Acórdão do Tribunal da Relação do Porto | |||
Processo: |
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Nº Convencional: | JTRP000 | ||
Relator: | ARISTIDES RODRIGUES DE ALMEIDA | ||
Descritores: | RESPONSABILIDADE MÉDICA RESPONSABILIDADE CONTRATUAL CIRURGIA ESTÉTICA OBRIGAÇÃO DE MEIOS OBRIGAÇÃO DE RESULTADO LEGES ARTIS CONSENTIMENTO INFORMADO DEVER DE INFORMAÇÃO | ||
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Nº do Documento: | RP20210617452/14.1T8PVZ.P1 | ||
Data do Acordão: | 06/17/2021 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Texto Integral: | S | ||
Privacidade: | 1 | ||
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Meio Processual: | APELAÇÃO | ||
Decisão: | CONFIRMADA A DECISÃO | ||
Indicações Eventuais: | 3ª SECÇÃO | ||
Área Temática: | . | ||
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Sumário: | I - Ao celebrar um contrato de prestação de serviços de cirurgia estética, o médico vincula-se, em regra, a prestar ao paciente a informação necessária para ele decidir livremente, proteger os interesses e a saúde do paciente, e, na execução do acto médico, cumprir com zelo e rigor as legis artis, actuando com diligência, conhecimento científico, aptidão e perícia. II - Numa cirurgia estética de natureza voluptuária a produção de um resultado inestético, designadamente na parte mais visível e notória do corpo humano que é o rosto, é um resultado que consubstancia um incumprimento da obrigação do médico. III - Perante esse resultado indesejado, para excluir a ilicitude da sua conduta o médico necessita de demonstrar que ele foi fruto dos riscos associados à cirurgia, dos imponderáveis da mesma, dos factores incontroláveis que a cirurgia convoca, e que quanto aos factores que podia e devia controlar a sua actuação não merece qualquer censura. IV - Se o médico se propõe reduzir ou eliminar as cicatrizes inestéticas através de tratamento a laser, cuja necessidade de utilização estava acautelado no consentimento informado, e o paciente se recusa a realizar esse tratamento, o tribunal pode não atribuir qualquer indemnização pelas consequências danosas das cicatrizes. | ||
Reclamações: | |||
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Decisão Texto Integral: | Recurso de Apelação ECLI:PT:TRP:2021:452.14.1T8PVZ.P1 * Sumário:……………………………… ……………………………… ……………………………… Acordam os Juízes da 3.ª Secção do Tribunal da Relação do Porto: I. Relatório: B…, contribuinte fiscal n.º ………, residente em Matosinhos, instaurou acção judicial contra C…, S.A., pessoa colectiva n.º ………4, com sede no Porto, e contra D…, com domicilio profissional na sede da sociedade demandada, pedindo a condenação dos réus, solidariamente, a devolverem à autora os custos da intervenção cirúrgica e a pagarem a indemnização pelos danos morais de €100.000,00, acrescidos de juros legais desde a citação até integral pagamento. Para o efeito alegou que em 18.10.2012 nas instalações da 1ª ré foi submetida a uma cirurgia plástica realizada pelo 2º réu visando corrigir efeitos indesejados provocados por anterior cirurgia efectuada por este, também nas instalações da 1ª ré e por conta e em benefício também desta. Na primeira intervenção, realizada em Fevereiro de 2011, além de ter sido sujeita a uma cirúrgica plástica ao abdómen, a autora sujeitou-se ainda a uma cirurgia plástica ao rosto (uma blefaroplastia) para correcção da pálpebra direita e retirar as bolsas existentes nas pálpebras inferiores dos olhos. O resultado final da blefaroplastia foi insatisfatório para a autora, porquanto ficou nos seus olhos com um aspecto encovado, com as pálpebras quase a bater na abertura do olho, com sobra de pele nos cantos internos dos olhos, com os olhos arredondados quando sempre os teve amendoados, e com a pálpebra do olho direito do lado externo sem ir até baixo como a do esquerdo. Como a blefaroplastia alterou as feições da autora de forma não desejada, não obstante as promessas do 2º réu de que com o tempo tudo ficaria bem, cerca de um ano e meio após tal cirurgia a autora foi convencida a sujeitar-se a nova intervenção, a qual iria corrigir os efeitos indesejados provocados pela primeira e, assegurava o 2º réu, iria corrigir tudo. Tratar-se-ia de um lifting que consistiria, disse o 2º réu, “em se cortar desde o cimo da testa até às orelhas, para levantar a sobrancelhas de lado”. A autora disse de imediato que o seu problema não era “de lado”, mas sim entre os olhos e o nariz, parte do rosto onde as suas feições se tinham alterado com a primeira cirurgia, dizendo que então não estava interessada em lhe mexerem mais no rosto. O 2º réu serenou a autora e explicou-lhe que iria fazer no centro da testa um pequeno furo para levantar parte da sobrancelha, que estava descaída, ficando perfeita. Apesar dos seus receios iniciais, a autora ficou convencida e confiou no 2º réu. Porém, por manifesta incapacidade e incompetência do 2º réu, os resultados foram catastróficos para o rosto da autora que perdeu todos os seus traços de identidade. Acresce que a autora deu autorização para o 2º réu praticar actos cirúrgicos no seu rosto, desconhecendo que este não se encontra inscrito como médico-cirurgião plástico no colégio de especialidade da Ordem dos Médicos Portuguesa, mas sim como um mero cirurgião geral, não possuindo por isso legitimidade científica e deontológica para a realização de uma cirurgia destas. O 2º réu cortou a autora desde o cimo da testa até às orelhas de uma forma que revela uma total incapacidade e falta de conhecimentos técnicos de cirurgia plástica, pois a autora ficou com enormes cicatrizes em toda a dimensão do seu rosto nas referidas zonas. Os seus olhos foram também cortados, para ficarem mais pequenos, coisa que nunca a autora tinha. A autora ignora o que lhe fizeram no rosto, pois se o 2º réu lhe disse que ia fazer um lifting temporal a verdade é que o seu consentimento foi de um lifting cervico-facial. Após esta segunda cirurgia a autora ficou com os seus traços completamente alterados, deixando de se reconhecer, mas o 2º réu disse-lhe para não se angustiar “que dentro de meses todo o rosto voltava ao normal”, situação que nunca se verificou já que dois anos depois a autora tem o seu rosto cada vez mais desfigurado, face àquilo que sempre foi. Deixou de ter a expressão no seu olhar que sempre teve, deixou de ter olhos naturalmente amendoados e passou a ter olhos profundos, rasgados, mais pequenos, estando permanentemente com olheiras. Deixou de ter expressão facial de sorrir, pois perdeu qualquer músculo ou tecido para tal, e passou a ter uma expressão somente de riso, de boca aberta. Nas têmporas e parte da raiz do cabelo dessa zona passou a ter severas cicatrizes dos cortes que lhe infligiram, as quais deveriam ser muito mais discretas e naturalmente escondidas pela raiz dos cabelos, tendo agora um aspecto de zona acidentada. Posteriormente, as cicatrizes dos cantos dos olhos ficaram brancas, o olho direito ficou encurtado e o esquerdo ficou descaído. Depois dos cortes nos olhos toda a área em volta das pálpebras ficou escura e as sobrancelhas ficaram assimétricas e sem o seu arco natural. Os vincos entre as sobrancelhas no cimo do nariz passaram a ser constantes e não somente quando o rosto muda de expressão, o que dá um ar de “sempre zangada” à autora. Na boca, o lábio do lado esquerdo descaiu, o do lado direito entra nos dentes quando fala e os vincos da pele, nos cantos da boca, prolongam-se até ao fim do queixo que assumiu um aspecto quadrado, tudo feições e traços que a autora jamais teve. Tal situação criou uma tensão permanente na boca da autora que lhe força os maxilares, tendo sempre os dentes constantemente cerrados e em tensão. A intervenção cirúrgica realizada afectou a autora de tal forma, física e emocionalmente, que determinou que passasse a sofrer de acentuada perda de cabelo devido ao sofrimento psicológico em que se encontra. Como consequência da acção negligente e incompetente do réu, na segunda intervenção cirúrgica a autora perdeu toda a sua qualidade de vida e estabilidade emocional, estando em profunda depressão, encontrando-se, desde Fevereiro de 2014, sob vigilância médico-psiquiátrica no Hospital …. A autora pagou à 1ª ré 3.250,00€ pela cirurgia. A autora começou a sentir dores repetidas e reiteradas nas têmporas e cabeça dias depois da cirurgia, dores que actualmente são quotidianas, perdendo inclusive sensibilidade nas maçãs do rosto. Mais, deixou de se reconhecer, o que a fez cair numa depressão e crise emocional profundíssimas. Era uma mulher de enorme auto estima consigo própria, vistosa, alegre e comunicativa que tinha uma vida social com amigos e familiares intensa e uma feliz vida familiar e íntima com seu marido. Devido ao que o 2º réu fez no seu rosto deixou de conseguir olhar-se ao espelho e o seu sofrimento emocional é constante. E, com o passar do tempo, tudo se agrava, cada vez mais a pele do seu rosto fica em tensão, esticada, cada vez mais o seu rosto fica diferente daquilo que era. A autora está fortemente medicada para evitar cair numa espiral depressiva que pode levar a consequências imprevisíveis. Perdeu todo o gosto pela vida, deixou de sair com amigos, de receber pessoas em casa ou de frequentar a casa de familiares e amigos. Só consegue andar na rua com óculos escuros, pois não consegue emocionalmente mostrar-se tal como ficou. Desde que foi operada, e sobretudo no último ano, em que as consequências da intervenção se tornaram cada vez mais patentes e definitivas, a autora passa os seus dias em casa, sem ver e conviver com ninguém. A sua libido foi afectada devido à sua perda de auto estima, o que vem provocando um desgaste emocional intenso no casal. Os réus contestaram por excepção e por impugnação, defendendo a improcedência da acção. Por excepção arguiram a prescrição do direito da autora, uma vez que na responsabilidade extracontratual o prazo de prescrição é de três anos a contar da data em que o lesado teve conhecimento do direito que lhe compete, prazo já decorrido. Impugnando, alegam que o procedimento cirúrgico de mini-lifting temporal ocorrido em 18.10.2012 teve por único objectivo o levantamento das sobrancelhas e diminuição de rugas frontais superiores, conforme a autora pretendia. Essa cirurgia teve como objectivo o aperfeiçoamento da zona das pálpebras que se encontravam descaídas e não a correcção da blefaroplastia uma vez que em termos médicos é impossível corrigir uma blefaroplastia com um mini-lifting facial temporal. Acresce que a autora se submeteu a um mini-lifting facial temporal um ano e oito meses depois de ter sido submetida à blefaroplastia quando o período normal de estabilização e de obtenção de resultados definitivos desta é de aproximadamente seis meses. A autora mostrou-se totalmente satisfeita com os resultados obtidos e após a segunda intervenção não deu mais notícias nem sinais de insatisfação, apenas se tendo queixado, da última vez que esteve nas instalações da 1ª ré, de uma pequena cicatriz que não quis corrigir. Impugnam na sua generalidade as queixas da autora na petição inicial, nenhuma das quais está relacionada com as cirurgias realizadas (blefaroplastia e mini lifting temporal). A autora não foi convencida a sujeitar-se a nova cirurgia; antes da cirurgia foi realizada uma consulta em 08.02.2012, onde foram explicados os procedimentos cirúrgicos que se iriam realizar, as suas implicações e onde foi assinado pela autora o consentimento informado. Depois da cirurgia, a autora dirigiu-se às instalações da 1ª ré, em 13.02.2013, para uma consulta de diagnóstico e tratamento do envelhecimento geral e não se queixou da cirurgia, tendo-se mostrado satisfeita com os seus resultados. Só em 28.10.2013, um ano e oito meses após a última cirurgia, é que se queixou numa consulta de uma cicatriz do lado direito da face que era facilmente retocável com um simples laser, procedimento que aceitou mas que acabou por não fazer. Desde a primeira cirurgia passaram mais de quatro anos pelo que a autora teve necessariamente de envelhecer e é possível que tenham surgido olheiras, a prega no meio das sobrancelhas e rugas glabelares que têm tendência a reaparecer. Mais alegam que a autora recorreu no dia 02.02.2011 a uma consulta para melhorar o seu aspecto físico, por não gostar do aspecto “volumoso” do seu abdómen e cintura e por achar que tinha as pálpebras “descaídas”. Nessa conformidade, em 17.02.2011, foi submetida à blefaroplastia (retirada da pele em excesso das pálpebras), realizada segundo a técnica clássica, com extracção das bolsas de gordura. A evolução da autora foi normal, com boa cicatrização, tendo-se a autora mostrado satisfeita com os resultados obtidos. Em 08.10.2012 pretendeu melhorar o aspecto da região frontal (sobrancelha descaída, rugas frontais e rugas entre as sobrancelhas incipientes) foi-lhe pormenorizadamente explicado o procedimento de lifting do terço superior facial (abordagem temporal) para levantar a cauda das sobrancelhas e diminuir as rugas frontais, e explicados os riscos e complicações próprias desta cirurgia, tendo a autora compreendido e dado o seu consentimento informado para o efeito. O lifting temporal foi realizado em 18.10.2012, sem intercorrências. Na reavaliação realizada em 13.02.2013 constatou-se um bom resultado final do procedimento, não tendo a autora apresentado qualquer queixa mas sim um aumento na sua auto-estima, manifestando apenas algum descontentamento com uma cicatriz da região temporal própria do procedimento. A cicatrização foi boa, ficando só um pouco mais evidente à direita, situação que poderia ter sido facilmente tratada com laser, procedimento pelo qual a autora não demonstrou interesse. Tudo foi feito com total diligência e respeito absoluto pela legis artis, bons resultados e inexistência de cumprimento defeituoso. Nas cirurgias realizadas na paciente estiveram também presentes cirurgiões plásticos e cirurgião maxilo-facial, os quais nada de mal encontraram nos actos realizados com a sua colaboração. O 2º réu não omitiu nem enganou a autora quanto às suas capacidades técnicas e habilitações, possuindo conhecimentos e experiência que o habilitam para os procedimentos cirúrgicos realizados. Terminam pedindo a condenação da autora, como litigante de má fé, no pagamento da quantia de €50.000,00. Em sede de aperfeiçoamento da matéria alegada na petição, a autora alegou que contratou os serviços do 2º réu para atingir o resultado da correcção dos efeitos indesejados provocados pela anterior cirurgia, resultado que foi praticamente assegurado pelo réu à autora quando esta lhe demonstrou o seu pesar e desgosto com o resultado da cirurgia anterior, tendo sido esse comportamento do réu que a levou a contratar os seus serviços, tendo em vista esse resultado. Por outro lado, tudo foi tratado directamente com a 1ª ré e o seu staff, foi ela que lhe proporcionou a equipa médica que iria adjuvar o 2º réu nos seus serviços e intervenções e foi a ela que a autora pagou as intervenções. Após julgamento, foi proferida sentença, julgando a acção improcedente e absolvendo o réu do pedido. Do assim decidido, o réu interpôs recurso de apelação, terminando as respectivas alegações com as seguintes conclusões: 1. O Tribunal efectuou, com todo o devido respeito o dizemos, uma sofrível análise da prova existente no processo. 2. Por um lado, desmereceu por completo as perícias médico-legais existente nos autos, sem qualquer razão, motivo, ciência ou conhecimento próprio que o permitisse. 3. Por outro, sem qualquer motivo ou real fundamento que nos leve a se compreender o porquê, o Tribunal desmereceu o depoimento da autora de e testemunhas por si arroladas, sem fundamentar minimamente tal posição, como veremos. 4. Por fim, constam da sentença factos que simultaneamente são dados como provados e não provados, o que por si gera a sua ininteligibilidade e determina a sua nulidade, nos termos do Art. 615º nº 1 al. c). 5. A Motivação da Sentença é o momento no qual o Juiz exprime e expõe, perante todos, o porquê do seu convencimento quanto aos factos que dá como provados e onde assenta tal convencimento nas provas dos autos. 6. Sem nunca se esquecer que é o convencimento do Juiz, perante a prova dos autos, que determina os factos provados, e não a vontade subjectiva da parte que gostaria de ver determinados factos provados, a verdade é que tal convencimento do Juiz tem de ser cristalino, límpido e linear, de modo a afastar toda e qualquer sombra de erro ou má avaliação. 7. Deve ser um convencimento, assente em critérios que sejam compreensíveis, derivem da natureza das coisas, impregnados com razoabilidade, lógia sustentabilidade e exame crítico consequente, tudo à luz dos destinatários de tal decisão: o homem médio suportado pela ordem jurídica e exterior ao processo, com experiências de vida. 8. A motivação da sentença enferma, in casu, de dois pecados capitais ostensivos para o homem médio: - O desprezo total por uma perícia de avaliação de dano corporal em direito civil, que reconhece categoricamente a existência daquele, fica incapacidade, data de consolidação, deficit funcional quantum doloris e dano estético permanente, realidades que nem são afloradas ou referenciadas na sentença. - O desprezo, sem qualquer fundamento e real sustentação de parte da prova apresentada pela autora, sem nunca realmente o Tribunal colocar em causa a credibilidade do seu conteúdo declaratório, mas decompondo o relevo de tal depoimento: dando-o como bom para a prova de uns factos, mas não aceitando tal depoimento como bastante para a prova de outros, não obstante existir a mesma razão de ciência que não é colocada em causa. 9. Consta dos autos perícia de avaliação de dano corporal em direito civil, cujo relatório final consta da ref. Citius nº 17444423, a qual serviu somente para o tribunal a quo apenas sustentar a prova do nº 1.11 dos factos provados na sentença. E nada mais. 10. Porém do mesmo se extrai muito, muito mais. Nomeadamente que: . A data de consolidação médico-legal das lesões da autora referidas a 1.11 da sentença foi a 14-11-2014; . O período de défice funcional temporário total da autora foi de 2 dias, . O período de défice funcional temporário parcial da autora foi de 1365 dias, . O quantum doloris da autora foi de 4/7, . O dano estético permanente da autora é fixável em 3/7, de gravidade crescente tendo em conta a alteração da sua face e as cicatrizes que tem. . E que “os elementos disponíveis permitem admitir a existência de nexo de causalidade entre as cirurgias realizadas e o estado actual apresentado (status pós-cirurgia estética ao nível da face) tendendo a que se confirmam os critérios necessários para o seu estabelecimento; existe adequação entre a sede das cirurgias e a sede das alterações resultantes, existe continuidade sintomatologia e adequação temporal entre as cirurgias e as alterações resultantes, o tipo de alterações resultantes é adequado à etiologia de escrita, o tipo de cirurgia é causa adequada a produzir este tipo de alterações resultantes lesões e se exclui a existência de uma causa estranha.” 11. Nexo de causalidade esse reforçado em posterior esclarecimento a fls… dos autos, ref. Citius nº 18127702, do perito médico que subscreveu relatório, onde se escreve : “(…) do ponto de vista médico legal, com os elementos disponíveis, o estado actual apresentado ao nível da face resulta dos tratamentos de cirurgia plástica realizados, com a consequente alteração da face da examinada e consequente necessidade de avaliação de dano corporal resultante. É evidente a diferença pré e pós tratamentos em questão, amplamente documentada na fotodocumentação existente nos autos.” (destacado nosso). 12. Estes elementos, perícia e esclarecimento à mesma, foram, sem qualquer fundamento, totalmente obliterados e silenciados pelo Tribunal, pois o tribunal não perdeu uma linha a refutar tal perícia de avaliação de dano corporal em direito civil e posterior esclarecimento. 13. Esta postura ofende todos os critérios legais (Art. 607º nº 3, 4 e 5), de raciocínio logico natural e ofende a serena jurisprudência de que “O juízo técnico e científico inerente à prova pericial presume-se subtraído à livre apreciação do julgador; o julgador está amarrado ao juízo pericial, sendo que sempre que dele divergir deve fundamentar-se esse afastamento, exigindo-se um acrescido dever de fundamentação.” Ac. Trib. Rel. Lisboa proc. 949/05.4TBOVR-A.L1-8, proferido a11-03-2010, in DGSI.pt, entre inúmeros outros arestos. 14. Consequentemente muito mal andou o tribunal a quo devendo, outrossim, a perícia de avaliação de dano corporal em direito civil constante do processo e posterior esclarecimento serem devidamente valorados e os seus elementos e conclusões integradas nos factos provados, o que infra se concretizará. 15. Quanto à prova testemunhal a sentença em crise comete um erro fatal que não se entende: o dar relevo e credibilidade parcial aos depoimentos, compartimentando-os face aquilo que a testemunha depõe, dando relevo a parte do depoimento e não dando relevo a outra parte, sem qualquer justificação para tal. 16. Ora um depoimento não pode ter uma força parcial, servir para a prova de um facto que interessa e já não ser vir para a prova de outro facto, quando ambos os factos estão inseridos numa logica coerente de raciocino, de acontecimentos e ao abrigo de uma razão de ciência una. 17. Um depoimento ou é credível ou não é credível, sendo neste caso irrelevante para a prova nos autos. 18. Um depoimento é irrelevante quando, voluntaria ou involuntariamente, consciente ou inconsciente, não corresponde à verdade das coisas, tal como esta se pode extrair de outras provas dos autos. 19. Esta é a base, única e simples, para não se aceitar um depoimento: o mesmo não dizer a verdade. 20. E falta de verdade pode derivar de uma série de factores, nem todos eles, necessariamente, malignos: desde logo a testemunha mentir ou omitir voluntária e conscientemente, mas também ser o seu conhecimento só parcial dos factos, o não ter razão de ciência que lhe permita afirmar o que diz (eventualmente convencido que a tem), o ter um conhecimento indirecto nos termos em que o mesmo é proibido por lei, o facto de não saber apesar de convencido que sabe, o contrariar presunções legais ou judiciais, etc. 21. Seja como for, o tribunal na motivação da sentença deverá de forma clara referir porque é que o depoimento da testemunha X não foi relevado para a prova, seja porque aquela não disse a verdade, ou porque deliberadamente não o quis dizer, ou porque foi induzida a dizer tal, ou porque não a conhecia e pensava que sim, ou por qualquer razão atendível, como falta de discernimento, razão de ciência ou outra que conduza a que de tal depoimento não se extraia a verdade, ou concluindo que tal depoimento nada contem de relevante para os autos. 22. Para se concluir isso, pode e deve socorrer o tribunal do circunstancialismo do depoimento da testemunha em si: estar nervosa, pouco segura, agressiva, com memória selectiva, com uma díspar postura perante o advogado que o arrolou e a contra parte, com lapsos de memória, sem contacto visual, sem espontaneidade nas respostas, com respostas pensadas e sem pormenores ou conhecimento de circunstâncias que deveria conhecer face ao que responde, etc. 23. Mais revelando o conteúdo do seu depoimento e razão de ciência: se depõe sobre factos de conhecimento próprio, se factos presenciais, se indirectos, se de memória visual, se de memória auditiva, se foi interveniente num diálogo, etc. 24. Tudo elementos que devem e têm de revelar para se considerara um depoimento credível ou não. 25. In cau em momento algum da sentença o Tribunal refere que as testemunha da autora não disseram a verdade, em momento algum ataca a sua razão de ciência ou o circunstancialismo fáctico que as mesmas descrevem. Pois que as testemunhas em causa estavam a dizer a verdade. 26. Porém, porque o tribunal não se quis convencer dessa verdade plena, adjectivou os depoimentos com circunstancialismos vagos e conclusivos. 27. No caso do depoimento de parte da autora, tomado antes de toda e qualquer prova dos autos, este foi rotulado (ver pág. 34 da sentença último paragrafo) de “fortemente emotivo”, sem a sentença referir em que é que tal emoção tolhe a veracidade do mesmo; “parcial”, sem fundamentar donde retira tal parcialidade pois do resumo que a sentença faz do depoimento da autora (págs. 33 a 35 da sentença) não se indicia minimamente tal parcialidade, sendo os réus tratados com todo o respeito, tendo inclusive a autora com total lisura e ausência de parcialidade; “subjectivo”, também nesta adjectivação não se alcança como pode tal por em causa a credibilidade do depoimento da autora, nem se entende donde a mesma se possa inferir, pois quem conta a sua história e narra o que lhe aconteceu, está sempre a falar do seu ponto de vista. 28. Não obstante o depoimento da autora “serviu” para o tribunal dar como provado vinte e cinco (25) dos factos provados na sentença, incluindo o fim acordado /contratado para a intervenção dos réus, facto nº 1.8 e 1.42 dos factos provados. 29. Porém foi desprezado relativamente aqueloutros factos que são compagináveis com o resultado das perícias médico-legal ao dano e psiquiátricas, onde se revela o sofrimento e lesões físicas tal como a autora referiu, derivados daquele incumprimento contratual (referido nº 1.8 e 1.42. factos provados). 30. Subjectividade, em tal depoimento, não há nenhuma. Pelo contrário, há uma penosa objectividade na forma como a autora conta o que se passou consigo, sem autocomiseração ou inimizade pelos réus, mas com profundo desespero e tristeza. 31. Contando desde o momento em que desejou ser intervencionada no seu rosto pelos réus, referindo o momento em que os réus se comprometeram com o resultado desejado (facto provado nº 1.8 e 1.42) e ao momento em que tal resultado, ostensivamente, não foi atingido. 32. Pelo que o seu depoimento é adequado, verdadeiro, honesto e circunstancializado, com razão de ciência, pelo que deve ser valorado plenamente. 33. A testemunha E…, filha da autora, por seu turno, viu o seu depoimento, adjectivado de “sereno”, mas a “transparecer alguma subjectividade”, ser validado de forma significativa pelo tribunal para a prova de vários factos, vinte e um (21) dos factos dados com provados na sentença tiveram este depoimento como fonte. 34. Mas também aqui, sem qualquer motivo para tal ou contra prova no processo, assistimos a uma validade parcial do seu depoimento, dando o tribunal um relevo cirúrgico (não estivéssemos nos a falar de responsabilidade médica…) somente a certos pontos do mesmo. 35. Já outros momentos essenciais do depoimento da testemunha, onde a mesma revelou uma razão de ciência inabalável foram completamente desprezados constando dos factos não provados, como infra referiremos. 36. É inaceitável e muito pouco compreensível um depoimento ser cirurgicamente válido para a prova de uns factos e não o ser para a prova de outros, apesar de continuar a existir uma poderosa razão de ciência e uma serenidade reconhecida no mesmo. 37. Em suma, a forma como a tribunal afastou a credibilidade dos depoimentos supra referidos é inaceitável, porque assente em conceitos circunstanciais e conclusões genéricas, sem nunca referir onde, como e porquê se revelaram tais emoções, passividade ou subjectividade e em que medida tal coloca em causa a veracidade dos depoimentos ou a sua razão de ciência. 38. A livre convicção não pode confundir-se com a íntima convicção ou desejo pessoal do julgador (neste sentido Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra, proc. nº 3/07.4GAVGS.C2, de 01-10-2008, in dgsi.pt) 39. A livre convicção, por imposição legal, deve extrair-se das provas dos autos assente num convencimento lógico e motivado, avaliadas as provas com sentido de responsabilidade e bom senso e valoradas segundo parâmetros da lógica do homem médio e as regras da experiência (idem). O que, in casu, não foi feito na sentença em crise. 40. Assente que está a plena capacidade testemunhal e o total relevo dos depoimentos da autora e testemunha e E…, vejamos quais os factos concretos que devem se dados como provados e não provados: 41. O Tribunal a quo verteu os seus factos provados nas páginas 8 a 22 da sentença, nomeadamente, entre os números 1.1 e 1.68. 42. Considera-se correctamente provados os pontos:1.1, 1.2, 1.3, 1.4, 1.5, 1.6, 1.7, 1.8, 1.9, 1.10, 1.11, 1.12, 1.13, 1.14, 1.15, 1.16, 1.17, 1.18, 1.19, 1.20, 1.21, 1.22, 1.23, 1.24, 1.25, 1.26, 1.28, 1.29, 1.30, 1.31, 1.32, 1.33, 1.34, 1.35, 1.36, 1.37, 1.38, 1.39, 1.40, 1.42, 1.43, 1.44, 1.45 e 1.47 a 1.68. 43. Considera-se incorrectamente provados os pontos: 1.27, 1.41 e 1.46 os quais deverão ser dados como não provados pelas seguintes razões (o ponto 1.46 será analisado mais abaixo): 44. O nº 1.27 dos factos provados na sentença, “O objectivo referido em 1.24. foi alcançado” é dado como provado sem qualquer sustentação e, de forma categórica, deve ser dado como não provado. 45. Desse facto nº 1.27 extrai-se que a intervenção cirúrgica referida a 1.24 (e 1.1 para onde o nº 1.24 remete) teve um resultado conforme o que a autora pretendia. Tal não é verdade. 46. O referido mini-lifting temporal (intervenção referida no nº 1.27) teve por base o acordado e contratado pelas partes a 10/10/2012, na sequência do provado em 1.8. e 1.42. onde se escreve «Em 08.10.2012 a autora recorre novamente aos serviços dos réus, pretendendo melhorar o aspecto da região frontal (sobrancelha descaída), sendo que lhe foi explicado o procedimento de lifting do terço superior facial (abordagem temporal) para levantar a cauda das sobrancelhas». 47. Ora é um absurdo jurídico dizer que tal intervenção, que visou levantar as sobrancelhas da autora, teve o seu objectivo alcançado quando existe uma perícia de avaliação de dano corporal em direito civil e cabal esclarecimento pericial, que, na sequência de tal intervenção cirúrgica, atribui um dano estético permanente à autora de 3/7, dano esse provocado pela dita intervenção. 48. Os factos, tal como estão provados, se compaginados com a perícia de avaliação de dano corporal em direito civil forçar-nos-iam a concluir o total despropósito: segundo a sentença em crise a autora desejou o dano estético que tem, contratando os réus para lhe causarem o mesmo! 49. Acresce que o resultado/objectivo a atingir não é somente subir a sobrancelha da autora, é fazê-lo sem destruir a sua face com cicatrizes, como naturalmente se depreende para todos os efeitos. 50. Logo resultado/objectivo é sim aquele que a autora desejou atingir (subir a sua sobrancelha) e que os réus assumiram como sendo o fim da intervenção a levar a cabo, com adequadas consequências a nível de cicatrizes e cortes, tal como está provado a 1.8 e 1.42 da sentença. 51. E esse objectivo jamais foi atingido pois o desagrado da autora foi constante como aliás consta dos factos provados nomeadamente os pontos 1.16, 1.17, 1.19, factos que chocam frontalmente com o facto aqui em questão, o 1.27. 52. Concluindo não pode, de todo, o ponto 1.27 da sentença ser dado como provado quando, na sequência da intervenção cirúrgica assumida pelas partes em 1.8 e 1.42 e concretizada em 1.1, a autora fica com dano estético permanente, como resulta da perícia de avaliação de dano corporal em direito civil, além de constantemente manifestar o seu desagrado pelo resultado. 53. A existência deste dano estético permanente plasmado na perícia médico-legal a que a autora se submeteu, reforçado pelos esclarecimentos prestados pelo perito após solicitação nesse sentido dos réus, impõe uma presunção judicial, inabalável (art. 349º e 351º ambos do C.C.), de que o objectivo pretendido pela autora não foi atingido, tudo reforçado, reitera-se pela manifestação por parte desta do seu total desagrado quanto ao resultado final, factos provados na sentença nº 1.16, 1.17, 1.19. 54. Deve assim ser o nº 1.27 dos factos provados na sentença, “O objectivo referido em 1.24. foi alcançado” ser dado como não provado para todos os devidos efeitos legais. 55. O mesmo se diga para o facto vertido no nº 1.41. dos factos provados da sentença, concretamente que “A evolução da autora foi satisfatória”, o qual deve ser dado como não provado. 56. Desde logo tal facto está mal redigido, pois pergunta-se: a evolução da autora foi satisfatória, para quem? 57. Para ela não foi, seguramente, atento o supra exposto e os factos dados como provados a 1.16, 1.17 e 1.19. 58. O facto nº 1.41, na sua parcimónia, é destruído e entra em choque com outros factos provados nomeadamente os factos 1.16, 1.17 e 1.19, tornando obscura e ininteligível a sentença neste aspecto, nos termos do art. 615º nº 1 al. c) do C.P.C. gerando a sua nulidade, o que se alega para todos os devidos efeitos legais. 59. Aqui se reiterando o supra referido, quanto a existência de dano estético permanente fixado na perícia médico-legal o que conjugado com os factos dados como provados a 1.16, 1.17 e 1.19, revela que tal evolução foi tudo menos satisfatória, pois ninguém evolui para um dano permanente. 60. Deve assim ser o nº 1.41 dos factos provados da sentença, concretamente que “A evolução da autora foi satisfatória”, ser dado como não provado para todos os devidos efeitos legais. 61. Considera-se incorrectamente não provados os pontos: 2.21, 2.37, 2.40, 2.41, e 2.69, os quais deverão ser dados como provados, com os seguintes fundamentos: 62. Considera-se incorrectamente não provados o nº 2.21. da sentença: “As cicatrizes identificadas em 1.11., tratando-se duma cirurgia plástica, deveriam ser muito mais discretas e naturalmente escondidas pela raiz dos cabelos.” 63. A prova deste facto assenta numa imperativa presunção legal nos termos do art. 349º e 351º do C. Civil, atendendo a existência de dano estético, dano esse sempre denunciado pela autora junto dos réus como se extrai dos nº 1.16, 1.17 e 1.19 dos factos provados na sentença. 64. Se é óbvio que qualquer cirurgia causa cicatrizes, também não deixa de ser óbvio que poucas causam um dano estético permanente de 3/7, e ainda menos quando se trata de uma cirurgia estética que, por definição, não deve deixar dano estético, daí a autora se ter queixado das mesmas ao 2º réu como é referido a 1.17 dos factos provados, pois são cicatrizes que não devia ter e jamais esperou ter. 65. Ninguém faz uma operação estética para ficar com dano estético permanente de 3/7, e tal dano estético existe porque as cicatrizes da autora derivaram de uma intervenção cirúrgica praticada pelo 2º réu que não conseguiu aquilo que as intervenções estéticas conseguem: ter cortes finos, adequadamente feitos, a ser escondidos pelas zonas naturais do corpo intervencionado (cabelos in casu), não causando por si só qualquer dano estético. 66. A existência deste dano estético plasmado nos autos leva a ter de se dar como provado que “As cicatrizes identificadas em 1.11., tratando-se duma cirurgia plástica, deveriam ser muito mais discretas e naturalmente escondidas pela raiz dos cabelos” facto na sentença erroneamente dado como não provado. 67. Também deve ser dado como provado o conteúdo do nº 2.37 dos factos não provados: “A autora era uma mulher de enorme auto estima consigo própria, era uma mulher vistosa, alegre, comunicativa que tinha uma vida social com amigos e familiares intensa e uma feliz e satisfatória vida familiar e íntima com seu marido”. 68. Assim como o nº 2.40. dos factos não provados: “Devido ao estado em que seu rosto ficou a autora perdeu todo o gosto pela vida, deixou de sair com amigos, deixou de receber pessoas em casa ou de frequentar a casa de familiares e amigos fora.” 69. E o nº 2.41. dos factos não provados: “A autora só consegue andar na rua com óculos escuros, mesmo durante o inverno e em dias de chuva, pois não consegue emocionalmente mostrar-se tal como agora ficou.” 70. Tais factos, diga-se, não são mais do que uma explicitação e concretização dos factos dados como provados a 1.19, 1.21, e sobretudo, 1.22 e 1.23, os quais tiveram por base para o convencimento do tribunal os seguintes depoimentos: da própria autora B…, da testemunha F…, da testemunha G…, da testemunha E…, da testemunha H…, como consta da motivação da sentença a fls. 34, 36, 37, 40 e 41, respectivamente para cada um dos citados depoimentos/testemunhos. 71. A realidade é que tais depoimentos disseram muito mais do que o tribunal a quo refere, e se os valorou para a prova dos factos dados como provados, deve valorar para os supra referidos factos dados como não provados, pois estes não são mais que uma explicitação daqueles, sempre dentro do mesmo circunstancialismo e razão de ciência, como se passa a expor: 72. Declarações de parte da autora B…, constantes da documentação áudio da audiência de julgamento, nas seguintes passagens: [nota do relator: segue transcrição de passagem do depoimento] 73. Depoimento da testemunha G…, constante da documentação áudio da audiência de julgamento, nas seguintes passagens: [nota do relator: segue transcrição de passagem do depoimento] 74. Depoimento da testemunha E…, constante da documentação áudio da audiência de julgamento, nas seguintes passagens: [nota do relator: segue transcrição de passagem do depoimento] 76. Estes depoimentos, cuja razão de ciência dos mesmos não foi posta em causa pois derivaram de um conhecimento directo, nomeadamente situações de convívio pessoal e constante com a autora sustentam e comprovamos factos que devem ser dados como provados e supra referidos, 77. Sendo, ademais, perfeitamente compaginados com o período de défice funcional temporário parcial de 1365 dias de que a autora padeceu, período esse referido e concretizado nas duas peritagens médicas (de psiquiatria e ao dano). 78. Devem ser dados como provados os seguintes factos, os quais se suportam na perícia de avaliação de dano corporal em direito civil, subscrita pelo Dr. I… com a ref. Citius (…) documento não impugnado por nenhuma das partes: “A data de consolidação médico legal das lesões da autora supra referidas foi a 14-11-2014. “ “O período de défice funcional temporário total da autora foi de 2 dias”. “O período de défice funcional temporário parcial da autora foi de 1365 dias”. “O quantum doloris da autora, foi de 4/7.” “O dano estético permanente da autora é fixável em3/7, de gravidade crescente tendo em conta a alteração da sua face e as cicatrizes que tem”. “1. Os elementos disponíveis permitem admitir a existência de nexo de causalidade entre as cirurgias realizadas e o estado actual apresentado (status pós-cirurgia estética ao nível da face) tendendo a que se confirmam os critérios necessários para o seu estabelecimento; existe adequação entre a sede das cirurgias e a sede das alterações resultantes, existe continuidade sintomatologia e adequação temporal entre as cirurgias e as alterações resultantes, o tipo de alterações resultantes é adequado á etiologia descrita, o tipo de cirurgia é causa adequada a produzir este tipo de alterações resultantes lesões e se exclui a existência de uma causa estranha”. “2. A data da consolidação médico-legal das lesões é fixável em 14-11-2014, tendo em conta os seguintes aspectos: o tipo de lesões resultantes e o tipo de tratamento efectuados e período de tempo apontado em perícia de psiquiatria para a resolução do quadro de agravamento temporário de patologia desse foro.” 79. Deve ser [feito] constar dos factos provados o esclarecimento que o Sr. Perito Médico Dr. I… dá à sua peritagem supra referida, a pedido dos próprios réus, datado de 5 de Março de 2018, (ref. Citius …) nomeadamente: “(…) do ponto de vista médico legal, com os elementos disponíveis, o estado actual apresentado ao nível da face resulta dos tratamentos de cirurgia plástica realizados, com a consequente alteração da face da examinada e consequente necessidade de avaliação de dano corporal resultante. É evidente a diferença pré e pós tratamentos em questão, amplamente documentada na fotodocumentação existente nos autos.” 80. No relatório em perícia de psiquiatria, datado de 27-09-2017 consta a seguinte conclusão que deve ser dada como provada: “É de admitir um agravamento temporário do estado prévio o qual foi adequadamente tratado do ponto de vista psiquiátrico, de Abril a Novembro de 2014 findo qual é de considerar que retomou um estado clínico sobreponível ao que apresentava anteriormente à situação em apreço. Da análise da entrevista clínica, no exame do estado mental e da consulta de registos clínicos constantes de peças processuais não é observável qualquer alteração susceptível de se constituir como dano psíquico permanente, decorrente do evento em apreço.” 81.Deve ainda ser aditado o seguinte facto novo: “Os resultados na autora da cirurgia referida em 1.1 estão totalmente desconformes ao contratualizado e acordado entre ambos, não tendo os réus cumprido com o que acordaram com a autora e com o resultado que se comprometeram a ter”. 82. Este facto está sustentado em vários meios de prova existentes nos autos, desde logo no desagrado manifestado pela autora ao 2º réu sobre as suas cicatrizes e alterações ao seu rosto constante do nº 1.17 dos factos provados. 83. Revela-se ainda nas fotografias juntas na P.I. como doc. 9 a 15, que não podem deixar margem para duvidas das alterações sofridas no rosto da autora após a segunda operação a que foi sujeita, alterações essas jamais desejadas pela mesma e jamais incluídas no resultado que os réus (simples levantar sobrancelhas) assumiram perante a autora. 84. O que, aliás, é exemplarmente lembrado e categoricamente referido pelo Exmo. Sr. Perito Médico Dr. I… no esclarecimento que dá à sua peritagem final, a pedido dos próprios réus, datado de 5 de Março de 2018 escreve: “(…) do ponto de vista médico legal, com os elementos disponíveis, o estado actual apresentado ao nível da face resulta dos tratamentos de cirurgia plástica realizados, com a consequente alteração da face da examinada e consequente necessidade de avaliação de dano corporal resultante. É evidente a diferença pré e pós tratamentos em questão, amplamente documentada na fotodocumentação existente nos autos.” 85. Devem ser considerado como provado o seguinte facto: “O 2º réu nunca informou a autora que era um cirurgião geral sem especialidade em cirurgia plástica.” 86. A autora nas suas declarações foi clara e verdadeira ao afirmar que nunca foi informada de que o 2º réu não era cirurgião plástico. 87. Vejam-se as declarações de parte da autora B…, constantes da documentação áudio da audiência de julgamento, nas seguintes passagens: [nota do relator: segue transcrição de passagem do depoimento]. 88. Sendo que da prova que os réus levaram aos autos nenhuma testemunha pôde dizer que o 2º réu informou a autora que não tinha especialidade de medicina plástica, e que era somente um cirurgião geral. Nem o 2º réu referiu nas suas declarações ter dito isso à autora. 89. Ou seja, tal foi omitido consciente e deliberadamente pelo 2º réu sempre que falou com a autora, independentemente de alegadamente existir um papel, afixado na clínica da 1ª ré, da qual consta o seu corpo clínico e as habilitações dos seus médicos. 90. Verifica-se pelos registos clínicos da autora, junto da 1ª Ré, que o 2º réu de facto, não é cirurgião plástico de especialidade nas intervenções que realizou na autora, sendo tal qualificação a de outro médico que segundo tais registos clínicos o acompanhou nessas intervenções. 91. Igualmente deve ser considerado como provado que: “A autora somente aceitou ser intervencionada pelo 2º réu porque estava convencida de que aquele era cirurgião plástico.” 92. A prova deste facto impõe-se por meio de uma natural presunção judicial nos termos do Art. 351º do C. Civil, como se passa a expor: 93. Se alguém vai a uma clínica de medicina estética como a 1ª Ré, para ser intervencionada no seu corpo, espera ser atendida por cirurgiões especializados em medicina estética, plástica ou reconstrutiva, nunca por um cirurgião geral, caso nunca lhe digam as especialidades dos médicos em causa. 94. Quem vai a uma clínica como a 1ª Ré não vai perguntar se os médicos são cirurgiões plásticos. Assume isso, sem mais. 95. Caso os médicos não o sejam devem, em boa fé, explicitar isso aos utentes, in casu à autora, única forma de esta ter a sua vontade plenamente consciente e lealmente construída, sem qualquer erro vício. 96. Esse convencimento natural da autora é reforçado pela sua ignorância derivada do silêncio do médico. 97. É uma natural e imperativa conclusão que quem vai a uma clínica médica de medicina estética o faz porque está convencida que vai ser atendida por alguém da especialidade. 98. E somente aceitará ser intervencionada porque tem esse justo convencimento: de que o médico que irá tocar no seu corpo tem a adequada especialidade em medicina plástica/estética, independentemente da experiência que tal clínico possa na prática ter. 99. O que nos leva a concluir pela absoluta legalidade e pertencia da prova do facto supra referido devendo eliminar-se os nº 2.10, 2.14 e 2.31 do elenco dos Factos Não Provados da Sentença. 100. Deve ser incluído também o seguinte facto novo: “O 2º réu não soube concretizar a técnica cirúrgica adequada e a que se propôs, na intervenção que fez no rosto da autora e para o fim que assegurou atingir, causando as lesões supra referidas”. 101. A prova deste facto assente numa imperativa presunção legal nos termos do Art. 349º e 351º do C. Civil. 102. Explicamos: resulta claro que, procedimentalmente, o 2º réu se propôs realizar uma cirurgia eventualmente adequada ao fim que se propôs com a autora: um Lifting. 103. Tal resulta inclusive de parecer técnico junto aos autos do INMLCF que, porém, nada mais foi que uma análise ao processo clínico em si, sem qualquer visualização ou avaliação da autora, como foi referido pelo seu relator, Dr. J… nos esclarecimentos prestados ao tribunal. 104. Porém uma coisa é, tecnicamente, as intenções serem boas. Outra coisa é a concretização dessa técnica, a capacidade ou incapacidade para conseguir um resultado quem se propõe e que a técnica poderá levar. 105. E aqui, na concretização do resultado via a técnica a que se propôs, o 2º réu falhou total e redondamente. 106. Como refere o relatório de perícia de avaliação do dano de 4 de Janeiro de 2018, a autora tem um dano estético permanente de3/7, fruto das cicatrizes que tem na sua cara. 107. A autora faz uma cirurgia estética e saiu de lá com um dano estético permanente, do qual se queixou de imediato ao 2º réu. 108. Ficar-se com um dano estético depois de se ter sido intervencionado em medicina estética, revela a total incompetência e incapacidade do médico que opera. 109. Também deve ser considerado como provado o seguinte facto: “As cicatrizes e alterações do rosto com que a autora ficou após a cirurgia referida em 1.1 nunca deveriam ter existido como consequência de uma cirurgia plástica e só existem porque o 2º réu não teve a arte, o engenho e a capacidade técnica, para as evitar, por inépcia própria, não obstante o fim a que se havia proposto”. 110. A prova deste facto assente também numa imperativa presunção legal nos termos do Art. 349º e 351º do C. Civil. 111. Se alguém faz uma operação estética e fica com dano estético permanente de 3/7, justamente pelas cicatrizes advenientes da cirurgia realizada, é ostensivo que quem realizou tal operação não teve a arte e o engenho para evitar tal dano. 112. E não se pode considerar que o médico que interveio soube utilizar a técnica e a legis artis correcta. Não se pode. 113. Teoricamente o 2º réu até poderia saber o que tinha de fazer e conhecer a legis artis… mas na prática não o soube concretizar do todo, pois se soubesse não tinha a autora reclamado do seu trabalho e das cicatrizes com que ficou e não existiria um dano estético permanente de 3/7 no rosto da autora. 114. O médico que toca num rosto com pormenores que se propõe corrigir (subir sobrancelhas) e o resultado dessa intervenção é um dano estético de 3/7 “de gravidade crescente tendo em conta (…) a alteração facial e as cicatrizes” (sic Relatório Pericial de 4 de Janeiro de2018) é um médico que de monstra uma total incapacidade culposa no exercício de uma função a que se propôs e de atingir o fim contratado com a sua cliente, a autora in casu. 115. Com a prova deste facto deve ser dado como não provado o facto constante do nº 1.46 dos factos provados. 116. Com a prova destes últimos dois novos factos devem ser eliminados do elenco dos factos não provados constantes da sentença os seguintes nº 2.9, 2.12, 2.17, 2.28, 2.30, 2.45 e 2.69. 117. Quanto ao direito a aplicar, os presentes autos, e para o que o âmbito deste recurso interessa, têm o seguinte objecto do litígio, na sequência do despacho saneados de fls. (…). Saber se em consequência do incumprimento ou cumprimento defeituoso do contrato celebrado entre a autora e os réus, devem os réus ser condenados nos pagamentos peticionados. 118. Como sustenta o acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 17.12.2009, processo número 544/09.9YFLSB, disponível in www.dgsi.pt, «1 - Em cirurgia estética se a obrigação contratual do médico pode não ser uma obrigação de resultado, com o médico a comprometer-se “em absoluto” com a melhoria estética desejada, prometida e acordada, é seguramente uma obrigação de quase resultado porque é uma obrigação em que “só o resultado vale a pena”. 2 - Aqui, em cirurgia estética, a ausência de resultado ou um resultado inteiramente desajustado são a evidência de um incumprimento ou de um cumprimento defeituoso da prestação por parte do médico devedor. 3 - Ao médico compete, por isso, em termos de responsabilidade contratual, o ónus da prova de que o resultado não cumprido ou cumprido defeituosamente não procede de culpa sua, tal como o impõe o nº1 do art.799º do C.Civil.». 119. Nestes termos se contempla que a inobservância da obrigação que impende sobre o médico de obter o resultado estético pedido pela cliente e assegurado por aquele, obrigação emergente do contrato de prestação de serviços médicos, importa responsabilidade contratual. 120. Tal como na responsabilidade extracontratual ou delitual, na responsabilidade contratual são quatro os pressupostos: o facto ilícito (constituído pela omissão do resultado exigível), a culpa (que aqui se presume – art.799º nº 1 C.C.), o dano e o nexo de causalidade entre o facto e o dano. 121. O artigo 563.º do Código Civil consagrou a doutrina da causalidade adequada, na formulação negativa nos termos da qual a inadequação de uma dada causa para um resultado deriva da sua total indiferença para a produção dele, que, por isso mesmo, só ocorreu por circunstâncias excepcionais ou extraordinárias. 122. De acordo com essa doutrina, o facto gerador do dano só pode deixar de ser considerado sua causa adequada se se mostrar inidóneo para o provocar ou se apenas o tiver provocado por intercessão de circunstâncias anormais, anómalas ou imprevisíveis. 123. No caso dos autos estão reunidos todos os pressupostos da obrigação de indemnizar, incluindo o dano e o nexo de causalidade entre o facto e o dano. 124. Desde logo estão provados o contrato e o fim do mesmo, factos provados nº 1.8 e 1.42 da sentença, factos nº 1.9 e 1.52 da recompilação e renumeração supra referida., nos termos do Art. 1154º do C. Civil 125. Por sua vez os danos estão provados nos factos provados a 1.11, 1.15, 1.16, 1.18, 1.19,1.21, 1.22 e 1.23 dos factos provados na sentença e nos números 1.13, 1.14, 1.15 (primeira parte), 1.16, 1.19, 1.24, 1.25, 1.27, 1.28, 1.31, 1.32, 1.33, 1.34 e 1.35 da recompilação e renumeração supra referida. 126. Com o nexo de causalidade entre a conduta dos réus, máxime 2º réu e os danos sofridos pela autora a se extrair directamente do relatório pericial e esclarecimento ao mesmo dado como provado no nº 1.15 (segunda parte) e 1.17 da recompilação e renumeração supra referida. 127. Igualmente é patente o facto ilícito (constituído pela omissão do resultado exigível), o qual já se extraia dos factos provados na sentença em virtude dos factos nº 1.11, 1.15, 1.6, 1.17, 1.19, estando ainda mais reforçado nos factos a dar como provados e referidos na recompilação renumeração supra sob os nº 1.13, 1.15 (dano estético permanente de 3/7), 1.18, 1.19, 1.20. 128. Deste modo se conclui que foi a realização da cirurgia de 18/11/2012, que causou aqueles danos na autora por culpa directa do 2º réu ao serviço da 1ª Ré que não teve a arte, o engenho e a capacidade técnica, para os evitar, por inépcia própria, não obstante o fim a que se havia proposto, não tendo os réus conseguido provar esta ausência de culpa nos termos do Art. 799º nº 1 e Art. 342º nº 2 ambos do C. Civil. 129. Recuperando o douto aresto supra reproduzido: «Ao médico não basta, para cumprir esse ónus, a prova de que o tipo de intervenção efectuada importa um determinado risco (eventualmente aceite pelo paciente); é necessário fazer a prova de que a sua conduta profissional, o seu rigoroso cumprimento das “leges artis”, foi de molde a poder colocar-se o concreto resultado dentro da margem de risco considerada e não dentro da percentagem em que normalmente a intervenção teria êxito». 130. Atenta a prova produzida em julgamento, claro é, que os réus não lograram provar o referido, como supra pugnado, nem o cumprimento adequado do contratado com a autora, nos termos do art. 762º e 1154º ambos do C. Civil. 131. Por tudo o exposto, deverá a autora ser ressarcida pelo extensos danos sofridos, pois como sustenta o referido acórdão, «só o resultado valeria a pena», uma vez que qualquer pessoa se submete a uma cirurgia plástica busca da melhoria, e nunca o agravamento! 132. Em jeito de conclusão terminamos com mais palavras adequadas do referido aresto que se enquadra perfeitamente no caso dos autos: «O que se pode dizer com segurança, in casu, é que a obrigação ou não foi cumprida ou foi cumprida defeituosamente. 133. Porque não estamos, na situação concreta em que nos movimentamos, perante alguém que estando doente anseia ser curado (sendo que, não se sujeitando à intervenção do médico, continuará doente). O que estamos é perante alguém, uma mulher, que – não se encontrando perante qualquer doença em movimento, a que pretenda por termo ou atenuar – anseia apenas por novas mamas (no caso concreto, a sua face) que satisfaçam mais a preceito a sua exigência estética. 134. Se esta pode não ser uma obrigação de resultado, com o médico a comprometer-se em absoluto com a melhoria estética desejada (e acordada entre ambos), é seguramente uma obrigação de quase resultado porque é obrigação em que só o resultado vale a pena. Só o resultado vale a pena, quer para a autora quer para o réu. 135. Noutro tipo de intervenções a alternativa será, para o paciente, entre o risco assumido de uma intervenção eventualmente não conseguida, e/ou a degradação de um estado de doença a que se pretende pôr termo ou atenuar, e em relação ao qual a inércia parece ser o pior dos males; aqui não há dois polos de uma mesma alternativa, porque ou se concretiza o resultado ou não valia a pena correr o risco de pôr em risco o que era um estado de ... saúde. 136. Portanto aqui, em intervenções médico-cirúrgicas deste tipo, em cirurgia estética, a ausência de resultado ou um resultado inteiramente desajustado são a evidência de um incumprimento ou de um cumprimento defeituoso da prestação por parte do médico-devedor.» 137. Os demais argumentos referidos na sentença e atinentes à anterior blefaroplastia, são totalmente impertinentes e irrelevantes, pois ficando provado a contratação dos serviços dos réus para um fim específico, factos provados nº 1.8 e 1.42 da sentença, irrelevante se torna os motivos de tal contratação mal tendo andado o tribunal a quo ao ter dado como provado tal contrato e não o ter enquadrado no direito. 138. Não são os motivos que levam ao contrato que relevam na responsabilidade contratual. São sim os fins e objectivos do contrato quem as partes assumem entre si, cristalinamente dados como provados nos autos: O 2º réu comprometeu-se levantar as sobrancelhas da autora via mini-lifting, factos provados nº 1.8 e 1.42 da sentença, e factos nº 1.9 e 1.52 da recompilação e renumeração supra referida. 139. Face ao exposto e sem necessidade de mais considerandos devem os réus serem condenados no pagamento de uma indemnização solidária á autora., nos termos e montantes peticionados na P.I., indemnização essa que abranja os danos patrimoniais e não patrimoniais provados e supra referidos. 140. A sentença em crise é violadora das seguintes normas: art. 342º, 349º, 351º, 563º, 762º, 799º e 1145º todos do C. Civil e ainda os arts. 607º nº 3, 4 e 5 e 615º nº 1 al. b) e c) estes do C. Processo Civil. Termos em que e nos mais de direito, dando-se por provado e procedente o presente recurso deve ser revogada a sentença ora em crise substituindo-se por outra que condene os réus a solidariamente indemnizarem a ré por todos os danos sofridos em tudo se concluindo como na petição inicial. Os recorridos responderam a estas alegações defendendo a falta de razão dos fundamentos do recurso e pugnando pela manutenção do julgado. Após os vistos legais, cumpre decidir. II. Questões a decidir: As conclusões das alegações de recurso demandam desta Relação que decida as seguintes questões: a. Se a sentença é nula por preencher a previsão da alínea c) do n.º 1 do artigo 615.º do Código de Processo Civil; b. Se a decisão sobre a matéria de facto deve ser modificada; c. Se estão preenchidos os pressupostos da responsabilidade dos réus perante a autora. III. Da nulidade da sentença: Na conclusão 4 a recorrente refere que «constam da sentença factos que simultaneamente são dados como provados e não provados, o que por si gera a sua ininteligibilidade e determina a sua nulidade, nos termos do Art. 615º nº 1 al. c)». A recorrente não indica, contudo, quais são esses factos em simultâneo julgados provados e não provados, sendo certo que tinha de o fazer porque o recurso tem de ser fundamentado, tem de se apoiar em razões concretas e não em afirmações vagas e sem conteúdo, remetendo para o Tribunal ad quem a fiscalização global da decisão recorrida. Como quer que seja não encontramos nos elencos dos factos provados e dos factos não provados essa decisão múltipla e contraditória, pelo que a arguição do vício improcede sem mais. Já na conclusão 58 a recorrente sustenta que «o facto nº 1.41, na sua parcimónia, é destruído e entra em choque com outros factos provados nomeadamente os factos 1.16, 1.17 e 1.19, tornando obscura e ininteligível a sentença neste aspecto, nos termos do art. 615º nº 1 al. c) do C.P.C. gerando a sua nulidade». Nesta conclusão, a afirmação já é diferente. A contradição já não é entre factos provados e não provados, mas sim entre factos provados. Conforme referiremos mais à frente, aquando do conhecimento da impugnação da decisão sobre o facto do ponto 1.41, não existe qualquer contradição entre a redacção deste facto e a redacção dos factos dos pontos 1.16, 1.17 e 1.19 uma vez que os mesmos se referem a aspectos bem diferentes. Aquele refere-se à evolução clínica, isto é, ao processo de consolidação médica das lesões decorrentes a cirurgia, dos cortes cirúrgicos, dos pontos, da actuação sobre a pele e a superfície subcutânea; estes referem-se à reacção da autora perante o resultado da cirurgia, ao modo como a mesma avaliou esse resultado e ao que transmitiu sobre a sua avaliação. Refira-se ainda que na última das conclusões a recorrente menciona igualmente a nulidade da alínea b) do n.º 1 do artigo 615.º do Código de Processo Civil que se reporta a outra deficiência da sentença, no caso a falta de fundamentação de facto ou de direito da decisão. Trata-se de uma menção que surge aqui de modo desgarrado, sem cuidado, não correspondendo a qualquer alegação desenvolvida na motivação do recurso e que por isso não pode sequer constituir objecto do recurso uma vez que sendo as conclusões uma síntese da motivação, não havendo motivação a conclusão é vazia de conteúdo recursório. Em suma, a sentença recorrida não enferma das nulidades que lhe são imputadas. IV. Impugnação da decisão sobre a matéria de facto. A recorrente começa a sua impugnação da decisão sobre a matéria de facto sustentando que o facto do ponto 1.27 deve ser julgado não provado. Afigura-se-nos que a decisão de julgar provado esse facto não apenas não é um «absurdo jurídico», para usar a expressão da recorrente, como é mesmo aquela que a prova produzida impõe. A redacção do aludido facto apenas revela que com a cirurgia realizada em 18.10.2012 foi alcançado o objectivo de levantar as sobrancelhas de lado (cf. factos dos pontos 1.8, 1.24 e 1.27), o que a nosso ver é perfeitamente revelado pelas fotografias juntas aos autos e tiradas antes e depois dessa cirurgia. Nada disso é posto em crise por qualquer outro facto ou meio de prova, designadamente pelo relatório pericial do INMLCF. Com efeito, aquela redacção apenas traduz que esse objectivo foi alcançado, [mais rigorosamente: «o objectivo referido em 1.24»] não que tenha sido alcançado do modo ou nas condições almejadas pela autora. A redacção dada ao facto evidencia que a cirurgia produziu o resultado do levantamento das sobrancelhas, mas não qualifica o resultado, isto é, não evidencia em que condições esse objectivo foi alcançado, se são as condições ideais ou outras não ideais. Por isso, o facto em causa não é minimamente beliscado pelo relatório do INMLCF e a resposta dada pelo tribunal a quo deve ser mantida. A recorrente impugna de seguida a decisão de julgar provado o facto do ponto 1.41 onde se descreve que a autora teve uma evolução satisfatória da cirurgia realizada em 17.02.2011 ao abdómen e ao rosto (blefaroplastia). De novo cremos que a impugnação da recorrente resulta de um equívoco na leitura do facto em questão. Numa cirurgia desta natureza é necessário distinguir vários aspectos, entre os quais o da observância das legis artis pelo cirurgião, o da relação entre o resultado da cirurgia e os desejos ou expectativas do paciente e o da evolução clínica das lesões causadas pela intervenção cirúrgica. O facto em questão apenas respeita a este último aspecto. A evolução que ele refere é a evolução clínica da autora após a cirurgia: se a autora não sofreu infecções, se a cicatrização ocorreu sem intercorrências, se não ocorreu algum dos riscos que qualquer cirurgia pode sempre causar. Esta interpretação da redacção do facto impõe-se desde logo tendo em conta a proveniência do facto. O mesmo foi alegado no artigo 66.º da contestação dos réus, onde estes referem que após a cirurgia realizada em 17.02.2011 a «evolução da autora foi totalmente satisfatória com boa cicatrização, como ficou constatado em consulta realizada em 29-08-2011, e é visível nas fotos de antes e depois tendo a autora se mostrado muito satisfeita com os resultados obtidos». O que o tribunal a quo julgou provado no aludido facto foi a primeira parte desta alegação que manifestamente se refere apenas à evolução clínica dos cortes executados no rosto da autora durante a cirurgia. Sendo assim, a decisão do tribunal a quo é inteiramente correcta por corresponder ao que consta dos registos clínicos elaborados pelo réu da cirurgia que efectuou, bem como do relatório da cirurgiã N... referido no facto do ponto 1.48, não havendo outros elementos clínicos que infirmem esses registos. O facto do ponto 1.41 manter-se-á pois como facto provado. A recorrente pretende de seguida que seja julgado provado o facto do ponto 2.21 do elenco dos factos não provados. A sua redacção é a seguinte: «As cicatrizes identificadas em 1.11., tratando-se duma cirurgia plástica, deveriam ser muito mais discretas e naturalmente escondidas pela raiz dos cabelos». É fácil de ver que este facto está relacionado com as legis artis da cirurgia plástica, com o modo como podem e devem ser feitas as cirurgias destinadas a levantar as sobrancelhas de um rosto, com que técnica devem ser executadas, onde se localizam os cortes no rosto para essa finalidade, se os mesmos ficam ou não visíveis e, caso o sejam, como são dissimulados ou encobertos. A autora não fez produzir nos autos qualquer meio de prova destinado a demonstrar esse facto, o qual tinha necessariamente de passar pelos depoimentos, pareceres ou relatórios técnicos de cirurgiões ou cirurgiões plásticos que explicassem como se obtém a subida das sobrancelhas fazendo uso das melhores técnicas e quais os vestígios que ficam no rosto dessa intervenção. Por isso mesmo, no seu recurso a recorrente não indica qualquer meio de prova específico para sustentar a modificação da decisão sobre esse facto. Ela limita-se sim a sustentar que a prova desse facto deve ser alcançada através de uma presunção natural formulada a partir do relatório do INMLCF: se neste se afirma que a autora ficou com um dano estético então devemos presumir que as cicatrizes deviam ser mais discretas e estar escondidas pela raiz do cabelo. Pode estabelecer-se essa presunção? No tocante à questão de as cicatrizes deverem estar localizadas na zona da cabeça coberta pelo cabelo e escondidas pela raiz deste, parece-nos evidente que não. Trata-se de uma questão técnica que contende não com o desejo mas com a exequibilidade cirúrgica, sendo que nada nos autos permite apurar se era possível fazer os cortes na zona da cabeça coberta por cabelo, se isso era compatível com a finalidade pretendida e não iria interferir com o próprio couro cabeludo ou o cabelo, razões pelas quais é impossível este tribunal julgar provado esse facto. No tocante ao seu aspecto, pode extrair-se da prova produzida nos autos, designadamente do relatório do INMLCF e mesmo do relatório da cirurgiã plástica referido no facto do ponto 1.48, que as cicatrizes não têm o melhor aspecto que se pretende obter com uma cirurgia estética. A execução de cortes no rosto com esta extensão e finalidade exige que depois decorra o processo de cicatrização, o qual depende de factores que interferem com o resultado final designadamente no tocante ao aspecto, havendo por isso riscos associados a esta intervenção relacionados com esse aspecto. O consentimento informado assinado pela autora alerta para vários riscos do lifting facial, referindo que apesar de eles não ocorrerem com a maioria dos pacientes eles existem e deverão ser tidos em conta da decisão do paciente. Quanto aos riscos inerentes à cicatrização, o consentimento refere o seguinte: «Ainda que se espere uma boa cicatrização da ferida após o procedimento cirúrgico, podem ocorrer cicatrizes anómalas tanto na pele, como nos tecidos profundo. As cicatrizes podem ser inestéticas ou de cor diferente à da pele circundante. Existe a possibilidade de marcas visíveis da sutura. Podem ser necessários tratamentos adicionais, incluindo cirurgia para resolver a cicatrização anómala». Por conseguinte, se estes riscos existem mas a sua ocorrência não é forçosa e não acontece com a maioria dos pacientes é porque o que se espera que aconteça, o que pode ser alcançado e é alcançado na maioria dos casos é que as cicatrizes não sejam visíveis, não apresentem o aspecto inestético e a cor diferente à da pela circundante (como sucedeu com as cicatrizes resultantes da anterior primeira cirurgia ao rosto da autora). Isso mesmo se retira afinal do relatório da cirurgiã plástica referido no facto do ponto 1.48 quando esta menciona que as cicatrizes são uma «sequela», que o «resultado objectivo» da cirurgia é «muito bom, … objectivando apenas cicatriz na região temporal direita» (ou seja, com excepção da cicatriz) e que foi «proposto tratamento laser para optimização da cicatriz» que a autora recusou (se foi proposto tratamento é porque existe algo que ficou aquém do que se pretendia e que carece de ser melhorado). Coisa bastante diferente consiste em saber se o resultado alcançado resultou de uma má técnica do cirurgião, se este não foi suficientemente hábil e competente e foi essa deficiência que causou aquele resultado, ou se foi originado apenas pelos riscos inerentes à cirurgia, isto é, produto de outros factores não controláveis ou superáveis pela técnica do cirurgião. É manifesto que não se produziu prova no sentido da primeira dessas possibilidades, tanto mais que o relator do parecer técnico-científico do Conselho Médico-Legal e especialista em Cirurgia Plástica e Reconstrutiva, em resposta às questões colocadas pela autora sobre se os actos cirúrgicos executados pelo réu no rosto da autora foram «adequados e correctos face às legis artis da medicina plástica», se foram executados «com competência e conhecimento e respeito pelos procedimento médicos adequados e recomendados» e se um «profissional devidamente habilitado, competente e conhecedor da legis artis … causaria as cicatrizes e as alterações ao rosto» que se verificam, respondeu que o acto médico está executado em conformidade com as legis artis, foi realizado com a competência, o conhecimento e os procedimentos adequados e que as cicatrizes são compatíveis com a cirurgia realizada. Em conclusão, julga-se provado apenas o seguinte: «Com a execução da cirurgia estética, pretendia-se que as cicatrizes identificadas em 1.11 fossem menos notórias». A seguir a recorrente pretende que se acrescente aos factos provados o seguinte facto julgado não provado na 1.ª instância: «2.37. A autora era uma mulher de enorme auto estima consigo própria, era uma mulher vistosa, alegre, comunicativa que tinha uma vida social com amigos e familiares intensa e uma feliz e satisfatória vida familiar e intima com seu marido.» Com todo o devido respeito, a autora não tem muito em conta o significado das palavras que usa. O passado da autora de problemas e tratamentos psicológicos e a sua busca de tratamentos de natureza estética (já comum a familiares, como a filha e o próprio marido) para melhoria de aspectos físicos que a qualquer observador comum passam despercebidos ou pelo menos não são vistos como deficiências ou manifestações de fealdade, são tudo menos indiciadores de que a autora era uma pessoa com enorme auto-estima, bem pelo contrário. Aliás, os elementos clínicos de natureza psiquiátrica revelam que a autora desenvolveu um «quadro fóbico depressivo grave com dismorfofobia» (cf. relatório do INMLCF, pág. 4, § final). Através da internet, designadamente nos endereços https://www. msdmanuals.com/pt-pt/casa/distúrbios-de-saúde-mental/transtorno-obsessivo-compulsivo-e-distúrbios-relacionados/transtorno-dismófico-cor poral e https://pt.wikipedia.org/wiki/Transtorno_dismórfico_corporal, é possível apurar que uma pessoa com transtorno dismórfico corporal é uma pessoa que acredita que tem imperfeições ou defeitos na sua aparência física que na realidade não existem ou são diminutos. Normalmente são pessoas que se preocupam demasiado com a sua própria aparência em resultado designadamente de terem baixa auto-estima. Quanto a ser vistosa, para além de isso ser muito subjectivo e por isso profundamente opinativo, e não propriamente um facto que possa ser julgado provado ou não provado, sobretudo estando em causa uma cirurgia estética, certo é apenas que a autora tinha, aos 46 anos de idade, o aspecto que as fotografias juntas aos autos e tiradas antes da primeira cirurgia revelam. Logo o que será julgado provado é apenas o seguinte: «Por alturas de Fevereiro de 2011, a autora levava à data uma vida comum e normal do ponto de vista pessoal, familiar e social». Relativamente ao facto seguinte (2.40) que a autora pretende que seja julgado provado é necessário atentar com precisão no que o mesmo pretende revelar. A sua redacção é a seguinte: Devido ao estado em que seu rosto ficou, graças à incompetência do 2º réu, a autora perdeu todo o gosto pela vida, deixou de sair com amigos, deixou de receber pessoas em casa ou de frequentar a casa de familiares e amigos fora». Quanto à competência ou incompetência do réu cirurgião já fizemos referência ao que consta do parecer técnico-científico do Conselho Médico-Legal elaborado por especialista em Cirurgia Plástica e Reconstrutiva que não permite de modo algum dar como provado o que pretende a autora. Quanto a ter havido uma reacção negativa da autora aos resultados da cirurgia a prova é densa e inquestionável, designadamente aquela que resulta da informação clínica de natureza psiquiátrica segundo a qual, em 2013, após a cirurgia de Outubro de 2012, a autora desenvolveu um quadro fóbico depressivo grave com dismorfofobia que exigiu acompanhamento e tratamento psiquiátrico. Mas a redacção proposta para o facto levanta outra questão: se essa situação psicológica da autora foi causado pelo estado em que ficou o seu rosto. A qualificação daquela situação como quadro fóbico depressivo grave com dismorfofobia impede, a nosso ver, o tribunal de julgar provado esse nexo de causalidade. O mais que se pode afirmar é que aquele estado psicológico foi causado pela avaliação que a própria autora fez do resultado da cirurgia, pela insatisfação pessoal, subjectiva, desta com esse resultado, pelo modo como esta geriu as expectativas que tinha sobre o resultado. Vendo as diversas fotografias juntas aos autos perece notório, pese embora o subjectivismo a que, por mais que tentemos, não conseguimos escapar, que o aspecto do seu rosto ficou mais rejuvenescido, mais esbelto e sem as anomalias que esta lhe imputa, com excepção apenas das cicatrizes na transição frontotemporal. Isso mesmo parece ter sido concluído pelos peritos médicos ao qualificarem daquele modo o estado psicológico desenvolvido pela autora. Por isso, julga-se provado o seguinte facto: «A autora não ficou satisfeita com o resultado da cirurgia e desenvolveu um quadro fóbico depressivo grave com dismorfobia, em resultado do qual se sentia infeliz e passou a evitar contactos sociais». Pelas mesmas razões, do facto subsequente referido pela recorrente (2.41) decide-se julgar provado o seguinte: «Nesse quadro, a autora chegou a andar na rua com óculos escuros, mesmo quando deles não tinha necessidade, para evitar a observação do seu rosto por terceiros». A recorrente reclama de seguida o aditamento à matéria de facto provado do teor dos relatórios médicos juntos aos autos. Esta pretensão merece acolhimento tanto mais que já consta da matéria de facto provada um ponto (1.48) que reproduz aquilo que poderá ser denominado relatório médico. Assim, acrescenta-se à matéria de facto provadas os seguintes pontos e respectiva redacção: «O relatório da perícia de avaliação do dano corporal em direito cível elaborado pelo INMLCF junto aos autos (em 17.01.2018) contém as seguintes passagens: “[…] Exame objectivo: […] 2. Lesões e/ou sequelas relacionáveis com o evento A examinanda apresenta as seguintes sequelas: - Face: não traz maquiagem (apenas uma sombra no bordo livre das pálpebras de ambos os olhos): Na transição fronto-temporal, à esquerda, acompanhando a linha de inserção capilar, mas não recoberta pelos cabelos, apresenta uma cicatriz irregular, nacarada, com dimensões máximas de 9cm por 0,1 cm de maiores dimensões, não visível na perspectiva frontal. Visível na perspectiva de perfil e perfil a 3/4 com o cabelo apanhado. Na transição fronto-temporal, à direita, acompanhando a linha de inserção capilar, mas não recoberta pelos cabelos, apresenta uma cicatriz irregular, nacarada, com dimensões máximas de 9cm por 0,2cm de maiores dimensões, não visível na perspectiva frontal. Visível na perspectiva de perfil e perfil a 3/4 com o cabelo apanhado. Sem alterações na mímica facial (enrugar a testa, sorrir, cerrar os olhos, bocejar) Nas pálpebras superiores não são perceptíveis cicatrizes. […] Discussão: 1. Os elementos disponíveis permitem admitir a existência de nexo de causalidade entre as cirurgias realizadas e o estado actual apresentado (status pós-cirurgia estética ao nível da face) atendendo a que se confirmam os critérios necessários para o seu estabelecimento: existe adequação entre a sede das cirurgias e a sede das alterações resultantes, existe continuidade sintomatológica e adequação temporal entre as cirurgias e as alterações resultantes, o tipo de alterações resultantes é adequado à etiologia descrita, o tipo de cirurgia é causa adequada a produzir este tipo de alterações resultantes lesões e se exclui a existência de uma causa estranha. 2. A data da consolidação médico-legal das lesões é fixável em 14-11-2014, tendo em conta os seguintes aspectos: o tipo de lesões resultantes e o tipo de tratamentos efectuados e período de tempo apontado em perícia de psiquiatria para resolução do quadro de agravamento temporário de patologia desse foro. 3. No âmbito do período de danos temporários são valorizáveis, entre os diversos parâmetros do dano, os seguintes: - Défice Funcional Temporário (corresponde ao período durante o qual a vítima, em virtude do processo evolutivo das lesões no sentido da cura ou da consolidação, viu condicionada a sua autonomia na realização dos actos correntes da vida diária, familiar e social, excluindo-se aqui a repercussão na actividade profissional). Considerou-se o: - Défice funcional temporário total (… correspondendo com os períodos de internamento e/ ou de repouso absoluto), que se terá situado entre 17-02-2011 e 17-02-2011, entre 18-10-2012 e 18-10-2012, sendo assim fixável num período de 2 dias. - Défice funcional temporário parcial (… correspondendo ao período que se iniciou logo que a evolução das lesões passou a consentir algum grau de autonomia na realização desses actos, ainda que com limitações), que se terá situado entre 18-02-2011 e 17- 10-2012, entre 19-10-2012 e 14-11-2014, sendo assim fixável num período 1365 dias. Quantum doloris (corresponde à valoração do sofrimento físico e psíquico vivenciado pela vítima durante o período de danos temporários, isto é, entre a data do evento e a cura ou consolidação das lesões); fixável no grau 4 numa escala de sete graus de gravidade crescente, tendo em conta as lesões resultantes, o período de recuperação funcional e os tratamentos efectuados. 4. No âmbito do período de danos permanentes são valorizáveis, entre os diversos parâmetros de dano, os seguintes: - Dano estético permanente (corresponde à repercussão das sequelas, numa perspectiva estática e dinâmica, envolvendo uma avaliação personalizada da afectação da imagem da vítima quer em relação a si próprio, quer perante os outros). É fixável no grau 3, numa escala de sete graus de gravidade crescente, tendo em conta os seguintes aspectos: a alteração da facial e as cicatrizes. Conclusões: - A data da consolidação médico-legal das lesões é fixável em 14-11-2014 - Período de défice funcional temporário total sendo assim fixável num período de 2 dias - Período de défice funcional temporário parcial sendo assim fixável num período 1365 dias - Quantum Doloris fixável no grau 4/7 - Dano estético permanente fixável no grau 3/7”.» «O relatório da perícia médico-legal da especialidade de psiquiatria junto aos autos (em 22.11.2017) contém as seguintes passagens: “[…] Exame do estado mental: […] A examinanda apresenta sintomatologia ansiosa, irritabilidade e desconforto pelo facto de o resultado da cirurgia não satisfazer as expectativas que tinha quando decidiu optar pelo tratamento. […] Discussão: […] Após o tratamento e acompanhamento ao longo de cerca de um ano terá constatado que o resultado do tratamento não cumpria as expectativas da examinanda acerca do mesmo, tendo conduzido a uma rotura da relação e da confiança terapêutica. Em 2014, iniciou acompanhamento em internamento parcial de psiquiatria por sugestão da sua médica assistente de medicina geral e familiar, por sintomatologia ansiosa e depressiva, tendo feito tratamento com melhoria clínica. A examinanda apresenta antecedentes de acompanhamento em consulta de psiquiatria, no ano de 1993/1994, por sintomatologia depressiva reactiva a perda afectiva. Actualmente, apresenta um exame do estado mental normal e sem evidência de sintomatologia psicopatológica. Conclusões: É de admitir um agravamento temporário do estado prévio o qual foi adequadamente tratado do ponto de vista psiquiátrico, de Abril a Novembro de 2014, findo o qual é de considerar que retomou um estado clínico sobreponível ao que apresentava anteriormente à situação em apreço. Da análise da entrevista clínica, do exame do estado mental e da consulta de registos clínicos constantes de peças processuais não é observável qualquer alteração susceptível de se constituir como dano psíquico permanente, decorrente do evento em apreço.”» «Em sede de esclarecimentos ao referido relatório o médico-legista, por referência ao assinalado sob a epígrafe “discussão” e no respectivo ponto 1, fez constar o seguinte: “(…) do ponto de vista médico legal, com os elementos disponíveis, o estado actual apresentado ao nível da face resulta dos tratamentos de cirurgia plástica realizados, com a consequente alteração da face da examinada e consequente necessidade de avaliação de dano corporal resultante. É evidente a diferença pré e pós tratamentos em questão, amplamente documentada na fotodocumentação existente nos autos.”» «O parecer técnico-científico do Conselho Médico-Legal, relatado por especialista em Cirurgia Plástica e Reconstrutiva e aprovado em reunião do Conselho por unanimidade, contém as seguintes passagens: “1- Os actos cirúrgicos levados a efeito pelo 2º Réu no rosto da Autora foram os adequados e correctos face à legis artis da medicina plástica reconstrutiva e representam um lifting cervico-facial tal como a A. autorizou, ou são outro tipo de acto médico? Qual? Resposta: O que consta dos registos cirúrgicos foi que o procedimento cirúrgico foi um lifting temporal depreende-se contudo que a autorização dada pela A. para a realização de um lifting cervico-facial engloba a cirurgia realizada. Entende-se assim que o acto médico realizado corresponde à legis artis da cirurgia plástica e reconstrutiva. 2- O acto médico operado no rosto da A. foi desenvolvido com competência e conhecimento e respeito pelos procedimentos médicos adequados e recomendados? Resposta: Do que consta dos registos clínicos o acto médico foi realizado com competência, conhecimento e com os procedimentos médicos adequados. 3- Uma intervenção cirúrgica ao rosto, com os objectivos referidos 6 e 7 desta P.I., levada a acabo por profissional devidamente habilitado, competente, e conhecedor da legis artis da medicina plástica reconstrutiva, causaria as cicatrizes e as alterações ao rosto da A. tal como referidas de 22 a 28 desta P.I.? Resposta: A descrição das cicatrizes realizada na perícia médico-legal do INMLCF delegação do Norte leva-nos a afirmar que estas são compatíveis com a cirurgia realizada.”.» A recorrente reclama de seguida que se julgue provado o seguinte facto: «Os resultados na autora da cirurgia referida em 1.1 estão totalmente desconformes ao contratualizado e acordado entre ambos, não tendo os réus cumprido com o que acordaram com a autora e com o resultado que se comprometeram a ter.» A decisão sobre este facto impõe que se tenha presente que a autora fazia queixas específicas (corte e modificação dos olhos, eliminação dos traços da identidade do rosto, afectação da expressão, perturbação da fácies do rosto, sobrancelhas assimétricas, uma orelha mais descaída que a outra) que foram julgadas não provadas e agora em vez de impugnar a decisão sobre alguma ou algumas dessas queixas para através da sua demonstração o tribunal poder concluir pela divergência entre o contratado e o executado, procura que seja dada uma resposta em globo, não específica e conclusiva sem estar provado o facto que permitiria essa conclusão. Entendemos que não se produziu prova do facto referido pela recorrente. A autora submeteu-se a duas cirurgias ao rosto, uma para alterar as pálpebras e outra para alterar as sobrancelhas. Significa isso que o rosto da autora tinha obrigatoriamente que ficar diferente do que era antes das cirurgias. Logo, não são nem as queixas da autora nem as fotografias juntas aos autos que demonstram essa desconformidade entre as alterações contratadas e as alterações introduzidas pelas cirurgias. Por outro lado, a patologia psiquiátrica que a autora apresentou após a cirurgia (quadro fóbico depressivo grave com dismorfobia) permite sérias dúvidas sobre a razão das queixas da autora e a sua correspondência com a realidade, sendo certo que algumas das suas queixas são frontalmente negadas pelo relatório do INMLCF onde se refere que a autora não apresenta alterações ao nível da mímica facial, como sorrir e cerrar os olhos quando a autora se queixava de não conseguir sequer sorrir, de alterações ao nível da posição dos lábios e dos olhos, assim deixando patente a desconformidade entre a sua percepção e os resultados da cirurgia. Por fim, é evidente que o perito médico que elaborou o relatório não pode saber que alterações tinham sido pedidas pela autora ao réu, que explicação este lhe deu sobre o que fazer e como fazer e que consenso foi estabelecido por ambos sobre os objectivos a alcançar com as cirurgias. Por esse motivo nenhuma das suas afirmações permite corroborar (ou negar) o facto em apreço. Refira-se, aliás, que a nosso ver a recorrente extrai do relatório médico-legal conclusões que ele não parece consentir. Para a recorrente aquele relatório afirma peremptoriamente que a autora ficou a padecer de um dano corporal, de um dano estético. Isso é verdade, mas convém perceber o que o perito médico-legal pretende afirmar com isso. O perito médico-legal teve o cuidado de assinalar que apenas procedia à avaliação do dano corporal e que as questões relativas às legis artis da medicina estética estavam excluídas do relatório e deviam ser respondidas pelo Conselho Médico-Legal no âmbito de consulta técnico-científica da especialidade correspondente. Por conseguinte quando o perito assinala o dano corporal, na dimensão estética, ele limita-se a assinalar a alteração do rosto e a existência das cicatrizes. Para o perito se a autora antes das cirurgias tinha outro aspecto de rosto e não tinha cicatrizes e depois das cirurgias ficou com um aspecto diferente e com cicatrizes, isso significa que o réu executou actos cirúrgicos no corpo da autora gerando esse resultado. O dano que o perito considera existir resulta, no seu parecer, desses dois aspectos apenas; para o perito essas alterações são um dano corporal (o que, aliás, parece líquido do ponto de vista médico-legal). O perito não discutiu, nem tinha de discutir, se a autora pretendeu a realização das cirurgias, se as autorizou de modo válido e eficaz e, nessa medida, o resultado obtido é imputável à sua própria esfera de autodeterminação. O perito apenas avaliou o resultado do ponto de vista da integridade corporal e como constatou a existência da modificação (que, aliás, é inegável e foi aceite por ambas as partes, mas é também inevitável face à realização de uma cirurgia estética) assinalou essa modificação como um dano, rectius, uma afectação do corpo (o dano corporal em termos médico-legais é isso). O nexo de causalidade que o perito afirma é óbvio. O que o perito assinala é que existe nexo de causalidade (relação causa-efeito) entre as cirurgias realizadas pelo réu e o resultado que se observa no corpo da autora. Mas isso também não foi questionado pelo réu, o qual não defendeu em momento algum que o aspecto que a autora apresenta não seja resultante dos actos que praticou ou que tenha sido outrem a realizar no corpo da autora cirurgia que haja gerado aquele resultado. A afirmação desse nexo de causalidade não constitui pois a afirmação de que os actos cirúrgicos levados a cabo pelo réu foram realizados ilegalmente, à revelia ou contra a vontade da autora ou em violação das legis artis. Por sua vez o quantum doloris vem indexado quer ao sofrimento físico quer ao sofrimento psíquico. O sofrimento físico foi aceite previamente pela autora ao decidir-se pela realização das duas cirurgias, cuja recuperação implica sofrimento e dores que exigem inclusivamente a tomada de fármacos. O sofrimento psíquico está relacionado com a forma como a autora interpreta e avalia subjectivamente o resultado das cirurgias, interpretação e avaliação que como vimos é qualificada com uma visão patológica, errada, de dismorfobia. Finalmente o dano estético é relacionado com a alteração da facial e das cicatrizes, ou seja, inclusivamente levando em conta as cicatrizes da cirurgia ao abdómen que não estão em causa na presente acção. Acresce que esse dano é avaliado através de uma avaliação personalizada da afectação da imagem, ou seja, levando em conta a repercussão das modificações para esta pessoa em concreto e a imagem que a mesma tem em relação a si mesma e aos outros, a qual, como vimos já, se encontra no caso exacerbada ao ponto de constituir uma fobia. O facto referido pela recorrente não será por isso acrescentado aos factos provados. A seguir, a recorrente questiona a decisão relativa aos factos sobre se o réu nunca informou a autora de que era apenas cirurgião geral e não cirurgião plástico e se a autora apenas o procurou por estar convencida de que aquele tinha esta última especialidade. Note-se que o facto em apreço não é que o réu se tenha apresentado à autora como tendo a especialidade de cirurgião plástico, é somente que não a informou que não tinha esta especialidade, mas sim a de cirurgião (geral). Portanto o alegado não é que o réu mentiu, que invocou uma especialidade que não tinha, mas apenas que o réu não esclareceu que não tinha essa especialidade. No seu depoimento a autora limitou-se a responder que não à pergunta sobre se o réu «alguma vez lhe referiu se tinha ou não alguma especialidade em medicina plástica reconhecida pela ordem dos médicos em Portugal?». Portanto, o mais que se pode retirar do depoimento é que não houve qualquer conversa sobre o assunto. Porém, está dado como provado no ponto 1.52 (ponto cuja decisão não é impugnada) que «a especialidade do 2.º réu em cirurgia geral consta em todas as receitas que foram entregues à autora com os pedidos de estudo analítico e restante estudo pré-operatório». Sendo assim, qualquer declaratário normal teria obtido por essa via a informação de que o réu era cirurgião geral, logo que não era cirurgião plástico. Acresce que estando o réu, na posse dessa especialidade médica, legalmente autorizado a realizar a cirurgia que realizou, não se justificava que este tivesse necessidade ou sentisse necessidade de explicar que não tinha outra especialidade. Se a autora o procurou por estar convencida que ele era cirurgião plástico e somente por ter essa convicção era algo que carecia de ser demonstrado por meios de prova. Porém, a recorrente, de novo, face à inexistência de prova directa, não consegue apontar um único meio de prova concreto que possa consubstanciar uma fonte de demonstração desse facto, remetendo antes para o recurso a presunções naturais. Ora as regras da experiência comum permitem afirmar que se uma pessoa se desloca a uma clínica para realizar uma cirurgia estética é porque está convencida que quem se propõe realizar a cirurgia possui competências e habilitações académicas e médicas para o fazer. Porém, se a pessoa não tem conhecimento da natureza e extensão dos actos médicos que podem ser praticados por cada uma das especialidades médicas existentes em Portugal, dificilmente pode presumir que o médico que se propõe realizar a cirurgia possui necessariamente uma determinada especialidade médica e não outra. Não tendo a autora demonstrado ter razões para estar convencida que a cirurgia só podia ser praticada por um cirurgião plástico não é possível deduzir esse convencimento do mero facto de ela ter procurado esta clínica para executar a cirurgia, tanto mais que, repete-se, a autora tinha em seu poder documentos escritos onde apenas era referido que o réu era cirurgião geral. Em resultado, mantém-se a decisão de julgar não provados os factos referidos nas conclusões 85 e seguintes e 91 e seguintes das alegações de recurso (e por inerência os factos dos pontos 2.10, 2.14 e 2.31 do elenco dos não provados). A finalizar a recorrente pretende que sejam julgados provados por esta Relação os seguintes factos (e consequentemente que seja julgado não provado o facto do ponto 1.46 e expurgados do elenco dos não provados os pontos 2.9, 2.12, 2.17, 2.28, 2.30, 2.45 e 2.69): «O 2º réu não soube concretizar a técnica cirúrgica adequada e a que se propôs, na intervenção que fez no rosto da autora e para o fim que assegurou atingir, causando as lesões supra referidas» «As cicatrizes e alterações do rosto com que a autora ficou após a cirurgia referida em 1.1 nunca deveriam ter existido como consequência de uma cirurgia plástica e só existem porque o 2º réu não teve a arte, o engenho e a capacidade técnica, para as evitar, por inépcia própria, não obstante o fim a que se havia proposto». Estes factos remetem para o modo como as cirurgias foram executadas, as técnicas utilizadas e a perícia e habilidade técnica do executante, e, portanto, colocam a questão de saber se com melhor arte ou perícia as cicatrizes podiam ter sido evitadas ou serem menos notórias e as alterações do rosto serem diferentes, mais próximas do que a autora entende que devia ser. Sendo assim, a decisão sobre estes factos já foi abordada a propósito da impugnação da decisão sobre o ponto 2.21 do elenco dos não provados, embora então apenas na perspectiva das cicatrizes, seu aspecto e localização. Como então se afirmou e aqui se reitera, não se produziu qualquer meio de prova destinado a demonstrar estes factos, sendo certo que essa prova, atenta a natureza dos factos em questão, teria de consistir necessariamente em depoimentos, pareceres ou relatórios técnicos de cirurgiões ou cirurgiões plásticos que explicassem como é executada a cirurgia pretendida, quais os vestígios que a mesma deixa no rosto e se os mesmos são evitáveis e de que modo. A autora sustenta que a prova destes factos deve ser obtida fazendo uso de presunções naturais com base no que é afirmado no relatório do INMLCF: se neste se afirma que a autora ficou com um dano estético então devemos presumir que o cirurgião não teve a arte nem o engenho que devia ter tido. Parece que isso não pode ser assim. Se toda a cirurgia apresenta riscos isso significa que a mesma pode produzir efeitos indesejados mesmo que o executante respeite escrupulosamente as legis artis. Logo, para determinar que determinado efeito se deve a uma violação das legis artis, a uma falha na perícia e na destreza exigível do cirurgião, é necessário saber, através de pessoas com conhecimento das legis artis, se ocorreu alguma falha, onde ela se situa e quais as consequências que determinou (refira-se que não estamos por ora a cuidar das regras do ónus da prova, estamos apenas a verificar a prova produzida). Conforme já referido, a localização das cicatrizes é uma questão técnica que pressupõe conhecimentos cirúrgicos que não foram carreados para os autos. A questão do aspecto das cicatrizes encontra-se efectivamente relevada no relatório do INMLCF, mas a possibilidade de isso ocorrer encontra-se ressalvada no consentimento informado. Acresce que o réu se propôs realizar um tratamento laser para melhorar o aspecto das cicatrizes e a autora recusou submeter-se a esse tratamento. No tocante às modificações do rosto era igualmente indispensável que tivesse sido produzido o depoimento, parecer ou relatório técnico de especialistas em cirurgia plástica donde se pudesse retirar a afirmação de que se o réu tivesse actuado de outro modo o resultado desejado pela autora teria sido obtido. Conforme também se referiu, em resposta às questões colocadas pela autora sobre se os actos cirúrgicos executados pelo réu no rosto da autora foram «adequados e correctos face às legis artis da medicina plástica», se foram executados «com competência e conhecimento e respeito pelos procedimento médicos adequados e recomendados» e se um «profissional devidamente habilitado, competente e conhecedor da legis artis … causaria as cicatrizes e as alterações ao rosto» que se verificam, o relator do parecer técnico-científico do Conselho Médico-Legal e especialista em Cirurgia Plástica e Reconstrutiva, respondeu que o acto médico está executado em conformidade com as legis artis, foi realizado com a competência, o conhecimento e os procedimentos adequados e que as cicatrizes são compatíveis com a cirurgia realizada. Pese embora se anote que a expressão «são compatíveis» não é muito expressiva, certo é que de modo algum aquele parecer permite afirmar que o cirurgião usou de má técnica, não foi suficientemente hábil e competente, foi essa falha que causou o resultado observável. Acresce que, como já se referiu também, o relatório do INMLCF tem de ser devidamente interpretado quanto ao conceito de dano corporal (estético) que nele é usado e àquilo que os peritos pretendem manifestar em sede de avaliação médico-legal do dano, não se podendo ver nele mais que uma perícia médico-legal, designadamente uma perícia de cirurgia plástica, que aborde as técnicas usadas e a (falta de) correspondência entre a técnica exigível e os resultados observados. Por isso, entendemos que a prova produzida não permite de modo algum julgar provados estes factos. Para isso seria necessária uma actividade probatória que a autora não fez produzir e que não se pode deduzir da mera existência das cicatrizes e respectivo aspecto. A impugnação da decisão sobre a matéria de facto procede assim em parte, na medida do assinalado. V. Os factos: Ficam agora, introduzidas as modificações e os aditamentos acabados de decidir, definitivamente julgados provados os seguintes factos: 1.1. Em 18 de Outubro de 2012 a autora foi sujeita, pelo 2º réu e nas instalações da 1ª ré, a uma cirurgia plástica. 1.2. A autora foi sujeita a uma cirurgia anterior, efectuada pelo 2º réu, também nas instalações da 1ª ré. 1.3. Na primeira intervenção cirúrgica identificada em 1.2., em Fevereiro de 2011, a autora, nas instalações da 1ª ré, além de ter sido sujeita a uma intervenção cirúrgica plástica ao abdómen, sujeitou-se ainda, no mesmo momento, a uma intervenção plástica no seu rosto (uma blefaroplastia), visando esta a correcção das pálpebras superiores e retirar as bolsas existentes nas pálpebras inferiores dos olhos (vulgo olheiras, papinhos por baixo dos olhos), ambos os procedimentos levados a cabo pelo 2º réu. 1.4. A blefaroplastia efectuada em Fevereiro de 2011 era destinada unicamente à correcção das pálpebras superiores e a retirar as bolsas existentes nas pálpebras inferiores dos olhos. 1.5. O resultado final da blefaroplastia foi insatisfatório para a autora. 1.6. Com a blefaroplastia a autora ficou, ao nível das pálpebras, com os seus traços pessoais alterados. 1.7. A autora decidiu sujeitar-se à cirurgia a que se alude em 1.1. 1.8. A cirurgia a que se alude em 1.1. tratar-se-ia de um lifting que consistiria, disse o 2º réu à autora, em se cortar desde o cimo da testa ate às orelhas, para levantar a sobrancelhas de lado. 1.9. O 2º réu encontra-se inscrito no colégio de especialidade da Ordem dos Médicos Portuguesa como médico-cirurgião geral. 1.10. Na cirurgia a que se alude em 1.1. o 2º réu cortou a autora desde o cimo da testa até às orelhas. 1.11. A autora apresenta: - na transição fronto-temporal, à esquerda, acompanhando a linha de inserção capilar mas não recoberta pelos cabelos, uma cicatriz irregular, nacarada, com dimensões máximas de 9 cm por 0,1 cm de maiores dimensões, não visível na perspectiva frontal e visível na perspectiva de perfil e perfil a ¾ com o cabelo apanhado; e, - na transição fronto-temporal, à direita, acompanhando a linha de inserção capilar mas não recoberta pelos cabelos, uma cicatriz irregular, nacarada, com dimensões máximas de 9 cm por 0,2 cm de maiores dimensões, não visível na perspectiva frontal e visível na perspectiva de perfil e perfil a ¾ com o cabelo apanhado. 1.12. Com referência à cirurgia a que se alude em 1.1., a autora nunca solicitou ao 2º réu que lhe cortasse os olhos. 1.13. Com referência à cirurgia identificada em 1.1., o 2º réu disse à autora que lhe ia fazer um lifting temporal. 1.14. A autora, com referência à cirurgia identificada em 1.1., assinou o “Consentimento Informado Lifting Cervico-Facial (Ritidectomia)” anexo ao “Consentimento Para Cirurgia/ Procedimento ou Tratamento”, bem como este último, juntos a fls. 23 a 25, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido. 1.15. Após a cirurgia identificada em 1.1., a autora ficou com os seus traços alterados, face à fisionomia que tinha antes, mesmo aquela após a primeira cirurgia. 1.16. Na sequência da realização da cirurgia identificada em 1.1., a partir de data não concretamente apurada, a autora perdeu a sua estabilidade emocional, entrando em depressão, sendo que desde 14.04.2014 até 11.11.2014 esteve em tratamento em regime de internamento parcial no Hospital …, apresentando um quadro clínico compatível com o diagnóstico de “Reacção de Ajustamento (309 CID-9), na sequência de intervenções cirúrgicas estéticas com resultados insatisfatórios”. 1.17. A autora queixou-se ao 2º réu das cicatrizes identificadas em 1.11., bem como das alterações que entende que o seu rosto apresenta após a realização da cirurgia identificada em 1.1. 1.18. A autora pagou à 1ª ré €3.250,00 pela cirurgia que efectuou nas suas instalações, no dia 18.10.2012 e que foi levada a cabo pelo 2º réu. 1.19. A autora, na sequência da cirurgia identificada em 1.1., deixou de se reconhecer. 1.20. Com o passar do tempo o rosto da autora sofreu e sofre alterações. 1.21. A autora foi medicada para combater a depressão. 1.22. A autora viu a sua vida familiar e de casal afectada com a sua perda de auto estima, o que provocou desgaste emocional no casal. 1.23. A autora deixou de gostar do seu rosto e de se ver, o que a condicionou na sua vida social, familiar e de casal. 1.24. O procedimento cirúrgico de mini-lifting temporal ocorrido em 18.10.2012, identificado em 1.1., teve por objectivo o levantamento das sobrancelhas, conforme a autora pretendia. 1.25. A blefaroplastia identificada em 1.3. teve como objectivo o aperfeiçoamento da zona das pálpebras, uma das quais se encontrava descaída. 1.26. Na primeira cirurgia identificada em 1.3. existe um período de estabilização até que sejam obtidos resultados definitivos. 1.27. O objectivo referido em 1.24. foi alcançado. 1.28. A autora não quis corrigir as cicatrizes identificadas em 1.11. 1.29. O consentimento a que se alude em 1.14. é amplo, abrangendo o mini-lifting temporal. 1.30. Está afixado na entrada da clínica que o 2º réu é cirurgião geral, constando essa indicação nas receitas pelo mesmo prescritas. 1.31. Na blefaroplastia e no mini-lifting facial temporal a região da boca ou do terço médio da face não é operada e, por isso, não pode haver a afectação dessa zona anatómica. 1.32. Na blefaroplastia e no mini-lifting facial temporal não é efectuada exérese (extirpação) de músculo nenhum. 1.33. A evolução natural de um lifting é que a pele fique cada vez com menor tensão devido ao facto de que com a idade irem relaxando cada vez mais os tecidos. 1.34. A autora dirigiu-se às instalações da 1ª ré em 13.02.2013, para uma consulta “anti aging” (diagnóstico e tratamento do envelhecimento geral). 1.35. Em 28.10.2013, a autora queixou-se numa consulta das cicatrizes, tendo-lhe o 2º réu sugerido que as retocasse com um laser, procedimento que a autora recusou. 1.36. Os réus intentaram queixa-crime por difamação, denúncia caluniosa e tentativa de burla agravada contra a autora. 1.37. Desde a 1ª cirurgia identificada em 1.3. a autora teve necessariamente de envelhecer como qualquer ser humano. 1.38. As rugas glabelares, mesmo quando melhoradas através de cirurgia, têm tendência a reaparecer. 1.39. A autora recorreu no dia 2 de Fevereiro de 2011 a uma consulta nos réus para melhorar o seu aspecto físico, manifestando não gostar do aspecto volumoso do seu abdómen e cintura, tendo manifestado, após a consulta e perante uma funcionária da 1ª ré, descontentamento com a pálpebra direita que achava “descaída”. 1.40. Nessa conformidade, a autora foi submetida à cirurgia de blefaroplastia (retirada da pele em excesso das pálpebras), identificada em 1.3., no dia 17.02.2011, estando a equipe integrada pelo 2.º réu, médico especialista em cirurgia geral, pelo Dr. K…, cirurgião maxilo-facial, e pela Dra. L…, especialista em anestesiologia. 1.41. A evolução da autora foi satisfatória. 1.42. Em 08.10.2012 a autora recorre novamente aos serviços dos réus, pretendendo melhorar o aspecto da região frontal (sobrancelha descaída), sendo que lhe foi explicado o procedimento de lifting do terço superior facial (abordagem temporal) para levantar a cauda das sobrancelhas. 1.43. A cirurgia de lifting temporal, identificada em 1.1., foi realizada em 18.10.2012 pela equipe chefiada pelo 2.º réu, composta por este, pelo Dr. K… e pela Dra. L…, tendo decorrido sem intercorrências. 1.44. A autora foi reavaliada no dia 13.02.2013. 1.45. Não existe cirurgia estética sem cicatrizes. 1.46. A cicatrização da autora é compatível com a cirurgia realizada, identificada em 1.1. 1.47. O resultado visado com a 1ª cirurgia, identificada em 1.3., foi obtido. 1.48. Pela Dra. N..., médica especialista em cirurgia plástica reconstrutiva e estética foi elaborado o seguinte documento: “Relatório médico de avaliação clínica da paciente B… Segundo consta no processo clínico da Exma. Dª. B…: Paciente avaliada em consulta a 02-02-2011 apresentando dermatocalasia palpebral e sinais de envelhecimento facial compatíveis com a idade real. Mostrando o desejo de melhoramento da região peri-ocular e terço superior da face, foi proposto o procedimento cirúrgico de blefaroplastia das pálpebras superiores e inferiores. Explicado o procedimento e potenciais complicações. Cirurgia de blefaroplastia realizada a 17-02-2011 (Cirurgião: Dr. D…; Cirurgião Ajudante: Dr. K… (Cirurgião Maxilo-Facial)) segundo técnica clássica descrita, com abordagem das bolsas de gordura. Sem intercorrências. Cuidados de penso com boa evolução e cicatrização. Reavaliação e a pedido da paciente foi feita reintervenção para maior exérese cutânea das pálpebras superiores (Blefaroplastia secundária), procedimento realizado a 26-04-2011 (Cirurgião: Dr. D…; Cirurgião Ajudante: Dr. M… (Cirurgião Plástico)) com anestesia local. Sem intercorrências. Doente reavaliada a 29-08-2011 constatando-se bom resultado final da blefaroplastia. A 8-10-2012, uma vez que a paciente manifestava descontentamento com o aspecto da região frontal a pedido da paciente foi explicado o procedimento de mini-lifting do terço superior da face com abordagem temporal com o objectivo da levantar a cauda das sobrancelhas e diminuir as rugas frontais. Cirurgia de mini-lifting temporal realizada a 18-10-2012 (Cirurgião: Dr. D… n.º…..; Cirurgião Ajudante: Dr. K… (Cirurgião Maxilo-Facial)) sem intercorrências. Doente reavaliada a 13-2-2013 constatando-se bom resultado final do procedimento, verificando-se em consultas posteriores e de acordo com queixas do doente, cicatriz visível bilateralmente, mais à direita. Trata-se de uma cicatriz de tamanho pequeno, não hipertrófica ou quelóide, na região temporal na transição para a linha do cabelo. Trata-se de uma sequela descrita na literatura associada ao procedimento, da qual a doente estava informada e assinado o consentimento informado previamente a todas as intervenções. Doente reavaliada sempre que solicitado em consultas posteriores onde se intensificaram as queixas de descontentamento com auto-imagem, doente apresentou fotos com várias décadas, exprimindo desejo de voltar à expressão facial passada. Apresentava assim expectativas irreais do que a cirurgia estética pode oferecer no tratamento dos sinais de envelhecimento da face, bem como queixas inespecificas e sinais de distúrbio psiquiátrico associado. Resultado objectivo da blefaroplastia e mini-lifting temporal, muito bom, documentado por fotografias pré e pós operatórias, objectivando apenas cicatriz na região temporal direita. Foi até proposto tratamento de laser para optimização que doente recusou. Avaliação também por mim, Cirurgiã Plástica, no dia 28-10-2013 que concordo com resultado acima descrito e presencio consulta, alertando também para distúrbio psiquiátrico da doente. As complicações que a paciente, por meio oficial de denúncia se queixa: 1.“deixar de ter expressão no olhar”; 2.“olhos rasgados profundos mais pequenos estando permanentemente com olheiras”; 3. “deixou de ter sorriso passando a ter riso” (!?); 4.“deixou de ter expressão para sorrir porque perdeu qualquer músculo para tal passou a ter expressão só de riso entende-se de boca aberta”; 5.“os vincos entre as sobrancelhas no cimo do nariz passaram a ser constantes e não somente quando o rosto muda de expressão, o que dá um ar “sempre zangada”; 6.“Na sua boca do lado esquerdo descaiu e do lado direito entra nos dentes quando fala e os vincos da pele nos cantos da boca prolongam-se até ao fim do queixo, que assumiu um aspecto quadrado”: Em nada se relacionam com procedimentos realizados (blefaroplastia e mini-lifting temporal). Outras queixas como: 1.“Olho direito ficou encurtado e o esquerdo ficou descaído” 2.“Toda a área a volta das pálpebras ficaram escuras e as sobrancelhas ficaram assimétricas: Não se constatam, nem na observação da paciente, nem nas fotografias disponíveis no arquivo clínico. As complicações de Blefaroplastia descritas na literatura (cegueira, ptose, irritação da córnea, lagoftalmos,) e do Lifting (hematoma, necrose cutânea, lesão nervosa e cicatriz hipertrófica, alopecia, (Grabb and Smith's Plastic Surgery, sétima edição) não se verificam. Conclui-se assim que os procedimentos realizados obtiveram um bom resultado, pesando o descontentamento actual da doente devido a expectativas irreais e algum distúrbio psiquiátrico associado e bem notório nas consultas subsequentes, não identificado previamente. (…).” 1.49. Os procedimentos cirúrgicos foram explicados à autora antes da realização das cirurgias. 1.50. Os réus, habitualmente, usam consentimento geral para o lifting cervical facial e temporal. 1.51. Os conhecimentos e experiência do 2º réu habilitam-no para os procedimentos cirúrgicos em causa. 1.52. A especialidade do 2.º réu em cirurgia geral consta em todas as receitas que foram entregues à autora com os pedidos de estudo analítico e restante estudo pré-operatório. 1.53. A especialidade de cirurgia geral é abrangente. 1.54. A formação do 2.º réu é vasta na área da cirurgia estética e a prática é intensa e actualizada. 1.55. Existe uma sobreposição de procedimentos cirúrgicos entre as especialidades. 1.56. A cirurgia estética é uma parte da especialidade de cirurgia plástica, sendo praticada também, de forma mais ou menos habitual, por outras especialidades, tais como a dermatologia (medicina e pequena cirurgia estética facial), a otorrinolaringologia (rinoplastia estética), a oftalmologia (blefaroplastias), a cirurgia maxilo - facial (cirurgia estética facial) e cirurgia geral. 1.57. O 2º réu, além do curso de medicina obtido na Universidade de Granada em 1989, possui o diploma de mestre em medicina estética pela Escola Espanhola de Medicina Estética, estando inscrito na Ordem dos Médicos com o n.º …... 1.58. O 2º réu obteve o título de especialista em cirurgia geral em Portugal com 19.2 valores. 1.59. O 2º réu assistiu a cursos, congressos e estágios relacionados com a cirurgia estética e a medicina estética, os quais aqui se transcrevem: a) Enquanto membro da comissão organizadora de congressos: - XI Encontro Internacional de Cirurgia do Centro Hospitalar de Vila Nova de Gaia, evento que decorreu entre 18 e 20 de Outubro de 1999; - XII Encontro Internacional de Cirurgia do Centro Hospitalar de Vila Nova de Gaia que decorreu em Outubro de 2000; - I Congresso Ibérico de Medicina e Cirurgia Estética. Lisboa 29-30 Abril de 2000; b) Enquanto membro de sociedades científicas: - ALTEC. Asociação de laserterapia e tecnologias afins. Portugal; - Ordem dos Médicos. Inscrição n.º ......; - Colégio da especialidade de Cirurgia Geral; - Sociedade Portuguesa de Cirurgia (Secção da Sociedade das Ciências Médicas de Lisboa - Academia Portuguesa de Medicina), é membro de vários Capítulos; - Grupo Português de Endocrinologia Médico-Cirúrgica; - “Ilustre Colégio Oficial de Médicos” de Almeria (Espanha). Inscrito com o número ……..; - Associação Profissional de Médicos e Cirurgiões Estéticos. Portugal; - “Sociedad Española de Informática de la Salud”; - Associação de apoio ao Encontro Internacional de Cirurgia do CHVN de Gaia; - “Sociedad Española de Calidad Asistencial”; - Associação Portuguesa de Cirurgia do Ambulatório; - “Association Française de medicine Morpho-Esthétique et Anti-âge”; 1.60. O 2.º réu participou nos seguintes cursos teórico-práticos: - “Curso Superior de Especialización en Medicina Estética” (CES-1) pela Escola Espanhola de Medicina Estética no “Colegio de Médicos de Sevilla”(1991); - “Curso Superior de Especialización en Medicina Estética” (CES-2) pela Escola Espanhola de Medicina Estética em Barcelona (1992); - Flebectomia ambulatória. Seminário celebrado pela escola C+C. Dr. W Chong. Madrid, em Outubro de 1995; - XX Curso Internacional de Actualización en Cirugia General y del Aparato Digestivo. Universidad Complutense. Hospital XII de Octubre. Madrid, 26-31 de Maio de 1997; - “III Curso de actualización a distancia: Nutrición, Dietética y Dietoterapia” pela Universidade de Navarra (Outubro de 1997 a Junho de 1998) com um total de 130 horas, o qual foi declarado de interesse para a saúde pelo governo de Navarra, composto por três módulos, e superado com rendimentos de 94, 93 e 95%; - “XXI Curso Internacional de Actualización en Cirugia General y del Aparato Digestivo” pela Universidad Complutense, Hospital XII de Octubre, Madrid, 27-30 de Maio de 1998; - Curso de Imunidade e Farmacoterapia. Fevereiro-Março de 1999 (30 horas) pela Universidade de Navarra; - Curso Práctico de Cirurgia Cosmética “Profesor José Juri”, Março de 1999, Barcelona; - Curso de Nutrição e Obesidade, Universidade de Navarra, 15 de Março- 8 de Maio; - Curso de Lipoescultura Superficial, "Profesor Marco Gasparotti" 29-30 Maio 1999, Clínica Menorca, Madrid; 1.61. O 2º réu participou nos seguintes cursos e formações: - “6th Postgraduate Course on Endocrine Surgery”, 2 de Junho de 1999, Serviço de Cirurgia 3, Faculdade de Medicina do Hospital de São João no Porto; - Curso de ecografia da Sociedade Portuguesa de Cirurgia, 11 de Março de 2000, Lisboa; - Curso de Oncologia Básica do Instituto Português de Oncologia, 10 de Janeiro a 20 de Março de 2000, Porto; - "Posgraduate course in Endocrine Surgery", 17-22 de Setembro de 2000, Funchal, Madeira; - “EUROPEAN LAP. BAND Workshop on Laparoscopic Gastricbanding”, Prof. Cadiere, 11-12 Junho de 2002, Bruxelas; - “I Curso de reconstrucción mamaria para cirujanos generales”, 16-17 de Octubre 2002, San Sebastian, Espanha; - “I Curso Português de Cirurgia Bariátrica”, Guarda, 2003; - “XXVI Curso Internacional de Actualización en Cirugia General y del Aparato Digestivo”, Universidad Complutense, Hospital XII de Octubre, Madrid, Maio 2003; - Curso Internacional de Cirugia Plástica y Estética, Clínica Planas, Barcelona, 2011; 1.62. O 2º réu participou nos seguintes congressos: - III Jornadas Médicas de Gaia, Semana do Interno, Gaia, Abril de 1995; - XIII Jornadas Portuguesas de Cirurgia, Hospital Geral de Santo António, Departamento de Cirurgia, Porto, 27-29 de Outubro de 1995; - 8º Encontro Internacional de Cirurgia, C.H. de Gaia, Departamento de Cirurgia, Espinho, 23-25 de Outubro de 1995; - XIV Jornadas Cirúrgicas, Faculdade de Medicina de Coimbra, 27-29 de Novembro de 1995; - I Congresso Internacional de Cirurgia e Medicina Estética do Homem, Sociedade Portuguesa de Cirurgia Estética, Lisboa, 11-12 de Outubro de 1996; - XV Jornadas Cirúrgicas Faculdade de Medicina de Coimbra, Coimbra, 25-27 de Novembro de 1996; - XVII Congresso Nacional da Sociedade Portuguesa de Cirurgia, Lisboa, 6,7 e 8 de Março de 1997; - 9º Encontro Internacional de Cirurgia do CHVN de Gaia. Granja, Gaia, 20-22 de Outubro de 1997; - XVI Jornadas cirúrgicas, Faculdade de Medicina de Coimbra, 10-12 de Novembro de 1997; - X Encontro Internacional de Cirurgia do CHVN de Gaia. Granja, Gaia. 19-21 de Outubro de 1998; - Simpósio Internacional de Tumores do Estômago, Instituto Português de Oncologia, 11-13 de Fevereiro 1999, Porto; - Primeiras Jornadas: novas perspectivas laser, 5 Março de 1999, Porto; - XIX Congresso da Sociedade Portuguesa de Cirurgia, 7-10 de Março de 1999, Lisboa; - “IInd. International Meeting on Endocrine Surgery”, 31-02 de Junho, Serviço de cirurgia 3, Faculdade de Medicina do Hospital de São João, Porto; 1.63. O 2º réu participou nos congressos que a seguir se enumeram: - “Second European Congress of Aesthetic Medicine and Dermatological and Plastic”, 24-26 de Setembro de 1999, Bruxelas; - XI Encontro Internacional de Cirurgia do CHVN Gaia. Granja, Gaia, 18-20 de Outubro de 1999; - Simpósio internacional de doenças venosas, Capítulo de Cirurgia Venosa da Sociedade Portuguesa de Cirurgia, 11 de Março de 2000, Lisboa; - XX Congresso Nacional da Sociedade Portuguesa de Cirurgia, 12-15 de Março de 2000, Lisboa; - XVIII Jornadas Portuguesas de Cirurgia, Departamento de Cirurgia do Hospital Geral de Santo António, 27 a 29 de Março de 2000, Porto; - II Reunião Internacional de Actualização em Cirurgia do Esófago e do Estômago, 8-10 de Maio de 2000, Porto; - XII Encontro Internacional de Cirurgia do CHVN de Gaia, 16-18 de Outubro de 2000, Gaia; - "13ème. Congres International de Médicine Esthétique", 1-4 de Novembro de 2000, Montecarlo; - “IX Jornadas Mediterraneas. Confrontaciones Terapeuticas en Medicina y Cirugia Cosmética”, 21-25 Marzo 2001, Barcelona; - “VI Reunión Nacional de Cirugía de la pared abdominal. HERNIA-2001”. 3-5 Maio de 2001. Santander; - 8º Congresso Brasileiro de Medicina Estética. 3º Congresso Pan-americano de Medicina Estética. 2ª Jornada Baiana de Medicina Estética. 28 Junho a 1 de Julho 2001. Salvador da Baia – Brasil. 1.64. O 2º réu tem no seu currículo a participação em outros congressos: - Reunião do Capitulo de Cirurgia Venosa da Sociedade Portuguesa de Cirurgia. 23 Junho 2001. Régua; - “I Congreso Latino de Cirurgía Estética”. 1-4 de Novembro de 2001. Madrid; - “IV Jornadas Internacionales. Laser, Luz Intensa Pulsada y Técnicas Dermocosméticas”. 23-25 Noviembre 2001. Madrid; - “Congreso Nacional de la Sociedad Española de Calidad Asistencial”. 2001. Murcia-Espanha; - XXV Reunião Internacional de Cirugia Digestiva; - XXII Congresso Nacional da Sociedade Portuguesa de Cirurgia. 2002. Lisboa; - XIV Encontro Internacional de Cirurgia do CHVN de Gaia. Outubro de 2002. Gaia; - XXIII Congresso Nacional da Sociedade Portuguesa de Cirurgia. 2003. Lisboa; - XI Jornadas Mediterraneas Confrontaciones terapeuticas Barcelona, 3 de Abril de 2003; - Congres International de la Société Française de Chirurgie Esthétique. Nice, 16-18 Maio 2003; - XV Encontro Internacional de Cirurgia do CHVN de Gaia. 15 de Outubro de 2003. Gaia; - Congreso de la Asociación Española de Cirujanos. Valencia. Outubro de 2003; - Congresso Nacional de Senologia do Porto, 19 d Novembro de 2003; - Congresso da Sociedade Portuguesa de Cirurgia de Ambulatório. Alvor 2004; - XXIV Congresso Nacional da Sociedade Portuguesa de Cirurgia. 2004. Lisboa; - VII Jornadas internacionais em laser, luz intensa pulsada e outras Técnicas Dermocosméticas. 22-24 de Outubro de 2004. Porto; - XVI Encontro Internacional de Cirurgia do CHVN de Gaia. 25-27 de Outubro de 2004. Gaia; - XVII Jornadas Mediterraneas de Confrontaciones Terapeuticas en Medicina y Cirugia Cosmética. 15-17 de Mayo. 2009. Sitges – Barcelona; - 9ème Congrès de la Association Française De Medicine Esthetique. 2-3 Abril 2011. Paris; - XXI Congreso de la Sociedad Española de láser Médico Quirúrgico. 30 Maio-1 Junho 2013; - 49ª Congreso nacional de la Sociedad Española de Cirugia Plástica Reparadora y Estética (SECPRE) Granada 11-13 Junio de 2014; - 44º Congresso da Sociedade Portuguesa de Cirurgia Plástica Reconstrutiva e Estética. 2014; - XXVI Encontro Internacional de Cirurgia CHVN Gaia. 10-11 Novembro 2014. Porto. 1.65. A autora contratou com o 2º réu os serviços deste. 1.66. A autora, desde o primeiro momento, efectuou todos os pagamentos e calendarizou tudo directamente com a 1ª ré e o seu staff. 1.67. Foi às instalações da 1ª ré, como uma clinica médica, que a autora se dirigiu de inıcio e quando pensou em fazer uma redução ao abdómen. 1.68. Foi a 1ª ré que assegurou a equipe médica que adjuvou o 2º réu nas intervenções cirúrgicas realizadas pela autora. 1.69. Com a execução da cirurgia estética pretendia-se que as cicatrizes identificadas em 1.11 fossem menos notórias. 1.70. Por alturas de Fevereiro de 2011, a autora levava à data uma vida comum e normal do ponto de vista pessoal, familiar e social. 1.71. A autora não ficou satisfeita com o resultado da cirurgia e desenvolveu um quadro fóbico depressivo grave com dismorfobia, em resultado do qual se sentia infeliz e passou a evitar contactos sociais. 1.72. Nesse quadro, a autora chegou a andar na rua com óculos escuros, mesmo quando deles não tinha necessidade, para evitar a observação do seu rosto por terceiros. 1.73. O relatório da perícia de avaliação do dano corporal em direito cível elaborado pelo INMLCF junto aos autos (em 17.01.2018) contém as seguintes passagens: “[…] Exame objectivo: […] 2. Lesões e/ou sequelas relacionáveis com o evento A examinanda apresenta as seguintes sequelas: - Face: não traz maquiagem (apenas uma sombra no bordo livre das pálpebras de ambos os olhos): Na transição fronto-temporal, à esquerda, acompanhando a linha de inserção capilar, mas não recoberta pelos cabelos, apresenta uma cicatriz irregular, nacarada, com dimensões máximas de 9cm por 0,1 cm de maiores dimensões, não visível na perspectiva frontal. Visível na perspectiva de perfil e perfil a 3/4 com o cabelo apanhado. Na transição fronto-temporal, à direita, acompanhando a linha de inserção capilar, mas não recoberta pelos cabelos, apresenta uma cicatriz irregular, nacarada, com dimensões máximas de 9cm por 0,2cm de maiores dimensões, não visível na perspectiva frontal. Visível na perspectiva de perfil e perfil a 3/4 com o cabelo apanhado. Sem alterações na mímica facial (enrugar a testa, sorrir, cerrar os olhos, bocejar) Nas pálpebras superiores não são perceptíveis cicatrizes. […] Discussão: 1. Os elementos disponíveis permitem admitir a existência de nexo de causalidade entre as cirurgias realizadas e o estado actual apresentado (status pós-cirurgia estética ao nível da face) atendendo a que se confirmam os critérios necessários para o seu estabelecimento: existe adequação entre a sede das cirurgias e a sede das alterações resultantes, existe continuidade sintomatológica e adequação temporal entre as cirurgias e as alterações resultantes, o tipo de alterações resultantes é adequado à etiologia descrita, o tipo de cirurgia é causa adequada a produzir este tipo de alterações resultantes lesões e se exclui a existência de uma causa estranha. 2. A data da consolidação médico-legal das lesões é fixável em 14-11-2014, tendo em conta os seguintes aspectos: o tipo de lesões resultantes e o tipo de tratamentos efectuados e período de tempo apontado em perícia de psiquiatria para resolução do quadro de agravamento temporário de patologia desse foro. 3. No âmbito do período de danos temporários são valorizáveis, entre os diversos parâmetros do dano, os seguintes: - Défice Funcional Temporário (corresponde ao período durante o qual a vítima, em virtude do processo evolutivo das lesões no sentido da cura ou da consolidação, viu condicionada a sua autonomia na realização dos actos correntes da vida diária, familiar e social, excluindo-se aqui a repercussão na actividade profissional). Considerou-se o: - Défice funcional temporário total (… correspondendo com os períodos de internamento e/ ou de repouso absoluto), que se terá situado entre 17-02-2011 e 17-02-2011, entre 18-10-2012 e 18-10-2012, sendo assim fixável num período de 2 dias. - Défice funcional temporário parcial (… correspondendo ao período que se iniciou logo que a evolução das lesões passou a consentir algum grau de autonomia na realização desses actos, ainda que com limitações), que se terá situado entre 18-02-2011 e 17- 10-2012, entre 19-10-2012 e 14-11-2014, sendo assim fixável num período 1365 dias. Quantum doloris (corresponde à valoração do sofrimento físico e psíquico vivenciado pela vítima durante o período de danos temporários, isto é, entre a data do evento e a cura ou consolidação das lesões); fixável no grau 4 numa escala de sete graus de gravidade crescente, tendo em conta as lesões resultantes, o período de recuperação funcional e os tratamentos efectuados. 4. No âmbito do período de danos permanentes são valorizáveis, entre os diversos parâmetros de dano, os seguintes: - Dano estético permanente (corresponde à repercussão das sequelas, numa perspectiva estática e dinâmica, envolvendo uma avaliação personalizada da afectação da imagem da vítima quer em relação a si próprio, quer perante os outros). É fixável no grau 3, numa escala de sete graus de gravidade crescente, tendo em conta os seguintes aspectos: a alteração da facial e as cicatrizes. Conclusões: - A data da consolidação médico-legal das lesões é fixável em 14-11-2014 - Período de défice funcional temporário total sendo assim fixável num período de 2 dias - Período de défice funcional temporário parcial sendo assim fixável num período 1365 dias - Quantum Doloris fixável no grau 4/7 - Dano estético permanente fixável no grau 3/7”.» 1.74. O relatório da perícia médico-legal da especialidade de psiquiatria junto aos autos (em 22.11.2017) contém as seguintes passagens: “[…] Exame do estado mental: […] A examinanda apresenta sintomatologia ansiosa, irritabilidade e desconforto pelo facto de o resultado da cirurgia não satisfazer as expectativas que tinha quando decidiu optar pelo tratamento. […] Discussão: […] Após o tratamento e acompanhamento ao longo de cerca de um ano terá constatado que o resultado do tratamento não cumpria as expectativas da examinanda acerca do mesmo, tendo conduzido a uma rotura da relação e da confiança terapêutica. Em 2014, iniciou acompanhamento em internamento parcial de psiquiatria por sugestão da sua médica assistente de medicina geral e familiar, por sintomatologia ansiosa e depressiva, tendo feito tratamento com melhoria clínica. A examinanda apresenta antecedentes de acompanhamento em consulta de psiquiatria, no ano de 1993/1994, por sintomatologia depressiva reactiva a perda afectiva. Actualmente, apresenta um exame do estado mental normal e sem evidência de sintomatologia psicopatológica. Conclusões: É de admitir um agravamento temporário do estado prévio o qual foi adequadamente tratado do ponto de vista psiquiátrico, de Abril a Novembro de 2014, findo o qual é de considerar que retomou um estado clínico sobreponível ao que apresentava anteriormente à situação em apreço. Da análise da entrevista clínica, do exame do estado mental e da consulta de registos clínicos constantes de peças processuais não é observável qualquer alteração susceptível de se constituir como dano psíquico permanente, decorrente do evento em apreço.”» «Em sede de esclarecimentos ao referido relatório o médico-legista, por referência ao assinalado sob a epígrafe “discussão” e no respectivo ponto 1, fez constar o seguinte: “(…) do ponto de vista médico legal, com os elementos disponíveis, o estado actual apresentado ao nível da face resulta dos tratamentos de cirurgia plástica realizados, com a consequente alteração da face da examinada e consequente necessidade de avaliação de dano corporal resultante. É evidente a diferença pré e pós tratamentos em questão, amplamente documentada na fotodocumentação existente nos autos.”» 1.75. O parecer técnico-científico do Conselho Médico-Legal, relatado por especialista em Cirurgia Plástica e Reconstrutiva e aprovado em reunião do Conselho por unanimidade, contém as seguintes passagens: “1- Os actos cirúrgicos levados a efeito pelo 2º Réu no rosto da Autora foram os adequados e correctos face à legis artis da medicina plástica reconstrutiva e representam um lifting cervico-facial tal como a A. autorizou, ou são outro tipo de acto médico? Qual? Resposta: O que consta dos registos cirúrgicos foi que o procedimento cirúrgico foi um lifting temporal depreende-se contudo que a autorização dada pela A. para a realização de um lifting cervico-facial engloba a cirurgia realizada. Entende-se assim que o acto médico realizado corresponde à legis artis da cirurgia plástica e reconstrutiva. 2- O acto médico operado no rosto da A. foi desenvolvido com competência e conhecimento e respeito pelos procedimentos médicos adequados e recomendados? Resposta: Do que consta dos registos clínicos o acto médico foi realizado com competência, conhecimento e com os procedimentos médicos adequados. 3- Uma intervenção cirúrgica ao rosto, com os objectivos referidos 6 e 7 desta P.I., levada a acabo por profissional devidamente habilitado, competente, e conhecedor da legis artis da medicina plástica reconstrutiva, causaria as cicatrizes e as alterações ao rosto da A. tal como referidas de 22 a 28 desta P.I.? Resposta: A descrição das cicatrizes realizada na perícia médico-legal do INMLCF delegação do Norte leva-nos a afirmar que estas são compatíveis com a cirurgia realizada.» VI. Matéria de direito: Em sede de matéria de direito a recorrente defende que se encontram reunidos todos os pressupostos da obrigação de indemnizar a cargo dos réus, sendo o facto ilícito, no caso, a omissão do resultado que constituía o objectivo da cirurgia estética contratada pela autora. Vejamos. Resulta da matéria de facto que a autora contratou com o réu D…, médico-cirurgião, a realização de uma cirurgia de natureza estética ao seu rosto, a qual foi executada nas instalações da Clínica ré, onde aquele médico desenvolve actividade médica de natureza privada. Temos assim que entre a autora e os réus foi celebrado um contrato que pode ser qualificado sem dificuldade como um contrato de prestação de serviços, definido no artigo 1154º do Código Civil como «aquele em que uma das partes se obriga a proporcionar à outra certo resultado do seu trabalho intelectual ou manual, com ou sem retribuição». Atenta a natureza e perigosidade dos actos cirúrgicos, o conhecimento científico que a sua execução pressupõe e envolve mas que está em contínuo desenvolvimento e evolução, os riscos que a actividade médica envolve necessariamente e ainda a circunstância de os actos serem praticados no corpo do paciente e, portanto, num organismo vivo que reage de forma múltipla e diferenciada a agressões exteriores, a obrigação que o médico assume não é, em regra, uma obrigação de resultado, mas sim uma obrigação de meios (não assim, por exemplo, quando o acto médico é, por exemplo, um exame, a execução e colocação de uma prótese ocular ou dentária, etc.). Essa afirmação visa assinalar, com recurso à distinção dogmática que a doutrina faz entre obrigação de resultado (em que o devedor se vincula a alcançar um determinado resultado) e obrigação de meios (em que o dever de prestação do devedor consiste apenas no desenvolvimento de todos os esforços e diligências para que o resultado se possa produzir), que em regra o médico se vincula a prestar ao paciente toda a informação necessária para que este possa decidir livremente consentir na intervenção a realizar, a proteger os interesses e a saúde do paciente, e, na execução do acto médico, a cumprir com zelo e rigor as legis artis próprias do acto, actuando com diligência, conhecimento científico, aptidão e perícia, mas não lhe é exigível que em qualquer caso o resultado visado seja alcançado pontualmente e sem quaisquer sequelas, intercorrências ou manifestações indesejadas. Quando, como aqui sucede, o trabalho acordado é a execução de actos médicos de natureza cirúrgica com o objectivo de introduzir alterações fisionómicas no corpo do paciente, no caso no rosto da autora, ordenadas pelo critério estético do paciente e, portanto, por vontade e decisão pessoal e não propriamente por necessidade médica ou conveniência clínica de curar qualquer doença ou vencer qualquer defeito ou limitação física, a questão do resultado visado assume um enfoque particular. No Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 17-12-2019, proferido no processo n.º 544/09.9YFLSB, disponível in www.dgsi.pt, o Exmo. Juiz Conselheiro Pires da Rosa emprestou a esta questão a bela sonoridade da figura da obrigação de quase resultado, afirmando que em cirurgia estética se a obrigação do médico não é «uma obrigação de resultado, com o médico a comprometer-se em absoluto com a melhoria estética desejada (e acordada entre ambos), é seguramente uma obrigação de quase resultado porque é obrigação em que só o resultado vale a pena. Só o resultado vale a pena, quer para a autora quer para o réu.». Descontando a heresia de uma figura de contornos indefinidos que perturba a valia da distinção dogmática entre obrigação de resultado e obrigação de meios, o que o Acórdão pretende sublinhar, e merece a nossa inteira concordância, é que para avaliar a prestação do médico e a sua conformidade com os termos do contrato, isto é, os termos em que se pode afirmar que ele cumpriu pontualmente a obrigação que assumiu, é necessário, no domínio da cirurgia estética puramente voluptuária, ter presente duas coisas. A primeira é a de que a pessoa decide submeter-se a essa cirurgia porque quer um resultado específico e porque acredita que ele lhe vai ser proporcionado. A segunda é a de que o médico que se dedica a essa actividade e aceita a incumbência do paciente apresenta-se perante este como sendo capaz de produzir o resultado desejado pelo paciente, ou seja, cria no paciente a expectativa de que o resultado será alcançado. A medicina estética é uma actividade médica mas quando ela se guia por critérios puramente estéticos e não corresponde a qualquer necessidade curativa ou reconstrutiva, ela é igualmente um negócio, no qual o médico se apresenta ao paciente como capaz de lhe proporcionar o resultado almejado e o leva a confiar nisso, bem sabendo que para o paciente o resultado é essencial, um objectivo em si mesmo. Esse respeito pela confiança gerada pelo próprio médico e pela essencialidade do resultado para o paciente não pode estar ausente no momento da fiscalização do cumprimento da obrigação a cargo do médico. Não se trata tanto, a nosso ver, de só o resultado interessar, mas mais da cabal apreensão do conteúdo do compromisso estabelecido entre as partes. A obrigação do médico não deixa nesse sentido de ser uma obrigação de meios porque a obtenção do resultado em si mesmo não é algo que dependa em absoluto do devedor, cujo processo de produção este possa controlar inteiramente e cuja não verificação lhe seja sempre imputável. Mas é uma obrigação em que os meios são apresentados como capazes de proporcionar o resultado desejado, sabendo-se da sua essencialidade para o credor, e portanto, em que na perspectiva dos contratantes existe uma probabilidade tal de se alcançar um resultado essencial e um compromisso de o alcançar, que se ele acaba por não se produzir o insucesso carece de ser explicado e justificado sob pena de se considerar que a obrigação (em sentido amplo) foi incumprida pelo devedor. Se o médico assumiu tácita ou expressamente esse compromisso, recai sobre ele o ónus de demonstrar porque não lhe deu concretização. Essa explicação pode consistir, por exemplo, na verificação de um risco adverso para o qual o paciente estava alertado, numa reacção que raramente acontece mas que no caso aconteceu de facto e o médico não conseguiu evitar, num comportamento do próprio paciente que afectou os resultados da cirurgia. Mas terá de ser dada, sob pena de se concluir no sentido do incumprimento, leia-se, no sentido da ilicitude contratual do comportamento do médico. No caso, a ilicitude do comportamento imputado ao réu vinha assente em aspectos bem diversos: a falta de competência profissional para o exercício da cirurgia estética (o réu não pode praticar estes actos porque não tem a especialidade de cirurgia plástica); a ausência da competência profissional que a autora procurava e pressupunha existir (o réu foi escolhido na convicção errónea de ser cirurgião plástico e não informou a autora desse aspecto); a violação das legis artis (por falta de engenho ou competência, o réu não aplicou na cirurgia as técnicas adequadas e próprias da arte, cuja aplicação teria evitado o resultado produzido); a execução de actos médicos sem o consentimento da autora (a autora subscreveu o consentimento informado para um acto médico e foi executado outro); a execução de modificações anatómicas em partes do rosto que a autora não autorizou que fossem alteradas (o réu modificou os olhos e a expressão facial, quando a autora apenas lhe pediu que eliminasse as bolsas existentes nas pálpebras inferiores, corrigisse as pálpebras superiores e levantasse a cauda da pálpebra); a produção de um resultado inestético (os actos praticados no rosto da autora geraram o aparecimento de cicatrizes inestéticas). Destes possíveis fundamentos de ilicitude do comportamento do réu, após o julgamento da matéria de facto, o único que subsiste é o último referido. A questão de saber se o réu podia praticar estes actos médicos tendo a especialidade de cirurgião-geral mas não a de cirurgia plástica está respondida em sentido afirmativo nos pontos 1.51 e seguintes. A questão de saber se a autora estava equivocada quanto à especialidade do réu não está reflectida em qualquer facto provado. A questão da violação das legis artis não encontra apoio em qualquer facto provado, sendo certo que o parecer técnico-científico do Conselho Médico-Legal da especialidade de Cirurgia Plástica e Reconstrutiva considerou que o acto médico realizado corresponde à legis artis da cirurgia plástica e reconstrutiva e foi realizado com competência, conhecimento e os procedimentos médicos adequados. O mesmo Conselho manifestou o entendimento de que o consentimento informado assinado pela autora é suficientemente amplo e abrangente para incluir os actos médicos concretamente realizados (o mini lifting temporal). Também não transparece da matéria de facto que o réu tenha executado modificações anatómicas em partes do rosto distintas daquelas que a autora pretendia alterar. Não está demonstrado com efeito que o réu tenha causado modificações ao nível dos olhos e da expressão facial da autora como esta se queixava. Está provado que a cirurgia de Fevereiro de 2011 (a primeira) provocou uma alteração dos traços pessoais da autora ao nível das pálpebras (facto 1.6), o que é absolutamente natural e era espectável porque a autora deseja precisamente alterar esses pontos específicos do seu rosto mediante a correcção das pálpebras superiores e a eliminação das bolsas (olheiras) existentes nas pálpebras inferiores. Está ainda provado que a cirurgia de Outubro de 2012 (factos 1.3 e 1.4) provocou igualmente uma alteração dos traços do rosto (facto 1.15), mas se a autora pretendia o levantamento das sobrancelhas e isso foi alcançado (facto 1.27), parece não poder deixar de se concluir que a alteração da fisionomia do rosto era inevitável. Coisa diferente consistia em saber se as alterações produzidas são excessivas, se as correcções pretendidas pela autora podiam e deviam ter sido executadas com menor repercussão ao nível das modificações no rosto, se era possível um cirurgião ter mexido nas zonas desejadas pela autora (as pálpebras e as sobrancelhas) modificando menos o rosto da autora, rectius, deixando intocado e inalterado o restante do rosto da autora. A matéria de facto não permite essa discussão, sendo certo que a mesma não passaria pelo critério subjectivo da autora, mas sim pelo critério do cirurgião normalmente apto e capaz, conhecedor e aplicador das melhores técnicas, e sobre isso não existe qualquer facto provado que permita sequer colocar a questão. Resta pois a circunstância, indesmentível, de a cirurgia ter causado o aparecimento de cicatrizes inestéticas no rosto da autora. A produção de um resultado inestético não é, evidentemente, o que se pretende com uma cirurgia estética, designadamente na parte mais visível e notória do corpo humano que é o rosto, pelo que numa cirurgia estética de natureza voluptuária, esse resultado consubstancia sempre um incumprimento da obrigação do médico. O corte na epiderme gera sempre uma cicatriz porque esta é a área de tecido fibroso que se produz durante o processo de cicatrização na zona onde o corte foi feito. O facto de as cicatrizes serem inevitáveis apenas significa que a pele cortada durante a execução da cirurgia tem de cicatrizar, mas não implica que o processo de cicatrização deixe marcas inestéticas notórias. Existem, com efeito, cicatrizes que são praticamente invisíveis ou que resultam de técnicas cirúrgicas irrepreensíveis que evitam que elas deixem marca. No caso, por exemplo, as cicatrizes dos cortes que o réu fez nas pálpebras não se notam, apenas se notam as que foram feitas na região fonto-temporal. O facto de as cicatrizes serem compatíveis com os actos cirúrgicos realizados apenas significa, se bem interpretamos o parecer onde isso é afirmado, que está excluído que as cicatrizes tenham outra causa que não os actos médicos próprios da cirurgia estética que o médico realizou, o lifting facial. Também não significa, portanto, que uma cirurgia estética desta natureza e finalidade cause necessariamente cicatrizes com o aspecto inestético que estas possuem. O facto de o aparecimento de cicatrizes inestéticas ou de cor diferente à da pela circundante constituir um dos riscos do lifting facial anunciados como possíveis no consentimento informado assinado pela autora não é, por si mesmo, suficiente para excluir a ilicitude desse resultado. Com efeito, mesmo que num determinado contexto haja consequências que podem ocorrer ainda que as técnicas utilizadas tenham sido as melhores e executadas de forma adequada, a causa directa de uma consequência concreta pode ser, afinal de contas, a má execução da cirurgia, o desrespeito das legis artis, a falta de engenho ou arte do cirurgião. Portanto, o que importa saber não é se as cicatrizes são um risco da cirurgia, mas sim se a causa delas está fora do poder-dever de controlo do médico, isto é, se elas se produziram não obstante o médico ter actuado com zelo, arte e engenho, no respeito absoluto das legis artis. Por outras palavras, havendo um resultado indesejado, para excluir a ilicitude da sua conduta que está na génese do resultado o médico necessita de demonstrar que ele foi efectivamente fruto dos riscos associados à cirurgia que realizou, isto é, dos imponderáveis da mesma, dos factores incontroláveis que a cirurgia convoca. Para isso necessita de demonstrar que quanto aos factores que podia e devia controlar a sua actuação não merece qualquer censura. Como essa demonstração não foi feita, entendemos estar perante um ilícito contratual (um incumprimento ou cumprimento defeituoso da prestação) e que essa ilicitude não foi excluída. Sucede, contudo, que no tocante às cicatrizes se provou que na sequência das queixas da autora o réu se propôs executar um tratamento a laser das cicatrizes. O tratamento a laser é um procedimento médico através do qual se pode reduzir o aspecto e a notoriedade das cicatrizes. Acresce que tal procedimento deverá pressupor a prévia estabilização das cicatrizes para poder determinar com rigor o que fazer e como fazer, pelo que não podia ser feito imediatamente após a cirurgia estética. Sendo assim, uma vez que a autora recusou a execução desse procedimento e não se encontra demonstrado nos autos nenhum motivo válido para essa atitude (v.g. que no caso o tratamento não surtiria efeito, surtiria efeitos mais gravosos ou era clinicamente desaconselhado), acabou por ser afinal a autora a impedir o réu de sanar, na medida do possível, o aparecimento do referido efeito inestético indesejado. Ora, dispõe o artigo 570º, n.º 1, do Código Civil que «quando um facto culposo do lesado tiver concorrido para a produção ou agravamento dos danos, cabe ao tribunal determinar, com base na gravidade das culpas de ambas as partes e nas consequências que delas resultaram, se a indemnização deve ser totalmente concedida, reduzida ou mesmo excluída». No caso, considerando que é apenas essa a falha do réu, que essa falha corresponde a um risco de que a autora estava informada, que não foi sequer alegado qualquer motivo para a autora recusar o tratamento que podia eliminar o aspecto inestético das cicatrizes, que houve consequências psicológicas (dano) para a autora que são em parte atribuíveis a características da sua própria personalidade, e que é impossível distinguir as consequências das cicatrizes das consequências de todas as restantes queixas subjectivas da autora que não se demonstraram ou que foram mesmo excluídas, entendemos, ao abrigo daquela norma legal, não atribuir qualquer indemnização à autora pelo dano corporal consubstanciado nas cicatrizes que a mesma possui no respectivo rosto e pelos danos psicológicos decorrentes da reacção ao aspecto inestético dessas cicatrizes. Nesses termos, improcede o recurso. VII. Dispositivo: Pelo exposto, acordam os juízes do Tribunal da Relação em julgar o recurso improcedente e, em consequência, negando provimento à apelação, confirmam a sentença recorrida. Custas do recurso pela recorrente, a qual vai condenada a pagar aos recorridos, a título de custas de parte, a taxa de justiça suportada por estes e eventuais encargos. * Porto, 17 de Junho de 2021.* Aristides Rodrigues de Almeida (R.to 620)Os Juízes Desembargadores Francisca Mota Vieira Paulo Dias da Silva [a presente peça processual foi produzida com o uso de meios informáticos e tem assinaturas electrónicas qualificadas] |