Acórdão do Tribunal da Relação do Porto
Processo:
494/09.0GAVLG.P1
Nº Convencional: JTRP000
Relator: FRANCISCO MARCOLINO
Descritores: ESCUTA TELEFÓNICA
CONHECIMENTO FORTUITO
EXTENSÃO
LIVRE APRECIAÇÃO DA PROVA
Nº do Documento: RP20130227494/09.0GAVLG.P1
Data do Acordão: 02/27/2013
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: REC. PENAL.
Decisão: NEGADO PROVIMENTO.
Indicações Eventuais: 1ª SECÇÃO.
Área Temática: .
Sumário: I - A escuta telefónica deve ter caráter excecional, senão mesmo residual, de última ratio: só se deve a ela recorrer se e quando os fins da prova não puderem ser alcançados com o uso de meios menos danosos para os direitos fundamentais, ou seja, quando constitua uma “medida necessária, adequada e proporcional numa sociedade democrática para salvaguardar a segurança nacional, a defesa, a segurança pública e a prevenção, a investigação, a deteção e a repressão de infrações penais” [art. 15º da Diretiva 95/46/CE].
II - Ao JIC incumbe averiguar se estão reunidos os pressupostos gerais, os requisitos específicos e fazer o indispensável juízo de ponderação entre os direitos fundamentais conflituantes, devendo concluir pela prevalência do direito à administração da justiça.
III - Concluindo pela imprescindibilidade da medida para a investigação, seja porque a diligência é indispensável para a descoberta da verdade de um dos crimes do catálogo, seja porque há razões para crer que a prova seria, de outra forma, impossível ou muito difícil de obter deve autorizar a interceção e gravação das comunicações telefónicas.
IV - O controlo visa um objetivo triplo: em primeiro lugar, velar pela observância das prescrições e pautas incorporadas no auto autorizante, não se admitindo qualquer tipo de discricionariedade na sua execução; em segundo lugar, a escrupulosidade na receção do material gravado, garantindo-se a sua autenticidade e integridade; e, por último, a adoção de medidas necessárias para a advertência escrita das gravações obtidas e seleção de tudo o quanto possa ser importante.
V - A II parte do n.° 7 do art.° 187° do CPP permite a utilização da gravação de conversações ou comunicações, quer se trate de conhecimentos de investigação ou fortuitos, em outro processo, em curso ou a instaurar, se, cumulativamente: (i) tiver resultado de interceção de meio de comunicação utilizado por pessoa referida no n.° 4 (suspeito ou arguido; pessoa que sirva de intermediário, relativamente à qual haja fundadas razões para crer que recebe ou transmite mensagens destinadas ou provenientes de suspeito ou arguido; ou vítima de crime, neste caso, mediante o respectivo consentimento, efectivo ou presumido); (ii) for indispensável à prova de crime; e (iii) o crime for um dos previstos no n.° 1 do art.° 187° (do catálogo).
VI - Se permite o seu uso em outro processo, em curso ou a instaurar, por maioria de razão permite o uso no processo em curso, passando a haver novo suspeito e/ou arguido (modificação subjetiva).
VII - Equiparável à escuta telefónica é o regime das comunicações transmitidas por correio eletrónico, abrangendo “qualquer mensagem textual, vocal, sonora ou gráfica enviada através de uma rede pública de comunicações que pode ser armazenada na rede ou no equipamento terminal do destinatário até este a recolher" [alínea h) do art.° 2° da Directiva 2002/58/CE], mesmo que guardadas em suporte digital.
VIII - O regime é também estendido da voz humana e à imagem, ou seja, abrange também as comunicações vídeo ou qualquer outra forma técnica de captação de imagem.
IX – Bem como à interceção de comunicações entre presentes, entre pessoas que estão de cara a cara, não podendo um deles gravar a conversa que tem com o outro, sob pena de não poder ser utilizada, para além de que sujeita o que executa a operação a procedimento criminal.
X – Por último, regime das escutas telefónicas é também estendido à obtenção do registo de realização de conversações ou comunicações, à localização geográfica do aparelho técnico da comunicação e à recolha de dados de localização.
XI - Transcritas em auto, as escutas telefónicas, só por si, de acordo com o princípio da livre apreciação da prova, poderão ser suficientes para condenar os arguidos.
Reclamações:
Decisão Texto Integral:
Recurso 494/09.9GAVLG.P1

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Acordam no Tribunal da Relação do Porto

Nos autos de processo comum colectivo n.º 494/09.9GAVLG, tramitados no 2º Juízo da Comarca de Valongo, foram pronunciados os arguidos:
B........, casado, nascido a 6.10.1980 em S. Gonçalo, Amarante, filho de C........ e de D……, titular do BI nº 1220…., com residência na Rua …, …, ….º, …., Amarante, e atualmente recluso no EP do Porto à ordem destes autos;
E........, solteiro, nascido a 13.08.1985 em Massarelos, Porto, filho de F….. e de G…., titular do BI nº 1306…., residente na Rua …, nº .., .., Amarante;
H........, solteiro, nascido a 05.04.1964, filho de I….. e de J….., titular do BI nº 820…., com residência na Rua …., .., …., Amarante, atualmente recluso preventivamente no EP do Porto à ordem destes autos;
K........, divorciado, nascido a 13.03.1973 em Campelo, …., Felgueiras, filho de L….. e de M……, titular do BI nº 1091…., com residência na Rua …., .., …, Felgueiras, e atualmente recluso preventivamente no EP do Porto à ordem destes autos;
N........, solteiro, nascido a 06.05.1986 em …., Amarante, filho de O….. e de P….., titular do BI nº 1346…., residente na Rua …, .., …, . …., Amarante;
Q........, casado, nascido a 23.09.1978 em …., Amarante, filho de O….. e de P….., titular do BI nº 1250…., residente na Rua …. .., Nº …, …., Amarante, atualmente recluso no EP de Vila Real à ordem de outro processo;
R........, divorciado, nascido a 25.03.1983 em …., Amarante, filho de S……, titular do BI nº 1291…., residente na Rua …., …., Vila Meã, Amarante;
T........, divorciado, nascido a 13.07.1971 em …., Felgueiras, filho de U….. e de V….., titular do BI nº 1122….., com residência na Rua …., nº …, …., Felgueiras;
X........, divorciado, nascido a 10.01.1964 em …., …., Amarante, filho de W….. e de Y….., titular do BI nº 066…., residente na ….., …, …., Amarante;
10º Z........, solteiro, nascido a 02.07.1966 em …., filho de AB…… e de AC….., titular do BI nº 998…. e residente na Rua …., …, Amarante;
11º AD........, solteiro, nascido a 17.09.1980 em ….., Amarante, filho de AE….. e de AF….., titular do BI nº 1266…., residente no …., …., Amarante, atualmente recluso no EP de Vila Real à ordem de outro processo;
12º AG........, solteiro, nascido a 12.01.1970 em …., Amarante, filho de AH…. e de AI……, titular do BI nº 9948…., residente no …., …., Amarante;
13º AJ........, divorciado, nascido a 05.09.1963 na ….., Matosinhos, filho de AK….. e de AL….., titular do BI nº 0903…., residente …., nº …., …., Maia;
14ª AM........, divorciada, nascida a 14.06.1969 em …., Amarante, filha de NA…. e de AO……, titular do BI nº 0910….,residente na Rua …., nº .., Mem Martins;
15º AP........, casado, nascido a 15.03.1961 em ….., Marco de Canavezes, filho de AQ….. e de AR….., titular do BI nº 0972…., com residência na Rua …., Nº …, …., …, Marco de Canavezes;
16º AS........, divorciado, nascido a 16.06.1973 em …., Marco de Canavezes, filho de AQ….. e de AR….., titular do CC nº 1090…., com residência na Rua …., …, …., Marco de Canavezes;
17º AT........, casado, nascido a 06.06.1978 em …., Marco de Canavezes, filho de AU…. e de AV….., titular do BI nº 1136….. e residente no …., nº …, …, Marco de Canavezes;
18º AW........, divorciado, nascido a 02.06.1972 em França, filho de AX….. e de AY….., titular do BI nº 998…., residente na Rua …, Nº …., …, Marco de Canavezes;
19º AZ........, divorciado, nascido a 31.07.1970 em …., Paredes, filho de BA….. e de BB….., titular do BI nº 0897…. e residente na ….., …., …., …. Paredes;
20º BC........, solteiro, nascido a 29.10.1984 em ….., …., Paredes, filho de BD…… e de BE….., titular do BI nº 1259…., com residência na Rua …., nº …., …., Penafiel;
21º BF........, casado, nascido a 20.04.1950 em …., Amarante, filho de BG…… e de BH….., titular do BI nº 957…., residente na Rua …., …, …, …, Amarante, atualmente recluso no EP de Vila Real à ordem de outro processo.
Era-lhes imputada a prática de factos susceptíveis de integrarem:
- Em relação aos arguidos B........, E........, H........, K........, N........, Q........, R........, T........, AS........ e AP........, AJ........, AM........, AG........ e AD........, a prática, em autoria material, de um crime de tráfico de estupefacientes agravado, previsto e punido pelas disposições conjugadas dos artigos 21º, nº 1, e 24º, al. l), do Decreto-Lei nº 15/93, de 22 de janeiro;
- Em relação aos arguidos X........, Z........, AT........, AW........, AZ........ e BC........, a prática, em autoria material, de um crime de tráfico de estupefacientes, p. e p. pelo artº 21º, nº 1, do Decreto-Lei nº 15/93, de 22 de janeiro;
- Ao arguido T........, em concurso efectivo, com o antes referido, a prática de dois crimes de condução sem habilitação legal, p. e p. pelo artº 3º, nºs 1 e 2 do DL nº 2/98, de 03.01;
- Ao arguido BF........, em concurso efectivo, com o antes referido, a prática, em autoria material de um crime de detenção ilegal de arma e um outro de detenção ilegal de munições, p. e p. pelos art.ºs 86º, nº 1, al. d), da Lei nº 5/2006, de 23 de fevereiro, na redação decorrente da Lei nº 17/2009, de 06.05; e ainda a prática de uma contra-ordenação p. e p. pelo artº 97º do mesmo diploma legal;
- Aos arguidos AJ........ e AM........, em concurso efectivo, com o antes referido, a prática em autoria material de dois crimes de detenção de arma proibida, p. e p. pelo art.º 86º, nº 1, al. d), com referência ao artº 2º, nº 1, al. m), todos da Lei nº 5/2006, de 23.02, com a redação que lhe foi atribuída pela Lei nº 17/2009, de 06.05.
- Agrava a responsabilidade dos arguidos T........ e AJ........ a circunstância qualificativa da reincidência (artºs 75 e ss. Código Penal).

Efectuado o julgamento, foi proferido acórdão que assim decidiu:
1. Absolveu da pronúncia os arguidos B........, E........, H........, K........, N........, Q........, R........, T........, AS........, AP........, AJ........, AM........, AG........ e AD........ na parte em que lhes é imputada a prática de um crime de tráfico de estupefacientes agravado, p. e p. pelos art.ºs 21º, nº 1, e 24º, al. l), do DL nº 15/93, de 22.01;
2. Absolveu os arguidos AJ........ e AM........ da pronúncia na parte em que lhes imputa a prática de um crime de detenção de arma proibida, p. e p. pelo artº 86º, nº 1, al. d), com referência ao artº 2º, nº 1, al. m), todos da Lei nº 5/2006, de 23.02, na redação dada pela Lei nº 17/2009, de 06.05 (respeitante à detenção da faca que lhes foi apreendida);
3. Absolveu o arguido BF........ da pronúncia na parte em que lhe é imputada a prática de um crime de detenção ilegal de munições, p. e p. pelo artº 86º, nº 1, al. d), da Lei nº 5/2006, de 23.02, na redação dada pela Lei nº 17/2009, de 06.05, e da contra-ordenação p. e p. pelo artº 97º do mesmo diploma legal;
4. Condenou o arguido B........, pela prática, em co-autoria material e na forma consumada, de um crime de tráfico de estupefacientes, p. e p. pelo artº 21º, nº 1, do DL nº 15/93, de 22.01, com referência às tabelas I-A e I-B anexas a esse diploma, na pena de 7 (sete) anos de prisão;
5. Condenou o arguido E........, pela prática, em co-autoria material e na forma consumada, de um crime de tráfico de estupefacientes, p. e p. pelo artº 21º, nº 1, do DL nº 15/93, de 22.01, com referência às tabelas I-A e I-B anexas a esse diploma, na pena de 6 (seis) anos e 6 (seis) meses de prisão;
6. Condenou o arguido H........, pela prática, em co-autoria material e na forma consumada, de um crime de tráfico de estupefacientes, p. e p. pelo artº 21º, nº 1, do DL nº 15/93, de 22.01, com referência às tabelas I-A e I-B anexas a esse diploma, na pena de 6 (seis) anos e 8 (oito) meses de prisão;
7. Condenou o arguido K........, pela prática, em co-autoria material e na forma consumada, de um crime de tráfico de estupefacientes, p. e p. pelo artº 21º, nº 1, do DL nº 15/93, de 22.01, com referência às tabelas I-A e I-B anexas a esse diploma, na pena de 6 (seis) anos de prisão;
8. Condenou o arguido N........, pela prática, em co-autoria material e na forma consumada, de um crime de tráfico de estupefacientes, p. e p. pelo artº 21º, nº 1, do DL nº 15/93, de 22.01, com referência às tabelas I-A e I-B anexas a esse diploma, na pena de 6 (seis) anos de prisão;
9. Condenou o arguido Q........, pela prática, em co-autoria material e na forma consumada, de um crime de tráfico de estupefacientes, p. e p. pelo artº 21º, nº 1, do DL nº 15/93, de 22.01, com referência às tabelas I-A e I-B anexas a esse diploma, na pena de 6 (seis) anos e 3 (três) meses de prisão;
10. Condenou o arguido R........, pela prática, em co-autoria material e na forma consumada, de um crime de tráfico de estupefacientes, p. e p. pelo artº 21º, nº 1, do DL nº 15/93, de 22.01, com referência às tabelas I-A e I-B anexas a esse diploma, na pena de 4 (quatro) anos e 6 (seis) meses de prisão;
11. Condenou o arguido T........:
11.1. Pela prática, em co-autoria material e na forma consumada, de um crime de tráfico de estupefacientes, agravado pela reincidência, p. e p. pelo artº 21º, nº 1, do DL nº 15/93, de 22.01, com referência às tabelas I-A e I-B anexas a esse diploma e ao artº 75º do CP, na pena de 7 (sete) anos de prisão;
11.2. Pela prática, em autoria material e na forma consumada, de dois crimes de condução sem habilitação legal, p. e p. pelo artº 3º, nºs 1 e 2, do DL nº 2/98, de 03.01, na pena de 6 (seis) meses por cada um desses crimes;
11.3. Em cúmulo jurídico das penas parcelares referidas nos pontos 11.1. e 11.2., na pena única de 7 (sete) anos e 4 (quatro) meses de prisão;
12. Condenou o arguido AS........, pela prática, em co-autoria material e na forma consumada, de um crime de tráfico de estupefacientes, p. e p. pelo artº 21º, nº 1, do DL nº 15/93, de 22.01, com referência às tabelas I-A e I-B anexas a esse diploma, na pena de 5 (cinco) anos e 6 (seis) meses de prisão;
13. Condenou o arguido AP........, pela prática, em co-autoria material e na forma consumada, de um crime de tráfico de estupefacientes, p. e p. pelo artº 21º, nº 1, do DL nº 15/93, de 22.01, com referência às tabelas I-A e I-B anexas a esse diploma, na pena de 6 (seis) anos e 6 (seis) meses de prisão;
14. Condenou o arguido AJ........:
14.1. Pela prática, em co-autoria material e na forma consumada, de um crime de tráfico de estupefacientes, agravado pela reincidência, p. e p. pelo artº 21º, nº 1, do DL nº 15/93, de 22.01, com referência às tabelas I-A e I-B anexas a esse diploma e ao artº 75º do CP, na pena de 7 (sete) anos de prisão;
14.2. Pela prática, em co-autoria material e na forma consumada, de um crime de detenção de arma proibida, p. e p. pelo artº 86º, nº 1, al. d), com referência ao artº 2º, nº 1, als. m) e ax), da Lei nº 5/2006, de 23.02, na redação dada pela Lei nº 17/2009, de 06.05, na pena de 6 (seis) meses de prisão;
14.3. Operando o cúmulo jurídico das penas parcelares referidas nos pontos 14.1 e 14.2, foi condenado na pena única de 7 (sete) anos e 2 (dois) meses de prisão;
15. Condenou a arguida AM........:
15.1. Pela prática, em co-autoria material e na forma consumada, de um crime de tráfico de estupefacientes, p. e p. pelo artº 21º, nº 1, do DL nº 15/93, de 22.01, com referência às tabelas I-A e I-B anexas a esse diploma, na pena de 6 (seis) anos e 6 (seis) meses de prisão;
15.2. Pela prática, em co-autoria material e na forma consumada, de um crime de detenção de arma proibida, p. e p. pelo artº 86º, nº 1, al. d), com referência ao artº 2º, nº 1, als. m) e ax), da Lei nº 5/2006, de 23.02, na redação dada pela Lei nº 17/2009, de 06.05, na pena de 6 (seis) meses de prisão;
15.3. Operando o cúmulo jurídico das penas parcelares referidas nos pontos 15.1. e 15.2., foi condenada na pena única de 6 (seis) anos e 8 (oito) meses;
16. Condenou o arguido AG........, pela prática, em co-autoria material e na forma consumada, de um crime de tráfico de estupefacientes, p. e p. pelo artº 21º, nº 1, do DL nº 15/93, de 22.01, com referência às tabelas I-A e I-B anexas a esse diploma, na pena de 5 (cinco) anos e 6 (seis) meses de prisão;
17. Condenou o arguido AD........, pela prática, em co-autoria material e na forma consumada, de um crime de tráfico de estupefacientes, p. e p. pelo artº 21º, nº 1, do DL nº 15/93, de 22.01, com referência às tabelas I-A e I-B anexas a esse diploma, na pena de 5 (seis) anos e 6 (seis) meses de prisão;
18. Condenou o arguido X........, pela prática, em co-autoria material e na forma consumada, de um crime de tráfico de estupefacientes, p. e p. pelo artº 21º, nº 1, do DL nº 15/93, de 22.01, com referência às tabelas I-A e I-B anexas a esse diploma, na pena de 6 (seis) anos de prisão;
19. Condenou o arguido Z........, pela prática, em co-autoria material e na forma consumada, de um crime de tráfico de estupefacientes, p. e p. pelo artº 21º, nº 1, do DL nº 15/93, de 22.01, com referência às tabelas I-A e I-B anexas a esse diploma, na pena de 5 (seis) anos e 6 (seis) meses de prisão;
20. Condenou o arguido AT........, pela prática, em co-autoria material e na forma consumada, de um crime de tráfico de estupefacientes, p. e p. pelo artº 21º, nº 1, do DL nº 15/93, de 22.01, com referência às tabelas I-A e I-B anexas a esse diploma, na pena de 4 (quatro) anos e 6 (seis) meses de prisão, que declarou suspensa na sua execução por igual período de tempo, sujeita a regime de prova (mediante plano de reinserção social a elaborar e a acompanhar pela DGRS) e subordinada ao dever do arguido se abster do consumo de produtos estupefacientes e de se sujeitar a teste semestral de despiste do consumo desse tipo de substâncias;
21. Condenou o arguido AW........, pela prática, em co-autoria material e na forma consumada, de um crime de tráfico de estupefacientes, p. e p. pelo artº 21º, nº 1, do DL nº 15/93, de 22.01, com referência às tabelas I-A e I-B anexas a esse diploma, na pena de 4 (quatro) anos e 6 (seis) meses de prisão, que declarou suspensa na sua execução por igual período de tempo, sujeita a regime de prova (mediante plano de reinserção social a elaborar e a acompanhar pela DGRS) e subordinada ao dever do arguido se abster do consumo de produtos estupefacientes e de se sujeitar a teste semestral de despiste do consumo desse tipo de substâncias;
22. Condenou o arguido AZ........, pela prática, em co-autoria material e na forma consumada, de um crime de tráfico de estupefacientes, p. e p. pelo artº 21º, nº 1, do DL nº 15/93, de 22.01, com referência às tabelas I-A e I-B anexas a esse diploma, na pena de 4 (quatro) anos e 6 (seis) meses de prisão, que declarou suspensa na sua execução por igual período de tempo, sujeita a regime de prova (mediante plano de reinserção social a elaborar e a acompanhar pela DGRS) e subordinada ao dever do arguido se abster do consumo de produtos estupefacientes e de se sujeitar a teste semestral de despiste do consumo desse tipo de substâncias;
23. Condenou o arguido BC........, pela prática, em co-autoria material e na forma consumada, de um crime de tráfico de estupefacientes, p. e p. pelo artº 21º, nº 1, do DL nº 15/93, de 22.01, com referência às tabelas I-A e I-B anexas a esse diploma, na pena de 4 (quatro) anos e 6 (seis) meses de prisão, que declarou suspensa na sua execução por igual período de tempo, sujeita a regime de prova (mediante plano de reinserção social a elaborar e a acompanhar pela DGRS) e subordinada ao dever do arguido se abster do consumo de produtos estupefacientes e de se sujeitar a teste semestral de despiste do consumo desse tipo de substâncias.
24. Condenou o arguido BF........, pela prática, em autoria material e na forma consumada de um crime de detenção de arma proibida, p. e p. pelo artº 86º, nº 1, al. d), com referência ao artº 2º, nº 1, al. an), ambas as disposições da Lei nº 5/2006, de 23.02, na redação dada pela Lei nº 17/2009, de 06.05., na pena de 6 (seis) meses de prisão.
O Tribunal Colectivo decidiu ainda:
- Declarar perdidos a favor do Estado os produtos estupefacientes apreendidos, nos termos do disposto no artº 35º, nº 2, do Decreto-Lei nº 15/93, de 22 de janeiro, e ordenar a respectiva destruição (cfr. artº 62º, nº 6, do mesmo diploma legal);
- Declarar perdidos a favor do Estado todo o dinheiro, artefactos e viaturas apreendidas, nos termos do disposto nos art.ºs 35º, nº 1, e 36º, nº 1, , do Decreto-Lei nº 15/93, de 22 de janeiro, com exceção do dinheiro e telemóveis apreendidos ao arguido BF........, cuja apreensão foi levantada, determinando-se assim a respetiva devolução, sem prejuízo contudo do disposto no artº 34º do RCP (direito de retenção);
- Declarar perdidas a favor do Estado as armas e munições apreendidas (cfr. artº 109º, nºs 1 e 2, do CP).

Não conformados, os arguidos B........, E........, H........, K........, N........, Q........, R........, T........, AD........, AG........, X........, Z........, AM........, AP........, AZ........ e BC........, interpuseram recurso e extraíram das respectivas motivações as seguintes conclusões:
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Nesta Relação, a Ex.ma PGA emite douto parecer no sentido de que o recurso não merece provimento.

Ao parecer responderam os arguidos Q……. e N........, mas apenas quanto à questão da apresentação do recurso nos 3 dias úteis seguintes ao termo do prazo.
Todavia, pagaram a respectiva multa e, por isso, a questão está prejudicada.

Colhidos os vistos dos Ex.mos Adjuntos, cumpre apreciar e decidir.

O Tribunal Colectivo considerou provada a seguinte factualidade (transcrição):
1. Os arguidos B........, E........, H........, K........, N........, Q........, R........, T........, X........, Z........, AD........, AG........, AJ........, AM........, AP........, AS........, AT........, AW........, AZ........ e BC........ são vulgarmente conhecidos entre as pessoas relacionadas com a atividade de compra/venda ou consumo de estupefacientes, especialmente heroína e cocaína, por várias alcunhas. Assim, o arguido B........ é conhecido por “B1” ou “BJ….”, enquanto os arguidos E........ e H........ são apelidados de “BK….”, sendo E........ também frequentemente apelidado de “BL….”.
2. O arguido K........ é reconhecido por “BM….”, ao passo que o arguido T........ é apelidado de “BN….” ou só “BO….”; o arguido AJ........ é conhecido por “BP….”; o arguido R........ é conhecido por “BQ…..” ou “BR…..”, enquanto o arguido N........ é conhecido por “BS….”; o seu irmão Q….. é igualmente conhecido por “BT…..”; e o arguido AG........ é vulgarmente apelidado de “BU…..”.
3. O arguido AS........ é vulgarmente conhecido por "BV……" e o seu irmão AP........ é conhecido também por “BW…..”; o arguido AZ........ é vulgarmente apelidado de “BX…..”, o arguido BC........ é comummente conhecido por “BY…..” e o arguido AW........ é vulgarmente conhecido por “BZ…..”.
4. No entanto, algumas das pessoas que conheciam menos bem os três primeiros arguidos também apelidavam os arguidos E........ e H........ de “B1……”.
5. Os arguidos B........, E........ e H........ desenvolveram, nos moldes que a seguir se descreverão, pelo menos, entre dezembro de 2009 e julho de 2010, a atividade ilícita de venda de heroína e cocaína, não levando os mesmos a cabo qualquer atividade lícita regular que lhes permitisse obter os rendimentos necessários para sobreviver. Por seu turno, os arguidos AJ........ e AM........ desenvolveram aquela atividade desde pelo menos fevereiro de 2010 até julho do mesmo ano e também não desenvolviam qualquer atividade profissional com caráter regular. Os arguidos K........, Q........, N........, T........, AG........, AD........, X........, AP........ e AS........ desenvolveram a atividade de tráfico de heroína e cocaína entre pelo menos março e julho de 2010. O arguido Z........, por seu turno, desenvolveu a mesma atividade desde finais de abril até inícios de julho de 2010. Já o arguido R........ desenvolveu a atividade ilícita de tráfico de estupefacientes por conta do arguido K........ entre maio de 2010 e inícios de julho do mesmo ano. Por sua vez, o arguido AT........ traficou desde pelo menos maio de 2010 até inícios de julho do mesmo ano. Já o arguido AW........ era fornecido de heroína e cocaína pelo arguido K........, parte dela destinada à revenda a terceiros, pelo menos, nos meses de abril e maio de 2010. Por sua vez, o arguido AZ........ levou a cabo a venda e cedência de heroína e cocaína a terceiros, pelo menos, nos meses de abril e maio de 2010, ao passo que o arguido BC........ fê-lo, pelo menos, em maio desse ano.
6. Os referidos arguidos levavam a cabo de forma mais ou menos organizada e profissional a atividade supra indicada, cedendo onerosamente produtos estupefacientes (heroína e cocaína) a terceiros revendedores de menores quantidades e também a consumidores de tais substâncias, com alguma hierarquização entre si, atuando tendencialmente em patamar e, por essa via, logrando uma percentagem de todo o negócio de venda ilícita de estupefacientes na zona alargada de todo o “Vale do Sousa”, designadamente em Felgueiras, Lousada, Penafiel, Amarante e Marco de Canavezes, mas também em Lamego e Vila Real.
7. O arguido B........ era, no lapso temporal indicado e até à sua detenção ocorrida em 7 de julho de 2010, quem normalmente fornecia àquele grupo os produtos estupefacientes transacionados, os quais se subdividiam, a partir da cúpula (considerando a proveniência das substâncias), em diversas pequenas estruturas, com alguma hierarquização (fornecedor/colaborador), onde se efetivava a venda dos indicados produtos a revendedores de quantidades menos significativas e/ou ao consumidor final desse tipo de substâncias.
8. Assim, o arguido B........ superintendia o fornecimento dos produtos estupefacientes àquele grupo, no que era diretamente auxiliado pelos arguidos E........ e H.........
9. Pelo menos um destes acompanhava B........ quando o mesmo se deslocava para se fornecer de grandes quantidades de produtos estupefacientes, sempre superiores a 500 gramas, e posteriormente estabeleciam contactos diretamente com os líderes dos grupos intermédios de distribuição, com áreas geográficas de atuação mais ou menos definidas, sendo eles: os arguidos T........, K........, AP........, AJ........, N........, e, já no decurso da investigação, o próprio arguido H........ criou uma pequena estrutura destinada ao fornecimento direto a consumidores ou a pequenos revendedores, sendo diretamente auxiliado pela arguida CA........, que se apelidava de sua sócia.
10. Simultaneamente, os arguidos E........ e H........, sempre segundo a supervisão do arguido B........, repartiam a cocaína e a heroína que detinham pelos seus clientes, fornecedores intermédios, após lhe acrescentarem bicarbonato de sódio e amoníaco, estando os produtos referidos já devidamente embalados e entabulavam ou recebiam eles próprios os contactos telefónicos tendentes à concretização de tais transações, com indicação do local de permuta “estupefaciente – dinheiro” e hora da mesma, mantendo-se, em geral, o arguido B........ alheado do contacto com os seus clientes, salvo nos estabelecidos com os seus melhores distribuidores supra referidos e os seus próprios fornecedores.
11. Em regra, o arguido B........ apenas tinha contacto direto com os produtos estupefacientes no percurso que invariavelmente realizava entre o local onde se fornecia, algures na zona de Guimarães, e a sua residência, em Amarante, sendo certo que a partir desse momento eram os arguidos E........ e H........ quem trabalhavam, doseavam e procediam à venda das grandes quantidades de produtos estupefacientes que aquele adquiria.
12. O arguido E........ era, inicialmente, o homem de maior confiança de B........ e, por isso, era o mesmo que o acompanhava, por norma, nos contactos com os seus fornecedores. Por seu turno, o arguido H........ tinha como função primordial a de analisar a qualidade dos produtos estupefacientes adquiridos por B........, bem como a tarefa de adicionar à “cocaína” e “heroína” substâncias não estupefacientes – as já referidas bicarbonato de sódio e amoníaco -, que aumentavam as quantidades de produtos obtidas e passíveis de serem transacionadas e, por fim, era também o responsável pela função comummente designada de “cozer a droga” e que significa uma operação ligada ao aquecimento do produto após adicionado das substâncias não estupefacientes.
13. Para os aludidos contactos telefónicos com os clientes, o arguido H........ usava aparelhos com os cartões nºs “914 911 …”, “911 783 …”, “917 739 …”, “913 384 … e 910 828 …”, enquanto o arguido E........ utilizava aparelhos com os cartões nºs “917 804 …”, “913 179 … e 918 786 …”. Sempre que o arguido B........ pretendia contactar os seus fornecedores ou os seus exclusivos colaboradores usava os cartões telefónicos nºs “917 803 …, 910 228 …, 914 911 …, 914 819 …, 919 981 … e 913 384 …”.
14. De forma muito ocasional, alguns dos cartões telefónicos eram usados comummente pelos três primeiros arguidos.
15. Por outro lado, no que respeita às estruturas adjacentes à principal, liderada por B........, o arguido T........ utilizava como cartões telefónicos de contacto os nºs “913 880 …, 914 321 …, 915 765 …, 911 071 …”.
16. Por seu turno, o arguido K........ utilizava os cartões telefónicos com os nºs “914 154 …, 914 862 … e 913 424 …”, enquanto o arguido AJ........ utilizava os cartões telefónicos com os nºs “915 927 … e 915 925 …” e o arguido N........ e o seu irmão Q….. utilizavam os cartões telefónicos nºs “918 585 …, 913 931 …, 911 783 … e 919 981 …”.
17. Os arguidos T........ e K........ utilizavam vários aparelhos telefónicos e outros tantos cartões, sendo que, muitos destes, eram usados no mesmo aparelho.
18. Por outro lado, aqueles dois arguidos redirecionavam as chamadas realizadas para os seus números mais conhecidos dos clientes para os vários outros cartões que possuíam e que, a maior parte deles, estavam entregues aos respetivos colaboradores. Por esta via, ainda que ocorresse interceção telefónica - como ocorreu - do aparelho principal de cada um destes, a localização celular dos demais aparelhos utilizados pelos colaboradores dos mesmos arguidos que estavam a proceder à efetiva venda dos estupefacientes era inviável.
19. Os arguidos AP........ e AS........ utilizavam, na preparação dos seus atos de compra e venda de heroína e cocaína, os cartões telefónicos com os nºs “911 515 … e 918 534 …”.
20. E........ e H........, por seu turno, sob a liderança última e o fornecimento do arguido B........, vendiam os produtos estupefacientes que recebiam, após os dosearem e embalarem, a diversos outros arguidos - K........, R........, N........ e Q........, T........, X........, AG........ AJ........ e AM........, com localizações geográficas de atuação mais ou menos definidas, os quais, por sua vez, organizavam grupos de venda na sua respetiva dependência, auferindo os lucros inerentes das grandes quantidades daqueles produtos que introduziam em circulação.
21. O arguido B........ era tratado por “B1….” ou “BK….”.
22. E........ e H........, além da função de acompanharem, um em cada momento, B........ na aquisição de grandes quantidades de substâncias estupefacientes para doseamento e revenda, tinham ainda as incumbências de armazenar o produto estupefaciente em lugar que dificultasse a sua eventual descoberta pelas forças policiais de investigação, normalmente enterrado em terrenos agrícolas ou florestais relativamente próximos das habitações dos intervenientes referidos mas disfarçados com vegetação para não ser perceptível a quem não conhecesse os locais.
23. As atividades de embalagem dos mesmos produtos em grandes quantidades conforme os pedidos recebidos, de realização das respetivas entregas de quantidades de produto mais substantivas e a recolha das quantias devidas pelas transações de estupefacientes cabiam indistintamente a H........ e E.........
24. No dia 11 de janeiro de 2010, cerca das 22.30 horas, o arguido B........ conduziu o seu veículo de matrícula “..-EV-..”, da marca Mercedes, modelo “270”, até à Rua da ….., em …., Amarante, onde reside o arguido H......... Aí chegado, este acedeu ao interior da mesma viatura e ambos se deslocaram para a estalagem “CB…..”, sita em ….., Penafiel. Nesse local, o arguido H........ saiu do veículo “EV” com duas malas, contendo uma cocaína e outra heroína, e, munido da chave de um dos quartos da estalagem dirigiu-se para o seu interior, enquanto o arguido B........ se ausentou para o café “CC…..”, sito na EN nº 15, em ….., Lousada, onde se encontrava habitualmente com os arguidos T........, K........, E........, AG........ e, por vezes, também com o próprio H.........
25. Este arguido, na data indicada manteve-se no interior do “CB........” a juntar bicarbonato de sódio aos produtos estupefacientes que detinha, pertença de B........, a dosear os produtos finais obtidos e a embalá-los de acordo com as encomendas que haviam recebido.
26. Cerca das 3 horas do dia 12 de janeiro de 2010, o arguido B........ regressou ao “CB........”, entrou diretamente no quarto em que já se encontrava H........ e, volvidos cerca de 2 minutos ausentou-se, carregando o mesmo as duas malas já referidas com as substâncias estupefacientes e ausentando-se do local no veículo “EV” a grande velocidade, de forma a impedir o seu seguimento por terceiros.
27. No dia seguinte, pelas 0.20 horas, os arguidos B........ e H........ chegaram novamente ao indicado “CB........” no veículo com a matrícula “..-EV-..”, acompanhados de um terceiro indivíduo, entrando de imediato num dos quartos do sobredito estabelecimento. Cerca das 2 horas o arguido B........, com os produtos estupefacientes já preparados e doseados abandonou o local no mesmo veículo, enquanto uma hora depois saiu H........ a pé, aguardando-o um terceiro indivíduo na EN nº 15, que o transportou do local.
28. Já no dia 3 de março de 2010, cerca das 20 horas, em S. Mamede de Recezinhos e Castelões, em Penafiel, o arguido H........ chegou ao local como passageiro do veículo de marca “Fiat”, modelo “Punto”, com a matrícula “..-..-MM” e vendeu heroína a CD........, mais conhecido por “CD1…..” e a um consumidor denominado de CE…..
29. No dia 5 de março de 2010, cerca das 23.35 horas, o arguido B........ dirigiu-se à habitação de H........ no veículo “..-EV-..” e forneceu-lhe heroína e cocaína que o mesmo vendeu de imediato a diversos consumidores que já o aguardavam nas imediações de tal residência, cerca de dois minutos após B........ se ausentar do local.
30. No dia 11 de março de 2010, pelas 1.35 horas, mais uma vez os arguidos B........ e H........ chegaram à estalagem “CB........” no veículo “..-EV-..” e entraram diretamente para o quarto habitual onde se mantiveram a preparar a cocaína e a heroína que destinavam à venda até depois das 3 horas.
31. O fabrico do produto final denominado “crack”, um derivado da cocaína que passa por um processo de “cozedura”, com adição de bicarbonato de sódio e/ou de amoníaco, era também da responsabilidade do arguido H......... Este, de resto, a partir de abril/maio de 2010, resolveu também passar a relacionar-se diretamente com consumidores e vendedores de quantidades mais pequenas de estupefacientes que as transacionadas por B........, para tanto recorrendo aos serviços da arguida CA........ que levava a cabo todas as tarefas de receção de encomendas e venda de substâncias estupefacientes, assumindo-se esta nas comunicações telefónicas estabelecidas como “sócia” de H......... A aludida arguida utilizava em tais comunicações os telemóveis com os cartões nºs “910828… e 918386… e 913384…”.
32. No desenvolvimento da actividade individual de venda de heroína e cocaína que o arguido H........ levava autonomamente a cabo, em colaboração com CA........, os mesmos concretizavam tais operações junto ao Campo de Futebol de Travanca, junto ao Centro de Saúde de …., no Lugar …., em ….., Amarante; e no Estradão das Avestruzes, junto à residência daquele.
33. O arguido AW........, também conhecido por “BZ........”, pelo menos ao longo do mês de dezembro de 2009, tomou parte na actividade de distribuição de cocaína e heroína de H........, por diversas ocasiões o transportando para Penafiel, designadamente para …., no seu veículo “Renault”, modelo “Clio”, com a matrícula “..-..-AZ”, de cujo interior este arguido procedia à venda de cocaína e heroína a terceiros – cfr. fls. 4, 6, 10 e 14 do apenso “AD”.
34. No âmbito da actividade ilícita que desenvolviam, todos os arguidos utilizavam nos seus múltiplos contactos telefónicos diários uma linguagem codificada para se entenderem sem se comprometerem expressamente e tornarem mais difícil a perceção das suas actividades relacionadas com a compra e venda de heroína e cocaína. Assim, as palavras “branca, vinho branco e dia” significavam cocaína, por referência à cor clara de tal produto. Por seu lado e por contraponto, as palavras “castanha, escura e vinho tinto” referiam-se a “heroína” por relação à sua cor mais carregada.
35. As expressões “fichas”, “metro” e “cartucho” significam, respetivamente, dinheiro, balança e objecto de acondicionamento do produto estupefaciente.
36. No dia 01.06.2010, pelas 10h55m, o arguido K........, em conversa telefónica com a arguida CA........, referiu “Sim. Que eu …tenho que ir cozer isso”, referindo-se à cocaína que iria vender, respondendo-lhe CA........ “Ele coze”, por referência ao arguido H........, com quem colaborava diretamente.
37. No dia 22.06.2010, pelas 00h58m, o arguido E........ contactou telefonicamente com H........ e combinaram a forma de dosearem e introduzirem bicarbonato de sódio na cocaína e na heroína que possuíam, o que fizeram de imediato. Assim, E........ solicita-lhe: “quando vier para cima traga, dez minutos à porta de tua casa ou acima, com o metro e as sacas (…) Metro, sacas, e a navalha, pronto, você já sabe o resto”. No mesmo dia, mas pela 1h06m, também em conversação telefónica, E........ refere a H........ “Olhe uma coisa e ponha, traga consigo prata, bica e colher(…) para sacar uma cenita”, sendo que “bica” é o diminutivo de bicarbonato de sódio que os arguidos juntavam à cocaína e à heroína para assim obterem maior quantidade de produto para transação. Na indicada ocasião, os arguidos experimentaram a cocaína e a heroína que prepararam nos moldes indicados e detinham para venda.
38. No dia 22.06.2010, pelas 23h15m, o arguido H........, em conversação telefónica, refere a B........, a quem apelida de “chefe”, que tem clientes à espera, enquanto este lhe refere “olha lá, quero a fita métrica”, isto é, a balança para pesar a heroína e a cocaína que de seguida venderam.
39. No dia 21.06.2010, entre as 23h20m e as 23h29m, em conversações telefónicas, o arguido E........ acertou com o arguido T........ a venda de 200,00 gramas de cocaína.
40. De resto, o arguido T........ vendia cerca de 200 gramas de cocaína por dia e cerca de 400 gramas de heroína.
41. Já cerca das 23.29 horas do mesmo dia, T........ contactou telefonicamente E........ e pediu-lhe tal quantidade, já que dispunha de cinco mil euros para o pagamento: “Põe duzentos metros. Que eu vou levar aí … cinco mil euro”.
42. Anteriormente, no dia 30 de abril de 2010, pelas 16.22 horas, os arguidos E........ e K........ conversaram telefonicamente, fornecendo aquele a este o número que o arguido B........, o principal fornecedor de cocaína e de heroína de K.........
43. Ainda no mesmo dia, pelas 18.12 horas, K........ telefonou para E........ e questionou-o se estava com B........, “o BI….”. E........ referiu que o mesmo não podia falar no momento e entabularam diálogo, referindo aquele:
- “Há aqui um gajo … mas era para arran…. Uma coisa de potência, meu. É um amigo dele …que ele conhece. Que ele é que me falou nele e tal…. E eu disse “está bem”. Queria aí uma, uma amostrazita”.
De imediato, E........, tomando decisão por B........, esclareceu: “E dá-lhe tu!”.
44. Face à insistência de K........ relacionada com o preço das substâncias estupefacientes, E........ acabou por concluir: “Ah, pronto, daqui a pouco…daqui a pouco falas com ele, até já”.
45. No dia 1 de maio de 2010, a hora não concretamente apurada, o arguido E........ vendeu ao arguido K........ pelo menos 40 gramas de heroína e 13 de cocaína.
46. Entretanto, cerca das 17.48 horas do mesmo dia, este arguido reclamou com aquele que havia pago como se tivesse adquirido 50 e 20 gramas de cada um daqueles produtos respectivamente:
Vais trazê-lo - saco de 50 gramas de heroína - aqui para pesar na aqui na minha balança. É que …o branco, o branco só dá … na minha balança… no meu metro sé me dá 13 … e o castanho só dá 40 !”
47. E........ contestou tal afirmação: “Não ! Mas tem que estar mal … liga e desliga outra vez. Então tu viste. Foste tu que fizeste…bem viste”.
48. O arguido B........, através dos seus dois colaboradores diretos, E........ e H........, distribuía a título oneroso produtos estupefacientes, para além do mais, aos arguidos N........ e Q........, que também adquiriam as mesmas substâncias aos arguidos K........ e T........: após tais aquisições, N........ e Q........ redimensionavam o produto estupefaciente detido, embalavam-no individualmente e distribuíam na zona de Marco de Canavezes, surgindo este como um dos grupos desconcentrados encarregues da distribuição mais generalizada de substâncias estupefacientes fornecidas pelo 1º arguido.
49. Assim, no dia 21 de junho de 2010, o arguido N........ telefonou ao arguido B........ e solicitou-lhe a entrega de 50 gramas de cocaína e 100 gramas de heroína, acordando a respetiva efectivação da permuta entre quantia monetária e tais substâncias.
50. Posteriormente, nesse mesmo dia, o arguido N........ telefonou novamente a B........ e, dentro do negócio que anteriormente se referiu, acordaram, em aditamento ao já definido, a venda de mais "uma bola da outra", transação que ocorreu cerca das 23.30 horas, nessa mesma data, mas tendo B........ apenas entregue a N........ 28 gramas de heroína e de cocaína, justificando o facto de não satisfazer inteiramente a encomenda com a circunstância de apenas nessa mesma data se deslocar ao seu fornecedor.
51. Entre outros, os arguidos N........ e Q........, no período em causa nos autos, venderam heroína e cocaína aos indivíduos apelidados de "CF….”, “CG….”, “CH…”, “CI….”, “CJ….” e “CK…..”.
52. No dia 22 de junho de 2010, após as 19.30 horas e através da intervenção do arguido H........ para “desenrascar” um amigo, o arguido N........ vendeu duas gramas e meia de cocaína a um indivíduo cuja identidade não foi possível apurar.
53. No dia 8 de julho de 2010, pelas 16.30 horas, no cumprimento de mandados de busca domiciliária emitidos pela Mmª Juiz de Instrução Criminal à habitação do arguido N........, sita em …, …, Amarante, foi apreendida uma lata contendo no seu interior recortes de folhas de alumínio - que apresentavam resíduos de heroína - que se destinavam a embalar o produto estupefaciente e que o mesmo arguido e seu irmão vendiam a terceiros, bem como o automóvel que os mesmos usavam nas suas deslocações tendentes à concretização da venda de heroína e cocaína.
54. Também o arguido K........, que liderava outro pequeno grupo de distribuição de heroína e cocaína, era fornecido de tais produtos pelo trio supra elencado - os 3 primeiros arguidos -, sendo certo que aquele arguido, após dividir, pesar e embalar as substâncias estupefacientes recebidas, adicionadas de outras não estupefacientes, as vendia a terceiros que nelas se mostrassem interessados.
55. O mesmo arguido, para tentar evitar ser localizado na posse de heroína e cocaína e de objetos que usava no seu manuseamento, como o moinho e a balança, enterrava aquelas substâncias numa vinha situada junto à sua habitação, enquanto escondia os objetos referidos em terrenos agrícolas ou muros debaixo de forte vegetação.
56. É por isso que no dia 09.06.2010, pelas 00h43m, o arguido K........ informa o arguido Q........ da exata localização da heroína e da cocaína, o que faz no sentido de este localizar o produto caso algo lhe aconteça: “nem que ele me mate Q….., isto está no segundo poste na segunda fila ao lado da minha carrinha na parte traseira, está no segundo poste..” (cfr sessão 4000 de intercepções telefónicas, constante de fls. 992 e ss. do apenso “CC”).
57. No que respeita ao moinho, já no pretérito dia 16 de maio de 2010, pelas 17.24 horas, o arguido K........ enviou uma mensagem de texto a Q........, referindo: “Mas não está, vou ver onde escondi o moinho mas não me recorda de pegar…” “Estava lá”.
58. De resto, o moinho utilizado pelo arguido K........ acabou por ser apreendido nos autos no dia 27 de julho de 2010, já após o mesmo estar sujeito à medida de coação de prisão preventiva, objeto esse que se encontrava envolvido num saco plástico e foi localizado escondido sob densa vegetação num muro próximo da sua habitação.
59. O arguido K........, por si próprio ou através do seu colaborador R........, fornecia heroína e cocaína aos arguidos CL........ (entretanto falecida), BC........, AW........, AZ........ e AT.........
60. Os arguidos BC........, AW........, AZ........ e AT........ posteriormente embalavam novamente as substâncias obtidas em menores quantidades e revendiam os produtos referidos que adquiriam aos seus consumidores finais ou a outros revendedores de menores quantidades.
61. K........, por regra, não efetuava vendas de heroína e cocaína em quantidades inferiores a 2,5 gramas.
62. Este mesmo arguido procedia à venda dos produtos estupefacientes que preparava na área da sua residência (isto é, na zona da Lixa, em Felgueiras) e mantinha a trabalhar na venda de estupefacientes, sob a sua direta responsabilidade e orientação, o referido arguido R......... Além dos arguidos já referidos, o arguido K........, por si próprio ou através de R........, fornecia produtos estupefacientes, para revenda destes, aos arguidos N........ e Q........, conhecidos pela alcunha de "BT........" que, além de colaborarem e auxiliarem frequentemente aquele na distribuição de heroína e cocaína aos seus consumidores, também desenvolviam uma actividade paralela autónoma de venda de cocaína e heroína.
63. No dia 17 de maio de 2010, após as 15 horas, um desconhecido contactou com o arguido K........ e, após discutir com o mesmo a má qualidade da cocaína pelo mesmo fornecida ultimamente, acordaram ambos e concretizaram a transação de duas gramas e meia do mesmo produto pela quantia de € 100,00.
64. No mesmo dia 17 de maio de 2010, pelas 19.24 horas, um desconhecido contactou com o arguido K........ e, após lhe solicitar a venda de duas gramas e meia de heroína e uma grama de cocaína foi informado por este que não tinha doseada para venda a quantidade correspondente a €. 10,00: “eu não tenho cenas de dez, tenho que fazer isso”. Nesse mesmo dia, alguns momentos depois, o arguido K........ vendeu ao tal desconhecido duas gramas e meia de heroína, uma grama de cocaína e ainda o correspondente a €. 10,00 também de heroína.
65. Já no dia 18 de maio de 2010, pelas 12.49 horas, a arguida AM........ contactou telefonicamente o arguido K........ e questionou-o sobre a cocaína que o seu marido AJ........ havia adquirido àquele momentos antes para revenda: “Não me sabe dizer se ele comprou alguma coisa branca? Telefonou-me agora um cliente a perguntar se ele tinha comprado a ele, não sabe dizer se ele trouxe?”.
66. O arguido K........, por sua vez, informou-a que vendeu nesse dia ao arguido AJ........ “uma pedrinha”.
67. No mesmo indicado dia, após a hora de almoço, o arguido K........ dirigiu-se diretamente à habitação de B........ para se abastecer de cocaína e heroína. Uma vez que o não encontrou, contactou-o telefonicamente, acabando por concretizar a transação nessa ocasião: “Já está, já tem tudo aí” referiu K........, ao qual respondeu B........ “Está, ok, depois liga-me, não está a fazer falta, mais logo depois ”.
68. No dia 21 de maio de 2010 pelas, 23.33 horas, desenvolvendo os arguidos a sua atividade preferencialmente à noite, K........ informou Q........ que só com o cartão telefónico “914862…” já tinha “facturado mil euros” e ainda iria servir mais dois clientes, respondendo-lhe Q........ que já havia ganho naquela ocasião “até agora…4 mil euros”.
69. No dia 22 de maio de 2010, o arguido R........ atendeu uma chamada efectuada pelo arguido BC........, que supunha estar a falar com K........, conhecido por “BM........” ou “BM1….”, acabando por questionar: “O MB1…. não está ?”.
70. O arguido R........ esclareceu que “não, é o empregado dele” e que é ele que está a tratar do negócio dos estupefacientes: “agora sou eu que estou com as coisas”.
71. No referido dia, o arguido R........ vendeu meia grama de cocaína a um tal “CM…..”, em ….., Amarante, sendo certo que o mesmo arguido não se pode deslocar a ….., Paços de Ferreira, como fazia habitualmente, porque tinha em Mancelos “muita gente à espera” a quem vendeu também cocaína e heroína.
72. Já depois da transação ora referida ter sido concluída, o mesmo “CM........” contactou telefonicamente R........ e, demonstrando saber que este trabalhava por conta de K........, adquiriu-lhe 10 gramas de cocaína: “daqui a um bocado vou quer 10 gramas de branca … de pó! E depois de tinto. Tas a ver … ! Depois tens que dar um canequinho fixe. Esta merda nem na prata corre !”.
73. No dia seguinte, 23 de maio de 2010, Q........ adquiriu a R........ 50 gramas de cocaína, transação que se efectivou no “CC........”, em ….., área da comarca de Lousada.
74. No dia 24 de junho de 2010, N........ telefonou a B........, tendo a seu lado o arguido K......... Este, a dado passo, inicia conversa com B........ e dá nota de saber que está a ser alvo de investigação pelas entidades policiais, continuando, no entanto, a sua actividade de venda de cocaína e heroína, em estreita ligação com aquele. Assim, K........ questiona “está complicado não está ?”. B........ responde “É” e aquele acrescenta “para o meu lado. Não sabes mais novidades ?...
75. Ainda na mesma ocasião, K........ refere que tem que continuar a sua actividade ilícita e questiona B........ se tem o produto preparado, referindo: “Tens isso em ordem ?”, recebendo informação positiva de B.........
76. R........, trabalhando segundo orientações de K........, como antes se referiu, também vendeu heroína e cocaína ao arguido BC........ para revenda deste em embalagens de menor dimensão, aquisições que realizava preferencialmente ao próprio K.........
77. Os arguidos K........ e R........ agendavam encontro com os adquirentes de produtos estupefacientes que serviam junto ao “Banco Millennium” e no Campo de Futebol da Aparecida, em Lousada, assim como junto ao posto de abastecimento da “Cepsa” na Serrinha, entre outros.
78. Na zona de Lousada, operava um outro grupo intermédio de distribuição dos produtos estupefacientes em causa nos autos liderado pelo arguido T........, que era igualmente fornecido por B........, E........ e H......... Ocasionalmente e caso aqueles não dispusessem de heroína ou cocaína, o arguido T........ abastecia-se junto de K.........
79. Esta específica estrutura, sob as ordens de T........, integrava os arguidos AD........, X........ (conhecido por “X1….”), Z........ (vulgarmente apelidado de “CF.….”), bem como um indivíduo que se intitulava “CN…..”.
80. O arguido T........, por ele próprio e através dos seus indicados colaboradores, fornecia também heroína e cocaína aos arguidos e irmãos AP…. e AS........, os quais revendiam o produto obtido após o embalarem em quantidades mais pequenas.
81. Os locais de entrega dos produtos estupefacientes no que respeita à atuação desta específica estrutura liderada por T........ eram os lugares de Carvalhos, Cruzeiro, bem como o cemitério e o Campo de Futebol da Aparecida, em Lousada.
82. O arguido T........ fornecia cocaína e heroína, para lá de muitos dos arguidos nos autos, a inúmeros clientes cuja identidade completa não foi possível apurar mas que se identificavam como “o amigo do CW…..”, o “CX….”, o “........ de Penafiel”, “o CY….”, “o CZ….”, o “DA….”, o “ DB….”, o “DC…..”, entre outros..
83. Nos dias 26 e 31 de março de 2010, o arguido T........, conduzindo o veículo com a matrícula “..-.-PM” vendeu cocaína e heroína ao arguido AJ........, cerca das 11 e das 12.30 horas, respetivamente, junto ao Campo de Futebol da Aparecida.
84. CO........ enviou ao seu companheiro T........ uma mensagem no dia 20 de maio de 2010, informando-o que as autoridades policiais, que apelida de “mosquitos”, estão a rondar a sua zona de actuação.
85. Como já se referiu, o arguido T........, por si próprio e através dos seus colaboradores, vendia aos arguidos e irmãos AP… e AS........ cocaína e heroína.
86. No dia 13 de junho de 2010, após as 14.30 horas, o arguido AD........ vendeu a AP........ 50 gramas de heroína, para revenda deste. No dia anterior, já AP........ havia adquirido a AD........ cocaína a que ambos sabiam ter sido adicionado amoníaco, conhecendo ambos perfeitamente os efeitos de tal produto.
87. Com efeito, no referido dia 13 de junho de 2010, AD........ esclareceu AP........ que já tinha preparadas as 50 gramas de heroína - “Já arranjei 50 para você do outro”.
88. Nessa mesma ocasião, AP........ referiu que a cocaína transacionada no dia anterior tinha sido adicionada de amoníaco - “sabes aquilo que se lava o azulejo das casas de banho (…) tinha amoníaco” – mencionando ainda que “rebenta com isso tudo (….) é merda pior que há para os pulmões pá!”.
89. O arguido AG........ é vulgarmente conhecido por "BU........" e nos contactos de preparação das suas ações de aquisição e venda de produtos estupefacientes utilizava o telemóvel com o cartão “918 583 …”.
90. Este arguido passou a liderar uma estrutura autónoma da de T........ de venda de cocaína e heroína.
91. Este passou a ser o fornecedor habitual de AG........ de cocaína e heroína, com quem havia colaborado diretamente no início de 2010, sendo certo que auxiliavam AG........ na mesma tarefa de venda de cocaína e heroína, além de outros, indivíduos que o mesmo apelidava de “DB…..” e “CF….”. As zonas de atuação do arguido AG........ eram os concelhos de Felgueiras, Lousada, Penafiel, Amarante e Marco de Canavezes.
92. Ocasionalmente, o arguido AG........ também se fornecia das substâncias indicadas junto de E........ e H........, a mando de B.........
93. Para tentar dificultar a investigação da sua ação ilícita, o arguido AG........ realizava os carregamentos do seu cartão telefónico nº “918 583 …” através da conta bancária “0400/001125/300 do “CP….”, titulada pela sua sogra, CQ........, mãe da sua esposa, CR.........
94. No dia 21 de junho de 2010, pelas 19.30 horas, o arguido AG........ entregou ao seu colaborador “DB….”, que ainda tinha 18 sacos de 2,5 gramas de heroína, mais 10 gramas da mesma substância para proceder à sua venda.
95. Ainda nesse mesmo dia, cerca das 22.25 horas, após o arguido AG........ se reabastecer de cocaína, voltou a encontrar-se com o aludido “DB….” para lhe disponibilizar tal produto para venda por sua (do arguido) conta.
96. No dia seguinte, cerca das 12.30 horas, o arguido AG........, através de um dos seus colaboradores e para além do mais, vendeu 2,5 gramas de cocaína a um indivíduo desconhecido e ainda meia grama da mesma substância e 2,5 gramas de heroína a um tal “DA….”.
97. Ainda no dia 22 de junho de 2010, pelas 14.38 horas, em conversação telefónica, o arguido AG........ definiu o horário de actividade dos seus vários colaboradores na venda de cocaína e de heroína: “O número 1 vai andar hoje até às 6, queres andar das 6 até à meia-noite ou um dia cada um ?
(…)
“Então eu ando das 6 à meia-noite”.
(…)
E ligou-te mais alguém ontem ?
(…)
Ainda servi dois ou três. Vós estavas com pressa de ir embora.
(…)
E podes andar com o CS….”.
98. Ainda no mesmo dia, já perto da meia-noite, o arguido AD........ vendeu, após contacto do arguido AG........, meia grama de cocaína na Estrada Nacional nº 15, na área de Penafiel.
99. No dia 24 de junho de 2010, pelas 17.38 horas, o arguido AG........ estabeleceu contacto com um dos seus colaboradores e dá-lhe nota das quantias entretanto ganhas com a actividade que desenvolvem de venda de cocaína e heroína, referindo que nos três dias anteriores, sucessivamente, havia ganho e entregue para a aquisição de mais produto, € 1.000,00 em cada um dos dias.
100. Nesse mesmo dia, pelas 22.33 horas, o arguido T........ contactou com o arguido AG........ no sentido deste lhe entregar a quantia monetária que pretendia gastar em nova aquisição de cocaína e heroína, já que B........ iria deslocar-se ao seu fornecedor para se abastecer de produto.
101. No dia 27 de junho de 2010, pelas 9 horas, o arguido N........ vendeu 2,5 gramas de heroína junto ao “Campo de Futebol de Santa Cristina”, Amarante, na sequência de pedido feito por um dos colaboradores do arguido AG........, sendo certo que mantinha ainda na sua disponibilidade pelo menos mais 5 gramas do mesmo produto.
102. Como já se descreveu, o arguido AD........ colaborava diretamente com a estrutura liderada pelo arguido T........ da distribuição e venda a revendedores de cocaína e heroína.
103. Porém, à semelhança do que ocorreu com o arguido AG........, também o arguido AD........, a partir do último terço de junho de 2010, passou a desenvolver a mesma atividade mas autonomamente, sendo contactado através do cartão telefónico nº “911 071 …”.
104. O fornecedor habitual do arguido AD........ de cocaína e heroína era o arguido T........, com quem colaborara, e as suas zonas de atuação eram preferencialmente os concelhos de Felgueiras, Lousada e Marco de Canavezes, sendo auxiliado por um seu cunhado, cuja identidade se não logrou apurar.
105. Ocasionalmente, o arguido AD........ também se fornecia das substâncias indicadas junto de E........ e H........, a mando de B.........
106. Via telefone, no dia 25.06.2010, pelas 25h59m, CI........ solicitou a compra de cocaína e heroína ao arguido AD........, transação que entretanto se concretizou.
107. O arguido AD........ guardava e escondia os produtos estupefacientes num monte, onde se deslocava para os recolher de acordo com as solicitações telefónicas que lhe eram realizadas.
108. Nos dias imediatamente anteriores a 22 de junho de 2010, o arguido AD........ adquiriu a T........, para revenda, 150 gramas de heroína, cuja qualidade lhe não agradava, facto do qual a este deu conta.
109. No dia 22 de junho de 2010, cerca das 12.45 horas, a mando do arguido AD........, um seu colaborador cuja identidade se não logrou apurar, vendeu duas meias gramas de heroína.
110. Ainda no mesmo dia 22 de junho de 2010, cerca das 22.10 horas, o arguido AD........ adquiriu, mais uma vez, heroína e cocaína para revenda ao arguido T.........
111. No dia 23 de junho de 2010, pelas 0.33 horas, o arguido AD........ delineou com o arguido T........ um negócio de venda cinquenta e cem gramas de cocaína e heroína, respetivamente, em que este lhe forneceria o produto e o AD........ o entregaria, obtendo comissão de 1/2 euros por grama.
112. No mesmo dia, pelas 16.21 horas, o arguido AD........ reclamou junto do seu fornecedor de heroína e cocaína, T........, pela falta de qualidade dos produtos, sendo certo que nesses dias já lhe havia adquirido 100 gramas e havia encomendado mais 50, não concretizando esta última aquisição pelos apontados motivos. AD........ entregou ainda a T........ € 2.500,00, sendo certo que este se dirigiu ao seu fornecedor para se abastecer de heroína e cocaína.
113. O arguido AJ........, em conluio e repartição de tarefas com a sua ex-mulher AM........, recebia produtos estupefacientes dos arguidos N........ e Q........, K........ e T........, para além de ocasionalmente aos arguidos E........ e H......... AJ........ e AM........, após prepararem e embalarem os produtos estupefacientes em doses individuais, procediam à respetiva venda, sendo certo que apenas aquele se encarregava da venda direta dos produtos assim preparados a consumidores que neles estivessem interessados, atividade que concretizava em matas, descampados e terrenos agrícolas na zona de Penafiel, área da sua residência, bem como em Vila Meã.
114. A arguida AM........, além de ajudar o ex-marido AJ........ na preparação dos produtos estupefacientes, recebia também telefonemas de potenciais clientes e auxiliava o ex-marido na definição dos locais e momentos em que poderiam ocorrer as permutas entre as substâncias estupefacientes e as respetivas quantias monetárias para o seu pagamento.
115. Assim, no dia 27 de fevereiro de 2010, o arguido AJ........ vendeu várias gramas de heroína e cocaína, preparando já, pelas 15 horas, nova visita a um dos seus fornecedores para continuar a desenvolver a mesma atividade, facto do qual deu conhecimento à ex-mulher AM........:
Estou aqui no monte, estou a vender… se puser o meu dinheiro já posso ir buscar mais.”
116. Esta referiu então “Está! Já que estás aí”.
117. No dia 4 de março de 2010, pelas 17.22 horas, o arguido AJ........ encontrava-se num monte próximo da habitação a vender heroína e cocaína e informou a arguida AM........ que continuaria “a ver se faço dinheiro para ir buscar”.
118. Já no dia 7 de março de 2010, pelas 12.38 horas, a arguida AM........ questiona o arguido AJ........ se já vendeu todas as substâncias estupefacientes, referindo este que sim “está tudo. Branquinha e tudo”, referindo-se à heroína e à cocaína (esta a branquinha).
119. Já no dia 7 de abril de 2010, após as 15.30 horas, o arguido AJ........ vendeu produtos estupefacientes a um tal “CT........”, o qual contactou com AM........, ao que esta o informou do local exato onde AJ........ procedia a tal venda.
120. Nos primeiros dias de julho de 2010, o arguido B........ estava a preparar mais uma visita ao seu fornecedor de cocaína e heroína. Efectivamente, no dia 2 de julho de 2010, este arguido solicitou dinheiro ao arguido T........, invocando que tinha as contas atrasadas com o seu fornecedor de cocaína e heroína e este não entregava nova quantidade daquele produto se as contas não estivessem em dia.
121. Nesse mesmo momento, o arguido T........ encomendou ao arguido B........ 600 gramas de heroína (“depois se der para por aí seiscentos metros, pá, do preto”), aludindo este que lhe vendia tal produto de imediato (“do outro ? Podes levar, não passa nada. Isso tenho eu aí bastante, ainda…sabes).. Aliás, B........ ainda tinha em armazém, naquela mesma data, também umas duzentas gramas de cocaína, mas que queria manter em stock (“tenho aí duzentos metros, só que deixei estar em stock”).
122. Nesse mesmo momento, acordaram de imediato os dois arguidos em T........ adquirir a B........ 100 gramas também de cocaína das 200 que o mesmo detinha, referindo aquele: “Agarra-me cem metros para mim”, ao passo que B........ assentiu, referindo: “Está bem, oh velhinho, vai lá tomar café então que eu vou já lá a tomar café”, tendo-se concretizado a referida transação alguns momentos depois no “CC........”, em …., Lousada, para onde se deslocou B........ no veículo com a matrícula “..-..-MP” e, poucos minutos depois, chegou ao local T........ na viatura com a matrícula “..-GD-..”.
123. Cinco dias depois, ou seja, no dia 7 de julho de 2010, o arguido B........ deu nota que se iria dirigir ao seu fornecedor de grandes quantidades de cocaína e heroína, pelo que procurou obter as quantias monetárias junto dos elementos a quem vendia tais produtos no sentido de obter os valores necessários à transacção que preparava.
124. Assim, o arguido B........ contactou o arguido T........ e solicitou-lhe a entrega de dinheiro para poder abastecer-se de cocaína e de heroína junto do seu fornecedor, obtendo deste arguido mais de € 5.000,00, na qual refere B........: “Não queres vir aqui beber uma coisa, uma cerveja? Eu tenho que ir ao gajo… sabes..” respondendo T........ que “tenho ali mil, mil contos”, acabando por se encontrarem no já referido café “CC….” onde T........ entregou a quantia em causa a B.........
125. Nesse mesmo dia 7 de julho de 2010, cerca das 18 horas, o arguido B........ circulava no veículo automóvel de marca “Volvo”, modelo “V460TD”, com a matrícula “..-..-MP”, na AE nº 11, ao Km 40,00, em Guimarães, acompanhado de H.........
126. Nesse momento, foi a aludida viatura abordada por elementos do NIC da GNR de Santo Tirso, tal como os seus ocupantes.
127. Na execução dos mandados de busca emitidos nos autos ao veículo em causa foi apreendido ao arguido B........, para além do veículo supra aludido:
- uma embalagem de plástico, contendo 449,309 gramas de cocaína, examinada a fls. 2643 e cujo teor aqui se dá por reproduzido;
- um saco contendo 4.7 gramas de canabis, examinada a fls. 2643 e cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido;
- um papel contendo 31,493 gramas de bicarbonato de sódio, cfr. exame de fls. 2643, cujo teor aqui se dá por reproduzido;
- um telemóvel de marca “Nokia”, modelo 1616-2, Imei 352723/04/434373/0, com a respectiva bateria e um cartão da operadora “Vodafone” - examinados a fls. 1586 dos autos;
- um telemóvel de marca “Nokia”, modelo “N95”, Imei 354829024789871, com a respectiva bateria e um cartão da operadora “Vodafone”, aprendido e examinados a fls. 1586 dos autos, cujo teor aqui se dá por reproduzido;
- um telemóvel de marca “Nokia”, cor azul, modelo “1209”, Imei 356027/03/192852/9, com a respetiva bateria e um cartão da operadora “Vodafone”, aprendido e examinados a fls. 1586 dos presentes autos, cujo teor aqui se dá por reproduzido;
- dois telemóveis de marca “Nokia”, ambos modelo “1209”, um com Imei 358287/03/624761/8 e outro com o Imei 359332/03/564220/0, ambos com bateria e cartões da operadora “Vodafone”, examinados a fls. 1586 dos presentes autos e cujo teor aqui damos por reproduzido;
- a importância de €. 1,115,00 em notas do Banco Central Europeu;
- inúmeros recortes de plástico, constantes a fls. 1096 destes autos; e
- os automóveis de marca “Volvo”, com a matrícula “..-..-MP” e um outro com a matrícula “..-..-SA”, que o mesmo usava nas suas deslocações para concretizar as ações descritas nos autos.
128. Da descrita atuação policial e apreensões, resultou a detenção naquela mesma data e hora dos arguidos B........ e H.........
129. Este último detinha, especificamente, na sua roupa e foi-lhe apreendido:
- uma embalagem de plástico, contendo 0,367 gramas de heroína – produto examinado no LPC a fls. 2635 e cujo teor aqui se dá por reproduzido;
- um telemóvel de marca “Nokia”, modelo “1209”, com o IMEI 359332035640113, com bateria e sem cartão SIM, examinado a fls. 1588 dos presentes autos e cujo teor aqui se dá por reproduzido;
- um telemóvel de marca “Nokia”, modelo “1209”, com o IMEI 359332035674369, com bateria, com cartão SIM da “Vodafone” n.º 91946…., examinado a fls. 1588 dos presentes autos e cujo teor damos por reproduzido;
- um telemóvel de marca “Nokia”, modelo “1209”, com o IMEI 358260032246918, com bateria e cartão da “Vodafone” n.º 91385…., apreendido e examinado a fls. 1588 dos presentes autos, cujo teor damos por reproduzido; e,
- a importância de € 154,29.
130. Posteriormente, já no dia 8 de julho de 2010 cumpriram-se os mandados de busca domiciliária à residência do arguido H........ emanados pela Mmª. Jic, a qual se situa na Rua …, .., em …, Amarante.
Na sequência de tal diligência foi localizado e apreendido:
- um canivete com cabo vermelho, cuja lâmina contém resíduos de cocaína e de heroína, cfr. examinado a fls. 1571 e 2635 dos presentes autos, sendo tal objecto utilizado para o corte e doseamento das substâncias estupefacientes;
- três colheres contendo vestígios de heroína e cocaína – cfr. examinado a fls. 1571 e 2635 dos presentes autos -, funcionando tais objetos como material de apoio à dita operação de “cozer”;
- papéis com apontamentos rudimentares de contabilidade das vendas de produtos estupefacientes realizadas;
-um anel, em metal amarelo, com o peso de 3,4 gramas;
- 266,687 gramas de Bicarbonato de sódio (trata-se de um produto químico que é misturado na dita operação de “cozer” os produtos estupefacientes originando a produção do “Crack”, que é um derivado da cocaína, o qual se obtém por um processo simples, a partir do “cozinhado” da cocaína), cfr. examinado a fls. 1571 e 2635 dos presentes autos;
- uma caixa, contendo quatro pires e quatro chávenas, utilizados para misturar o bicarbonato de sódio com os produtos estupefacientes comercializados por B........, E........ e H........ , mantendo resquícios de cocaína - cfr. examinado a fls. 1571 e 2635 dos presentes autos;
- sacos plásticos recortados, utilizados na embalagem de estupefacientes;
- um frasco em plástico, contendo cerca de 152,653 gramas de bicarbonato de sódio, cfr. examinado a fls. 1571 e 2635 dos presentes autos;
- um maçarico de gás, marca “IGI”, modelo “Typhoon 100”, em razoável estado de conservação, o qual era utilizado como fonte de calor para a operação de “Cozer” os produtos estupefacientes;
- um mini-fogão, marca “BLEUET 206”, com botija, com a mesma finalidade acabada de referir;
- recortes de plástico;
- diversos recortes de plástico, utilizados para embalagem de estupefacientes;
- papéis com apontamentos sobre as vendas de estupefacientes;
- uma balança, do tipo cozinha, em plástico branco, sem marca, destinada a pesar o produto estupefaciente;
- um fio entrelaçado, de um metal cor amarelo com 28,00 gramas;
- uma tesoura com cabo vermelho com resquícios de heroína e cocaína, cfr. examinado a fls. 1571 e 2635 dos presentes autos;
- uma tesoura com cabo vermelho com resquícios de heroína e cocaína, cfr. examinado a fls. 1571 e 2635 dos presentes autos;
- quatro pequenas peças, de um metal cor amarelo (laminas em metal amarelo) com 0,2 Gramas;
- uma pequena bolsa, do tipo porta-moedas, cor preta.
131. Ainda no dia 8 de Julho de 2010, foi executado o mandado de busca domiciliária emanado nestes pela Mmª. Jic, à residência do arguido E........ em cuja sequência foram localizados e apreendidos:
- um telemóvel de marca “Nokia”, modelo “1209”, com o Imei “358267103169058512, com cartão da “Vodafone” e sem bateria;
- um telemóvel da marca “Nokia”, modelo acabado de referir e o Imei “358287103162484010”, com cartão “Vodafone”;
- telemóvel da mesma marca e modelo dos dois anteriores, com o Imei 358287036255330” da operadora “Vodafone”, com o número “917 804 …”;
- um suporte de cartão “Vodafone”;
- um papel manuscrito contendo número “912 014 …”; e,
- metade de um cartão da “Vodafone”, conforme teor do documento de fls. 1137 a 1141, cujo teor aqui se dá por inteiramente reproduzido.
132. Ainda no dia 8 de julho de 2010 cumpriram-se os mandados de busca domiciliária à residência do arguido K........, já após este a ter abandonado por ter tido conhecimento da operação policial em curso, emanados pela Mmª. Jic, habitação que se situa na Rua …, …, na Lixa.
133. Na sequência de tal diligência foi localizado e apreendido:
- duas caixas de comprimidos denominados “Noostan” e uma chávena com 30 comprimidos com o princípio activo “Pirocetam”, todos estes objetos escondidos no mini-bar da sala. Estes medicamentos de tipo depressor, são habitualmente empregues na mistura com heroína, após devidamente triturados para o efeito, com o objetivo de potenciar o produto, aumentando a quantidade da substância estupefaciente obtida mas reduzindo a qualidade da mesma e o seu estado de pureza;
- três telemóveis da marca “Nokia”, sendo um modelo “1209”, outro modelo “2630” e o último modelo “1112”;
- € 460,00 em numerário emitido pelo Banco Central Europeu;
- uma caixa de bicarbonato de sódio puríssimo, com o peso de 200,663 gramas, cfr. auto de exame de fls. 2640 cujo teor aqui se dá por reproduzido;
- um frasco de plástico vazio, cfr. fls. 1569 dos autos;.
- um outro frasco;
- um frasco de plástico com as inscrições “Compal” e com uma tampa verde, que se encontrava num vaso dissimulado por trás de um esteio em pedra e alguma vegetação, contendo heroína e cocaína, cfr. exame de fls. 2640;
- um saco plástico, que se encontrava enterrado junto a uma videira, contendo cocaína;
- um frasco de plástico cor-de-laranja com as inscrições “Ovomaltine”, que se encontrava enterrado junto a uma árvore, contendo heroína e cocaína;
- no total foram apreendidas ao arguido 57,289 gramas de cocaína e 51,112 gramas de heroína, cfr. auto de exame de fls. 2640;
- uma faca com vestígios de heroína, cfr. exame de fls. 1569 e 2640 dos presentes autos;
- um rolo de sacos de plástico para embalar a heroína e a cocaína;
- o veículo de matrícula “..-..-DN” usado pelo arguido nas suas deslocações para concretizar as permutas entre produtos estupefacientes e quantias monetárias; e
- dez peças peças metálicas, que se pode designar por “Prensa Manuel”, tudo como melhor se observa do teor de fls. 929 a 965, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido.
134. Já no dia 27 de julho de 2010, cerca das 9.30 horas, a GNR de Amarante, na sequência de denúncia telefónica, apreendeu o moinho do arguido K........, já antes referido, que apresentava resíduos de heroína, na Rua ….., junto à “…..”, nas proximidades da residência do arguido K........, na …., Felgueiras.
135. O objeto em causa era utilizado pelo referido arguido para trabalhar – “cozer” - os produtos estupefacientes que vendia e para lhe adicionar substâncias não estupefacientes como bicarbonato de sódio e amoníaco, sendo certo que se encontrava disfarçado no interior de um saco plástico. O arguido K........, tal como acontecia com o produto estupefaciente e demais utensílios que utilizava na sua descrita atividade ilícita, escondeu tal objeto sob muito densa vegetação num muro próximo da sua habitação, onde veio a ser apreendido, apenas tendo sido encontrado em virtude de, no âmbito de trabalhos agrícolas em curso, estar a ser cortada tal vegetação.
136. No mesmo dia 8 de julho de 2010 cumpriram-se os mandados de busca domiciliária à residência do arguido R........ emanados pela Mmª. Jic, a qual se situa na Rua …, nº .., em …., Amarante. O arguido já aí se não encontrava por, após ter tido conhecimento da atuação policial ocorrida com os arguidos B........ e H........, juntamente com K........, para quem trabalhava no negócio da venda de estupefacientes, bem assim como Q…. e N........, T........ e AG........ terem fugido em direção ao norte de Espanha, tendo sido interceptados pelo NIC da GNR já próximo da aludida fronteira.
137. Na sequência da diligência de busca à habitação de R........ foi localizado e apreendido:
- um telemóvel da marca “SciPhone”, preto, com os imei “351280083021744” e “356296108021746”;
- um telemóvel da marca “Samsung”, modelo “GTS5620”, preto, com o imei “352052043231419;
- um telemóvel da marca “Sharp”, modelo “903Sh”, preto, com o imei “35472100721091”;
- um telemóvel da marca “Ifoe”, modelo “P1687”, preto, com o imei “354969011224795”;
- um telemóvel da marca “Nokia”, modelo “1200”, com o número de série “700950378234”;
- um telemóvel da marca “Nokia”, modelo “1208”, com o imei “358626013323811”, com cartão da “Optimus” e com a indicação em papel do número “917670… - Q….”;
- um computador portátil da marca “Asus”, modelo “Aspire 5602”, com o número de série “LXAB10506661807002500”;
- dois cartões da “Vodafone” com os nºs de série “700913362911” e “800932124597”; e,
- um cartão da “Vodafone” com o PIN “5257” correspondente ao cartão “SIM” inserido no telemóvel “Sharp”, tudo como melhor se observa do teor de fls. 982 a 993, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido.
138. Ainda no dia 8 de julho de 2010 cumpriram-se os mandados de busca domiciliária à residência do arguido T........ e de CO........ emanados pela Mmª. Jic, habitação que se situa no Lugar …., .., …., …, Lixa. O arguido T........ já aí se não encontrava, como se referiu.
139. Na sequência de tal diligência de busca à habitação de T........ e CO........ foi localizado e apreendido:
- 2 cartões de telemóvel com os nºs de série “100842740792 e 700839251867” da “Vodafone;
- um cartão de telemóvel da “Vodadone”, com o nº de série “100842741477”;
- um suporte de cartão de telemóvel da “Vodafone”, com o nº “91576….”;
- um cartão “Yorn” da “Vodafone” com o nº “700889251891”;
- um telemóvel da marca “Sony Ericson”, modelo “W9101”, com o número de série “357392021609334”;
- um telemóvel da marca “Nokia”, modelo “2220S”, com o imei “358312031629303”;
- um telemóvel da marca “Vodafone”, modelo “236”, com o imei “352785034012591”;
- um telemóvel da “Vodafone”, modelo “736”, com o imei “351923030051096”, contendo um cartão da mesma operadora com o nº de série “760815661212”;
- € 210,00 em notas do Banco Central Europeu, e
- o veículo automóvel de matrícula “..-GD-..”, registado a favor de CO........ e no qual o arguido T........ se deslocava a fim de se abastecer de heroína e cocaína e para proceder posteriormente à venda de tais substâncias, tudo como melhor se observa do teor de fls. 1030 a 1057, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido.
140. Ainda no dia 8 de julho de 2010, foi cumprido o mandado de busca domiciliária emitido por ordem da Mmª. Jic em nome do arguido AD........ e à residência deste, sita na …, ... .., .., em Vila Cova da Lixa. Na sobredita diligência foram apreendidos € 190,00 em notas do Banco Central Europeu, resultantes do exercício da atividade ilícita de tráfico de estupefacientes, e o veículo com a matrícula “CS-….-AT”, de marca “Hyundai” Coupé, no qual o mesmo arguido se deslocava para levar a cabo a supra descrita actividade, cfr. fls. 964 a 978 dos autos, cujo teor aqui se dá por inteiramente reproduzido.
141. Também no dia 8 de julho de 2010, foi realizada uma busca domiciliária à habitação da arguida AM........ (e onde, naquela data, também pernoitava o arguido AJ........), sita no …., …, Amarante, onde foram apreendidos os seguintes objectos pelos mesmos detidos e utilizados:
- a quantia de € 121,20;
- um pequeno recorte de papel, contendo apontamento de vários números de telemóvel, designadamente os nºs 919 460 … e 915 931 …, pertencentes ao arguido H........, o nº 913 880 … utilizado pelo arguido T........, o nº 914 862 … usado pelo arguido K........, o nº 914 073 … utilizado pelo arguido AG........ e o nº 911 071 … usado pelo arguido AD........;
- várias pratas” utilizadas para o consumo de estupefacientes, com resíduos de heroína;
- uma faca de fabrico artesanal cuja lâmina tem 29 centímetros e o cabo de madeira tem com 13 cm usada no doseamento da heroína e da cocaína;
- um canivete do tipo ponta e mola para o mesmo efeito;
- uma caixa em metal, um tubo e um doseador, todos com resíduos de heroína;
- alguns recortes de plástico destinados ao acondicionamento e embalagem dos mesmos produtos estupefacientes, a que vulgarmente designados de “ pacos”; e
- 0,395 gramas de haxixe – embora o peso bruto de todo o produto apreendido fosse de 0,605 gramas, cfr. exame de fls. 2632, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido.
142. Ainda no dia 8 de julho de 2010, foram cumpridos os mandados de busca domiciliária emitidos pela Mmª. Jic para a residência do arguido BF........, sita na Rua …, …, Amarante, na qual foi localizado e apreendido:
- € 1.185,00 em notas do Banco Central Europeu dispersas por vários “maços”;
- um bastão metálico extensível com 62 cm de comprimento, subdividido em 3 secções, em bom estado de conservação e funcionamento, objeto este melhor descrito e examinado a fls. 1995, cujo teor aqui se dá por inteiramente reproduzido;
- uma navalha em bom estado de conservação;
- 50 cartuchos metálicos de percussão central, carregados, de calibre 6,35 mm “Browning”, próprios para arma de fogo de classe “B1”, em bom estado de conservação, que estavam dissimulados dentro de um maço de tabaco, objetos estes melhor descritos e examinados a fls. 1995, cujo teor aqui se dá por inteiramente reproduzido;
- 6 cartuchos metálicos , de percussão central, carregados, de calibre 9 mm, próprios para armas de alarme de classe A, objetos este melhor descritos e examinados a fls. 1995, cujo teor aqui se dá por inteiramente reproduzido;
- duas embalagens de bicarbonato de sódio;
- 3 telemóveis da marca “Nokia”, com os “Imei” “354177039130040”, “354801018466691” e “367998034652382.
143. O referido arguido possuía o bastão descrito para efeitos de o usar como arma de agressão.
144. As quantias monetárias apreendidas aos arguidos (com exceção do arguido BF........) foram obtidas em resultado da venda de produtos estupefacientes já levadas a cabo pelos mesmos nos momentos anteriores à intervenção policial.
145.Os telemóveis apreendidos eram usados pelos arguidos (com exceção do arguido BF........) para estabelecerem ligação e para serem contactados por indivíduos interessados em adquirir os produtos estupefacientes que detinham, acordar as quantidades em concreto pretendidas, os respetivos preços a cobrar e o local exato onde se faria a permuta entre o produto e a quantia monetária em causa.
146. No âmbito das suas atividades ilícitas já referidas, o arguido T........ usava os veículos com as matrículas “..-GD-..”, “..-..-TT” e “..-..-PM”, enquanto o arguido B........ usava esta viatura (“..-..-PM”) e ainda outras com as matrículas “..-EV-..”, “..-..-SA” e “..-..-RH”; os arguidos N........ e Q........, por sua vez, faziam-se transportar no veículo com a matrícula “..-..-SX”, os arguidos AP…. e AS........ usavam os veículos “..-GN-..” e “TR-..-..”, o arguido R........ fazia-se transportar na viatura com a matrícula “..-..-HZ”, o arguido K........ fazia-se transportar no veículo com a matrícula “..-..-DN”, o arguido AG........ deslocava-se no veículo com a matrícula “..-JD-..”, o arguido AD........ usava o veículo de matrícula “CS-….-AT”, enquanto o arguido AW........ se deslocava-se no veículo com a matrícula “..-..-AZ”.
147. Os arguidos não possuíam qualquer permissão legal para levar a cabo condutas como as supra descritas e conheciam bem as características dos produtos estupefacientes que adquiriam, detinham e vendiam, sabendo que qualquer daquelas atividades era proibida, destinando, mesmo assim, tais substâncias à venda a quem os procurassem com essa finalidade.
148. De resto, os arguidos B........, E........, H........, K........, N........ e Q........, R........, T........, X…. e AP........, AJ........, AM........, AG........ e AD........ detinham quantidades de cocaína e heroína muito significativas e vendiam sempre quantidades superiores a 10,00 gramas diárias de qualquer daquelas substâncias.
149. Os referidos arguidos adicionavam bicarbonato de sódio e amoníaco à cocaína e à heroína que adquiriam e posteriormente preparavam e acondicionavam, para assim obterem maiores quantidades de produtos para venda e maximizar os lucros monetários.
150. Os arguidos indicados dedicavam-se à descrita atividade com o único propósito de alcançarem lucros com a venda dos referidos produtos a número indeterminado de pessoas ou em quantidades que não foi possível apurar em concreto. Estes arguidos agiram segundo planos previamente traçados, em conjugação de ações, esforços, repartição de tarefas e com alguma organização interna nos diversos patamares em que se dividia a referida estrutura de fornecimento e comercialização de produtos estupefacientes, cuja introdução era assegurada, em primeira linha e por via de regra, pelo arguido B.........
151. Todos os arguidos sabiam dos extremos malefícios que as substâncias em causa provocam na saúde dos cidadãos que as destinassem a consumo próprio, mas apesar disso não se coibiram de atuar da forma descrita.
152. Um dos veículos em que se fazia transportar o arguido T........ para levar a cabo a atividade ilícita acabada de descrever ostentava a matrícula “..-GD-..”, como era do conhecimento da sua irmã CU…., em nome de quem tal veículo se mostra registado.
153. O arguido T........ não tem carta de condução e tinha perfeito conhecimento que não podia conduzir veículo automóvel na via pública sem estar habilitado com a necessária carta de condução ou documento equivalente.
154. Sabia o arguido BF........ que não podia deter o bastão extensível descrito a fls. 1995 e estava perfeitamente ciente que com esta conduta podia colocar em causa a segurança da generalidade dos cidadãos.
155. Por outro lado, sabiam os arguidos AJ........ e AM........ que não podiam deter a navalha ponta e mola que lhes foi apreendida e que, ao atuar da forma descrita, podiam colocar em causa a segurança de todos os demais cidadãos.
156. Agiram sempre todos os arguidos de forma livre, voluntária e consciente, com perfeito conhecimento que as respetivas condutas eram proibidas e sancionadas por lei.

Do percurso de vida e das condições sócio económicas do arguido B........ e respetivos antecedentes criminais
157. O processo de maturação psicossocial do arguido B........ decorreu em convivência familiar afetiva e de investimento parental no desenvolvimento seguro dos descendentes (o arguido é o mais velho de uma fratria de dois).
158. Iniciou a atividade profissional após o abandono da formação académica (habilitado com o 6º ano de escolaridade) pelos 13 anos de idade na área da pichelaria, carreira profissional na qual adquiriu conhecimentos práticos e teóricos através da formação profissional especializada após inserção em empresa do ramo.
159. Entre os anos de 1999 e 2004 desenvolveu aquela atividade profissional por conta própria, sendo certo que a crescente autonomia em relação ao controlo exercido pelas figuras parentais, o convívio com pares do meio de residência e a frequência de meios noturnos, tornou o seu envolvimento no consumo de estupefacientes imperceptível para os familiares.
160. Entre os meses de março e julho de 2005 esteve preso preventivamente à ordem do processo nº 6/05.3GDPNF, do 2º Jz do T.J. da Comarca de Lousada.
161. Entretanto constituiu agregado próprio, contraindo matrimónio. Porém, a intensificação e instalação de um estado de dependência, as dificuldades de exploração de um estabelecimento comercial de aluguer de DVDs e de fotografia comprometeram o cumprimento das rotinas familiares, do suporte ao agregado constituído e das exigências laborais e sociais.
162. À data dos factos em causa nestes autos, o arguido persistia na condição de toxicómano, encontrava-se integrado no agregado próprio, constituído há cerca de dois anos, composto pelo cônjuge e pelo filho de ambos. Viviam num apartamento de tipologia 3, em meio comunitário pacato e no qual estabeleceram convivências cordatas.
163. A condição financeira daquele núcleo era assegurada pela cônjuge e pelos familiares de ambos (através do suporte monetário), o que possibilitava a manutenção das necessidades básicas e de sobrevivência.
164. As relações de proximidade e os laços afetivos às pessoas significativas têm sido mantidos por um regime regular de visitas familiares.
165. Encontra-se recluso no EP do Porto, preso preventivamente desde 10.07.2010 à ordem destes autos. Decorrido um período de desorientação e de adaptação ao meio prisional, abandonados os consumos de estupefacientes e estabilizada a sua conduta, aderiu a um programa de desintoxicação e acedeu a um estado abstémio.
166. A presente privação de liberdade começa a promover no arguido a consciencialização da necessidade de resolução definitiva da toxicomania e da recuperação dos laços familiares e sociais, de manifestação de um sentimento de arrependimento pelos danos causados a terceiros e aos seus familiares, assim como um sentido crítico de responsabilização sobre a sua conduta criminal, as opções passadas e as perspetivas de futuro, percebendo a sua permeabilidade aos convívios marginais e de risco.
167. Não tem antecedentes criminais.

Do percurso de vida e das condições sócio económicas do arguido E........ e respetivos antecedentes criminais
168. O arguido E........ cresceu em …, Vila Meã. Tinha 3 anos de idade quando os seus pais se separaram.
169. O seu processo de desenvolvimento decorreu liderado pela mãe, sem a participação do pai nas responsabilidades parentais e também ao nível afetivo.
170. A sua mãe voltou a encetar nova relação afetiva quando o arguido tinha 10 anos de idade. Com o companheiro da sua mãe o arguido E........ estabeleceu uma boa relação, mas nem sempre o aceitou como figura de autoridade, o que fragilizou a sua estrutura educativa.
171. Revelou desde criança um comportamento rebelde, com o qual a mãe tinha dificuldade em lidar, nem sempre conseguindo conformar o comportamento do filho com a disciplina que lhe procurava impor.
172. Na escola apresentou baixa motivação para os estudos e falta de concentração, tendo encetado precocemente fugas, razões pelas quais foi encaminhado para acompanhamento psicológico, o qual todavia não conseguiu inverter o seu comportamento.
173. Aos 13 anos de idade abandonou o contexto escolar com a conclusão do 5º ano de escolaridade e ficou a trabalhar com o companheiro da mãe num café que este explorava (no rés do chão do imóvel onde habitavam).
174. Nesse trabalho esteve aproximadamente 4 anos, período em que se revelou mais estável, para o que contribuiu a supervisão do companheiro da sua mãe.
175. Desde então tem encetado várias experiências profissionais, com ruturas sucessivas, revelando dificuldade em se estabilizar.
176. À data dos factos em causa nestes autos, E........ mantinha inserção no agregado da progenitora, constituído pelo companheiro desta e um irmão fruto desta relação da sua mãe, atualmente com 15 anos de idade. O agregado beneficiava de um ambiente familiar estável e funcional.
177. Habitavam em casa própria, a progenitora trabalhava na “CV…..”, em Penafiel, e o companheiro numa serração, propriedade do pai deste. E........ também trabalhava na serração familiar, da qual saiu porque não tinham trabalho para lhe dar. O arguido revelava baixa iniciativa, apenas correspondendo quando mandado.
178. Vulgarmente é humilde no relacionamento interpessoal, mas a sua mãe continuava a ter dificuldade em orientá-lo, pois mantinha-se permeável a influências antisociais. No seu tempo de lazer frequentava cafés, sobretudo em ambientes noturnos, e nesses ambientes consumia haxixe.
179. Atualmente mantém-se integrado no mesmo agregado, o qual reúne as condições existentes à data dos factos. Trabalha na construção civil desde há uns meses, após um período de desocupação.
180. É referenciado de forma positiva no meio social em que se insere, na medida em que mantém um comportamento ajustado no relacionamento interpessoal e beneficia da boa imagem do agregado que integra. Contudo, trata-se de um meio social com acentuada problemática de consumo e tráfico de drogas.
181. O presente processo é vivenciado pelo arguido com grande ansiedade, pois teme as suas consequências, avaliando negativamente as perdas decorrentes para o agregado em termos de sofrimento causado, sobretudo à mãe.
182. Não tem antecedentes criminais.

Do percurso de vida e das condições sócio económicas do arguido H........
183. O desenvolvimento pessoal e social do arguido H........, o segundo da prole de quatro fruto da união dos progenitores, decorreu no agregado de origem, em convivência familiar afetiva e sem registo de disfuncionalidades ou acontecimentos traumáticos comprometedores da integração social.
184. Abandonou a formação académica no final da habilitação com o 4º ano de escolaridade, tendo principiado a profissionalização como serralheiro de ferro, funções que exerceu até ao cumprimento do serviço militar obrigatório, seguido de um período de cerca de cinco anos de estadia no Algarve como operário da construção civil e durante o qual efetuou as primeiras experiências com estupefacientes e adquiriu hábitos de consumo.
185. Regressado ao contexto familiar, exerceu as funções de jardineiro numa empresa do ramo, mantendo a regularidade nos consumos de estupefacientes e cuja intensificação levaram a um estado de dependência toxicómana, resistente às sucessivas tentativas de tratamento especializado, ainda que seguidos de períodos de abstinência.
186. As recorrentes recidivas impediram a resolução daquela problemática. O curto contacto com a realidade prisional, em 2000, facilitou a sua inscrição no Centro de Atendimento de Toxicodependentes de Cedofeita, no Porto. Todavia, a intervenção terapêutica instituída foi paulatinamente associada à manutenção dos consumos de estupefacientes e gerida conforme as motivações, as dificuldades e as pressões familiares.
187. Um acidente de que foi vítima reduziu a sua capacidade de trabalho, sendo certo que desde 2008 que a mesma está comprometida pela irregularidade.
188. À data dos factos em causa nestes autos, o arguido H........ persistia na condição de toxicómano, integrado no agregado dos progenitores, em convivência pessoal ordeira e harmoniosa, tanto familiar como socialmente.
189. A condição financeira daquele núcleo familiar tem sido suportada pela reforma do progenitor, gerida de modo equilibrado.
190. As suas referências profissionais, enquanto jardineiro, são excelentes, o que lhe permitirá, uma vez em liberdade, dispor de nova oportunidade laboral na mesma área.
191. As relações de proximidade e os laços afetivos às pessoas significativas têm sido mantidos por um regime regular de visitas familiares.
192. Encontra-se preso preventivamente á ordem destes autos no E.P. do Porto desde o passado dia 10.07.2010.
193. Como é um indivíduo de convivência cordata, cumpriu um protocolo de desintoxicação com manutenção de acompanhamento. Assim que surgiu a respetiva vaga foi colocado no setor da cozinha, onde desempenha funções diárias.
194. A presente privação da liberdade tem promovido no arguido H........ a manutenção de um estado abstémio pacífico e a consciencialização da necessidade de resolução definitiva da toxicomania, bem como da prossecução de acompanhamento especializado em meio livre, a ser retomado no Centro de Respostas Integradas, enquanto suporte às futuras dificuldades a enfrentar.
195. Tem adotado um comportamento ajustado à disciplina exigida em meio prisional, mantendo uma atitude educada e humilde, com consciência crítica de reprovação em relação ao estilo de vida marginal empreendido no passado.
196. Tem os seguintes antecedentes criminais:
- No âmbito do processo sumaríssimo nº 266/08.8GBPNF, do 3º Jz do T.J. da Comarca de Penafiel, por sentença datada de 15.09.2009, transitada em julgado a 15.09.2009, foi condenado na pena de 50 dias de multa, à taxa diária de 5 euros, num total de 250,00 euros, pela prática a 16.02.2008 de um crime de condução sem habilitação legal, p. e p. pelo artº 3º do DL nº 2/98, de 03.01. Tal pena foi declarada extinta pelo seu pagamento por despacho datado de 17.06.2010 e transitado em julgado a 15.09.2009;
- No âmbito do PCC nº 62/06.7GNPRT, do 2º Jz do T.J. da Comarca de Amarante, por acórdão datado de 19.01.2011, transitado em julgado a 18.02.2011, foi condenado nas seguintes penas:
* 100 dias de multa, à taxa diária de 5 euros, pela prática a 04.02.2006 de um crime de simulação de crime, p. e p. pelo artº 366º, nº 1, do CP;
* 80 dias de multa, à taxa diária de 5 euros, pela prática a 04.02.2006 de um crime de condução sem habilitação legal, p. e p. pelo artº 3º, nº 1, do DL nº 2/98, de 03.01;
* 1 ano e seis meses de prisão, suspensa na sua execução pelo mesmo período de tempo, com regime de prova, pela prática a 04.02.2006 de um crime de tráfico de estupefacientes de menor gravidade, p. e p. pelo artº 25º, al. a), do DL nº 15/93, de 22.01;
* Em cúmulo (respeitante às penas de multa), foi condenado na pena única de 130 dias de multa, à taxa diária de 5 euros, num total de 650,00 euros.

Do percurso de vida e das condições sócio económicas do arguido K........ e respetivos antecedentes criminais
197. O arguido K........ teve um processo de desenvolvimento no agregado composto pelos progenitores e irmãos, aqueles dedicados a atividades agrícolas como jornaleiros, num ambiente disfuncional, decorrente do comportamento etílico por parte do pai, evidenciando atitudes austeras e violentas aos familiares, que a mãe, embora temerosa, procurava compensar protegendo a prole.
198. Quando concluiu o 1º ciclo de escolaridade (4º ano), por carência económica, não foi motivado a prosseguir a aprendizagem, pelo que precocemente foi ocupado em tarefas agrícolas até começar a atividade na construção civil aos 14 anos de idade, interrompida por um ano para tratamento à tuberculose que lhe foi diagnosticada.
199. Quando ficou recuperado foi trabalhar como operário do setor do calçado, mas aos 19 anos retomou o exercício da atividade no setor da construção civil.
200. Tinha 26 anos quando contraiu casamento e em 2001 estabeleceu com a cônjuge uma sociedade para o exercício profissional e laboral na área da construção civil (“DD….., Lda.”, com sede em ….).
201. A capacidade laboral que revelou proporcionou um nível económico com ascensão e desafogo, mas a respetiva gestão dos recursos não foi eficaz, quer pelos gastos precipitados em bens adquiridos antes da consolidação económica quer pela dificuldade em receber os pagamentos de vários clientes.
202. Esse quadro a par de um estilo de vida social de convívio com amigos e de consumo excessivo de bebidas alcoólicas provocou dificuldades no relacionamento conjugal e potenciou a separação e subsequente divórcio em 2008, facto que o arguido percecionou negativamente e o conduziu a uma fase de instabilidade emocional.
203. Em 2010, até ser sujeito a prisão preventiva à ordem deste processo, pela DGRS foi tentado que ele cumprisse a decisão de prestação de trabalho comunitário, o que ele recusou, verbalizando que preferia ser preso. Apesar de advertido em sede desse processo, manteve a indecisão, e nas entrevistas havidas apresentou alguma incongruência no discurso, dificuldade em se perspetivar e em elaborar projetos consistentes de vida, notando-se sofrimento psicológico decorrente ainda da situação de separação conjugal e da atribuição à ex-cônjuge da responsabilidade do seu estado e do clima persecutório em que se sentia rodeado.
204. Residia num espaço arrendado, que era então desconhecida dos pais e irmãos, familiares que ele contactava e que o sustentavam. Relacionava-se com indivíduos socialmente referenciados com estilos de vida pouco normativos, em freguesias vizinhas, alguns dos quais tinham sido trabalhadores na empresa que geria.
205. Os seus pais são septuagenários, sendo certo que o progenitor ainda não visitou o arguido por rejeitar a respetiva situação prisional, ao contrário dos restantes elementos do grupo familiar alargado. Não obstante, o seu grupo familiar alargado mostra-se disponível para o apoiar e receber quando for libertado.
206. O arguido K…. deu entrada no E.P. do Porto a 13.07.2011, à ordem destes autos, não apresentando consciência crítica acerca do comportamento que o levou à reclusão.
207. Revela preocupação com a sociedade da qual é sócio com a ex-cônjuge pelas dívidas que lhe estão imputadas e com a responsabilização que lhe poderá ser assacada, aguardando a sua colocação em liberdade para resolver algumas situações.
208. No âmbito do cumprimento da medida de coação a que está sujeito, revelou e manteve interesse em se valorizar, pelo que em julho de 2011 concluiu com aproveitamento a frequência escolar do 2º ciclo.
209. Contudo, a nível disciplinar regista punições a 14.11.2011 por posse de telemóvel e a 5.01.2012 por posse de resistência artesanal.
210. Reconhece a problemática do consumo excessivo de bebidas alcoólicas, que registou durante vários anos e até ficar privado da liberdade.
211. Tem os seguintes antecedentes criminais:
- No âmbito do PCS nº 227/08.7GBFLG, do 1º Jz do T.J. da Comarca de Felgueiras, por sentença datada de 08.10.2009, transitada em julgado a 09.11.2009, foi o arguido K........ condenado em três penas de 100 dias de multa, à taxa diária de 5 euros, pela prática a 11.05.2008 de três crimes de injúria, p. e p. pelo artº 181º, nº 1, do CP, agravados nos termos do artº 184º, com referência ao artº 132º, nº 2, al. l), todos do CP. Em cúmulo foi condenado na pena única de 200 dias de multa, à taxa diária de 5 euros, num total de 1.000,00 euros. Tal pena viria a ser convertida em 133 dias de prisão subsidiária, que o arguido cumpriu;
- No âmbito do PCS nº 538/08.1TAFLG, do 3º JZ do T. J. da Comarca de Felgueiras, por sentença datada de 19.04.2010, transitada em julgado a 10.05.2010, foi condenado na pena de 185 dias de multa, à taxa diária de 5,00 euros, num total de 925,00 euros, pela prática a 19.06.2008 de um crime de injúria, p. e p. pelo artº 181º, do CP. Tal pena viria a ser convertida em 123 dias de prisão subsidiária por despacho datado de 29.03.2011 e transitado em julgado a 17.05.2011.

Do percurso de vida e das condições sócio económicas do arguido N........ e respetivos antecedentes criminais
212. O arguido N........ nasceu no seio de uma família numerosa, sendo o mais novo de um grupo de 9 irmãos, cuja estrutura e dinâmica foi abalada pelo falecimento da progenitora, ocorrido quando o mesmo tinha 11 anos de idade.
213. A partir daí, não mais voltou à escola. O progenitor, trabalhador da construção civil, enfrentava uma situação de vida muito difícil, decorrente da dificuldade em conciliar a atividade laboral com a educação dos filhos.
214. Deste modo, o progenitor do arguido não conseguiu manter níveis de controlo e supervisão adequados, tendo os filhos mais novos crescido entregues aos cuidados das irmãs mais velhas, numa situação de carência afetiva e económica, situação perspetivada com angustia pelo arguido.
215. A sua entrada no mundo do trabalho ocorreu assim precocemente, já que tinha apenas 13 anos de idade quando começou a trabalhar como servente da construção civil, solução encontrada pelo pai para o grupo familiar em geral, não tendo o arguido, apesar de ser o mais novo, beneficiado de tratamento diferente.
216. Teve dificuldade em estabilizar a sua vida profissional (mudou sucessivamente de entidade patronal, de atividade profissional e com períodos sem trabalhar). Do seu currículo profissional constam experiências diversas na construção civil, designadamente como servente, carpinteiro, gesseiro, em Portugal e Espanha, para além de ter trabalhado como pedreiro na Bélgica.
217. Aos 20 anos de idade iniciou uma relação afetiva, passando a viver em união de facto com a namorada em casa do pai, relação que é avaliada por ambos como gratificante.
218. Ao longo dos anos manteve sempre relações cordiais com a comunidade de vizinhança, mas dado o seu envolvimento com o sistema de justiça, em finais de 2004, passou a ser encarado com desconfiança por parte dos vizinhos e conhecidos, verificando-se então algum distanciamento social. Este facto deveu-se também á circunstâncias dum irmão do arguido ter vivido também confrontos com o sistema de justiça, tendo cumprido pena de prisão.
219. Em finais de 2009 encontrava-se desempregado, após dois anos de trabalho regular numa empresa de construção civil da localidade onde residia, tendo posto termo ao respetivo contrato de trabalho sem que, não obstante, tivesse qualquer alternativa laboral.
220. À data vivia com base no trabalho esporádico e ocasional que fazia na construção civil e residia sozinho, numa casa sem as condições mínimas de habitabilidade, da qual o seu pai era arrendatário, sendo este quem lhe garantia algum suporte em termos de fornecimento de refeições, apesar de há anos estar em desacordo com o seu estilo de vida ocioso.
221. O seu quotidiano era passado, essencialmente, entre a casa da mãe do filho (onde ia diariamente), com quem tinha forte vinculação afetiva, a casa do pai (onde fazia as refeições) e um café da localidade, conotado com a problemática da toxicodependência.
222. Em abril de 2010 foi condenado no âmbito do processo nº 823/08.2TBLSD (conforme infra melhor se explicitará), sendo certo que nessa altura já vivia com a mãe do seu filho, numa apartamento arrendado, dotado de condições de habitabilidade – onde se mantém -, constituindo-se como o suporte económico do agregado, visto que a companheira não trabalha (era beneficiária do RSI) e o próprio havia retomado o exercício profissional da construção civil.
223. Até ao verão de 2011 manteve o exercício profissional regular, o que lhe permitiu assumir as suas responsabilidades, demonstrando vontade em recuperar suportes de inserção perdidos.
224. Pelo menos em fevereiro de 2012 havia retomado o estilo de vida ocioso, permanecendo num café próximo da sua residência, conotado com a problemática da toxicodependência, integrando um grupo de pares conotados com a mesma problemática.
225. Nessa altura fazia alguns biscates na área da construção civil e a companheira prestava serviços de limpeza em casas particulares, sendo os rendimentos auferidos manifestamente insuficientes para fazer face aos encargos fixos mensais.
226. O seu estilo de vida é alvo de suspeição por parte dos elementos da comunidade residencial, o que se deve à sua inatividade e às interações que estabelece com pessoas associadas ao tráfico de estupefacientes (designadamente o irmão e familiares da companheira).
227. Teme ser condenado em pena de prisão efetiva, pois tal implicaria o afastamento da sua companheira e do filho, por quem nutre ligação afetiva.
228. Posiciona-se de forma crítica face ao estilo de vida adotado, mas não detém a determinação necessária para reorganizar a sua vida em torno do exercício profissional regular e do afastamento dos pares antissociais.
229. O pai e outros familiares conhecem o seu envolvimento no âmbito deste processo, assim como algumas pessoas residentes na sua comunidade vicinal, com danos para a sua imagem social, que já está sinalizado como alguém envolvido com o sistema de justiça penal.
230. Tem os seguintes antecedentes criminais:
- No âmbito do processo abreviado nº 15/04.0GAAMT, do 2º Jz do T.J. da Comarca de Amarante, por sentença datada de 10.03.2005, transitada em julgado a 04.04.2005, foi condenado nas seguintes penas:
* 80 dias de multa, à taxa diária de 5,00 euros, num total de 400,00 euros, pela prática a 16.09.2004 de um crime de condução sem habilitação legal, p. e p. pelo artº 3º, nºs 1 e 2, do DL nº 2/98, de 03.01. Tal pena viria a ser declara extinta pelo seu pagamento por despacho datado de 21.04.2010;
* 7 meses de prisão, suspensa na sua execução pelo período de 18 meses, subordinada ao pagamento pelo arguido da quantia de 250,00 euros à “DE….” até ao dia 15.04.2005, pela prática a 16.09.2004 de um crime de condução perigosa de veículo rodoviário, p. e p. pelo artº 291º, nº 1, al. b), do CP. Esta pena viria a ser declarada extinta por despacho datado de 31.03.2008, o abrigo do disposto no artº 57º, nº 1, do CP (tendo o arguido cumprido a obrigação imposta em 13.04.2005);
- No âmbito do processo sumaríssimo nº 204/05.0GNPRT, do 2º Jz do T. J. da Comarca de Amarante, por sentença datada de 06.02.2006, transitada em julgado a 06.02.2006, foi condenado na pena de 40 dias de multa, à taxa diária de 4,00 euros, num total de 160,00 euros, pela prática a 16.04.2005 de um crime de condução sem habilitação legal, p. e p. pelo artº 3º, do DL nº 2/98, de 03.01. Tal pena viria a ser declarada extinta pelo seu pagamento por despacho datado de 05.07.2007;
- No âmbito do PCS nº 716/04.2GNPRT, do 1º Jz do T. J. da Comarca de Lousada, por sentença datada de 23.02.2006, transitada em julgado a 01.03.2010, foi condenado na pena de 6 meses e 15 dias de prisão, pela prática a 09.09.2004 de um crime de condução sem habilitação legal, p. e p. pelo artº 3º do DL nº 2/98, de 03.01. Tal pena viria a ser substituída por 130 dias de multa, à taxa diária de 5,00 euros, num total de 650,
- No âmbito do PCS nº 623/05.1GBAMT, do 3º Jz do T. J. da Comarca de Amarante, por sentença datada de 28.04.2010, transitada em julgado a 18.05.2010, foi condenado nas seguintes penas:
* 100 dias de multa, à taxa diária de 6,00 euros, pela prática a 07.02.2005 de um crime de desobediência, p. e p. pelo artº 348º, nº 1, al. b), do CP, aplicável ex vi do artº 22º, nº 2, do DL nº 54/75, de 12.02;
* 100 dias de multa, à taxa diária de 6,00 euros, pela prática a 03.07.2005 de um crime de condução sem habilitação legal, p. e p. pelo artº 3º, nºs 1 e 2, do DL nº 2/98, de 03.01;
* Em cúmulo, foi condenado na pena única de 200 dias de multa, à taxa diária de 6,00 euros, num total de 1.200,00 euros. Esta pena única viria a ser paga pelo arguido e, por esse motivo, foi declarada extinta por despacho datado de 14.09.2011.

Do percurso de vida e das condições sócio económicas do arguido Q........ e respetivos antecedentes criminais
231. O arguido Q........ nasceu numa família numerosa e de modesta condição social e económica, uma vez que só o progenitor assegurava o sustento da cônjuge e dos filhos.
232. A dinâmica familiar caracterizou-se por um relacionamento sem problemas entre os vários elementos do agregado.
233. Frequentou a escola até aos 12 anos de idade, completando o 4º ano de escolaridade, após duas reprovações. O 6º ano foi concluído em idade adulta e durante a primeira reclusão.
234. O abandono precoce do ensino prendeu-se com o desinteresse que sentia pelas atividades letivas e devido às dificuldades económicas da família.
235. Começou então a trabalhar na construção civil logo após a conclusão dos estudos, o que lhe permitiu contribuir para as despesas do seu agregado familiar. Até aos 18 anos desenvolveu várias atividades, altura em que emigrou para a Bélgica, onde permaneceu durante 2 anos. Na altura do seu regresso a Portugal a sua progenitora já havia falecido, passando o arguido a coabitar com o seu pai e alguns dos seus irmãos.
236. A partir daí denotou alterações no seu comportamento, desinvestimento laboral e acompanhamento com grupo de pares marginais. Desde essa altura e até à atualidade o arguido tem sido alvo de vários processos criminais (infra discriminados). Com 21 anos é detido pela primeira vez a fim de cumprir uma pena única de 8 anos de prisão. Foi restituído à liberdade aos 5/6 da pena, decorrendo a liberdade condicional até abril de 2009, período durante o qual o arguido obteve trabalho.
238. O arguido teve uma primeira união de facto aos 21 anos de idade, tendo o casal integrado o agregado de origem do mesmo. Vivenciaram uma situação de dependência económica relativamente à sua família, uma vez que o estilo de vida adotado por Q........ não lhe permitia ter uma situação organizada, acabando por se separar quando o arguido foi detido pela primeira vez. No decurso da liberdade condicional o arguido encetou nova união de facto e entretanto autonomizou-se do seu agregado familiar de origem.
239. À data da sua reclusão, ocorrida em setembro do ano anterior, Q........ residia com DF….., sua companheira, e filha do casal, de dois anos de idade, ocupando um apartamento de tipologia 2, com adequadas condições de habitabilidade.
240. A companheira efetua trabalhos como empregada doméstica e o arguido, antes de recluso, não exercia qualquer atividade profissional regular. A situação económica do agregado é assim precária, não dispondo de recursos económicos para fazer face a todas as despesas, designadamente a renda da habitação. A companheira do arguido tem recorrido à ajuda da sua progenitora e à ajuda do progenitor do arguido.
241. O arguido, no seu meio residencial, tem uma imagem muito negativa, sendo conotado com o ócio, com companhias consideradas desadequadas e com práticas delituais (designadamente contra a propriedade).
242. O arguido mantém o suporte familiar, sendo visitado no E.P. pela companheira, pelo pai e por alguns irmãos.
243. Tem um comportamento prisional isento de punições.
244. Tem os seguintes antecedentes criminais:
- No âmbito do PCC nº 409/98.8GBAMT (ex 249/99), do 2º Jz do T.J. da Comarca de Amarante, por acórdão datado de 12.05.2000, transitado em julgado a 11.01.2001, foi condenado na pena de 8 meses de prisão, perdoada na sob a condição resolutiva prevista no artº 4º da Lei nº 29/99, de 12.05, pela prática a 26.05.98 de um crime de furto qualificado, p. e p. pelos art.ºs 203º, nº 1, e 204º, nº 2, al. e), do CP;
- No âmbito do PCC nº 246/99, do 1º Jz do T. J. da Comarca de Amarante, por acórdão datado de 21.12.2000, transitado em julgado a 28.02.2001, foi condenado na pena de 26 meses de prisão, suspensa na sua execução pelo período de 3 anos, pela prática a 20.05.98 de um crime de furto qualificado, p. e p. pelos art.ºs 203º, nº 1, e 204º, nº 2, al. e), do CP.;
- No âmbito do PCC nº 400/98.4GBAMT (ex 64/99), do 3º Jz do T.J. da Comarca de Amarante, por acórdão datado de 09.03.2001, transitado em julgado a 26.03.2001, foi condenado na pena de 12 meses de prisão, suspensa na sua execução pelo período de 3 anos, pela prática a 28.05.98 de um crime de furto qualificado, p. e p. pelos art.ºs 203º, nº 1, e 204º, nº 2, al. e), do CP. Tal pena viria a ser englobada no cúmulo jurídico efetuado no âmbito do. PCC nº 1142/00.8GBAMT (ex 52/2001), do 3º Jz do T. J. da Comarca de Amarante;
- No âmbito do PCS nº 180/00, do 3º Jz do T.J. da Comarca de Felgueiras, por sentença datada de 15.03.2001, transitada em julgado a 26.04.2001, foi condenado na pena de 140 dias de multa, à taxa diária de 500$00, num total de 70.000$00, pela prática a 11.04.2000 de um crime de condução sem habilitação legal, p. e p. pelo artº 3º do DL nº 2/98, de 03.01.;
- No âmbito do PCC nº 15/98.7GACBT (ex 105/98), do T. J. da Comarca de Celorico de Basto, por acórdão datado de 28.05.2001, transitado em julgado a 12.06.2001, foi condenado na pena de 140 dias de multa, à taxa diária de 500$00, o que perfaz o total de 70.000$00, pela prática a 18.01.98 de um crime de detenção ilegal de arma de defesa, p. e p. pelo artº 6º da Lei nº 22/97, de 27.06. Tal pena viria a ser declarada extinta por despacho datado de 21.02.2003, por força do artº 4º da Lei nº 2/99, de 12.05.;
- No âmbito do PCS nº 196/99.2GBFLG (ex 13/01), do 2º Jz do T.J. da Comarca de Felgueiras, por sentença datada de 04.06.2001, transitada em julgado a 01.07.2001, foi condenado na pena de 80 dias de multa, à taxa diária de 500$00, num total de 40.000$00, pela prática a 08.07.99 de um crime de condução sem habilitação legal, p. e p. pelo artº 3º, nºs 1 e 2, do DL nº 2/98, de 03.01;
- No âmbito do PCC nº 49/98, do 1º Jz do T.J. da Comarca de Amarante, por acórdão datado de 04.07.2001, transitado em julgado a 02.10.2001, foi condenado na pena de 2 anos de prisão, suspensa na sua execução pelo período de 3 anos, pela prática em outubro de 1996 de um crime de furto qualificado, p. e p. pelos art.ºs 203º, nº 1, e 204º, nº 2, al. e), do CP.;
- No âmbito do PCS nº 197/97, do 1º Jz do T.J. da Comarca de Amarante, por sentença datada de 10.10.2001, transitada em julgado a 30.10.2001, foi condenado na pena de 2 anos e 6 meses de prisão, suspensa na sua execução pelo período de 18 meses, pela prática a 08.12.96 de um crime de furto qualificado, p. e p. pelos art.ºs 203º, nº 1, e 204º, nº, 2, al. e), do CP;
- No âmbito do PCC nº 1142/00.8GBAMT (ex 52/2001), do 3º Jz do T. J. da Comarca de Amarante, por acórdão datado de 26.02.2002, transitado em julgado a 13.03.2002, foi condenado na pena de 4 anos e 6 meses de prisão pela prática a 10.04.2002 de um crime de tráfico de estupefacientes, p. e p. pelos art.ºs 21º e 22º, da Lei nº 15/93, de 22.01. Neste processo procedeu-se a cúmulo jurídico das penas impostas nos processos 46/98.7TBAMT, 380/98.6GBAMT, 196/99.2GBFLG, 15/98.7GACBT, 409/98.8GBAMT, 118/97.5TBAMT, 400/98.4GBAMT e 147/00.3GNPRT, tendo sido condenado na pena única de 8 anos de prisão e na coima de 75.000$00 (374,10 euros), por acórdão datado de 08.01.2003, transitado em julgado a 27.01.2003 (foi-lhe concedida liberdade condicional com efeitos reportados a 09.12.2007);
- No âmbito do PCS nº 15/08.0GCFLG, do 3º Jz do T. J. da Comarca de Felgueiras, por sentença datada de 24.03.2009, transitada em julgado a 04.05.2009, foi condenado na pena de 200 dias de multa, à taxa diária de 5,5 euros, num total de 1.100,00 euros, pela prática a 05.05.2008 de um crime de condução sem habilitação legal, p. e p. pelo artº 3º do DL nº 2/98, de 03.01. Tal pena viria a ser declarada extinta pelo pagamento por despacho datado de 29.04.2011;
- No âmbito do PCS nº 283/08.8GNPRT, do 3º Jz do T.J. da Comarca de Felgueiras, por sentença datada de 05.02.2009, transitada em julgado a 25.06.2009, foi condenado na pena de 240 dias de multa, à taxa diária de 5,5 euros, num total de 1.320,00 euros, pela prática a 03.05.2008 de um crime de condução sem habilitação legal, p. e p. pelo artº 3º, do DL nº 2/98, de 03.01. Tal pena viria a ser declarada extinta pelo seu pagamento por despacho datado de 08.07.2010;
- No âmbito do PCS nº 540/08.3GNPRT, do 2º Jz do T. J. da Comarca de Amarante, por sentença datada de 15.10.2010, transitada em julgado a 18.11.2010, foi condenado na pena de 5 meses de prisão, suspensa na sua execução por 12 meses, pela prática a 12.10.2008 de um crime de condução sem habilitação legal, p. e p. pelo artº 3º do DL nº 2/98, de 03.01.

Do percurso de vida e das condições sócio económicas do arguido R........ e respetivos antecedentes criminais
245. O arguido R........ é filho de mãe solteira e nasceu quando esta tinha 18 anos de idade. O progenitor, por sua vez, não assumiu a paternidade, pelo que cresceu integrado no agregado familiar dos avós maternos, visto que a sua progenitora não dispunha de qualquer tipo de autonomia.
246. Tratava-se de uma família com baixos recursos económicos (eram um grupo de 10 irmãos) e o único elemento que trabalhava era a avó do arguido (auxiliar da ação educativa num infantário).
247. Contudo, como a mãe do arguido quando ainda estava grávida deste encetou uma relação afetiva com um indivíduo casado, detentor de boa situação económica, que manteve durante cerca de 15 anos, R........ não sofreu privações significativas em termos da satisfação das suas necessidades, tendo inclusive desenvolvido uma relação gratificante com aquele.
248. Quando o arguido completou 16 anos, o companheiro da mãe pôs termo à relação, o que se traduziu numa alteração significativa das condições de vida de ambos. A sua mãe não conseguiu aceitar a rutura e teve de ser internada durante um longo período em serviço hospitalar de psiquiatria, pelo que o arguido foi entregue aos cuidados dos avós maternos, atravessando assim uma fase em que sofreu com a ausência da mãe e com privações de ordem económica.
249. Foi neste contexto que decidiu trabalhar (tinha acabado de concluir o 7º ano de escolaridade) para ajudar a sua mãe, a qual se encontrava fragilizada e sem meios de subsistência.
250. Começou a trabalhar na construção civil e com o seu salário arrendou uma casa, onde passou a viver com a sua mãe.
251. Registou a partir daí e até aos 23 anos de idade um percurso profissional regular na área da construção civil.
252. Aos 22 anos de idade casou com uma pessoa de nacionalidade brasileira, com quem mantinha uma relação afetiva há 3 anos e da qual teve um filho. Decorridos 6 meses divorciou-se.
253. Quase de imediato encetou novo relacionamento, com outra pessoa de nacionalidade brasileira, registando-se então um desinvestimento na área profissional e a manutenção num estilo de vida mais centrado na frequência de espaços de diversão noturna e no acompanhamento de grupo de pares, alguns dos quais com práticas delituosas.
254. Na sequência deste estilo de vida, em outubro de 2007, que é condenado em pena de prisão suspensa na sua execução no âmbito do processo nº 643/05.6TAAMT.
255. Pouco tempo depois desta condenação, foi para o Brasil com a namorada de então.
256. Regressou a Portugal, em fevereiro de 2009, voltando-se a ausentar em julho do mesmo ano, desta feita para a Bélgica, onde desempenhou serviços de limpeza e de porteiro.
257. Em finais de 2009 o arguido encontrava-se assim a residir na Bélgica, tendo regressado definitivamente a Portugal em meados de 2010, retornando a casa da sua mãe, comparticipando as despesas da sua namorada, a qual vivia num apartamento arrendado, passando aí parte do seu tempo.
258. Imediatamente após o seu regresso a Portugal registou dificuldades em se vincular à manutenção de hábitos de trabalho regulares, passando a trabalhar alguns meses depois num stand de venda de automóveis, sendo remunerado à comissão (entre 400/1500 euros mensais), revelando estar empenhado na prossecução desta atividade profissional.
259. Mantém-se a viver com a mãe, partilhando ambos uma moradia unifamiliar, dotada de boas condições económicas, existindo entre ambos forte vinculação afetiva.
260. Apesar do arguido suportar parte das despesas domésticas, a mãe desloca-se duas vezes por ano à Suíça, onde trabalha na agricultura, sendo com esse dinheiro e com algum que ganha a cozer sapatos em casa que comparticipa com a sua parte nos gastos domésticos.
261. Atualmente e desde que o arguido terminou a relação afetiva que mantinha há cerca de 4 anos, iniciou outro relacionamento, pelo que a atual companheira passou a integrar o seu agregado familiar. Esta nova companheira merece a aprovação da mãe do arguido, por entender que é uma influência positiva para o filho.
262. O arguido mantém um relacionamento cordial com os vizinhos, verificando-se contudo um sentimento de suspeição face ao seu estilo de vida. Não obstante, não é hostilizado, uma vez que não assume comportamentos que ponham em causa a paz e a ordem social.
263. O arguido continua a contar com o apoio incondicional da sua mãe.
264. Tem os seguintes antecedentes criminais:
- No âmbito do processo abreviado nº 218/05.0GCAMT, do 2º Jz do T. J. da Comarca de Amarante, por sentença datada de 11.01.2006, transitada em julgado a 27.02.2006, foi condenado na pena de 60 dias de multa, à taxa diária de 2,5 euros, pela prática a 12.09.2005 de um crime de condução sem habilitação legal, p. e p. pelo artº 3º do DL nº 2/98, de 03.01. Tal pena viria a ser declara extinta pelo seu cumprimento, por despacho datado de 03.07.2006;
- No âmbito do processo sumário nº 189/07.8GCAMT, do 1º Jz do T. J. da Comarca de Amarante, por sentença datada de 23.07.2007, transitada em julgado a 07.09.2007, foi condenado na pena de 120 dias de multa, à taxa diária de 4,00 euros, pela prática a 16.07.2007 de um crime de condução sem habilitação legal, p. e p. pelo artº 3º do DL nº 2/98, de 03.01. Tal pena viria a ser declara extinta pelo seu pagamento, por despacho datado de 31.03.2008;
- No âmbito do PCC nº 643/05.6TAAMT, do 3º Jz do T. J. da Comarca de Amarante, por acórdão datado de 11.10.2007, transitado em julgado a 05.11.2007, foi condenado nas seguintes penas:
* 16 meses de prisão, suspensa na sua execução pelo mesmo período de tempo, pela prática a 04.01.2006 de um crime de tráfico de menor gravidade, p. e p. pelo artº 25º, al. a), do DL nº 15/93, de 22.01;
* 150 dias de multa, à taxa diária de 15,00 euros, num total de 2.250,00 euros, pela prática a 04.01.2006 de um crime de condução sem habilitação legal, p. e p. pelo artº 3º do DL nº 2/98, de 03.01. Esta pena de multa viria a ser declarada extinta pelo seu pagamento por despacho datado de 18.12.2009;
- No âmbito do PCS nº 664/05.9GALSD, do 2º Jz do T. J. da Comarca de Lousada, por sentença datada de 19.11.2007, transitada em julgado a 10.12.2007, foi condenado na pena de 200 dias de multa, à taxa diária de 4,00 euros, o que perfaz o total de 800,00 euros, pela prática a 11.05.2005 de um crime de condução sem habilitação legal, p. e p. pelo artº 3º, nºs 1 e 2, do DL nº 2/98, de 03.01. Tal pena viria a ser declara extinta pelo seu cumprimento, por despacho datado de 01.09.2008.

Do percurso de vida e das condições sócio económicas do arguido T........ e respetivos antecedentes criminais
265. O arguido T........ viveu a sua infância entre o agregado dos pais e dos avós, já que as casas eram juntas e estes apoiavam os seus pais na prestação de cuidados aos filhos.
266. O seu pai era serralheiro e a sua mãe fazia bordados em casa e assumia a gestão da vida doméstica, tratando-se de uma família funcional.
267. Quando o arguido tinha 13 anos de idade, ao terminar o 4º ano de escolaridade, decidiu não dar continuidade aos estudos.
268. Assim, aos 14 anos foi trabalhar para uma fábrica de calçado, situada próximo de sua casa, onde permaneceu durante cerca de 6 meses. A partir daí e até aos 17 anos de idade registou um percurso profissional que se caracterizou por mudanças frequentes de emprego, pois ora trabalhou em fábricas de calçado ora na construção civil.
269. A partir dos 17 anos de idade optou pela construção civil, onde passou a revelar regularidade no exercício dessa atividade profissional.
270. Casou aos 21 anos de idade, com uma empregada fabril, tendo ficado a residir em casa dos sogros.
271. Pouco tempo após o casamento, decidiu criar uma empresa de construção civil, passando a trabalhar como subempreiteiro (tinha 22 anos), empresa essa que faliu passados 4 anos.
272. Aos 31 anos de idade foi condenado numa pena única de 5 anos e 2 meses de prisão (PCS nº 43/02.0GNPRT, do 2º Jz do T. J. da Comarca de Lousada), iniciando o respetivo cumprimento em 10.06.2002 e tendo beneficiado de liberdade condicional entre 21.04.2006 e 10.08.2007, período em que cumpriu as obrigações impostas.
273. Enquanto estava em cumprimento da referida pena de prisão deu-se a rutura conjugal, ficando o filho de ambos aos cuidados da cônjuge.
274. À data da concessão da liberdade condicional retomou a atividade profissional na construção civil em Espanha, por conta de outrem, mas pouco tempo depois criou uma nova empresa de construção civil.
275. Em 2009 vivia em união de facto com a atual companheira, inativa profissionalmente, e “geria” a empresa de construção civil de que era proprietário, encerrando tal empresa no início de 2010, mantendo-se desde então inativo (faz apenas alguns biscates).
276. É sinalizado negativamente no seu meio de residência, já que o seu estilo de vida merece suspeitas, alicerçadas no facto de ser procurado pelas autoridades policiais e de não lhe serem conhecidos hábitos de trabalho.
277. A situação económica do seu agregado (constituído por si, pela companheira – sem qualquer atividade regular -, por uma filha desta de 7 anos e pelo filho de ambos, de 2 anos de idade) é precária. Vivem os 4 num apartamento arrendado por 175,00 euros mensais, proporcionador de adequadas condições de habitabilidade, mas têm a renda em atraso há já alguns meses.
278. O prédio onde vivem é habitado por outros inquilinos a quem são atribuídos estilos de vida antissociais.
279. O arguido não mantém relações de grande proximidade vicinal.
280. Tem os seguintes antecedentes criminais:
- No âmbito do PCC nº 631/01.1TALSD, do 1º Jz do T. J. da Comarca de Lousada, por acórdão datado de 15.07.2003, transitado em julgado a 30.07.2003, foi condenado nas seguintes penas:
* 5 anos de prisão, pela prática, entre novembro de 2001 e 10.06.2002, de um crime de tráfico de estupefacientes, p. e p. pelo artº 21º, nº 1, do DL nº 15/93, de 22.01;
* 100 dias de multa, à taxa diária de 5,00 euros, por cada um dos 23 crimes de condução sem habilitação legal, p. e p. pelo artº 3º, nºs 1 e 2, do DL nº 2/98, de 03.01, praticados entre 11.12.2001 e 10.06.2002;
* Em cúmulo (das 23 penas de multa), foi condenado na pena única de 800 dias de multa, à taxa diária de 5,00 euros. Por força do não pagamento dessa pena única de multa, foi determinada a respetiva conversão em 533 dias de prisão subsidiária.
Tais penas viriam porém a perder autonomia na medida em que foram englobadas no cúmulo jurídico que entretanto viria a ser efetuado no âmbito do PCS nº 43/02.0GNPRT, do 2º Jz do T. J. da Comarca de Lousada.
Por força de tal processo, o arguido manteve-se detido e posteriormente preso desde 11 de junho de 2002 a 15 de março de 2006, data em que passou a estar detido à ordem do processo comum singular nº 43/02.0GNPRT até ao dia 20 de abril de 2006, momento em que foi condicionalmente libertado;
- No âmbito do PCS nº 43/02.0GNPRT, do 2º Jz do T. J. da Comarca de Lousada, por sentença datada de 16.01.2004, transitada em julgado a 02.02.2004, foi condenado nas seguintes penas:
* 5 meses de prisão, substituída por igual número de meses de multa, à taxa diária de 3,00 euros, pela prática a 22.09.2001 de um crime de resistência e coação sobre funcionário, p. e p. pelo artº 347º do CP;
* 180 dias de multa, à taxa diária de 3,00 euros, pela prática a 22.09.2001 de um crime de condução sem habilitação legal, p. e p. pelo artº 3º, nºs 1 e 2, do DL nº 2/98, de 03.01;
* Em cúmulo, foi condenado na pena única de 250 dias de multa, à taxa diária de 3,00 euros, o que perfaz a quantia de 750,00 euros.
Ainda no âmbito deste processo, por acórdão datado de 31.01.2006, transitado em julgado a 23.02.2008, foi condenado na pena única de 5 anos e 2 meses de prisão e 890 dias de multa, à taxa diária de 3,00 euros (englobando as penas impostas no PCC nº 631/01.1TALSD, do 1º Jz do T. J. da Comarca de Lousada). Tal pena de prisão viria entretanto a ser declara extinta pelo seu cumprimento, com efeitos reportados a 17.09.2007, pelo 1º Jz do TEP do Porto;
- No âmbito do PS nº 294/08.3GCAMT, do 2º Jz do T. J. da Comarca de Amarante, por sentença datada de 14.11.2008, transitada em julgado a 19.01.2009, foi condenado na pena de 160 dias de multa, à taxa diária de 6,00 euros, o que perfaz o total de 960,00 euros, pela prática a 26.10.2008 de um crime de condução sem habilitação legal, p. e p. pelo artº 3º, nºs 1 e 2, do DL nº 2/98, de 03.01. Tal pena viria a ser declarada extinta pelo seu pagamento, por despacho datado de 28.10.2009;
- No âmbito do processo abreviado nº 46/09.3GCFLG, do 1º Jz do T. J. da Comarca de Felgueiras, por sentença datada de 19.04.2010, transitada em julgado a 25.05.2010, foi condenado na pena de 200 dias de multa, à taxa diária de 5,00 euros, o que perfaz o total de 1.000,00 euros, pela prática a 19.11.2009 de um crime de condução sem habilitação legal, p. e p. pelo artº 3º, do DL nº 2/98, de 03.01. Por despacho datado de 11.10.2010, pelo seu pagamento, tal pena de multa foi declarada extinta.

Do percurso de vida e das condições sócio económicas do arguido X........ e respetivos antecedentes criminais
281. O arguido X........ nasceu no seio de uma família numerosa, de baixa condição social e económica, integrando um grupo de sete irmãos, sujeito a um modelo educativo que veiculava regras e práticas educativas em conformidade com os valores socialmente aceites.
282. Fez a escolaridade em idade normal, tendo abandonado o sistema de ensino ao concluir o 4º ano de escolaridade, estratégia definida pelos progenitores para diminuir a pressão económica dos filhos sobre o agregado familiar.
283. Com apenas 10/11 anos de idade começou a trabalhar na construção civil, atividade mantida de forma regular e investida, inicialmente por conta de outrem e mais tarde como subempreiteiro.
284. Casou aos 23 anos e teve dois filhos, beneficiando de estabilidade familiar e profissional até aos 27 anos de idade.
285. Foi preso preventivamente em 09.11.92, verificando-se uma co-ocorrência entre o confronto com o sistema de justiça penal e o consumo de drogas que iniciou em fevereiro de 1992.
286. Na sequência da sua condenação no âmbito do PCC nº 28/99, do 3º Jz do T. J. da Comarca de Amarante (ex 60/93, do Tribunal de Círculo de Penafiel) tentou orientar positivamente o seu estilo de vida, mas foi recaindo nos consumos de droga e inerente desorganização pessoal, traduzida na incapacidade de manter o exercício profissional regular, com consequências negativas na dinâmica familiar, verificando-se então um afrouxamento da vinculação afetiva à família de origem e agregado constituído – cônjuge e dois filhos -, pessoas que estavam em desacordo com o seu estilo de vida.
287. Não mais conseguiu interromper este estilo de vida desorganizado, sendo de novo condenado em pena de prisão suspensa na sua execução, por tráfico, desta feita no âmbito do PCS nº 512/02.1TAAMT, do 1º Jz do T. J. da Comarca de Amarante, não conseguindo no entanto cumprir as regras impostas, pelo que foi revogada a suspensão da execução da respetiva pena de prisão, que assim cumpriu, sendo por isso preso em 28.01.2004. Saiu em liberdade em 03.10.2006, já que depois de ter cumprido aquela pena de prisão foi desligado do processo em questão e foi ligado a um outro, para além de que em 08.04.2008 regressou ao E.P. para cumprir uma pena de prisão subsidiária de 6 meses (PCS nº 9/03.2TALSD, do 1º Jz do T. J. da Comarca de Lousada), tendo sido libertado em outubro de 2008.
288. Regressou então a casa dos progenitores, mas nesta altura já tinha perdido todos os suportes de inserção (há muito que a cônjuge tinha posto termo à relação, verificando-se um total afastamento do arguido em relação aos filhos. Também os pais e irmãos do arguido estavam já claramente afastados do mesmo, desgastados por anos de apoio). Tal contexto não facilitou a reorganização da sua vida.
289. A condição de toxicodependente (que manteve desde os 28 anos de idade, tendo feito algumas interrupções nos consumos, mas recaiu sempre) provocou danos irreparáveis na sua saúde (contraiu HIV e hepatite C), encontrando-se por isso à data muito debilitado, o que também dificultou a sua reinserção laboral.
290. Assim, passou a viver num anexo da casa dos seus pais e a depender economicamente do sistema de proteção social.
291. À data dos factos em causa nestes autos, as suas condições pessoais e sociais eram idênticas ás que se verificam hoje, isto é, ao nível habitacional ocupa um anexo junto à casa dos pais, dotado de infraestruturas básicas e das necessárias condições de habitabilidade, onde vive sozinho, posto que a relação com os pais se degradou de tal ordem que apenas falam entre si o indispensável. O progenitor sente-se defraudado no esforço que ele e a sua família fizeram, sem sucesso, no apoio à reintegração social do arguido, visto que este nunca conseguiu libertar-se das drogas e da prática de ilícitos criminais.
292. Em face dos problemas de saúde que tem, esteve internado de 24.11.2011 a 30.11.2011 e de 29.12.2011 a 10 01.2012.
293. Vive com base na prestação do RSI, montante que se revela insuficiente para assegurar os seus gastos em alimentação e medicação.
294. Não obstante muito fragilizado, continua centrado nas estratégias de satisfação da sua dependência de produtos estupefacientes, atravessando uma etapa vivencial em que prevalece, no meio residencial, uma sinalização de si mais como vítima do que como criminoso. Esta sinalização deve-se também ao facto do arguido ser pessoa calma e cordial nos relacionamentos interpessoais que estabelece, além de que, com o estilo de vida que mantém, não perturba a paz e a tranquilidade social dos vizinhos.
295. Não tem projetos para o futuro, mostrando-se resignado com a sua atual situação de vida, à parte a questão da doença, que é geradora de sofrimento e mau estar.
296. Os presentes autos não representaram para o arguido qualquer impacto no seu estilo de vida, pois mantém-se centrado na satisfação da sua dependência de produtos estupefacientes, continuando a frequentar espaços e a acompanhar indivíduos conotados com essa problemática.
297. Tem os seguintes antecedentes criminais:
- No âmbito do PCC nº 28/99, do 3º Jz do T. J. da Comarca de Amarante (ex 60/93, do Tribunal de Círculo de Penafiel), por acórdão datado de 30.09.93, transitado em julgado, foi condenado em pena de multa e na pena de 18 meses de prisão, suspensa na sua execução pelo período de 3 anos, pela prática de um crime de tráfico de quantidades diminutas, p. e p. pelo artº 24º, nº 1, do DL nº 430/83, de 13.12. Tal pena viria a ser declarada extinta nos termos do artº 57º do CP por decisão datada de 10.01.2000;
- No âmbito do PCS nº 501/94, do 2º Jz do T. J. da Comarca de Amarante, por sentença datada de 18.10.95, transitada em julgado, foi condenado na pena de 180 dias de multa, à taxa diária de 500$00, declarada perdoada por força do disposto nos artºs 8º e 11º da Lei nº 15/94, de 11.05, pela prática a 03.02.92 de um crime de falsificação de documento, p. e p. pelo artº 256º, nºs 1, al. a) e 3, do CP, com referência ao artº 255º, al. a), do mesmo diploma legal. Tal pena viria entretanto a ser declarada extinta, por se ter considerado definitivo o seu perdão.
- No âmbito do PCS nº 199/95, do 2º Jz do T. J. da Comarca de Felgueiras, por sentença datada de 20.11.97, transitada em julgado, foi condenado na pena de 90 dias de multa, à taxa diária de 250$00, pela prática de um crime de emissão de cheque sem provisão, p. e p. pelo artº 11º, nº 1, al. a), do DL nº 454/91, de 28.12, e artº 313º, nº 1, do CP de 82;
- No âmbito do PCS nº 1102/01.1GBAMT, do 3º Jz do T. J. da Comarca de Amarante, por sentença datada de 20.06.2002, transitada em julgado a 10.10.2002, foi condenado na pena de 140 dias de multa, à taxa diária de 2,00 euros, num total de 280,00 euros, pela prática a 14.07.2001 de um crime de desobediência qualificada, p. e p. pelo artº 22º, nº 2, do DL nº 54/75, de 12.02., e artº 348º, nºs 1 e 2, do CP. Tal pena viria a ser declarada extinta pelo seu pagamento por despacho datado de 12.11.2003;
- No âmbito do PCS nº 512/02.1TAAMT, do 1º Jz do T. J. da Comarca de Amarante, por sentença datada de 09.07.2003, transitada em julgado a 29.09.2003, foi condenado na pena de 2 anos de prisão, suspensa na sua execução pelo período de 3 anos, sujeita a regras de conduta, pela prática a 16.08.2002 de um crime de tráfico de estupefacientes de menor gravidade, p. e p. pelo artº 25º, al. a), do DL nº 15/93, de 22.01. Essa suspensão viria entretanto a ser revogada por decisão datada de 12.12.2008, tendo o arguido cumprido a respetiva pena de prisão (entre 28.01.2004 e 28.01.2006, altura em que foi desligado deste processo e foi ligado ao PCC nº 689/02.6PBVRL, do 2º Jz do T.J. da Comarca de Vila Real). Assim, tal pena viria entretanto a ser declarada extinta pelo seu cumprimento, por despacho datado de 20.02.2006;
- No âmbito do PCC nº 689/02.6PBVRL, do 2º Jz do T. J. da Comarca de Vila Real, por acórdão datado de 26.11.2003, transitado em julgado a 11.12.2003, foi condenado na pena de 200 dias de multa, à taxa diária de 2,00 euros, num total de 400,00 euros, pela prática a 19.02.2003 de um crime de recetação, p. e p. pelo artº 231º, nº 1, do CP. À ordem deste processo o arguido viria a cumprir pena de prisão subsidiária entre 28.01.2006 e 09.06.2006, pelo que tal pena viria a ser declarada extinta pelo seu cumprimento por despacho datado de 26.06.2006;
- No âmbito do PCS nº 9/03.2TALSD, do 1º Jz do T. J. da Comarca de Lousada, por sentença datada de 04.02.2004, transitada em julgado a 03.03.2004, foi condenado na pena de 400 dias de multa, à taxa diária de 5,00 euros, num total de 2.000,00 euros, pela prática a 21.11.2002 de um crime de falsidade de testemunho agravado, p. e p. pelos artºs 360º e 361º do CP. Tal pena viria a ser declarada extinta por despacho datado de 02.12.2008 (o arguido pagou 333,332 euros e cumpriu 222 dias de prisão subsidiária, cujo termo ocorreu a 15.11.2008);
- No âmbito do PCS nº 242/03.7TAAMT, do 3º Jz do T. J. da Comarca de Amarante, por sentença datada de 09.06.2004, transitada em julgado a 05.07.2004, foi condenado na pena de 180 dias de multa, à taxa diária de 2,00 euros, num total de 360,00 euros, pela prática a 07.02.2002 de um crime de falsidade de testemunho, p, e p. pelo artº 360º, nºs 1 e 3, do CP. Tal pena viria a ser declarada extinta pelo seu cumprimento por despacho datado de 19.10.2006;
- No âmbito do PCS nº 10/04.9TAFLG, do 2º Jz do T. J. da Comarca de Felgueiras, por sentença datada de 01.03.2005, transitada em julgado a 16.03.2005, foi condenado em pena de prisão, substituída por 200 dias de multa, à taxa diária de 3,00 euros, pela prática a 23.09.2003 de um crime de falsidade de testemunho, p. e p. pelo artº 360º, nºs 1 e 3, do CP.

Do percurso de vida e das condições sócio económicas do arguido Z........ e respetivos antecedentes criminais
298. O arguido Z........ cresceu numa família organizada (pais e 5 filhos) que subsistiu com base no trabalho do pai como mecânico, assumindo a mãe (doméstica) as tarefas de acompanhamento do arguido e das quatro irmãs.
299. Quando o arguido tinha 12 anos de idade e frequentava o 5º ano de escolaridade, decidiu não dar continuidade aos estudos.
300. Pouco tempo depois foi trabalhar num horto em V. N. de Gaia, onde permaneceu durante cerca de 8 anos.
301. Aí iniciou o consumo de haxixe, tendo sido entretanto condenado em pena de prisão suspensa na sua execução, tendo permanecido preso preventivamente durante 7 meses.
302. À data da libertação regressou a casa dos pais, tendo sido entretanto preso de novo.
303. Foi nas fases que antecederam as suas reclusões que se verificou o consumo de estupefacientes, como um processo evolutivo e de dependência de drogas duras, passando a centrar-se nas estratégias para a obtenção das mesmas.
304. O seu passado ao nível profissional caracterizou-se pela falta de investimento, experimentando diversas colocações que não conseguia manter, atravessando fases frequentes e prolongadas no tempo sem trabalhar.
305. Viveu sempre na dependência do seu agregado de origem, não tendo conseguido autonomizar-se a qualquer nível.
306. À data dos factos em causa nestes autos, o arguido registava uma situação de vida em tudo semelhante à presente.
307. Integra o agregado familiar de origem, constituído pelo pai (de 77 anos de idade), pela mãe (de 74 anos de idade), por uma irmã e por uma filha desta. A casa em que vive é arrendada, proporcionando condições mínimas de habitabilidade.
308. Vive na dependência económica dos pais (que juntos auferem 464,00 euros), trabalhando apenas esporadicamente na construção civil.
309. A mãe assume uma atitude de proteção e de desculpabilização face à incapacidade do arguido para assumir as suas responsabilidades, desculpando a sua ociosidade com o atual contexto sócio e económico.
310. O arguido denota uma circular repetição entre o consumo de drogas (designadamente cocaína) e a prática de condutas delituosas.
311. Apesar das dificuldades económicas, os seus pais continuam disponíveis para lhe garantir o alojamento e alimentação, já que o mesmo é cordial e não assume atitudes perturbadoras da dinâmica familiar.
312. Esta é também a atitude que o mesmo assume na comunidade residencial, sendo referenciado pelos vizinhos como sendo um indivíduo educado e que não assume comportamentos perturbadores da paz e ordem social. Contudo, é associado à ociosidade e à problemática da toxicodependência, em face dos espaços que frequenta e o grupo de pares que integra, conotados com aquela problemática.
313. A sua constituição como arguido no âmbito dos presentes autos em nada alterou os seus hábitos e estilo de vida.
314. No âmbito do PS nº 1067/10.9GBAMT, do 1º Jz do T. J. da Comarca de Amarante, por sentença datada de 01.09.2010, transitada em julgado a 22.09.2010, foi condenado na pena de 50 dias de multa, à taxa diária de 5,00 euros, o que perfaz o total de 250,00 euros, pela prática a 01.09.2010 de um crime de condução sem habilitação legal, p. e p. pelo artº 3º, nº 1, do DL nº 2/98, de 03.01. Tal pena viria a ser declarada extinta pelo seu pagamento por despacho datado de 09.05.2011.

Do percurso de vida e das condições sócio económicas do arguido AD........ e respetivos antecedentes criminais
315. O arguido AD........ é oriundo de um meio familiar de condição social e económica desfavorecida, integrando um agregado cuja dinâmica era marcada por dificuldades relacionais entre os progenitores, devido ao consumo excessivo de bebidas alcoólicas por parte do pai, o qual assumia frequentemente atitudes violentas face à pessoa da cônjuge. O progenitor manifestava ainda escassos hábitos de trabalho, pelo que o agregado experienciava dificuldades económicas.
316. O arguido iniciou a frequência escolar aos 6 anos de idade e concluiu a 4ª classe com 12 anos de idade. Não prosseguiu os estudos devido à falta de motivação para as atividades académicas, dando prevalência à sua integração profissional. Assim, começou a trabalhar como carpinteiro e pouco depois exerceu atividades indiferenciadas na construção civil.
317. Emigrou para Espanha aos 24 anos de idade, tendo aí permanecido 4 anos a trabalhar como estucador. Nessa altura iniciou uma união de facto com uma cidadã de nacionalidade portuguesa, fruto da qual nasceu os seus dois filhos. O casal regressou a Portugal na altura do nascimento do primeiro filho, fixando residência na zona da Lixa, concelho de Felgueiras.
318. O arguido exercia atividade profissional, mas a sua prestação era instável e sem vínculos formais. A sua companheira, por sua vez, mantinha uma atividade profissional irregular. Tal situação que condicionava negativamente a estabilidade económica do agregado.
319. Paralelamente, o arguido foi adotando um estilo de vida ocioso, sem atividades estruturadas, frequentando cafés e outros espaços de convívio, tendo alterado um pouco os hábitos de convivência social, passando a relacionar-se com grupos de pares antissociais.
320. Na altura da prática dos factos em causa nestes autos, o arguido partilhava o seu quotidiano com a companheira e os dois filhos, de cinco e três anos de idade, e, apesar da afetividade e coesão existente, a dinâmica relacional era, por vezes, marcada pela conflitualidade, na sequência de manifestações de ciúme protagonizadas pelo arguido.
321. AD........ exercia atividade profissional na área da constrição civil de forma intermitente, pelo que o casal não usufruía de uma situação económica estável que lhe permitisse garantir adequadamente a satisfação das suas necessidades. Na atualidade, aquele agregado vivencia também uma situação económica instável, uma vez que os rendimentos de que dispõe limitam-se a 370,00 euros mensais referentes a bolsa atribuída à companheira do arguido devido a frequência em curso de formação profissional.
322. Viviam num apartamento de tipologia 2 na zona da Lixa e recentemente mudaram-se para um outro apartamento que proporciona boas condições de habitabilidade, localizado em Figueiró, concelho de Amarante.
323. O quotidiano mais recente do arguido era passado de forma ociosa, frequentando espaços de convívio social e manifestando alguma dificuldade em organizar a sua vida profissional e económica.
324. Em junho de 2011 iniciou o cumprimento de pena de prisão na habitação com vigilância eletrónica, no âmbito do processo nº 279/09.2GBFLG, e cujo termo ocorreu em novembro de 2011.
325. Encontra-se preso preventivamente desde 25.01.2012 à ordem do processo 12/11.9GAAMT, do 2º Jz do T. J. da Comarca de Amarante.
326. Revela consciência crítica relativamente ao estilo de vida ocioso que levava.
327. Vive a sua situação de reclusão com angústia, pelas repercussões negativas que a mesma tem na organização do seu agregado, manifestando preocupação relativamente às dificuldades que a sua companheira e os seus filhos atravessam.
328. Dois irmãos do arguido também se encontram presos, pelo que a sua família alargada tem-se debatido com dificuldades acrescidas. Por outro lado, a sua companheira foi também sujeita à medida de coação de obrigação de permanência na habitação com vigilância eletrónica, situação que tem contribuído para uma maior instabilidade familiar.
329. Continua a dispor do apoio da companheira, com a qual mantém sólidos laços de afetividade, mas esse apoio é pouco consistente dadas as dificuldades que a mesma enfrenta na atualidade e que implicam o recurso à ajuda dos familiares.
330. O arguido mantém um comportamento prisional estável e recebe visitas dos pais e dos irmãos, tendo a companheira deixado de o visitar desde que está sujeita à referida medida de coação.
331. Tem os seguintes antecedentes criminais:
- No âmbito do processo abreviado nº 46/03.7GBAMT, do 1º Jz do T. J. da Comarca de Amarante, por sentença datada de 09.06.2003, transitada em julgado a 16.09.2003, foi condenado na pena de 90 dias de multa, à taxa diária de 4,00 euros, num total de 360,00 euros, pela prática a 04.11.2002 de um crime de condução sem habilitação legal, p. e p. pelo artº 3º, nºs 1 e 2, do DL nº 2/98, de 03.01. Tal pena viria a ser declarada extinta por prescrição, por despacho datado de 26.05.2008;
- No âmbito do PCS nº 270/04.5GBFLG, do 1º Jz do T. J. da Comarca de Felgueiras, por sentença datada de 11.03.2005, transitada em julgado a 18.04.2005, foi condenado na pena de 200 dias de multa, à taxa diária de 2,5 euros, o que perfaz o total de 500,00 euros, pela prática a 08.07.2004 de um crime de condução sem habilitação legal, p. e p. pelo artº 3º, nºs 1 e 2, do DL nº 2/98, de 03.01. Por despacho datado de 13.01.2011, pelo seu pagamento, tal pena de multa foi declarada extinta;
- No âmbito do PS nº 279/09.2GBFLG, do 2º Jz do T. J. da Comarca de Felgueiras, por sentença datada de 07.07.2009, transitada em julgado a 27.07.2009, foi condenado na pena de 5 meses de prisão, substituída 150 dias de multa, à taxa diária de 5,00 euros, o que perfaz o total de 750,00 euros, pela prática a 16.06.2009 de um crime de condução sem habilitação legal, p. e p. pelo artº 3º, nºs 1 e 2, do DL nº 2/98, de 03.01. Por despacho datado de 17.05.2011, tal pena viria a ser substituída por 5 meses de prisão. Esta pena de prisão viria a ser declarada extinta por despacho de 05.12.2011, já que o arguido a cumpriu em regime de prisão efetiva e o remanescente em regime de permanência na habitação com fiscalização por meios eletrónicos de controlo à distância, entre 29.06.2011 e 25.07.2011;
- No âmbito do PS nº 256/11.3GAMNC, do 2º Jz do T. J. da Comarca de Marco de Canavezes, por sentença datada de 05.05.2011, transitada em julgado a 06.06.2011, foi condenado na pena de 8 meses de prisão, suspensa na sua execução, subordinada ao pagamento da quantia de 500,00 euros à “DG….”, pela prática a 20.04.2011 de um crime de condução sem habilitação legal, p. e p. pelo artº 3º do DL nº 2/98, de 03.01.

Do percurso de vida e das condições sócio económicas do arguido AG........ e respetivos antecedentes criminais
332. O processo de socialização do arguido António Santos decorreu no agregado familiar de origem, do qual eram parte integrante os pais e os três irmãos. Quando tinha 7 anos, o seu pai emigrou para França, país onde permaneceu durante 35 anos, verificando-se por isso um claro distanciamento afetivo e relacional face ao agregado. Assim, o seu progenitor vinha a casa uma vez por ano, mas à medida que os anos iram passando passou a vir uma vez de dois em dois anos. Não obstante, assumiu sempre a manutenção económica do agregado, já que nunca deixou de enviar o dinheiro necessário para a cônjuge educar os filhos.
333. As estadias do pai em casa eram momentos de tensão e de conflito, pelo que não existia proximidade relacional entre ambos.
334. A progenitora manteve o arguido no sistema de ensino enquanto este o desejou, isto é, até aos 19 anos de idade, não obstante as quatro reprovações, tendo apenas concluído o 7º ano de escolaridade.
335. Ao sair da escola integrou-se profissionalmente como carpinteiro numa fábrica de móveis, tendo atravessado nos 10 anos seguintes uma etapa de estabilidade familiar e profissional, decorrente do trabalho regular e do assumir das suas responsabilidades através da comparticipação para o custeio dos gastos domésticos e das suas despesas pessoais.
336. Entretanto aceitou uma proposta de trabalho para ir trabalhar como madeireiro em Espanha, mas um ano depois regressou a Portugal e, conjuntamente com um colega, criou uma empresa, projeto que foi mal sucedido e que rapidamente abandonou, tinha na altura 31 anos de idade.
337. Desde então não voltou a registar uma integração profissional regular, passando a fazer biscates.
338. Apesar de ser pai de uma menina de 9 anos, que nasceu fruto de um relacionamento esporádico, e de um rapaz de 7 anos, fruto de outra relação, sempre viveu integrado no agregado de origem, recusando a assunção de responsabilidades.
339. Em finais de 2009 o arguido vivia integrado no agregado de origem, do qual faziam parte os pais, encontrando-se a recuperar de 4 anos traumáticos e em que se dedicou ao acompanhamento do seu irmão, que padeceu de uma doença do foro oncológico e por força da qual viria a falecer.
340. Partilhavam os três uma pequena habitação, de construção bastante antiga, mas dotada de infraestruturas básicas, onde atualmente apenas permanecem o arguido e a mãe de 77 anos de idade, já que o seu pai faleceu entretanto.
341. À data dependia (e continua a depender) economicamente da mãe, que detém um rendimento mensal na ordem dos 1.000,00 euros. A sua progenitora assume em relação ao arguido uma atitude protetora e desculpabilizante.
342. O arguido mantém a situação de inativo, acomodado a um estilo de vida ocioso, ausente de responsabilidades e de privações, já que a progenitora suporta-lhe todos os gastos, inclusive pessoais.
343. Apesar do arguido manter uma relação afetiva com a mãe do seu filho, rejeita a vivência em comum, por continuar a não querer assumir responsabilidades e a valorizar a sua liberdade e saídas e convívios com grupo de pares.
344. Em Figueiró, onde sempre viveu, o arguido é sinalizado como alguém que não tem hábitos de trabalho. Contudo, sendo educado e cordial, inexistem sentimentos de rejeição por parte da comunidade vicinal.
345. A sua constituição como arguido no âmbito deste processo não trouxe qualquer alteração ao seu estilo de vida nem alterou a imagem social de que desfruta no meio onde reside.
346. No âmbito do PCS nº 62/06.7GCAMT, do 2º Jz do T. J. da Comarca de Amarante, por sentença datada de 25.06.2007, transitada em julgado a 16.07.2008, foi condenado na pena de 4 meses de prisão, substituída por 120 dias de multa, à taxa diária de 3,5 euros, num total de 420,00 euros, pela prática a 06.09.2005 de um crime de descaminho, p. e p. pelo artº 355º do CP. Tal pena viria a ser declarada extinta pelo seu pagamento, por despacho datado de 17.11.2008.

Do percurso de vida e das condições sócio económicas do arguido AJ........ e respetivos antecedentes criminais
347. O arguido AJ........ nasceu numa família de condição sócio económica humilde, mas funcional e organizada, sendo o 5º descendente de um conjunto de 7 irmãos, cujo processo de socialização decorreu sem percalços e num meio social com características rurais.
348. Integrou a vida académica em idade apropriada, tendo concluído a 4ª classe sem registo de reprovações
349. Todavia, após a conclusão deste grau académico, abandonou o estabelecimento de ensino para dar início ao percurso laboral, de modo a poder contribuir para a economia doméstica.
350. Assim, começou por trabalhar como ajudante de mecânico numa oficina de motos. Contudo, com a autonomização da irmã mais velha através do casamento e a sua deslocação para a região do Porto, o arguido – que a acompanhou – enveredou pela área da construção civil, tendo ainda pontualmente exercido a atividade de sapateiro.
351. Contraiu matrimónio em 1991 com a arguida AM........, tendo nascido desta união quatro filhos, um deles já maior de idade.
352. Não obstante ter iniciado os consumos de drogas leves na entrada da fase adulta, foi após o casamento que o arguido e a cônjuge se envolveram no consumo acentuado de estupefacientes, deles se tornando dependentes, situação que comprometeu o trajeto de vida regular que vinha adotando. Por via desta situação, os filhos do arguido foram alvo de intervenção tutelar, sendo retirados do núcleo familiar. Para além disso, o arguido tinha ainda hábitos etílicos.
353. Ainda como consequência da dependência de drogas, AJ........ e a cônjuge registaram diversos contactos com o sistema de justiça penal, tendo aquele cumprido pena de prisão efetiva, a última das quais entre 2002 e 2007. Com o falecimento dos pais e a problemática aditiva do arguido e consequentes comportamentos, verifica-se o seu afastamento da família alargada, nomeadamente dos irmãos, os quais lhe deixaram de prestar qualquer apoio, ocorrendo também no período da reclusão a rutura conjugal, dissolvendo-se o casamento através do divórcio. Durante o tempo de reclusão manteve-se abstinente do consumo de estupefacientes, apesar de não se ter sujeito a qualquer tratamento.
354. Após a libertação, ocorrida em agosto de 2007 e, não tendo apoio consistente por parte dos familiares, passou a viver sem residência certa, adotando o estatuto de sem abrigo, uma vez que, apesar de permanecer na localidade onde residia a ex-cônjuge, pernoitava em vários locais, incluindo a rua, não obstante mantivesse contactos com a mesma.
355. À data dos factos em causa nestes autos, o arguido estava a passar por um período pouco estruturado, encontrando-se a residir na zona de Vila Meã, local onde se fixou após a sua libertação, mantendo com a ex-cônjuge alguma convivência. No aspeto profissional, executava alguns trabalhos na construção civil, em regime de biscates e sem qualquer regularidade.
356. Desde junho de 2011 que se encontra integrado na comunidade “DH….”, com instalações em …., …., concelho da Maia, sendo certo que, neste contexto, tem mantido uma atitude de colaboração, realizando as atividades inerentes à manutenção da casa, nomeadamente no apoio à casa comercial que essa instituição detém na região do Porto.
357. Não dispõe de qualquer apoio familiar.
358. A nível social, apesar de não ser identificado nominalmente, inexistem incidentes graves com os elementos da comunidade ali situada.
359. Não tem consciência crítica acerca dos atos praticados e vitimiza-se.
360. Tem os seguintes antecedentes criminais:
- No âmbito do PCS nº 233/95, do 1º Jz do T. J. da Comarca de Penafiel, por sentença datada de 14.11.96, transitada em julgado, foi condenado na pena única de 4 meses e 15 dias de prisão, substituída por igual tempo de multa, à razão diária de 700$00, pela prática a 08.01.95 de dois crimes de injúria qualificada, p. e p. pelos artºs 181º e 184º do CP. Tal pena viria a ser declarada extinta pelo pagamento por despacho datado de 18.02.97;
- No âmbito do PCS nº 260/97.2GBPNF, do 1º Jz do T. J. da Comarca de Penafiel, por sentença datada de 13.06.2000, transitada em julgado 28.06.2000, foi condenado na pena de 30 meses de prisão, suspensa na sua execução por dois anos, pela prática a 15.04.97 de um crime de furto qualificado, p. e p. pelos artºs 203º, nº 1, e 204º, nº 2, al. e), do CP, com referência ao artº 202º, al. d), do mesmo diploma legal. Tal pena viria a ser declarada extinta ao abrigo do disposto no artº 57º, nº 1, do CP, por despacho datado de 13.12.2005.
- No âmbito do PCS nº 448/98.9TAPNF (ex 14/01), do 3º Jz do T.J. da Comarca de Penafiel, por sentença datada de 29.10.2001, transitada em julgado, foi condenado na pena de 2 anos de prisão, cuja execução foi suspensa por 5 anos, pela prática a 31.07.99 de um crime de tráfico de estupefacientes de menor gravidade, p. e p. pelo artº 25º, al. a), do DL nº 15/93, de 22.01;
- No âmbito do PCC nº 15/02.4GAPRT, do 3º Jz do T.J. da Comarca de Penafiel, por acórdão datado de 09.05.2003, transitado em julgado a 09.06.2003, foi condenado na pena de 5 anos de prisão efetiva, pela prática entre 17.05.2002 e 16.08.2002 de um crime de tráfico de estupefacientes, p. e p. pelos artgs 21º, nº 1, do DL nº 15/93, de 22.01. No âmbito deste processo, o arguido foi detido no dia 16 de agosto de 2002 e foi sujeito à medida de coação de prisão preventiva no dia seguinte, assim se mantendo até ao trânsito em julgado do acórdão proferido. Posteriormente, o arguido manteve-se em cumprimento de pena, acabando por ser libertado apenas no dia 13 de agosto de 2007. Tal viria assim a ser declarada extinta pelo seu cumprimento por despacho datado de 26.09.2007.

Do percurso de vida e das condições sócio económicas da arguida AM........ e respetivos antecedentes criminais
361. A arguida AM........ é a segunda de uma fratria de quatro de um casal com modesta condição sócio económica, residentes numa zona rural de Penafiel. O progenitor era trabalhador da construção civil e a progenitora era doméstica. A sua educação foi assente em valores tradicionais religiosos do catolicismo, adotando os progenitores um modelo educacional rígido e punitivo.
362. Integrou o sistema de ensino em idade regular e concluiu o 4º ano, tendo abandonado os estudos com cerca de 11 anos de idade por opção parental, uma vez que não valorizavam a educação académica feminina.
363. Aos 17 anos teve o seu primeiro emprego como operária fabril na área têxtil, tendo trabalhado como operária em várias fábricas durante cerca de 10 anos. Efetuou o 5º e 6º ano de escolaridade e já aos 40 anos de idade obteve o 9º ano de escolaridade através da iniciativa “Novas Oportunidades”.
364. Com cerca de 20 anos contraiu matrimónio com o arguido AJ........, tendo deixado o seu agregado familiar de origem para integrar o agregado familiar de origem do cônjuge. Do casamento nasceram 4 filhos (um dado para adoção ainda bebé). Dois dos filhos encontram-se institucionalizados no âmbito de medidas de promoção e proteção.
365. O relacionamento marital foi problemático, já que o cônjuge era já consumidor de estupefacientes antes do matrimónio e que foram agravados posteriormente. A arguida, que antes do matrimónio não consumia produtos estupefacientes, passou a consumi-los por influência do arguido AJ.........
366. Após o matrimónio e o início dos consumos de estupefacientes, acabou por ser despedida na sequência de absentismo, tendo então efetuado diligências para trabalhar em casa, em costura, recebendo por peça executada, situação que se prolongou por vários anos.
367. O quotidiano do casal era maioritariamente ocupado nas dinâmicas associadas à toxicodependência, registando-se neste âmbito contactos com o sistema de justiça penal.
368. Há cerca de 9 anos divorciou-se, indo residir para junto da progenitora, em casa anexa à desta em ….., concelho de Penafiel. Foi neste período, aquando da gravidez da 4ª filha, que iniciou o tratamento á toxicodependência, fazendo um programa de substituição com metadona. Durante o período de tratamento começou a consumir álcool em excesso, tendo estado por isso internada 15 dias no Hospital Magalhães Lemos, no Porto, para fazer a respetiva desintoxicação. Foi neste processo que os seus dois filhos mais velhos foram institucionalizados e, posteriormente, também a sua filha mais nova.
369. AM........ esteve internada numa comunidade, em Fafe, durante cerca de 1 ano, tendo após esse período regressado para junto do agregado da sua progenitora, ficando a habitar em casa próxima desta.
370. À data dos factos em causa nestes autos, ela residia numa casa tipo anexo, junto á residência da progenitora, em Penafiel. O seu quotidiano era passado em função dos consumos de estupefacientes, subsistindo do RSI, no valor de 179,00 euros mensais. O arguido AJ........ frequentava a sua casa, por vezes fazendo a alimentação e pernoitando em casa dela, sem no entanto fixar residência ali.
371. Em maio de 2011 foi para uma casa de acolhimento da associação “DI….”, sita em Sintra, onde permaneceu até meados de fevereiro de 2012.
372. Desde 20.02.2012 que se encontra integrada na comunidade “DH….” (onde também se encontra o ex-marido), vocacionada para o apoio e acolhimento de pessoas com problemas de toxicodependência, sita em …., na Maia. Mudou-se para essa comunidade na medida em que o ex-marido ali se encontrava e para estar mais próxima dos dois filhos institucionalizados em Valongo.
373. Subsiste do RSI, no valor de 188,00 euros mensais, dos quais entrega metade à instituição. Ocupa o seu tempo ajudando no apoio a um espaço comercial que a instituição detém no Porto.
374. Não mantém contactos ou relações de proximidade com a família de origem, o que se deve ao seu longo percurso de consumo de produtos estupefacientes e sucessivas recaídas.
375. Presentemente mantém-se abstinente.
376. Tem dificuldade em refletir criticamente acerca dos eventuais danos e vítimas decorrentes do crime em causa nestes autos.
377. Tem os seguintes antecedentes criminais:
- No âmbito do PCS nº 448/98.9TAPNF (ex 14/01), do 3º Jz do T.J. da Comarca de Penafiel, por sentença datada de 29.10.2001, transitada em julgado, foi condenada na pena de 2 anos de prisão, cuja execução foi suspensa por 4 anos, pela prática a 31.07.99 de um crime de tráfico de estupefacientes de menor gravidade, p. e p. pelo artº 25º, al. a), do DL nº 15/93, de 22.01;
- No âmbito do PCC nº 15/02.4GAPRT, do 3º Jz do T.J. da Comarca de Penafiel, por acórdão datado de 09.05.2003, transitado em julgado a 09.06.2003, foi condenada na pena de 15 meses de prisão, suspensa na sua execução pelo período de 5 anos, pela prática a 17.05.2002 de um crime de tráfico de estupefacientes de menor gravidade, p. e p. pelo artº 25º do DL nº 15/3, de 22.01. Tal viria a ser declarada extinta por despacho datado de 03.04.2008.

Do percurso de vida e das condições sócio económicas do arguido AP........ e respetivos antecedentes criminais
378. O arguido AP..... viveu a sua infância integrado no agregado de origem, constituído pelos pais e pelos seus seis irmãos, tratando-se de um agregado familiar de modesta condição sócio económica.
379. O seu pai sempre trabalhou numa fábrica de moagem e a sua mãe era doméstica, pelo que o arguido cresceu sujeito a algumas privações a nível material.
380. Aos 12 anos de idade, sem concluir o 4º ano de escolaridade, iniciou o exercício profissional, guardando ovelhas e trabalhando num matadouro.
381. Até aos 20 anos de idade manteve esta atividade profissional, embora tenha abandonado o pastoreio para se dedicar ao abate de gado e a magarefe.
382. Interrompeu o exercício da sua atividade profissional para cumprir o serviço militar obrigatório, facto no tempo coincidente com o casamento.
383. A deserção do cumprimento do serviço militar obrigatório e o cometimento de um crime durante esta deserção levou-o a confrontar-se pela primeira vez com o sistema de justiça, tendo sido condenado numa pena de 5 anos de prisão efetiva. Beneficiou de liberdade condicional e à data da sua libertação integrou-se profissionalmente na construção civil, mas a partir dos 30 anos de idade não voltou a exercer qualquer atividade profissional, na sequência do facto de ter contraído tuberculose durante o cumprimento do serviço militar obrigatório, o que lhe deixou graves sequelas a nível pulmonar.
384. A cônjuge trabalhava numa empresa têxtil, como operária, sendo com base no seu salário que eram suportadas as despesas domésticas (na altura constituído pelo casal e uma filha).
385. Foi entretanto condenado por tráfico numa pena de 4 anos de prisão.
386. Foi durante o cumprimento dessa pena de prisão que iniciou o consumo de produtos estupefacientes.
387. Após a libertação, manteve-se inativo, continuando a ser a cônjuge quem assegurava a manutenção do agregado, a qual trabalhava agora no “…….”.
388. Algum tempo depois voltou a cumprir uma pena de prisão (1 ano e 4 meses) por condução sem habilitação legal.
389. Durante o cumprimento desta pena iniciou um tratamento ao seu problema aditivo no C.R.I. de Vila Real e, após a sua restituição à liberdade, manteve a sua inatividade e a dependência face à sua cônjuge.
390. A situação do seu agregado agravou-se há cerca de 8 anos, já que a sua cônjuge ficou de baixa médica por doença do foro psiquiátrico durante 3 anos e, como após esse período não regressou ao trabalho, deixou de usufruir de rendimento próprio.
391. À data dos factos em causa nestes autos, o arguido vivia com a cônjuge e com a filha de 28 anos de idade, num alojamento sem condições mínimas de habitabilidade, onde continua a viver. Trata-se de um espaço que foi um matadouro, que não dispõe de água canalizada nem de casa de banho e por cuja ocupação pagam 45,00 euros mensais.
392. O arguido e a cônjuge mantinham uma situação de inatividade, que se continua a verificar atualmente, dispondo apenas de 192 euros mensais referentes à prestação do RSI e do apoio da filha, empregada de balcão num estabelecimento comercial.
393. Apesar das dificuldades económicas, o arguido é visto a circular diariamente na localidade num pequeno veículo automóvel de que dispõe, em movimentações olhadas com suspeição, não só por não lhe ser conhecida qualquer fonte de rendimento para custear tais movimentações como pela natureza dos locais onde se encontra parado e pelas pessoas que o abordam nesses locais.
394. Mantém-se em acompanhamento no C.R.I. de Vila Real (desde 12.12.2002) e está inserido num programa de substituição, fazendo a toma diária de metadona no Centro de Saúde de Marco de Canaveses. Ao longo do período de tratamento registou recaídas nos consumos de cocaína e abandonos periódicos do tratamento.
395. Apesar de ser conotado com o ócio e com a toxicodependência, é referenciado pelos vizinhos como pessoa educada e cordial no relacionamento interpessoal.
396. A constituição como arguido no âmbito destes autos em nada alterou o seu estilo de vida, mantendo os mesmos hábitos e dando-se com os mesmos amigos, associados à problemática da toxicodependência.
397. Tem os seguintes antecedentes criminais:
- No âmbito do processo correcional nº 539/79, do Tribunal Judicial de Marco de Canaveses, por sentença datada de 12.05.82, transitada em julgado, foi condenado na pena de 6 meses de prisão e 2.300$00 de multa, ou em alternativa 36 dias de prisão, tendo sido perdoados 3 meses da pena de prisão por força da Lei nº 2/81, de 13.03, e a execução do remanescente foi suspensa por 4 anos, pela prática de um crime de furto, p. e p. pelo artº 350º, nº 1, do CP. O remanescente da pena de prisão viria também a ser declarada perdoada por força da Lei nº 16/86, de 11.06, por despacho datado de 24.07.86;
- No âmbito do processo nº 148/82, do 2º Tribunal Militar Territorial do Porto, por acórdão datado de 08.02.84, transitado em julgado, foi condenado na pena de 4 meses de prisão militar, pela prática de um crime de deserção, p. e p. pelos artºs 142º, nº 1, al. b), e 149º, nº 1, al. a), 2ª parte, do Código de Justiça Militar. Tal pena foi englobada no cúmulo jurídico efetuado no processo nº 6/84;
- No âmbito do processo nº 6/84, do 2º Tribunal Militar Territorial do Porto, por acórdão datado de 08.04.84, transitado em julgado, foi condenado em cúmulo jurídico na pena unitária de 5 meses de prisão militar (englobando a pena imposta no âmbito do processo nº 148/82), pela prática de um crime de deserção, p. e p. pelos artºs 142º, nº 1, al. b), e 149º, nº 1, al. a), 2ª parte, do Código de Justiça Militar. O arguido terminou o cumprimento dessa pena em 03.06.84;
- No âmbito do processo de querela nº 10-A/85, do Tribunal Judicial de Marco de Canaveses, por acórdão datado de 26.06.85, transitado em julgado, foi condenado na pena de 5 anos de prisão, substituída por 5 anos de presídio militar, pela prática de um crime de furto qualificado, p. e p. pelo artº 297º, nºs 1, als. a) e e), e 2, als. c) e d), do CP. Por despacho datado de 12.06.86, foi declarada perdoada 1 ano de prisão, por força do artº 13º, nº 1, al. b), da Lei nº 16/86, de 11.06. O arguido acabou de cumprir a respetiva pena em 07.11.89, razão pela qual foi declarada extinta, por despacho datado de 13.11.89, proferido pelo TEP do Porto;
- No âmbito de processo sumário a que diz respeito o boletim 9º do respetivo CRC[1], do T. J. de Marco de Canaveses, por sentença datada de 13.05.91, transitada em julgado, foi condenado na pena de 60 dias de multa, à taxa diária de 250$00, ou em alternativa 40 dias de prisão, pela prática a 12.05.91 de um crime de condução ilegal, p. e p. pelo artº 46º, nº 1, do CE;
- No âmbito do PCC nº 77/95, do Tribunal de Círculo de Penafiel, por acórdão datado de 13.12.95, transitado em julgado, foi condenado na pena de 18 meses de prisão, suspensa na sua execução por 4 anos, pela prática a 28.08.94 de um crime de furto, p. e p. pelos artºs 204º, nº 2, al. e), 206º e 73º do CP. A pena imposta ao arguido viria a perder autonomia na medida em que viria a ser englobada no cúmulo jurídico efetuado no âmbito do PCC 690/95.4TBMCN, do 2º Jz do T. J. do Marco de Canaveses;
- No âmbito do PCC nº 690/95.4TBMCN, do 2º Jz do T. J. do Marco de Canaveses (ex 31/96, do Tribunal de Círculo de Penafiel), por acórdão datado de 27.06.96, transitado em julgado, foi condenado na pena de 3 anos de prisão, pela prática a 01.08.95 de um crime de tráfico de menor gravidade, p. e p. pelo artº 25º, al. a), do DL nº 15/93, de 22.01. Por acórdão datado de 07.06.99, transitado em julgado, procedeu-se a cúmulo jurídico com a pena imposta no PCC nº 77/95, do Tribunal de Círculo de Penafiel, tendo sido condenado na pena única de 3 anos e 3 meses de prisão, tendo sido perdoado 1 ano de prisão relativamente ao crime de furto, sob a condição resolutiva prevista no artº 4º da Lei nº 29/99, de 12.05. Por acórdão datado de 09.03.2007, transitado em julgado a 26.03.2007, procedeu-se a novo cúmulo jurídico, tendo sido o arguido condenado a 3 anos e 6 meses de prisão. Tal pena foi declarada extinta pelo seu cumprimento por despacho datado de 24.01.2008;
- No âmbito do PS nº 152/99, do 1º Jz do T.J. do Marco de Canaveses, por sentença datada de 07.10.99, transitada em julgado a 22.10.99, foi condenado na pena de 50 dias de multa, à taxa diária de 750$00, pela prática a 07.10.99 de um crime de condução sem habilitação legal, p. e p. pelo artº 3º, nºs 1 e 2, do DL nº 2/98, de 03.01;
- No âmbito do PS nº 214/00, do 1º Jz do T.J. do Marco de Canaveses, por sentença datada de 12.12.2000, transitada em julgado a 09.01.2001, foi condenado na pena de 4 meses e 15 dias de prisão, suspensa na sua execução pelo período de 12 meses, pela prática a 04.12.99 de um crime de condução sem habilitação legal, p. e p. pelo artº 3º, nºs 1 e 2, do DL nº 2/98, de 03.01. Tal pena viria a ser declarada extinta, ao abrigo do disposto no artº 57º, nº 1, do CP, por despacho datado de 06.03.2002;
- No âmbito do PCS nº 339/99.9GAMNC (ex 151/2000), do 1º Jz do T.J. do Marco de Canaveses, por sentença datada de 20.02.2001, transitada em julgado a 07.03.3001, foi condenado na pena de 5 meses e 15 dias de prisão, cuja execução foi suspensa pelo período de 16 meses, pela prática a 19.10.99 de um crime de condução sem habilitação legal, p. e p. pelo artº 3º, nºs 1 e 2, do DL nº 2/98, de 03.01. Tal pena foi englobada no cúmulo jurídico que se procedeu no âmbito do PCS nº 893/00.1GBAMT, do 3º Jz do T. J. da Comarca de Amarante;
- No âmbito do PCS nº 449/00.9GAMNC, do 2º Jz do T.J. do Marco de Canaveses, por sentença datada de 19.06.2002, transitada em julgado a 04.07.2002, foi condenado na pena de 10 meses de prisão, pela prática a 28.11.2000 de um crime de condução sem habilitação legal, p. e p. pelo artº 3º, nºs 1 e 2, do DL nº 2/98, de 03.01. Pelo seu cumprimento, tal pena viria a ser declarada extinta por despacho de 05.10.2003;
- No âmbito do PCS nº 893/00.1GBAMT, do 3º Jz do T. J. da Comarca de Amarante, por sentença datada de 02.10.2003, transitada em julgado a 29.10.2002, foi condenado em pena de prisão pela prática a 11.09.2000 de um crime de condução sem habilitação legal, p. e p. pelo artº 3º, do DL nº 2/98, de 03.01. Nessa sentença procedeu-se a cúmulo jurídico com as penas de prisão impostas no âmbito do PCS nº 339/99.9GAMNC e PCS nº 449/00.9GAMNC, tendo sido condenado na pena única de 1 ano e 4 meses de prisão. Esta viria a ser declarada extinta pelo seu cumprimento por despacho datado de 19.04.2004;
- No âmbito do PCC nº 690/95.4TBMCN, do 2º Jz do T. J. da Comarca de Marco de Canaveses, por acórdão datado de 09.03.2007, transitado em julgado a 26.03.2007, foi condenado na pena única de 3 anos e 6 meses de prisão, pela prática a 01.08.95 de um crime de tráfico de menor gravidade, p. e p. pelo artº 25º, do DL nº 15/93, de 22.01; e de um crime de furto qualificado, p. e p. pelos artºs 203º, nº 1, 204º, nº 2, al. e), 206º e 73º, todos do CP. Em relação ao crime de furto foi declarado perdoado 1 ano de prisão sob a condição resolutiva prevista no artº 4º da Lei nº 29/99, de 12.05. Pelo seu cumprimento, a pena de prisão imposta (na parte não perdoada) viria a ser declarada extinta por despacho datado de 24.01.2008.

Do percurso de vida e das condições sócio económicas do arguido AS........ e respetivos antecedentes criminais
398. AS........ cresceu junto do agregado de origem, de modesta condição sócio económica e cultural, constituído pelos progenitores e um grupo de sete irmãos. O pai era operário numa fábrica de moagem e a mãe era doméstica, sendo os recursos económicos disponíveis suficientes para assegurar a manutenção das necessidades básicas.
399. Iniciou a escolaridade aos 6 anos, tendo abandonado o sistema de ensino por volta dos 13 anos de idade, sem concluir a 4ª classe e sem ter adquirido os mecanismos básicos da leitura e da escrita em virtude das dificuldades de aprendizagem patenteadas.
400. Iniciou então o seu percurso profissional na construção civil, atividade que inicialmente manteve de forma regular e empenhada, mas que progressivamente foi passando a negligenciar, para o que contribuíram problemas do foro afetivo (em virtude do suicídio da namorada) e neurológicos (na sequência de acidente de viação de que foi vítima), tendo deixado então definitivamente de trabalhar.
401. Por volta dos 26/27 anos de idade iniciou o consumo de estupefacientes (heroína e cocaína), deles se tornando dependente. Efetuou ao longo do tempo várias tentativas de tratamento no sentido de ultrapassar o seu problema aditivo, não tendo contudo conseguido o resultado pretendido.
402. Contraiu matrimónio por volta dos 27/28 anos de idade, tendo a relação durado aproximadamente um ano e meio.
403. Na época dos factos em causa nestes autos, o arguido AS........ residia com a mãe e um irmão mais novo, numa casa integrada num bairro social localizado no núcleo urbano de Marco de Canaveses. Era consumidor regular de heroína e cocaína, não desenvolvendo qualquer atividade profissional com carácter regular, beneficiando do RSI.
404. Desde então as suas condições de vida não sofreram alteração significativa, continuando a viver na mesma casa, cujo pagamento da renda é assegurada pela mãe, a qual assegura também os pagamentos inerentes aos consumos de energia elétrica, água e gás (através dos valores que recebe mensalmente a título de pensão de sobrevivência e reforma). O próprio continua a beneficiar de RIS (189,00 euros por mês), assegurando com este montante as suas despesas pessoais.
405. O seu quotidiano decorre sem rotinas estruturadas e sem investimento laboral, sendo habitualmente visto junto de outros indivíduos conotados com o consumo de substâncias estupefacientes. Atualmente não está a efetuar qualquer tratamento ao seu problema aditivo, tendo interrompido por iniciativa própria o acompanhamento no C.R.I. Porto Central.
406. No contexto familiar é referenciado negativamente em virtude do estilo de comunicação agressivo que utiliza, pressionando a mãe a irmã a dar-lhe dinheiro, o que tem provocado desgaste na relação familiar.
407. No seio da vizinhança o arguido é bem conhecido e é associado a um estilo de vida desorganizado, estando as interações existentes praticamente restritas a cumprimentos de cordialidade.
408. O presente processo, até ao momento, não teve qualquer impacto no modo de vida do arguido.
409. Não tem antecedentes criminais.

Do percurso de vida e das condições sócio económicas do arguido AT........ e respetivos antecedentes criminais
410. O processo de socialização de AT........ decorreu junto do agregado familiar de origem, constituído pelos progenitores, o próprio e um irmão mais velho. O pai trabalhava como subempreiteiro na construção civil e a mãe era doméstica e empregada de limpeza, sendo os recursos económicos disponíveis suficientes para assegurar a satisfação das necessidades do agregado.
411. Inicialmente as relações familiares eram equilibradas, porém, a relação dos pais evoluiu negativamente até à rutura conjugal, quando o arguido tinha 16 anos de idade.
412. Iniciou a escolaridade aos 6 anos de idade, tendo abandonado os estudos quando frequentava o 9º ano de escolaridade em virtude da desmotivação revelada. Iniciou então uma trajetória profissional que decorreu sempre na área da construção civil, mantendo um percurso regular, durante o qual percorreu várias entidades patronais na procura de melhores condições de vida, tendo trabalhado na Alemanha, França, Espanha e ilha da Madeira.
413. Por volta dos 15 anos de idade efetuou as primeiras experiências de consumo de estupefacientes (haxixe), tendo mais tarde passado a consumir heroína. Este comportamento aditivo não interferiu significativamente na gestão do seu quotidiano, que foi percorrendo de forma organizada.
414. Contraiu matrimónio há aproximadamente 13 anos, tendo da relação nascido dois filhos, ambos menores de idade.
415. Na época a que se reportam os factos em causa nos autos, o arguido integrava o agregado que constituiu após o matrimónio, do qual fazia parte a cônjuge e os dois filhos. Desenvolvia a sua atividade profissional em França e consumia substâncias estupefacientes aquando das suas deslocações a Portugal (deslocava-se a Portugal todos os fins de semana, mas pelo menos em maio de 2010 esteve no nosso país também à semana).
416. Desde o passado mês de novembro que se encontra inativo, tendo sido nessa altura dispensado por ter sido dada como concluída a obra onde trabalhava em Espanha e porque naquela altura a sua entidade patronal não dispunha de novos contratos.
417. Não aceitou entretanto uma proposta de trabalho nos Camarões em face da sua situação jurídico-processual no âmbito destes autos.
418. Atualmente está a decorrer o processo de divórcio, estando a atravessar por condições de vida muito deficitárias, pois não dispõe dos recursos económicos que lhe permitam a satisfação das suas necessidades básicas. Embora pernoite na mesma casa onde vivem a cônjuge e os filhos, está privado do convívio com os descendentes, beneficiando apenas do apoio da progenitora, residente na cidade do Porto, a qual, apesar das limitações económicas, lhe fornece alguns alimentos e dinheiro.
419. Assim, o seu quotidiano vem decorrendo sem qualquer ocupação estruturada, passando os dias habitualmente em zonas públicas, frequentadas por indivíduos conotados com a problemática da toxicodependência.
420. No meio de residência, apesar do arguido ser conotado com a toxicodependência, não se registam sinais de rejeição, já que sempre manteve adequadas interações com os vizinhos.
421. Face à sua situação jurídico-processual mostra-se impossibilitado de prosseguir no estrangeiro a sua atividade laboral na área da construção civil.
422. No meio vicinal é desconhecido o seu envolvimento no âmbito deste processo.
423. A progenitora mantém-se disponível para lhe prestar o apoio, dentro das suas possibilidades económicas.
424. Não tem antecedentes criminais.

Do percurso de vida e das condições sócio económicas do arguido AW........ e respetivos antecedentes criminais
425. O arguido AW........ nasceu em França, país onde os progenitores residiram durante 8 anos. O seu processo de socialização decorreu junto do agregado familiar de origem, de modesta condição sócio económica, constituído pelos progenitores e dois irmãos, dos quais era o mais novo. A dinâmica familiar caracterizava-se pela harmonia e afetividade, beneficiando o arguido de uma postura educativa atenta por parte dos progenitores, tendo mantido ao longo do tempo uma inserção comunitária ajustada. O pai trabalhava na construção civil e a mãe era doméstica, sendo a situação económica satisfatória, na medida em que permitia assegurar a manutenção das necessidades básicas de todos.
426. Iniciou a escolaridade aos 6 anos de idade, tendo concluído a 4ª classe. Algum tempo depois iniciou o seu percurso profissional como servente da construção civil, vindo posteriormente também a trabalhar na indústria têxtil, mantendo então hábitos regulares de trabalho. Contudo, o comportamento aditivo de consumo de estupefacientes que mais tarde adotou interferiu negativamente ao nível laboral, tendo-se desde então mantido praticamente inativo, trabalhando apenas esporadicamente ao dia quando solicitado.
427. Precocemente efetuou as primeiras experiências de consumo de estupefacientes. Porém, só por volta dos 18 anos de idade iniciou o consumo de drogas duras (heroína e cocaína).
428. Há mais de 10 anos efetuou um tratamento de desintoxicação, situação que lhe permitiu manter-se algum tempo em abstinência em relação ao consumo de tal tipo de substâncias. Durante este período cumpriu um contrato de trabalho com a duração de 9 meses, na Suíça, na área da hotelaria.
429. Por volta dos 24 anos de idade contraiu matrimónio. Porém, cerca de 2 anos depois, verificou-se a rutura da relação conjugal. Manteve posteriormente novo relacionamento, em união de facto, que durou 4 anos e do qual nasceu uma filha, ainda menor, cujo exercício das responsabilidades parentais lhe foi atribuído judicialmente.
430. À época a que se reportam os factos em causa nos presentes autos, residia com os progenitores e a filha, numa casa que é da propriedade dos primeiros. As despesas de manutenção global do agregado e da filha eram asseguradas pelos progenitores do arguido, dispondo próprio do montante recebido no contexto do RSI para as suas despesas pessoais.
431. Desde então as suas condições de vida não se alteraram significativamente. Continua a residir junto dos progenitores, os quais asseguram gratuitamente o seu alojamento e alimentação, bem como as despesas de manutenção da filha, utilizando o arguido os 189,00 euros que recebe mensalmente a título de RSI para as suas despesas pessoais. O agregado do agregado do arguido apresenta uma situação económica deficitária, pois a única fonte de rendimento fixa cifra-se em cerca de 300,00 euros, proveniente da pensão de reforma do progenitor do arguido, sendo certo que este em nada contribuiu para o custeio das despesas domésticas.
432. O arguido continua profissionalmente inativo, não desenvolvendo qualquer esforço no sentido de inverter a situação, decorrendo o seu quotidiano em casa e no café onde convive com outros indivíduos conotados com o consumo de estupefacientes.
433. Quando solicitado presta serviços ao dia.
434. Na vizinhança é conotado com a problemática da toxicodependência. Não obstante, não se verificam sentimentos de rejeição em relação à sua pessoa, pois não é elemento perturbador da paz social, mantendo relações de cordialidade com os vizinhos, sendo certo que estes desconhecem o seu envolvimento no âmbito dos presentes autos.
435. O presente processo, até ao momento, não trouxe qualquer impacto especial ao seu modo de vida.
436. A sua família mostra-se disposta a colaborar num eventual plano de reinserção social do arguido.
437. No âmbito do PCS nº 275/10.7GAMCN, do 1º Jz do T. J. da Comarca de Marco de Canaveses, por sentença datada de 23.01.2012, transitada em julgado a 22.02.2012, foi condenado na pena de 1 ano e 6 meses de prisão, suspensa na sua execução pelo período de 1 ano e 6 meses, sujeito a regime de prova, pela prática em 03.04.2010 de um crime de um crime de tráfico de menor gravidade, p. e p. pelos artgs 21º e 25º, al. a), do Dl nº 15/93, de 22.01.

Do percurso de vida e das condições sócio económicas do arguido AZ........ e respetivos antecedentes criminais
438. O arguido AZ........ desenvolveu-se integrado no agregado familiar de origem, de humilde condição sócio económica e do qual faziam parte os progenitores e uma irmão, com uma dinâmica caracterizada como funcional, atentas as relações compatíveis entre os progenitores e o estabelecimento de uma adequada comunicabilidade.
439. Após a conclusão do 9º ano de escolaridade, o arguido frequentou um curso de secretariado que lhe deu equivalência ao 10º ano. Logo após, iniciou-se profissionalmente numa gráfica, pertença de um tio, seguindo-se o desenvolvimento de outras atividades, abandonadas por iniciativa do próprio por inadaptação.
440. Contraiu matrimónio aos 28 anos, do qual nasceram dois filhos, ambos menores, ocorrendo a rutura conjugal há cerca de 7 anos.
441. Iniciou o consumo de estupefacientes durante o cumprimento do serviço militar obrigatório, tendo chegado a realizar um tratamento na associação “DI….”, onde permaneceu durante cerca de 1 ano. Manteve controlados os hábitos de consumo de estupefacientes até à separação conjugal, retomando-os nessa altura, acabando entretanto por recorrer ao C.R.I.
442. À data dos factos em causa nestes autos, vivia com uma irmã no apartamento desta e encontrava-se desempregado. Havia recaído no consumo de estupefacientes há cerca de 4 meses.
443. O seu quotidiano era gerido em função do auxílio que prestava à irmã em pequenas tarefas domésticas e no contacto regular que mantinha com indivíduos relacionados com o consumo de estupefacientes.
444. Presentemente, mantém-se a residir com a irmã, numa habitação adquirida com recurso a empréstimo bancário, sendo a relação entre ambos caracterizada pela solidariedade e apoio mútuo.
445. O arguido encontra-se desempregado há cerca de 3 anos, sendo dependente economicamente da irmã e dos pais (que o têm apoiado).
446. É acompanhado no C.R.I. de Freamunde, onde realiza consultas (mas nem sempre com carácter regular). Encontra-se integrado no programa de substituição de opiáceos com metadona, apresentando períodos de abstinência que se interligam com períodos de recaídas nos consumos de estupefacientes.
447. O seu quotidiano é gerido em função de pequenos biscates que realiza de forma pontual para amigos e do convívio quase diário que estabelece com os filhos.
448. Tem consciência que a sua dependência de substâncias estupefacientes condicionaram negativamente o seu percurso de vida.
449. No seu meio social de residência, o arguido é conhecido pelo seu passado ligado ao consumo de estupefacientes e instabilidade laboral, o que causa consternação na medida em que ao arguido são reconhecidas características pessoais positivas, tais como a solidariedade, o respeito e a educação.
450. O arguido teme ser privado da liberdade, o que lhe causa preocupação.
451. A mãe e a irmã sabem do seu envolvimento no âmbito deste processo, mantendo-lhe o apoio. O pai mostra-se desgastado pelo facto do arguido ainda não viver uma situação pessoal estável, nomeadamente através do desenvolvimento de uma atividade profissional regular, apesar das várias oportunidades que já teve.
452. Tem os seguintes antecedentes criminais:
- No âmbito do PCS nº 355/01.0TAPRD, do 2º Jz Criminal do T. J. da Comarca de Paredes, por sentença datada de 24.01.2003, transitada em julgado a 05.03.2005, foi condenado na pena de 45 dias de multa, à taxa diária de 1,5 euros, pela prática a 06.04.2001 de um crime de burla, p. e p. pelo artº 220º, nº 1, al. c), do CP. Tal pena viria a ser declarada extinta pelo pagamento por despacho datado de 08.06.2004;
- No âmbito do PCS nº 174/08.2GALSD, do 1º Jz do T. J. da Comarca de Lousada, por sentença datada de 20.11.2008, transitada em julgado a 05.01.2009, foi condenado na pena de 80 dias de multa, à taxa diária de 6,00 euros, o que perfaz o total de 480,00 euros, e na pena acessória de inibição de conduzir veículos motorizados pelo prazo de 3 meses, pela prática a 07.01.2008 de um crime de condução de veículo em estado de embriaguez, p. e p. pelo artº 292º, nº 1, do CP. Por despacho datado de 30.06.2011, tais penas (principal e acessória) foram declaradas extintas (pelo pagamento da pena de multa e pelo cumprimento da pena acessória);
- No âmbito do PS nº 537/11.6GAPFR, do 2º Jz do T. J. da Comarca de Paços de Ferreira, por sentença datada de 01.07.2011, transitada em julgado a 23.09.2011, foi condenado na pena de 100 dias de multa, à taxa diária de 5,5 euros, o que perfaz o total de 550,00 euros, e na pena acessória de privação do direito a conduzir ciclomotores ou de obter permissão para conduzir ciclomotores pelo período de 6 meses, pela prática a 27.06.2011 de um crime de condução de veículo em estado de embriaguez, p. e p. pelo artº 292º, nº 1, do CP.

Do percurso de vida e das condições sócio económicas do arguido BC........ e respetivos antecedentes criminais
453. O percurso de vida do arguido BC........ decorreu até à data junto ao agregado de origem, constituído pelos pais e uma irmã.
454. O seu percurso educativo foi liderado sobretudo pela mãe, a qual é doméstica, e por isso tem mais disponibilidade, sendo certo que o seu pai trabalha na “DJ…..” e por essa razão esteve sujeito a períodos de ausência do agregado.
455. O ambiente familiar pautou-se pela afetividade entre os seus membros, existindo adequados canais de comunicação entre todos.
456. A progenitora, contudo, foi frequentemente permissiva, pelo que, precocemente (aos 14 anos), passou a sair à noite sem qualquer supervisão. Assim, por volta dos 15 anos de idade, por influência dos pares sociais, iniciou o consumo de haxixe e mais tarde de cocaína inalada.
457. Os consumos de estupefacientes, entretanto, passaram a ter um impacto desorganizador do seu estilo de vida, com períodos de instabilidade, tendo repercussões ao nível do seu investimento escolar. Concluiu o 9º ano de escolaridade, sem reprovações, e integrou de seguida um curso de formação na cidade de Amarante, o qual lhe dava equivalência ao 12º ano, sendo neste contexto que agudizou o consumo de drogas. Assim, abandonou o curso quando faltavam apenas 6 meses para o seu términus.
458. Iniciou aos 17 anos de idade o seu percurso profissional numa empresa de pladur, onde permaneceu durante 8 anos.
459. À data dos factos em causa nestes autos, mantinha a sua inserção no agregado de origem, constituído apenas pelo próprio e pelos pais (a irmã já se havia autonomizado).
460. O agregado beneficiava de um ambiente familiar estável e com uma estrutura funcional.
461. Habitavam em casa própria, com boas condições de habitabilidade, inserida em meio rural e com elevada problemática relacionada com o consumo e o tráfico de estupefacientes.
462. A mãe mantinha-se doméstica e o pai mantinha a mesma inserção na empresa “DJ….”.
463. A situação económica do agregado era estável, sendo certo que o arguido à data mantinha-se profissionalmente ativo na empresa de pladur, auferindo o equivalente ao salário mínimo nacional.
464. Em termos emocionais passava por um período de grande instabilidade devido à dificuldade em aceitar a rutura de uma relação afetiva e, por isso, havia recaído no consumo de drogas.
465. Atualmente o arguido mantém as mesmas condições de vida já descritas, mas está desempregado desde dezembro de 2010, altura em que foi despedido por falta de trabalho.
466. Em março de 2011 sofreu um acidente de viação e desde então está incapacitado para o trabalho. Após o engessamento de um dos pés, foi operado ao tornozelo, mantendo contudo rigidez no pé e dificuldade em apoiar-se nele devido às dores.
467. O seguro atribuiu-lhe desde então 485,00 euros mensais, com os quais faz face às suas despesas pessoas (mas é a progenitora que lhe gere o dinheiro).
468. Em termos de rotinas, no momento atual BC........ não tem rotinas laborais ou outras, em face das suas limitações de ordem física, passando o seu tempo em casa a ver televisão, no computador ou a dormir, indo por vezes a um café.
469. No meio social tem-se a perceção que o arguido tem alterado a sua conduta, pois está mais calmo e menos vulnerável à influência de pares anti sociais. Não é objeto de rejeição, tanto mais que no relacionamento interpessoal sempre manteve um comportamento ajustado às expetativas sociais vigentes.
470. O presente processo é vivenciado com grande apreensão pelo arguido, pois teme as suas consequências, designadamente o sofrimento causado aos pais.
471. Mantém-se abstinente do consumo de drogas.
472. Não tem antecedentes criminais.

Do percurso de vida e das condições sócio económicas do arguido BF........ e respetivos antecedentes criminais
473. O arguido BF........ é filho de um casal de comerciantes, tendo formado a sua personalidade num ambiente familiar e social positivo e sem privações dignas de registo.
474. Abandonou de livre vontade o sistema de ensino quando completou o 6º ano de escolaridade. A sua primeira experiência profissional ocorreu quando tinha 16 anos de idade, como empregado de balcão, interrompida durante cerca de 3 anos, período em que cumpriu no ultramar o serviço militar obrigatório.
475. Uma vez regressado à metrópole, retomou a sua atividade laboral na área do comércio. Constituiu agregado familiar próprio aos 23 anos, idade em que contraiu casamento, sendo pai de três descendentes.
476. Por volta dos 25 anos de idade empregou-se como programador de fabrico numa metalúrgica, onde permaneceu durante 19 anos, enfrentando o desemprego de 1992 aquando da falência da sua entidade patronal. Desde então não mais beneficiou de estabilidade laboral.
477. Em abril de 1998 foi preso preventivamente pela prática de um crime de tráfico de estupefacientes, vindo a sofrer uma condenação de 7 anos de prisão efetiva. Beneficiou de liberdade condicional aos 2/3 da pena, que decorreu entre dezembro de 2002 e abril de 2004, período em que não se registaram mais envolvimentos com o aparelho de justiça penal.
478. Entretanto, em 2006, o arguido conseguiu uma colocação profissional na área da construção civil.
479. Em março de 2008 é novamente preso preventivamente, tendo sido restituído à liberdade por habeas corpus. Foi porém condenado numa pena de 3 anos e 8 meses de prisão, pela prática de um crime de tráfico de estupefacientes e por detenção ilegal de arma.
480. Após ter sido restituído à liberdade, obteve trabalho em janeiro de 2009 numa firma de construção civil.
481. Reside com a cônjuge (de 60 anos) e desde março de 2011 que coabitam com o casal três dos seus netos (de 17, 13 e 10 anos de idade), atento o suicídio da progenitora dos mesmos. No entanto, o respetivo exercício das responsabilidades parentais foi atribuído a um outro filho do arguido, que é vizinho e que também presta apoio aos sobrinhos.
482. A casa onde vivem é de construção antiga e foi herdada pelo arguido, dispondo de adequadas condições de habitabilidade.
483. Cerca de um ano e meio antes de ter sido detido à ordem destes autos, o arguido ficou desempregado, passando a auferir o respetivo subsídio de desemprego. A Cônjuge é doméstica, não tendo rendimentos próprios, pelo que pelo menos um dos filhos do casal presta apoio na manutenção do agregado familiar (um dos filhos do casal trabalha em França na construção civil e integra o agregado nos períodos de inatividade; o outro filho do casal estabeleceu-se por conta própria no ramo comercial, detendo uma situação financeira estável, sendo solidário com os pais sempre que necessário).
484. A dinâmica familiar é coesa, na medida em que a relação conjugal mantém-se há cerca de 38 anos, existindo proximidade relacional entre o arguido, filhos e netos.
485. A comunidade vicinal conhece bem o arguido e tem tido conhecimento dos seus envolvimentos com a Justiça.
486. O arguido e a cônjuge são consideradas pessoas cordiais e disponíveis para com os vizinhos. Estes, porém, optam por manter distanciamento do casal, já que discordam do estilo de vida do agregado e como forma de se resguardarem.
487. O arguido BF........ deu entrada no E.P. de Vila Real em 18.10.2011 na situação de condenado à ordem de outro processo, a fim de cumprir mais uma pena de prisão efetiva.
488. A sua reclusão teve impacto negativo ao nível familiar, pois gerou algum conflito com os filhos, os quais, porém, continuaram a manter-lhe o apoio, visitando-o (tal como a cônjuge) com regularidade do E.P.
489. A situação económica do seu agregado familiar sofreu um agravamento, uma vez que, após ter sido detido, o arguido perdeu o direito ao subsídio de desemprego. Assim, o agregado está dependente da ajuda de um dos filhos.
490. Ao nível social, um novo processo não alterou a representação da comunidade sobre o arguido, que já era negativa.
491. BF........ mantém um comportamento adequado no E.P.
492. Tem os seguintes antecedentes criminais:
- No âmbito do PCC nº 34/99, do 3º Jz Criminal do T. J. da Comarca de Guimarães, por acórdão datado de 16.02.2000, transitado em julgado a 02.03.2000, foi condenado na pena de 7 anos de prisão, pela prática em 1998 de um crime de tráfico de estupefacientes, p. e p. pelos artºs 21º e 24º do DL nº 15/93, de 22.01. Tal pena viria a ser declarada extinta por despacho de 04.05.2005, proferido pelo TEP, com efeitos reportados a 29.04.2005:
- No âmbito do PCC nº 6/08.1GDPNF, do 1º Jz do T. J. da Comarca de Amarante, por acórdão datado de 09.07.2010, transitado em julgado a 12.09.2011, foi o arguido condenado nas seguintes penas:
* 3 anos e 8 meses de prisão, pela prática a 17.03.2008 de um crime de tráfico de menor gravidade, p. e p. pelos artºs 21º, nº 1, e 25º, al. a), ambos do DL nº 15/93, de 22.01, com referência às tabelas I-A e I-B;
* 100 dias de multa, à taxa diária de 8,00 euros de multa, o que perfaz o quantitativo global de 800,00 euros, pela prática a 17.03.2008 de um crime de detenção ilegal de arma de defesa, p. e p. pelos artºs 2º, nº 1, al. x); 5º, al. d); e 86º, al. c), todos da Lei nº 5/2006, de 23.02;
- No âmbito do PCC nº 30/10.4PEVRL, do 1º Jz do T. J. da Comarca de Vila Real, por acórdão datado de, transitado em julgado a 28.12.2011, foi condenado na pena de 5 anos e 8 meses de prisão, pela prática a 26.08.2010 de um crime de tráfico de estupefacientes, p. e p. pelo artº 21º, nº 1, do DL nº 15/93, de 22.01, com referência à tabela I-A anexa a este DL. Neste processo, por acórdão datado de 30.05.2012, transitado em julgado a 19.06.2012, foi procedido a adequado cúmulo com a pena imposta ao arguido no âmbito do PCC nº 6/08.1GNPNF, do 1º Jz do T.J. da Comarca de Amarante, tendo sido assim condenado na pena única de 6 anos e 9 meses de prisão e 100 dias de multa, á taxa diária de 8 euros, o que perfaz o quantitativo global de 800,00 euros.

Considerou o Tribunal Colectivo que “Não se provou qualquer outro facto relevante para a boa decisão da causa nem qualquer facto que esteja em contradição com os factos acima expostos, designadamente:
- Que os arguidos AJ........ e AM........ tenham traficado em período anterior a fevereiro de 2010;
- Que os arguidos K........, N........, Q........, AG........, AD........, X........, AP........, AS........ e Z........ tenham traficado em período anterior a março de 2010;
- Que o arguido Z........ tenha traficado em data anterior a finais de abril de 2010;
- Que o arguido R........ tenha desenvolvido por conta do arguido K........ a atividade de tráfico de estupefacientes em data anterior a maio de 2010;
- Que o arguido AT..... tenha traficado em data anterior a maio de 2010;
- Que o arguido AW........ se tenha abastecido junto do arguido K........ de heroína e cocaína para revenda a terceiros antes de abril de 2010 e depois de maio do mesmo ano;
- Que o arguido AZ........ tenha traficado em data anterior a abril de 2010 e em data posterior a maio do mesmo ano nos moldes descritos no despacho de pronúncia;
- Que o arguido BC........ tenha traficado nos moldes descritos na pronúncia antes ou depois do mês de maio de 2010;
- Que os arguidos funcionassem de forma perfeitamente homogénea e com estrita hierarquização interna;
- Qual a percentagem que cada um dos arguidos obtinha na venda dos produtos estupefacientes;
- Que os arguidos (designadamente os arguidos AJ........ e AM........) vendessem cannabis;
- Que o arguido B........ superintendesse todas as “atividades significativas” do grupo[2];
- Que os cartuchos e a navalha apreendidos em casa do arguido BF........ lhe pertencessem ou que, por qualquer forma, por si tenham sido detidos ou usados;
- Que a aquantia monetária apreendida ao arguido BF........ seja o produto de qualquer atividade de traficância;
- Que o arguido BF........ tenha usado os telemóveis que lhe foram apreendidos no estabelecimento de contactos com vista à comercialização de produtos estupefacientes;
- Que a viatura de matrícula “..-GD-..” seja da propriedade do arguido T.........

O Tribunal Colectivo fundamentou assim a sua decisão quanto à matéria de facto:
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DECIDINDO
Por razão metodológica, a fim de facilitar a decisão no presente recurso, atendendo á sua complexidade face à extensão da matéria de facto e ao número de Recorrentes, começaremos por abordar, em termos doutrinários e jurisprudenciais, algumas questões que são recorrentes nos diversos recursos para, depois, fazermos remissão para tais ensinamentos, facilitando a conclusão, com evidente economia de tempo e de espaço.
Assim:
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E) AS ESCUTAS TELEFÓNICAS[3]
“As «escutas telefónicas» dizem respeito às intervenções que sofrem os particulares no exercício do seu direito fundamental à comunicação livre e de forma secreta, entre si, por meio de telefone”[4].
A intervenção telefónica pode definir-se como “todo o acto de investigação, limitativo do direito fundamental ao segredo das comunicações, pelo qual o juiz de instrução, relativamente a um acto punível de especial gravidade e no decurso de um procedimento penal, decide, mediante decisão especialmente fundamentada, que pelo OPC se proceda ao registo das chamadas e/ou a efectuar a gravação por magnetofone das conversações telefónicas do suspeito durante o tempo imprescindível para poder pré-constituir a prova do facto punível e a participação do seu autor”[5].
“Gravar significa fazer o registo técnico das palavras num suporte (fita magnética, disco, cassete, etc.) que torne possível a sua ulterior audição”[6].
Daí que a «intercepção e gravação» seja entendida como “um conjunto de operações técnicas, levadas a cabo por instrumentos electrónicos de captação e registo de fluxos informacionais e comunicacionais digitais, com vista à sua guarda e conservação, em tempo real, num suporte electrónico-digital (de armazenamento – Disquete, CD, DVD, etc.) de um dado fluxo informacional ou comunicacional que, de outro modo, se teria «perdido» no seu acontecer espácio-temporalmente limitado[7].
“O procedimento de intercepção telefónica ou similar consubstancia-se na captação de uma comunicação entre pessoas diversas do interceptor por meio de um processo mecânico, sem conhecimento de, pelo menos, um dos interlocutores”[8].
“Nos termos do art.º 187º, n.º 1 e 190º (hoje, 189º) do CPP, o instituto das «escutas telefónicas» abrange a «intercepção e gravação de conversações ou comunicações telefónicas», bem como as levadas a cabo «por qualquer meio técnico diferente do telefone» e, ainda, a «intercepção de comunicação entre presentes»[9].
Equiparável às escutas telefónicas é o regime das comunicações transmitidas por correio electrónico, abrangendo aquele “qualquer mensagem textual, vocal, sonora ou gráfica enviada através de uma rede pública de comunicações que pode ser armazenada na rede ou no equipamento terminal do destinatário até este a recolher” [alínea h) do art.º 2º da Directiva 2002/58/CE].
As escutas telefónicas são, reconhecidamente, um meio de prova de relativa eficácia, especialmente no combate à grande criminalidade, à criminalidade organizada e à económico-financeira.
Mas são também extraordinariamente intrusivas, provocadoras de elevada danosidade social.
Se usadas sem moderação, esquecendo que é última ratio, se não forem objecto de permanente controlo judicial, estaremos a contribuir, seguramente, para a transformação do Estado-de-direito em Estado-policial.
No dizer de Costa Andrade[10], “as escutas telefónicas têm uma danosidade social polimórfica (…) são o meio de prova mais invasivo dos direitos e liberdades fundamentais das pessoas. Desde logo, porque quem aplicar as escutas telefónicas nunca consegue limitar os danos. Os estragos têm uma dimensão subjectiva (apanhamos sempre mais pessoas do que queríamos apanhar) e lesam mais interesses do que aqueles que se queria lesar”.
Depois, porque “com elas se lesam o «direito à palavra – o direito fundamental que todos temos a que a nossa palavra, não proferida em público, não seja gravada sem o nosso consentimento – (…), o direito à privacidade e à intimidade, a violação do estado processual activo, isto é, o direito que o arguido tem de não ter de contribuir positivamente para a sua condenação (…)”[11].
Trata-se de danosidade sempre certa e segura, sempre presente e irredutível[12], que contrasta com a eficácia da justiça, na grande maioria das vezes reduzida, mas sempre incerta e contingente.
A escuta traduz-se “num meio oculto de investigação e devassa, ela condena o suspeito a «ditar», inconsciente e incontrolavelmente, para o processo «confissões» auto-incriminatórias”[13].
Daí que as escutas devam ter carácter excepcional, senão mesmo residual, de última ratio: só se deve a elas recorrer se e quando os fins da prova não possam ser alcançados com o uso de meios menos danosos para os direitos fundamentais., ou seja, quando constitua um “medida necessária, adequada e proporcional numa sociedade democrática para salvaguardar a segurança nacional, a defesa, a segurança pública e a prevenção, a investigação, a detecção e a repressão de infracções penais” - art.º 15º da Directiva 95/46/CE.
O n.º 1 do art.º 34º da CRP proclama que “O domicílio e o sigilo da correspondência e dos outros meios de comunicação privada são invioláveis”.
O n.º 4 estabelece que “É proibida toda a ingerência das autoridades públicas na correspondência, nas telecomunicações e nos demais meios de comunicação”.
Ressalva, todavia, “os casos previstos na lei em matéria de processo criminal”.
Com a inviolabilidade pretende-se, desde logo, defender o direito à confidencialidade da palavra falada (art.º 26º, n.º 1 da CRP), “o direito à autodeterminação informacional e comunicacional das pessoas ao nível do uso dos sistemas ou redes informáticas e de comunicações electrónicas para o processamento, tratamento e transmissão dos seus fluxos informacionais e comunicacionais”[14].
Quando se interfere nas comunicações comprimem-se direitos fundamentais, constitucionalmente protegidos, como, por exemplo, o direito à reserva da intimidade da vida privada e familiar[15],[16] (art.º 26º, n.º 1 da CRP), o direito à reserva quanto aos ficheiros informáticos (art.º 35, n.ºs 2 e 4 da CRP), o direito à liberdade de informação (art.º 37º da CRP); e até o direito ao livre desenvolvimento pessoal (art.º 26º, n.º 1 da CRP) e ao segredo profissional, que decorre do direito à reserva da intimidade da vida privada[17].
Gozam estes direitos também da protecção de textos internacionais, como do art.º 12º da DUDH[18], e do n.º 1 do art.º 8º da CEDH[19].
De resto, “É a partir do artigo 8° da CEDH que o Tribunal Europeu tem entendido que as intervenções nas comunicações (…) contendem directamente com o direito ao respeito da «vida privada» das pessoas e da sua correspondência”[20].
Os quais são ainda tutelados pelo ordenamento jurídico infraconstitucional.
Como meio de obtenção da prova, que é, as escutas são admissíveis desde que a CRP as autorize; estejam suficientemente sustentados em lei da Assembleia da República ou em decreto-lei autorizado; visem a salvaguarda de outro direito ou interesse constitucionalmente protegido; sejam necessários, adequados para o efeito e proporcionais ao objectivo; e ainda que sejam previstos de forma geral e abstracta, sem possibilidades de efeito retroactivo e sem diminuírem a extensão e o alcance do conteúdo essencial dos preceitos constitucionais.
A CRP autoriza a intercepção telefónica ou similar desde que a mesma seja necessária à investigação criminal (art.º 34º, n.º 4 da CRP).
As intercepções e gravações de conversações telefónicas estão sustentadas em lei aprovada pela Assembleia da República, com suficiente densidade normativa. Com efeito, os artigos 187º, 188º e 189º, do CPP, cuja redacção é resultante da revisão operada pela Lei 48/2007 (Lei da AR, portanto), respeitam a jurisprudência do TEDH, na qual se estabelece “o conteúdo ou «qualidade mínima» que a lei restritiva necessita de revestir para legitimar a intervenção nas comunicações telefónicas”. Porque assim, dela constam “as categorias de pessoas susceptíveis de serem submetidas à escuta judicial[21]; a natureza das infracções susceptíveis de poder dar lugar a ela; a fixação de um limite à duração da execução da medida, o procedimento de transcrição das conversações interceptadas; as precauções a observar para comunicar, intactas e completas, as gravações realizadas com vista ao controlo eventual pelo Juiz ou pela defesa; as circunstâncias nas quais se torna possível, ou deve proceder-se, ao apagamento ou destruição das fitas, no caso de desistência ou colocação em liberdade”[22].
Ou seja, a lei tem densidade normativa suficiente.
Só podem ser autorizadas intercepções telefónicas desde que adequadas, exigíveis e proporcionais à investigação em curso, indispensáveis à descoberta da verdade ou que a prova seria, de outra forma, impossível ou muito difícil de obter, isto é, quando a administração da justiça poderia ficar em causa se a medida não fosse levada a cabo.

As escutas têm carácter excepcional, até pela sua danosidade polimórfica e, por isso, só se deve a elas recorrer se e quando os fins da prova não possam ser alcançados com o uso de meios menos danosos para os direitos fundamentais: “A intercepção e a gravação de conversações ou comunicações telefónicas só podem ser autorizadas (…) se houver razões para crer que a diligência é indispensável para a descoberta da verdade ou que a prova seria, de outra forma, impossível ou muito difícil de obter” (art.º 187º, n.º 1).
A Lei, hoje, não deixa dúvidas quanto ao carácter excepcional[23], de última ratio da intercepção telefónica: só pode ser autorizada desde que: (1) Haja razões para crer que a diligência é indispensável para a descoberta da verdade de um dos crimes do catálogo; ou (2) Haja razões para crer que a prova seria, de outra forma, impossível ou muito difícil de obter.
No que ao requisito material diz respeito, houve a preocupação de respeitar a jurisprudência do TEDH[24], já que este, com base no art.º 8º, fixou os seguintes princípios gerais:
(a) O adjectivo «necessária» não é sinónimo de «indispensável», mas também não tem a flexibilidade de outros termos tais como «admissível», «normal», «útil», «razoável» ou «oportuno» (…);
(b) Os Estados contratantes gozam de uma certa margem de apreciação - não ilimitada - em matéria de restrições, mas a resolução final sobre a compatibilidade destas com a Convenção pertence ao Tribunal. (…);
(c) «Necessária numa sociedade democrática» significa que, para estar de acordo com a Convenção, a intervenção deve corresponder especialmente a «uma necessidade social imperiosa» e ser «proporcional à finalidade legítima perseguida». (…);
(d) Os artigos da Convenção que estabelecem uma excepção a um direito garantido devem ser interpretados restritivamente. (…);
(e) A necessidade de interferir no exercício do direito de um condenado recluso relativamente à sua correspondência deve apreciar-se em função das exigências normais e razoáveis da detenção. A «defesa da ordem» e a «prevenção de infracções penais», por exemplo, podem justificar interferências mais amplas relativamente a um recluso do que face a uma pessoa em liberdade. (…).
Até à reforma de 2007, a Lei portuguesa era omissa quanto às pessoas «escutáveis», o que configurava grave e preocupante lacuna, que era suprida por critérios jurisprudenciais, nem sempre concordantes, e alguns muito discutíveis.
A Lei 48/2007, de 29/08, indo ao encontro à jurisprudência do TEDH, que exige que as leis dos Estados-Membros definam “as categorias de pessoas que podem ser escutadas”, introduziu o n.º 4 do art.º 187º. Agora, a intercepção e a gravação só podem agora ser autorizadas, independentemente da titularidade do meio de comunicação usado, que pode ser do próprio, de terceiro ou público, contra:
(a) Suspeito ou arguido;
(b) Pessoa que sirva de intermediário, relativamente à qual haja fundadas razões para crer que recebe ou transmite mensagens destinadas ou provenientes de suspeito ou arguido; ou
(c) Vítima de crime, mediante o respectivo consentimento, efectivo ou presumido.
Por suspeito entende-se qualquer pessoa sobre a qual recaiam indícios seguros da prática de um crime grave, do catálogo[25]. Independentemente da sua forma de participação.
O arguido pode igualmente ser escutado.
A Jurisprudência, maxime do TC[26], entende que o arguido terá de se sujeitar a escutas telefónicas desde que, obviamente, estejam reunidos os pressupostos e requisito legais, sem que com isso se viole o princípio da não auto-incriminação.
Pode ainda ser alvo de intercepção e gravação de conversações ou comunicações telefónicas a “pessoa que sirva de intermediário, relativamente à qual haja fundadas razões para crer que recebe ou transmite mensagens destinadas ou provenientes de suspeito ou arguido”.
Também as vítimas de crime podem ser escutadas. Ponto é que a escuta seja efectuada no seu próprio interesse e com o seu consentimento, expresso ou presumido.
A jurisprudência do TEDH indica a necessidade de a lei ordinária estabelecer “a natureza das infracções susceptíveis de poder dar lugar a ela”, escuta. O legislador português, no n.º 1 do art.º 187º, indo ao encontro da dita jurisprudência, enumerou os crimes relativamente aos quais podem ser efectuadas escutas telefónicas (crimes do catálogo), adoptando um duplo critério: o da gravidade do ilícito-típico e o da danosidade social.
No primeiro caso, da gravidade do ilícito, prevê se autorizem escutas sempre que haja suspeita[27] da prática de um dos seguintes crimes: puníveis com pena de prisão superior, no seu máximo, a 3 anos; relativos ao tráfico de estupefacientes; de detenção de arma proibida e de tráfico de armas; de contrabando; de ameaça com prática de crime ou de abuso e simulação de sinais de perigo; de evasão, quando o arguido haja sido condenado por algum dos crimes previstos nas alíneas anteriores.
O critério da danosidade social presidiu à permissão de escutas sempre que os crimes investigados sejam os de injúria, de ameaça, de coacção, de devassa da vida privada e perturbação da paz e do sossego, desde que cometidos através de telefone.
O item 25) do n.º 2 do art.º 2º da Lei 43/86, de 26 de Setembro (Lei de Autorização Legislativa) impôs ao legislador ordinário a “Regulamentação rigorosa da admissibilidade de gravações, intercepção de correspondência e escutas telefónicas, mediante a salvaguarda da autorização judicial prévia (…)”.
O art.º 269º do CPP, na alínea e) do n.º 1, prescreve que, durante o inquérito, compete exclusivamente ao juiz de instrução autorizar[28] a intercepção, gravação ou registo de conversações ou comunicações, nos termos dos artigos 187.º e 189.º.
Por sua vez, o n.º 1 do art.º 187.º do CPP dispõe que a intercepção e a gravação de conversações ou comunicações telefónicas só podem ser autorizadas durante o inquérito por despacho fundamentado do juiz de instrução[29] e mediante requerimento do Ministério Público.
Dos preceitos legais transcritos se conclui que apenas o Juiz pode autorizar a intercepção, gravação ou registo de conversações ou comunicações.
Ao JIC incumbe averiguar se estão reunidos os pressupostos gerais, os requisitos específicos e ainda fazer o indispensável juízo de ponderação entre os direitos fundamentais conflituantes, devendo concluir pela prevalência do direito à administração da justiça.
Concluindo pela imprescindibilidade da medida para a investigação, seja porque a diligência é indispensável para a descoberta da verdade de um dos crimes do catálogo, seja porque há razões para crer que a prova seria, de outra forma, impossível ou muito difícil de obter a autorização da intercepção e gravação das comunicações telefónicas, deve autorizar a efectivação da escuta.
A efectivação de escutas telefónicas conflitua, como se viu, com diversos direitos fundamentais dos cidadãos. Por isso, a lei exige um controlo permanente da medida por parte do JIC, sem o que as provas produzidas não poderão ser valoradas em julgamento (art.º 126º, n.º 3)[30].
O controlo visa “uma tríplice frente: Em primeiro lugar, velar pela observância das prescrições e pautas incorporadas no auto autorizante, não se admitindo qualquer tipo de discricionaridade na sua execução. Em segundo lugar, a escrupulosidade na recepção do material gravado, garantindo-se a sua autenticidade e integridade. E, por último, a adopção de medidas necessárias para a advertência escrita das gravações obtidas e selecção de tudo o quanto possa ser importante”[31]
Para efeitos de o controlo judicial, o n.º 3 do art.º 188º determina que “o órgão de polícia criminal referido no n.º 1 leva ao conhecimento do Ministério Público, de 15 em 15 dias a partir do início da primeira intercepção efectuada no processo, os correspondentes suportes técnicos, bem como os respectivos autos e relatórios”, prescrevendo o n.º 4 que “O Ministério Público leva ao conhecimento do juiz os elementos referidos no número anterior no prazo máximo de quarenta e oito horas”.
Efectuado o controlo, no prazo máximo de 24 horas (art.º 268º, n.º 4 do CPP), o juiz pode decidir:
(a) Fazer cessar a escuta por desnecessidade ou porque a mesma não respeita os pressupostos em que assentou;
(b) Manter a mesma até ao término do prazo de 3 meses.
Em qualquer dos casos, deve:
● Ordenar a junção aos autos, a requerimento do Ministério Público, das transcrições e autos de conversações que sejam indispensáveis para fundamentar a aplicação de medidas de coacção ou de garantia patrimonial, à excepção do termo de identidade e residência (art.º 188º, n.º 7 do CPP).
● Determinar, de acordo com o n.º 6 do art.º 188º, a destruição imediata dos suportes técnicos e relatórios manifestamente estranhos ao processo, entendendo-se como tais: (a) Que disserem respeito a conversações em que não intervenham pessoas referidas no n.º 4 do artigo anterior; (b) Que abranjam matérias cobertas pelo segredo profissional, de funcionário ou de Estado; ou (c) Cuja divulgação possa afectar gravemente direitos, liberdades.

Como refere Costa Andrade[32], “as escutas telefónicas têm uma danosidade social polimórfica (…) são o meio de prova mais invasivo dos direitos e liberdades fundamentais das pessoas. Desde logo, porque quem aplicar as escutas telefónicas nunca consegue limitar os danos. Os estragos têm uma dimensão subjectiva (apanhamos sempre mais pessoas do que queríamos apanhar) e lesam mais interesses do que aqueles que se queria lesar”.
O que vale por dizer que, na sequência das escutas, podem aparecer os chamados conhecimentos fortuitos entendidos como aquele conjunto de factos que foi casualmente descoberto, que não era objecto de investigação, “aqueles que não se reportam ao crime cuja investigação legitimou a sua realização”[33], aqueles que foram obtidos por mero acaso.
Contrapõe-se-lhes os conhecimentos da investigação, os que são objecto do próprio processo.
A lei portuguesa, antes da reforma de 2007, nada referia quanto aos conhecimentos fortuitos.
Costa Andrade[34] tratou dogmaticamente a questão, assim explanando: “No estado actual das questões, não se afigura viável adiantar um critério conceptual susceptível de demarcar e contrapor em termos esgotantes e exclusivos as duas áreas em confronto. (…)
Nesta linha, devem, desde logo, ter-se por pertinentes aos conhecimentos da investigação os factos que estejam numa relação de concurso ideal e aparente com o crime que motivou e legitimou a investigação por meio da escuta telefónica. O mesmo valendo para os delitos alternativos que com ele estejam numa relação de comprovação alternativa de factos. Consensual parece ainda, tanto na doutrina como na jurisprudência, que o mesmo terá de ser o entendimento quanto aos crimes que, no momento em que é decidida a escuta em relação a uma associação criminosa, aparecem como constituindo a sua finalidade ou actividade. (…) À figura e ao regime dos conhecimentos da investigação deverão ainda levar-se as diferentes formas de comparticipação (autoria e cumplicidade), bem como as diferentes formas de favorecimento pessoal, auxílio material ou receptação. (…)”.
Todos os outros serão conhecimentos fortuitos.
Ainda segundo o mesmo Autor, “Não será arriscado apontar como pratica­mente isolados os autores que se pronunciam a favor da valoração, sem restrições, dos conhecimentos fortuitos. (…)
Na doutrina aceita-se generalizadamente a tese da jurisprudência, segundo a qual «a valoração dos conhecimentos fortuitos só é possível no interior da classe dos crimes do catálogo». (…) Nesta linha, e para emprestar operatividade à doutrina, os autores propendem para submeter os conhecimentos fortuitos a um juízo hipotético de intro­missão, fazendo incidir sobre eles aquela ideia de «estado de necessi­dade investigatório» em nome da qual o legislador abre a porta à admissibilidade da devassa da escuta (…).
Temos por bem fundado o entendimento da doutrina e jurisprudência alemãs na parte em que reclamam como exigência mínima que os conhecimentos fortuitos se reportem a um crime do catálogo, se, a uma das infracções previstas no artigo 187° do CPP. Para além disso, cremos, em segundo lugar, ser mais consistente a posição dos autores que, a par do crime do catálogo, fazem intervir exigências complementares tendentes a reproduzir aquele estado de necessidade investigatório que o legislador terá arquetipica­mente representado como fundamento da legitimação (excepcional) das escutas telefónicas. (…) Parece, outrossim e em terceiro lugar, que em caso de perseguição de associação criminosa nada impedirá a valoração dos conhecimentos fortuitos relativos aos crimes que integram a finalidade ou actividade da associação”.
O legislador de 2007 conhecia a doutrina e as dificuldades que a questão atinente aos conhecimentos fortuitos suscita. Em vez de a resolver definitivamente, limitou-se a aditar os n.ºs 7 e 8 ao art.º 187º:
7. Sem prejuízo do disposto no artigo 248.º, a gravação de conversações ou comunicações só pode ser utilizada em outro processo, em curso ou a instaurar, se tiver resultado de intercepção de meio de comunicação utilizado por pessoa referida no n.º 4 e na medida em que for indispensável à prova de crime previsto no n.º 1.
8. Nos casos previstos no número anterior, os suportes técnicos das conversações ou comunicações e os despachos que fundamentaram as respectivas intercepções são juntos, mediante despacho do juiz, ao processo em que devam ser usados como meio de prova, sendo extraídas, se necessário, cópias para o efeito.
Ou seja, limitou-se a prever e regulamentar a utilização das gravações que contenham conhecimentos de investigação ou fortuitos em outro processo, em curso ou a instaurar, fazendo depender tal utilização do concurso cumulativo dos seguintes requisitos:
1. Tratar-se de pessoa escutável, tal como supra o definimos;
2. O crime do outro processo será também crime do catálogo;
3. A gravação é indispensável à prova desse crime
Por outro lado, abordou de forma muito perfunctória o tratamento a que devem ser sujeitos os factos de que os órgãos de polícia criminal, que executem as intercepções, tiverem notícia no exercício destas funções, que não reúnam os aludidos requisitos, sabendo-se que o art.º 248º, para o qual remete o n.º 7 do art.º 187º, obriga os órgãos de polícia criminal que tiverem notícia de um crime, por conhecimento próprio ou mediante denúncia a transmiti-la ao Ministério Público no mais curto prazo, que não pode exceder 10 dias. E que o n.º 2 do art.º 188º permite que o órgão de polícia criminal que proceder à investigação tome previamente conhecimento do conteúdo da comunicação interceptadas a fim de poder praticar os actos cautelares necessários e urgentes para assegurar os meios de prova.
A II parte do n.º 7 do art.º 187º do CPP permite a utilização da gravação de conversações ou comunicações, quer se trate de conhecimentos de investigação ou fortuitos, em outro processo, em curso ou a instaurar, se, como vimos, e cumulativamente:
(1) Tiver resultado de intercepção de meio de comunicação utilizado por pessoa referida no n.º 4 (suspeito ou arguido; pessoa que sirva de intermediário, relativamente à qual haja fundadas razões para crer que recebe ou transmite mensagens destinadas ou provenientes de suspeito ou arguido; ou vítima de crime, neste caso, mediante o respectivo consentimento, efectivo ou presumido);
(2) For indispensável à prova de crime;
(3). O crime for um dos previstos no n.º 1 do art.º 187º (do catálogo).
Se permite o seu uso em outro processo, em curso ou a instaurar, por maioria de razão permite o uso no processo em curso, passando a haver novo suspeito e/ou arguido (modificação subjectiva).
Ponto é que os pressupostos processuais e o requisito material estejam verificados, designadamente no que toca ao crime de catálogo e à essencialidade da escuta.

O artº 189.º do CPP, sob a epígrafe “Extensão”, dispõe:
1. O disposto nos artigos 187.º e 188.º é correspondentemente aplicável às conversações ou comunicações transmitidas por qualquer meio técnico diferente do telefone, designadamente correio electrónico ou outras formas de transmissão de dados por via telemática, mesmo que se encontrem guardadas em suporte digital, e à intercepção das comunicações entre presentes.
2. A obtenção e junção aos autos de dados sobre a localização celular ou de registos da realização de conversações ou comunicações só podem ser ordenadas ou autorizadas, em qualquer fase do processo, por despacho do juiz, quanto a crimes previstos no n.º 1 do artigo 187.º e em relação às pessoas referidas no n.º 4 do mesmo artigo.
A extensão envolve cinco dimensões:
1. Do telefone a outros meios técnicos;
2. Da voz humana à imagem;
3. Da comunicação à distância à comunicação entre presentes;
4. Da inge­rência (no conteúdo das) nas conversações ou comunicações à obten­ção do registo de realização das mesmas;
5. Da ingerência «transambiental» à localização geográfica do aparelho técnico da comunicação[35].
O regime jurídico das escutas telefónicas “é aplicável às conversações ou comunicações transmitidas por qualquer meio técnico diferente do telefone”, ou seja, é aplicável às conversações ou comunicações efectuadas através de computador, de telefax, por mensagem SMS, ou outros. “Já não se trata apenas de captar os fluxos comunicacionais que envolvam a palavra falada, também se abrangem outros fluxos informacionais e comunicacionais onde ganha relevância a palavra escrita (texto) o áudio e a imagem”[36].
Equiparável às escutas telefónicas é o regime das comunicações transmitidas por correio electrónico, abrangendo aquele “qualquer mensagem textual, vocal, sonora ou gráfica enviada através de uma rede pública de comunicações que pode ser armazenada na rede ou no equipamento terminal do destinatário até este a recolher” [alínea h) do art.º 2º da Directiva 2002/58/CE].
Mesmo que guardadas em suporte digital[37]. Assim, estas comunicações, só podem ser “interceptadas” se verificados os respectivos pressupostos: relacionadas com a investigação de crime de catálogo, disserem respeito a suspeito, arguido, terceiro mediador ou vítima, neste caso com o seu consentimento, a requerimento do M.º P.º, na fase do inquérito, sendo indispensáveis à investigação, mediante despacho fundamentado do JIC.
O regime é também estendido da voz humana à imagem, ou seja, o regime das escutas telefónicas abrange também as comunicações vídeo, ou qualquer outra forma técnica de captação de imagem. Por isso, também os pressupostos das escutas têm de estar presentes sempre que haja “intercepção” dessas comunicações.
Ainda o regime jurídico das escutas telefónicas é estendido à intercepção de comunicações entre presentes, entre pessoas que estão de cara a cara, não podendo um destes gravar a conversa que tem com o outro, sob pena de não poder ser utilizada, para além de que sujeita o que executa a operação a procedimento criminal.
O princípio da lealdade impõe a solução - são nulas todas as provas obtidas por meios enganosos (art.º 126º).
E é também estendido à obten­ção do registo de realização de conversações ou comunicações.
Finalmente, equipara a lei às escutas telefónicas a localização geográfica do aparelho técnico da comunicação, a recolha de dados de localização, “aqueles que são tratados para efeitos do envio de uma comunicação através de uma rede de comunicações electrónicas ou para efeitos da facturação da mesma”[38].
Por “dados de localização” entende-se, no dizer da alínea e) do art.º 2º da Lei 41/2004, “quaisquer dados tratados numa rede de comunicações electrónicas que indiquem a posição geográfica do equipamento terminal de um assinante ou de qualquer utilizador de um serviço de comunicações electrónicas acessível ao público”.
A localização geográfica “assenta na detecção de aparelhos que se ligam a células disseminadas pelo território e que garantem a «cobertura de rede» - sem interferir ou intercep­tar conteúdo da comunicação - a localização permite situar geograficamente a posição do aparelho ou a mudança de conexão para (outras) células e, assim, seguir a trajectória pelas zonas onde o aparelho se encontra a operar.
Pode revelar-se uma boa técnica para localizar suspeitos ou até arguidos (…), mas também para localizar vítimas, por exemplo, de sequestros [presumindo-se o consentimento nos termos do n.º 4 al. c) do 187.° CPP]”[39].
Deve precisar-se, refere Costa Andrade[40], mais uma vez criticando a solução legal, que “só os dados autênticos de comunicação (os «echten Verhin-dungsdaten» de que falam os autores alemães), isto é, só os dados que se reportam a comunicações efectivamente realizadas ou tentadas/falha­das entre pessoas, detêm aquele estatuto e regime (de dados de tráfego). Por vias disso, caem fora do regime e da área de tutela da inviolabilidade das tele­comunicações os procedimentos de identifi­cação do número de um aparelho de telemóvel ou do respectivo cartão (IMEI e IMSI). O mesmo valendo para os consequentes dados obtidos, concretamente os dados de localização logrados através destes procedimentos. Na verdade, estes procedimentos não pressupõem qualquer acto de comunicação: basta que o telemóvel esteja em posição stand-by, isto é, ligado e apto para receber chamadas. Como impressivamente assinala o Tribunal Constitucional alemão (22.8.2006), aqui não há telecomunicação entre pessoas, mas apenas entre máquinas, que não gozam da tutela constitucional e processual penal. Na precisa formulação do Tribunal: «uma comunicação téc­nica entre aparelhos não apresenta o específico potencial de perigo face ao qual se erige a tutela do artigo 10º da Lei Fundamental. O artigo 10° da Lei Fundamental não segue o conceito estritamente técnico de telecomunicação ..., mas vincula-se ao portador pessoal do direito fundamental e à sua carência de tutela provocada pela mediação de terceiros no processo de comunicação. A identificação do IMSI ou IMEI pode seguramente pôr em causa a disponibilidade de um telemóvel para ser utilizado; mas não actualiza o perigo específico para a privacidade da comunicação deri­vado da utilização de um meio de comunica­ção». O mesmo devendo valer, por maioria de razão, para o chamado SMS silencioso («stillen SMS»)”.
Ainda enquadrada no regime das escutas telefónicas está a denominada facturação detalhada. “Não se compagina, o descobrir da «lista» de contactos telefónicos, que a facturação detalhada revela, com uma referência apressada a meios de prova como os obtidos à custa da inviolabilidade das comunicações telefónicas, por se quebrar com a mera aproximação de qualquer modelo abstractamente desenhado.
Trata-se de um meio de prova que contende com bens jurídicos pessoais que, de forma mais ou menos ostensiva e directa, revelam da esfera da privacidade e se caracterizam pela sua estrutura comunicativa e intersubjectiva. (…)
As facturas de telefonemas viabilizarão o acesso tanto à esfera jurídica do autor como do destinatário da comunicação. A revelação dos telefonemas só será muitas vezes possível à custa do sacrifício de «segredos de terceiro», deste modo se suscitando frequentes e não fáceis problemas de identificação do portador do bem jurídico (…) isto é, das pessoas concretamente atingidas com a sua revelação. A índole estruturalmente comunicativa destas expressões de liberdade erigidas em bem jurídico imprime um carácter invencivelmente ambivalente à intervenção de terceiro. Ela configurará a forma mais drástica de sacrifício, se imposta sem tutela do direito fundamental do próprio investigando, mas pior se atinge terceiro que não está a ser investigado” [42].
Por tal razão, a facturação teria de ser requerida pelo JIC, posição que o legislador de 2007 acolheu.
F) O VALOR PROBATÓRIO DAS ESCUTAS TELEFÓNICAS
Nunca é de mais repetir o que supra afirmámos:
As escutas telefónicas são, reconhecidamente, um meio de prova de relativa eficácia, especialmente no combate à grande criminalidade, à criminalidade organizada e à económico-financeira. Mas são também extraordinariamente intrusivas, provocadoras de elevada danosidade social. Se usadas sem moderação, esquecendo que são última ratio, se não forem objecto de permanente controlo judicial, estaremos a contribuir, seguramente, para a transformação do Estado-de-direito em Estado-policial.
Trata-se de danosidade sempre certa e segura, sempre presente e irredutível[43], que contrasta com a eficácia da justiça, na grande maioria das vezes reduzida, mas sempre incerta e contingente.
A escuta traduz-se “num meio oculto de investigação e devassa, ela condena o suspeito a «ditar», inconsciente e incontrolavelmente, para o processo «confissões» auto-incriminatórias”[44] /[45].

As escutas dos presentes autos são todas, sem excepção, válidas.
Importa afirmá-lo de forma categórica.
Foram autorizadas pelo JIC no âmbito de um crime do catálogo; a suspeitos da prática desse crime; eram absolutamente imprescindíveis á descoberta dos agentes do tráfico de droga que tinha lugar na zona do Vale do Sousa, sendo considerada criminalidade organizada, que estava a atingir estabelecimentos de ensino.
Foram sendo sempre controladas pelo JIC e estão transcritas nos autos.
O Sr. Juiz de Instrução Criminal, num despacho de pronúncia a todos os títulos louvável e meritório, daqueles que legitimam a função judicial, tratou em profundidade a questão da validade das escutas:
“Por questão de precedência lógica, começaremos por analisar o invocado pelos arguidos T……, CO….., AD........, AG........ e CU….. em sede de requerimento de instrução (comum a todos eles).
Invocaram estes arguidos que:
A investigação dos factos denunciados presentes autos, iniciou-se com vigilâncias e seguimentos a suspeitos da prática de tráfico de estupefacientes. No seu decurso, logo após ter iniciado, o OPC vem dar conhecimento aos autos da impossibilidade de conseguir identificar o alegado fornecedor dos suspeitos pois estes aperceberam-se da sua abordagem, tendo adoptado atitudes de mais resguardo para não ser descobertos.
Não se percebe em que consistiu a abordagem realizada pelo OPC, como foi feita? Terá havido um menor cuidado na investigação do OPC? Não se sabe e dos autos não resulta o esclarecimento a tais questões.
O certo é que esse foi o factor/fundamento para que o MP viesse suscitar a necessidade de se dar inicio às intercepções telefónicas bem como captação de som e imagem. Cfr promoção de fls. 21 e sgts. e relatório do ope em que se baseia. A fls. 25 foi lavrado despacho a autorizar a captação de imagens dos suspeitos e de terceiros A fls. 71 foi lavrado despacho que ordenou o início das intercepções telefónicas:
«Todavia, face à ineficácia dos meios de recolha de prova anteriormente ordenados, por força dos cuidados que os visados passaram a adoptar, impõe-se redirecionar a investigação tendo em vista a prossecução dos seus fins últimos, como bem refere o Digno Magistrado do Ministério Publico».
«As diligências promovidas de acordo com o estado actual da investigação, são indispensáveis para a descoberta da verdade e essenciais para a recolha de meios de prova atenta a natureza do crime indiciado.
Assim, em face da investigação já levada a cabo, entende o titular da acção penal (Ministério Publico) ser essencial a intercepção telefónica das conversações efectuadas através dos cartões telefónicos identificados a fls. 68-b)».
Resulta assim que a essencialidade em dar início a intercepções telefónicas se encontra apenas no insucesso - não se percebendo em que é que traduz - e na frustração dos objectivos pretendidos logo ao início das diligências.
Repare-se que logo após terem dado início a esta diligência o OPC vem dar conhecimento da frustração da mesma - refere-se no relatório que quando foi feita abordagem foram detectados, ficando sem se perceber de que forma e em que termos isso ocorreu - indicando logo como essencial, e a única adequada, as escutas telefónicas.
Verifica-se assim a nulidade das escutas telefónicas por violação dos princípios da proporcionalidade, adequação, e subsidiariedade, pois a sua autorização não foi precedida das diligências indispensáveis à verificação da efectiva necessidade no recurso a um meio de prova tão fortemente lesivo de direitos fundamentais.
O Mm° Juiz não sindicou as verdadeiras razões que levaram ao insucesso das diligências que na altura se realizavam. Impunha-se antes de tudo esclarecer a «abordagem», de que forma ocorreu e, posteriormente, a ponderação se a única via para a investigação era a suscitada. Ao invés foi proferido um despacho puramente remissivo para a promoção do MP que por sua vez se sustenta no relatório do OPC. Em face disso, é de concluir pela falta de fundamento do douto despacho, sendo por isso nulo nos termos dos art.ºs 190° e 187º, n.º l do CPP.
O início das intercepções telefónicas, vão ocorrendo em seguida promoções e sucessivos despachos de autorização de intercepções telefónicas a diferentes números de telefone em decorrência daqueles iniciais.
Sendo nulo o despacho, serão nulos todos os subsequentes.
Mais argumentam que os despachos de validação das escutas foram realizados não com base no seu verdadeiro teor mas sim aquilo que o OPC apelidou de «súmula». Isto é, ao invés de levar ao conhecimento do tribunal o verdadeiro conteúdo, a transcrição, o OPC faz uma síntese das conversações.
Como refere o n.º 2 do art 188° CPP o Juiz para validar e ordenar a transcrição, tem que conhecer o teor das escutas telefónicas, coisa diferente de conhecer apenas a sua súmula feita com base na análise do OPC. Concluem que ocorreu por isso a violação do citado preceito, sendo nulas as escutas telefónicas - art. 190° do CPP.
Mais referiram que decisão de autorizar as escutas telefónicas, para a salvaguarda do direito à reserva devida, imagem e dignidade, é proferida nos termos do preceituado no art. 187°, n.° l do CPP. No seu n.° 4 vem prevista a possibilidade de proceder de igual modo relativamente a quem seja suspeito de actividade delituosa.
Como melhor se percebe com a leitura do artigo, exige-se que existam suspeitas sobre determinada pessoa já identificada nos autos enquanto tal.
Esta exigência legal impede que as escutas telefónicas sejam feitas de forma indiscriminada e em atropelo dos direitos constitucionais referidos.
Refere a acusação pública que o arguido T........, utilizava o n.º de telemóvel 913 88 …. .
A fls. 178 o OPC, não se referindo ao arguido e sem saber de quem se trata, apenas alega que poderá ser o presumível fornecedor de estupefaciente. Informa que este número 91388…. poderá ser utilizado pelo presumível fornecedor de um outro suspeito.
Isto para além do n.º 91432…. sobre o qual havia já sido proferido despacho a fls. 158, a autorizar as escutas telefónicas.
Concluem que sobre o número de telemóvel não se sabia a quem o mesmo pertencia e que o arguido T........, á data, ainda nem sequer era suspeito ou tão pouco estava identificado. Também quanto a este número de telefone se verifica a mesma omissão.
Da captação de imagens
Existem nos autos fotografias de locais e pessoas recolhidas no âmbito da investigação. Veja-se nomeadamente a fls. 433 e 3760.
O art. 6 da Lei 5/02 remete para o art.º 188º do CPP as formalidades a que tal tarefa deve obedecer.
Refere o n° 5 do art. 188° CPP que cabe ao Juiz de Instrução a verificação da relevância à investigação de tal matéria, validando-a em seguida.
Para que sejam validadas as fotografias deve assim ser proferido despacho fundamentado, sob pena de nulidade - art. 190° CPP.
Verifica-se uma tomada de conhecimento nos autos - cfr. por exemplo despacho de fls. 460 mas sem que seja proferido o competente despacho fundamentado. São por isso prova nula.
Quanto á arguida CU…. refere que a matéria constante da acusação se baseia em conclusões e não em elementos de prova e que deveria ter sido proferido despacho de arquivamento.
Concluem todos pela prolação de despacho de não pronúncia.
Apreciemos.
Da nulidade das escutas telefónicas por violação dos princípios da necessidade, adequação e proporcionalidade.
Sobre a admissibilidade das escutas telefónicas, determina o n.º l do art. 187º do Código de Processo Penal (CPP, doravante), na redacção constante da Lei n.º 48/2007, de 29 de Agosto que:
A intercepção e a gravação de conversações ou comunicações telefónicas só podem autorizadas durante o inquérito, se houver razões para crer que a diligência é indispensável para a descoberta da verdade ou que a prova seria, de outra forma, impossível ou muito difícil de obter, por despacho fundamentado do juiz de instrução e mediante requerimento do Ministério Público, quanto a crimes:
a) Puníveis com pena de prisão superior, no seu máximo, a 3 anos;
b) Relativos ao trafico de estupefacientes;
c) De detenção de arma proibida e de tráfico de armas;
d) De contrabando;
e) De injúria, de ameaça, de coacção, de devassa da vida privada e perturbação
e perturbação da paz e do sossego, quando cometidos através do telefone;

f) De ameaça com prática de crime ou de abuso e simulação de sinais de perigo; ou
g) De evasão, quando o arguido haja sido condenado por alguns dos crimes previstos nas alíneas anteriores.
A doutrina e jurisprudência têm sido unânimes em considerar que as escutas telefónicas, atenta a sua «manifesta e drástica danosidade social» quer pelo «número de direitos ou interesses atingidos», quer pela «gravidade da respectiva lesão», revelam uma matéria muito delicada e sensível, que sobressai «pela diversidade e extrema complexidade dos problemas normativos que suscitam» (cf. Costa Andrade - Sobre as proibições de prova em processo penal, pg. 281 e Revista Portuguesa de Ciência Criminal - Ano I, 3, pág. 387).
É sabido que as escutas telefónicas constituem um meio de obtenção de prova que se traduz numa considerável devassa da vida privada tanto das pessoas que têm os seus telefones sob escuta, relativamente às quais existem indícios da prática de um determinado crime, como também de todas as pessoas que contactam as primeiras através do telefone, que não serão suspeitas da prática de qualquer ilícito.
Deste modo, deverão as escutas telefónicas apenas ser autorizadas quando forem verdadeiramente necessárias para os fins da investigação e adequadas e proporcionais aos resultados que possam obter, em prol da verdade que se procura descobrir, quando comparadas com as lesões que constituem à intimidade pessoal e familiar dos atingidos por elas.
Os artºs 187º e 188º do CPP estabelecem um regime de autorização e controlo judicial, e «sistema de catálogo», em que a escuta telefónica é reservada exclusivamente a tipos criminais que pelas suas características tornam tal meio de recolha de prova particularmente apto à investigação ou que, pela gravidade dos interesses em jogo (expressa numa moldura penal abstracta qualificada), podem justificar a adopção de uma medida consensualmente vista como portadora de um elevado potencial de «danosidade social» (vide Manuel da Costa Andrade, in «Sobre as proibições de prova em Processo Penal», Coimbra, 1992, págs. 272, 275, 281, 283 e 285).
Tais normas estão em consonância com o art.º 34º, n.º l, da CRP, segundo o qual «O domicilio e o sigilo da correspondência e dos outros meios de comunicação privada são invioláveis», bem como com o disposto no n.º 4, do mesmo preceito constitucional, no qual se consagra que «é proibida toda a ingerência das autoridades públicas na correspondência, nas telecomunicações e nos demais meios de comunicação social, salvo os casos previstos na lei em matéria de processo penal».
Perante o prescrito no art.º 187º, n.º l, do CPP temos que, a admissibilidade das escutas telefónicas depende, por um lado, de o crime a investigar ser um dos elencados no n.º l do art.º 187º do CPP e, por outro, de haver razões para crer que a diligência é indispensável para a descoberta da verdade ou que a prova seja, de outra forma, impossível ou muito difícil de obter (obviamente que se impõe a pendência de um inquérito já instaurado, e, portanto, uma investigação criminal em curso).
Nas palavras do Prof. Costa Andrade, as escutas telefónicas (sendo um dos «métodos ocultos de intervenção e de investigação» para fazer face «a uma fenomenologia criminal» cada vez mais sofisticada, que vai gozando «de uma imunidade privilegiada à devassa das instâncias formais de controlo»), enquanto meio de obtenção de prova, sobressaem por serem eficazes «do ponto de vista da perseguição penal» (visando garantir o ius puniendi do Estado), embora impliquem uma manifesta e drástica danosidade social» (destacando-se a «lesão irreparável do direito à palavra falada»), razão pela qual a lei impõe determinados pressupostos materiais e formais, exigindo do juiz uma «ponderação vinculada» dos interesses em jogo («por um lado, os sacrifícios ou perigos que a escuta telefónica traz consigo; e, por outro lado, os interesses mais relevantes da perseguição penal»).(in «Sobre o regime processual penal das escutas telefónicas», RPCC, ano I, fase.3, Julho-Setembro 1991, pg. 370 e ss).
Daí que, este meio de obtenção de prova assume um carácter excepcional, devendo reger-se pelos critérios da proporcionalidade, da adequação e da necessidade (art. 18º, nº 2, da Constituição da República Portuguesa).
É que a verdade que se visa alcançar no processo penal, não sendo um valor absoluto, só pode ser procurada através de meios justos, não podendo ser investigada a qualquer preço, mormente quando esse preço é o sacrifício dos direitos das pessoas.
Na opinião de Susana Aires de Sousa, «a protecção e garantia dos direitos fundamentais não tutelam apenas o seu titular mas a própria credibilidade, reputação e imagem do Estado de Direito» (cfr. «Agent provocateur e meios enganosos de prova. Algumas reflexões», in Liber Discipulorum para Jorge Figueiredo Dias, Org. por Manuel da Costa Andrade, José de Faria Costa, Anabela Miranda Rodrigues, Maria João Antunes, Coimbra Editora, 2003, pág. 1212).
Logo, «a proibição de prova é uma barreira colocada à determinação dos factos que constituem objecto do processo», isto é, trata-se de um limite à descoberta da verdade (Manuel da Costa, ob. citada, pág. 83 e 84).
As escutas telefónicas têm de ser ordenadas por despacho fundamentado do Juiz de instrução e mediante requerimento do Ministério Público (arts. 187º n.º l e 269º n.º l, al. e), do CPP, na versão em vigor.
O Prof. Costa Andrade, relativamente ao regime legal das escutas telefónicas em vigor na versão anterior a 15.09.07, apontava quatro pressupostos materiais essenciais para a admissibilidade das escutas telefónicas:
«1º As escutas telefónicas hão-de estar preordenadas ã perseguição dos chamados ‘crimes do catálogo’ (‘enumeração taxativa e fechada’, expressa no art. 187, n.º l, do CPP, onde se procura positivar o ‘juízo de proporcionalidade’ também contido no art. 18º da CRP);
2º Exige-se uma forma relativamente qualificada de suspeita da prática do crime (ver a referência a ‘razões’ do art. 187° n.º l CPP), suspeita que terá ‘de atingir um determinado nível de concretização a partir de dados do acontecer exterior ou da vida psíquica’;
3º Estão subordinadas ao princípio de subsidiariedade, no sentido de, em princípio não haver outro meio eficaz, menos gravoso, para alcançar o resultado probatório em vista, devendo ficar demonstrado que a escuta ‘reveste grande interesse para a descoberta da verdade ou para a prova’, ou seja, a escuta telefónica há-de revelar-se ‘como um meio em concreto adequado a mediatizar aquele resultado’ (portanto, há que demonstrar que a escuta telefónica a autorizar é essencial e idónea para a descoberta da factualidade em investigação, criando-se a convicção de que através dela serão alcançados resultados fecundos e substanciais);
4º As escutas telefónicas deverão ser limitadas ‘a um universo determinado de pessoas ou ligações telefónicas’.
Ora, apesar das alterações que sofreu este regime legal, com a entrada em vigor da Lei 48/2007, de 29.08, afigura-se-nos que estes pressupostos materiais se mantêm, devendo agora o referido 3º pressuposto material, ou seja, o que determina que as escutas telefónicas estão subordinadas ao princípio da subsidiariedade, ser agora interpretado, no sentido de, em princípio não haver outro meio eficaz, menos gravoso, para alcançar o resultado probatório em vista, devendo ficar demonstrado que a escuta «é indispensável para a descoberta da verdade ou que a prova seria, de outra forma, impossível ou muito difícil de obter».
Assim, a decisão judicial que se pronunciar sobre o pedido de intercepção telefónica, tem que verificar se estavam preenchidos os referidos pressupostos materiais.
Precisamente para assegurar «a menor compressão possível dos direitos fundamentais afectados pela escuta telefónica» a lei exige, na fase do inquérito, a intervenção de um juiz (entidade imparcial e independente, que não tem funções investigatórias, mas antes intervém para garantir direitos e liberdades das pessoas, portanto, tem uma função de conteúdo meramente garantístico), o qual irá garantir que as restrições dos direito fundamentais se limitarão «ao necessário para salvaguardar outros direitos ou interesses constitucionalmente protegidos, sem jamais diminuir a extensão e o alcance do conteúdo essencial dos preceitos constitucionais» ('artigo 18, n.ºs 2 e 3, da CRP) (cfr. neste sentido, Acórdãos do Tribunal Constitucional n.° 426/2005, m DR II Série de 05.12.2005 e n.° 232/2006, in DR, II Série de 23.05.06).
Acresce salientar que as intercepções telefónicas não são meios de prova mas antes meios de obtenção de prova (isto é, meio de aquisição de prova). Ou seja, enquanto meio de obtenção de prova, visa recolher prova (meios de prova).
Assim, o juízo prévio de ponderação dos interesses em conflito baseia-se na existência de suspeitas bastantes que justifiquem a utilidade e necessidade da intercepção telefónica, suspeitas essas que não equivalem à existência de «fortes indícios» (antes é, através da intercepção telefónica, que se vai tentar recolher indícios dos factos que, por outra via, não são ou dificilmente seriam alcançáveis).
Com efeito, quando o art. 187º, n.º l, do CPP condiciona a autorização das escutas telefónicas ao requisito «se houver razões para crer que a diligência é indispensável para a descoberta da verdade ou que a prova seria, de outra forma, impossível ou muito difícil de obter», há que ter em atenção o momento em que é pedida a intercepção telefónica, pois que, ocorrendo tal pedido na fase inicial do processo de investigação, não se pode fazer corresponder à existência de suspeitas «um grau de exigência equiparável aos fortes indícios» (cfr., neste sentido, o Acórdão do T.R.C, de 25.10.06, in www.dgsi.pt).
A admissibilidade das escutas telefónicas implica que seja proferido um juízo valorativo sobre o que está em causa no processo, exigindo-se por isso ao juiz um conhecimento mínimo do seu objecto.
No que concerne à fundamentação da decisão judicial, refere André Lamas Leite que «a sua maior ou menor densidade depende da fase das diligências investigatórias em que a escuta for ordenada, devendo o magistrado indicar, do modo mais completo possível, os dados que se visa recolher e a medida da sua relevância para a notícia criminis, ilustrando sempre de forma concreta o raciocínio que desenvolveu no sentido de considerar cumpridos os requisitos legais» (in «As escutas telefónicas - Algumas reflexões em redor do seu regime e das consequências processuais derivadas da respectiva violação», na Revista da Faculdade de Direito da Universidade do Porto, Coimbra Editora, Ano I, 2004, pág. 23).
Visto o regime substantivo, apreciemos.
Os presentes autos tiveram como elemento gerador a denúncia do Senhor DK….., da Comarca de Valongo, da qual dava notícia da presumível existência de tráfico de distribuição directa no interior da escola EB 2,3 ….., Campo.
Naquele momento precoce da investigação, recaíam suspeitas, mormente, sobre aluno DL…., que por decisão do Tribunal de Menores se encontrava institucionalizado no lar DM….. de Ermesinde, que supostamente desenvolveria essa actividade por influência do seu pai, o arguido AJ….., já condenado pela prática de crimes de tráfico de estupefacientes e nessa altura em liberdade.
A partir de tais menções e uma vez que as acções apontavam para situações de distribuição directa aos consumidores, iniciou-se com diligências investigatórias, que passou pela realização de vigilâncias, quer no interior do sobredito estabelecimento, quer junto ao gradeamento do mesmo.
Face aos elementos aduzidos nos autos, mormente, os que resultam dos R.D.E., (relatos de diligência externa de fls. 33 a 37) em relação aos patenteados na denúncia, não foi possível recolher elementos que possibilitassem imputar pela prática do crime de «tráfico de estupefacientes».
Na sequência da informação obtida junto do DM….. de Ermesinde - relatório social documentado a fls. 53 e 54 - apurou-se existir comportamentos estranhos e suspeitos do menor DN….., a partir do momento em que o mesmo enceta uma aproximação efectiva com o pai, o arguido AJ.........
Em face aos elementos colhidos, a investigação também passou a centrar-se no arguido X….., que dado aos seus antecedentes criminais, a conduta deste poderia ter eventualmente alguma «influência» a garantir a aludida actividade ilícita por parte do seu filho DN….. .
Assim sendo, na sequência destas notícias autorizaram-se vigilâncias aos arguidos AJ........, de alcunha «BP….», casado, nascido a 05-11-1963, filho de AK….. e de AL….., natural da Senhora da Hora - Matosinhos, titular do B.I. n.º 9306….. e sua companheira, a arguida AM........, casada, nascida a 14-06-1969, filha de NA….. e de AO….., natural de Real - Amarante, ambos residentes no ….. - …., …. – Penafiel.
Assim, o inquérito iniciou-se com intercepções telefónicas ao número 915 93 ……, do qual foi atribuído o código 42165M e, 915 92 … sobre o qual foi atribuído o código 2A530M.
E as conversas telefónicas sobre a venda de produtos estupefacientes por parte daqueles arguidos, o casal, AJ….. e AM........, iniciam a 24-02-2010 (cf. fls. 81 do I Vol) e 15-03-2010 (cfr. fls. 166 do I vol.)
E é na decorrência da operação de intercepções telefónicas aos aparelhos telefónicos destes arguidos que a investigação da actividade criminosa em causa nos autos - tráfico de estupefacientes - causa toda esta dispersão por toda zona do Vale de Sousa, das comarcas de Felgueiras, Lousada, Penafiel, Amarante, Marco de Canaveses, Penafiel etc.
Daí em diante, a investigação conduziu a rede, com várias fontes de «alimentação» específicas e concretas.
Por despacho de fls. 71 a 72 e com fundamento na ineficácia dos meios de prova anteriormente ordenados (recolha de imagens cfr. fls. 25 e ss) por força dos cuidados que os visados passaram a adoptar, considerou-se que se impunha redirecionar a investigação e com os fundamentos aí constantes (nomeadamente, com referência expressa ao princípio da reserva da vida privada, proporcionalidade) determinou-se a intercepção aos telemóveis 915 93 …., 916 67…. e 913 12…. .
Considerou-se que as «As diligências promovidas de acordo com o estado actual da investigação, são indispensáveis para a descoberta da verdade e essenciais para a recolha de meios de prova atenta a natureza do crime indiciado.
Assim, em face da investigação já levada a cabo, entende o titular da acção penal (Ministério Publico) ser essencial a intercepção telefónica das conversações efectuadas através dos cartões telefónicos identificados a fls. 68-b)».
O despacho que autoriza as intercepções além de fundamentado, quer de facto quer de direito, estriba-se em todos os elementos ou requisitos supra referidos:
- Foi respeitado o crime de catálogo - Tráfico de estupefacientes, que desde logo referido no art.º 187º, n.º 1, al. a) e e), do CPP, que é considerado pelo legislador de «criminalidade altamente organizada» - cfr. art.º 1º, al. m) do CPP.
- Positivou-se o «juízo de proporcionalidade» também contido no art. 18º da CRP) (aliás com referência expressa a esse dispositivo constitucional);
- Fundamentou-se também e embora se estivesse numa fase inicial da investigação, em «uma forma relativamente qualificada de suspeita da prática do crime» (ver a referência a «razões» do art. 187º n.º l CPP), suspeita que terá «de atingir um determinado nível de concretização a partir de dados do acontecer exterior ou da vida psíquica»;
- E considerou-se que as escutas telefónicas estão subordinadas ao princípio da subsidiariedade, no sentido de, em princípio não haver outro meio eficaz, menos gravoso, para alcançar o resultado probatório em vista, e que as mesmas eram «'indispensável para a descoberta da verdade ou que a prova seria, de outra forma, impossível ou muito difícil de obter», atenta a natureza do crime. Note-se que se trata de crime de tráfico de estupefacientes em que, por via de regra, e conforme se logrou apurar no decurso da investigação, os seus autores utilizam de todos os meios para se furtarem às instâncias formais de controlo, nomeadamente com troca sistemática de telemóveis, de cartões, uso de linguagem codificada e outros artifícios, nomeadamente o esconder o produto estupefaciente fora das residências, por forma a não serem detidos com produto estupefaciente. Assim e neste tipo de criminalidade, grande parte da investigação, passa necessariamente, pelas intercepções telefónicas, sob pena de se frustrar o combate á criminalidade deste tipo, com todos os efeitos nocivos, sobejamente conhecidos associados a este tipo de crime.
Neste tipo de «criminalidade altamente organizada» (cfr. art.º 1º, al. m), do CPP), ê conhecida a dificuldade de obtenção de elementos de prova da sua prática bem como a dificuldade em se apurar o grau de responsabilidade dos seus autores.
Acresce que o juízo prévio de ponderação dos interesses em conflito baseia-se na existência de suspeitas bastantes que justifiquem a utilidade e necessidade da intercepção telefónica, suspeitas essas que não equivalem ã existência de «fortes indícios» (antes é, através da intercepção telefónica, que se vai tentar recolher indícios dos factos que, por outra via, não são ou dificilmente seriam alcançáveis).
Com efeito, quando o art. 187º, n.º l, do CPP condiciona a autorização das escutas telefónicas ao requisito «se houver razões para crer que a diligência é indispensável para a descoberta da verdade ou que a prova seria, de outra forma, impossível ou muito difícil de obter», há que ter em atenção o momento em que é pedida a intercepção telefónica, pois que, ocorrendo tal pedido na fase inicial do processo de investigação, não se pode fazer corresponder à existência de suspeitas «um grau de exigência equiparável aos fortes indícios» (cfr., neste sentido, o Acórdão do T.R.C, de 25.10.06, in www.dgsi.pt).
Pelo exposto e sem necessidade de maiores considerações, por respeitados todos os requisitos substantivos previstos no art.º 187º, n° l, do CPP, julgo válidas as intercepções telefónicas aos telemóveis 915 93 …., 916 67 …. e 913 12 …. e consequentemente, todas as restantes intercepções, porque também respeitados os pressupostos legais e não se verifica qualquer nulidade derivada ou consequencial (efeito à distância ou doutrina dos frutos da arvore envenenada - fruit of poisnuos tree: que não se verifica).

Da invocada nulidade das intercepções telefónicas por violação do disposto no art.º 190º do CPP.
Os arguidos invocaram, ainda, que a M.ª JIC validou as intercepções telefónicas através do recurso a «súmulas».
Nesta parte, desde já, cumpre dizer que, conforme se alcança dos despachos validar as intercepções telefónicas, a M.ª JIC procedeu á sua validação após se inteirar do conteúdo das mesmas, sendo certo que, conforme se alcança de fls. 1940, não se procedeu á validação de intercepções e consequente ordem de transcrição.
Pelo exposto, constata-se que existiu um controlo efectivo de todas as intercepções telefónicas por parte da M.ª JIC, que aliás, se constata de sessões em que verificou que terá havido fuga de informação e face a esse conteúdo mandou extrair certidão para efeitos de abertura de inquérito. Assim, não é lícito aos arguidos argumentarem que a validação das intercepções se tenha operado com base em súmulas, pelo que, também, improcede a nulidade invocada.

Da nulidade dos despachos de fls. 153 e 193 relativo à intercepção ao n.º 913 880 984.
Mais argumentaram os arguidos que a decisão de autorizar as escutas telefónicas, para a salvaguarda do direito à reserva devida, imagem e dignidade, é proferida nos termos do preceituado no art. 187º, n.º l do CPP. No seu n.º 4 vem prevista a possibilidade de proceder de igual modo relativamente a quem seja suspeito de actividade delituosa.
Como melhor se percebe com a leitura do artigo, exige-se que existam suspeitas sobre determinada pessoa já identificada nos autos enquanto tal.
Esta exigência legal impede que as escutas telefónicas sejam feitas de forma indiscriminada e em atropelo dos direitos constitucionais referidos.
Refere a acusação pública que o arguido T........, utilizava o n.º de telemóvel 913 88 …. .
A fls. 178 o OPC, não se referindo ao arguido e sem saber de quem se trata, apenas alega que poderá ser o presumível fornecedor de estupefaciente. Informa que este número 913 88 …. poderá ser utilizado pelo presumível fornecedor de um outro suspeito.
Isto para além do n.º 914 32 …. sobre o qual havia já sido proferido despacho a fls. 158, a autorizar as escutas telefónicas.
Concluem que sobre o n.º de telemóvel não se sabia a quem o mesmo pertencia e que o arguido T........, á data, ainda nem sequer era suspeito ou tão pouco estava identificado. Também quanto a este número de telefone se verifica a mesma omissão.
No que respeita a tal matéria, dispõe o art.º 187º, n.º 4, do CPP que: A intercepção e a gravação previstas nos números anteriores só podem ser autorizadas, independentemente da titularidade do meio de comunicação utilizado, contra:
a) Suspeito ou arguido;
b) Pessoa que sirva de intermediário, relativamente à qual haja fundadas razões para crer que recebe ou transmite mensagens destinadas ou provenientes de suspeito ou arguido; ou
c) Vítima de crime, mediante o respectivo consentimento, efectivo ou presumido.
No despacho de fls. 194 e 195, devidamente fundamentado, e consignou-se que «decorrente das intercepções telefónicas realizadas pela entidade investigante que o (ou um dos) fornecedores de produto estupefaciente do suspeito AJ........, além do cartão 914 32 …. utiliza igualmente o cartão 913 88 …..»
Foi então, com o referido fundamento, determinada a intercepção ao n.º 913 88 …. .
A lei refere não apenas suspeito, mas também pessoa que sirva de intermediário, relativamente à qual haja fundadas razões para crer que recebe ou transmite mensagens destinadas ou provenientes de suspeito ou arguido.
Efectivamente, aquando da autorização da intercepção telefónica desconhecia-se a identidade de um potencial fornecedor de estupefaciente do suspeito AJ......... Esse, obviamente foi o motivo pelo qual se autorizou a intercepção telefónica, porquanto visava-se apurar não só a sua identidade mas também os concretos contornos do fornecimento de estupefaciente, sendo aliás um dos objectivos das intercepções telefónicas a recolha de prova.
Pelo exposto, improcede também a invocada nulidade, por violação do disposto no art.º 187º, n.º 4, do CPP.

Da captação de imagem: nulidade.
Invocaram igualmente os arguidos que existem nos autos fotografias de locais e pessoas recolhidas no âmbito da investigação. Veja-se nomeadamente a fls. 433 e 3760.
Concluem que para que sejam validadas as fotografias deve assim ser proferido despacho fundamentado, sob pena de nulidade – art.º 190º do CPP.
Verifica-se urna tomada de conhecimento nos autos - cfr. por exemplo despacho de fls. 460 mas sem que seja proferido o competente despacho fundamentado. São por isso prova nula.
Apreciemos.
A recolha de imagem teve inicialmente lugar por despacho fundamentado constante de fls. 25 e ss.
A fls. 433 e ss e a fls. 3760 e ss contam imagens de pessoas em locais públicos.
Assim e independentemente de despacho judicial, tais imagens, porque recolhidas em locais públicos, e porque não implicam a devassa da vida privada, são processualmente válidas e têm força probatória, contrariamente ao invocado pelos arguidos.
Assim e quanto á invocada nulidade da recolha de imagens, os arguidos fundamentam no disposto nos art.º 188º, 190º do CPP. Fundamentam que a recolha de imagens não foram autorizadas por despacho fundamentado e como tal estão feridas de nulidade.
A prova através de fotografias (e de outros documentos designados na lei por «reproduções mecânicas») vem regulada no art. 167º CPP, ai se estabelecendo que as mesmas valem como prova dos factos ou coisas reproduzidas «se não forem ilícitas nos termos da lei penal». E o n.º 2 explicita que não se consideram ilícitas, entre outras, as reproduções mecânicas que obedecerem ao disposto nos artigos 171º a 190º, que regulamentam os «meios de obtenção da prova».
Assim, a ideia geral sobre a validade das fotografias como meio de prova, é a seguinte: (i) valem como meio de prova se não forem penalmente ilícitas e (ii) não são ilícitas se forem obtidas através do procedimento previsto nos artigos 171º a 190º do C. P. Penal.
Vejamos então se a obtenção de fotografias pelos órgãos de polícia criminal, no âmbito da investigação criminal, pode ser lícita e, consequentemente, valer como meio de prova.
Se a fotografia foi obtida pelos órgãos de polícia criminal, no âmbito das suas funções, através da devassa da vida privada, configura prova nula, nos termos do art.º 126º, n.º 3 do C.P.Penal, a não ser que a lei especial expressamente preveja essa possibilidade. Antes da Lei 5/2005, de 11 de Janeiro, tal não estava especialmente previsto e, portanto, tal prova seria, em princípio, nula. Dizemos em princípio, pois mesmo nesta hipótese poderia ser admissível a validade da prova - cfr. sobre a questão o Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 263/97, de 19/3/97, onde se defende uma ponderação de interesses, com o fundamento de que a protecção do direito à vida privada não pode intoleravelmente limitar outros direitos. Porém, no caso dos autos, as fotografias foram obtidas num local público e sem qualquer intenção de devassa da vida privada, pelo que não é aplicável este regime.
Se a fotografia foi obtida no âmbito do processo criminal e não implica a devassa da vida privada, a mesma será lícita, desde que obtida no âmbito da recolha de meios de prova previstos nos artigos 171º e seguintes e se observe o regime aí previsto (art. 167º do CPP) - cfr neste sentido SIMAS SANTOS E LEAL HENRIQUES, Código de Processo Penal anotado, pg. 858, anotação ao art. 167º: haverá exclusão da ilicitude quando os meios mecânicos referidos no art. 167º do CPP não sejam «(...) senão o natural resultado de actos e diligências levadas a cabo no âmbito do CPP, com vista à perseguição da verdade material, portanto verdadeiros actos de investigação criminal».
Nos termos do art. 171º do C.P.Penal, os órgãos de polícia criminal podem proceder a exames a pessoas, lugares e coisas, inspecionando os vestígios que o crime possa ter deixado. Cabe neste tipo de recolha de prova a observação directa, acompanhada de relatórios e fotografias de coisas e pessoas. Dado que o art. 171º do C.P.Penal não exige qualquer autorização especial, quer da pessoa visada, quer das autoridades judiciárias, qualquer órgão de polícia criminal pode obter fotografias para documentar o exame. Neste caso, a obtenção da fotografia é lícita, embora só seja possível se não implicar devassa da vida privada.
Veja-se a título exemplificativo acórdãos da Relação de Coimbra, de 22 de Janeiro de 2002, in CJ, I, pg. 40, de 23 de Abril de 2002, in CJ, II, pág. 43, da Relação do Porto de 21 de Dezembro de 2004 e de 27 de Abril de 2005 (este proferido no processo 414638) que versaram sobre o registo de imagem na actividade de tráfico de estupefacientes, desenvolvida ao ar livre, não consiste, na intromissão na vida privada, nem está dependente da prévia autorização do juiz.
Ora, no caso dos autos, está provado que as fotografias dos arguidos foram obtidas pelos órgãos de polícia criminal (agentes da GNR[46]) no âmbito de uma investigação criminal com a finalidade de documentar a prática do crime de tráfico de estupefacientes, num local público, não tendo implicado devassa da vida privada.
Pelo exposto, improcede, igualmente, a invocada nulidade de captação de imagens invocada pelos arguidos.

Da nulidade das intercepções telefónicas como meio de prova invocada pelo arguido Q........ e N.........
Em sede de RAI, os arguidos Q........ e N........, vieram, além do mais, invocar que estavam com os seus telefones sob escuta, escutas essas, que, com toda a certeza eram acompanhadas em tempo real, sendo que não resulta a comprovação de qualquer escuta telefónica aos arguidos, não se verifica na sequência da escuta qualquer encontro, qualquer entrega ou troca. Aliás face ao teor das intercepções telefónicas, deveria ter sido efectuada uma vigilância cerrada aos arguidos de modo a corroborar o seu teor no terreno, no entanto não existe nos autos qualquer elemento que corrobore o teor quer das intercepções telefónicas, quer do real teor das mesmas em relação ao arguido e demais intervenientes. Conclui que como é consabido na nossa jurisprudência as escutas telefónicas sem qualquer elemento que as corrobore no terreno são nulas como meio de prova.
As escutas telefónicas são um meio de obtenção de prova e necessitam de corroboração por qualquer outro elemento de prova para poderem ser utilizadas como tal. As intercepções telefónicas só podem ser valoradas como meio de prova, caso, nos autos, existam outros elementos que permitam suportar e confirmar as mesmas, de modo a poder-se aferir, com toda a certeza, da sua veracidade, não revestindo um grau de credibilidade suficiente que por si só permita a condenação de um arguido, (aqui e desde já apraz-nos dizer o seguinte: note-se que, estamos apenas numa fase em que não se exige a certeza do cometimento do crime, mas apenas da existência de indícios suficientes que o crime tenha sido cometido, não se exigindo para a pronúncia como para a condenação o grau de comprovação categórica da verificação dos factos.
Apreciemos.
As escutas telefónicas não constituem, como é sabido, meios de prova em sentido próprio, mas um dos meios de obtenção de prova, distinguindo-se as categorias, separadamente previstas na lei (Título II, artigos 128 a 170, «Dos meios de prova» e Titulo III, artigos 171 a 190, «Dos meios de obtenção da prova», do Livro III do CPP), por vários elementos.
Esta divisão sistemática retira a sua justificação de um duplo fundamento: lógico e técnico-processual. No tocante ao primeiro, os chamados meios de prova «caracterizam-se pela capacidade de fornecer ao juiz resultados probatórios directamente utilizáveis em sede de decisão», enquanto os «meios de obtenção de prova não são de per si fontes de convencimento, mas tornam possível adquirir coisas materiais, vestígios ou declarações dotadas de aptidão probatória». No plano técnico-processual, «os meios de obtenção de prova caracterizam-se igualmente pelo facto de, dirigindo-se a fazer entrar no processo elementos que preexistem à investigação judiciária, assentam no factor surpresa», pelo que, «nestes casos a prova é preconstituída» (cfr. «Relazione» do Projecto de 1978 do CPP italiano, apud Alberto Medina de Seiça, Legalidade da prova e reconhecimentos «atípicos» em processo penal, in Líber discipulorum para Jorge de Figueiredo Dias, 2003, pág. 1406, nota (50).
Não constituindo as escutas telefónicas, no sentido técnico, meios de prova, através exclusivamente do conteúdo de uma conversação escutada, e sem a concorrência dos adequados meios de prova sobre os factos, não se poderá considerar directamente provado um determinado facto, que não seja a mera existência e o conteúdo da própria conversação. Mesmo considerando que a escuta se transforma em meio de prova (documental) através da documentação em suporte fonográfico ou em transcrição, tal afirmação tem de ser tomada pelo seu valor facial e nos seus precisos termos, sem extrapolações de regime probatório material, já que a documentação da escuta não será mais do que a cristalização em suporte do simples conteúdo da comunicação escutada ou interceptada; nada lhe acrescentando, permite a prova directa - mas só - de que uma comunicação existiu, a certa hora, e que teve um determinado conteúdo.
Os intervenientes nessa comunicação verbal exprimem-se através da voz, associada à fala, que varia de indivíduo para indivíduo, dependente como está de factores orgânicos (tamanho das cavidades oral, nasal, configurações do trato vocal, dimensão, proporção, comprimento, massa e tensão das pregas vocais) e funcionais (a maneira como cada indivíduo utiliza e manipula esse conjunto de recursos estruturais durante a fala). Daí que a voz seja um elemento de identificação de pessoas.
Façamos mais algumas notas quanto à problemática das escutas telefónicas, designadamente quanto ao seu valor enquanto meio de prova e ao modo como devem ser examinadas.
Como resulta do disposto no art. 188/9, só podem valer como prova as conversações - ou comunicações - transcritas para auto.
Perante isto, há quem sustente que a transcrição assume a natureza de meio de documentação das conversações relevantes para a prova. Mais do que isso, as conversações escutadas só poderiam valer como meio de prova se as respectivas transcrições estivessem juntas aos autos e tivessem sido feitas pelo OPC - a mando do MP ou do JIC -, pelo arguido ou pelo assistente (n,º 9). É este o entendimento de Carlos Adérito Teixeira («Escutas Telefónicas: a mudança de paradigma e os velhos e os novos problemas», Revista do CEJ, n.º 9, p. 264), para quem é possível sustentar, com base em dois indícios, extraídos da letra da lei, que a prova é a transcrição, enquanto documentação das conversas gravadas, qualquer que seja o sujeito processual a operá-la. Primeiro, porque parece ser esse o sentido da expressão do n.º 9 do art. 188: «só podem valer como prova as conversações (...)», reportando-se o termo «só» ao objecto (conversações transcritas) e não aos sujeitos. Segundo, porque nesse sentido parece igualmente apontar o n.º 12, quando determina a conservação, para posterior destruição, dos suportes técnicos cujas «conversações ou comunicações não forem transcritas para servirem como meio de prova.»
Deste modo, apenas as conversas transcritas poderiam ser utilizadas para fundamentar decisões, e não já todo o conteúdo dos suportes técnicos - que se tornariam, assim, mero instrumento técnico apto a permitir a obtenção do meio de prova, a conversação documentada.
Em sentido oposto, Benjamim Silva Rodrigues (Das Escutas Telefónicas. A Monotorização dos Fluxos Informacionais e Comunicacionais, I, 2.a ed., Coimbra: Coimbra Editora, 2008, pgs. 414 - 415) afirma que a validade probatória está nas gravações originais em si mesmas, na audição da palavra falada gravada no suporte de armazenamento electrónico-digital, aparecendo essas palavras sob a forma digital, deveria, segundo o autor, ser essa prova digital o verdadeiro elemento probatório, e não a transcrição documental das gravações, atendendo a que só a audição directa permite que o juiz de julgamento possa aceder a elementos de convicção relevantes como são a similitude das vozes, o acento e os giros linguísticos do investigado, o seu estado de ânimo e entoação, etc., algo que a mera leitura da transcrição seria incapaz de alcançar. Para este autor, a prova obtida mediante intervenção telefónica nas comunicações surgiria como uma prova antecipada, necessitando de uma «legitimação» através da sua audição na audiência de julgamento, até para, desse modo, se realizarem os princípios da imediação, oralidade e contraditório, vigentes no direito processual penal português.
Esta posição é de rejeitar.
É inegável que a re-audição da palavra gravada tem vantagens para uma apurada valoração probatória das escutas. Tal não é, todavia, imprescindível para que as conversações obtenham valor probatório. Nesse sentido, tem-se orientado o STJ como se pode constatar através dos acórdãos de 17.10.2002 (www.dgsi.pt, processo n.º 02P2815), 20.11.2002 (processo n.º 3173/02 – 3ª, Sumários de Acórdãos das Secções Criminais, Edição anual de 2002, p. 340), 4.06.2003 www.dgsi.pt, processo n.º 03P519), 31.05.2006 (www.dgsi.pt., processo n.º 06P1412) e 15.02.2007 (www.dgsi.pt, processo n.º 06P4092), os quais consideraram que as escutas telefónicas, uma vez transcritas em auto, passam a constituir prova documental, valendo em julgamento, nomeadamente para o efeito e formação da convicção do tribunal, independentemente de serem ou não lidos em audiência.
No citado aresto de 4.06.2003 escreveu-se que «[o]s registos magnéticos das conversas telefónicas não têm de ser mostrados ou examinados em audiência de julgamento. Na medida em que as conversações telefónicas foram transcritas, constituem prova documental. A leitura efectiva dos documentos em audiência não é obrigatória, para efeitos do cumprimento do estabelecido no art. 355/1, bastando a junção aos autos com a inerente possibilidade de leitura».
De facto, lê-se no aresto de 15.02.2007, a exigência do art. 355 prende-se apenas com a necessidade de evitar que concorram para a formação daquela convicção provas que não tenham sido apresentadas e feitas juntar ao processo pelos intervenientes, com respeito pelo princípio do contraditório, e não que tenham de ser reproduzidas na audiência, isto é, lidas ou apresentadas formalmente aos sujeitos processuais todas as provas documentais dele constantes. Basta que existam no processo, com pleno conhecimento dos sujeitos processuais, que puderam inteirar-se da sua natureza, da sua importância e do seu conteúdo, bem como do seu valor probatório, para que qualquer desses sujeitos possa, em audiência, requerer o que se lhe afigurar sobre elas, examiná-las, contraditá-las e realçar o que, do seu ponto de vista, valem em termos probatórios. Neste sentido, tais provas são examinadas em audiência, sob a presidência dos princípios da imediação e do contraditório, podendo concorrer sem reservas para a convicção do tribunal.
Aliás, de acordo com o preceituado no art. 340/1 e 2 do CPP, o tribunal ordena, oficiosamente ou sob requerimento, a produção de todos os meios de prova cujo conhecimento se lhe afigurar necessário à descoberta da verdade e à boa decisão da causa, e se considerar necessária a produção de meios de prova não constantes da acusação, da pronúncia ou da contestação, dá disso conhecimento, com a antecedência possível, aos sujeitos processuais e fá-lo constar da acta. Isto, exactamente porque, nos termos do referido art. 355, só podem valer para a formação da convicção do tribunal as provas produzidas ou examinadas em audiência.
Ora, se as provas, nomeadamente as provas documentais, já constam do processo, tendo sido juntas ou indicadas por qualquer dos sujeitos processuais e tendo os outros sujeitos delas tomado conhecimento, podendo examiná-las e exercer o direito do contraditório em relação a elas, não se vê razão para que elas tenham de ser obrigatoriamente lidas ou os sujeitos processuais obrigatoriamente confrontados com elas em julgamento para poderem concorrer para a formação da convicção do tribunal. O sujeito processual que assim o requeira pode sempre fazer examinar esta ou aquela prova, chamando a atenção para este ou aquele aspecto, ou pôr em causa de qualquer forma o seu valor e mesmo a sua validade. Daí que o princípio da produção da prova na audiência de julgamento, tal como decorre do art. 355 do CPP, se manifeste nestes casos, mesmo independentemente da sua concreta (re)produção ou da leitura do seu conteúdo em audiência, sendo essa leitura permitida (isto é, não proibida).
Assente isto, acrescentamos de seguida que não se nos afigura indispensável a criação de um meio de prova atípico - a isso exigiria o art. 125 -, a prova digital, quando é certo que o regime legal da prova documental introduz, no art. 167, um alargamento justamente com o propósito de acolher mecanismos como as reproduções fonográficas. Depois, não vislumbramos que existam razões suficientes para se dizer que o meio de prova é a palavra falada, só devendo valer a reprodução da conversação gravada e não já a sua transcrição escrita. Embora os princípios da imediação, da oralidade e do contraditório pleno o recomendassem, afigura-se-nos solução preferível, quanto mais não seja por imperativos de economia processual, subordinar a possibilidade de reprodução das gravações - e apenas das correspondentes às transcrições - ao impulso dos sujeitos processuais, assim como do próprio juiz, se a reputar útil para melhor formar a sua convicção (é o que parece resultar do n.º 10 do art. 188, e é o que resulta, em termos gerais, do n.º l do art. 340). Além de que, a defender-se o contrário, perder-se-ia parte da utilidade da função na transcrição das escutas, exigência que percorre todo o art. 188.
Concordamos, assim, com a leitura de Vinício Ribeiro (Código de Processo Penal - Notas e Comentários, Coimbra Editora, 2008, pgs. 394 - 395), também sufragada por Nuno Serrão de Faria («Acesso...», p. 217): a conversação gravada (se quisermos, a palavra falada) com potencialidade de se converter em prova - por impulso dos diversos sujeitos processuais, através da transcrição em documento é obtida por intercepção telefónica na fase de inquérito. Os suportes são o instrumento técnico que permite obter o meio de prova. A lei aponta para que a transcrição seja o meio de prova e a jurisprudência qualifica-a como prova documental, algo que a lei admite no art. 167. Para valer em julgamento, não tem que ser nessa sede reproduzida - nem lida sequer, visto o art. 356/1 e o entendimento do STJ -, embora deva poder sê-lo (ao abrigo do n.º 8 do art. 356), se os sujeitos processuais assim o desejarem - dando-se cumprimento ao princípio do contraditório -, ou o juiz de julgamento, ao abrigo do poder que os arts. 188/10 e 340/1 lhe conferem. Ainda neste sentido, pode citar-se Paulo Pinto de Albuquerque (Comentário do Código de Processo Penal, Lisboa: UCE, 2008, p. 891), sendo de acrescentar que o Tribunal Constitucional, no Acórdão n.º 87/99, de 10 de Fevereiro (DR, II Série, de 01.07.99), decidiu não considerar inconstitucional a norma do art. 355 do Código de Processo Penal, interpretada no sentido de que os documentos juntos aos autos não são de leitura obrigatória na audiência, considerando-se nesta produzidos e examinados, desde que se trate de caso em que a leitura não seja proibida.
Por outro lado, tem-se entendido na jurisprudência que, tendo a escuta telefónica sido realizada de modo legalmente válido, as gravações de conversas entre o arguido e uma testemunha são livremente apreciadas pelo tribunal mesmo que o arguido invoque o direito ao silêncio. Tal conclusão apoia-se no argumento de que as declarações do arguido e os registos fonográficos são meios de prova distintos. A proibição de valoração incide sobre o silêncio que o arguido adoptou como estratégia de defesa, mas não pode repercutir-se na demais prova legalmente produzida. Neste sentido, vide o Ac. da RC de 13.03.2002, CJ, XXVII, t. 2, pgs. 45 e ss., e o Ac. da RG de 19.05.2003, CJ, XXVIII, t. 3, pgs. 299 e ss.
Convém ainda dizer que a aquisição processual que a escuta permite não poderá, enquanto tal, na dimensão valorativa da prova penal em audiência (e logo, com menor exigência, na fase prévia de instrução, em que contrariamente á fase de julgamento, não se visa a obtenção da certeza dos factos, mas apenas a verificação de indícios ou suspeições de que o crime tenha sido cometido), ser considerada mais do que princípio de indicação ou de interacção com outros factos, permitindo, então, deduções ou interpretações conjugadas no plano autorizado pelas regras da experiência para afirmação da prova de um determinado facto. Os dados recolhidos na escuta, apenas por si mesmos, não podem constituir, nesta dimensão probatória, mais do que elementos da construção e intervenção das regras das presunções naturais como instrumentos metodológicos de aquisição da prova de um facto.
No entanto, o juízo de inferência a partir do teor de uma ou várias conversas telefónicas, mormente por via da consideração conjunta ou articulada destas, tem de conduzir uma linha de lógica argumentativa válida e racional face às regras da experiência.
Na verdade, a actividade probatória é constituída pelo complexo de actos que tendem a formar a convicção da entidade decidente sobre a existência, ou inexistência, de uma determinada situação factual.
Ultrapassada a fase histórica da plenitude da prova tarifada, é manifesto que, hoje, a convicção do julgador apenas terá de obedecer ao requisito de ser recondutível a critérios objectivos. Como se sabe, é clássica a distinção entre prova directa e prova indiciária. Aquela refere-se aos factos probandos, ao tema da prova, enquanto a prova indirecta ou indiciária se refere a factos diversos do tema da prova, mas que permitem, com o auxílio de regras da experiência, uma ilação quanto ao tema da prova.
Assim, se o facto probatório (meio de prova) se refere imediatamente ao facto probando fala-se de prova directa, se o mesmo se refere a outro, do qual se infere o facto probando, fala-se em prova indirecta ou indiciária. O indício não tem uma relação necessária com o facto probando, pois pode ter várias causas ou efeitos, e, por isso, o seu valor probatório ê extremamente variável. Na prova indiciária, mais do que em qualquer outra, intervém a inteligência e a lógica do juiz, ainda que em momentos distintos: Em primeiro lugar é a inteligência que associa o facto indício a uma máxima da experiência ou uma regra da ciência; em segundo lugar intervém a lógica através da qual, na valoração do facto, se outorga à inferência feita maior ou menor eficácia probatória.
A associação que a prova indiciária proporciona entre elementos objectivos e regras objectivas leva alguns autores a afirmar a sua superioridade perante outro tipo de provas, nomeadamente prova directa e testemunhal, pois que aqui também intervém um elemento que ultrapassa a racionalidade e que será muito mais perigoso de determinar, como é o caso da credibilidade do testemunho.
Como refere Marieta (apud Ac. do STJ de 3.12.2009, www.dgsi.pt, processo n.º 187/09.7YREVR.SI), são dois os elementos da prova indiciária:
Em primeiro lugar o indício que será todo o facto certo e provado com virtualidade para dar conhecer outro facto que com ele está relacionado. O indício constitui a premissa menor do silogismo que, associado a um princípio empírico ou a uma regra da experiência, vai permitir alcançar uma convicção sobre o facto a provar. Este elemento de prova requer em primeiro lugar que o indício esteja plenamente demonstrado, nomeadamente através de prova directa (v. g. prova testemunhal no sentido de que o arguido detinha em seu poder objecto furtado ou no sentido de que no local foi deixado um rasto de travagem de dezenas de metros). O que não se pode admitir é que a demonstração do facto indício que é a base da inferência seja também ele feito através de prova indiciária atenta a insegurança que tal provocaria.
Em segundo lugar é necessária a existência da presunção que é a inferência que obtida do indício permite demonstrar um facto distinto. A presunção é a conclusão do silogismo construído sobre uma premissa maior: a lei baseada na experiência; na ciência ou no sentido comum que apoiada no indício - premissa menor - permite a conclusão sobre o facto a demonstrar.
A inferência realizada deve apoiar-se numa lei geral e constante e permite passar do estado de ignorância sobre a existência de um facto para a certeza, ultrapassando os estados de dúvida e probabilidade.
A prova indiciária realizar-se-á para tanto através de três operações.
Em primeiro lugar a demonstração do facto base ou indício que, num segundo momento faz despoletar no raciocínio do julgador uma regra da experiência ou da ciência que permite, num terceiro momento, inferir outro facto que será o facto sob julgamento.
A lógica tratará de explicar o correcto da inferência e será a mesma que outorgar à prova capacidade de convicção.
Não faz a nossa lei processual penal qualquer referência a requisitos especiais em sede de demonstração dos requisitos da prova indiciária.
O funcionamento e creditação desta depende da convicção do julgador que, sendo uma convicção pessoal, deverá ser sempre objectivável e motivável.
O juízo sobre a valoração da prova tem vários níveis. Num primeiro aspecto trata-se da credibilidade que merecem ao tribunal os meios de prova e depende substancialmente da imediação e aqui intervém elementos não racionais explicáveis. Num segundo nível inerente á valoração da prova intervêm as deduções e induções que o julgador realiza a partir dos factos probatórios e, agora já as inferências não dependem substancialmente da imediação, mas hão-de basear-se na correcção do raciocínio que há-de fundamentar-se nas regras da lógica, princípio da experiência e conhecimentos científicos, tudo se podendo englobar na expressão regras da experiência.
O facto de também relativamente à prova indirecta funcionar a regra da livre convicção não quer dizer que na prática não se definam regras que, de forma alguma se poderão confundir com a tarifação da prova. Assim, os indícios devem ser sujeitos a uma constante verificação que incida não só sobre a sua demonstração como também sobre a capacidade de fundamentar uma lógica dedutiva; devem ser independentes e concordantes entre si.
Se a ilação não puder estar contida no procedimento lógico de uma presunção, será, então, porventura, caso de erro notório na apreciação da prova, por manipulação arbitrária das regras das presunções.
A exposição que antecede serve a compreensão das particulares «limitações» da prova integrada pelo teor de conversações telefónicas e a regras a que obedecem os juízos de inferência, na medida em que se julga que dela ressaltará a, adiante-se, proficiência das escutas cuja valoração é admitida para fundar as imputações feitas, mormente pela conjugação entre elas.
Note-se que a análise que o Tribunal fez das escutas telefónicas incidiu sobre dois aspectos que se interligam: o conteúdo das conversações propriamente dito e o seu contexto (na verdade, amiúde existem várias sessões que se interligam por dizerem respeito ao mesmo episódio ou assunto e que assim permitem melhor interpretá-las). É aliás por isso que não se deve analisar isoladamente cada sessão (pois dessa forma é mais difícil apreender o sentido e o alcance de cada conversação), mas antes compreendê-las no contexto em que se inserem, conjugadas também com os outros elementos de prova produzidos, bem como com as regras da experiência comum, reportada ao mundo da traficância, a que o Tribunal aliás já está habituado em virtude da experiência profissional do respectivo colectivo de juízes.
No caso, desde já adiantamos que, na esmagadora maioria das sessões transcritas, os respectivos intervenientes utilizaram uma linguagem que é facilmente decifrável por quem tenha o mínimo conhecimento da matéria em causa. Expressões como «clarão», «branca», «vinho branco», «dia», «castanha», «escura», «vinho tinto», «fichas», «metro», «cartucho» não são mais que formas corriqueiras de aludir a produtos estupefacientes, dinheiro, balança ou objecto de acondicionamento de estupefaciente. Nenhuma outra explicação, plausível ou não, foi avançada para o que foi dito em tais sessões, pelo que temos de nos bastar, na interpretação delas, com aquilo que resulta da nossa experiência e conhecimento, somada aos que resultou das apreensões efectuadas a alguns dos arguidos, bem como da confirmação por parte de alguns arguidos que confirmaram, além de serem os interlocutores nas intercepções, telefonaram para co-arguidos, solicitando-lhe a entrega de estupefaciente (cfr. fls. 2883 e ss, 2967 e ss, 2978 e ss, 2949 e ss 2918 e ss).
Algumas sessões permitem-nos concluir que os sujeitos que nelas intervieram detinham estupefacientes e os transacionaram. Noutras, existem apenas conversas no sentido de serem transaccionados estupefacientes, não havendo depois qualquer elemento que permita concluir que assim aconteceu, o que torna frágil o indício, que, visto o contexto global, passa a ser mero elemento de que determinado sujeito se dedicava a actividade de tráfico de estupefacientes. Mas este é o preço a pagar por uma investigação que assenta, quase em exclusivo, em intercepções telefónicas.
Assim e em conclusão, contrariamente ao sufragado pelos arguidos, entendemos que, por uma lado, as intercepções telefónicas realizadas nos presentes autos não são nulas, como são um meio de prova legalmente admissível, permitindo ao julgador, de acordo com as regras da experiência comum e de forma fundamentada e motivada, concluir que os arguidos terão agido conforme referem no teor dessas mesmas intercepções e cuias transcrições constam dos autos.
Acresce que a convicção do Tribunal tanto pode assentar em prova directa do facto (in casu o que resulta do teor de todas as transcrições), como em prova indiciária da qual se infere o facto probando. Assim e desde logo é legítimo o recurso a presunções naturais ou simples, uma vez que são admissíveis em processo penal as provas que não forem proibidas por lei (artº 125º do CPP) e o art.º 349º do CC prescreve que as presunções são as ilações que a lei ou o julgador tira de um facto conhecido (no caso o que decorre das transcrições efectuadas nos autos) para afirmar um facto desconhecido, sendo admissíveis as presunções judiciais nos casos e nos termos em que é admitida a prova testemunhal (cfr. artº 351º do CC).
As presunções simples ou naturais são simples meios de convicção, pois que se encontram na base de um qualquer juízo. O sistema probatório alicerça-se em grande parte no raciocínio indutivo de um facto conhecido para um facto desconhecido; toda a prova indirecta se faz valer através desta espécie de presunções. Conquanto nem sempre resulte explicita a sua intervenção na formação da convicção do julgador, constituem um importante mecanismo que pode levar o tribunal a afirmar a verificação de um certo facto controvertido, suprindo as lacunas de conhecimento ou de informação que não possam ser preenchidas por outros meios de prova.
Assim e concluindo, o teor de transcrições das intercepções telefónicas constantes dos autos, isoladamente consideradas, permite-nos, de acordo com as regras da experiência comum, neste momento inferir que os arguidos, que infra serão pronunciados, terão agido conforme relataram em sede de conversas telefónicas e cujas transcrições constam dos autos.

Que dizer do despacho transcrito?
Apenas, e repetindo, que é daqueles despachos que “legitimam” a função judicial pela profundidade da fundamentação e pela sua potencialidade para convencer.
Apesar disso, os arguidos ainda não estão – e nunca ficarão – convencidos da bondade da decisão.
Porque entendem que não se devem deixar convencer.
Sem qualquer reserva o subscrevemos até porque, fácil é de ver, a fundamentação coincide inteiramente com o nosso entendimento sobre as escutas telefónicas expresso na alínea E) deste acórdão.
Tendo o despacho do Sr. Juiz de Instrução demonstrado, sem margem para dúvidas, com base em realidade factual, assente na correcta interpretação das disposições legais aplicáveis, que as escutas telefónicas foram autorizadas pelo JIC, em inteiro respeito pelos pressupostos processuais e pelo requisito material, e foram por ele controladas, resta concluir que as mesmas são inteiramente válidas e, por isso, podem ser usadas como prova.
De resto, conquanto seja discutível que o despacho do Sr. JIC esteja a coberto do chamado caso julgado atendendo a que, se viesse a considerar-se as escutas nulas, estaríamos perante prova proibida da qual sempre se poderia tomar conhecimento, a verdade é que nenhum argumento novo os arguidos carrearam aos autos para tentar demonstrar essa nulidade.
Que, em verdade, não se verifica.

Resta acrescentar, fazendo afirmação categórica, que as escutas, transcritas em auto, só por si, de acordo com o princípio da livre apreciação da prova, poderão ser suficientes para condenar os arguidos.
Escreveu-se em recente acórdão desta Relação[47]:
“Uma prévia distinção importa fazer entre a escuta telefónica, enquanto meio de obtenção de prova e as conversações/gravações naquela recolhidas, a assumirem, estas sim, natureza de verdadeiro meio de prova. (…)
Socorrendo-se o Tribunal das gravações transcritas, usou um meio legal de prova?
Em sede de motivação dos diversos recursos, em momento algum é posta em causa a legalidade do meio de obtenção de prova, enquanto tal.
Verdade, todavia, que se não vem posta em causa a legalidade do meio de obtenção de prova, vem, de todo o modo, a várias vozes, questionado o modo processual da préconstituição probatória.
Nomeadamente, se bem se interpreta, vem posto causa o papel desempenhado pelo órgão de polícia criminal enquanto efectua a transcrição da gravação e, assim, na justa medida em que não se limita a transcrever o que (objectivamente) ouve mas, indo mais longe – incarnando, deste modo, um papel de tradutore/traditore, se bem se interpreta o pensamento dos recorrentes – identifica a voz de quem fala (aqui, com a inerente carga subjectiva).
Daqui, num salto breve, passa-se para a ideia da indispensabilidade do exame pericial, tanto que se chega a sugerir «a ineficácia para efeitos de prova dos autos de transcrição desacompanhados de perícia às vozes escutadas e interceptadas».
Sem prejuízo do acerto que se reconhece à resposta dada pelo colégio dos Juízes, a este propósito, no momento da motivação da decisão de facto – resposta a que voltaremos – importa em traços breves fundamentar, hic et nunc, a ideia de que não estando ao tribunal vedado o recurso à prova pericial também não lhe era impreterivelmente exigível, sob pena de perda de eficácia de prova, a realização da sugerida perícia.
Atentemos, a propósito, no regime definido na lei penal adjetiva a propósito das «formalidades das operações» [Artigo 188º CPP].
Autorizada a intercepção e a gravação de conversações ou comunicações telefónicas, pelo juiz de instrução, o órgão de polícia criminal (OPC) que àquelas tenha procedido «lavra o correspondente auto e elabora relatório no qual indica as passagens relevantes para a prova, descreve de modo sucinto o respectivo conteúdo e explica o seu alcance para a descoberta da verdade» (Item 1).
De 15 em 15 dias, a partir do início da 1ª intercepção, o mesmo OPC leva ao conhecimento do Mº Pº «os correspondentes suportes técnicos, bem como os respectivos autos e relatórios», Mº Pº que, de sua vez, dá deles conhecimento ao Juiz de Instrução (Item 3).
Este, uma vez «inteirado do conteúdo das conversações ou comunicações» - para o que, entendendo-o conveniente, é coadjuvado pelo OPC e entendendo-o necessário, por um intérprete - «determina a destruição imediata dos suportes técnicos e relatórios manifestamente estranhos ao processo» (Item 6).
A partir daqui relevam com especial interesse os itens 8, 9 e 11.
Dizer, nos limitados termos que importa considerar à luz dos desenhados recursos, «só podem valer como prova as conversações ou comunicações que:
a) O Mº Pº mandar transcrever ao órgão de polícia criminal que tiver efectuado a intercepção e a gravação e indicar como meio de prova na acusação;
b) O arguido transcrever a partir das cópias previstas no número anterior e juntar ao requerimento de abertura da instrução ou à contestação»;
Assumindo um mui particular significado, importa realçar que, independentemente do proveito que o arguido, no exercício do seu direito de defesa, possa retirar, uma vez findo o inquérito, através do recurso às suas transcrições, sobra-lhe, ainda, toda a oportunidade de um pleno e redobrado exercício do contraditório até ao encerramento da audiência de julgamento.
Dizer, então. A partir do encerramento do inquérito, a lei faculta-lhe: (i) o acesso directo/imediato aos suportes técnicos [«o arguido pode examinar os suportes técnicos das conversações ou comunicações» Sic]; (ii) como assim, faculta - lhe a obtenção de cópia das partes que pretenda transcrever para juntar ao processo até ao termo dos prazos previstos para requerer a abertura da instrução ou apresentar a contestação; (iii) como, finalmente, faculta-lhe que, na própria audiência de julgamento, possa examinar os respectivos suportes técnicos, levando o tribunal a «proceder à audição das gravações», nomeadamente para «determinar a correcção das transcrições já efectuadas» (Itens 10 e 11).
É neste palco aberto da produção da prova quanto do exercício do contraditório (audiatur et altera pars) que tanto o Mº Pº, a partir das transcrições que indicou no libelo deduzido, argumentará no sentido da acusação ou corrigirá o sentido desta, quanto igualmente o arguido, no pleno uso do direito de defesa, poderá, de uma parte, oferecer as transcrições que entenda oportunas à sua defesa quanto, de outra, questionar e/ou pôr em causa a conformidade das transcrições oferecidas pelo Mº Pº – discutindo, aqui, já a fidelidade da transcrição já, mesmo, a identificação da voz.
Prova e contraprova que o Tribunal, de sua vez, à luz do princípio da «Livre apreciação da prova» (Artº 127º CPP), conjugadamente com a demais prova produzida, apreciará /valorará «segundo as regras da experiência e a livre convicção» e decidirá em sentido afirmativo ou negativo e/ou, num tertium genus, no sentido de um insuperável non liquet.
Valoração, de todo o modo, em que o Tribunal seguramente não deixará de tomar em linha de conta que: «as referências, por transcrição (…), das passagens das conversações que o órgão de polícia criminal (que está sujeito a especiais obrigações de objectividade) considera relevantes, (…) porque necessariamente acompanhadas do envio ao juiz das fitas gravadas ou elementos análogos, merecem, à partida, um juízo de fidedignidade, atenta a possibilidade efectiva de controlo da sua correspondência ao material gravado» - Ac. TC n.º 426/05, de 25-08-2005.
Juízo de fidedignidade que, todavia - repete-se - o arguido pode contrariar exigindo o exame do auto de transcrição quanto dos suportes técnicos de modo a conferir a conformidade da transcrição com a gravação quanto a conformidade da identificação das vozes gravadas.
Com esse ou outro alcance, como seja - repetindo uma vez mais - o de requerer a transcrição de outras passagens no possível entendimento de que as mesmas assumam relevância própria, ou, de que, de todo o modo, possam revelar-se úteis para esclarecer ou contextualizar o sentido de passagens anteriormente seleccionadas.
Insista-se, todavia, na questão da identificação das vozes: será imprescindível – sob pena de perda de eficácia - que o Tribunal se socorra de perito para a respectiva identificação?
De modo algum.
Na verdade, não se duvida que a identificação (das vozes) pode ser alcançada de diferentes modos: assim, entre outros, pelo próprio contexto das conversações, pelo auto-reconhecimento ou pelo reconhecimento através do interlocutor, assim, igualmente, pelo órgão de polícia criminal.
Só em caso de uma insuperável dúvida o Tribunal deverá socorrer-se de tal meio técnico coadjuvante.
Ora uma tal dúvida insuperável não sobreveio ao julgamento.
Questionou-se a «perícia» do policial mas, no que importava, da conformidade ou não das vozes identificadas ninguém ousou questioná-las directamente ou pô-las em causa.
No caso sub specie - antecipando uma vez mais - dê-se conta da segurança revelada pelo Tribunal no cuidado posto em confirmar que as comunicações e conversações transcritas correspondiam efectivamente às pessoas a quem na acusação/pronúncia era atribuída a autoria dos actos ou afirmações nelas reproduzidas.
Mas uma outra questão se suscita, relativa à valoração da prova assim obtida: garantida a conformidade legal das gravações vindas das escutas telefónicas vedado ficava, ainda, o seu uso pelo Tribunal?
Obviamente que não.
Não, não por força da regra da não taxatividade dos meios de prova (são admissíveis as provas que não forem proibidas por lei – Artigo 125º do C.P.Penal), antes - e visto a intrínseca intrusão na privacidade - com a cobertura de lei expressa (artigos 187º ss CPP).
Mas: podendo valer como meio único de prova?
Obviamente que sim.
Sendo como são um meio legal de prova, não se vê por que razão não pudessem constituir meio único de prova.
Di-lo o STJ em Ac. de 19.10.2005 (Processo nº 1941/05-3ª):
«Mesmo sendo o único meio de prova, o tribunal não está impedido de apoiar nas escutas telefónicas a sua convicção probatória como até de as subalternizar e reduzir a um mero instrumento metodológico de aquisição de prova, elementos de intervenção de presunções naturais, prova através da qual o tribunal se pode abalançar à aquisição de factos materiais e neste sentido prova indiciária mas ainda meio credenciado de prova, nos termos dos artigos 124º, 125º e 187º e ss do CPP».
Num outro âmbito vem suscitada a questão comum da ausência de leitura das transcrições na audiência de julgamento e, daí, a de uma eventual prática de «valoração proibida de prova».
Sem fundamento.
De facto «Não valem em julgamento, nomeadamente para o efeito de formação da convicção do tribunal, quaisquer provas que não tiverem sido produzidas ou examinadas em audiência” (Artigo 355º/1 CPP).
Porém, como ensina Paulo Pinto de Albuquerque: «A disposição não abrange a prova documental e os meios de obtenção de prova. Com efeito, não é inconstitucional a interpretação conjugada dos artigos 127º, 355º e 165º/2 do CPP, segundo a qual a formação da convicção com documentos juntos com a acusação, constantes dos autos, não lidos nem explicados na audiência, não viola o princípio do contraditório, ‘quer na modalidade do princípio da oralidade, quer da imediação’ (Ac. do TC 87/99, mas contra Germano Marques da Silva, 2000b:254). De igual modo, os meios de obtenção de prova, isto é, os autos de exames, revistas, buscas, apreensões e escutas telefónicas podem ser invocados na fundamentação da sentença mesmo que não tenham sido examinados na audiência. A razão é esta: conhecendo a defesa o inquérito, a defesa pode contrariar a admissão e o valor probatório da prova, sempre que quiser, mas ‘a leitura em audiência de dezenas de documentos nada acrescentaria às oportunidades de defesa do arguido’, o mesmo valendo para os autos de exames, revistas, buscas, apreensões e escutas telefónicas (quanto aos documentos, Ac. do TC 87/99 e quanto às escutas telefónicas, Ac. do STJ de 29.11.2006 in CJ Acs. STJ XIV, 3, 235 e Ac. TRL de 12.1.2000 in CJ XXV, 1, 135).»”

Também neste particular, e sem qualquer reserva, importa afirmar que se subscreve a doutrina do transcrito acórdão.
Acrescentando apenas que, in casu, o Tribunal Colectivo não teve dúvidas em imputar o conteúdo das transcrições aos arguidos porque concluiu que se tratava da sua voz [quando a questão foi suscitada, em 1ª Instância, como tinha de ser, não em sede de recurso, como alguns arguidos fazem agora, o arguido foi confrontado com o teor da escuta, v. g. o Vasconcelos: “Confrontado com algumas transcrições de conversas telefónicas que manteve e que lhe são comprometedoras (conforme emerge da respetiva ata), negou ter sido interveniente nessas conversações. Em face disso, confrontado com a gravação de algumas sessões (como também da respetiva ata consta), ainda respeitantes a conversações telefónicas mantidas a propósito da atividade ilícita em causa nos autos, referiu não reconhecer a sua voz. Esta afirmação, porém, foi visivelmente contrariada pela postura do arguido K........ aquando da reprodução das respetivas gravações, denotativa de que reconheceu efetivamente a sua voz”.].
Não havendo dúvidas (para o Tribunal a quo, e só esta interessa) sobre a voz, não se enxerga para que seria necessária eventual perícia quando o Juiz, perito dos peritos, conclui pela autoria.
Importa acrescentar ainda que as comunicações telefónicas interceptadas não se reportam a dois (ou mais) loucos que falem sobre coisas que lhes daria prazer.
Ou também que se reportem a declarações não sérias.
Casos em que, naturalmente, segundo o princípio da livre apreciação da prova, não serviriam para a condenação.
Antes, e sem excepção, estamos perante comunicações telefónicas entre indivíduos conotados com a actividade de tráfico de estupefacientes, sem actividade conhecida, apanhados na “rede” de outras escutas autorizadas a suspeitos da prática do crime de tráfico, que usam linguagem cifrada, facilmente perceptível por quem exerce funções judiciais, que encomendam estupefaciente para venda e que até chegam a fazer comentários sobre a qualidade do mesmo e sobre as pessoas a quem irão ceder.
A alguns dos fornecedores, referenciados nas escutas, e por causa delas, até foi aprendido estupefaciente.
Em quantidade significativa.
Não pode, por isso, falar-se de escutas não corroboradas.

G) O TIPO LEGAL DE TRÁFICO DE ESTUPEFACIENTES
Sob a epígrafe “Tráfico e outras actividades ilícitas” dispõe o n.º 1 do art.º 21º do DL 21/93, de 22 de Janeiro:
“Quem, sem para tal se encontrar autorizado, cultivar, produzir, fabricar, extrair, preparar, oferecer, puser à venda, vender, distribuir, comprar, ceder ou por qualquer título receber, proporcionar a outrem, transportar, importar, exportar, fizer transitar ou ilicitamente detiver, fora dos casos previstos no artigo 40.º, plantas, substâncias ou preparações compreendidas nas tabelas I a III é punido com pena de prisão de 4 a 12 anos”.
É unanimemente entendido que se trata de um crime de perigo abstracto, com cuja incriminação se quer “evitar a degradação e destruição de seres humanos provocadas pelo consumo de estupefacientes”[48], para cuja consumação se exige a prática de uma das condutas ali referidas[49], seja o cultivo a produção, o fabrico, a extração, a preparação, a oferta, a colocação à venda, a venda, a distribuição, a compra, a cedência ou a mera detenção de plantas, substâncias ou preparações compreendidas nas tabelas I a III anexas ao citado DL.
O tipo base constante do art.º 21º pode ser agravado (caso se verifiquem as circunstâncias referidas no art.º 24º); e pode ser privilegiado (caso concorram as circunstâncias indicadas nos art.ºs 25º e 26º).
Dispõe o art.º 25º do DL 21/93, sob a epígrafe, “Tráfico de menor gravidade”:
“Se, nos casos dos artigos 21.º e 22.º, a ilicitude do facto se mostrar consideravelmente diminuída, tendo em conta nomeadamente os meios utilizados, a modalidade ou as circunstâncias da acção, a qualidade ou a quantidade das plantas, substâncias ou preparações, a pena é de (…).
Como bem refere o STJ[50] “O crime de tráfico de menor gravidade, previsto no art. 25.º do DL 15/93,de 22-01, como a sua própria denominação legal sugere, caracteriza-se por constituir um minus relativamente ao crime matricial, ou seja, ao crime do art. 21.º, do citado DL 15/93. Trata-se de um facto típico cujo elemento distintivo do crime tipo reside, apenas, na diminuição da ilicitude do facto, redução que o legislador impõe seja considerável, indicando como factores aferidores de menorização da ilicitude do facto, a título meramente exemplificativo, os meios utilizados, a modalidade ou as circunstâncias da acção e a qualidade ou a quantidade das plantas, substâncias ou preparações. É pois a partir do tipo fundamental, concretamente da ilicitude nele pressuposta, que se deve aferir se uma qualquer situação de tráfico se deve ou não qualificar como de menor gravidade. Tal aferição, consabido que a ilicitude do facto se revela, essencialmente, no seu segmento objectivo, com destaque para o desvalor da acção e do resultado, deverá ser feita a partir de todas as circunstâncias que, em concreto, se revelem e sejam susceptíveis de aumentar ou diminuir a quantidade do ilícito, quer do ponto de vista da acção, quer do ponto de vista do resultado. Assim, e para além das circunstâncias atinentes aos factores de aferição da ilicitude indicados no texto do art. 25.º do DL 15/93, há que ter em conta todas as demais circunstâncias susceptíveis de interferir na graduação da gravidade do facto, designadamente as que traduzam uma menor perigosidade da acção e/ou desvalor do resultado, em que a ofensa ou o perigo de ofensa aos bens jurídicos protegidos se mostre significativamente atenuado, sendo certo que para a subsunção de um comportamento delituoso (tráfico) ao tipo privilegiado do art. 25º do DL 15/93, torna-se necessária a valorização global do facto, tendo presente que o legislador quis aqui incluir, como já atrás se consignou, os casos de menor gravidade, ou seja, aqueles casos que ficam aquém da gravidade justificativa do crime tipo, o que tanto pode decorrer da verificação de circunstâncias que, global e conjugadamente sopesadas, se tenham por consideravelmente diminuidoras da ilicitude do facto, como da não ocorrência (ausência) daquelas circunstâncias que o legislador pressupôs se verificarem habitualmente nos comportamentos e actividades contemplados no crime tipo, isto é, que aumentam a quantidade do ilícito colocando-o ao nível ou grau exigível para integração da norma que prevê e pune o crime tipo”.
É o mesmo STJ[51] quem afirma que “a constatação da menor ilicitude terá de resultar de uma avaliação global da situação de facto, em que assumem relevo, entre outros eventuais factores, a quantidade e a qualidade dos estupefacientes comercializados, os lucros obtidos, o grau de adesão a essa actividade como modo de vida, a afectação ou não de parte dos lucros ao financiamento do consumo pessoal de drogas, a duração e a intensidade da actividade desenvolvida, o número de consumidores contactados e a posição do agente na rede de distribuição clandestina dos estupefacientes”.
É por isso - que não é pela ausência de factos - que se pode concluir pela menor ilicitude da conduta.
A menor ilicitude da conduta há-de resultar da imagem global da conduta constante dos factos apurados.
A comprovar o que afirmamos se, por exemplo, o arguido vendesse apenas as chamadas drogas não duras, tal facto, só por si, podia não implicar a subsunção ao tipo privilegiado, se a mesma fosse disseminada por vários consumidores, se o arguido tivesse um autêntico minimercado de droga, etc.[52].
Afirma o STJ[53] que “A tipificação do art. 25.º, do DL 15/93, parece significar o objectivo de permitir ao julgador que, sem prejuízo do natural rigor na concretização da intervenção penal relativamente a crimes desta natureza, encontre a medida justa da punição em casos que, embora porventura de gravidade ainda significativa, ficam aquém da gravidade do ilícito justificativo da tipificação do art. 21.º e têm resposta adequada dentro da moldura penal prevista na norma indicada em primeiro lugar (entre muitos, o Ac. STJ de 15/12/99, proc. 912/99)”.
Por isso, defende, se o tráfico for de carácter muito rudimentar, se a quantidade traficada não for muito elevada, se a modalidade ou as circunstâncias da acção não forem altamente desvaliosas, se o tráfico não for efectuado por estrutura organizada, se não houver organização pode a conduta ser subsumível ao tipo privilegiado.
Os Tribunais de 2ª Instância vão no mesmo sentido:
“Só se pode falar em tráfico de menor gravidade, e enquadrar os factos no artigo 25.º do Decreto-Lei n.º 15/93, de 22 de Janeiro, quando, avaliado na sua globalidade, o seu grau de ilicitude seja de tal modo inferior ao que se verifica no caso normal de tráfico de estupefacientes que se imponha considerá-lo, relativamente a este, como caso extraordinário ou excepcional[54].
Para além daqueles casos em que é evidente que a conduta é subsumível ao tipo fundamental ou ao tipo privilegiado, outros há que ficam na denominada “«zona cinzenta» em que o juiz fica na dúvida sobre a real dimensão do tráfico em causa e, nesses casos, deverá, tendencialmente, aplicar uma pena cuja medida concreta é coincidente na moldura penal abstracta do crime de tráfico comum e não do crime de tráfico menor gravidade, a qual, conforme se pode verificar pelos artigos 21.º e 25.º, se situa entre os 4 e os 5 anos de prisão. Nesses casos, a que chamámos de «zona cinzenta», o legislador apontou para que se aplicasse o crime regra - o do art.º 21.º - mas permitiu que a sua moldura mais baixa convergisse com a penalidade própria do art.º 25.º, reservando este tipo criminal para outras situações de muito menor ilicitude”[55].
E isto porque, lê-se no aresto acabado de citar, “o legislador não se contentou com uma simples diminuição da ilicitude para enquadrar o crime de tráfico de menor gravidade, pois obrigou a que fosse «consideravelmente diminuída». Do mesmo modo, não aceitou que o tráfico que é realizado pelo agente com a finalidade de obter droga para o seu consumo seja sempre integrado no crime privilegiado do traficante-consumidor, pois que essa finalidade tem de ser «exclusiva». Em ambos os casos, o legislador deu um sinal claro ao intérprete de que os crimes privilegiados são a excepção e nunca a regra”.
E acrescenta: “Note-se, também, que provavelmente não poderá ser considerado como «vendedor de rua», mas como «pequeno armazenista», aquele que, apesar de só ter sido observado pela polícia em pequenas vendas aos consumidores, detém em local próprio uma quantidade de droga que excede largamente a necessidade de satisfazer os seus «clientes» num período de tempo razoavelmente curto, tal como o retalhista no comércio cujo stock é limitado às exigências dos clientes nos tempos mais próximos”.
Daí que “a avaliação de uma actividade, seja ela qual for, obriga a uma definição prévia de critérios (ou de exemplos-padrão) e, portanto, dir-se-á que o agente do crime de tráfico de menor gravidade do art.º 25.º do DL 15/93, de 22 de Janeiro, deverá estar nas circunstâncias seguidamente enunciadas, tendencialmente cumulativas:
a) A actividade de tráfico é exercida por contacto directo do agente com quem consome (venda, cedência, etc.), isto é, sem recurso a intermediários ou a indivíduos contratados, e com os meios normais que as pessoas usam para se relacionarem (contacto pessoal, telefónico, internet);
b) Há que atentar nas quantidades que esse vendedor transmitia individualmente a cada um dos consumidores, se são adequadas ao consumo individual dos mesmos, sem adicionar todas as substâncias vendidas em determinado período, e verificar ainda se a quantidade que ele detinha num determinado momento é compatível com a sua pequena venda num período de tempo razoavelmente curto;
c) O período de duração da actividade pode prolongar-se até a um período de tempo tal que não se possa considerar o agente como “abastecedor”, a quem os consumidores recorriam sistematicamente em certa área há mais de um ano, salvo tratando-se de indivíduo que utiliza os proventos assim obtidos, essencialmente, para satisfazer o seu próprio consumo, caso em que aquele período poderá ser mais dilatado;
d) As operações de cultivo ou de corte e embalagem do produto são pouco sofisticadas.
e) Os meios de transporte empregues na dita actividade são os que o agente usa na vida diária para outros fins lícitos;
f) Os proventos obtidos são os necessários para a subsistência própria ou dos familiares dependentes, com um nível de vida necessariamente modesto e semelhante ao das outras pessoas do meio onde vivem, ou então os necessários para serem utilizados, essencialmente, no consumo próprio de produtos estupefacientes;
g) A actividade em causa deve ser exercida em área geográfica restrita;
h) Ainda que se verifiquem as circunstâncias mencionadas anteriormente, não podem ocorrer qualquer das outras mencionadas no art.º 24.º do DL 15/93”.
É ainda o STJ[56] quem afirma: “Se, por um lado é de toda a conveniência o estabelecimento de uma corrente jurisprudencial que sirva como indicador para aplicação destes normativos (art.ºs 24º, 21º e 25º do DL 15/95, de 22 de Janeiro, em nome da estabilidade e da segurança do direito, por outro lado, nunca poderá deixar de fazer-se a apreciação de cada caso, como um episódio com especificidades próprias, inconfundível com os demais (…).
É sabido como, em sede de ilicitude, e portanto em sede de malefício causado à sociedade, o papel do pequeno e médio traficante é essencial a todo o sistema de tráfico. O abastecimento normal, do consumidor normal, faz-se através deles e, sem eles, os chamados barões da droga poucos lucros aufeririam”[57].
Tipo privilegiado é ainda o do n.º 1 do art.º 26º do DL 15/93, que, sob a epígrafe “Traficante-consumidor” estatui: “Quando, pela prática de algum dos factos referidos no artigo 21.º, o agente tiver por finalidade exclusiva conseguir plantas, substâncias ou preparações para uso pessoal, a pena é de prisão até três anos ou multa, se se tratar de plantas, substâncias ou preparações compreendidas nas tabelas I a III, ou de prisão até 1 ano ou multa até 120 dias, no caso de substâncias ou preparações compreendidas na tabela IV”.
Neste tipo legal, o factor de privilegiamento é o dolo específico com que o agente actua: as actividades de tráfico são praticadas com a finalidade exclusiva de o agente obter droga para o seu próprio consumo.
Só em concreto, face às circunstâncias apuradas, é possível apurar se a conduta do arguido fica consideravelmente diminuída, mediante, usando palavras do STJ, “uma avaliação global da situação de facto, em que assumem relevo, entre outros eventuais factores, a quantidade e a qualidade dos estupefacientes comercializados, os lucros obtidos, o grau de adesão a essa actividade como modo de vida, a afectação ou não de parte dos lucros ao financiamento do consumo pessoal de drogas, a duração e a intensidade da actividade desenvolvida, o número de consumidores contactados e a posição do agente na rede de distribuição clandestina dos estupefacientes”.
Ou se as actividades de tráfico são praticadas com a finalidade exclusiva de o agente obter droga para o seu próprio consumo.

H) A MEDIDA CONCRETA DA PENA
Nos termos do art.º 40º, n.º 1, do CP, a aplicação de penas e de medidas de segurança visa a protecção de bens jurídicos e a reintegração do agente na sociedade.
São, pois, necessidades preventivas, que não retributivas, que estão na base da aplicação das penas, consideradas estas como “amarga realidade”.
Num Estado de Direito, Democrático e Social, só a necessidade de manutenção da ordem social (função utilitária) justifica a aplicação de penas. Por isso, o direito penal só intervém quando haja necessidade de protecção de bens jurídicos essenciais, tendo presentes os princípios da mínima intervenção, da fragmentariedade e da subsidiariedade.
A prevenção, geral e especial, tem de estar subjacente a essa aplicação.
O bem jurídico protegido pela norma violada, a necessidade de resposta contrafáctica a essa violação e a personalidade do Recorrente, manifestada no facto, a sua postura e antecedentes hão-de influir – e decisivamente – na medida concreta da pena.
Acrescenta o art. 71º do mesmo diploma legal que a determinação da medida da pena, dentro dos limites definidos na lei, é feita em função da culpa do agente e das exigências de prevenção, devendo o tribunal atender a todas as circunstâncias que, não fazendo parte do tipo de crime, depuserem a favor ou contra aquele, enumerando-se nesse preceito exemplificativamente alguns desses factores.
A pena não pode, em caso algum, ultrapassar a medida da culpa sob pena de se violar o princípio constitucional da dignidade da pessoa humana, subjacente a um Estado de direito democrático e social, como é o nosso – art.º 40º, n.º 2, do mesmo Código.
Segundo Figueiredo Dias[58], “o modelo de determinação da medida da pena que melhor combina os critérios da culpa e da prevenção é aquele que comete à culpa a função (única, mas nem por isso menos decisiva) de determinar o limite máximo e inultrapassável da pena; à prevenção geral (de integração), entendida esta como a protecção de bens jurídicos alcançada mediante a estabilização das expectativas comunitárias na validade da norma jurídica violada[59], aquela que “responde, por excelência, à sua função pública, aos interesses públicos da tranquilidade e segurança social (…), cabendo-lhe encontrar a medida óptima de tutela dos bens jurídicos dentro do que é consentido pela culpa, tendo em conta a importância e necessidade dos bens jurídicos a proteger; cujo limite mínimo é fornecido pelas exigências irrenunciáveis de defesa do ordenamento jurídico (o revelar perante a comunidade a solidez do sistema jurídico-penal, traduzido na “necessidade de tutela da confiança ... e das expectativas da comunidade na manutenção da vigência da norma violada ... no restabelecimento da paz jurídica comunitária abalada pelo crime”[60]); e à prevenção especial a função de encontrar o quantum exacto de pena, dentro da referida «moldura de prevenção», que melhor sirva as exigências de socialização (ou, em casos particulares, de advertência ou de segurança) do delinquente”.
“Se, por um lado, a prevenção geral positiva é a finalidade primordial da pena e se, por outro, esta nunca pode ultrapassar a medida da culpa, então parece evidente que, dentro da moldura legal, a moldura da pena aplicável ao caso concreto (moldura de prevenção) há-de definir-se entre o mínimo imprescindível à estabilização das expectativas comunitárias e o máximo que a culpa consente; entre tais limites, encontra-se o espaço possível de resposta às necessidades da reintegração social”[61].
São, pois, as circunstâncias referidas, diferentes em cada situação, que hão-de determinar a pena concreta.

I) A SUSPENSÃO DA EXECUÇÃO DA PENA
Segundo o n.º 1 do art.º 50º do C. Penal “o tribunal suspende a execução da pena de prisão aplicada em medida não superior a cinco anos se, atendendo à personalidade do agente, às condições da sua vida, à sua conduta anterior e posterior ao crime e às circunstâncias deste, concluir que a simples censura do facto e a ameaça da prisão realizam de forma adequada e suficiente as finalidades da punição”.
A pena de prisão suspensa na sua execução é “uma pena autónoma e, portanto, na sua acepção mais estrita e exigente, uma pena de substituição”[62].
Para que a pena de prisão seja substituída, para além da verificação do pressuposto formal (condenação em pena em medida não superior a cinco anos), é necessário que os requisitos materiais estejam verificados, designadamente tem de concluir-se que o arguido presumivelmente não voltará a delinquir face à sua personalidade, às condições da sua vida, à sua conduta anterior e posterior ao crime e às circunstâncias deste.
Trata-se, no dizer de Anabela Rodrigues[63], de alcançar a socialização, prevenindo a reincidência.
Porque de pena se trata, só pode ser aplicada se realizar “de forma adequada e suficiente as finalidades da punição”.
O que implica se faça juízo de ponderação tendo em conta que “Na suspensão da pena une-se um juízo de desvalor ético social contido na sentença penal com o apelo, fortalecido com a ameaça de executar a pena no futuro, à própria vontade do condenado de se reintegrar na sociedade”[64].
Para que a pena de prisão seja substituída, segundo Jescheck[65] é decisivo, “por um lado, a função que a pena tem de «manter perante a comunidade a evidência da inquebrantibilidade do ordenamento jurídico e de prevenir, ao mesmo tempo outras futuras violações análogas do direito por parte dos delinquentes potenciais»; e, por outro, o critério de manutenção da confiança da comunidade do direito»”.
Da mesma forma, Roxin[66] afirma que a suspensão da pena não pode ser decretada se a “defesa do ordenamento jurídico exige a sua execução”.
Porque assim é, estamos reconduzidos à doutrina dos fins das penas, para a qual remete, de resto, o citado n.º 1 do art.º 50º do C. Penal.
Segundo Figueiredo Dias[67] “primordialmente, a finalidade visada pela pena há-de ser a da tutela necessária dos bens jurídico-penais no caso concreto; e esta há-de ser também por conseguinte a ideia mestra do modelo de medida da pena. Tutela dos bens jurídicos não obviamente num sentido retrospectivo, face a um crime já verificado, mas com um significado prospectivo, correcta­mente traduzido pela necessidade de tutela da confiança (de que falava já Beleza dos Santos) e das expectativas da comunidade na manutenção da vigência da norma violada; sendo por isso uma razoável forma de expressão afirmar como finalidade primária da pena o restabelecimento da paz jurídica comunitária abalada pelo crime. Uma finalidade que, deste modo, por inteiro se cobre com a ideia da prevenção geral positiva ou prevenção de integração; e que dá por sua vez conteúdo ao princípio da necessidade da pena que o art. 18°-2 da CRP consagra de forma paradigmática. A ponto de se poder defender que onde a aplicação de uma pena - e a determinação da sua medida - não fosse essencialmente coman­dada por esta finalidade, aí se divisaria uma infracção ao espírito (se não à própria letra) da referida norma constitucional.
A Günter Jakobs se fica devendo a fórmula - emitida na esteira de Luhmann - segundo a qual a finalidade primária da pena reside na estabilização contrafáctica das expectativas comunitárias na validade da norma violada. (…)
Afirmar que a prevenção geral positiva ou de integração cons­titui a finalidade primordial da pena e o ponto de partida para a resolução de eventuais conflitos entre as diferentes finalidades preventivas traduz exactamente a convicção de que existe uma medida óptima de tutela dos bens jurídicos e das expectativas comunitárias que a pena se deve pro­por alcançar; medida esta que não pode ser excedida (princípio da necessidade) por considerações de qualquer tipo, nomeadamente por exigências (acrescidas) de prevenção especial, derivadas de uma particular perigosidade do delinquente. (…)”.
Günter Jakobs[68] afiança que a estabilização contrafáctica das expectativas comunitárias na validade da norma violada é imprescindível não só porque “ninguém pode dominar todos os círculos da organização social onde se insere, no seu conjunto, mas também porque, devido ao direito da própria organização, a ninguém é permitido dominá-los de forma tão ampla”.
Por isso, acrescenta[69]: “a pena deve proteger as condições de tal interacção e tem, portanto, uma função preventiva (…) para exercitar a confiança na norma (…) aumentando a probabilidade de que esse comportamento seja apreendido pela comunidade de forma considerá-lo como aquele que não se deve ter”.
É evidente que, para além da função preventiva geral, a pena tem ainda uma função preventiva especial, que pode “operar através da «neutralização-afastamento» do delinquente para que fique impedido fisicamente de cometer mais crimes, como intimidação do autor do crime para que não reincida, e, sobretudo, para que sejam fornecidos ao arguido os meios de modificação de uma personalidade revelada desviada, assim este queira colaborar em tal tarefa (Vide, a propósito, v.g. Roxin in “Derecho Penal - Parte Especial”, Tomo I, Madrid, Civitas, 1997, pág.86)”[70].
Quando o delinquente carece de auxílio efectivo e continuado na socialização, a pena a aplicar tem de ter em conta a aludida “neutralização-afastamento”.
Quando a necessidade de auxílio está diluída ou não é premente, o tribunal pode limitar-se a aplicar uma pena que sirva de suficiente advertência à não reiteração criminosa.

Tratadas assim, de forma global e abrangente, as questões mais ou menos recorrentes dos arguidos, com particular acuidade no que toca à validade das escutas e sua livre apreciação, para cujas soluções remeteremos sempre que cada arguido nos confronte com a concreta questão supra tratada, estamos em condições de abordar e decidir cada um dos recursos, de per si.

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Improcedem, pois, as conclusões da motivação.

DECISÃO:
Termos em que, na improcedência de todos os recursos, se mantém e confirma o douto acórdão Recorrido.
Cada um dos Recorrente pagará 5 Ucs de taxa de justiça, sem prejuízo do decidido quanto ao apoio judiciário.

Porto, 27.02.2013
Francisco Marcolino de Jesus
Élia Costa de Mendonça São Pedro
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[1] O número do processo é impercetível.
[2]Provou-se que superintendia o fornecimento dos produtos estupefacientes àquele grupo, mas no domínio das “atividades significativas” por certo contar-se-ia a definição dos locais de venda de toda a estrutura e a definição dos preços ao consumidor final. Ora este arguido apenas controlaria esses aspetos no que se refere aos produtos estupefacientes diretamente por si fornecidos, existindo naturalmente relativa autonomia das “estruturas intermédias” quer na definição dos locais de venda quer na fixação dos preços.
[3] Nesta parte seguiremos de perto o trabalho do Relator destes autos, Os meios de obtenção da prova em processo penal, Almedina 2011.
[4] P. 61
[5] Sentença de 18/07/1993, do Supremo Tribunal Espanhol, citada por Armando Veiga e Benjamim Rodrigues, Escutas telefónicas, Coimbra 2007, p. 66
[6] ANDRADE, Manuel da Costa, Comentário Conimbricense do Código Penal, Direcção do Prof. Figueiredo Dias, Coimbra Editora, 1999, Tomo I, em anotação ao artigo 199º, p. 829
[7] VEIGA/outro, op. cit., p. 176
[8] Conclusão 3º do Parecer da PGR 92/91
[9] VEIGA/outro, op. cit., p. 165
[10] ANDRADE, Manuel da Costa, Das escutas telefónicas, I Congresso de Processo Penal, Coordenação de VALENTE, Manuel Monteiro Guedes, Almedina 2005, pp [216, 217]
[11] A respeito da auto-incriminação, remetemos para a lição de Figueiredo Dias, Curso… pp [437-439]
[12] ANDRADE, Manuel da Costa, Bruscamente no verão passado, RLJ, 137º-227.
[13] Idem, p. 228
[14] VEIGA/outro, op. cit., p. 63
[15] Como refere Costa Andrade, “Bruscamente …”, RLJ 138-119, quando se atinge a “área nuclear e inviolável da intimidade” “sobressai, por um lado, o carácter absoluto da tutela, com a subtracção à balança e aos juízos de ponderação; e, por outro lado, à prescrição de linhas articuladas de defesa e de reafirmação contrafáctica (...) sobreleva, sistematicamente reconhecida e proclamada, a sua inviolabilidade absoluta (...) se trata de erigir a área nuclear da intimidade como limite à investigação e perseguição” penais.
[16] Segundo GOMES CANOTILHO / VITAL MOREIRA, Constituição … Vol. I, p. 467, o direito à reserva da intimidade da vida privada e familiar “analisa-se principalmente em dois direitos menores: a) o direito a impedir o acesso de estranhos a informações sobre a vida privada e familiar; b) o direito a que ninguém divulgue as informações que tenha sobre a vida familiar e privada de outrem”.
[17] O Ac do STJ, Uniformizador, com o n.º 13/2009, DR, I, de 6/11/2009, afirma que “as escutas telefónicas, como meio de obtenção de prova particularmente intrusivo, caracterizam-se pela intromissão na intimidade da vida privada e familiar, na correspondência e na comunicação por meio da palavra falada, e acarretando, por isso, uma elevada e expansiva danosidade social”
[18] “Ninguém sofrerá intromissões arbitrárias na sua vida privada, na sua família, no seu domicílio ou na sua correspondência, nem ataques à sua honra e reputação. Contra tais intromissões ou ataques toda a pessoa tem direito a protecção da lei”.
[19] Qualquer pessoa tem direito ao respeito da sua vida privada e familiar, do seu domicílio e da sua correspondência”, (n.º 1); acrescenta no n.º 2: “Não pode haver ingerência da autoridade pública no exercício deste direito senão quando esta ingerência estiver prevista na lei e constituir uma providência que, numa sociedade democrática, seja necessária para a segurança nacional, para a segurança pública, para o bem-estar económico do país, a defesa da ordem e a prevenção das infracções penais, a protecção da saúde ou da moral, ou a protecção dos direitos e das liberdades de terceiros
[20] Idem, pp [119-120]
[21] A respeito do elenco de pessoas «escutáveis», afirma Costa Andrade in «Bruscamente …., RLJ Ano 137º, n.º 3948, p. 139, nota (1), que ao fazer a transposição do correspondente preceito da StPO alemã, o legislador de 2007 o fez “«despoletado» da exigência de que a suspeita de mediação de notícias de ou para o suspeito seja fundada em «factos concretos» (...). O que equivale a dizer que o legislador pôs de pé uma inócua máscara de protecção”.
[22] VEIGA/outro, op. cit., p. 106
[23] Crê-se ser unânime o entendimento de que o princípio da subsidiariedade sai reforçado da redacção do n.º 1 do art.º 187º resultante da reforma de 2007.
[24] VEIGA/outro, op. cit., pp [136,137]
[25] Deve interpretar-se restritivamente o preceito considerando suspeito apenas aquele sobre quem recaem indícios seguros de que cometeu um dos crimes do catálogo, precisamente pela elevada danosidade que resulta das escutas.
[26] Por todos, cfr. Ac do TC 155/2007 onde, desenvolvidamente, se dá conta da doutrina e jurisprudência relevante
[27] A lei exige apenas a suspeita da prática de um crime de catálogo e já não a «fundada» suspeita - no sentido do texto, ver Costa Andrade «Bruscamente …, RLJ Ano 137º, n.º 3948, p. 143. Entendemos que deve fazer-se interpretação restritiva do preceito até porque está em causa a violação de direitos fundamentais.
[28] Deve entender-se que está revogado, por incompatibilidade, o segmento da norma que permitia ao JIC ordenar as escutas telefónicas.
[29] A lei, na sequência da reforma de 2007, é hoje bem mais exigente no que toca às exigências de fundamentação, o que deve ser levado a crédito da questão sempre presente da legitimação dos juízes. E bem assim da qualidade da decisão (cfr. Luigi Ferrajoli, Revista Julgar 06, Setembro-Dezembro 2008, p. 12). Como bem refere Costa Andrade, «Bruscamente no Verão Passado …», RLJ, Ano 137º, n.º 3948, p. 142, tal exigência “obriga inter alia o Juiz a decidir na base da sua próxima e autónoma representação das coisas, maxime no que toca ao comprovado preenchimento dos pressupostos fácticos de princípios prescritos sub nomine subsidiariedade e suspeita fundada de ocorrência de crime de catálogo”.
[30] No sentido do texto, VEIGA/outro, op. cit., p. 195
[31] Estrela Ruiz e Soto Nieto, La intervencion de las comunicaciones telefónica, pg. 169, apud, VEIGA/outro, op. cit., p. 293
[32] ANDRADE, Manuel da Costa, Das escutas telefónicas, I Congresso de Processo Penal, Coordenação de VALENTE, Manuel Monteiro Guedes, Almedina 2005, pp [216, 217]
[33] COSTA ANDRADE, Manuel, Sobre as proibições… p. 304
[34] Sobre as proibições pp. [304-312]
[35] Assim, TEIXEIRA, Carlos Adérito, Revista do CEJ, n.º 9 (especial), 1º semestre de 2008, p. 281
[36] VEIGA/outro, op. cit., p. 357
[37] A doutrina e a jurisprudência estão divididas a este respeito, sendo da nossa responsabilidade a afirmação
[38] VEIGA/outro, op. cit., p. 440
[39] TEIXEIRA, Carlos Adérito, Revista do CEJ, n.º 9 (especial), 1º semestre de 2008, p. 291
[40] Bruscamente…, RLJ 137º-341
[41] Realce nosso
[42] Ac da RC de 7/03/2001 in CJ, Ano XXVI, tomo II, p. 44
[43] ANDRADE, Manuel da Costa, “Bruscamente …”, RLJ, 137º-227.
[44] Idem, p. 228
[45] Realce nosso
[46] Por evidente lapso escreveu-se “PSP”
[47] Ac da RP de 23 de Fevereiro de 2011, processo 1152/08.7PEGDM, in www.dgsi.pt, cujo Relator é o Desembargador Melo Lima, que sempre empresta a sua qualidade às decisões; e é Adjunta a Ex.ma Adjunta destes autos
[48] Ac do STJ de 31/3/2011, processo 368/09.3GAABF.S1, in www.dgsi.pt
[49] Neste sentido o Ac da RC de 25/3/2010, processo 1058/08.0TACBR.C1, in www.dgsi.pt
[50] Ac do STJ de 17/03/2010, processo 291/09.1TBALM.L1.S1, in www.dgsi.pt
[51] Ac do STJ de 15/4/2010, processo 17/09.0PJAMD.L1.S1, in www.dgsi.pt
[52] Neste sentido, o Ac do TRC de 17-11-2010, processo 33/09.1PEFIG.C1, in www.dgsi.pt
[53] Ac do STJ de 2/3/2011, processo 58/09.7GBBGC.S1, in www.dgsi.pt
[54] Ac da RE de 28-06-2011, processo 5/09.6GBALQ.E1, in www.dgsi.pt
[55] Ac do STJ de 23/11/2011, processo 127/09.3PEFUN.S1, in www.dgsi.pt
[56] Ac do STJ de 21/9/2011, CJ, Acs do STJ, XIX, tomo III, pg. 187
[57] O voto de vencido neste acórdão, em nossa opinião, demonstra à saciedade como uma pequena actividade de venda de estupefacientes, à míngua de elementos que permitam concluir pela ilicitude do facto diminuída de forma considerável pode – e deve – ser subsumida ao tipo base
[58] Revista Portuguesa de Ciência Criminal, Ano 3, Abril - Dezembro de 1993, p. 186 e segs.
[59] Para Roxin, a aplicação da pena pelo juiz, serve, em primeiro lugar, de complemento à função de prevenção geral própria da cominação legal pela confirmação da seriedade da ameaça abstracta expressa pela lei, nunca ultrapassando a culpa do autor pois de contrário este seria utilizado como meio para os demais (a função da pena no momento legislativo é a de protecção de bens jurídicos e prestações públicas imprescindíveis mediante a ameaça de uma sanção, que tem de constar do tipo atendendo ao princípio da legalidade); e, num segundo momento, serve a prevenção especial fazendo sentir ao delinquente a necessidade de não voltar a violar bens jurídicos fundamentais pela afirmação contrafáctica da validade da norma.
[60] Figueiredo Dias, Temas Básicos de Direito Penal, p. 105
[61] Ac. do STJ de 17.03.99, citado pelo Ac. do mesmo Tribunal, de 14.03.01 in CJ, Acs. do STJ, IX, 1, 249).
[62] DIAS, Figueiredo, Direito Penal Português, as consequências jurídicas do crime, pg. 339
[63] A posição jurídica do recluso, pg. 78 e segs.
[64] H. H. Jescheck, Tratado de Derecho Penal, Editorial Bosch, vol. II, pg 1152
[65] Idem, pg 1157
[66] Derecho Penal, Parte General, Thomson Civitas, Tomo I, pg. 131
[67] Direito Penal, Parte Geral, Coimbra Editora, 2004, Tomo I, pg. 78 e seguintes
[68] Derecho Penal, Marcial Pons, 2ª edição corrigida, Parte General, pg. 11 e segs
[69] Pg. 18
[70] Ac do STJ de 6/1/2011, CJ, Acs do STJ, XIX, I, 171