Acórdão do Tribunal da Relação do Porto
Processo:
117/07.0GAPFR-A.P1
Nº Convencional: JTRP00043961
Relator: DONAS BOTTO
Descritores: REGIME DE PERMANÊNCIA NA HABITAÇÃO.
SUBSTITUIÇÃO DE PENA DE PRISÃO
Nº do Documento: RP20100519117/07.0gapfr-A.P1
Data do Acordão: 05/19/2010
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: REC. PENAL.
Decisão: PROVIDO.
Indicações Eventuais: 1ª SECÇÃO - LIVRO 638 FLS. 206.
Área Temática: .
Sumário: O Regime de permanência na Habitação (Art.44º C.Penal) tem a natureza de pena de substituição: não se trata nem de um mero regime de cumprimento da pena de prisão que possa ser aplicado em momento posterior ao da condenação nem um meio de substituir a execução de penas de prisão que resultem do incumprimento de outras penas de substituição.
Reclamações:
Decisão Texto Integral: Processo N.º 117/07.0GAPFR-A.P1

Acordam em Conferência no Tribunal da Relação do Porto

Relatório

O arguido B……………. veio requerer que a pena de prisão a que foi condenado, seja cumprida na sua habitação por meios electrónicos de controlo à distância.
O Digno Magistrado do Ministério Público deduziu oposição.
Na sequência da revisão ao Código Penal (CP) operada pela Lei n.º 59/2007, de 4 de Setembro, que entrou em vigor a 15 de Setembro (artigo 13.°, do referido diploma), passou a prever o artigo 44.°, apenas para o que aqui interessa, que se o condenado consentir, podem ser executados em regime de permanência na habitação, com fiscalização por meios de controlo à distância, a pena de prisão aplicada em medida não superior a um ano, sempre que o Tribunal concluir que esta forma de cumprimento realiza de forma adequada e suficiente as finalidades da punição.
Ora, por decisão proferida a 2008/01/22, já transitada em julgado, o arguido foi condenado pela prática de um crime de condução sem habilitação legal numa pena de 7 meses de prisão, que foi substituída por 210 dias de multa à razão diária de 7€, num total de 1.470€.
Não tendo o arguido procedido ao pagamento atempado da pena de multa de substituição, por despacho proferido a 02/10/2008, já transitado em julgado, foi determinado que o arguido deveria cumprir a pena de 7 meses de prisão em que foi condenado, estando o mesmo a cumprir essa pena desde o dia 15 de Outubro de 2009.
Tome-se em atenção que, salvo melhor opinião, não se encontra fundamento para indeferir liminarmente o pedido efectuado pelo arguido, designadamente por ter beneficiado anteriormente da substituição da pena de prisão por multa, tanto mais que na decisão que aplicou a pena de prisão não tomou o Tribunal posição sobre a modalidade de execução dessa pena de prisão e não tomou pela simples razão que acabou por substituir essa pena de prisão.
Neste sentido, considerando o tipo de crime pelo qual o arguido foi condenado, cujo desvalor de acção ou de resultado não é considerável, não obstante esta ter sido a sua quarta condenação pelo mesmo tipo de crime, tudo aliado ao carácter criminógeno das penas curtas de prisão, o cumprimento da pena de prisão na sua habitação mostra-se adequada e suficiente às finalidades da punição, não mais se esquecendo o arguido desta condenação,

Em todo o caso, acrescenta-se que nesta altura o Tribunal desconhece se estão reunidas as condições técnicas e logísticas que o permitem.
Pelo exposto, sem prejuízo da avaliação que se irá fazer quanto a essas condições, determina-se que o arguido B………… cumpra na sua habitação, com fiscalização por meios de controlo à distância, o remanescente da pena de prisão de sete meses em que foi condenado.
Notifique.
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Oficie, de imediato e pelo meio mais célere, à DGRS no sentido de serem preparadas na habitação do arguido as condições necessárias ao cumprimento da pena de prisão no regime ora aplicado, devendo informar o Tribunal logo que se inicie esse cumprimento ou se tais condições não existem ou não são viáveis.

Dê conhecimento do presente despacho aos serviços prisionais a fim de articularem com o DGRS a data e hora a que devem conduzir o arguido B…………. à sua habitação, no caso daquelas condições estarem reunidas, de modo a que desde o início da execução da pena de prisão neste regime estejam em funcionamento os meios de controlo à distância.
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O Ministério Público, inconformado com este despacho, onde se determina que o remanescente da pena de prisão em que o arguido B……….. foi condenado seja cumprido com recurso ao regime da permanência na habitação, com fiscalização por meios técnicos de controlo à distância, regime esse previsto no artigo 44.º do Código Penal, dele vem interpor o presente recurso, cujas conclusões se passam a transcrever:

1ª – No âmbito dos presentes autos, por sentença condenatória transitada em julgado no dia 25 de Fevereiro de 2.008, o arguido B………… foi condenado pela prática de um crime de condução sem habilitação legal, previsto e punível pelo artigo 3.º, n.os 1 e 2, do Decreto-Lei n.º 2/98, de 3 de Janeiro, na pena de 7 (sete) meses de prisão, substituída, no termos do artigo 43.º, n.º 1 do Código Penal, por pena de multa.
2ª – Como o arguido não procedeu ao pagamento da referida pena de multa, o Tribunal Recorrido decidiu, por douto despacho, já transitado em julgado, que o arguido deveria cumprir a pena de prisão em que foi condenado, tendo o mesmo sido conduzido a estabelecimento prisional no dia 15 de Outubro de 2.009, onde permanecia.
3ª – No entanto, no dia 28 de Dezembro de 2.009, o arguido requereu ao Tribunal Recorrido que “reavaliasse” a sua situação, pelo que no decurso de tal requerimento, o Tribunal ad quo determinou, que o remanescente dos 7 (sete) meses de prisão seriam cumpridos na habitação do arguido, com recurso à fiscalização por meios técnicos de controlo à distância, nos termos do disposto no artigo 44.º do Código Penal, alegando que «não se encontra fundamento para indeferir liminarmente o pedido efectuado pelo arguido, designadamente por ter beneficiado anteriormente da substituição da pena de prisão por multa, tanto mais que na decisão que aplicou a pena de prisão não tomou o Tribunal posição sobre a modalidade de execução dessa pena de prisão e não tomou pela simples razão que acabou por substituir essa pena de prisão».
4ª – É com o entendimento expendido no, aliás douto, despacho proferido que o Ministério Público não se conforma, dele agora recorrendo, por entender que foi realizada uma incorrecta interpretação e aplicação do artigo 44.º do Código Penal.
5ª – A Lei n.º 59/2.007, de 4 de Setembro, veio introduzir o novo regime de permanência na habitação, com fiscalização por meios técnicos de controlo à distância, previsto na redacção actual do artigo 44.º do Código Penal.
6ª – Tal consagração resulta da continuada preocupação legislativa com a criação de um sistema punitivo no âmbito do qual as penas têm um papel pedagógico e ressocializador do arguido, que dificilmente se coaduna com a pena de prisão e para o qual é fundamental a criação de uma panóplia de medidas não institucionais.
7ª – Ora, salvo o devido respeito por opinião contrária, corroboramos aquela que consideramos ser a melhor Doutrina, no sentido de que, se a pena de prisão por dias livres e o regime de semidetenção são penas de substituição detentivas, com mais pertinência se poderá atribuir tal natureza jurídica de pena de substituição ao regime de permanência na habitação, com recurso à fiscalização por meios técnicos de controlo à distância, porquanto trata-se de um regime de carácter não instituicional, apesar de detentivo, que pressupõe a prévia determinação da medida da pena de prisão.
8ª – Nesta conformidade, entendemos que «O regime (pena de substituição) de permanência na habitação previsto no actual art.º 44.º do C. Penal tem efectivamente a natureza de uma nova pena de substituição privativa da liberdade (...). O citado regime de permanência na habitação não se trata de um específico regime de execução da pena de prisão, é antes uma pena substitutiva», (sublinhado nosso), Acórdão da RELAÇÃO DO PORTO, de 2 de Dezembro de 2.009, Proc. n.º 425/06.8PTPRT.P1, in www.dgsi.pt.
9ª – E, precisamente, porque se trata de uma pena de substituição, com uma autonomia própria, conforme preconizam a Doutrina e Jurisprudência maioritárias, a sua aplicação deve ser ponderada no momento da condenação e não posteriormente.
10ª – Por outro lado, e atendendo a que o escopo das penas de substituição é o combate ao efeito criminógeno da pena de prisão, em especial, o combate aos efeitos negativos das penas curtas de prisão, as penas de substituição apenas são aplicáveis em alternativa à pena de prisão originariamente aplicada e não em consequência de penas de substituição que se frustraram. Basta atentarmos à redacção conferida aos artigos que prevêm penas de substituição, ou seja, artigos 43.º, 44.º, 45.º, 46.º, 50.º e 58.º, todos do Código Penal, que facilmente constatamos que se reportam sempre à pena de prisão, não fazendo qualquer referência à possibilidade de serem aplicadas perante o incumprimento de penas de substituição previamente aplicadas, pelo que «A permanência na habitação só substitui uma pena de prisão, não sendo um meio de susbstituir a execução de penas de prisão que resultem do incumprimento de outras penas de substituição», PAULO PINTO DE ALBUQUERQUE, in Comentário do Código Penal..., 1.ª Ed., pág. 183.
11ª – O, aliás douto, despacho recorrido, ao aplicar o referido regime ao arguido, concebendo-o como uma modalidade de execução da pena de prisão, a ser aplicado posteriormente ao trânsito em julgado da decisão condenatória, no âmbito da qual a pena de prisão foi substituída por pena de multa, fez uma incorrecta interpretação e aplicação do artigo 44.º do Código Penal, violando, assim, o nele preceituado.

Devendo, por isso, ser revogado e substituído por outro que acolha os fundamentos expostos e nos termos propugnados.
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Junto desta Relação, o Sr. PGA, é de parecer que o recurso merece provimento.

Colhidos os vistos legais, cumpre decidir.

A questão que se coloca neste recurso consiste em saber se ao arguido B………….. podia ser aplicado, como foi, o referido regime de prisão domiciliária, depois de o mesmo ter incumprido a pena de multa que substituiu a pena de prisão em que foi condenado, por sentença já transitada em julgado.

Vejamos
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Por decisão proferida no dia 22 de Janeiro de 2008, transitada em julgado no dia 25 de Fevereiro de 2008, o arguido B………….. foi condenado pela prática de um crime de condução sem habilitação legal, previsto e punível pelo artigo 3.º, n.os 1 e 2, do Decreto-Lei n.º 2/98, de 3 de Janeiro, na pena de 7 (sete) meses de prisão, substituída, no termos do artigo 43.º, n.º 1, do Código Penal, por 210 (duzentos e dez) dias de multa, à razão diária de € 7,00 (sete euros), perfazendo o quantitativo total de € 1.470,00 (mil quatrocentos e setenta euros).
Uma vez que o arguido não procedeu ao pagamento da pena de multa, o Tribunal Recorrido decidiu, por despacho proferido a 2 de Outubro de 2008, já transitado em julgado, que o arguido deveria cumprir a pena de prisão em que foi condenado, tendo o mesmo sido conduzido a estabelecimento prisional no dia 15 de Outubro de 2009, onde permanecia.
Porém, no dia 28 de Dezembro de 2009, o arguido requereu ao Tribunal Recorrido que reavaliasse a sua situação, pois pretendia que a pena de prisão que lhe foi aplicada fosse substituída por qualquer medida, que lhe conferisse a possibilidade de estar junto dos seus filhos e dos restantes familiares.
Na sequência de tal requerimento, contrariando o propugnado pelo Ministério Público, o Tribunal Recorrido determinou, então, que o remanescente dos 7 (sete) meses de prisão seriam cumpridos na habitação do arguido, com recurso à fiscalização por meios técnicos de controlo à distância.
Argumentou o Tribunal Recorrido, que não se encontra fundamento para indeferir liminarmente o pedido efectuado pelo arguido, designadamente por ter beneficiado anteriormente da substituição da pena de prisão por multa, tanto mais que na decisão que aplicou a pena de prisão não tomou o Tribunal posição sobre a modalidade de execução dessa pena de prisão e não tomou pela simples razão que acabou por substituir essa pena de prisão.
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O artigo 44.º, do C.P., com a epígrafe “Regime de permanência na habitação”, introduzido pela Lei n.º 59/2007, de 4 de Setembro, veio estabelecer uma nova pena de substituição, a aplicar-se como alternativa ao cumprimento da prisão nos estabelecimentos prisionais, em condenações até um ano, ou quando estejam em causa condenações superiores, mas em que o remanescente a cumprir não exceda um ano, descontado o tempo de detenção, prisão preventiva ou obrigação de permanência na habitação. Excepcionalmente, pode ser uma alternativa em penas até dois anos.
Pode questionar-se se o regime em questão consiste no que podemos chamar de “pena de substituição na execução”, ou seja, se o momento da substituição seria a fase de execução da pena e não o da sentença condenatória.
Sabemos que o momento em que a aplicação das penas de substituição deve ser decidida é o da sentença condenatória, enquanto momento da escolha, determinação e aplicação da pena correspondente ao facto.
Ora, somos de opinião que o regime de permanência na habitação é, efectivamente, uma nova pena de substituição, pelo menos em sentido impróprio, sendo a sentença condenatória o momento para decidir da sua aplicação, no mesmo sentido em que se consideram como penas de substituição a prisão por dias livres e o regime de semidetenção (cfr. Figueiredo Dias, ob. cit., p. 335).
A Lei n.º 59/2007, de 4 de Setembro, que entrou em vigor no dia 15 de Setembro de 2007 veio consagrar, no seu artigo 1.º, a nova redacção do artigo 44.º do Código Penal, referente ao regime de permanência na habitação, com fiscalização por meios técnicos de controlo à distância.
Como se refere no n.º 1, al. a) da mencionada disposição legal, perante o consentimento do arguido, a pena de prisão aplicada em medida não superior a 1 (um) ano pode ser executada com recurso ao referido regime, desde que o Tribunal conclua que esta forma de cumprimento realiza de forma adequada e suficiente as finalidades da punição.
Tal consagração resulta da continuada preocupação legislativa com a criação de um sistema punitivo no âmbito do qual as penas têm um papel pedagógico e ressocializador do arguido, que dificilmente se coaduna com a pena de prisão e para o qual é fundamental a criação de uma panóplia de medidas não institucionais. É o caso das penas de substituição.
Como bem refere o MP nas motivações de recurso, citando o Professor Figueiredo Dias Direito Penal Português – As Consequências Jurídicas do Crime, 1.ª Ed., pág. 326. , «...o processo de determinação da pena não se esgota nas operações de determinação da pena aplicável e de determinação da medida da pena, mas comporta ainda, ao menos de forma eventual, uma terceira operação, a da escolha da pena,...uma vez determinada a medida de uma pena de prisão, o tribunal verifica que pode aplicar, em vez dela, uma pena de substituição, devendo então proceder à determinação da medida da mesma».
Ora, este regime constitui uma verdadeira pena substantiva.
Por isso, o regime de permanência na habitação tem a natureza de uma nova forma de pena de substituição privativa de liberdade a aplicar como alternativa a um cumprimento de pena em ambiente de estabelecimento prisional, e não um específico regime de execução da pena de prisão.
E, porque se trata de uma pena de substituição, com uma autonomia própria, a sua aplicação deve ser ponderada no momento da condenação e não posteriormente, como se retira da própria redacção do n.º 2 do artigo 44.º do Código Penal, que se refere expressamente “à data da condenação”.
Atendendo a que o escopo das penas de substituição é o combate ao efeito criminógeno da pena de prisão, em especial, o combate aos efeitos negativos das penas curtas de prisão, as penas de substituição apenas são aplicáveis em alternativa à pena de prisão originariamente aplicada e não em consequência de penas de substituição que se frustraram. Basta atentarmos à redacção conferida aos artigos que prevêm penas de substituição, para constatarmos que se reportam sempre à pena de prisão, não fazendo qualquer referência à possibilidade de serem aplicadas perante o incumprimento de penas de substituição previamente aplicadas.

Maria João Antunes em comunicação feita nas Jornadas de Direito Penal, organizadas pelo CEJ, em Novembro de 2007 na Aula Magna da Reitoria da Universidade Clássica de Lisboa, a propósito deste tema, referiu:
«No artigo 44.° prevê-se agora o regime de permanência na habitação, com fiscalização por meios técnicos de controlo à distância. Uma nova pena de substituição privativa da liberdade, à qual são, correspondentemente aplicáveis regras da Lei que Regula a vigilância electrónica prevista no artigo 201.° do Código de Processo Penal (artigo 9.° da Lei n.° 59/2007). Substitui a pena de prisão aplicada em medida não superior a 1 ano; e o remanescente não superior a 1 ano da pena de prisão efectiva que exceder o tempo de privação da liberdade a que o arguido esteve sujeito em regime de detenção, prisão preventiva ou obrigação de permanência na habitação. Ou, excepcionalmente, o remanescente não superior a 2 anos, quando se verifiquem circunstâncias de natureza pessoal ou familiar do condenado que desaconselham a privação da liberdade em estabelecimento prisional, nomeadamente gravidez, idade inferior a 21 anos ou superior a 65 anos, doença ou deficiência graves, existência de menor a seu cargo, existência de familiar exclusivamente ao seu cuidado.
O enquadramento do regime de permanência na habitação nas penas de substituição privativas da liberdade é para nós inequívoco, quando substitui – à semelhança da prisão por dias livres e do regime de semidetenção – pena de prisão em medida não superior a um ano e é de concluir que esta forma de cumprimento realiza de forma adequada e suficiente as finalidades da punição (artigo 44.°, n.° 1, alínea a)). Quando substitui o remanescente não superior a um ano – ou, excepcionalmente, dois – da pena de prisão efectiva que exceder o tempo de privação da liberdade a que o arguido esteve sujeito em cumprimento de medida de natureza processual e é de concluir que esta forma de cumprimento realiza de forma adequada e suficiente as finalidades da punição (artigo 44.°, n.°s 1, alínea a), e 2), já não estamos, verdadeiramente, perante uma pena de substituição, mas antes perante uma regra de execução da pena de prisão, semelhante à agora introduzida no artigo 62.° (Adaptação à liberdade condicional)».

Assim, o novo artigo 44.º veio estabelecer uma forma de execução domiciliária da prisão, uma nova pena de substituição, a aplicar-se como alternativa ao cumprimento da prisão nos estabelecimentos prisionais, em condenações até um ano, ou quando estejam em causa condenações superiores, mas em que o remanescente a cumprir não exceda um ano, descontado o tempo de detenção, prisão preventiva ou obrigação de permanência na habitação. Excepcionalmente, pode ser uma alternativa em penas até dois anos.
Como pena de substituição, o momento para decidir da aplicação do regime de permanência na habitação, repetimos, é o da sentença condenatória, tal como ocorre com a prisão por dias livres e o regime de semidetenção.
Por isso, o artigo 44.° não consentirá, por exemplo, que tendo sido suspensa a execução de uma pena de prisão que veio a ser revogada, se venha a colocar, posteriormente a tal revogação, a questão do cumprimento domiciliário da prisão.
Também Paulo Pinto de Albuquerque, no seu Código Penal, em anotação ao art. 44º, refere que o regime de permanência na habitação é uma verdadeira pena de substituição da pena de prisão (ver expressamente neste sentido a exposição de motivos da proposta de lei n.º 98/X, que esteve na base da Lei n.º 59/2007). Não se trata, pois, de um mero regime de cumprimento da pena de prisão, que possa ser aplicado em momento posterior ao da condenação. A configuração da permanência na habitação como uma verdadeira pena de substituição é rica em consequências substantivas e processuais.
Desde logo, compete ao tribunal de julgamento ordenar a substituição, em função da situação pessoal e familiar do condenado “há data da condenação” como se diz expressamente no n.º 2. O termo de referência temporal à data da condenação deixa absolutamente claro o propósito do legislador sobre a natureza desta pena de substituição e, portanto, também sobre a competência exclusiva do tribunal de julgamento para a sua aplicação.
Por outro lado, continua, o regime de permanência na habitação não é aplicável a uma pena de prisão que tenha resultado de multa não paga, de pena de prestação de trabalho não satisfeita ou de revogação da suspensão da execução da pena de prisão. A permanência na habitação só substitui uma pena de prisão, não sendo um meio de substituir a execução de penas de prisão que resultem do incumprimento de outras penas de substituição. Em termos simples, o regime de permanência na habitação não é uma pena de substituição de segunda linha, a que se recorre depois do fracasso de outras de penas de substituição.
O pressuposto material de aplicação desta pena de substituição é o da sua adequação às finalidades da punição. A escolha desta pena de substituição, como de qualquer outra, é determinada exclusivamente por considerações de natureza preventiva, quer de prevenção geral quer especial. Esta pena é particularmente indicada no caso em que o arguido já tenha sofrido um período de obrigação de permanência na habitação a título cautelar na pendência do processo e as necessidades preventivas sejam compatíveis com o cumprimento da pena de prisão no mesmo ambiente, conclui aquele jurista.

Assim, o requerimento apresentado pelo arguido deveria ter sido indeferido, por não ser possível, no momento processual em que os presentes Autos se encontram, a aplicação do regime de permanência na habitação, que, como autêntica pena de substituição que é, só seria susceptível de ser aplicada em sede de sentença condenatória.
Assim ao aplicar-se o referido regime ao arguido, concebendo-o como uma modalidade de execução da pena de prisão, a ser aplicada posteriormente ao trânsito em julgado da decisão condenatória, no âmbito da qual a pena de prisão foi substituída por pena de multa, está a fazer-se uma incorrecta interpretação e aplicação do artigo 44.º do Código Penal.

Pelo exposto, julga-se procedente o recurso, revogando-se o despacho recorrido, substituindo-o por outro que acolha estes fundamentos.

Sem custas

Porto, 19 de Maio de 2010
Pedro Álvaro de Sousa Donas Botto
Maria Leonor de Campos Vasconcelos Esteves