Acórdão do Tribunal da Relação do Porto | |||
Processo: |
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Nº Convencional: | JTRP000 | ||
Relator: | MARIA JOÃO AREIAS | ||
Descritores: | CONTRATO DE MEDIAÇÃO IMOBILIÁRIA RESCISÃO DE CONTRATO INDEMNIZAÇÃO | ||
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Nº do Documento: | RP20140709387/12.2TVPRT.P1 | ||
Data do Acordão: | 07/09/2014 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Texto Integral: | S | ||
Privacidade: | 1 | ||
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Meio Processual: | APELAÇÃO | ||
Decisão: | CONFIRMADA | ||
Indicações Eventuais: | 2ª SECÇÃO | ||
Área Temática: | . | ||
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Sumário: | I - No contrato de mediação imobiliária, a rescisão do contrato fora do prazo acordado e na ausência de invocação de uma justa causa, faz incorrer o cliente na obrigação de indemnizar pela rescisão antecipada do contrato. II - Os concretos prejuízos decorrentes da rescisão antecipada têm de ser alegados pelo autor e formulado o correspondente pedido indemnizatório. | ||
Reclamações: | |||
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Decisão Texto Integral: | Processo nº387/12.2TVPRT.P1 – Apelação Relator: Maria João Areias 1º Adjunto: Maria de Jesus Pereira 2º Adjunto: Maria Amália Santos Acordam no Tribunal da Relação do Porto (2ª Secção): I – RELATÓRIO B…, instaurou a presente ação declarativa sob a forma de processo ordinário contra C…, Lda., pedindo a condenação da ré a pagar-lhe a quantia de € 81.490,26, acrescida de juros de mora à taxa legal desde a citação. Para tal, alega, em síntese: o negócio tido em vista no contrato de mediação imobiliária celebrado com a Ré, de transmissão do estabelecimento de farmácia, teve efetivamente lugar e foi realizado com o referido cliente angariado pela A.., pelo que, ao comunicar a resolução do contrato e pelo modo como o fez, a R. visou obstar a que a A. pudesse continuar a promover a angariação de outros interessados, e assim criando as condições para, posteriormente, concretizar o negócio sem o encargo, para o comprador, do pagamento da comissão; impulsionou e diligenciou pela realização do negócio objeto do contrato de mediação, tendo, no quadro do mesmo, obtido, para a R., potenciais interessados e nomeadamente o comprador com quem aquela veio a celebrar o negócio visado e que a Ré, com a sua conduta, iludiu a obrigação de pagamento da remuneração, pretendendo obstar, de forma culposa e ilícita, que a ela houvesse lugar; a R. denunciou o contrato a 21/01/2010 com efeitos imediatos, violando o prazo de duração do mesmo definido pela Cláusula 7ª do contrato de mediação, pelo qual este se estenderia no tempo até 22/05/2010, uma vez que se renovava automaticamente, por iguais e sucessivos períodos de seis meses; a resolução do contrato levada a cabo pela R. é ilícita, dada a inexistência de factos suscetíveis de legitimar a resolução do contrato por ocorrência de justa causa, tudo se passando como se o contrato tivesse mantido a sua vigência; porém, como ocorre uma impossibilidade de manutenção do vínculo contratual, na medida em que o estabelecimento já foi trespassado, considera assistir-lhe o direito de ser indemnizada pelos prejuízos sofridos em consequência da resolução ilícita e não motivada, não só pelos danos emergentes, mas também pelos lucros cessantes que deixou de obter em consequência da lesão, correspondentes à comissão adjacente a este negócio, no valor de Euros 65.032,73, bem como aos danos emergentes correspondem aos custos associados às suas ações comerciais, designadamente em comunicações, deslocações e salários cujo valor global fixa em Euros 1.500,00. A ré apresentou contestação, alegando, em síntese: outorgou escritura de Trespasse do estabelecimento comercial de farmácia denominado “D…” e não qualquer venda de imóvel nem cessão de quotas da sociedade “C…, Lda.”, pelo que o objeto do negócio praticado pela Ré está inequivocamente fora do âmbito do objeto contratado com a Autora. Alegando que o pedido da A. consubstancia um enriquecimento sem causa, dado que, a A. não lhe prestou qualquer serviço que conduzisse à realização do negócio, concluiu pedindo a improcedência da ação e a condenação da A. como litigante de má fé. Realizada audiência de julgamento, foi proferida sentença que julgando a ação improcedente, absolveu a ré do pedido. Inconformada com tal decisão, a autora dela interpôs recurso de apelação, concluindo a sua motivação com as seguintes conclusões: 1. A Apelante apresentou Petição Inicial, alegando, em súmula, que a resolução do contrato de mediação imobiliária levada a cabo pela Apelada é ilícita, dada a inexistência de factos suscetíveis de legitimar a resolução do contrato por ocorrência de justa causa, e que a R. ao comunicar a resolução do contrato e pelo modo como o fez, obstou a que a A. pudesse continuar a promover a angariação de outros interessados, concluindo que assiste à A. o direito a ser indemnizada pelos prejuízos sofridos em consequência da resolução ilícita e não motivada. 2. Tal indemnização engloba os lucros cessantes (comissão adjacente a que corresponderia o valor de EURO 65.032,73) e os danos emergentes (custos associados às suas ações comerciais, designadamente em comunicações, deslocações e salários cujo valor global, por comodidade e brevidade, se fixou em EURO 1.500,00), ascendendo ao valor global de EURO 81.490,26. 3. A Apelada deduziu contestação, onde exerceu o seu direito de contraditório. 4. Por Douta sentença proferida em 06/01/2014, o Meritíssimo Tribunal “a quo” julgou os factos dados como provados, e decidiu “que a Ré pôs termo ao acordo celebrado entre a A., sem que tivesse logrado demonstrar existir causa para a resolução comunicada, como refere na sua comunicação junta a fls. 22, do p.p. Acontece, no entanto, que sempre a Ré poderia denunciar o contrato celebrado com a A., desde que o fizesse com a antecedência prevista no contrato e pela forma estipulada. Assim sendo, não se pode deixar de atender que, não tendo o contrato sido renovado após a data de 22/05/2010, por não se poder deixar de atentar naquela comunicação que manifestava a vontade de pôr fim ao mesmo, o mesmo se extinguiu, deixando, pelo menos, após essa data de vigorar e vincular as partes. Acresce, por outro lado que não se logrou demonstrar que o terceiro a quem o estabelecimento foi trespassado tivesse sido indicado e angariado pela A., sendo certo, para além do mais que também o objecto do negócio não era exactamente o mesmo que a A. tinha como objecto lograr obter para a Ré. De qualquer das formas, a quem incumbia, segundo os termos do referido contrato, concretamente do estipulado na sua cláusula 4ª, nº 3, pagar a remuneração à A. pelos serviços que viesse a prestar, era ao “comprador angariado”, como aí se refere, só cabendo essa obrigação à ré, em caso de violação desse contrato. Violação esta que a respectiva parte não logrou também demonstrar. Assim, não tendo a autora logrado provar toda a factualidade por si invocada, como lhe incumbia, ao abrigo do disposto no art. 342º, nº1, do Cód. Civil, tem a acção de improceder”. 5. Ora, salvo o devido respeito por diverso entendimento, não pode a Apelante deixar de manifestar a sua discordância perante a decisão proferida. 6. São, assim, três as questões que aqui se colocam a douta apreciação do Meritíssimo Tribunal “ad quem”: a) saber se, a douta sentença proferida está inquinada de nulidade; b) saber se, a resolução do contrato sem justa causa equivale à válida denúncia do mesmo; c) saber se, a Apelante tem direito a receber uma indemnização pela cessação antecipada do contrato com base na perda de chance. 7. Refira-se, como nota prévia, que o contrato de mediação imobiliária é o contrato de prestação de serviços e, como tal, é-lhe aplicável o regime do mandato. 8. Quanto à primeira questão, cabe mencionar que a douta sentença proferida é omissa em relação à questão do quantum indemnizatório, no valor de EURO 1.500,00, referente aos danos emergentes pelos prejuízos sofridos em consequência da resolução ilícita do contrato, peticionado na petição inicial. 9. Sendo este um ponto de facto relevante no quadro do litígio, que concerne à causa de pedir, exigia-se uma tomada de posição expressa por parte do Juiz. 10. Como tal não ocorreu padece de nulidade, por omissão de pronúncia, a sentença em apreço. 11. O que desde já se alega para todos os devidos e legais efeitos. SEM PRESCINDIR: 12. Em relação à segunda questão, importa determinar se, o contrato foi ou não validamente extinto. 13. Estabelece o artigo 1170º, número 2 do Código Civil que o contrato não pode ser resolvido pelo mandante sem o acordo do interessado, salvo ocorrendo justa causa. 14. No caso em apreço ficou demonstrado, como referiu o Meritíssimo Tribunal que “a Ré pôs termo ao acordo celebrado entre a A., sem que tivesse logrado demonstrar existir causa para a resolução comunicada, como refere na sua comunicação junta a fls. 22, do p.p.”. 15. Por isso, a Apelada terá de indemnizar a Apelante pelo prejuízo causado. SEM PRESCINDIR: 16. O Tribunal “a quo” entendeu que “sempre a Ré poderia denunciar o contrato celebrado com a A., desde que o fizesse com a antecedência prevista no contrato e pela forma estipulada”. 17. De facto, a denúncia não carece de causa justificativa, pelo que a sua validade depende do cumprimento do prazo de pré-aviso. 18. No caso sub iudice, foi observado o prazo de pré-aviso, como se pode constatar do Doc. 4 junto à petição inicial, todavia, a denúncia do contrato de mediação não podia “ produzir efeitos imediatos”. 19. Isto posto, independentemente do contrato ter cessado por resolução ou por denúncia, a indemnização é devida, no primeiro caso porque faltou invocar justa causa, e, no segundo caso porque com a cessação imediata dos efeitos contratuais, a Recorrente perdeu a oportunidade de angariar potenciais compradores. 20. Ora, escalpelizada a douta sentença posta em crise, temos que, e sempre com a devida vénia, o Meritíssimo Tribunal “a quo” não fez qualquer alusão à indemnização devida à Recorrente. 21. O que desde já se alega para todos os devidos e legais efeitos. 22. Por outro lado, entendeu o Meritíssimo Tribunal “a quo” que “não tendo o contrato sido renovado após a data de 22.5.2010, por não se poder deixar de atentar naquela comunicação que manifestava a vontade de pôr fim ao mesmo, o mesmo se extinguiu, deixando, pelo menos, após essa data de vigorar e vincular as partes”. 23. Esta afirmação leva-nos à terceira e, última, questão. Senão vejamos: o contrato deixou de vigorar e de vincular as partes, a 22/05/2010, todavia, já a partir de 21/01/2010 (data da comunicação de cessação contratual), a Recorrente viu-se impedida de angariar potenciais interessados na compra do estabelecimento de farmácia denominado de “D…”. 24. O que significa que durante esse período temporal, a Apelada perdeu a chance de angariar potenciais interessados na compra do mencionado estabelecimento comercial. 25. O que se traduziu num dano emergente para a Apelante, dada a oportunidade perdida ainda que tal oportunidade se referisse à obtenção futura de ganhos. ISTO POSTO: 26. Atendendo ao disposto no número 3, do artigo 5º do Código de Processo Civil “o juiz não está sujeito às alegações das partes no tocante à indagação, interpretação e aplicação das regras de direito” - emanação do velho brocardo iura novit curia. 27. Por isso, ainda que a doutrina da perda de chance não tenha sido alegada na petição inicial, tratando-se de uma questão de direito, a mesma deveria ter sido levantada pelo Tribunal “a quo”. 28. Tanto mais que a Recorrente na petição inicial alegou os factos que reclamavam essa subsunção ao direito, quando afirma que: “Ao comunicar a resolução do contrato e pelo modo como o fez, a R. obstou a que a A. pudesse continuar a promover a angariação de outros interessados”. 29. Ademais, tendo o Meritíssimo Tribunal “a quo” dado como provados os seguintes factos: a) “Assim, a A., no cumprimento do contratualmente estipulado, deu início ao processo de promoção e venda da “D…” tendo, para tal efeito, angariado uma sociedade integrada no denominado “Grupo E…” b) “Ao proceder à comunicação de fls. 22 a Ré obstou a que a A. pudesse continuar a promover a angariação de outros interessados”, dúvidas não subsistem que o Meritíssimo Tribunal “a quo” não fez a correta aplicação do direito aos factos. SENÃO VEJAMOS: 30. Tendo ficado provado que a, ora, Apelante, se empenhou, ab initio, na angariação de potenciais compradores e que, a partir da comunicação enviada, a Apelante perdeu a oportunidade de continuar a angariar interessados, salvo o devido respeito por diversa opinião, andou mal o Tribunal “a quo” ao não reconhecer à, ora, Apelante, o direito a receber uma indemnização, calculada segundo a equidade, pelo dano da perda de chance que sofreu. 31. Tanto mais que, à data, era facto notório e público a grande apetência pela aquisição de farmácias. 32. Facto esse que, conforme dispõe o artigo 412º do Código de Processo Civil, “não carece[m] de prova, nem sequer de alegação” (Antunes Varela, J. Miguel Bezerra e Sampaio e Nora, Manual de Processo Civil, 2ª Edição, Coimbra Editora, Coimbra, 1985, p. 420). 33. O que desde já se alega para todos os devidos e legais efeitos. 34. Pelo exposto, salvo o devido respeito por diversa opinião, repete-se, não são admissíveis os motivos invocados para a improcedência total do pedido. 35. Ao não contemplar tal raciocínio, a douta decisão recorrida incorreu no vício previsto no artigo 615º, número 1, alínea d), e violou o disposto nos artigos 563º, 1170º, número 2 e artigo 1172º do Código Civil. 36. O que conduziu a uma denegação do direito de acesso ao direito, da ora, Recorrente, incorrendo em grave violação do disposto no artigo 20º do Constituição da Republica Portuguesa, pelo que deve ser revogada. Conclui pela revogação da sentença recorrida. A Ré apresentou contra-alegações, no sentido da improcedência da apelação. Cumpridos os vistos legais, há que decidir. II – DELIMITAÇÃO DO OBJECTO DO RECURSO Tendo em consideração que o objeto do recurso é delimitado pelas conclusões das alegações de recurso, sem prejuízo da apreciação de eventuais questões de conhecimento oficioso – cfr., arts. 635º, e 639, do Novo Código de Processo Civil[1] –, as questões a decidir seriam as seguintes: 1. Nulidade por omissão de pronúncia. 2. Extinção do contrato de mediação imobiliária – validade da denúncia efetuada pela ré. 3. Indemnização pela perda de chance. III – APRECIAÇÃO DO OBJECTO DO RECURSO 1. Nulidade por omissão de pronúncia. Segundo a apelante, a sentença é omissa quanto à questão dos danos emergentes, especificamente quanto ao quantum indemnizatório de 1.500. 00 € referente aos prejuízos sofridos em consequência da resolução ilícita do contrato. A sentença apenas fez alusão à comissão adjacente ao negócio peticionada a título de lucro cessante, ignorando a questão dos danos emergentes. O Juiz a quo pronunciou-se no sentido da não verificação da inovada nulidade, argumentando que tendo decidido que, face aos factos apurados, não ocorreu qualquer resolução ilícita, não faz sentido apurar, nem quantificar, uma indemnização nessa base, referente a lucros cessantes, quando in existe base legal para tanto. Da leitura da petição inicial resulta que a autora faz assentar os seus pedidos indemnizatórios na “resolução ilícita e não motivada do contrato”: a) uma indemnização no valor de 65.032,73 €, correspondente ao valor da comissão acordada entre as partes; b) uma indemnização no valor de 1.500,00 €, pelos custos associados às suas ações comerciais. A sentença recorrida não reconhece a invocada ilicitude da denúncia do contrato. Com efeito, aí se afirma: “Acontece, no entanto, que, sempre a Ré poderia denunciar o contrato celebrado com a A., desde que o fizesse com a antecedência prevista no contrato e pela forma estipulada”. E, embora de um modo sucinto, determina igualmente qual a consequência para a inobservância do prazo acordado: “Assim sendo, não se pode deixar de atentar que, não tendo o contrato sido renovado após a data de 22.05.2010, por não poder deixar de atentar naquela comunicação que manifestava a vontade de pôr fim ao mesmo, o mesmo se extinguiu, deixando, pelo menos após essa data de vigorar e vincular as partes”. O não reconhecimento da ilicitude da denúncia, que constituiu o fundamento e a causa de pedir do pedido de indemnização, importando, sem mais a sua improcedência, prejudicou o conhecimento dos restantes pressupostos da obrigação de indemnizar. De qualquer modo, sempre se dirá que, a verificar-se a invocada nulidade por omissão de pronúncia, a única consequência consistiria na apreciação da questão omitida por parte deste tribunal, sendo que, não tendo sido dados como provados os alegados custos em comunicações, deslocações e salários, suportados pela autora, e por si avaliados globalmente em 1.500,00 € (matéria alegada no art. 36º para sustentar o pedido em causa), sempre tal pedido seria de improceder. Concluindo, não se julga verificada a invocada nulidade da sentença. A. Matéria de facto. A sentença recorrida teve em consideração os seguintes factos, que não foram qualquer objecto de impugnação: 1.A A., com data de 22/05/2009, a A. celebrou um contrato denominado de mediação imobiliária, com a R., obrigando-se a diligenciar no sentido de conseguir interessado: a) Na compra, pelo preço mínimo de €1.000.000 (um milhão de euros), da fracção autónoma designada pela letra “----“, com entrada pelo nº .. que faz parte integrante do prédio urbano em regime de propriedade horizontal, sito na Rua …, .. da freguesia … e Concelho de Coimbra, (….) e da totalidade das quotas no capital da sociedade comercial por quotas sob a firma --------, com o NIPC ……… e sede em na Rua … nº .., sendo que o respectivo preço pressupõe todo o activo e passivo da referida sociedade, incluindo o direito de arrendamento da aludia fracção “----“ e o estabelecimento comercial de Farmácia, denominado “D…”, instalado naquela morada, de que a sociedade é titular. 2. A Mediadora obriga-se, para o efeito, a desenvolver ações de promoção e recolha de informações sobre os negócios pretendidos e característicos do respectivo imóvel” – cfr. Cl.ª 1.ª, do referido contrato, cuja cópia se encontra junta a fls. 13, do p.p., e que aqui se dá por integralmente reproduzido. 2. Tal contrato foi celebrado por escrito, em regime de exclusividade, e por um período de duração inicial de 6 meses, renovável, desde que não denunciado por qualquer das partes, por iguais e sucessivos períodos de tempo – cfr. Doc. de fls. 13, do p.p., e que aqui se dá por integralmente reproduzido. 3. Por via do mesmo, a A. teria direito a receber uma remuneração correspondente a 5% do preço por que viesse a ser realizado o negócio, acrescido do IVA à taxa lde 20%, conforme cláusula 4ª do mesmo contrato. 4. Assim, a A., no cumprimento do contratualmente estipulado, deu início ao processo de promoção e venda da “D…” tendo, para tal efeito, angariado uma sociedade integrada no denominado “Grupo E… – cfr. Docs. de fls. 19 a 21, do p.p., aqui dados por integralmente reproduzidos. 5. Com data de 21/01/2010, a Ré comunicou à A. a resolução/denúncia do referido contrato denominado de mediação imobiliária – doc. de fls. 22, do p.p., aqui dado por integralmente reproduzido. 6. A A. teve conhecimento de que, nos inícios de Novembro de 2010, a R. teria celebrado um contrato denominado de trespasse relativo ao identificado estabelecimento de farmácia. 7. Efetivamente, com data de 02/07/2010, pelo preço indicado de Euros 1.300.654,57, a Ré declarou trespassar à sociedade F…, Lda. o estabelecimento de farmácia denominado ‘D…’, abrangendo a cedência de todas as licenças e respetivo alvará, e ainda a venda da armação, utensílios e demais coisas móveis que nessa data integravam o estabelecimento, bem como o direito ao arrendamento do local – cfr. Doc. de fls. 24, do p.p., aqui dado por integralmente reproduzido. 8. Ao proceder à comunicação de fls. 22, do p.p., a Ré obstou a que a A. pudesse continuar a promover a angariação de outros interessados. 9. Na Cláusula nº 3, nº 2, do Referido Contrato denominado de Mediação Imobiliária consta que “Nos termos da legislação aplicável, quando o contrato é celebrado em regime de exclusividade só a Mediadora contratada tem o direito de promover o negócio objecto do contrato de mediação durante o respectivo período de vigência. 10. Autora e ré, acompanhada pela sua Mandatária, a Exm.ª Sr.ª Dr.ª G…, deslocaram-se às instalações da empresa E… em 26 de Novembro de 2009 para reunir com os representantes da referida empresa e acordar nos termos do negócio. 11. Posteriormente, a Ré foi informada que o negócio não se efetuaria com a empresa E…. 12. Foi marcada reunião nas instalações da Autora para acordarem o fim do referido contrato celebrado entre as partes, por a Ré considerar não fazer já qualquer sentido em subsistir, o que não teve a aceitação da A., levando a Ré a proceder à comunicação constante de fls. 22, do p.p. 13. A Ré deixou de ter contacto com a Autora. B. O Direito Pretende a Autora com a presente ação exercer o direito a ser indemnizada pelos prejuízos sofridos em consequência da “resolução ilícita e não motivada”, levada a cabo pela Ré, formulando os seguintes pedidos: a) uma indemnização no valor de 65.032,73 €, correspondente ao valor da comissão acordada entre as partes; b) uma indemnização no valor de 1.500,00 €, pelos custos associados às suas ações comerciais. Julgada improcedente a ação, o Apelante insurge-se contra a decisão recorrida, com a seguinte alegação: na ausência de inovação de uma justa causa, a apelada terá de indemnizar a apelante pelo prejuízo causado, prejuízo este que consistiu na perda de chance de angariar clientes no período que mediou entre a data da comunicação da cessação contratual (21.01.2010) e a data do termo da renovação (22.05.2010), questões que passamos a analisar. 2.1. (I)Licitude da denúncia – seus efeitos. Segundo a autora/apelante, no caso do mandato, embora a lei admita a sua resolução unilateral, quando conferido também no interesse do mandatário, não pode ser resolvido pelo mandante sem o acordo do interessado, salvo ocorrência de justa causa – nº do art. 1170º do Código Civil, pelo que a Ré sempre deveria indemnizar a autora nos termos do art. 1172º do CC. O contrato de mediação é um contrato atípico no direito português, na medida em que não lhe corresponde um regime legal específico[2], sendo celebrado ao abrigo da liberdade contratual (artigo 405º, nº1, CC). Inserindo-se na categoria dos contratos de prestação de serviços, apesar de não ser recondutível a qualquer um dos tipos legais, permite a aplicação, com as necessárias adaptações, do regime do mandato (art. 1156º do CC). Ser-lhe-á igualmente aplicável a regulamentação legal específica, respeitante a algumas modalidades de mediação, no que ao caso interessa, o regime geral da atividade da imediação imobiliária aprovado pelo DL nº 211/2004, de 20 de Agosto, em vigor à data dos factos. Ao contrário do contrato de mediação em geral, o contrato de mediação imobiliária está sujeito à forma escrita (nº1 do art. 19º do DL 211/2004). Na vigência do DL 77/99, o prazo do contrato constituía um dos elementos referentes ao conteúdo e objeto do contrato, a constar obrigatoriamente do conteúdo contratual, sob pena de nulidade do mesmo (art. 20º, nº1, al. g), e nº2). O DL 211/2004, substituiu tal solução pela consagração de um prazo supletivo, a vigorar no silêncio das partes: quando o contrato for omisso relativamente ao respetivo prazo de duração, considera-se o mesmo celebrado por um período de seis meses – nº3 do art. 19º do citado diploma. No caso em apreço, as partes convencionaram na Cláusula 7ª (Prazo de duração do Contrato), que o mesmo “tem a validade de 6 meses, contados a partir da sua celebração, renovando-se automaticamente por iguais e sucessivos períodos de tempo, caso não denunciado por qualquer das partes contraentes através de carta registada com aviso de receção ou outro meio equivalente, com a antecedência mínima de 10 dias em relação ao seu termo”. A denúncia do contrato, enquanto cessação de um vínculo por revogação unilateral, figura própria dos contratos duradouros, é em princípio livre. Por via de regra, a denúncia, em qualquer das suas modalidades, não carece de qualquer justificação, podendo o direito exercer-se ad libitum[3], sendo configurado como um direito potestativo que assiste a qualquer um dos contraentes. Contudo, tendo em conta o princípio da boa-fé, para ser exercida deverá ser precedida de um aviso prévio, ou seja, a denúncia tem de ser comunicada com alguma antecedência relativamente à data em que a cessação produzirá efeitos. A doutrina distingue três casos em que a denúncia pode ser exercida: (i) para impedir a vigência das relações contratuais estabelecidas por tempo indeterminado; (ii) para obstar a renovação automática do acordo; (iii) como forma de “desistência”, admitida unicamente para determinados contratos, por lei ou acordo das partes. No caso em apreço, tendo as partes acordado que o contrato vigoraria por um prazo de seis meses, automaticamente renovável se não fosse denunciado com uma antecedência mínima de 10 dias relativamente ao termo do prazo acordado, e não tendo qualquer das partes exercido tal possibilidade até ao termo do contrato, o mesmo renovou-se automaticamente por mais seis meses, ou seja, renovou-se por novo período de seis meses – de 22.11. 2009 até 22.05.2010. Contudo, por carta datada de 21 de Janeiro de 2010, e por divergências com a autora não inteiramente apuradas, mas relacionadas com a desistência de um interessado angariado pela autora (teor da carta de fls. 22 e pontos 4, 19, 11 e 12, da matéria de facto dada como provada), a Ré comunicou à autora a sua vontade de “resolver” o contrato com efeitos imediatos. É bom de ver que, com tal comunicação, a Ré não pretendeu socorrer-se da possibilidade de denúncia prevista na Clausula 6º do contrato – denúncia para impedir a renovação automática do contrato – visando com a mesma a extinção do contrato com efeitos imediatos. Pelo juiz a quo foi considerado que “a Ré pôs termo ao contrato celebrado com a autora, sem que tivesse logrado demonstrar existir justa causa para a resolução comunicada”, o que não é posto em causa pela Ré. Como sustenta Meneses Cordeiro, o contrato de mediação cessa pelas razões que, nele, as partes tenham querido inserir, sendo que, só no caso de nada dizerem se terá de recorrer às regras gerais[4]. Ora, sendo o contrato celebrado omisso quanto à “denúncia” operada com vista a produzir efeitos fora do prazo previsto no contrato ou das suas renovação, terá de recorrer-se às regras gerais. Como afirma Pedro Romano Martinez[5], se uma das partes denunciar o contrato fora do contexto em que esta forma de cessação é admitida, nomeadamente sem se encontrarem os respetivos pressupostos, a sua atuação é ilícita. E tal autor, reconduz as consequências de tal ilicitude a dois tipos de efeitos: a) não produção, total ou parcial dos efeitos da denúncia (o que dependerá do tipo e natureza do contrato em apreço); b) constituição da parte que atuou ilicitamente na obrigação de indemnizar os prejuízos causados à contraparte. De qualquer modo, e por via de regra, a denúncia, ainda que exercida de modo ilícito, produz de imediato o efeito extintivo, ou ainda que este subsista, o ato ilícito da renúncia, verificados os pressupostos da responsabilidade civil, implica o pagamento da correspondente indemnização. E a igual solução chegaríamos com recurso ao regime do mandato: admitindo a lei a sua resolução unilateral, quando conferido também no interesse do mandatário não pode ser resolvido pelo mandante sem o acordo do interessado, salvo ocorrência de justa causa, nº 2 do art. 1170º do Código Civil, devendo a parte que revogar o contato indemnizar a outra parte pelo prejuízo que esta sofrer (als. c) e d) do art. 1172º, do CC). Como refere Luís Manuel Teles de Menezes Leitão[6], a indemnização é devida quando a revogação provier do mandante e se trate de mandato oneroso conferido por certo tempo ou para determinado assunto. Nestes casos, o mandatário conta receber a remuneração estipulada em função do tempo acordado ou da natureza do assunto, pelo que uma revogação antecipada frustra esse seu direito à remuneração, justificando assim a indemnização. Contudo, tratando-se de um contrato mediação imobiliária, a simples vigência do contrato não dá direito a qualquer remuneração, direito que apenas se constituirá se a mediadora vier a conseguir um interessado para algum dos negócios previstos entre as partes (cláusulas 1ª e 4ª, do contrato), só sendo devida com a conclusão ou perfeição do negócio visado pelo exercício da mediação (art. 18º do DL nº 211/2004), sendo que, segundo o nº3 da clausula 4ª, do contrato em apreço, o pagamento de tal remuneração incumbiria ao comprador e não ao cliente. Passamos assim, à segunda questão levantada pelas alegações da apelante, respeitante à determinação de quais os danos a indemnizar pela cessação antecipada do contrato por parte da Ré. 3. Indemnização pela “perda de chance”. Sustenta a apelante que não tendo sido observado o prazo do pré-aviso, e produzindo este os seus efeitos unicamente no termo do prazo do pré-aviso, ou seja, a 22.05.2010, subsiste à recorrente o direito a ser indemnizada pela cessação imediata dos efeitos contratuais, uma vez que “perdeu a chance de angariar potenciais compradores”, durante o período que mediou entre a data da comunicação da cessação contratual (21.01.2010) e a data do termo da renovação (22.05.2010), E, aqui chegados, deparamo-nos, desde logo, com um obstáculo ao deferimento da pretensão da autora. É que, independentemente da liberdade atribuída ao tribunal na qualificação jurídica dos factos, o mesmo encontra-se limitado pelo pedido e pela causa de pedir. Ora, a autora, na petição inicial, limitou-se a alegar como danos decorrentes da ilicitude da resolução, o valor da comissão que deixou de auferir com determinado negócio, no valor de 65.032,72 €, e os custos associados às suas ações comerciais, designadamente em comunicações, deslocações e salários, no valor 1.500,00 €. Com efeito, só nas suas alegações de recurso, e pela primeira vez, a Autora levanta tal questão[7], não se encontrando provados nos autos, por não terem sido oportunamente alegados, quaisquer factos relativos à alegada “perda de oportunidade de angariar potenciais compradores”, não tendo, além do mais, a autora formulado qualquer pedido indemnizatório relativamente a tal dano, que o autor não quantifica, nem sequer em sede de alegações. Ou seja, relativamente à pretensão agora deduzida pelo apelante, verifica-se falta de causa de pedir e da formulação do correspondente pedido (arts. 264º e 661º, nº1, ambos do CPC). O princípio do dispositivo implica que é às partes que incumbe a conformação do objeto do processo: ao autor incumbe a formulação dum pedido fundada em determinada causa de pedir. O pedido determina o conteúdo da decisão. É ele o objeto do processo: o juiz deve apreciar a pretensão do autor só em função dela pode condenar o réu[8]. Tendo o autor circunscrito o seu pedido indemnizatório ao valor da comissão correspondente ao negócio que a Ré veio a realizar e ao valor dos custos associados à sua ação comercial, não poderia o tribunal, oficiosamente, como pretende a apelante conhecer de um eventual prejuízo respeitante à “perda de chance”. A apelação será de improceder. IV – DECISÃO Pelo exposto, acordam os juízes deste tribunal da Relação em julgar a apelação improcedente, confirmando-se a decisão recorrida. Custas a suportar pela Apelante. Porto, 09 de Julho de 2014 Maria João Areias Maria de Jesus Pereira Maria Amália Santos _____________ [1] Tratando-se de decisão proferida após a entrada em vigor do novo código, aprovado pela Lei nº 41/2013, de 26 de Junho, em ação instaurada depois de 1 de Janeiro de 2008, aplicar-se-á o regime de recursos constante do novo código, de acordo com o art. 5º, nº1 do citado diploma – cfr., neste sentido, António Abrantes Geraldes, “Recursos no Novo Código de Processo Civil”, Almedina 2013, pág. 16. [2] Cfr., neste sentido, Carlos Lacerda Barata, “Contrato de Mediação”, Estudos do Instituto de Direito do Consumo, Vol. I, Instituto do Direito do Consumo, Vol. I, págs. 208 e 225. [3] Cfr., neste sentido, Pedro Romano Martinez, “Da Cessação do Contrato”, 2ª ed., Almedina 2006, pág. 116 e 118. [4] “Do Contrato de Mediação”, revista “O Direito” 139 (2007), III, pág. 553. [5] “Da Cessação do Contrato”, pág. 124. [6] “Direito das Obrigações”, Vol. III – Contratos em Especial, 3ª ed., pág. 474. [7] Tratando-se de uma questão nova, este tribunal encontrava-se impedido de a apreciar. Como é entendimento unânime na doutrina e na jurisprudência, o tribunal de recurso não pode conhecer questões novas, a não ser que se trate de questões de conhecimento oficioso – o recurso não serve para rejulgar o litígio (não se trata de reexaminar), mas apenas para apreciar se a decisão recorrida está ou não correta em face dos elementos de que o tribunal a quo dispunha para o julgamento da causa oficioso - Cfr., entre outros, Fernando Amâncio Ferreira, “Manual de Recursos em Processo Civil”, 9ª ed., Almedina, pág. 156 e 157, Miguel Teixeira de Sousa, “Estudos Sobre o Novo Processo Civil”, Lex Lisboa 1997, pág. 395, Lebre de Freitas e Armindo Ribeiro Mendes, in “Código de Processo Civil Anotado”, Vol. 3º, T1, 2ª ed., Coimbra Editora, pág. 8, e Abrantes Geraldes, Recursos em Processo Civil, Novo Regime”, 3ª ed., Almedina, 2009, págs. 103 e 104. Segundo Elisabeth Fernandez, o princípio do dispositivo vigente no processo cognitivo da primeira instância tem igual aplicação no âmbito das instâncias impugnatórias, desde logo quanto ao seu objeto – o objeto originário do processo configura uma espécie de limite máximo para o funcionamento do efeito devolutivo do processo: “Quer isto significar que, de um modo geral, o tribunal de recurso não pode aceitar novos contributos das partes, no que concerne a pretensões, actos ou provas, pois o tribunal de recurso não leva a cabo o reexame da controvérsia, mas antes e tão só a reponderação da decisão recorrida. Na verdade, porque o objecto do recurso, segundo este modelo não é a questão controvertida, mas a decisão impugnada, é óbvio que a sindicância desta decisão só pode lograr-se mantendo incólumes os elementos fácticos e probatórios do processo, pelo que o ponto de partida dos poderes cognitivos do tribunal da relação não pode, por via de regra, extravasar aqueles que o tribunal a quo detinha quando julgou a causa e emitiu a decisão impugnada - “Princípio do Dispositivo e Objecto de Decisão de Recurso”, in “As Recentes Reformas na Acção Executiva e nos Recursos”, Coimbra Editora, 2010, págs. 334, 336 e 337. [8] Cfr., José Lebre de Freitas, “Introdução ao Processo Civil, Conceitos e Princípios Gerais”, 2ª ed., Coimbra Editora, págs. 47 e 48, nota 3, e “A Acção Declarativa Comum à Luz do Código Revisto”, 2ª ed., Coimbra Editora, pág. 38. _____________ V — Sumário elaborado nos termos do art. 663ª, nº7, do CPC. 1. No contrato de mediação imobiliária, a rescisão do contrato fora do prazo acordado e na ausência de invocação de uma justa causa, faz incorrer o cliente na obrigação de indemnizar pela rescisão antecipada do contrato. 2. Os concretos prejuízos decorrentes da rescisão antecipada têm de ser alegados pelo autor e formulado o correspondente pedido indemnizatório. Maria João Areias |