, o arguido manifestou discordância com as injunções propostas (alegando dificuldades económicas) e, por essa mesma razão, a lei processual penal não impõe (por manifesta inutilidade) que os autos sejam remetidos ao Juiz de Instrução, nem prevê a possibilidade de o arguido contrapropor ou negociar com o Ministério Público, que é o titular do inquérito, as injunções a aplicar. Ademais, igualmente não se julga que a injunção proposta ofenda a dignidade do arguido, em violação do disposto no artigo 281.º, n.º 5 do Código de Processo Penal, desde logo porque o arguido não invoca nem demonstra nos autos uma precária situação económica ou financeira. Depois porque, como se disse supra, é ao Ministério Público que incumbe a ponderação de todos os pressupostos legais de que depende a aplicação do instituto, o que fez, concluindo pela proposta de pagamento imediato do referido montante. Importa, por isso, ter presente que estas medidas não são penas criminais, porém devem responder às exigências de prevenção que no caso se façam sentir. E sendo a injunção imposta in casu de cariz económico, o critério de fixação do seu montante terá necessariamente de atender, por um lado à capacidade económica de quem se obriga (não tendo o arguido demonstrado quaisquer dificuldades ou situação precária nem em sede de inquérito nem agora na fase de julgamento), e por outro às exigências de prevenção e à culpa que no caso se faz sentir. E, efetivamente, as exigências de prevenção geral que, recorde-se, fazem apelo à consciencialização geral da importância dos bens jurídicos tutelados e o restabelecimento da confiança da comunidade na efetiva tutela penal desses mesmos bens jurídicos, são elevadíssimas não só nesta Comarca do Porto, especialmente notadas neste Juízo de Pequena Criminalidade, como em todo o sistema judicial português, sendo o crime de condução sob o efeito do álcool um dos crimes mais julgados nos Tribunais portugueses e, por isso, reclamam a proposta de injunções adequadas à prevenção da perpetuação deste tipo de comportamentos. Razão pela qual, julga-se que a injunção proposta não padece das nulidades apontadas e indefere-se o requerido.” 6. O aludido despacho faz uma análise correta dos vícios invocados pelo arguido, não merecendo qualquer reparo e devendo ser considerado na sua totalidade. 7. Na verdade, refere o arguido que se mostra verificada a nulidade prevista no artigo 119.º, alínea c), do Código de Processo Penal. 8. Contudo, dispõe o artigo 119.º, alínea c), do Código de Processo Penal que: “Constituem nulidades insanáveis, que devem ser oficiosamente declaradas em qualquer fase do procedimento, além das que como tal forem cominadas em outras disposições legais: c) A ausência do arguido ou do seu defensor, nos casos em que a lei exigir a respectiva comparência. 9. Ora, o arguido foi interrogado e foi-lhe proposta a suspensão provisória do processo, tratando-se de um processo sumário fase preliminar, não se vislumbrando que diligência foi realizada nos autos na qual o arguido ou a ilustre defensora não estiveram presentes e que legalmente se impunha, inexistindo a alegada nulidade, devendo a mesma ser nos legais termos julgada improcedente. 10. Mais refere o arguido que se mostra verificada a nulidade prevista no artigo 120.º, n.º 2, alínea d), do Código de Processo Penal. 11. Analisado o aludido preceito verificamos que refere o artigo 120.º, n.º 2, alínea d), do Código de Processo Penal que: “2 - Constituem nulidades dependentes de arguição, além das que forem cominadas noutras disposições legais: d) A insuficiência do inquérito ou da instrução, por não terem sido praticados actos legalmente obrigatórios, e a omissão posterior de diligências que pudessem reputar-se essenciais para a descoberta da verdade.” 12. Compulsados os autos verificamos que também inexiste a nulidade arguida. 13. Na verdade, o arguido foi detido em flagrante delito, tendo sido libertado e notificado para comparecer em Tribunal, sendo nos legais termos notificado para a realização de julgamento sob a forma de processo sumário. 14. No dia em que o arguido foi notificado para comparecer foi-lhe proposta a suspensão provisória, com as injunções que foram as consideradas adequadas para acautelar as exigências de prevenção especial e geral, não tendo o arguido manifestado a sua concordância, impondo-se a prolação de acusação e apresentação do arguido para julgamento sob a forma de processo especial sumário. Não se vislumbra a omissão de qualquer ato legalmente obrigatório, tanto mais que inexiste inquérito, atenta a forma especial dos autos, nem omissão de qualquer diligência que possa reputar-se essencial para a descoberta da verdade, pois o arguido foi detido em flagrante delito e a prova é essencialmente documental e testemunhal e encontra-se vertida no auto de noticia por detenção. 15. Mais, o arguido num patamar de contraordenação teria que proceder ao pagamento da coima pelo mínimo legal, sendo no nosso ordenamento jurídico o valor de quinhentos euros. 16. As injunções a propor ao arguido têm que ser sentidas pelo próprio como tal, uma vez que o mesmo não poderá deixar de interiorizar que cometeu um crime de condução de veículo em estado de embriaguez, não sendo o arguido que escolhe as injunções que pretende que nos autos lhe sejam aplicadas, nem o momento e modo de cumprimento das mesmas. Mais, o arguido ingeriu bebidas alcoólicas, conduziu veículo motorizado em via pública, resultando que o mesmo dispôs de condições económicas para o efeito. 17. Inexistindo a omissão de qualquer diligência deve a arguida nulidade ser julgada improcedente. 18. No que se refere a arguição de irregularidade, nos termos descritos inexiste qualquer irregularidade, devendo do mesmo modo a mesma ser julgada improcedente. 19. Nestes termos, a sentença proferida, deve ser mantida em todos os seus aspetos, inexistindo qualquer vício nos autos, nulidades e irregularidades invocadas, devendo as mesmas serem julgadas improcedentes e, consequentemente o recurso apresentado pelo arguido. No entanto, farão V. Exas. a habitual e costumada justiça. * 5. O Ministério Público, junto deste Tribunal da Relação, emitiu parecer, devidamente fundamentado, acompanhando a motivação apresentada em primeira instância, pugnando pela improcedência do recurso.6. Cumprido o nº2, do artigo 417, não foi apresentada resposta. * 7. Não tendo sido requerida audiência e não sendo caso de renovação da prova, o processo foi à conferência, após os vistos legais, respeitando as formalidades legais [artigos 417º, 7 e 9, 418º, 1 e 419º, 1 e 3, c), todos, ainda do mesmo texto legal]. * 8. Definição do âmbito do recurso.Para definir o âmbito do recurso, a doutrina (Germano Marques da Silva, Curso de Processo Penal, III, 2ª edição revista e atualizada, Editorial Verbo, 2000, pág. 335, V). e a jurisprudência (como de forma uniforme têm decidido todos os tribunais superiores portugueses, nos acórdãos, entre muitos, do Supremo Tribunal de Justiça, de 19 de Outubro de 1995 (acórdão de fixação de jurisprudência obrigatória), publicado no Diário da República 1ª-A Série, de 28 de Dezembro de 1995, de 13 de Maio de 1998, in B.M.J., 477º,-263, de 25 de Junho de 1998, in B.M.J., 478º,- 242 e de 3 de Fevereiro de 1999, in B.M.J., 477º,-271 e, de 16 de Maio de 2012, relatado pelo Juiz-Conselheiro Pires da Graça no processo nº. 30/09.7GCCLD.L1. S1.) são pacíficas em considerar, à luz do disposto no artigo 412º, nº 1, do Código de Processo Penal, que o mesmo é definido pelas conclusões que o recorrente extraiu da sua motivação, sem prejuízo, forçosamente, do conhecimento das questões de conhecimento oficioso. A função do tribunal de recurso perante o objeto do recurso, quando possa conhecer de mérito, é a de proferir decisão que dê resposta cabal a todo o thema decidendum que foi colocado à apreciação do tribunal ad quem, mediante a formulação de um juízo de mérito. Atento o teor do relatório atrás produzido, importa decidir as questões substanciais a seguir concretizadas – sem prejuízo de outras de conhecimento oficioso -, que sintetizam as conclusões do recorrente, constituindo, assim, o seu thema decidendum enunciadas nas conclusões: Questões a apreciar: o recorrente haveria de ter sido ouvido pelo Ministério Público, no caso, para se averiguar da sua situação económica, em virtude de alegar não ter condições económicas para aceitar a injunção pecuniária proposta, de 450€ de pagamento imediato, com a finalidade de a alterar para a prestação de serviço a favor do Estado ou o pagamento daquela em prestações, mostrando-se violado o princípio do contraditório? A injunção proposta pelo Ministério Público, é ofensiva da dignidade do arguido, por ofender o seu direito a um rendimento mínimo, condigno, e violadora o princípio da igualdade, previsto no art.º 13º, da CRP? Faltou na suspensão provisória do processo, a concordância do Juiz de Instrução Criminal, nos termos do artigo 384º, nº 1 do CPP, existindo assim insuficiência de inquérito, por omissão de um acto, legalmente, obrigatório que inquinou a decisão de acusar, padecendo dos mesmos vícios a decisão que indeferiu, no início da audiência de julgamento, os vícios suscitados? Em caso afirmativo destas questões quais as consequências, que dali advém, irregularidade ou nulidade (sanável ou não), e em que medida afeta a sentença proferida aqui recorrida? * II – OS FACTOS PROCESSUAIS RELEVANTES Perante as questões suscitadas no recurso torna-se essencial, para a devida apreciação do seu mérito, recordar a fundamentação em matéria de facto vertida na decisão recorrida: Factos Provados. No dia 4 de março de 2025, pelas 06h23m, na Rua ..., no Porto, o arguido conduzia o veículo automóvel de matrícula n.º ..-..-DE, após ter ingerido bebidas alcoólicas. O arguido foi fiscalizado por Agentes da P.S.P., tendo sido submetido de imediato ao exame de pesquisa de álcool no sangue, pelo método do ar expirado, através do aparelho devidamente certificado e aprovado pelo I.P.Q., acusando uma taxa de álcool no sangue de 1,44g/l, a que corresponde, após dedução do erro máximo admissível, o valor apurado de 1,325g/l. O arguido não desejou contraprova. Agiu o arguido livre, deliberada e conscientemente, bem sabendo que não lhe era permitido conduzir veículos automóveis em via pública com a TAS superior à legalmente permitida por lei que possuía, como fez. Sabia o arguido que a sua conduta era proibida e punida por lei. O arguido confessou os factos integralmente e sem reservas. O arguido reside há 4 anos em Portugal, trabalha nas obras e aufere mensalmente o valor de 980€, reside com a esposa, que se encontra desempregada e sem beneficiar de qualquer apoio social, e três filhos menores, com as idades de 1, 5 e 7 anos, que neste momento se encontram no Brasil em visita a familiares. Residem em casa arrendada pagando a renda de 306€ e suportam a prestação mensal pela aquisição do veículo, que tripulava de 200€ mensais. Não tem antecedentes criminais e não beneficiou antes da Suspensão Provisória do Processo. (…) DISPOSITIVO DA SENTENÇA Pelo exposto, decide-se: a) Condenar o arguido AA pela prática, em 04/03/2025, em autoria material e na forma consumada, de um crime de condução de veículo em estado de embriaguez, previsto e punido pelo artigo 292.º, n.º 1, do Código Penal, na pena de 70 (setenta) dias de multa, à razão diária de €5,50 (cinco euros e cinquenta cêntimos), sendo de descontar 1 (um dia) nos termos do art.º 80.º n.º2 do CP, fixando-se a pena a cumprir em 69 (sessenta e nove) dias de multa, à razão diária de €5,50 (cinco euros e cinquenta cêntimos), o que perfaz o montante global de €379,50 (trezentos e setenta e nove euros e cinquenta cêntimos). b) Condenar o arguido AA na pena acessória de proibição de conduzir veículos motorizados, prevista no artigo 69.º, n.º 1, alínea a), do Código Penal, pelo período de 4 (quatro) meses. c) Condenar o arguido AA no pagamento das custas do processo, fixando-se a taxa de justiça em 1 (uma) UC já reduzida a metade atenta a confissão integral e sem reservas. * Factos com interesse para a questão a dirimir No dia 4 de março de 2025, pelas 06h23m, na Rua ..., no Porto, o arguido conduzia o veículo automóvel de matrícula n.º ..-..-DE, após ter ingerido bebidas alcoólicas. O arguido foi fiscalizado por Agentes da P.S.P., tendo sido submetido de imediato ao exame de pesquisa de álcool no sangue, pelo método do ar expirado, através do aparelho devidamente certificado e aprovado pelo I.P.Q., acusando uma taxa de álcool no sangue de 1,44g/l, a que corresponde, após dedução do erro máximo admissível, o valor apurado de 1,325g/l. O arguido foi notificado para comparecer nos serviços do Ministério Público, da Comarca do Porto, no caso na Procuradoria do Juízo Criminal Local de Pequena Instância Criminal do Porto, onde o Ministério Público validou a constituição como arguido, nos termos do disposto no artigo 58º, nº 1 e 3, do Código de Processo Penal e validou a detenção, nos termos do disposto nos artigos 254º, n.º 1, alínea a), 255º, n.º 1, alínea a) e 256º, n.º 1, todos do Código de Processo Penal. Determinou ainda que, em face do C.R.C., junto, do print das bases de identificação civil, print do I.M.T., print dos inquéritos registados em nome do arguido, print das bases de suspensão e print do registo de propriedade e características do veículo, ainda fosse junto cópia do certificado de verificação do alcoolímetro, aos autos. Depois de compulsar os autos e verificando que o arguido, nas circunstâncias de tempo, modo e lugar referenciados, no referido auto, e face aos factos participados incorreria na prática do crime de condução de veículo em estado de embriaguez, e atendendo a que se desconheciam antecedentes criminais e suspensões o Ministério Público ponderou, o uso do instituto da suspensão provisória do processo. Assim, e para o caso de os autos virem a ser encaminhados nesse sentido, determinou que se procedesse ao interrogatório do arguido, onde aquele deveria esclarecer os factos, se já foi condenado e já beneficiou de suspensão. Na negativa, deve esclarecer se concorda com a suspensão provisória do processo, pelo período de seis meses, com as seguintes injunções: - proceder ao pagamento da quantia de €450,00 ao Estado Português, através de documento único de cobrança, juntando aos autos documento a comprovar o aludido pagamento, de imediato e - proceder à entrega de todos os títulos que o habilitem a conduzir neste Tribunal no prazo de dez dias a contar da notificação do despacho de suspensão, devendo os mesmos ficar nestes autos pelo período de 3 meses e 15 dias, período durante o qual arguido não poderá conduzir qualquer veículo a motor. Após, conclua os autos, sendo de imediato caso não concorde e cumpra nos termos descritos, caso concorde até o dia 7 do mês em curso. Levado a cabo o interrogatório sumário do arguido, nos termos do artigo 382º, nº 2, do C.P.P. na presença da defensora nomeada, o arguido após ter sido informado, nos termos do art.º 143º, nº 2 do citado diploma, adiantou nunca ter beneficiado do instituto da suspensão provisória do processo, estar arrependido da prática dos factos pelos quais está indiciado, estar inserido social e economicamente, mas não concordar com os termos da injunção da suspensão suspensória do processo, uma vez que não tem possibilidades económicas para fazer o pagamento de imediato. Inviabilizada a Suspensão provisória do processo, e atento o teor da prova reunida, por ser legalmente admissível e uma vez que não se mostrar necessário proceder ao interrogatório do arguido, nos termos dos artigos 381º, 382º nºs 3, 5 e 6, ambos do Código de Processo Penal, o Ministério Público deduziu acusação em processo sumário, nos termos do artigo 389º, do citado diploma, ordenando a remessa dos autos à distribuição a fim de o arguido, ser presente ao(à) M.mo(a) Juiz(a) e proceder, oportunamente, à realização do julgamento em processo especial sumário nos legais termos dos artigos 381º e seguintes do Código de Processo Penal. O arguido requereu prazo para organizar a sua defesa, tendo a audiência ficado agendado para o dia 19.03.2025. * No início da audiência de discussão e julgamento, na forma de processo sumária, a defesa pediu a palavra e suscitou as seguintes nulidades:“O arguido foi notificado para comparecer no dia 05 de março de 2025 perante os serviços do MP, e uma vez que reunia os pressupostos inerentes à aplicação da SPP, foi-lhe proposta a mesma, sob o cumprimento de duas injunções, nomeadamente: proibição de conduzir pelo período de 3 meses e 15 dias, e o pagamento imediato de 450 euros ao Estado. Esta última injunção está ferida de Nulidade, nos termos dos art. 118º CPP, Insanável, segundo o art. 119º/c do CPP, ora, “ausência do arguido ou do seu defensor nos casos em que a lei exija a respetiva comparência”, uma vez que, não admitindo a possibilidade de o arguido aceitar a proposta de SPP sem o pagamento imediato da injunção, foram eliminadas diligências de audição do arguido fruto desse incumprimento, o que resulta em que o Ministério Público decida atos de inquérito suscetíveis de afetar o arguido, sem o ouvir, em violação direta do princípio do contraditório consagrado na Constituição da República Portuguesa (art. 32º, n.ºs 1 e 5). Caso assim não se entenda, o arguido invoca ainda a nulidade da injunção, nos termos do art. 120º/2/d, ora “insuficiência do inquérito ou instrução, por não terem sido praticados atos legalmente obrigatórios, e a omissão de diligências que pudessem reputar-se essenciais ara a descoberta da verdade” uma vez que: Considera inexigível o pagamento imediato da injunção, tendo sido informado da impossibilidade de pagamento às prestações. O arguido foi notificado para comparecer perante o MP no dia 05 de março, desconhecia, naturalmente, a figura da SPP, e viu-se confrontado com uma proposta, de pagamento imediato, de um valor superior a metade do salário mínimo nacional, tendo informado esses serviços, conforme consta do auto de interrogatório de arguido, que não tinha possibilidade de efetuar o pagamento imediato da injunção, ao que lhe foi respondido que não poderia então aceitar a proposta, o que consubstancia, no seu entendimento, e no seguimento do art. 281º/5 do CPP, uma ofensa da dignidade do arguido, visto que: Resulta da consagração no artigo 1º da Constituição, de que a nossa República é baseada na dignidade da pessoa humana, pelo que logicamente, para os cidadãos o direito a um mínimo de existência condigna não deve ser violado, seja pelo Estado seja pelos particulares. Do direito fundamental de cada pessoa a um mínimo de existência condigna ou mínimo existencial resulta o reconhecimento de um direito a não ser privado do que se considera essencial à conservação de um rendimento indispensável a uma existência minimamente condigna. Não fez aqui o Ministério Público intenção de acautelar a conservação de um rendimento minimamente condigno do arguido, ao propor o pagamento da injunção no imediato, sem possibilidade, sequer, de o arguido aceitar a proposta de SPP sem esse pagamento. Adicionalmente, a conduta adotada pelo Ministério Público resulta na desvalorização da vontade real do arguido, que pretende aceitar a proposta de SPP, mas vê essa possibilidade negada, por não conseguir efetuar o pagamento imediato. Para mais, não se compreende como é possível exigir o pagamento imediato, sem ter sido obtida a concordância do juiz de instrução quanto à SPP, sendo que este tem o poder-dever de fiscalização nos termos do art. 384º/1 CPP. Mais uma vez, sendo negada a possibilidade de o arguido aceitar a SPP sem o cumprimento imediato das injunções, a consequente eliminação de todas as diligências processuais que se seguiriam, nomeadamente, ser ouvido para justificar o seu incumprimento, constitui a violação do princípio do contraditório. Assistimo-nos ainda de jurisprudência, in casu Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra, Processo: 81/14.0GTCBR.C, de 13-09-2017, que tem entendido que o incumprimento das injunções ocorre quando, decorrido o prazo da suspensão se verifique esse incumprimento, pelo que à “contrario sensu”, o arguido terá até ao termo do prazo da suspensão para cumprir com as injunções. Por fim, mas não menos relevante, a injunção proposta com pagamento imediato, revela um desrespeito pelo art. 13º da CRP, permitindo que arguidos que possuam no imediato o valor para o pagamento da injunção, beneficiem da SPP, e aqueles que não tenham essa possibilidade, sejam lesados num direito processual que os assiste, e consequentemente sejam acusados e sujeitos a julgamento, apenas e só por não terem disponível, no dia e hora em questão, o valor da injunção. Nestes termos, requer-se a declaração das nulidades invocadas, e assim a determinação da invalidade de todos os atos subsequentes, e demais efeitos nos termos do art. 122º CPP.” * O Ministério Público promoveu o indeferimento das nulidades suscitadas, nos seguintes termos: “Uma vez que nenhuma das nulidades invocadas se mostra tipificada no Código de Processo Penal promove-se que se indefira as mesmas.Na verdade, os presentes autos, tratando-se de processo especial sumário inexiste qualquer obrigatoriedade na audição do arguido nomeadamente para efeitos de sindicância do incumprimento de algo que nem sequer o mesmo concordou. A remessa dos autos ao juiz de instrução só poderia ter ocorrido após ter sido obtida concordância por parte do arguido com as injunções nos termos e como foram propostas. Tal proposta é realizada atentas as exigências de prevenção não só geral como especial mas acautelando-se a geral uma vez que este tipo de crime lamentavelmente tem vindo a aumentar e de forma muito significativa não só no país como em particular na cidade do Porto, motivo pelo qual, as injunções foram propostas nos termos e nos precisos termos em que o foram. Não tendo sido obtida a concordância por parte do arguido as injunções nos termos propostos, o seguimento legal que se impunha é a dedução de acusação em processo especial sob a forma sumária inexistindo qualquer omissão de uma qualquer diligência processual uma vez que a mesma não se mostra prevista no Código de Processo Penal para o efeito.” * Pela Senhora Juíza foi proferido o seguinte DESPACHO O arguido AA vem arguir a nulidade da injunção proposta pelo Ministério Público em sede de inquérito no âmbito da proposta de suspensão provisória do processo, designadamente o pagamento imediato de 450,00€ ao Estado, invocando, por um lado, que a referida injunção é nula por violação do disposto no artigo 119, alínea c) do Código de Processo Penal e, por outro, subsidiariamente, que a injunção é nula nos termos do disposto no artigo 120.º, n.º 2, alínea d) do mesmo Código. O Ministério Público promove o indeferimento das nulidades arguidas. Cumpre apreciar e decidir. O instituto da Suspensão Provisória do Processo está previsto no artigo 281.º do Código de Processo Penal, resultando dos seus ns.º 1 e 2, o seguinte: «1 - Se o crime for punível com pena de prisão não superior a 5 anos ou com sanção diferente da prisão, o Ministério Público, oficiosamente ou a requerimento do arguido ou do assistente, determina, com a concordância do juiz de instrução, a suspensão do processo, mediante a imposição ao arguido de injunções e regras de conduta, sempre que se verificarem os seguintes pressupostos: a) Concordância do arguido e do assistente; b) Ausência de condenação anterior por crime da mesma natureza; c) Ausência de aplicação anterior de suspensão provisória de processo por crime da mesma natureza; d) Não haver lugar a medida de segurança de internamento; e) Ausência de um grau de culpa elevado; e f) Ser de prever que o cumprimento das injunções e regras de conduta responda suficientemente às exigências de prevenção que no caso se façam sentir. 2 – São oponíveis ao arguido, cumulativa ou separadamente, as seguintes injunções e regras de conduta: a) Indemnizar o lesado; b) Dar ao lesado satisfação moral adequada; c) Entregar ao Estado, a instituições privadas de solidariedade social, associação de utilidade pública ou associações zoófilas legalmente constituídas certa quantia ou efetuar prestação de serviço de interesse público; d) Residir em determinado lugar; e) Frequentar certos programas ou actividades; f) Não exercer determinadas profissões; g) Não frequentar certos meios ou lugares; h) Não residir em certos lugares ou regiões; i) Não acompanhar, alojar ou receber certas pessoas; j) Não frequentar certas associações ou participar em determinadas reuniões; l) Não ter em seu poder determinados animais, coisas ou objetos capazes de facilitar a prática de outro crime; m) Qualquer outro comportamento especialmente exigido pelo caso.» Da leitura do referido preceito legal decorre que o Instituto da Suspensão Provisória do Processo cabe no âmbito dos poderes de direção do inquérito atribuídos ao Ministério Público que, oficiosamente ou a requerimento do arguido ou assistente, pondera a decisão de propor ou não ao arguido o cumprimento de determinadas injunções e, só depois de o arguido tomar conhecimento da proposta e com ela concordar (sendo a concordância do arguido um pressuposto objetivo da aplicação do referido instituto), o processo é então apresentado ao Juiz de Instrução que, no âmbito dos atos que são da sua exclusiva competência em sede de inquérito (cfr. artigo 268.º, n.º 1, alínea f) do Código de Processo Penal) manifesta a sua concordância ou discordância com a aplicação do instituto naquele caso concreto. Compulsados os autos, foi proposta pelo Ministério Público ao arguido a aplicação do Instituto da Suspensão Provisória do Processo, mediante o cumprimento das seguintes injunções: a) pagamento da quantia de 450,00€ de imediato ao Estado, através de DUC e b) entrega de todos os títulos de condução que o habilitem a conduzir no prazo de 10 dias a contar da notificação do despacho de suspensão provisória do processo, ficando os mesmos nos autos pelo período de 3 meses e 15 dias, durante o qual o arguido não poderia conduzir qualquer veículo a motor. Ainda em sede de inquérito, o arguido foi ouvido em interrogatório e com a presença da sua Ilustre Defensora tendo manifestado a sua discordância com as injunções propostas pelo Ministério Público, o que inviabiliza de imediato a determinação pelo Ministério Público da suspensão dos autos e a remessa dos mesmos ao Juiz de Instrução para apreciação. Ora, o arguido manifestou discordância com as injunções propostas (alegando dificuldades económicas) e, por essa mesma razão, a lei processual penal não impõe (por manifesta inutilidade) que os autos sejam remetidos ao Juiz de Instrução, nem prevê a possibilidade de o arguido contrapropor ou negociar com o Ministério Público, que é o titular do inquérito, as injunções a aplicar. Ademais, igualmente não se julga que a injunção proposta ofenda a dignidade do arguido, em violação do disposto no artigo 281.º, n.º 5 do Código de Processo Penal, desde logo porque o arguido não invoca nem demonstra nos autos uma precária situação económica ou financeira. Depois porque, como se disse supra, é ao Ministério Público que incumbe a ponderação de todos os pressupostos legais de que depende a aplicação do instituto, o que fez, concluindo pela proposta de pagamento imediato do referido montante. Importa, por isso, ter presente que estas medidas não são penas criminais, porém devem responder às exigências de prevenção que no caso se façam sentir. E sendo a injunção imposta in casu de cariz económico, o critério de fixação do seu montante terá necessariamente de atender, por um lado à capacidade económica de quem se obriga (não tendo o arguido demonstrado quaisquer dificuldades ou situação precária nem em sede de inquérito nem agora na fase de julgamento), e por outro às exigências de prevenção e à culpa que no caso se faz sentir. E, efetivamente, as exigências de prevenção geral que, recorde-se, fazem apelo à consciencialização geral da importância dos bens jurídicos tutelados e o restabelecimento da confiança da comunidade na efetiva tutela penal desses mesmos bens jurídicos, são elevadíssimas não só nesta Comarca do Porto, especialmente notadas neste Juízo de Pequena Criminalidade, como em todo o sistema judicial português, sendo o crime de condução sob o efeito do álcool um dos crimes mais julgados nos Tribunais portugueses e, por isso, reclamam a proposta de injunções adequadas à prevenção da perpetuação deste tipo de comportamentos. Razão pela qual, julga-se que a injunção proposta não padece das nulidades apontadas e indefere-se o requerido. * Prosseguiu o processo para o julgamento do arguido sob a forma de processo sumário.* III – FUNDAMENTAÇÃO Tendo em conta a natureza das questões submetidas no recurso, importa respeitar as regras da precedência lógica a que estão submetidas as decisões judiciais (artigo 608º, nº 1 do Código de Processo Civil, “ex vi” do artigo 4º do Código de Processo Penal). Configuram-se, assim, as questões: o recorrente haveria de ter sido ouvido pelo Ministério Público, no caso, para se averiguar da sua situação económica, em virtude de alegar não ter condições económicas para aceitar a injunção pecuniária proposta de 450€ de pagamento imediato, com a finalidade de a alterar para a prestação de serviço a favor do Estado ou o pagamento daquela em prestações, mostrando-se violado o princípio do contraditório? A injunção proposta pelo Ministério Público, é ofensiva da dignidade do arguido, por ofender o seu direito a um rendimento mínimo, condigno, e violadora o princípio da igualdade, previsto no art.º 13º, da CRP? Faltou na suspensão provisória do processo, a concordância do Juiz de Instrução Criminal, nos termos do artigo 384º, nº 1 do CPP, existindo assim insuficiência de inquérito, por omissão de um acto, legalmente, obrigatório que inquinou a decisão de acusar, padecendo dos mesmos vícios a decisão que indeferiu, no início da audiência de julgamento, os vícios suscitados? Em caso afirmativo destas questões quais as consequências, que dali advém, irregularidade ou nulidade (sanável ou não), e em que medida afeta a sentença proferida aqui recorrida? Nos termos do artigo 281,º do C.P.P., (diploma a que pertencerão os preceitos a que se fará alusão) estabelecem-se os pressupostos legais para a suspensão provisória do processo, - quando esteja em causa crimes de pena não superior a 5 anos ou pena diferente da prisão; a concordância do arguido e do assistente; ausência de condenação anterior por crime da mesma natureza; ausência de aplicação anterior de suspensão provisória de processo, por crime da mesma natureza; não haver lugar a medida de segurança de internamento; ausência de um grau de culpa elevado; e ser de prever que o cumprimento das injunções e regras de conduta responda suficientemente às exigências de prevenção que no caso se façam sentir, os quais uma vez verificados, - na fase de inquérito, (que para o caso interessa), e com a concordância do Juiz de Instrução Criminal, se configura como uma medida pré-sentencial que visa evitar o prosseguimento do processo penal, até à fase de julgamento e que pode ser aplicada por iniciativa do Ministério Público. A suspensão provisória do processo constitui uma alternativa à acusação, ao alcance do Ministério Público, quando estiverem recolhidos indícios, suficientes, da prática de um crime, de quem foram os seus autores, a aplicar quando estejam reunidos os seus pressupostos formais, emergindo o dever de suspender, em vez do dever de acusar, da nova redação dada pela Lei 48/2007, de 29.08, ao artigo 281º, que substituiu a “pode …decidir-se” pela expressão “determina” a suspensão provisória do processo. Com esta alteração legislativa, foi afastado o mecanismo da oportunidade, na aplicação da suspensão provisória do processo, pois que, uma vez verificados os pressupostos formais, exigidos para a sua aplicação, em abstrato, previstos pelo legislador, o Ministério Público deve suspender o processo em vez de acusar, o que se integra no seu dever de promover a ação penal, orientado pelo principio da legalidade, previsto no art.º 219º/1, da CRP, em resultado da politica criminal definida pelo legislador. Em síntese: recolhidos indícios suficientes, o Ministério Público só pode suspender se não puder arquivar por ser um caso de dispensa de pena (art.º 280) e só pode acusar (art.º 283) se não puder arquivar nem suspender, (neste sentido João Conde Correia, in Questões Práticas Relativas ao Arquivamento e à Acusação e à Impugnação, 2007-74), numa gradação das soluções mais benignas para as mais gravosas. O legislador atribuiu a competência exclusiva, de decidir suspender o processo ao Ministério Público, na medida em que ao juiz de instrução cabe, apenas, um papel fiscalizador da legalidade, isto é, verificar os pressupostos legais da suspensão (cf. neste sentido Maia Costa, in Código de Processo Penal Comentado, Almedina, Coimbra, 2014, pág. 986, nota 3), o que não colide com a reserva da função jurisdicional do juiz, pois as injunções não se confundem com a imposição de penas (cf. acs TC 67/2006; 116/2006). Assim, para crimes de menor gravidade, o Ministério Público suspende a promoção do processo para julgamento, condicionando-o mediante aceitação do arguido a sujeitar-se a injunções e regras de conduta, durante determinado tempo, as quais se forem cumpridas pelo arguido, determinam o arquivamento do processo, nos termos do nº 3, do artigo art.º 282º, não podendo aquele ser reaberto. De outra forma, - em caso de incumprimento- a suspensão poderá vir a ser revogada pelo Ministério Público, nos termos do nº 4, do artigo 282º. No entanto, as injunções propostas não resultam de uma solução consensualizada entre o Ministério Público, arguido, assistente e Juiz de instrução, mas de “meras concordâncias perante (ou na aceitação de) propostas ou requerimentos de um ou mais sujeitos processuais a outro ou outros” (cf. Jorge Figueiredo Dias, 2011, Acordos sobre a sentença em processo penal: o fim do Estado de direito ou um novo princípio?, pág. 21). A suspensão provisória do processo é conformada pelas autoridades judiciárias, em função das finalidades especificas penais, cabendo ao arguido e ao assistente a possibilidade de aceitarem ou não tal solução, mas não a possibilidade de influenciarem decisivamente o seu conteúdo (Cláudia Cruz Santos, 2014, p. 582 justiça restaurativa: um modelo de reação ao crime diferente da justiça penal- Porquê, para quê e como?). Perante a diversidade do âmbito da suspensão provisória do processo, a diversidade dos seus pressupostos e as especificidades do próprio consenso, que lhe está subjacente esta não é confundível nem com o processo com mediação penal, nem com o processo sumaríssimo (art.º 392º segs.) ou acordos sobre sentença penal, que ainda que omissos, legalmente, poderão vir a ser possíveis. Elencamos, em cima, os pressupostos cumulativos de que depende a suspensão provisória do processo, e para o que agora nos interessa, exige-se que o cumprimento das injunções e regras de conduta, satisfaçam as necessidades de prevenção através da suspensão provisória, revelando-se adequadas e proporcionais às necessidades que no caso se façam sentir, respeitando a autonomia individual do arguido. Apenas o arguido, (e não ao seu defensor, que o poderá assistir, pois a assistência por defensor apenas se impõe, nos casos abrangidos pelo art.º 64º), de forma livre e esclarecida decidirá ou não, dar a sua concordância ou consentimento, à suspensão provisória do processo, proposta pelo Ministério Público, mediante a aceitação das injunções e regras de conduta a impor, (de outro modo estar-se-ia perante uma restrição inamissível dos seus direitos fundamentais, na medida em que vigora o princípio da presunção de inocência), no caso de não ser o arguido ou o assistente, os requerentes da suspensão provisória do processo. Apenas no caso de aceitação das injunções e regras de conduta que o Ministério Público pretende impor e da sua duração temporal, será admissível a suspensão, cuja decisão lhe compete, observados os pressupostos formais, previstos no artigo 281º, designadamente a “concordância do Juiz de Instrução”. Entre as diversas injunções e regras de conduta, prevista no nº 2, do artigo 281º, estão, nomeadamente, a de entregar ao Estado, certa quantia, e que no caso foi a opção do Ministério Público para além da proibição de conduzir, (prevista no nº 4, do artigo 281º,) visando-se com elas alertar o arguido para a validade da ordem jurídica violada e despertar um sentimento de fidelidade ao direito, (não dependendo tais opções de uma comprovação da culpa) mas a que não está ligada a censura ético-jurídica da pena. Ao arguido cabe decidir, de acordo com a sua estratégia de defesa, se aceita as injunções e regras de conduta, ciente que a todo o tempo àquelas se pode subtrair – se não forem de execução instantânea – bastando deixar de as cumprir ou prefere que o processo prossiga para julgamento. As injunções e regras de conduta, não representam uma verdadeira condenação, na medida em que o requerimento de suspensão provisória do processo não é um requerimento condenatório nem as injunções são penas, mas um mecanismo através do qual o arguido aceita cumprir certas regras e injunções e Ministério Público se compromete, caso se cumpram a desistir da pretensão punitiva do Estado e a arquivar o processo (cf. neste sentido ac. TC 253/2010). As injunções ou regras de conduta devem revelar-se suficientes, (atentas as necessidades de prevenção) adequadas (à natureza dos factos indiciados, às circunstâncias da sua prática; às suas consequências, à conduta anterior e posterior, à situação económica) e proporcionais (aos factos e seus efeitos) sendo as que de cariz económico deve representar um esforço de quem se obriga de molde a que o agente sinta o mal do crime e que não contendam com a sua dignidade, razão para a fiscalização ulterior de tal aceitação pelo juiz de instrução. Definidas as injunções e regras de conduta aceites pelo arguido, compete ao Juiz de Instrução Criminal, enquanto juiz das liberdades, suspender o processo, verificados os pressuposto exigidos, mas onde este não poderá discordar das injunções e regras propostas (fora da previsão do artigo 281, diremos nós) para a suspensão provisória do processo, motivado por insuficiência ou por excesso, de outro modo substituir-se-ia ao Ministério Público, atenta a fase inquisitória do processo onde vigora o princípio do acusatório e o caráter equitativo do processo (Conde Correia, 2012, pág. 55 seg. Bloqueio judicial a Suspensão provisória do processo, Porto, UCE). O Juiz de Instrução Criminal, sindica a legalidade formal da suspensão provisória do processo e a sua conformidade com a dignidade pessoal do arguido, que ocorre quando as injunções ou regras de conduta atingirem o núcleo dos direitos fundamentais, forem de cumprimento impossível, ou desproporcionado, revelando uma restrição excessiva e injustificada desses direitos individuais, (desde logo se cruéis, degradantes, infamantes, desumanas, castigos corporais) violadoras do art.º 25º /2 da CRP. O arguido é, evidentemente, o melhor juiz da desproporcionalidade de uma injunção, (medida em função das necessidades de prevenção) na medida em que o afeta, e que por isso, não a aceita, podendo em casos limite, em que a gravidade das injunções impostas, ultrapassem as necessidades de prevenção do caso, determinar o dissentimento do JIC. O Juiz de Instrução intervém no processo, após aceitação pelo arguido das injunções e regras de conduta propostas pelo Ministério Público, inexistindo concordância do arguido à proposta do Ministério Público não se verificam, desde logo, os requisitos formais para submeter uma proposta de suspensão provisória do processo a uma concordância do JIC (art.º 268º, nº 1 al. f)). Revisitando a situação recorrida constatamos que o recorrente se insurge contra a circunstância de lhe tendo sido proposto pelo Ministério Público a aplicação do Instituto da Suspensão Provisória do Processo, mediante o cumprimento das seguintes injunções: o pagamento da quantia de 450€ de imediato ao Estado através de DUC e b) entrega de todos os títulos de condução que o habilitem a conduzir no prazo de 10 dias a contar da notificação do despacho de suspensão provisória do processo, ficando nos autos por 3 meses e 15 dias, durante os quais não poderia conduzir qualquer veículo a motor. O arguido em sede de inquérito foi ouvido em interrogatório, na presença da sua defensora nomeada e manifestou discordância com as injunções propostas, (alegando dificuldades económicas) o que determinou o prosseguimento do processo com a dedução de acusação em processo sumário. Sustenta o recorrente padecer de nulidade insanável, prevista no art.º 119º, c) a suspensão provisória do processo, e todos os demais actos que se lhe seguiram, devido ter-lhe sido exigido o pagamento, imediato, de 450€ a favor do Estado, e eliminada a audição do arguido recorrente em virtude do seu incumprimento. Caso assim não se entenda, padece da nulidade prevista no artigo 120, nº 2 d) a suspensão provisória do processo, e todos os demais actos que se lhe seguiram em virtude de ter-lhe sido exigido o pagamento imediato de 450€, sem a concordância do Juiz de Instrução criminal, que não fiscalizou a injunção proposta, não lhe sendo,assim, dada a possibilidade de prestar serviço de interesse público, cf. 281º, 2 c) ou efetuado o pagamento do valor pecuniário da injunção em prestações, revelando-se tal injunção ofensiva da sua dignidade, por não acautelar o rendimento mínimo condigno. Finalmente, alega violar a injunção pecuniária proposta para a suspensão provisória do processo o princípio da igualdade previsto no art.º 13º, da CRP revelando-se por isso ferida de irregularidade, o que se comunica aos demais actos subsequentes enfermam de irregularidade, para além de não se revelar proporcional nem adequada. Nos artigos 118 a 123, regula-se, em geral, as consequências da inobservância das prescrições estabelecidas por lei (o processo penal está subordinado ao princípio da legalidade) para a prática dos atos processuais geradoras de invalidade. No entanto, estas não esgotam esta temática, pois há que atender a numerosas outras normas, dispersas pelo código, relativas a atos ou vícios determinados. As invalidades, são os efeitos dos desvios ao modelo prescrito na lei, a que esta faz corresponder uma inutilização, mais ou menos extensa dos atos processuais. A lei processual penal cataloga tais invalidades em três espécies, (não se cuidará da inexistência por não haver interesse para a situação em apreço) as quais sejam: as nulidades insanáveis– art.º 119 –, as nulidades dependentes de arguição – art.º 120 – e as irregularidades– art.º 123. O art.º 118 nº 1 e 2, estabelece que a violação ou inobservância das disposições da lei de processo, só determina a nulidade do ato quando esta for expressamente cominada na lei e que, nos casos em que a lei não comina a nulidade, o ato ilegal é irregular. Tal significa que, não basta a inobservância ou a simples violação de disposição legal, exige-se que a nulidade esteja expressamente prevista, como consequência da violação da lei ou pressupostos por esta exigidos. Não estando prevista a nulidade para a inobservância ou para a violação da lei, a invalidade que estará em causa será a irregularidade do ato, (nº2, do artigo 118 do C.P.P.). Uma vez que, só quando a lei comina as imperfeições dos atos com a consequência da nulidade, assume este vício caráter de exceção, pois a regra para a imperfeição dos atos é a da irregularidade, regendo-se o regime das nulidades pelo princípio da tipicidade, também designado por princípio da legalidade e da taxatividade ou numerus clausus, como estipula o art.º 118º n.º 1. De resto, o objetivo é, precisamente, não considerar todas as imperfeições do ato, no mesmo plano, antes graduar os efeitos dos vícios formais, em razão da sua essencialidade e gravidade, onde a regra é a irregularidade e a exceção a nulidade. Assinale-se que a norma do art.º 118º n.º 1, não consente, por outro lado, a aplicação analógica: as nulidades são típicas, taxativamente indicadas na lei, não havendo, por isso, lacunas a preencher. Contrapondo-se à irregularidade do ato, as nulidades, tipificadas na lei, distinguem-se entre nulidades insanáveis, ou absolutas, e nulidades dependentes de arguição, ou relativas. A fim de se poder declarar que o ato é nulo, é necessário que a lei expressamente comine a nulidade, como ainda se tal nulidade for insanável, importa que a lei explicitamente assim o preveja, pois as demais nulidades, são dependentes de arguição, é o que decorre da conjugação das normas dos artigos 119º e 120º, onde o primeiro enumera, quais as nulidades insanáveis e o segundo exige, que qualquer nulidade diversa das previstas no primeiro deve ser arguida. Por isso, também, no que respeita às nulidades insanáveis, vigora o princípio da tipicidade, que implica que a lei as designe, enquanto que as demais são dependentes de arguição. As nulidades insanáveis são, por definição, insuscetíveis de reparação, podendo ser conhecidas a todo o tempo na pendência do procedimento, oficiosamente ou a pedido. Todavia não podem, porém, ser declaradas após a formação de caso julgado, sobre a decisão final que, neste aspeto, atua como forma de sanação. A regra geral é a de que as nulidades relativas e as irregularidades ficam sanadas, se não forem acusadas, nos prazos legais de arguição. Prazos que, quanto às nulidades, são o prazo geral de 10 dias previsto no art.º 105º n.º 1 e os prazos específicos previstos nos art.º 120, n.º 3. Podendo a sanação ocorrer, ainda, por via da assunção das atitudes tipificadas no aludido art.º 121. As irregularidades, essas, haverão de ser arguidas no próprio ato, em que ocorrerem, quando os interessados estejam presentes. Não tendo assistido ao ato, devem os interessados suscitá-las “nos três dias seguintes a contar daquele, em que tiverem sido notificados para qualquer termo do processo ou intervindo em algum acto nele praticado” – art.º 123º n.º 1. Podendo, ainda, reparar-se oficiosamente a irregularidade que possa afetar o valor do ato praticado, no momento em que dela se tomar conhecimento. Tal como a(s) nulidade(s), também a irregularidade determina a invalidade do ato a que se refere e dos termos subsequentes que possa afetar – art.º 123º n.º 1 e 122º n.º 1. Em face deste regime, as nulidades insanáveis têm lugar quando: a) A falta do número de juízes ou de jurados que devam constituir o tribunal, ou a violação das regras legais relativas ao modo de determinar a respectiva composição; b) A falta de promoção do processo pelo Ministério Público, nos termos do artigo 48.º, bem como a sua ausência a actos relativamente aos quais a lei exigir a respectiva comparência; c) A ausência do arguido ou do seu defensor, nos casos em que a lei exigir a respectiva comparência; d) A falta de inquérito ou de instrução, nos casos em que a lei determinar a sua obrigatoriedade; e) A violação das regras de competência do tribunal, sem prejuízo do disposto no n.º 2 do artigo 32.º; f) O emprego de forma de processo especial fora dos casos previstos na lei; No caso não se verifica qualquer nulidade insanável, desde logo a prevista na alínea c) e d) do 119º, pois tal não é cominada para a falta de notificação do recorrente em caso de não aceitação das injunções que pretende negociar ou para os casos de incumprimento das injunções, prevista no artigo 282º, nº 4 a), isto se estivéssemos perante uma situação de incumprimento da injunção aceite pelo recorrente, a que o JIC tivesse dado a sua concordância e suspendido provisoriamente o processo, o que não é o caso. Proposta a suspensão provisória do processo ao recorrente em interrogatório, perante a sua defensora, o arguido não aceitou alegando dificuldades económicas para cumprir a injunção pecuniária. Alude o recorrente a uma situação de preterição da sua audição numa situação de revogação da suspensão provisória do processo, pelo Ministério Público e o seu prosseguimento para julgamento o que só teria lugar caso tivesse havido suspensão provisória do processo decretada pelo JIC, o que não se configura nos autos daí todos os argumentos invocados neste pressuposto haverão de soçobrar. De igual modo, tendo sido o processo remetido para julgamento, sob a forma de processo sumário, forma de processo especial, encontra-se ressalvada a obrigatoriedade de realização de inquérito, nos termos do art.º 262º, nº 2, e 381 e ss não constituindo a sua omissão a prática de um ato processual inválido. De facto, no processo sumário, a força probatória do flagrante delito, justifica a imediata introdução do facto em juízo. Por sua vez, no que respeita às nulidades do artigo 120º, do Código de Processo Penal, dependentes de arguição: 1 - Qualquer nulidade diversa das referidas no artigo anterior deve ser arguida pelos interessados e fica sujeita à disciplina prevista neste artigo e no artigo seguinte. 2 - Constituem nulidades dependentes de arguição, além das que forem cominadas noutras disposições legais: a) O emprego de uma forma de processo quando a lei determinar a utilização de outra, sem prejuízo do disposto na alínea f) do artigo anterior; b) A ausência, por falta de notificação, do assistente e das partes civis, nos casos em que a lei exigir a respectiva comparência; c) A falta de nomeação de intérprete, nos casos em que a lei a considerar obrigatória; d) A insuficiência do inquérito ou da instrução, por não terem sido praticados actos legalmente obrigatórios, e a omissão posterior de diligências que pudessem reputar-se essenciais para a descoberta da verdade. 3 - As nulidades referidas nos números anteriores devem ser arguidas: a) Tratando-se de nulidade de acto a que o interessado assista, antes que o acto esteja terminado; b) Tratando-se da nulidade referida na alínea b) do número anterior, até cinco dias após a notificação do despacho que designar dia para a audiência; c) Tratando-se de nulidade respeitante ao inquérito ou à instrução, até ao encerramento do debate instrutório ou, não havendo lugar a instrução, até cinco dias após a notificação do despacho que tiver encerrado o inquérito; d) Logo no início da audiência nas formas de processo especiais. No caso, o recorrente alega insuficiência de inquérito ou de instrução, por não terem sido praticados todos os atos obrigatórios, aqui a remessa do processo para o Juiz de instrução criminal, para a prática dos atos nos termos do artigo 268º, nº 1 f). Todavia, não lhe assiste razão, uma vez que o recorrente não tinha aceite a injunção, pelo que, não haveria de obter a concordância do JIC, nos termos do nº 1, do artigo 281, pois faltava desde logo um pressuposto formal, para a suspensão provisória do processo, que era a aceitação do recorrente, para ser concedida a suspensão provisória do processo. Tendo o recorrente manifestado a sua discordância com a injunção pecuniária, mercê de dificuldades económicas, não se mostra cominada com nulidade a falta de remessa ao JIC da proposta de suspensão provisória do processo não aceite, como não se mostra prevista legalmente a possibilidade de o arguido contrapor injunções ou negocia-las com o Ministério Público. Por outro lado, a exigência do pagamento imediato de 450€, não se revela ofensivo da dignidade da pessoa humana, nem violador do principio da igualdade, em face do crime indiciado e das fortes necessidades de prevenção geral, atenta a sinistralidade rodoviária, decorrente da condução de veículos a motor em estado de embriaguez, não se revelando demonstrado nos autos a indigência do recorrente, titular, aliás, de viatura própria, pois que o recorrente não foi alvo de tratamento desigual e injustificado, em razão da sua situação económica ou condição social. E como, acima, deixamos assinalado, é ao Ministério Público que compete a proposta de injunções e regras de conduta, perante a ponderação dos pressupostos legais, as necessidades de prevenção geral, em face do crime indiciado não estando as injunções sujeitas a negociação, de acordo com as conveniências do recorrente em ora prestar serviço ao Estado ou transformar a injunção num módico pagamento em prestações, do interesse do recorrente. Seja como for, não comina a lei nos artigos 281 e 282 com a nulidade, a falta de contraditório ao arguido das injunções propostas pelo Ministério Público, com vista à aceitação. De igual modo, não se surpreende nas normas que regem o instituto da suspensão provisória do processo, ou em qualquer outra disposição legal, que esteja cominado no caso de não aceitação pelo arguido da injunção, a nulidade do procedimento quando não tenha havido a remessa do processo ao JIC, ou ainda que a aquela se revele violadora da dignidade humana do recorrente, já que as injunções não são penas criminais e podem não ser aceites, como já deixamos assinalado. No que respeita à omissão de atos de inquérito, vale aqui o que deixamos dito a respeito da sua não obrigatoriedade no âmbito do processo sumário. Por fim, e não integrando qualquer dos casos previstos nos artigos 119º e 120º, deverá, a suspensão provisória do processo ser considerada irregular, em virtude de a injunção ser desproporcionada, desadequada ou por violar o princípio da igualdade, (art.º 118 do C.P.P ), forma menos grave de invalidade, não sujeita a “numerus clausus” e onde vigorando a atipicidade, ainda que com relevância material, atenta a possibilidade de afetar os atos subsequentes, o que resulta do disposto no artigo 123º, nº 1. Nos termos do artigo 123º, 1. “Qualquer irregularidade do processo só determina a invalidade do ato a que se refere e dos termos subsequentes que possa afetar quando tiver sido arguida pelos interessados no próprio ato ou, se a este não tiverem assistido, nos três dias seguintes a contar daquele em que tiverem sido notificados para qualquer termo do processo ou intervindo em algum ato nele praticado”. 2. Pode ordenar-se oficiosamente a reparação de qualquer irregularidade, no momento em que da mesma se tomar conhecimento, quando ela puder afetar o valor do acto praticado. Não surpreendemos que neste caso tenha existido, em qualquer dos casos a violação da legalidade processual, que afete o valor de qualquer dos atos praticados, não se revelando a injunção desproporcionada, atentas a necessidades de prevenção geral e a punição de condutas de menor gravidade, desde logo no artigo 81º, nº 6 b) do Código da Estrada, condução sob influência de álcool que tem por limite mínimo de 500€ e máximo de 1.250€. No entanto, assinale-se que, ainda que as nulidades dependentes de arguição, possam ser invocadas, nos processos especiais, como é o caso de processo sumário, até ao início da audiência da discussão e julgamento, a irregularidade da injunção proposta, com os fundamentos do recurso, haveria de ter sido suscitada no ato a que esteve presente o arguido e sua defensora, isto é, no seu interrogatório, e não foi, para vir a ser apreciada pelo Ministério Público, não podendo o recorrente vir posteriormente a argui-la, que a existir se teria sanado, a fim de atingir o despacho e a sentença proferida e recorrida e para a qual inexiste fundamento legal, para invalidar. Em face do exposto, improcede o recurso no seu todo. Das custas: Sendo negado provimento ao recurso do arguido, impõe-se a condenação do recorrente no pagamento das custas, nos termos previstos nos artigos 513°, 1, do Código de Processo Penal e 8º, nº 9, do Regulamento das Custas Processuais. A taxa de justiça é fixada em 4 (quatro) unidades de conta, nos termos da Tabela III anexa àquele Regulamento, tendo em conta o objeto e a extensão mediana do recurso. IV – DECISÃO Nos termos e pelos fundamentos expostos, acordam em conferência os Juízes Desembargadores da 4ª Secção (Criminal) do Tribunal da Relação do Porto, em negar provimento ao recurso do arguido AA e confirmar a sentença recorrida. Custas a cargo do recorrente, fixando-se a taxa de justiça em 4 UC (quatro unidades de conta). (A presente decisão foi processada em computador pela relatora, sua primeira signatária, e integralmente revisto por si e pelos Exmos. Juízes Desembargadores Adjuntos – art.º 94.º, n.º 2 do Código de Processo Penal) Porto, 08/10/2025 data certificada digitalmente Assinado digitalmente Isabel Monteiro José Castro Elsa Paixão |