Acórdão do Tribunal da Relação do Porto
Processo:
2672/20.0T8PRT.P1
Nº Convencional: JTRP000
Relator: ISABEL FERREIRA
Descritores: CONTRATO-PROMESSA DE COMPRA E VENDA
INTERPELAÇÃO
RESOLUÇÃO DO CONTRATO
CONSENTIMENTO DO CÔNJUGE
SINAL
Nº do Documento: RP202305182672/20.0T8PRT.P1
Data do Acordão: 05/18/2023
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: REVOGADA EM PARTE
Indicações Eventuais: 3ª SECÇÃO
Área Temática: .
Sumário: I – Constitui um termo essencial subjectivo absoluto a cláusula inserida em contrato-promessa de compra e venda de acordo com a qual, não sendo a escritura definitiva marcada dentro do prazo fixado no contrato, se considera, “independentemente de interpelação, imediatamente resolvida a presente promessa de compra e venda”.
II – O cônjuge que deve prestar o seu consentimento à venda, por força do regime de bens do casamento, não assume a posição de promitente-vendedor no contrato-promessa de compra e venda, pelo que, em caso de incumprimento do contrato, não tem obrigação de devolver o dobro do sinal.
Reclamações:
Decisão Texto Integral: Processo nº 2672/20.0T8PRT.P1
(Comarca do Porto – Juízo Local Cível do Porto – Juiz 2)

Relatora: Isabel Rebelo Ferreira
1ª Adjunta: Deolinda Varão
2ª Adjunta: Isoleta Costa
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Acordam no Tribunal da Relação do Porto:

I AA intentou, no Juízo Local Cível do Porto do Tribunal Judicial da Comarca do Porto, acção declarativa, com processo comum, contra BB, CC e DD, pedindo que:
- se declare ilícita e de má-fé a resolução contratual alegadamente operada pelos RR.;
- se considere o contrato-promessa definitivamente incumprido por culpa exclusiva dos RR.;
- se condenem os RR., solidariamente, a restituir ao A. o sinal recebido, em dobro nos termos legais e contratuais, no montante de € 40.000.00, acrescido de juros, à taxa legal, desde a citação até integral pagamento;
- se condenem os RR. no pagamento das despesas com o agendamento da escritura na qual não compareceram por sua culpa exclusiva, no montante de € 184,50, acrescido de juros, à taxa legal, desde a citação até integral pagamento.
Alegou para tal que celebrou com os RR. um contrato-promessa de compra e venda relativo ao imóvel identificado no art. 1º da petição inicial, que estes prometeram vender e o A. prometeu comprar, pelo preço de € 150.000,00, do qual a quantia de € 20.000,00 foi paga, a título de sinal e princípio de pagamento, na data da assinatura do contrato-promessa, sendo o restante a pagar no acto da escritura de compra e venda, que deveria ter lugar até ao dia 15/10/2019, e que comunicou, por intermédio de duas cartas dirigidas aos promitentes-vendedores, a marcação da escritura definitiva para o dia 10/10/2019, tendo a 2ª R. recebido a que foi enviada para a sua morada, e não tendo o 1º R. procedido ao levantamento da carta a si dirigida na respectiva caixa de correio.
Alegou ainda que compareceu no Cartório Notarial designado na data marcada, não tendo ali comparecido qualquer dos RR., suportando o A. os custos inerentes ao agendamento da escritura, no montante de € 184,50, que, logo em seguida, recebeu as notificações enviadas pelos RR., onde estes declaravam definitivamente resolvido o contrato-promessa, invocando que o A. não havia notificado o 3º R., cunhado do 1º R. e marido da 2ª R., não obstante aquele residir com esta e só intervir no contrato como “autorizante”, por força do regime de bens do casamento, e que, não obstante, remeteu uma carta a cada um dos três RR., onde manifestava o seu interesse na conclusão do negócio ou que lhe devolvessem a quantia paga a título de sinal, não tendo recebido qualquer resposta, apenas constatando depois que o imóvel foi novamente colocado à venda, através de outra agência imobiliária.
Os 2ª e 3º RR. contestaram, impugnando os factos alegados pelo A. para fundamentar a sua pretensão e alegando que o prazo de 15/10/2019 era uma data limite, pelo que não tendo sido outorgada a escritura pública, ocorreu a resolução imediata do contrato-promessa logo após essa data.
O 1º R. contestou, impugnando os factos alegados pelo A. para fundamentar a sua pretensão e invocando a essencialidade dos prazos estabelecidos, tendo a data da realização do contrato definitivo sido fixada em 15/10/2019, sob pena de resolução imediata do contrato-promessa.
O A. respondeu, impugnando a versão apresentada pelos RR. nas suas contestações e defendendo que invocar a eventual falta de notificação do 3º R. da data marcada para a realização da escritura definitiva como justificação da resolução automática do contrato-promessa constitui abuso de direito.
Foi dispensada a realização da audiência prévia, foi elaborado despacho saneador, fixou-se o objecto do litígio e enunciaram-se os temas da prova.
Procedeu-se seguidamente a julgamento.
Após, foi proferida sentença, na qual se decidiu julgar a acção parcialmente procedente e, em consequência:
a) declarou-se “ilícita a resolução operada pelos Réus do contrato promessa de compra e venda celebrado com o Autor”;
b) considerou-se “o contrato promessa de compra e venda celebrado entre Autor e Réus definitivamente incumprido pelos Réus”; e
c) condenou-se os RR. a pagar ao A. a quantia de € 40.000.00, “a título de dobro do sinal, acrescido de juros de mora, à taxa legal, desde a citação até integral e efetivo pagamento”.
Desta decisão vieram os RR. interpor recurso, tendo, na sequência da respectiva motivação, apresentado as seguintes conclusões (!), que se transcrevem:
«I – DA NULIDADE DA SENTENÇA
1.ª – O contrato promessa de compra e venda a que se referem os presentes autos, foi resolvido, pelos ora apelantes, com fundamento na circunstância do Recorrente DD não ter sido convocado para a escritura pública de compra e venda que o apelado designou para o dia 10 de Outubro de 2019, o que, atento o teor das Cláusulas 4.ª, números 1, 2, 4 e, bem assim, da Cláusula 8.ª, que prevê a forma de comunicação de tal convocatória, determinariam a resolução automática do aludido contrato, já que o promitente comprador e Segundo Contraente no Contrato Promessa de Compra e Venda, excederia, em caso de reagendamento, o prazo limite, absoluto, de 15 de Outubro de 2019;
2.ª - Mais sucedeu que foi também expressamente articulado na contestação dos apelantes CC e DD que, previamente à iniciativa de resolução, o apelado recebeu em 8 de Outubro de 2019, uma comunicação por carta registada com aviso de recepção do apelante DD, em conformidade com a qual ocorreu a sua falta de notificação prévia para a escritura marcada para a aludida data de 10 de Outubro de 2019, sendo que nesta tinha já compromissos profissionais inadiáveis e que iria averiguar das consequências da sua ausência de convocação;
3.ª – O exposto nas conclusões que precedem, encontra-se consubstanciado no texto do contrato promessa de compra e venda junto como documento n.º 1 com a petição inicial, das comunicações juntas sob os números 6, 7 e 8, com essa mesma peça; quanto à contestação do apelante BB, cfr. o teor dos factos articulados nos artigos 3.º, 4.º, 12.º a 24.º (ambos inclusive), 46.º, 48.º, todos da sua contestação; quanto à contestação dos apelantes CC e DD, cfr. o teor dos artigos 2.º a 10.º, 16.º a 22.º, 36.º, 37.º, 44.º, 53.º a 61.º, dessa peça, além dos documentos juntos com a mesma sob os números 1, 2 e 3, com a mesma;
4.ª – Compulsada a sentença sob recurso, irrelevam-se, na totalidade, tais questões em matéria de facto e de direito, suscitadas pelos ora Recorrentes, o que determina nulidade da mesma por omissão de pronúncia, nos termos das disposições conjugadas dos artigos 607.º, n.º 4, (V.1) 608.º, n.º 2 e 615.º, números 1, alínea d), 1.ª parte e 4, todos do CPC;
5.ª – Quanto à matéria de facto não provada (alíneas a) e b) da fundamentação), que nenhuma oposição tem com a que se considerou provada e se enquadra na interpretação e integração de negócio jurídico, na boa fé das partes na celebração e execução do contrato promessa identificado nos pontos 1. a 5. da matéria de facto provada e de eventual abuso de direito das mesmas quanto às pretensões emergentes de tal relação contratual – artigos 226.º, 227.º, 239.º, 762.º, n.º 2 e 334.º, todos do CC , a sentença é totalmente omissa na respectiva motivação, tornando-a absolutamente insindicável, em violação do disposto no artigo 607.º, n.º 4, do CPC, tornando-a nula;
II – ERRO DE JULGAMENTO - (Da preterição da prova documental produzida)
6.ª - Encontra-se ausente da matéria de facto da sentença sob recurso a forma como se encontram identificadas as partes, em que qualidade outorgam e os respectivos domicílios, sendo certo que tal observa as mais sérias consequências no clausulado contratual (Cláusula 4.ª, em especial os seus números 2 e 4, e Cláusula 8.ª, todos do contrato promessa de compra e venda, tudo em matéria de comunicações por carta registada com aviso de recepção) e para a matéria de facto, a tal propósito, articulada pelos apelantes CC/DD nos artigos 5.º, 6.º, 8.º, 15.º, 16.º, 36.º, 67.º e 68.º da sua contestação e bem assim para a matéria de facto articulada pelo apelante BB nos artigos 3.º, 6.º, 7.º, 8.º, 16.º, 17.º, 18.º, 20.º, 21.º, 22.º, 33.º e 73.º, todos da sua contestação.
7.ª – A matéria de facto mencionada na conclusão que antecede, encontra-se expressamente articulada pelos Recorrentes CC/DD nos artigos 10.º, 14.º, 16.º e 49.º da sua contestação e articulada pelo Recorrente BB nos artigos 6.º e 13.º da sua contestação;
8.ª – Em consequência, e porque se trata de matéria que consta do documento junto sob o número 1 com a petição inicial, o qual faz prova plena quanto às declarações proferidas pelos seus autores (artigos 363.º, números 1 e 2, última parte e 376.º, números 1 e 2, ambos do Código Civil), nos termos do disposto no artigo 607.º, n.º 4, do CPC, deve incluir-se nos factos provados que
“Na indicação dos outorgantes do contrato referido em 1., os Réus estão todos identificados como Primeiros Contraentes e o Autor como Segundo Contraente, tendo o Réu BB residência na Rua ..., ..., 1.º Direito, no Porto e os Réus CC e DD, na Rua ..., ..., 1.º Direito, no Porto, ambos casados em comunhão de adquiridos, aquela Ré, tal como o 1.º Réu, ambos também referidos como Promitentes Vendedores e aquele como Parte Autorizante; o Autor AA, vem identificado com residência na Praça ..., ..., ..., ..., também na qualidade de Promitente Comprador.”
9.º – Não obstante regular contratualmente matéria que é controvertida entre as partes, a sentença recorrida, na matéria de facto que se impõe seja provada, omite o teor das cláusulas da promessa de compra e venda em matéria de prazos (salvo o que laconicamente consta do Ponto 5. dos Factos Provados), as consequências resolutivas automáticas da respectiva inobservância, forma a observar nas comunicações entre as partes e da antecedência com que era obrigação do Recorrido comunicar todos os Primeiros Contraentes (todos os Recorridos) para a escritura de compra e venda – cfr. Cláusula 4.ª, números 1, 2 e 4 e 8.ª, do contrato promessa “sub iudice”;
10.ª – Em consequência, aos Factos Provados na sentença sob recurso deve ser aditado o teor integral dos números 1, 2 e 4 da Cláusula 4.ª e da Cláusula 8.ª, tendo aquela violado, ao assim não decidir, a força probatória que aos documentos particulares deve ser reconhecida (o documento junto sob o n.º 1 com a petição inicial) contra os Recorrentes e o Recorrido, verificando-se a omissão na decisão de factos que necessariamente se devem considerar provados e são essenciais à causa de pedir e às excepções deduzidas (artigos 363.º, números 1 e 2, última parte e 376.º, números 1 e 2, ambos do CC e artigos 5.º, n.º 1 e 607.º, n.º 4, ambos do CPC);
11.ª – Porque manifestamente relevante e especificador em matéria de prazos e das obrigações de todas as partes na promessa de compra e venda, à matéria de facto provada devem ser aditados os seguintes factos instrumentais:
a) “O Autor, Segundo Contraente no Contrato Promessa de Compra e Venda, teve ao seu dispor um prazo que começou no dia 26 de Julho de 2019 e se prolongou até 15 dias antes da data de 15 de Outubro de 2019, para comunicar por carta registada com aviso de recepção, aos Primeiros Contraentes, além do local para a realização da escritura pública de compra e venda, o respectivo dia e hora que não poderiam coincidir com os primeiros 45 dias após a outorga do aludido contrato.” e,
b) (aditando-se ao Ponto 4. dos Factos Provados) “4. O prédio em causa seria vendido livre de quaisquer ónus e/ou encargos e livre de pessoas e de coisas”.
12.ª – Com efeito, o facto que se identifica sob a alínea a) na conclusão que antecede, é o que resulta das disposições conjugadas das Cláusulas 4.ª, números 1 e 2, e 8.ª, da promessa de compra e venda (documento n.º 1 com a petição inicial), contém-se de igual modo nos articulados pelos Recorrentes nas respectivas contestações (artigos 3.º, 4.º, 20.º a 23.º e 96.º, todos da contestação dos Recorrentes CC/DD e nos artigos 22.º a 24.º, da contestação do apelante BB), sobre os mesmos se pôde pronunciar o Recorrido em resposta, pelo que deve ser aditado à matéria de facto provada, mesmo nesta instância de recurso, nos termos do disposto no artigo 5.º, n.º 2, alíneas a) e b), 607.º, n.º 4 “ex vi” artigo 663.º, n.º 2, todos do CPC;
13.ª - O facto que se identifica sob a alínea b) da conclusão 11.ª -, resulta da prova documental produzida em matéria de prazos e da própria posição do Recorrido expressa em correspondência que enviou aos Recorrentes em que afirma ser a mudança de habitação um “imperativo” (documento junto sob o n.º 1 com a petição inicial, Cláusula 4.ª, n.º 1; documentos juntos sob os números 9, 10 e 11), encontra-se explicitamente articulado pelas partes (contestação de CC e DD - artigos 88.º a 93.º; contestação de BB – artigos 60.º a 70.º), tendo de igual o apelado tido sobre ele a oportunidade de se pronunciar, não o impugnando na sua resposta, configurando-se, ainda, como fundamental para a apreciação da resolução da promessa de compra e venda, pelo que deve ser aditado ao Ponto 4. da matéria de facto provada, mesmo nesta instância de recurso, nos termos do disposto no artigo 5.º, n.º 1 e n.º 2, alíneas a) e b), 607.º, n.º 4 “ex vi” artigo 663.º, n.º 2, todos do CPC;
14.ª - Violou a sentença recorrida a força probatória plena, prevista nos artigos 363.º, números 1 e 2, última parte e 376.º, números 1 e 2, ambos do Código Civil, produzida pelos documentos particulares juntos sob os números 1, 2 e 3 com a contestação dos Réus CC/DD , ao omiti-los totalmente na matéria de facto provada, e no quais o marido da 2.ª Ré adverte o Recorrido por carta registada com aviso de recepção que este recebeu em 8 de Outubro de 2019, que não foi convocado para a escritura por este marcada para dia 10 de Outubro de 2019, que nesta data tinha compromissos profissionais inadiáveis e, como tal, não iria comparecer à mesma, além de que não havia, sequer, sido realizado qualquer contacto informal prévio para agendamento;
15.ª – A matéria de facto da conclusão que antecede, é relevante no que concerne às obrigações que emergem para o Recorrido das Cláusulas 4.ª, n.º 2 e 8.ª do contrato promessa, constantes do documento número 1 junto com a petição inicial, tendo presente a força obrigatória deste contrato e dos deveres impostos pela boa fé (artigos 406.º, n.º 1 e 762.º, ambos do Código Civil), resultando assim também violado, na decisão proferida, o disposto no artigo 607.º, n.º 4, do CPC.
16.º – Embora fundamental para efeitos de aplicação das disposições conjugadas dos artigos 808.º, n.º 1 e 442.º, n.º 2, ambos do Código, no que concerne à pretensão do Recorrido à restituição do sinal em dobro (XX.1), omite-se nos factos provados da sentença sob recurso que este, nos documentos que juntou sob os nú[i]meros 9, 10 e 11 com a petição inicial, além do que consta do Ponto 14. dos factos provados, admitiu não ter realizado a convocatória do Réu marido DD para a escritura, considerando-o convocado pelo simples facto de este residir com a 2.ª Ré, e intimou todos os Recorrentes a que fosse obrigação destes a marcar nova data para a escritura até ao final do mês de Outubro de 2019, sob pena de vir a exigir que devolvessem o dobro do sinal passado;
17.ª – Os documentos 9, 10 e 11 da conclusão que antecede, fazem prova plena quanto às declarações proferidas pelo seu autor (artigos 363.º, números 1 e 2, última parte e 376.º, números 1 e 2, ambos do Código Civil), que é o aqui recorrido, devendo o que neles se menciona e também resulta articulado no artigos 35.º e 62.º da contestação de CC e DD, ser aditado à matéria de facto provada, mesmo nesta instância de recurso, nos termos do disposto no artigo 5.º, n.º 1 e n.º 2, alíneas a) e b), 607.º, n.º 4 “ex vi” artigo 663.º, n.º 2, todos do CPC;
(Da contrariedade da matéria de facto provada
com a prova documental produzida)
18.ª – O Ponto 7. dos Factos Provados, deve ser considerado não escrito na parte conclusiva da respectiva redacção, em que se escreve “(...) dando-lhes conta de que, tal como estabelecido na cláusula quarta e com a antecedência mínima ali definida,(...)”, já que nele se decide se a forma observada em certa comunicação em ordem à determinação da respectiva validade e eficácia se enquadra e respeita disposição legal ou contratual, constituindo, portanto, matéria de direito (XXIV.1), violando do disposto no artigo 607.º, n.º 4, “a contrario sensu”, do CPC (XXIV.2);
19.ª - Nos termos das disposições conjugadas das Cláusulas 4.ª, n.º 2 e 8.ª, do contrato promessa de compra e venda, para efeitos de comunicações para a convocação para a escritura, ajustaram todos os outorgantes a forma de carta registada com aviso de recepção, o que, nos termos e para efeitos do disposto no artigo 345.º, do CC, significa que a prova das mesmas comunicações apenas se faz quando realizada por aquele mesmo meio e não por qualquer outro meio de prova, consubstanciando uma formalidade “ad substantiam”;
20.ª – Neste âmbito, o depoimento de parte da Recorrente CC, na parte em que reconhece ter recebido a única carta cujo texto consta do documento n.º 2 com a petição inicial (documento esse integrado por mais dois avisos de recepção) e com motivação no qual se também firmou parte do teor do Ponto 7. dos Factos Provados, padece de erro-obstáculo na declaração (artigo 247.º, do Código Civil), aliás notório, que assim vai expressamente arguido, nos termos e para efeitos do artigo 359.º, do Código Civil;
21.ª - Com efeito, essa mesma carta/texto (documento 2 com a p.i) tem como morada de destino a Rua ..., ..., 1.º Direito, ... Porto, a qual, no lugar do contrato promessa de compra e venda (documento 1 com a p.i.) reservado à identificação dos Primeiros Contraentes, unicamente corresponde à do Recorrente BB, enquanto que a morada da depoente, enquanto Primeira Contraente da aludida promessa, é a Rua ..., ..., 1.º Direito, ... Porto, correspondendo, por conseguinte, à que nunca foi levantada e devolvida ao remetente, como consta do Ponto 8. dos Factos Provados (cfr. aviso de recepção não assinado que consta do documento 2 junto com a p.i);
22.ª – Como claramente resulta da transcrição do depoimento gravado (Excerto A, Ponto XXVI) das presentes Alegações, a Recorrente CC confessou ter recebido uma carta que vinha com o nome do seu irmão em primeiro lugar, o Recorrente BB, e com o seu nome em segundo lugar, a qual, tendo sido por ela recebida, naturalmente, só poderia conter como morada de destino a Rua ..., ..., 1.º Direito, ... Porto;
23.ª - Na dinâmica do interrogatório tendente à prestação de depoimento de parte da Recorrente CC, a própria Mm.ª Juíza “a quo” – porventura atenta a manifesta confusão que as comunicações do Recorrido determinam – conjecturou que a depoente se estava a referir à única carta/texto que consta do documento número 2 com a petição, tendo-a erroneamente confrontado com a mesma, quando, na realidade, a mesma contém como morada de destino a Rua ..., ..., 1.º Direito, ... Porto e que a mesma depoente, posteriormente, no mesmo depoimento, declara que não recebeu nem levantou;
24.ª - A não se considerar assim, resultaria violada a prova por documento particular, aquela que resulta do texto da única carta/texto que consta do documento n.º 2 com a petição inicial com a força que lhe é reconhecida nos artigos 363.º, números 1 e 2, última parte e 376.º, números 1 e 2, ambos do Código Civil, o que tornaria inadmissível o depoimento de parte – o facto de uma carta que não tem a sua morada de residência como destino, nem sequer lhe é um facto pessoal - prestado pela Recorrente, nos termos do disposto no artigo 354.º, alínea a), do CC; (XXVIII.1)
25.ª - Atento o exposto quanto ao depoimento de parte da Recorrente CC, cujos termos resultam do Excerto A, Ponto XXVI do corpo das presentes Alegações (CC, depoimento de parte prestado no dia 17/03/2022 - gravado em dois ficheiros áudio distintos Ficheiro 1 -20220317105614_15652748_2871486.wma / Ficheiro 2 - 20220317105952_15652748_2871486.wma, no sistema Habilus Media Studio Início do depoimento 10horas:56minutos:15 segundos e Fim do Depoimento 11horas:24minutos:33segundos, sendo que o EXCERTO A, em causa, se situa no Ficheiro 2 – 20220317105952_15652748_2871486.wma, com Início aos 3minutos:27segundos e Fim 08minutos:08segundos), nos termos e para efeitos do disposto nas alíneas a), b) e c) do n.º 1 do artigo 640.º, do CPC, expressamente se consigna que
• O teor do Ponto 7. dos Factos Provados contraria o referido depoimento de parte da Recorrente CC, que meramente se referiu à carta enviada para o respectivo domicílio, sito Rua ..., ..., 1.º Direito, ... Porto;
• O teor do Ponto 7. dos Factos Provados, deve ser substituído por outro que assuma o sentido seguinte:“O Autor, AA, Segundo Contraente no Contrato Promessa de Compra e Venda, enviou em 20 de Setembro de 2019 por carta registada com aviso de recepção, recebida em 24 de Setembro de 2019, uma comunicação aos Réus BB e CC, Primeiros Contraentes no mesmo contrato, com morada de destino para a Rua ..., ..., 1.º Direito, ... Porto, em conformidade com a qual, invocando o Ponto 2. da Cláusula quarta do contrato-promessa oportunamente celebrado, designava o dia 10 de Outubro de 2019, pelas 11 horas, o Cartório Notarial Dra. EE, sito na Praça ..., ..., 4.º andar, ... Porto, para a outorga da escritura pública”.
26.ª – Em consequência das alterações a impor ao Ponto 7. dos Factos Provados, por respeito à prova que nos termos do artigo 607.º, n.º 4, do CPC, se deve considerar produzida o Ponto 8. dos Factos Provados, deve assumir o seguinte teor: “O Autor enviou igual comunicação referida em 7., com morada de destino para a Rua ..., ..., 1.º Direito, ... Porto, a qual não foi levantada.”;
27.ª - O teor do facto provado sob o n.º 13, ressalvada a referência nele feita à resolução da promessa de compra pelos Recorrentes, nenhuma correspondência tem com o teor dos documentos juntos sob os números 6, 7 e 8 com a petição inicial, já que o que nestas comunicações se invoca como fundamento para a resolução, além da ausência de convocação do Primeiro Contraente DD, foi a inevitabilidade do prazo limite, absoluto, de 15 de Outubro de 2019, vir a ser ultrapassado, face às Cláusula 4.ª, n.ºs 1, 2 e 4 e à Cláusula 8.ª, atenta a obrigação do Recorrido que era dele, e só dele, em marcar a escritura de venda definitiva, sendo que isso quase durou 2 meses e não cumpriu;
28.ª – A tais fundamentos, comuns aos documentos 6, 7 e 8 juntos com a petição inicial, acresceram os que vão indicados na alínea E) do documento junto n.º 6, da autoria do Recorrente BB, os quais consubstanciam a total ausência de contactos do Recorrido até ao envio anómalo e de comunicações para a escritura, em grave violação da boa fé que de igual modo deve imperar nas relações jurídicas obrigacionais (artigo 762.º, n.º 2, do CC);
29.º – O facto provado sob o n.º 13 é, por conseguinte, ausente de qualquer correspondência ou sequer semelhança com o teor dos documentos juntos sob os números 6, 7 e 8 com a petição inicial e, bem assim, com o do próprio documento junto sob o n.º 1 com a mesma peça, já que, no contrato promessa, o Recorrente DD é nele Primeiro Contraente, casado em comunhão de adquiridos com a Recorrente CC, tão responsável e condenado pela sentença ora recorrida como os demais Primeiros Contraentes ( e condenado, sem aspas...), a qual assim viola as [as] disposições conjugadas dos artigos 363.º, números 1 e 2, última parte e 376.º, números 1 e 2, ambos do CC e do artigo 607.º, n.º 4, do CPC;
30.ª - O teor do facto provado sob o n.º 14, que se refere aos documentos juntos sob os números 9, 10 e 11 com a petição inicial, incorre em mais uma violação das disposições conjugadas dos artigos 363.º, números 1 e 2, última parte e 376.º, números 1 e 2, ambos do Código Civil e do artigo 607.º, n.º 4, do Código de Processo Civil, já que em tais documentos o Recorrido não exige a mera restituição do sinal em singelo, mas sim em dobro.
(Da nulidade da prova testemunhal;
da impugnação da matéria de facto provada
face à prova testemunhal gravada)
31.ª - Ocorre uma ostensiva e patente contradição entre a motivação da matéria de facto provada e o teor do ponto 9. dos factos provados, uma vez que naquela se atribuí à testemunha FF a autoria das comunicações que depois enviou aos promitentes vendedores, mas depois dá como provado que quem elaborou e preparou as mesmas “foi a agência imobiliária encarregue pelos Réus da venda do imóvel “A..., Lda.”;
32.º – Não obstante, a própria motivação da matéria de facto provada nem assim está conforme ao depoimento dessa testemunha, dela divergindo num ponto essencial: quem recorreu à testemunha para a elaboração e envio das comunicações foi o Recorrido AA, como se pode verificar pela Transcrição Excerto A, constante do Ponto XXXVII destas Alegações;
33.º – Assim, e com fundamento em tal depoimento (depoimento prestado no dia 17/03/2022, por FF, e gravado no sistema Habilus Media Studio das 14 horas: 34minutos: 40segundos até às 14horas: 46minutos: 53segundos; (Excerto A, Ponto XXXVII) Início 3´ minutos:28´´segundos Fim 4´ minutos:14´´segundos), nos termos e para efeitos do disposto no artigo 640.º, n.º 1, alíneas a) a c), do CPC, se consigna impugnar-se o ponto 9. dos factos provados, o qual deve ser substituído por outro que assuma o sentido seguinte: “Quem elaborou e preparou as comunicações referidas em 7., foi FF, para o seu cliente, Segundo Contraente, AA.”;
34.º – Em razão do depoimento da aludida testemunha, formou-se a convicção do Tribunal “a quo” com relação a outra factualidade - como se pode constatar pela motivação da matéria de facto, na parte em que se alude a essa testemunha, os Factos sob os números 1 a 5 e 7 a 9, e os não provados sob as alíneas a) e b);
35.º – Como resulta das Transcrições dos Excertos A/B/C (depoimento da testemunha FF, prestado no dia 17/03/2022 e gravado no sistema Habilus Media Studio das 14horas:34minutos:40segundos até às 14horas:46minutos:53segundos - EXCERTO A - Início 1´minuto:7´´ segundos/ Fim 1´ minuto 50´´ segundos; EXCERTO B - Início 1´minuto:54´´ segundos / Fim 2´minutos:12´´segundos; EXCERTO C - Início 3´ minutos:28´´segundos/ Fim 4´ minutos:14´´segundos; ), constantes do Ponto XXXIX das presentes Alegações, a testemunha “ (fez) a minuta do contrato promessa, (reuniu) com os clientes, (acompanhou) à escritura(...)” “(...) preparou a minuta (das cartas)”, isto é, foi esse o sentido desse seu depoimento, que consubstancia actos que se enquadram no artigo 1.º, n.º 5, alínea b) e n.º 6, alínea a), da Lei n.º 49/2004, de 24 de Agosto, como tal reservados aos advogados (cfr., ainda o n.º 4 do artigo 2.º, da Lei n.º 15/2013, de 8/2, que expressamente excluí tais serviços dos que podem ser prestados por empresas de mediação imobiliária), e também sujeitos ao sigilo profissional, previsto no artigo 92.º, n.º 1, alínea a) e n.º 2, do Estatuto da Ordem dos Advogados (EOA), aprovado pela Lei n.º 145/2015, de 9/09, o qual se não encontra dispensado para os presentes autos; (XL.1)
36.ª - Consequentemente, é nulo tal depoimento da testemunha da Exma. Senhora Doutora FF, advogada inscrita sob o n.º ..., por violar o sigilo profissional, nos termos do artigo 92.º, n.º 5, do EOA, ocorrendo “(...) uma proibição de valoração da prova, (…) com um tratamento autónomo do que se encontra previsto para as nulidades processuais, podendo, designadamente, tal infração ser conhecida em recurso, sem que a nulidade da produção do respetivo meio de prova tenha que ser arguida nos termos previstos no artigo 199.º do Código de Processo Civil.” - Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 5 – V – 2022, proferido no Processo n.º 126/20.4T8OAZ-A.P1.S1 (Nº Convencional: 2.ª SECÇÃO),in dgsi.pt; (XLII.1) – cfr. o documento 1, junto com as presentes alegações;
37.ª - Aos advogados, está reservada a função que resulta das disposições conjugadas dos artigos 496.º, do CPC (embora com independência, ressalve-se) e 97.º, n.º 2, do EOA, como de forma bem concludente o demonstram estes autos nas Transcrições dos Excertos A/B do Ponto XLIV destas Alegações, com evidentes efeitos probatórios sobre a factualidade sob as alíneas a) e b) dos Factos que terminaram por se considerar não Provados (depoimento de FF prestado no dia 17/03/2022 e gravado no sistema Habilus Media Studio das 14horas:34minutos:40segundos até às 14horas:46minutos:53segundos EXCERTO A - Início 4´ minutos: 24´´segundos Fim 5´ minutos: 21´´segundos; EXCERTO B - Início 6´ minutos: 54´´segundos Fim 8´ minutos: 17´´segundos), sendo o sentido do seu depoimento o de que foi alheia, no plano profissional, ao negócio dos Recorrentes a que se alude nos Pontos 18. a 20. dos Factos Provados, o que, como resulta dos documentos que se juntam sob os números 2 e 3 com estas Alegações, com certeza exigirá esclarecimentos mais aprofundados;
38.º – De igual modo se deve decidir, atento o depoimento da testemunha nas passagens a que se alude na Conclusão 35.ª , supra, como erradamente julgado o Facto Provado sob o número 7., o qual se refere, na parte não versada já nas restantes Conclusões, a matérias abrangidas por sigilo profissional a que se encontra adstrita a testemunha, nos termos do disposto no artigo 92.º, n.º 1, alínea a), e n.º 5, do EOA;
39.º – Por último, deve também ser decidido erradamente julgada, porque sobre a mesma recaiu meio proibido de prova (artigo 92.º, n.º 5, do EOA), com especial relevo nas passagens a que se alude na Conclusão 37.ª , supra, a factualidade que consta das alíneas a) e b) dos Factos Não Provados relacionada que é com a que consta dos Pontos 18 a 20 dos Factos Provados, o que demandará sejam exercidos por este Venerando Tribunal da Relação do Porto, os poderes previstos no artigo 662.º, n.º 2, alínea d), do CPC;
40.ª - Na motivação da matéria de facto da sentença sob recurso, encontra-se mencionado os Réus confirmaram que a fração autónoma referida em 1. em Novembro / Dezembro de 2019, foi colocada novamente à venda noutra imobiliária, o que encontra expressão incompleta no Ponto número 16. dos Factos Provados, por referência ao momento no tempo em que o bem prometido vender foi colocado em venda pelos Recorrentes, algo de decisivo perante a Cláusula 4.ª, n.ºs 1 e 4, do Contrato Promessa “sub iudice”, com relação à resolução automática aí prevista, uma vez decorrida a data de 15 de Outubro de 2019.;
41.ª – A confirmação a que se alude na motivação da matéria de facto, corresponde ao depoimento de parte da Recorrente CC, (depoimento de parte de CC, prestado no dia 17/03/2022 - gravado em dois ficheiros áudio distintos Ficheiro 1 -20220317105614_15652748_2871486.wma / Ficheiro 2 - 20220317105952_15652748_2871486.wma, no sistema Habilus Media Studio Início do depoimento 10horas:56minutos:15 segundos e Fim do Depoimento 11horas:24minutos:33segundos, EXCERTO A transcrito no Ponto XLVII destas Alegações, em causa, se situa no Ficheiro 2 – 20220317105952_15652748_2871486.wma, com Início aos 3minutos:28segundos e Fim 08minutos:08segundos) e dele resulta o sentido de que nunca antes de Novembro de 2019 o imóvel foi colocado em venda noutra imobiliária pelos Réus, pelo que o Ponto 16. dos Factos Provados, está incorrectamente julgado, por incompleto quanto ao momento em que interveio a “B...”, devendo ser-lhe aditada a referência respectiva, nos termos seguintes: “16. O imóvel identificado em 1. foi novamente colocado no mercado, através de uma outra agencia imobiliária denominada “B..., em Novembro/Dezembro de 2019.;
42.ª – Sem prejuízo do que se concluí supra na Conclusão 35.ª, não se afigura credível que o Recorrido, na outorga da Promessa de Compra e Venda, segundo as mais elementares regras de experiência, ignorasse a factualidade das alíneas a) e b) dos Factos Não Provados;
43.º - Neste âmbito, no depoimento prestado como declarações de parte do Recorrente BB (declarações de parte de BB, prestado no dia 17/03/2022 no sistema Habilus Media Studio Início 16horas:10minutos:04 segundos e Fim 16horas:48minutos:22segundos, sendo que o EXCERTO A, transcrito no Ponto L destas Alegações, tem Início 5´minutos 46´´segundos / Fim 14´minutos 18´´segundos), explicitamente se concretiza que logo no acto da assinatura da promessa o Recorrido AA soube que o negócio a que se referem os Pontos 18. a 20. dos Factos se iria realizar seguidamente, na tarde do dia 25 de Julho de 2019, que seria esse mesmo negócio o relativo à futura habitação do aludido Recorrente BB, e para a qual realizaria a mudança de recheio e bens pessoais, tendo ambos chegado, inclusive, a trocar contactos telefónicos para que o Recorrido avaliasse as obras a realizar, o que, como se afigura evidente, só pode ter-se ideia exacta com o imóvel desocupado;
44.ª – Com fundamento nas declarações de parte da Conclusão que antecede (43.ª) e com o sentido e teor nela indicado, em conjugação com as regras de experiência, deve decidir-se incorrectamente julgada a factualidade que consta das alíneas a) e b) dos Factos Não Provados, a qual deve ser aditada à Matéria de Facto Provada, nos termos seguintes: “Só atendendo à conjugação da venda e da compra é que os Réus assinaram a promessa de compra e venda referida em 1., facto de que o Autor estava ciente e de que era conhecedor no momento em que outorgaram no contrato”.;
45.ª - No âmbito da matéria de facto articulada pelo Recorrente BB nos artigos 51.º a 59.º da respectiva contestação e na posição do Recorrido, na petição inicial (artigo 9.º com referência à matéria de facto que, após audiência final, acabou por ficar fixada nos Pontos 7., 8. e 9. dos Factos Provados), de que a intervenção da mediadora imobiliária “C...” (“A..., Lda.”) na promessa de compra e venda, havia ocorrido por solicitação única dos Réus;
46.ª – Não se encontra acolhida a tese do Recorrido, nesse ponto, no que concerne ao depoimento da testemunha GG (depoimento da testemunha GG, prestado no dia 17/03/2022 no sistema Habilus Media Studio com Início 14horas:47minutos:42 segundos e Fim 14horas:55minutos:34segundos, sendo que o EXCERTO A, transcrito no Ponto LIII das presentes Alegações, tem Início 1´minutos 30´´segundos / Fim 5´minutos 11´´segundos ), do qual resulta o sentido de que o Recorrido AA é cliente de tal mediadora imobiliária para a compra de imóveis e foi específico cliente para a aquisição do bem prometido vender, negócio para o qual solicitou a intervenção daquele depoente;
47.ª – Assim, com referência à matéria de facto que, após audiência final, acabou por ficar fixada nos Pontos 7., 8. e 9. dos Factos Provados. afigura-se dever ser fixado facto, que é instrumental e concretiza as posições das partes (v. Conclusão 45.ª, supra) e, como tal, necessário ao esclarecimento da causa (artigos 5.º, n.º 1, alíneas a) e b), do CPC), e a inserir na Matéria de Provada o seguinte: “O Autor AA é cliente da mediadora imobiliária “C...” (“A..., Lda.”) para a compra de imóveis e encarregou um colaborador de tal empresa, GG, de ajustar as condições comerciais para a aquisição do imóvel identificado em 1. dos Factos Provados.”;
48.ª - Nos artigos 88.º a 93.º da contestação dos Recorrentes CC e DD e nos artigos 61.º a 64.º da contestação do Recorrente BB, expressamente se alude à factualidade que imporia a mudança de habitação para que o imóvel prometido vender, dentro do cumprimento da promessa de compra e venda, fosse entrega livre de pessoas e coisas no acto da escritura;
49.ª - Atentas as posições de ambas as partes nos respectivos articulados, no que concerne ao cumprimento do contrato e tendo presente importa ao princípio da boa fé no desenvolvimento das relações jurídicas obrigacionais (artigo 762.º, do CC), é manifestamente pertinente e impõe-se seja decidido quanto à matéria de facto da causa (artigos 5.º, n.º 1 e 607.º, n.º 4, ambos do CPC), se, efectivamente, a aludida mudança se operou, o que resulta, inequivocamente, do depoimento integral da testemunha HH, mediadora imobiliária que tratou de todo o processo de aquisição de um apartamento sito na freguesia ..., concelho de Santa Maria da Feira, com o Recorrente BB, e para onde a aludida mudança se consumou, no plano logístico e jurídico (depoimento integral da testemunha HH, prestado no dia 17/03/2022, gravado no sistema Habilus Media Studio, com Início 14horas:58minutos:23segundos e Fim 15horas:09minutos:38segundos);
50.ª - Nessa conformidade e em resultado do teor integral do depoimento da testemunha HH (identificado na Conclusão 49.ª que antecede), deve inserir-se na Matéria de Facto Provada, a seguinte factualidade:
“Para realizar a mudança de habitação do imóvel identificado em 1., o 1.º Réu, em Agosto de 2019, contactou a Sra. HH, mediadora imobiliária em ..., no concelho de Santa Maria da Feira, para que esta levasse a efeito a mediação para a promessa de compra e venda com entrega das chaves e posterior compra de um apartamento sito na freguesia ..., do citado concelho.”
• “Nas condições comerciais acordadas pelo 1.º Réu com a Sra. HH e o proprietário de tal apartamento sito em ..., Santa Maria da Feira, também definidas em contrato promessa, ficou ajustado que as chaves seriam antecipadamente entregues em relação à escritura final e que nesta os 2.ºs Réus poderiam outorgar como compradores, caso viesse a ser necessário financiamento bancário em razão desta compra preceder o dia em que viesse a ser designada escritura do imóvel identificado em 1..”
III – DO DIREITO
51.ª - O Recorrido não adoptou, no ciclo de vida do contrato, elementares deveres de prudência, diligência e cuidado ao agendar com os Primeiros Contraentes, previamente às referidas comunicações formais para a escritura de compra e venda, em ordem a conciliar datas com as contrapartes Primeiros Contraentes (artigo 762.º, do CC), tendo, em contrapartida, dilatado para quase dois meses a iniciativa, que era apenas uma obrigação sua (Cláusula 4.ª,n.º 2, do contrato promessa) de notificar todos eles do dia, hora a local para a realização da escritura de compra e venda;
52.ª - O Recorrido bem sabia que a inobservância do prazo limite, absoluto, de 15 de Outubro de 2019, determinaria a resolução imediata, independentemente de interpelação, da promessa de compra e venda (Cláusula 4.ª, n.º 4, do contrato promessa como verdadeira causa convencionada de resolução, face ao artigo 432.º, n.º 1, do CC), com as consequências previstas na primeira parte do n.º 2 do artigo 442.º, do CC, isto é, a desvinculação do contrato dos Primeiros Contraentes e a perda de sinal do sinal passado;
53.ª – O aludido incumprimento da obrigação que para o Recorrido existiu de notificar todos os Primeiros Contraentes por carta registada com aviso de recepção e com 15 dias de antecedência em relação à data que ele designasse para a escritura (Cláusulas 4.ª, n.º 2 e 8.ª, da promessa de compra e venda), - já que se não provou, nem podia provar, que ao Primeiro Contraente DD tivesse feito tal comunicação, que efectivamente não fez – determinou, na negligência, no descuido e desmazelo que observou quanto ao respeito pelos termos do contrato (artigo 406.º, n.º 1, do CC), que os Primeiros Contraentes, nas declarações de resolução, praticamente se limitassem a constatar o que era óbvio: que a data de 15 de Outubro seria inevitavelmente ultrapassada, com as consequências do n.º 4 da Cláusula 4.ª, da promessa de compra e venda;
54.ª – A aludida data de 15 de Outubro de 2019, face ao n.º 4 da Cláusula 4.ª, da promessa de compra e venda “sub iudice”, tem a verdadeira natureza de termo essencial do contrato (cfr. o Prof. Baptista Machado, in Estudos em Homenagem ao Prof. Doutor J.J. Teixeira Ribeiro – II IURIDICA, BFDC, Coimbra, 1979), n.º 11, II, págs. 405 e segs.), sobretudo para os Primeiros Contraentes, os quais se viram sobrecarregados com despesas e encargos acrescidos, inclusive tendo o Recorrente DD tido que contrair, com a esposa, empréstimo bancário para a compra de outro apartamento em ordem ao cumprimento da promessa;
55.ª – Embora irrelevante face à operatividade automática do termo resolutivo introduzido na Cláusula 4.ª, n.º 4, da Promessa, nem assim o Recorrido manifestou ter em atenção que a obrigação de marcar dia, hora e local para a escritura, era apenas sua, face ao n.º 2 da Cláusula Quarta, tendo intimado todos os Primeiros Contraentes, por cartas registadas com aviso de receção que expediu em 16 de Outubro de 2019 a que fossem estes a tomar a iniciativa de promover a aludida marcação até ao final do mês, sob pena de vir a exigir o sinal em dobro, em flagrante violação das disposições conjugadas dos artigos 808.º, n.º 1, 801.º e segs., 442.º, n.º 2, 2.ª parte, todos do Código Civil, disposições legais estas que resultam também violadas na sentença sob recurso.
Nestes termos e nos melhores de Direito, com o douto suprimento de V.ªs Ex.ªs, deverá ser dado provimento ao presente recurso de apelação e, em consequência:
a) Declarar a nulidade por omissão de pronúncia suscitada;
b) Se assim se não entender, o que se não concede, dar provimento à arguição dos erros de julgamento em matéria de facto suscitados, modificando tal fundamentação em conformidade com o que se suscitou nas alegações e conclusões;
c) Julgar totalmente improcedente a acção instaurada contra os Recorrentes, com todas as legais e inerentes consequências.
Assim se fazendo a costumada e desejada,
Justiça!».
O A. apresentou contra-alegações, pugnando pelo não provimento do recurso e pela confirmação da sentença recorrida.
O recurso foi admitido, por despacho de 08/09/2022, e os autos foram remetidos a este Tribunal da Relação do Porto, sem que tivesse sido proferido o despacho previsto no art. 617º, nº 1, do C.P.C..
Por despacho da relatora de 26/09/2022, e pelos fundamentos aí aduzidos, determinou-se, ao abrigo do disposto no art. 617º, nº 5, 1ª parte, do C.P.C., a baixa do processo para que fosse proferido o despacho previsto no nº 1 da mesma norma.
Nessa sequência, foi então proferido o despacho de 06/10/2022, no qual se decidiu que não se verifica a nulidade invocada pelos recorrentes.
*
Colhidos os vistos legais, cumpre decidir.
***
II - Considerando que o objecto do recurso, sem prejuízo de eventuais questões de conhecimento oficioso, é delimitado pelas suas conclusões (cfr. arts. 635º, nº 4, e 639º, nº 1, do C.P.C.), são as seguintes as questões a tratar, por ordem lógica de precedência:
a) apreciar da nulidade da sentença;
b) apreciar da junção de documentos requerida pelos recorrentes;
c) apurar da alteração da matéria de facto conforme propugnado pelos recorrentes;
d) averiguar, com base na pretendida alteração da matéria de facto ou independentemente dela, se a acção deve ser julgada improcedente e os RR. absolvidos do pedido.
**
Apreciemos a primeira questão.
Invocam os recorrentes a nulidade da sentença por omissão de pronúncia, nos termos do art. 615º, nº 1, al. d), 1ª parte, do C.P.C., por, no seu entender, o tribunal recorrido não se ter pronunciado sobre os factos de o recorrente DD não ter sido convocado para a escritura pública e de ter enviado uma comunicação ao recorrido dando conta dessa falta e de não poder comparecer por ter compromissos profissionais inadiáveis, e sobre a circunstância de ocorrer a resolução automática do contrato, porque, em caso de reagendamento, seria ultrapassado o prazo limite absoluto de 15/10/2019, e por ter omitido a motivação das alíneas a) e b) dos factos não provados.
Na norma em referência prevê-se a nulidade da sentença quando o juiz deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar.
Questões e não argumentos, pois que estes não se confundem com aquelas. O juiz deve pronunciar-se sobre todas as questões com relevo para as pretensões das partes, suscitadas por estas ou de conhecimento oficioso, mas isso não implica que a sua decisão se debruce sobre todos os argumentos esgrimidos, como é jurisprudência pacífica.
Além disso, essa apreciação deve existir desde que o conhecimento da questão não se mostre prejudicado pela solução que tenha sido dada a outra questão conhecida previamente.
No caso concreto, a sentença recorrida conheceu efectivamente a questão que lhe era colocada e que respeitava à pretensão formulada pelo A., ora recorrido, na petição inicial, de se considerar ilícita a resolução do contrato-promessa efectuada pelos RR., que os ora recorrentes contestaram, aduzindo os seus argumentos no sentido contrário ao propugnado pelo A., concluindo o tribunal a quo pela ilicitude da resolução, por, em seu entender, “a alegada falta de notificação” do R. DD não constituir fundamento válido para a resolução, e pelo incumprimento definitivo por parte dos RR. por manifestarem a intenção de não celebrar o contrato definitivo nas cartas de 10/10/2019.
Ora, perante esta conclusão do tribunal a quo, tornava-se desnecessário, do seu ponto de vista, apreciar os restantes argumentos dos recorrentes no sentido de que a sua actuação foi lícita e não houve incumprimento da sua parte, bem como o facto respeitante à carta enviada pelo R. DD ao A..
No que concerne ao facto de o R. DD (o 3º R.) ter sido ou não convocado para a escritura pública, o mesmo, ainda que assim não expressamente aludido na matéria de facto provada, decorre efectivamente dos factos dos pontos 7 e 8 dos factos provados, de onde resulta que existiram duas cartas e que estas a foram enviadas ao 1º R. e à 2ª R. (e, portanto, não ao 3º R.), e foi considerado na matéria de direito, aí se aludindo “às comunicações enviadas aos Réus BB e CC” e considerando-se que a “falta de notificação” daquele não constituía fundamento válido de resolução.
Finalmente, relativamente à motivação das alíneas a) e b) dos factos não provados, embora aquelas não tenham sido expressamente indicadas pelo tribunal, percebe-se que a sua não prova decorreu do depoimento da testemunha GG, quando na referência ao mesmo na motivação do tribunal se diz que esta testemunha esclareceu “não ter sido estabelecida qualquer condição para a venda, desde logo, no que respeita à aquisição de outra casa”.
Pode-se concordar ou não com a decisão tomada e/ou com os seus fundamentos, pode-se entender que existiu erro de julgamento ou que a decisão não é correcta e é injusta, mas isso não significa a existência de omissão de pronúncia.
Note-se que a enumeração constante das alíneas da norma em causa é taxativa, não se incluindo entre as nulidades da sentença “o chamado erro de julgamento, a injustiça da decisão, a não conformidade dela com o direito substantivo aplicável, o erro na construção do silogismo judiciário” (Antunes Varela, Miguel Bezerra e Sampaio e Nora, Manual de Processo Civil, 2ª ed. revista e actualizada, 1985, pág. 686).
É de concluir, pois, que não ocorre a nulidade invocada pelos recorrentes.
Não merece, portanto, provimento o recurso nesta parte.
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Passemos à segunda questão.
Os recorrentes pretendem a junção de três documentos, dois deles respeitando a comunicações de correio electrónico enviadas pela testemunha FF ao 1º R. e um deles correspondente a uma impressão da página da internet da Ordem dos Advogados com a indicação da inscrição como advogada dessa mesma testemunha, entendendo que dos mesmos resulta que o depoimento daquela não pode ser valorado.
Nos termos do art. 651º, nº 1, do C.P.C., as partes apenas podem juntar documentos às alegações nas situações excepcionais a que se refere o artigo 425º ou no caso de a junção se ter tornado necessária em virtude do julgamento proferido na 1ª instância.
De acordo com o disposto no art. 425º do C.P.C., depois do encerramento da discussão só são admitidos, no caso de recurso, os documentos cuja apresentação não tenha sido possível até àquele momento.
No caso, os recorrentes nada alegam no sentido de que a apresentação dos documentos não tenha sido possível em momento anterior ao recurso. Aliás, antes pelo contrário, do que alegam na motivação de recurso até resulta que os documentos poderiam ter sido juntos, se não antes, pelo menos na audiência de julgamento, aquando do depoimento da testemunha em causa.
E, compulsados os concretos documentos, verifica-se que as comunicações de correio electrónico respeitam a Julho de 2019 e a impressão da página da Ordem dos Advogados, que pode ser obtida em qualquer altura, respeita a uma inscrição que já data de Novembro de 2017.
Assim, não se verifica que tais documentos não pudessem ter sido juntos antes, aliás, até poderiam ter sido juntos com os requerimentos probatórios, ou na audiência de julgamento, como se disse.
Como quer que seja, os documentos não têm qualquer relevância para a apreciação do objecto do recurso, posto que se trata de apreciar dos fundamentos da decisão recorrida, que foi tomada com base nos elementos existentes nos autos nessa data.
O que determina que não se admita a pretendida junção de documentos por parte dos recorrentes.
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Vejamos agora a terceira questão.
O recurso pode ter como objecto a impugnação da decisão sobre a matéria de facto e a reapreciação da prova gravada (cfr. art. 638º, nº 7, e 640º do C.P.C.).
Neste caso, o recorrente deve obrigatoriamente especificar, sob pena de rejeição (nº 1 do art. 640º):
a) Os concretos pontos de facto que considera incorrectamente julgados;
b) Os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida;
c) A decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas.
No que respeita à alínea b) do nº 1, e de acordo com o previsto na alínea a) do nº 2 da mesma norma, quando os meios probatórios invocados como fundamento do erro na apreciação das provas tenham sido gravados, incumbe ao recorrente, sob pena de imediata rejeição do recurso na respectiva parte, indicar com exactidão as passagens da gravação em que se funda o seu recurso, sem prejuízo de poder proceder à transcrição dos excertos que considere relevantes.
Uma vez que a impugnação da decisão de facto não se destina a que o tribunal de recurso reaprecie global e genericamente a prova valorada em primeira instância, a lei impõe ao recorrente um especial ónus de alegação, no que respeita à delimitação do objecto do recurso e à respectiva fundamentação.
No caso concreto, verifica-se que os recorrentes deram cumprimento às referidas exigências, especificando os concretos factos que põem em causa e indicando as razões da sua discordância, nomeadamente por referência aos meios de prova que, em seu entender, sustentam a solução que propugnam (apenas com excepção, como melhor se verá infra, dos factos das alíneas a) e b) dos factos não provados).
Apreciemos então.
São as seguintes as alterações pretendidas pelos recorrentes:
1) Que se insira na matéria de facto provada a forma como se encontram identificadas as partes no contrato-promessa, em que qualidade outorgam e os respectivos domicílios, e o teor das cláusulas 4ª e 8ª do contrato, nomeadamente devido ao que aí se diz sobre prazos e consequências do seu não cumprimento, sugerindo-se quanto à identificação que o ponto a acrescentar tenha o seguinte teor: “Na indicação dos outorgantes do contrato referido em 1., os Réus estão todos identificados como Primeiros Contraentes e o Autor como Segundo Contraente, tendo o Réu BB residência na Rua ..., ..., 1.º Direito, no Porto e os Réus CC e DD, na Rua ..., ..., 1.º Direito, no Porto, ambos casados em comunhão de adquiridos, aquela Ré, tal como o 1.º Réu, ambos também referidos como Promitentes Vendedores e aquele como Parte Autorizante; o Autor AA, vem identificado com residência na Praça ..., ..., ..., ..., também na qualidade de Promitente Comprador”.
Consta do ponto 1 da matéria de facto a celebração do contrato-promessa em causa nos autos (aludindo ainda os pontos 2 a 5 a partes do que foi acordado nesse contrato), embora não se aluda expressamente ao documento no qual foi vertido o contrato celebrado e que se encontra junto aos autos como doc. 1 da petição inicial, nem se acrescente a fórmula “cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido”.
Ora, estando assente a celebração do contrato, e inclusivamente referidos expressamente alguns dos termos do acordo, todas as cláusulas inseridas nesse contrato estão, por inerência, incluídas na factualidade assente, podendo ser tidas em conta na apreciação da matéria de direito, independentemente de estarem expressamente transcritas nos pontos elencados nos factos provados.
Sendo certo que o que releva é o que consta exactamente escrito no documento que suporta o contrato-promessa e não a interpretação que as partes façam do que aí está escrito, pelo que nunca a redacção que fosse inserida nos factos provados poderia ser a propugnada pelos recorrentes, posto que os RR. não estão “todos identificados como Primeiros Contraentes” no contrato.
De todo o modo, concede-se que, por facilidade de consideração do teor do contrato-promessa em toda e qualquer das partes do seu conteúdo escrito na decisão da questão de direito, na medida em que tal se entenda relevante para o efeito, se mostra útil que aquele teor esteja expressamente vertido na matéria de facto, de acordo com o seu exacto texto.
Assim, entende-se agrupar os pontos 1 a 5 da matéria de facto num único ponto (sem alterar a numeração, para não criar confusão relativamente aos pontos seguintes), do qual constará o teor do contrato-promessa, nos seguintes termos:
- pontos 1 a 5: «Com data de 25 de Julho de 2019 foi celebrado o contrato intitulado de contrato-promessa de compra e venda com o seguinte teor:
CONTRATO-PROMESSA DE COMPRA E VENDA
ENTRE:
PRIMEIROS CONTRAENTES: BB, divorciado, natural da freguesia ..., concelho do Porto, residente na Rua ..., ..., 1.º Dto., Porto, titular do CC n.º ..., emitido pela República Portuguesa e válido até 20/10/2021; e CC, casada sob o regime de comunhão de adquiridos com DD (contribuinte fiscal n.º ...), natural da freguesia ..., concelho do Porto, residente na Rua ..., ..., 1.º Dto., Porto, titular do CC n.º ..., emitido pela República Portuguesa e válido até 10/09/2020, na qualidade de PROMITENTES VENDEDORES, e DD, na qualidade de Parte Autorizante;
SEGUNDO CONTRAENTE: AA, solteiro, maior, natural de ..., concelho da Maia, residente na Praça ..., ..., ..., ..., contribuinte fiscal ..., titular do CC n.º ..., emitido pela República Portuguesa e válido até 18/08/2021, na qualidade de PROMITENTE COMPRADOR.
É ACORDADO O PRESENTE CONTRATO-PROMESSA NOS TERMOS E CONDIÇÕES CONSTANTES DAS SEGUINTES CLÁUSULAS:
PRIMEIRA
Os Primeiros Contraentes são donos e legítimos proprietários de uma fracção autónoma designada pela letra "B", correspondente a uma habitação (T2), no primeiro andar direito, com entrada pelo número ... da Rua ..., que integra o prédio em regime de propriedade horizontal sito na Rua ..., ... e Rua ..., ..., freguesia ..., concelho do Porto, inscrito na matriz sob o artigo ..., descrito na Conservatória do Registo Predial do Porto sob o registo n.º ..., com licença de utilização n.º ... de 22/12/1980.
SEGUNDA
Pelo presente contrato, os Primeiros Contraente prometem vender ao Segundo Contraente e este, por sua vez, promete comprar a fracção autónoma descrita na cláusula primeira deste contrato.
TERCEIRA
1. O preço da aqui prometida venda é de € 150.000,00 (cento e cinquenta mil euros), que será pago da seguinte forma:
a. Na presente data, a título de sinal e princípio de pagamento, a quantia de € 20.000,00 (vinte mil euros), através de cheque com o n.0 ..., sacado sobre o Banco 1... e passado a favor do Primeiro Contraente BB.
b. Na outorga da escritura pública de compra e venda, através de cheque visado ou bancário, a restante quantia em dívida, ou seja, € 130.000,00 (cento e trinta mil euros).
QUARTA
1. O aqui prometido contrato de compra e venda realizar-se-á até 15 de Outubro do presente ano, mas nunca antes de decorridos quarenta e cinco dias contados da data da assinatura do presente contrato.
2. Para tal, o Segundo Contraente obriga-se a comunicar aos Primeiros, com quinze dias de antecedência o dia, hora e local para a realização da escritura pública de compra e venda.
3. As despesas referentes ao presente contrato, bem como ao contrato definitivo, nomeadamente impostos e emolumentos notariais e de registo predial serão da exclusiva responsabilidade do Segundo Contraente.
4. Não sendo marcada a competente escritura pública de compra e venda no prazo a que alude o n.º 1 desta cláusula, considera-se, independentemente de interpelação, imediatamente resolvida a presente promessa de compra e venda.
QUINTA
1. A fracção aqui prometida vender será transmitida livre de quaisquer ónus ou encargos.
2. A Segunda Contraente declara conhecer a composição e o estado físico em que o imóvel actualmente se encontra, nada tendo a reclamar.
SEXTA
1. Se qualquer dos contraentes não comparecer para outorgar a escritura pública na data e local designados para tal, bem como para proceder ao pagamento do restante preço, fica desde já, convencionado que a outra parte poderá, de imediato, resolver o presente contrato, sem necessidade de qualquer outra interpelação para cumprimento, com as consequências previstas no n.º 2 do art.º 442.º do Código Civil.
2. Os Primeiros Contraentes também poderão resolver, de imediato, o presente contrato, no caso do Segundo Contraente não cumprir, integral e atempadamente, a obrigação de prestar sinal prevista na alínea a) do ponto um da cláusula terceira.
3. No caso de os Primeiros Contraentes optarem por resolver o presente contrato, nos termos mencionados nos pontos anteriores, deverá notificar o Segundo Contraente de tal facto.
Apesar de ter sido prestado sinal, as partes declaram que ao presente contrato se aplica a execução específica prevista no art.º 830.º do Código Civil.
SÉTIMA
Os contraentes declaram que o presente negócio foi mediado por "A..., Lda." com sede na Rua ..., ... Porto, NIPC ..., registada na Conservatória do Registo Comercial do Porto, titular da licença de actividade imobiliária (AMI) n.º ....
OITAVA
Todas as comunicações entre as partes relativas ao presente contrato serão feitas por carta registada com aviso de recepção, para as moradas supra referidas, ficando ambas as partes obrigadas a comunicar, reciprocamente, qualquer alteração.
NONA
1. Os contraentes declaram que o presente contrato reflecte o acordo alcançado, não existindo quaisquer convenções complementares.
2. Qualquer alteração ou aditamento ao presente contrato só será válido e eficaz se constar de documento escrito assinado por ambas as partes.
DÉCIMA
Declaram as partes, por mútuo acordo, prescindir do reconhecimento presencial das assinaturas, renunciando ao direito de invocar a sua falta.

O presente contrato é feito em triplicado, destinando-se um exemplar a cada contraente, todos com valor de originais.”».
2) Que se acrescente na matéria de facto um “facto instrumental” com o seguinte teor: “O Autor, Segundo Contraente no Contrato Promessa de Compra e Venda, teve ao seu dispor um prazo que começou no dia 26 de Julho de 2019 e se prolongou até 15 dias antes da data de 15 de Outubro de 2019, para comunicar por carta registada com aviso de recepção, aos Primeiros Contraentes, além do local para a realização da escritura pública de compra e venda, o respectivo dia e hora que não poderiam coincidir com os primeiros 45 dias após a outorga do aludido contrato”.
Nesta parte, retirando o que constitui teor do acordado no contrato, resta-nos apenas matéria conclusiva, que não constitui facto.
Na realidade, dizer que o A. “teve ao seu dispor um prazo que começou no dia 26 de Julho de 2019 e se prolongou até 15 dias antes da data de 15 de Outubro de 2019” não constitui um facto da vida, mas uma conclusão a retirar de factos concretos, dos que respeitam à celebração do contrato em Julho de 2019 e ao teor das cláusulas deste quanto à data de celebração da escritura, marcação e comunicação da mesma.
Tratando-se de matéria conclusiva, não há lugar à sua inclusão nos factos (provados ou não provados).
No sentido da exclusão da matéria conclusiva do elenco dos factos provados da sentença, por via do disposto no art. 607º, nº 4, do C.P.C., cfr. o Ac. do STJ de 29/04/2015, publicado em www.dgsi.pt, com o nº de proc. 306/12.6TTCVL.C1.S1, e o Ac. da R.E. de 28/06/2018, publicado no mesmo sítio da Internet, com o nº de proc. 170/16.6T8MMN.E1.
Como se refere neste último acórdão, “na decisão sobre a matéria de facto apenas devem constar os factos provados e os factos não provados, com exclusão de afirmações genéricas, conclusivas e que comportem matéria de direito”, pelo que, “mesmo no âmbito da vigência do actual CPC, a decisão sobre a matéria de facto deve estar expurgada” dessas afirmações, devendo ser eliminado qualquer ponto da matéria de facto que “integre uma afirmação ou valoração de factos que se insira na análise das questões jurídicas que definem o objecto da acção, comportando uma resposta, ou componente de resposta àquelas questões”.
Não há lugar, pois, à pretendida alteração.
3) Que:
a) se acrescente na matéria de facto, aditando ao ponto 4 dos factos provados, um outro “facto instrumental”, passando aquele a ter o seguinte teor: “O prédio em causa seria vendido livre de quaisquer ónus e/ou encargos e livre de pessoas e de coisas”.
b) se altere a redacção do ponto 9 dos factos provados, para que passe a ser: “Quem elaborou e preparou as comunicações referidas em 7., foi FF, para o seu cliente, Segundo Contraente, AA”.
c) se acrescente ainda um outro “facto instrumental” com o seguinte teor: “O Autor AA é cliente da mediadora imobiliária “C...” (“A..., Lda.”) para a compra de imóveis e encarregou um colaborador de tal empresa, GG, de ajustar as condições comerciais para a aquisição do imóvel identificado em 1. dos Factos Provados”.
d) se acrescente à matéria de facto provada dois pontos com o seguinte teor:
- “Para realizar a mudança de habitação do imóvel identificado em 1., o 1.º Réu, em Agosto de 2019, contactou a Sra. HH, mediadora imobiliária em ..., no concelho de Santa Maria da Feira, para que esta levasse a efeito a mediação para a promessa de compra e venda com entrega das chaves e posterior compra de um apartamento sito na freguesia ..., do citado concelho”; e
- “Nas condições comerciais acordadas pelo 1.º Réu com a Sra. HH e o proprietário de tal apartamento sito em ..., Santa Maria da Feira, também definidas em contrato promessa, ficou ajustado que as chaves seriam antecipadamente entregues em relação à escritura final e que nesta os 2.ºs Réus poderiam outorgar como compradores, caso viesse a ser necessário financiamento bancário em razão desta compra preceder o dia em que viesse a ser designada escritura do imóvel identificado em 1”.
Ora, esta factualidade não tem qualquer utilidade para a apreciação do mérito da causa e do presente recurso [como melhor decorrerá do tratamento da questão enunciada sob a alínea d)].
Com efeito, está em causa apreciar se a resolução do contrato-promessa pelos RR. foi lícita ou ilícita e do incumprimento contratual decorrente seja desta resolução seja da circunstância de o A. não ter notificado o 3º R.. Nenhuma das partes invoca qualquer incumprimento contratual que fosse decorrente de o imóvel não estar desocupado, ou de o teor das cláusulas do contrato ou das comunicações enviadas não estar correcto, ou de não se ter aguardado pelo prazo de 45 dias contados da data da celebração do contrato-promessa.
Assim, tendo presentes os fundamentos invocados pelas partes nos seus articulados, constata-se que a inclusão dos referidos factos invocados pelos recorrentes nos factos provados não tem quaisquer consequências na situação de facto que resulta da restante factualidade apurada nem na solução de direito da causa.
Face a tal circunstancialismo é irrelevante a alteração factual nesta parte pretendida pelos recorrentes.
Sendo irrelevante tal factualidade para a apreciação do mérito da causa, e a fim de não se praticarem actos inúteis no processo (o que até se proíbe no art. 130º do C.P.C.), não há que conhecer da impugnação deduzida quanto à mesma no que a estes factos respeita (neste sentido cfr. António Santos Abrantes Geraldes, Recursos em Processo Civil, Almedina, 2022, 7ª edição actualizada, pág. 334, nota 526, e, entre outros, o Ac. do STJ de 23/1/2020 (proc. 4172/16.4TFNC.L1.S1), C.J.S.T.J., tomo I, pág. 13, e o Ac. da R.P. de 05/11/2018, publicado na Internet, em www.dgsi.pt, com o nº de processo 3737/13.0TBSTS.P1).
Donde, em face do que acaba de se analisar, não se conhece da impugnação da matéria de facto apresentada pelos recorrentes no que concerne às alterações ora em causa.
4) Que se acrescente um facto respeitante à carta enviada pelo 3º R. ao A., que este recebeu em 08/10/2019.
Compulsados os autos, verifica-se que o facto em causa foi alegado na contestação do 3º R., tendo com esta sido juntas as cópias da carta e do talão de registo, e o documento dos correios respeitante à entrega da carta, facto que não foi impugnado, e até resulta admitido pelo A. na resposta. Tal facto encontra-se, pois, provado por acordo das partes nos articulados.
Ademais, o facto em questão, porque se insere na troca de correspondência entre as partes, que culminou com a cessação do contrato, cujo incumprimento está a ser apreciado nos autos, é relevante para a questão a decidir, sendo certo que esta carta é a única a que não é feita referência na matéria de facto, aí estando incluídas todas as restantes cartas enviadas.
Assim, entende-se que deve, efectivamente, ser aditada à matéria de facto provada essa factualidade, passando a ser o ponto 9-A, nos seguintes termos:
«No dia 7 de Outubro de 2019 o R. DD enviou ao A., que a recebeu no dia 8, uma carta com data de 6 de Outubro de 2019 e o seguinte teor:
“Hoje dia 06/10 domingo soube pela minha mulher que no dia 10 está marcada uma escritura para um apartamento na Rua ..., ..., 1. Direito, no Porto
Fiquei surpreendido porque, sendo eu parte interessada e outorgante no contrato promessa de compra e venda, não recebi e muito menos me foi enviada, até esta data, qualquer notificação para a escritura. Além do mais, penso que é de bom costume entrar primeiro em contato com os intervenientes, de forma a se poderem ajustar agendas sentindo-me afastado de um processo que me pertence, em conjunto com os meus familiares. Chega a ser mesmo ofensivo, além de incompatível, em absoluto, com compromissos profissionais que me vinculam nas próximas semanas, incluindo aquela data.
Considerando, por conseguinte, o que acabo de referir, informo que irei averiguar, também, as consequências legais, que oportunamente irei comunicar, da omissão que praticou, já que a mesma se revela grave.
Sem outro assunto de momento”.».
5) Que se acrescente ao ponto 14 da matéria de facto que nas comunicações aí referidas o A. “admitiu não ter realizado a convocatória do Réu marido DD para a escritura, considerando-o convocado pelo simples facto de este residir com a 2.ª Ré, e intimou todos os Recorrentes a que fosse obrigação destes a marcar nova data para a escritura até ao final do mês de Outubro de 2019, sob pena de vir a exigir que devolvessem o dobro do sinal passado” e corrigir a redacção desse mesmo ponto na parte onde consta “ou que lhe devolvessem o dinheiro pago a titulo de sinal”.
Trata-se aqui do teor da carta enviada pelo A. a cada um dos RR. com data de 15/10/2019, facto alegado na petição inicial e a que respeitam os doc. 9, 10 e 11 juntos com este articulado, que não foi impugnado, reconhecendo os RR. que receberam as referidas cartas. Portanto, também este facto se encontra provado por acordo das partes nos articulados.
Como é óbvio, o facto que está provado é o envio, e recepção, das cartas, com o exacto teor que delas consta e não com a interpretação que as partes ou o tribunal recorrido façam desse teor.
O que significa que o que deve constar dos factos provados é o exacto teor das cartas e não o que os RR. pretendem no recurso.
Mas também que efectivamente deve ser corrigido o teor do ponto 14 da matéria de facto, como pretendido pelos RR., posto que o que consta da carta no que concerne à devolução do dinheiro não é o que ali ficou a constar, mas “para me devolver o sinal de Eur. 20.000,00 que lhes entreguei em dobro”.
Assim, altera-se e complementa-se a redacção do ponto 14 dos factos provados nos seguintes termos:
«O A. remeteu uma carta, registada com aviso de recepção, dirigida a cada um dos três RR., com o seguinte teor:
“Assunto: Contrato promessa celebrado em 25/07/2019 referente ao prédio sito na Rua ..., ..., 1 .0 Dto., no Porto.
Exmos. Senhores,
Acuso a recepção das vossas comunicações, cujo teor me mereceu a melhor atenção e, em face do qual, venho transmitir o seguinte:
Como bem sabem, no passado dia 25/07/2019, assinamos o contrato promessa para venda do apartamento da Rua ….
Tal como estabelecido na cláusula quarta do contrato comuniquei, em devido tempo, para as moradas constantes do mesmo e que ficaram estabelecidas como aquelas para as quais deveriam ser feitas quaisquer comunicações, o agendamento da escritura definitiva de compra e venda para o dia 10/10/2019.
As supra referidas comunicações, repito, enviadas para as moradas constantes do contrato, foram dirigidas a todos os promitentes vendedores, sendo que, apenas o Sr. BB não a quis receber.
É um argumento, no mínimo, risível, afirmar que não notifiquei o Sr. DD, quando a carta que remeti à sua esposa (devidamente recebida), e com quem, acredito, este partilhará a sua habitação, também lhe foi dirigida.
Mais, tal argumento é tanto mais risível quanto o facto de a presença do Sr. DD ser apenas necessária na escritura, fruto do regime matrimonial, já que este não é proprietário/herdeiro.
Quanto às notas pessoais transmitidas pelo Sr. BB, acrescento ainda o seguinte:
- A decisão do Sr. BB em adquirir outro apartamento é, naturalmente, alheia à minha vontade, mas um imperativo óbvio decorrente do contrato promessa que comigo celebraram; se tal outro negócio falhou, não consigo alcançar que responsabilidade tenho eu nisso, nem nunca tal transacção foi condição do negócio celebrado comigo;
- A comunicação e o agendamento da escritura definitiva foi tratada por quem o Senhor BB contratou para proceder à venda do apartamento onde habitava para as moradas que constavam do contrato, sendo certo que fruto da minha actividade profissional não me ocorreu, nem tive tempo e oportunidade para lhe transmitir fosse o que fosse, senão aquilo que eram as minhas obrigações decorrentes do contrato.
Como tal, o inacreditável argumento/expediente utilizado para a resolução do contrato, para mais, operada ainda antes mesmo de terminado o prazo para agendamento da escritura definitiva, é insustentável e inaceitável e demonstrativo de uma profunda má-fé perfeitamente perceptível para qualquer pessoa medianamente honesta.
No dia 10/10/2019, conforme atestado na minha posse, estive presente no Cartório aonde foi agendada a escritura definitiva, à hora indicada, tendo V/ Exas. optado por não comparecer, não podendo desconhecer aquele agendamento, por muito que agora o venham negar, já que ninguém acredita que não falam entre vós.
Neste sentido, informo que têm até ao final do mês para me comunicar o agendamento da escritura definitiva, pois mantenho, como o demonstrei inequivocamente, o interesse na aquisição do apartamento ou, para me devolver o sinal de Eur. 20.000,00 que lhes entreguei em dobro.
Caso assim não aconteça, informo que, de imediato, irei avançar para os Tribunais, o que, sinceramente, lamento.”.».
6) Que se altere a redacção dos pontos 7 e 8 dos factos provados, nos seguintes termos:
- ponto 7: “O Autor, AA, Segundo Contraente no Contrato Promessa de Compra e Venda, enviou em 20 de Setembro de 2019 por carta registada com aviso de recepção, recebida em 24 de Setembro de 2019, uma comunicação aos Réus BB e CC, Primeiros Contraentes no mesmo contrato, com morada de destino para a Rua ..., ..., 1.º Direito, ... Porto, em conformidade com a qual, invocando o Ponto 2. da Cláusula quarta do contrato-promessa oportunamente celebrado, designava o dia 10 de Outubro de 2019, pelas 11 horas, o Cartório Notarial Dra. EE, sito na Praça ..., ..., 4.º andar, ... Porto, para a outorga da escritura pública”;
- ponto 8: “O Autor enviou igual comunicação [à] referida em 7., com morada de destino para a Rua ..., ..., 1.º Direito, ... Porto, a qual não foi levantada.”.
O que consta da sentença recorrida nessa parte é o seguinte:
«7. Em 20/09/2019, foram emitidas duas cartas dirigidas aos promitentes vendedores, dando-lhes conta de que, tal como estabelecido na cláusula quarta e com a antecedência mínima ali definida, a escritura pública teria lugar no dia 10/10/2019, pelas 11h no Cartório Notarial Dra. EE, sito na Praça ..., ..., 4.º, Salas ..., no Porto.
8. A notificação referida foi recebida pela 2.ª Ré, mas o 1.º Réu, não a recebeu, porquanto não a levantou.».
A matéria que consta do ponto 8, ressalvada eventualmente a utilização da expressão “notificação” (que foi retirada da petição inicial), que em rigor não se destina a este tipo de comunicações, está correcta, perante o que está assente por acordo das partes nos articulados e o que resultou dos depoimentos de parte dos 1º e 2ª RR., sendo certo que não colhe a objecção levantada pelos recorrentes quanto ao engano da 2ª R. relativamente à carta que viu e à que recebeu – o que interessou foi confirmar que o teor da carta por si recebida era igual ao do doc. 2 da petição inicial, independentemente de as moradas indicadas numa e noutra carta serem diferentes.
Ademais, uma vez que cada uma das cartas foi enviada para as respectivas moradas correctas do 1º R. e da 2ª R., tal como constam do contrato-promessa, não estando em causa a existência de qualquer engano nessa parte (como, aliás, os próprios recorrentes admitem na redacção que propõem para os dois factos em apreço), não se afigura de qualquer utilidade estar a alterar a redacção dos pontos em causa para aí fazer constar quais são essas moradas. Do mesmo modo nenhuma utilidade se encontra na repetição no ponto 7 da qualidade em que o A. e aqueles RR. intervinham no contrato-promessa, o que já resulta do contrato.
Já a referência à data de recepção das cartas e à circunstância de se tratar de cartas registadas com aviso de recepção se afigura relevante, atento o que ficou acordado no contrato-promessa para a forma e a antecedência desta comunicação, pelo que se irá acrescentar tal matéria ao ponto 7.
Além disso, há que corrigir a redacção deste ponto, uma vez que nas cartas enviadas não consta expressão com o teor “tal como estabelecido na cláusula quarta e com a antecedência mínima ali definida” (e como já se disse anteriormente, não cabe na matéria de facto inserir a interpretação que a sentença recorrida ou as partes fazem do teor dos documentos). De forma a ser o mais fiel possível ao teor das comunicações trocadas pelas partes, também aqui se optará por incluir o texto das cartas na redacção deste ponto da matéria de facto.
Assim, altera-se e complementa-se a redacção do ponto 7 dos factos provados nos seguintes termos:
«O A. remeteu, em 20 de Setembro de 2019, duas cartas, registadas com aviso de recepção, dirigidas ao 1º R. e à 2ª R., esta última recebida em 24 de Setembro de 2019, com o seguinte teor:
“Assunto: Agendamento escritura pública de compra e venda - Fracção B da Rua ..., ...
Nos termos e para os efeitos do disposto no ponto 2. da cláusula quarta do contrato-promessa oportunamente celebrado referente à aquisição da fracção autónoma designada pela letra "B", correspondente a uma habitação (T2), no primeiro andar direito, com entrada pelo número ... da Rua ..., que integra o prédio em regime de propriedade horizontal sito na Rua ..., ... e Rua ..., ..., freguesia ..., concelho do Porto, inscrito na matriz sob o artigo ..., descrito na Conservatória do Registo Predial do Porto sob o registo n.º ..., venho comunicar a V. Exas. que a escritura pública realizar-se-á no próximo dia 10 de Outubro, pelas 11h, no Cartório Notarial Dra. EE, sito na Praça ..., ..., 4.º andar, Salas ... ... Porto.”.».
7) Que se altere a redacção do ponto 13 dos factos provados, na medida em que a sua redacção não está exactamente de acordo com o teor dos documentos que reproduz, e que se acrescente o que consta da alínea E) do documento 6 junto do a petição inicial.
Na sentença recorrida, o ponto 13 dos factos provados tem o seguinte teor:
«13. Em seguida, o Autor recebeu as notificações constantes dos documentos n.ºs 6 a 8, datadas de 10/10/2019, assinadas pelos Réus, nas quais estes declaravam o contrato celebrado entre as partes definitivamente resolvido, tendo por base o argumento de que o Autor não havia notificado o cunhado do 1.º Réu e marido da 2.ª Ré, o qual habita com a sua mulher e que interveio no contrato promessa como "autorizante" por via do regime matrimonial que partilha com aquela.».
Os documentos aludidos são os doc. 6, 7 e 8 juntos com a petição inicial e o seu teor, para além de não ser igual entre si, também não coincide com o que consta deste ponto 13 dos factos provados.
Ora, considerando que o teor das cartas enviadas, em questão, está assente por acordo das partes nos articulados, e que, como já se disse, a matéria de facto deve ser o mais fiel possível ao teor das comunicações trocadas entre partes, sendo certo que se trata aqui das cartas em que os RR. comunicam ao A. a resolução do contrato-promessa, afigura-se que deve efectivamente corrigir-se a redacção deste ponto da matéria de facto e subdividir-se o mesmo em três pontos, cada um deles respeitante a cada uma das cartas enviadas, aí se incluindo o texto de tais cartas.
Assim, altera-se e complementa-se a redacção do ponto 13 dos factos provados e aditam-se os pontos 13-A e 13-B nos seguintes termos:
- ponto 13: «O 1º R. remeteu ao A., com data de 10 de Outubro de 2019, a carta cuja cópia constitui o doc. 6 da petição inicial e cujo teor se dá aqui por reproduzido, com o seguinte teor:
“Porto, 10 de Outubro de 2019
Assunto: Resolução de contrato promessa de compra e venda por incumprimento
Exm.º Senhor,
Venho com a presente comunicar-lhe que fica resolvido por incumprimento o contrato promessa de compra e venda relativo ao imóvel correspondente ao 1.º andar direito do n.º ... da Rua ..., da freguesia ..., no Porto.
Com efeito, foi incumprido do dever de notificar o meu cunhado, DD, primeiro outorgante no aludido contrato, obrigação contratual essa emergente das cláusulas Quarta, números 1, 2 e 4 e Oitava, [,] sendo que V.ª Ex.ª já não irá cumprir os prazos contratualmente estabelecidos — 15 de Outubro de 2019.
Neste propósito de resolução que ora lhe é comunicado, sou acompanhado por idêntica vontade que lhe vai ser comunicada pelos restantes primeiros outorgantes, meus familiares, cunhado e irmã, respectivamente, DD e CC.
Aproveito esta oportunidade, para acrescentar uma nota pessoal, lamentando a forma absurda e anómala como esta relação contratual se constituiu e se desenvolveu, em que destaco, entre outros, os seguintes factos:
(…)
E) Perante isto, V.ª Ex.ª remeteu-se ao silêncio, e nem sequer teve a elementar cortesia e decência de me contactar para agendar data para a escritura previamente à respectiva convocatória – limitou-se a enviar correio.
E, agora, por falar em correio, estou informado que lhe foi feita chegar cópia da notificação que foi recebida, na qual consto como residente na Rua ..., ..., 1.º Direito, no Porto.
Sinceramente, não percebo, mas acho ser mais uma brincadeira a somar às anteriores.”.»;
- ponto 13-A: «A 2ª R. remeteu ao A., com data de 10 de Outubro de 2019, a carta cuja cópia constitui o doc. 7 da petição inicial, com o seguinte teor:
“Porto, 10 de Outubro de 2019
Assunto: Resolução de contrato promessa de compra e venda por incumprimento
Exm.º Senhor,
Venho com a presente comunicar-lhe que fica resolvido o contrato promessa de compra e venda relativo ao imóvel correspondente ao 1º andar Direito do Nº ... da Rua ..., no Porto, por incumprimento do dever de notificar o meu marido, DD, para a escritura.
Resultam, assim, incumpridas as obrigações emergentes das cláusulas Quarta, números 1, 2 e 4 e Oitava, do mesmo Contrato, sendo que V.a Ex.a já não irá cumprir os prazos contratualmente previstos – 15 de Outubro de 2019.
Neste propósito de resolução que lhe é comunicado, sou acompanhada por idêntica vontade que lhe vai ser comunicada pelos restantes primeiros outorgantes, meus familiares, marido e irmão, BB.
Anexo: Cópia da notificação recebida, sendo que da mesma resulta, também, indevidamente notificado o meu irmão, BB, para a Rua ..., ...-1º Dt., ... Porto”.»;
- ponto 13-B: «O 3º R. remeteu ao A., com data de 10 de Outubro de 2019, a carta cuja cópia constitui o doc. 8 da petição inicial, com o seguinte teor:
“Porto, 10 de Outubro de 2019
Exmos. Snrs,
Venho pela presente comunicar-lhe que, na sequência da minha comunicação datada de 6/10 e expedida a 7/10, fica resolvido o contrato promessa de compra e venda, por incumprimento do dever de me notificar para a escritura, tal como consta das cláusulas Quarta, números 1, 2 e 4 e Oitava, do mesmo Contrato.
Neste propósito de resolução que lhe é comunicado, sou acompanhado por idêntica vontade que lhe vai ser comunicada pelos restantes primeiros outorgantes, meus familiares.
Sem outro assunto de momento,”.».
8) Que se acrescente ao ponto 16 da matéria de facto que o facto aí relatado ocorreu “em Novembro/Dezembro de 2019”.
O ponto 16 da matéria de facto tem a seguinte redacção: “O imóvel identificado em 1. foi novamente colocado no mercado, através de uma outra agência imobiliária denominada “B...”.”
Relativamente a esta matéria diz-se na motivação da sentença recorrida que “confirmaram os Réus que a fração autónoma referida em 1. em Novembro/Dezembro de 2019, foi colocada novamente à venda noutra imobiliária. denominada B...”.
Resultando assim balizado o período temporal em que ocorreu o facto em questão, e porque ao mesmo foi dado relevo na sentença recorrida na fundamentação de direito, afigura-se-nos que será relevante, como defendem os RR., que aquele período, que assim foi apurado, fique a constar da matéria de facto.
Assim, complementa-se a redacção do ponto 16 dos factos provados nos seguintes termos:
«O imóvel identificado em 1. foi novamente colocado no mercado, através de uma outra agência imobiliária denominada “B...”, em Novembro/Dezembro de 2019».
9) Que se considerem provados os factos das alíneas a) e b) dos factos não provados.
São os seguintes os factos em questão, por referência aos factos dos pontos 17 a 20 dos factos provados:
«a) Só atendendo à conjugação da venda e da compra é que os Réus assinaram a promessa de compra e venda referida em 1.
b) O Autor estava ciente do referido em a).».
Na sentença recorrida, como já se referiu no tratamento da primeira questão, a motivação da não prova destes factos decorre do depoimento da testemunha GG, que esclareceu “não ter sido estabelecida qualquer condição para a venda, desde logo, no que respeita à aquisição de outra casa” (nada resultando na motivação que nesta parte se tenha tido em conta qualquer parte do depoimento da testemunha FF, ao contrário do que parecem alegar os recorrentes).
Por seu turno, os recorrentes, para justificar a prova destes factos apenas alegam que “não se afigura credível que o Recorrido, na outorga da Promessa de Compra e Venda, segundo as mais elementares regras de experiência, ignorasse a factualidade das alíneas a) e b) dos Factos Não Provados” (conclusão 42ª).
Ou seja, é de concluir que, nesta parte, não foi dado cabal cumprimento ao disposto no art. 640º, nº 1, al. b), do C.P.C., impossibilitando o conhecimento do recurso nesta parte.
De todo o modo, sempre se dirá que estará aqui em causa a existência de uma estipulação acessória, anterior ou pelo menos contemporânea do contrato-promessa, que não consta deste documento.
Aliás, do contrato resulta precisamente o contrário, já que, nada aí constando sobre uma tal “condição”, consta expressamente na cláusula 9ª, §1, que “os contraentes declaram que o presente contrato reflecte o acordo alcançado, não existindo quaisquer convenções complementares” (sublinhado nosso).
Ora, a ter existido tal estipulação, a mesma sempre teria sido verbal, sendo, consequentemente nula, nos termos do art. 221º, nº 1, do Código Civil.
E ainda que fosse escrita, a sua prova só poderia ser feita pelo respectivo documento (ou outro de força probatória superior), nos termos conjugados dos arts. 364º, nº 1, e nº 2, a contrario, e 410º, nº 2, ambos do Código Civil, o que sempre inviabilizaria que a sua prova pudesse resultar de qualquer depoimento testemunhal.
Não pode, pois, proceder nesta parte a impugnação da matéria de facto.
A propósito da impugnação da matéria de facto os recorrentes vêm ainda defender que o depoimento da testemunha FF é nulo, por violar o sigilo profissional de advogado, ocorrendo uma proibição de valoração de prova, devendo a desconsideração do seu depoimento reflectir-se nas alíneas a) e b) dos factos não provados e no ponto 7 dos factos provados.
Relativamente ao ponto 7 e às alíneas dos factos não provados este tribunal de recurso já se pronunciou especificamente sobre a sua prova ou não, tendo concluído pela alteração da redacção do ponto 7 com base nos documentos respectivos e pela não alteração da resposta dada aos factos não provadas, tudo sem qualquer relevância para o efeito do depoimento da testemunha FF.
O que significa que é irrelevante a questão levantada pelos recorrentes, tornando-se desnecessário apreciar a mesma.
Sempre se acrescenta que, de acordo com a regra geral do art. 199º, nº 1, do C.P.C., a eventual nulidade teria que ser arguida na audiência de julgamento.
É, assim, de prover apenas parcialmente, nos termos supra expostos, a impugnação da matéria de facto apresentada pelos recorrentes.
*
Resta apreciar a quarta questão.
Tendo em conta a alteração da matéria de facto resultante do tratamento da questão anterior, a factualidade a ter em conta é a seguinte:
1) a 5) Com data de 25 de Julho de 2019 foi celebrado o contrato intitulado de contrato-promessa de compra e venda com o seguinte teor:
CONTRATO-PROMESSA DE COMPRA E VENDA
ENTRE:
PRIMEIROS CONTRAENTES: BB, divorciado, natural da freguesia ..., concelho do Porto, residente na Rua ..., ..., 1.º Dto., Porto, titular do CC n.º ..., emitido pela República Portuguesa e válido até 20/10/2021; e CC, casada sob o regime de comunhão de adquiridos com DD (contribuinte fiscal n.º ...), natural da freguesia ..., concelho do Porto, residente na Rua ..., ..., 1.º Dto., Porto, titular do CC n.º ..., emitido pela República Portuguesa e válido até 10/09/2020, na qualidade de PROMITENTES VENDEDORES, e DD, na qualidade de Parte Autorizante;
SEGUNDO CONTRAENTE: AA, solteiro, maior, natural de ..., concelho da Maia, residente na Praça ..., ..., ..., ..., contribuinte fiscal ..., titular do CC n.º ..., emitido pela República Portuguesa e válido até 18/08/2021, na qualidade de PROMITENTE COMPRADOR.
É ACORDADO O PRESENTE CONTRATO-PROMESSA NOS TERMOS E CONDIÇÕES CONSTANTES DAS SEGUINTES CLÁUSULAS:
PRIMEIRA
Os Primeiros Contraentes são donos e legítimos proprietários de uma fracção autónoma designada pela letra "B", correspondente a uma habitação (T2), no primeiro andar direito, com entrada pelo número ... da Rua ..., que integra o prédio em regime de propriedade horizontal sito na Rua ..., ... e Rua ..., ..., freguesia ..., concelho do Porto, inscrito na matriz sob o artigo ..., descrito na Conservatória do Registo Predial do Porto sob o registo n.º ..., com licença de utilização n.º ... de 22/12/1980.
SEGUNDA
Pelo presente contrato, os Primeiros Contraente prometem vender ao Segundo Contraente e este, por sua vez, promete comprar a fracção autónoma descrita na cláusula primeira deste contrato.
TERCEIRA
1. O preço da aqui prometida venda é de € 150.000,00 (cento e cinquenta mil euros), que será pago da seguinte forma:
a. Na presente data, a título de sinal e princípio de pagamento, a quantia de € 20.000,00 (vinte mil euros), através de cheque com o n.0 ..., sacado sobre o Banco 1... e passado a favor do Primeiro Contraente BB.
b. Na outorga da escritura pública de compra e venda, através de cheque visado ou bancário, a restante quantia em dívida, ou seja, € 130.000,00 (cento e trinta mil euros).
QUARTA
1. O aqui prometido contrato de compra e venda realizar-se-á até 15 de Outubro do presente ano, mas nunca antes de decorridos quarenta e cinco dias contados da data da assinatura do presente contrato.
2. Para tal, o Segundo Contraente obriga-se a comunicar aos Primeiros, com quinze dias de antecedência o dia, hora e local para a realização da escritura pública de compra e venda.
3. As despesas referentes ao presente contrato, bem como ao contrato definitivo, nomeadamente impostos e emolumentos notariais e de registo predial serão da exclusiva responsabilidade do Segundo Contraente.
4. Não sendo marcada a competente escritura pública de compra e venda no prazo a que alude o n.º 1 desta cláusula, considera-se, independentemente de interpelação, imediatamente resolvida a presente promessa de compra e venda.
QUINTA
1. A fracção aqui prometida vender será transmitida livre de quaisquer ónus ou encargos.
2. A Segunda Contraente declara conhecer a composição e o estado físico em que o imóvel actualmente se encontra, nada tendo a reclamar.
SEXTA
1. Se qualquer dos contraentes não comparecer para outorgar a escritura pública na data e local designados para tal, bem como para proceder ao pagamento do restante preço, fica desde já, convencionado que a outra parte poderá, de imediato, resolver o presente contrato, sem necessidade de qualquer outra interpelação para cumprimento, com as consequências previstas no n.º 2 do art.º 442.º do Código Civil.
2. Os Primeiros Contraentes também poderão resolver, de imediato, o presente contrato, no caso do Segundo Contraente não cumprir, integral e atempadamente, a obrigação de prestar sinal prevista na alínea a) do ponto um da cláusula terceira.
3. No caso de os Primeiros Contraentes optarem por resolver o presente contrato, nos termos mencionados nos pontos anteriores, deverá notificar o Segundo Contraente de tal facto.
Apesar de ter sido prestado sinal, as partes declaram que ao presente contrato se aplica a execução específica prevista no art.º 830.º do Código Civil.
SÉTIMA
Os contraentes declaram que o presente negócio foi mediado por "A..., Lda." com sede na Rua ..., ... Porto, NIPC ..., registada na Conservatória do Registo Comercial do Porto, titular da licença de actividade imobiliária (AMI) n.º ....
OITAVA
Todas as comunicações entre as partes relativas ao presente contrato serão feitas por carta registada com aviso de recepção, para as moradas supra referidas, ficando ambas as partes obrigadas a comunicar, reciprocamente, qualquer alteração.
NONA
1. Os contraentes declaram que o presente contrato reflecte o acordo alcançado, não existindo quaisquer convenções complementares.
2. Qualquer alteração ou aditamento ao presente contrato só será válido e eficaz se constar de documento escrito assinado por ambas as partes.
DÉCIMA
Declaram as partes, por mútuo acordo, prescindir do reconhecimento presencial das assinaturas, renunciando ao direito de invocar a sua falta.

O presente contrato é feito em triplicado, destinando-se um exemplar a cada contraente, todos com valor de originais.”;
6) O Autor pagou aos RR. a quantia de 20.000.00 € (vinte mil euros), a título de sinal e princípio de pagamento, através da entrega do cheque n.º ..., sacado sobre o Banco 1... e passado a favor do primeiro R..
7) O Autor remeteu, em 20 de Setembro de 2019, duas cartas, registadas com aviso de recepção, dirigidas ao 1º R. e à 2ª R., esta última recebida em 24 de Setembro de 2019, com o seguinte teor:
“Assunto: Agendamento escritura pública de compra e venda - Fracção B da Rua ..., ...
Nos termos e para os efeitos do disposto no ponto 2. da cláusula quarta do contrato-promessa oportunamente celebrado referente à aquisição da fracção autónoma designada pela letra "B", correspondente a uma habitação (T2), no primeiro andar direito, com entrada pelo número ... da Rua ..., que integra o prédio em regime de propriedade horizontal sito na Rua ..., ... e Rua ..., ..., freguesia ..., concelho do Porto, inscrito na matriz sob o artigo ..., descrito na Conservatória do Registo Predial do Porto sob o registo n.º ..., venho comunicar a V. Exas. que a escritura pública realizar-se-á no próximo dia 10 de Outubro, pelas 11h, no Cartório Notarial Dra. EE, sito na Praça ..., ..., 4.º andar, Salas ... ... Porto.”;
8) A notificação referida foi recebida pela 2.ª R., mas o 1.º R. não a recebeu, porquanto não a levantou.
9) Quem elaborou e preparou as comunicações referidas foi a agência imobiliária encarregada pelos RR. da venda do imóvel “A..., Lda.”;
9-A) No dia 7 de Outubro de 2019 o R. DD enviou ao A., que a recebeu no dia 8, uma carta com data de 6 de Outubro de 2019 e o seguinte teor:
“Hoje dia 06/10 domingo soube pela minha mulher que no dia 10 está marcada uma escritura para um apartamento na Rua ..., ..., 1. Direito, no Porto
Fiquei surpreendido porque, sendo eu parte interessada e outorgante no contrato promessa de compra e venda, não recebi e muito menos me foi enviada, até esta data, qualquer notificação para a escritura. Além do mais, penso que é de bom costume entrar primeiro em contato com os intervenientes, de forma a se poderem ajustar agendas sentindo-me afastado de um processo que me pertence, em conjunto com os meus familiares. Chega a ser mesmo ofensivo, além de incompatível, em absoluto, com compromissos profissionais que me vinculam nas próximas semanas, incluindo aquela data.
Considerando, por conseguinte, o que acabo de referir, informo que irei averiguar, também, as consequências legais, que oportunamente irei comunicar, da omissão que praticou, já que a mesma se revela grave.
Sem outro assunto de momento”;
10) O A., no dia e hora agendado, compareceu no Cartório designado tendo em vista a celebração da escritura definitiva de compra e venda, com toda a documentação necessária e que lhe cabia ter na sua posse, incluindo as guias de liquidação de IMT e IS.
11) Porém, nenhum dos RR. ali compareceu.
12) Tendo o A. suportado os custos inerentes ao agendamento da escritura e devidos de honorários ao referido cartório, no montante de € 184,50 (cento e oitenta e quatro euros e cinquenta cêntimos).
13) O 1º R. remeteu ao A., com data de 10 de Outubro de 2019, a carta cuja cópia constitui o doc. 6 da petição inicial e cujo teor se dá aqui por reproduzido, com o seguinte teor:
“Porto, 10 de Outubro de 2019
Assunto: Resolução de contrato promessa de compra e venda por incumprimento
Exm.º Senhor,
Venho com a presente comunicar-lhe que fica resolvido por incumprimento o contrato promessa de compra e venda relativo ao imóvel correspondente ao 1.º andar direito do n.º ... da Rua ..., da freguesia ..., no Porto.
Com efeito, foi incumprido do dever de notificar o meu cunhado, DD, primeiro outorgante no aludido contrato, obrigação contratual essa emergente das cláusulas Quarta, números 1, 2 e 4 e Oitava, [,] sendo que V.ª Ex.ª já não irá cumprir os prazos contratualmente estabelecidos — 15 de Outubro de 2019.
Neste propósito de resolução que ora lhe é comunicado, sou acompanhado por idêntica vontade que lhe vai ser comunicada pelos restantes primeiros outorgantes, meus familiares, cunhado e irmã, respectivamente, DD e CC.
Aproveito esta oportunidade, para acrescentar uma nota pessoal, lamentando a forma absurda e anómala como esta relação contratual se constituiu e se desenvolveu, em que destaco, entre outros, os seguintes factos:
(…)
E) Perante isto, V.ª Ex.ª remeteu-se ao silêncio, e nem sequer teve a elementar cortesia e decência de me contactar para agendar data para a escritura previamente à respectiva convocatória – limitou-se a enviar correio.
E, agora, por falar em correio, estou informado que lhe foi feita chegar cópia da notificação que foi recebida, na qual consto como residente na Rua ..., ..., 1.º Direito, no Porto.
Sinceramente, não percebo, mas acho ser mais uma brincadeira a somar às anteriores.”;
13-A) A 2ª R. remeteu ao A., com data de 10 de Outubro de 2019, a carta cuja cópia constitui o doc. 7 da petição inicial, com o seguinte teor:
“Porto, 10 de Outubro de 2019
Assunto: Resolução de contrato promessa de compra e venda por incumprimento
Exm.º Senhor,
Venho com a presente comunicar-lhe que fica resolvido o contrato promessa de compra e venda relativo ao imóvel correspondente ao 1º andar Direito do Nº ... da Rua ..., no Porto, por incumprimento do dever de notificar o meu marido, DD, para a escritura.
Resultam, assim, incumpridas as obrigações emergentes das cláusulas Quarta, números 1, 2 e 4 e Oitava, do mesmo Contrato, sendo que V.a Ex.a já não irá cumprir os prazos contratualmente previstos – 15 de Outubro de 2019.
Neste propósito de resolução que lhe é comunicado, sou acompanhada por idêntica vontade que lhe vai ser comunicada pelos restantes primeiros outorgantes, meus familiares, marido e irmão, BB.
Anexo: Cópia da notificação recebida, sendo que da mesma resulta, também, indevidamente notificado o meu irmão, BB, para a Rua ..., ...-1º Dt., ... Porto”;
13-B) O 3º R. remeteu ao A., com data de 10 de Outubro de 2019, a carta cuja cópia constitui o doc. 8 da petição inicial, com o seguinte teor:
“Porto, 10 de Outubro de 2019
Exmos. Snrs,
Venho pela presente comunicar-lhe que, na sequência da minha comunicação datada de 6/10 e expedida a 7/10, fica resolvido o contrato promessa de compra e venda, por incumprimento do dever de me notificar para a escritura, tal como consta das cláusulas Quarta, números 1, 2 e 4 e Oitava, do mesmo Contrato.
Neste propósito de resolução que lhe é comunicado, sou acompanhado por idêntica vontade que lhe vai ser comunicada pelos restantes primeiros outorgantes, meus familiares.
Sem outro assunto de momento,”;
14) O A. remeteu uma carta, registada com aviso de recepção, dirigida a cada um dos três RR., com o seguinte teor:
“Assunto: Contrato promessa celebrado em 25/07/2019 referente ao prédio sito na Rua ..., ..., 1 .0 Dto., no Porto.
Exmos. Senhores,
Acuso a recepção das vossas comunicações, cujo teor me mereceu a melhor atenção e, em face do qual, venho transmitir o seguinte:
Como bem sabem, no passado dia 25/07/2019, assinamos o contrato promessa para venda do apartamento da Rua ….
Tal como estabelecido na cláusula quarta do contrato comuniquei, em devido tempo, para as moradas constantes do mesmo e que ficaram estabelecidas como aquelas para as quais deveriam ser feitas quaisquer comunicações, o agendamento da escritura definitiva de compra e venda para o dia 10/10/2019.
As supra referidas comunicações, repito, enviadas para as moradas constantes do contrato, foram dirigidas a todos os promitentes vendedores, sendo que, apenas o Sr. BB não a quis receber.
É um argumento, no mínimo, risível, afirmar que não notifiquei o Sr. DD, quando a carta que remeti à sua esposa (devidamente recebida), e com quem, acredito, este partilhará a sua habitação, também lhe foi dirigida.
Mais, tal argumento é tanto mais risível quanto o facto de a presença do Sr. DD ser apenas necessária na escritura, fruto do regime matrimonial, já que este não é proprietário/herdeiro.
Quanto às notas pessoais transmitidas pelo Sr. BB, acrescento ainda o seguinte:
- A decisão do Sr. BB em adquirir outro apartamento é, naturalmente, alheia à minha vontade, mas um imperativo óbvio decorrente do contrato promessa que comigo celebraram; se tal outro negócio falhou, não consigo alcançar que responsabilidade tenho eu nisso, nem nunca tal transacção foi condição do negócio celebrado comigo;
- A comunicação e o agendamento da escritura definitiva foi tratada por quem o Senhor BB contratou para proceder à venda do apartamento onde habitava para as moradas que constavam do contrato, sendo certo que fruto da minha actividade profissional não me ocorreu, nem tive tempo e oportunidade para lhe transmitir fosse o que fosse, senão aquilo que eram as minhas obrigações decorrentes do contrato.
Como tal, o inacreditável argumento/expediente utilizado para a resolução do contrato, para mais, operada ainda antes mesmo de terminado o prazo para agendamento da escritura definitiva, é insustentável e inaceitável e demonstrativo de uma profunda má-fé perfeitamente perceptível para qualquer pessoa medianamente honesta.
No dia 10/10/2019, conforme atestado na minha posse, estive presente no Cartório aonde foi agendada a escritura definitiva, à hora indicada, tendo V/ Exas. optado por não comparecer, não podendo desconhecer aquele agendamento, por muito que agora o venham negar, já que ninguém acredita que não falam entre vós.
Neste sentido, informo que têm até ao final do mês para me comunicar o agendamento da escritura definitiva, pois mantenho, como o demonstrei inequivocamente, o interesse na aquisição do apartamento ou, para me devolver o sinal de Eur. 20.000,00 que lhes entreguei em dobro.
Caso assim não aconteça, informo que, de imediato, irei avançar para os Tribunais, o que, sinceramente, lamento.”;
15) Estas comunicações, apesar de recebidas, não mereceram qualquer resposta por banda dos RR.;
16) O imóvel identificado em 1. foi novamente colocado no mercado, através de uma outra agência imobiliária denominada “B...”, em Novembro/Dezembro de 2019;
17) O 1º Réu mantinha a sua casa de habitação e domicílio no imóvel referido em 1.;
18. A venda destinar-se-ia a possibilitar a compra de um outro apartamento pelo 1º R.;
19. No dia 25 de Julho de 2019, após a outorga do escrito referido em 1., seria posteriormente outorgada pelo 1º R. uma promessa de compra e venda na qualidade de promitente comprador;
20. O negócio referido em 19. não se realizou.
Dos pontos 1 a 5 resulta que foi celebrado um contrato-promessa de compra e venda, o qual, seguindo a definição legal dada pelo art. 410º, nº 1, do Código Civil, consiste na convenção pela qual alguém se obriga a celebrar certo contrato, sendo bilateral no caso de ambos os contraentes se comprometerem a celebrar futuramente o contrato, e unilateral (cfr. art. 411º do C.C.) se só um dos contraentes está disposto a vincular-se, e ao outro interessa compreensivelmente o estabelecimento desse vínculo.
As partes vinculam-se à celebração de um contrato futuro, muito embora estabelecendo previamente as bases que hão-de informar o conteúdo do contrato prometido, nascendo desta convenção uma obrigação de prestação de facto jurídico, consistente na emissão de uma dada declaração negocial, pelo que os efeitos jurídicos, a que tende qualquer contratação, não se produzem em globo, mas progressivamente.
E quem foram essas partes que se vincularam no caso concreto?
No texto do contrato consta, como decorre da respectiva transcrição, que são “primeiros contraentes”, na qualidade de promitentes-vendedores, o 1º R. e a 2ª R., esta identificada como casada sob o regime de comunhão de adquiridos com o 3º R., que intervém no contrato na qualidade aí denominada de “parte autorizante”.
E no final do contrato, na parte destinada às assinaturas, constam no espaço destinado aos “primeiros contraentes” as assinaturas do 1º R. e da 2ª R., no espaço destinado ao “segundo contraente” a assinatura do A. e no espaço destinado à denominada “parte autorizante” a assinatura do 3º R..
Não sendo uma qualidade legal essa de “parte autorizante”, presume-se, atenta a forma como o 3º R. foi introduzido no contrato, que esteja em causa a prestação de consentimento à venda a realizar pela sua mulher, nos termos do disposto no art. 1682º-A, nº 1, do Código Civil, por força do regime de bens do casamento (que no contrato ficou a constar ser o de comunhão de adquiridos).
Ora, sendo assim, o 3º R. não será proprietário do imóvel prometido vender, mas apenas o 1º R. e a 2ª R., verificando-se que na cláusula 1ª do contrato consta que “os primeiros contraentes são donos e legítimos proprietários”.
Ou seja, as partes no contrato-promessa, que são o promitente-vendedor e o promitente-comprador, são o 1º e a 2ª RR. e o A., posto que aqueles são quem promete (e quem pode fazê-lo, por serem os titulares do direito de propriedade sobre o imóvel objecto do contrato) vender e este é quem promete comprar.
A intervenção do 3º R. respeita apenas à prestação do consentimento para a venda a realizar, o que não implica necessariamente que o mesmo intervenha na escritura pública de compra e venda (como não implicava que interviesse no contrato-promessa), pois o consentimento pode ser prestado por escrito, com a forma exigida para a procuração, nos termos do art. 1684º, nº 2, do Código Civil.
Estamos, então, no caso concreto, perante um contrato-promessa de compra e venda bilateral, já que ambas as partes (promitente-comprador e promitentes-vendedores) se obrigaram, respectivamente, a comprar e a vender.
E nos contratos bilaterais, a lei, nos termos dos arts. 432º, nº 1, e 801º, nº 2, do Código Civil, admite a resolução quando se verifique uma situação de incumprimento definitivo imputável ao devedor.
Impõe-se, então, para haver lugar à resolução, que exista uma impossibilidade culposa de cumprimento da obrigação (art. 801º, nº 1, do C.C.) ou que exista uma situação de mora no cumprimento e que esta se converta em incumprimento definitivo.
De acordo com o art. 808º, nº 1, do Código Civil, a mora converte-se em incumprimento definitivo em duas situações:
- se a prestação não for realizada dentro do prazo razoavelmente fixado pelo credor (interpelação admonitória);
- se o credor perder o interesse que tinha na prestação.
Trata-se de uma “medida complementar de justa e indispensável tutela do credor da obrigação insatisfeita” (ver A. Varela, R.L.J., Ano 118, pág. 54), que tem em vista evitar os danos que poderiam advir ao credor de uma mora perpétua do devedor, possibilitando-lhe tornar a mora em incumprimento definitivo.
A interpelação admonitória com a fixação de um prazo peremptório para o cumprimento é “uma intimação formal dirigida ao devedor moroso para que cumpra a sua obrigação dentro de certo prazo determinado, sob pena de se considerar o seu não cumprimento como definitivo”, e deve, por isso, conter três elementos:
- a intimação para o cumprimento;
- a fixação de um termo peremptório para o cumprimento; e
- a admonição ou a cominação de que a obrigação se terá por definitivamente não cumprida se não se verificar o cumprimento dentro daquele prazo.
Estes elementos são cumulativos e a falta de qualquer um deles “não pode valer para o efeito” (cfr. Baptista Machado, Pressupostos da resolução por incumprimento, in Boletim da Faculdade de Direito - Estudos em Homenagem ao Prof. Dr. J. J. Teixeira Ribeiro, vol. II - Iuridica, Coimbra, pág. 382 e 383).
Quanto à perda de interesse do credor na prestação, esta, nos termos do nº 2 do art. 808º do Código Civil, é apreciada objectivamente - significando, em rigor, o desaparecimento objectivo da necessidade que a prestação visava satisfazer -, embora, como é óbvio, tal não signifique uma abstracção do quadro contratual concreto.
Há-de ter-se em conta “o conteúdo do particular contrato em causa, atendendo não só às específicas cláusulas deste, mas ainda a qualquer declaração ou facto concludente de que possam inferir-se as especiais finalidades de uso ou de troca a que o credor destinava a prestação, etc.”, podendo atender-se mesmo a circunstâncias posteriores, “previsíveis ou não no momento da celebração”.
A objectividade não significa que não se atenda, de todo em todo, o interesse subjectivo do credor; significa antes que “a importância do interesse afectado pelo incumprimento, aferida embora em função do sujeito, há-de ser apreciada objectivamente, com base em elementos susceptíveis de serem valorados por qualquer outra pessoa (designadamente pelo próprio devedor ou pelo juiz), e não segundo o juízo valorativo arbitrário do próprio credor” (Baptista Machado, cit., págs. 354 e 355).
Na maior parte das vezes o desaparecimento do interesse na prestação está ligado às finalidades de uso ou de troca que o credor visava conseguir com a mesma.
Conforme se dispõe no art. 801º, nº 2, do Código Civil, o direito à resolução existe independentemente do direito à indemnização, ou seja, mesmo optando pela resolução do contrato, o credor mantém ainda o direito à indemnização pelos danos sofridos com o incumprimento do devedor (cfr. P. Lima - A. Varela, Código Civil anotado, vol. II, 3ª ed., pág. 60).
No caso de contrato-promessa, como é o dos autos, e uma vez que, em face do disposto no art. 441º do Código Civil, toda a quantia entregue pelo promitente comprador ao promitente vendedor reveste carácter de sinal, aquela indemnização, independentemente da demonstração de quaisquer danos concretos, corresponde ao direito a exigir o dobro da quantia que prestou (se o incumprimento é do promitente vendedor) ou ao direito a fazer sua a quantia entregue (se o incumprimento é do promitente comprador) - art.442º, nº 2, do C.C..
Com efeito, o sinal, que “consiste na entrega, por um dos contraentes ao outro, de uma coisa, normalmente uma quantia em dinheiro, efectuada no momento em que se celebra o contrato ou posteriormente”, para além de ter um objectivo de confirmação da celebração do contrato e de envolver uma antecipação do cumprimento, quando seja possível a computação da coisa entregue na prestação devida, representa ainda, “em caso de não cumprimento do contrato, uma sanção contra o faltoso, visto que o contraente fiel pode optar por fazer seu o sinal ou exigir à outra parte a restituição do sinal em dobro, consoante o inadimplemento for imputável a quem o constituiu ou a quem o recebeu, sem ter de provar a quanto montam os danos sofridos ou, sequer, a mera existência destes” (Pinto Monteiro, Cláusula Penal e Indemnização, 1990, págs. 163 e 164).
Ou seja, existindo sinal, ao credor basta provar o incumprimento do devedor, não tendo de provar quaisquer danos concretos, já que a indemnização é medida pelo valor da quantia prestada a título de sinal.
E tal significa que o credor terá direito a ser indemnizado pelo valor do sinal, quer os danos concretos que sofreu tenham sido superiores quer inferiores àquele montante, não sendo admitida qualquer outra indemnização suplementar (cfr. art. 442º, nº 4, do C.C.), pois se entende que tal indemnização cobre todos os danos sofridos.
Portanto, em regra, para haver lugar à resolução, é necessário que exista uma impossibilidade culposa de cumprimento da obrigação ou que exista uma situação de mora no cumprimento e que esta se converta em incumprimento definitivo.
Porém, as partes podem, por acordo, convencionar cláusulas que regulem tal aspecto da relação contratual, substituindo as normas legais que regem tal matéria.
Na verdade, no já citado artigo 432º, nº 1, do Código Civil, é admitida também a resolução convencional do contrato (ou seja, permite-se a fixação, na economia do contrato, de uma cláusula resolutiva expressa).
Para além do mais, ao abrigo do princípio da liberdade contratual decorrente do art. 405º do Código Civil, podem ainda as partes convencionar um termo essencial ou uma condição resolutiva.
Existindo uma condição resolutiva (acontecimento futuro e incerto a cuja verificação se subordina a resolução do negócio jurídico - art. 270º do C.C.), “o contrato torna-se automaticamente ineficaz com a verificação do evento futuro e incerto previsto na cláusula”.
Já com a cláusula resolutiva, a parte “reserva-se o direito de, uma vez verificado o evento futuro e incerto nela previsto, resolver a relação contratual mediante declaração unilateral receptícia”.
Ou seja, “se as partes fixam uma condição resolutiva, a verificação do evento condicionante opera automaticamente a resolução do contrato; ao passo que, se estipulam uma cláusula resolutiva, a verificação do evento previsto é apenas um pressuposto da constituição do direito potestativo de, mediante declaração unilateral, operar a resolução do contrato” (cfr. Baptista Machado, Obra Dispersa, vol. I, págs. 184 e 185).
A cláusula resolutiva tem como função normal “organizar ou regular o regime do incumprimento”, definindo a “importância de qualquer modalidade deste para fins de resolução”, obviamente observando os princípios da boa fé contratual, determinando com precisão as prestações e modalidades do inadimplemento que accionam a cláusula e não comportando em si uma fraude ao princípio do art. 809º do Código Civil (ob. e aut. cits., págs. 186 e 187).
Pode ocorrer também, por outro lado, que o prazo da prestação seja um elemento essencial na economia do contrato, quer pela própria natureza da prestação ou pela finalidade do contrato, quer porque as partes assim o convencionaram.
E estaremos então perante um termo essencial - “a essencialidade do termo diz respeito à influência deste sobre os efeitos do contrato, muito em especial sobre a redução ou desaparecimento da utilidade da prestação para o credor após o vencimento do termo”.
Quando o termo está objectivamente integrado ou consolidado na própria prestação e a caracteriza, “por tal forma que com o vencimento deste termo a prestação se torna impossível”, estamos perante o chamado termo essencial objectivo.
Quando a essencialidade lhe é conferida por convenção (expressa ou tácita) das partes, sendo este acordo o que “liga ao termo do vencimento a presunção absoluta do desaparecimento do interesse do credor, se não houver rigorosa pontualidade no cumprimento”, então estamos perante o chamado termo essencial subjectivo.
Este último pode ainda ser absoluto - quando a “não observância do termo implica o incumprimento definitivo da obrigação” - ou relativo - quando aquela não observância “é apenas “fundamento do direito de resolução para o credor, o qual nesta hipótese poderá recusar a prestação mas também poderá optar ainda por exigir o cumprimento retardado” (cfr. ob. e aut. cits., págs. 188 e 189).
Porque na cláusula resolutiva há que precisar também o tempo ao fim do qual se deve considerar o incumprimento relevante para efeitos de resolução, na prática existe uma certa coincidência entre esta e o termo essencial.
Desde logo, considerando o que se expôs, é de concluir que o termo essencial relativo é no fundo uma cláusula resolutiva, sendo termo essencial unicamente “no sentido de que define a importância ou essencialidade do prazo de cumprimento para efeitos de resolução”.
Relativamente ao termo essencial absoluto, estaremos perante este e não perante uma mera cláusula resolutiva “quando da cláusula resulte de modo inequívoco o carácter de absoluta improrrogabilidade da prestação, quando seja claro que o credor não aceitará a prestação tardia” (idem, págs. 191 e 192).
Segundo Baptista Machado (ob. cit., pág. 190), na interpretação das cláusulas concretas insertas nos contratos, há-de ter-se em consideração que a regra, segundo os usos, é a “de que o termo essencial subjectivo tem o sentido de uma simples cláusula resolutiva e que o termo subjectivo absolutamente essencial tem carácter excepcional”, por forma a que na dúvida, “se de um concurso inequívoco de circunstâncias se não conclui com segurança que o termo é absoluto, ele deve ser interpretado como relativo”.
Ao contrário, no Ac. do S.T.J. de 11/04/2000, C.J.S.T.J., tomo 2, pág. 32, defendeu-se que na dúvida se considerava que o termo fixado encerra um “prazo-limite, absoluto ou essencial”.
Como quer que seja, antes de mais, há que interpretar a cláusula e retirar da mesma o seu sentido, de acordo com as regras previstas para o efeito no art. 236º do Código Civil (cfr. Ac. do S.T.J. de 06/04/2000, C.J.S.T.J., tomo 2, pág. 24).
Só existindo aquela dúvida se, após esta operação, não for possível concluir inequivocamente por uma ou outra situação.
Vejamos agora o caso concreto, à luz das considerações supra expostas.
Obrigaram-se então os contraentes, aqui A. e 1º e 2ª RR., a outorgar a respectiva escritura de compra e venda consubstanciadora do negócio prometido.
Do contrato-promessa celebrado resulta, designadamente, que o contrato definitivo deveria ser celebrado até 15/10/2019 e que era do A. a responsabilidade de marcação da data, hora e local da celebração do mesmo.
Nos termos da cláusula 4ª, § 4, não sendo a escritura definitiva marcada dentro daquele prazo, “considera-se, independentemente de interpelação, imediatamente resolvida a presente promessa de compra e venda”.
Não estando em causa um caso de conhecimento por parte do declaratário da vontade real do declarante (já que nada na matéria de facto nos permite equacionar tal situação, nada estando provado quanto à existência de uma determinada vontade real dos 1º e 2ª RR. e ao conhecimento do A. dessa vontade), temos que a declaração negocial valerá com o sentido que um declaratário normal, colocado na posição do real declaratário, possa deduzir do comportamento do declarante, salvo se este não puder razoavelmente contar com ele, não podendo ainda no caso concreto a declaração valer com um sentido que não tenha o mínimo de correspondência no texto do respectivo documento, ainda que imperfeitamente expresso (cfr. arts. 236º e 238º do Código Civil).
Ora, a interpretação que um declaratário normal, colocado na posição do A., pode fazer da cláusula em apreço, e com um sentido correspondente ao texto do documento, é a de que a celebração da escritura definitiva ocorrerá até ao dia 15 de Outubro de 2019 e de que o não cumprimento desse prazo, isto é a não realização da escritura até essa data (escritura esta, de acordo com o contrato, a designar pelo A.), determina que o contrato-promessa se considere resolvido de imediato, sem necessidade de qualquer interpelação.
Isto é, daqui resulta que o não cumprimento do prazo previsto para a realização da escritura pública é logo configurado como uma situação de incumprimento do A. por parte dos promitentes-vendedores e que esse incumprimento é definitivo, não existindo a disponibilidade do credor de optar por aceitar o cumprimento retardado da prestação ou antes por resolver o contrato.
Este é o sentido que resulta do texto do documento, é aquele pelo qual concluiria um declaratário normal e é o sentido com o qual contava o declarante (no caso os promitentes-vendedores).
Temos, pois, que estamos aqui perante um termo essencial subjectivo absoluto, na medida em que se elege, por convenção das partes nesse sentido, o prazo para a realização da escritura pública como um elemento essencial na economia do contrato, e que a não observância desse prazo implica o incumprimento definitivo da obrigação.
Porém, no caso, não sucedeu uma situação de incumprimento do prazo fixado para a marcação da escritura pública.
Na verdade, o A., a quem competia marcar a escritura, procedeu à marcação desta para o dia 10/10/2019, antes de se completar o prazo de que dispunha para o efeito.
O que sucedeu foi que os RR. não compareceram no dia, hora e local designados, escudando-se no argumento de que o A. não enviou carta para convocar o 3º R..
Todavia, o que decorre do contrato-promessa é que o A. se obrigava a comunicar aos primeiros contraentes a marcação da escritura, com 15 dias de antecedência (cláusula 4ª, § 2) e que as comunicações entre as partes seriam feitas “para as moradas supra referidas”, por carta registada com aviso de recepção (cláusula 8ª).
Como decorre de quanto se disse, atenta a posição que cada um dos intervenientes ocupava no contrato, afigura-se-nos que a obrigação de comunicação do A. era apenas relativamente aos 1º e 2ª RR., promitentes-vendedores, pois que apenas estes teriam que comparecer obrigatoriamente na escritura, podendo a 2ª R. apresentar-se munida do consentimento escrito prestado pelo seu marido ou mesmo de uma procuração para o representar no acto. Aliás, tanto assim é que no contrato apenas vêm indicadas as moradas do 1º e da 2ª RR. e não do 3º R. (veja-se a referência a “residente na Rua ...…” no singular) – e se é verdade que, por norma, as pessoas casadas entre si têm a mesma residência, isso nem sempre sucede, não se podendo pretender que se presuma que a morada do 3º R. seria a mesma para efeitos de indicação no contrato.
E ainda que assim se não entendesse, sempre não decorre da cláusula 8ª que tivesse de existir uma comunicação individual para a 2ª R. e o 3º R. – aí fala-se em efectuar as comunicações para as moradas referidas, mas não diz que no caso dos habitantes na mesma morada teria que haver duas comunicações distintas.
Nem decorre da mesma cláusula que um eventual incumprimento de todas as formalidades previstas para as comunicações tivesse como consequência o incumprimento definitivo do contrato.
O certo é que o A. enviou duas cartas, uma para a morada do 1º R. e outra para a morada da 2ª R. (e do 3º R.), não tendo sido recebida a primeira carta porque não foi levantada, mas não havendo dúvidas de que todos os RR. tiveram conhecimento da convocatória, como facilmente se retira das comunicações aludidas nos pontos 9-A, 13 e 13-A. E de que só o 3º R. enviou uma carta ao A. a dar conta de que não iria comparecer, invocando não ter recebido a notificação e ter compromissos inadiáveis.
Nenhum dos restantes RR. comunicou o que quer que fosse, limitou-se a não comparecer.
Aqui chegados, o que nos parece ser de concluir é que os promitentes-vendedores foram convocados para a escritura. O marido da promitente-vendedora não tinha que ser convocado autonomamente, mas teve conhecimento da marcação. A promitente-vendedora poderia (e deveria) ter providenciado por se munir do consentimento escrito do seu marido ou de procuração com poderes para o representar para efeitos de prestar o consentimento (uma vez que este, aparentemente, estava indisponível para comparecer presencialmente), já que é o seu acto de venda que necessita de consentimento do cônjuge, sendo a si que lhe incumbe providenciar pelo mesmo e não ao promitente-comprador.
Logo, houve incumprimento contratual da parte dos 1º e 2ª RR., que não compareceram, injustificadamente, à escritura – o qual, aliás, conferia ao A. o direito de resolver o contrato, nos termos da cláusula 6ª, § 1, mas que este não quis exercer.
Ainda assim, os RR., invertendo a situação, e invocando um incumprimento do A., declararam eles a resolução do contrato-promessa, direito que não lhes assistia, na medida em que, como se viu da análise supra, o direito à resolução do contrato nasce na esfera do contraente fiel e não daquele que incumpriu, como foi o seu caso.
Portanto, o não cumprimento do contrato foi efectivamente imputável aos promitentes-vendedores, conferindo ao A., na qualidade de promitente-comprador, o direito a ser ressarcido com a entrega do sinal em dobro.
Sucede que, como decorre do regime do sinal, a que anteriormente se aludiu, as quantias que têm esse carácter são as que são entregues pelo promitente-comprador ao promitente-vendedor (art. 441º do Código Civil), sendo a obrigação de entrega do sinal em dobro do promitente-vendedor (cfr. art. 442º, nº 2, do Código Civil) e não de qualquer outro terceiro, ainda que possa ter de intervir no contrato, por exemplo para prestar consentimento à venda.
Daqui resulta que são apenas os 1º e 2ª RR. os obrigados a entregar o dobro do sinal ao A. e já não o 3º R., que, como se viu, não assume a posição de promitente-vendedor no contrato, pelo que este deve ser absolvido do pedido contra si formulado na acção.
Anote-se que nem sequer se pode equacionar uma eventual sua responsabilidade por dívidas do cônjuge, posto que não é essa a causa de pedir na acção, nem o fundamento do pedido contra si formulado, não estando alegados factos que permitissem apreciar se a dívida da 2ª R., de pagamento do dobro do sinal, constitui ou não uma dívida comunicável.
Merece, assim, parcial acolhimento a pretensão dos recorrentes com a apresentação do presente recurso, embora com argumentos diferentes dos por si apresentados.
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Em face do resultado do tratamento das questões analisadas, é de concluir pela obtenção parcial de provimento do recurso interposto pelos RR., com a absolvição do 3º R. do pedido, mantendo-se no mais, com excepção das alterações efectuadas à matéria de facto, a sentença recorrida.
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III - Por tudo o exposto, acorda-se em:
- não admitir a junção dos documentos apresentados com o requerimento de recurso;
- conceder provimento parcial ao recurso e, em consequência:
a) alterar a decisão proferida quanto à matéria de facto, nos termos expostos no tratamento da terceira questão enunciada;
b) absolver o R. DD do pedido;
c) no mais, negar provimento ao recurso, confirmando-se a restante parte da sentença recorrida.
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Custas da apelação pelos recorrentes BB e CC e pelo recorrido na proporção do respectivo decaimento, que se considera ter ocorrido na proporção de 2/3 para aqueles recorrentes e 1/3 para o recorrido (art. 527º, nºs 1 e 2, do C.P.C.).
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Notifique.
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Sumário (da exclusiva responsabilidade da relatora - art. 663º, nº 7, do C.P.C.):
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datado e assinado electronicamente
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Porto, 28/5/2023
Isabel Ferreira
Deolinda Varão
Isoleta de Almeida Costa