Acórdão do Tribunal da Relação do Porto
Processo:
885/17.1T9VNG.P1
Nº Convencional: JTRP000
Relator: JORGE LANGWEG
Descritores: MOTIVAÇÃO DO RECURSO
CONCLUSÕES
RECURSO
MANIFESTA IMPROCEDÊNCIA
REJEIÇÃO
CUSTAS
Nº do Documento: RP20230825885/17.1T9VNG.P1
Data do Acordão: 08/25/2023
Votação: DECISÃO SINGULAR
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: RECURSO PENAL (DECISÃO SUMÁRIA)
Decisão: REJEITADO O RECURSO INTERPOSTO PELO ARGUIDO POR MANIFESTA IMPROCEDÊNCIA.
Indicações Eventuais: 4. ª SECÇÃO CRIMINAL
Área Temática: .
Sumário: I - Não formulando o recorrente no plano técnico-jurídico processual qualquer questão concreta, consubstanciando as conclusões da motivação de recurso meras críticas genéricas sem real motivação e desprovidas do menor fundamento jurídico, o recurso é manifestamente improcedente.
II - A rejeição do recurso implica, ainda, a condenação do recorrente no pagamento de uma importância entre 3 UC e 10 UC (que não são meras custas judiciais, tendo natureza sancionatória), por força do disposto no artigo 420º, nº 3, do Código de Processo Penal.
Reclamações:
Decisão Texto Integral: Proc. n.º 885/17.1T9VNG.P1
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Cumpre proceder ao exame preliminar e, sendo caso disso, proferir decisão sumária (artigo 417º, números 1 e 6, do Código de Processo Penal).
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DECISÃO SUMÁRIA

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Sendo o recurso do arguido manifestamente improcedente, este Tribunal limitar-se-á a especificar, de forma sumária, os fundamentos da sua decisão de rejeição (artigos 417º, nº 6, al. b) e 420º, nº 1, al. a), ambos do Código de Processo Penal).
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Para definir o âmbito do recurso, a doutrina[1] e a jurisprudência[2] são pacíficas em considerar, à luz do disposto no artigo 412º, nº 1, do Código de Processo Penal (CPP), que o mesmo é definido pelas conclusões que o recorrente extraiu da sua motivação, sem prejuízo, forçosamente, do conhecimento das questões de conhecimento oficioso.
Cumpre, ora, concretizar as conclusões do recorrente:

“1. O Recorrente não se pode conformar com a condenação no presente processo.
2. Não corresponde à realidade que o Recorrente incumpriu gravemente bem como dolosamente, mas sim demonstrou que não cumpriu apenas porque não tinha condições emocionais, psicológicas para o fazer, tendo aliás sido dado como informado e provado de que o mesmo padecia de condições psicológicas, psiquiátricas e médicas graves!
3. Existe uma prescrição dos crimes imputados.
4. Facilmente se conclui que o Recorrente seria capaz de suportar a pena suspensa, não tendo em vista a prisão efetiva.
5. O Recorrente não arranjou justificativas para não cumprir caso fosse dada essa oportunidade.
6. Aliás, nunca foi verdadeiramente perguntado, em algum momento, o estado e sob que forma está a cumprir ou não as exigências, ao arguido!
7. Não se pode dizer, então, que o Recorrente se colocou numa situação que lhe impossibilitaria o cumprimento quando nunca fora ouvido antes do términus da suspensão.
8. Conclui-se que o Recorrente apenas não cumpriu com o exigido porque não conseguiu e mais não lhe podia ser exigível.
9. Não se pode, então, concluir, como fez o tribunal a quo na condenação de que se recorre que o Recorrente infringiu de forma grosseira ou repetidamente os deveres ou regras de conduta que lhe podiam ser impostos, levando assim à da pena de prisão.
10. Por outro lado, devido a esta conduta, não obstante ilícita, mas esvaziada de perseguição condenatória, devido ao tempo e oportunidade em condenar, é necessário adotar uma decisão que pugne, no mínimo, pela prescrição devendo tal ser considerada extinta.
11. E que seja declarado nulo por ter existido uma omissão de pronúncia.
12. E, caso assim não se verifique, pela diminuição da pena atribuída e sempre em suspensão da execução da pena de prisão aplicada ao Arguido.
13. Não só por que se dilui em si mesma a finalidade da pena suspensa quando foi atribuída e confiada ao arguido em outros momentos.
14. Relembre-se que o propósito de uma pena é para reconduzir o arguido para uma via correta e positiva.
15. Assim, ao condenar sob estes moldes, contraria tal princípio, pois é manifestamente excessivo tal medida e pena tendo em conta todos os acórdãos já mencionados, que se dão inteiramente por reproduzidos e na medida do mais favorável para o arguido.
16. Pelo que é necessário reconhecer a prescrição, pois já deveria ter sido considerada extinta não só pelo facto de a perigosidade do agente já não existir, mas também o direito a acautelar já não se encontrar em perigo bem como este instituto que começa a decorrer desde 2016.
17. Relembre-se de que se na data da audiência o arguido demonstrava uma bagagem emocional pesada com uma visão abalada não só devido as situações que decorriam da sua vida pessoal, mas também do seu vínculo profissional.
18. Assim, a condenar o arguido, erroneamente e socialmente, por duas vezes, não assegura a reintegração do arguido na sociedade, conforme dispõe a norma do artigo 40.º do Código Penal, bem como as exigências da prevenção geral e especial.
19. Nem é possível equacionar uma condenação deste tipo, contrariando o princípio basilar e constitucional, ao ser condenado. Ninguém pode sofrer pena ou medida de segurança mais graves do que as previstas no momento da correspondente conduta ou da verificação dos respetivos pressupostos, aplicando-se retroativamente as leis penais de conteúdo mais favorável ao arguido, enunciado no n.º 4 do art.º 29.º da Constituição da República Portuguesa (CRP) bem como toda a proporcionalidade prevista em tal instrumento legislativo.
20. Isto não se verifica pela não ressocialização o arguido pessoal e profissionalmente, perdendo os laços familiares e o progresso desde 2017.
21. Tenha-se em mente de que, embora exista mérito na atribuição do pedido, não foi considerado na confissão integral e sem reservas.
22. Tal confissão livre, integral e sem reservas que deveria ter sido tomada em conta para uma pena não superior a dois anos e sete meses nem muito menos mais do que metade e efetiva na sua execução!
23. Ao que o pedido de indemnização cível tem de ser eliminado, e quando muito, reduzido na sua vasta proporção, não só por falta de suficiência económica, mas por que se demarca como desmedido após todo o período temporal, bem como as consequências da necessidade condenatória cujo nunca mais foi condenado por algum tipo de crime, seja de qualquer índole.
24. Além disso, o arguido manifestou e manifesta um grande interesse em frequentar consultas de tratamento psicológico e/ou psiquiátrico a longo prazo para mudar a sua vida bem como para que um dia, tal foi o facto dado como provado no relatório social, conseguir ser capaz em ser um pai saudável a fim de ser restabelecido nas suas responsabilidades parentais.
25. Pois, considera isso fundamental para a sua reintegração e evolução social.
26. Nos termos do supra alegado, afigura-se ser de maior justiça que o arguido não cumpra em prisão sob qualquer modo, muito menos efetiva como estabelecido pelo tribunal a quo.”
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Lidas as conclusões acima reproduzidas, conclui-se que as mesmas não chegam a concretizar no plano técnico-jurídico processual qualquer questão, consubstanciando, antes, um discurso confuso, muitas vezes incompreensível e sempre desprovido do menor fundamento jurídico real.
Concretizando.
O arguido recorrente não impugnou a decisão da matéria de facto e limitou-se a tecer considerações críticas genéricas sem real motivação.
É manifesto que o recorrente não especificou, formalmente:
a) As normas jurídicas violadas;
b) O sentido em que, no entendimento do recorrente, o Tribunal recorrido interpretou cada norma ou com que a aplicou e o sentido em que ela devia ter sido interpretada; e
c) Em caso de erro na determinação da norma aplicável, a norma jurídica que no entendimento dos recorrentes, deve ser aplicada.
Um exercício de interpretação jurídica exige um exercício de subsunção legal – de factos determinados no direito -.
- A conclusão 1. limita-se a manifestar discordância com a decisão condenatória.
- A conclusão 2 consubstancia uma frase confusa, destituída de significado jurídico, da qual o recorrente também não extrai qualquer consequência jurídica, nem formula uma tese recursória.
- Nas conclusões 3, 10 e 16, o recorrente invoca a prescrição “dos crimes imputados”, quando é certo que o arguido só foi condenado pela prática de um único crime de violência doméstica, do art. 152º, n.º 1, alínea b) do Código Penal, cometido entre 28 de Novembro de 2016 e 6 de Janeiro de 2017.
Nos termos do disposto no artigo 119º, 2, a), o prazo de prescrição começou a contar em 6 de Janeiro de 2017.
Esse prazo, referente ao crime pelo qual o arguido foi condenado, é de dez anos, nos termos do disposto no artigo 118º, 1, b), do Código Penal.
Por conseguinte, não tendo decorrido sequer os dez anos – e não entrando sequer em linha de conta com as existentes causas de suspensão e de interrupção da prescrição - é manifesto que o procedimento criminal «in iudicium» é válido, não se mostrando prescrito.
- As conclusões 4 a 9, 12 a 15 e 17, 20, 21 a 26 consubstanciam outras frases confusas, destituídas de significado jurídico, da qual o recorrente também não extrai qualquer consequência jurídica específica concreta, nem formula uma tese recursória baseada em factos e no direito.
- O recorrente invoca uma omissão de pronúncia na conclusão 11, mas não concretiza qual é a questão que deveria ter sido apreciada. No limite, considerando a conclusão precedente, a questão poderá ser a da prescrição, mas a mesma não foi invocada ma contestação pelo arguido, nem no decurso do julgamento, nem a mesma tinha de ser conhecida oficiosamente, por não se verificar a prescrição, pelas razões acima concretizadas.
- Na conclusão 18, o recorrente alega que o tribunal violou o disposto no artigo 40º do Código Penal, por ter condenado o arguido erroneamente e socialmente, por duas vezes. Trata-se de uma afirmação destituída de fundamento, pois o arguido só foi condenado na sentença recorrida por um crime em pena e em indemnização civil e se tivesse sido cometido algum erro em matéria de direito ou de facto, competia ao recorrente demonstrá-lo na motivação de recurso – o que não fez -.
- Na conclusão 19 o recorrente alega que o tribunal não aplicou retroativamente lei mais favorável, violando o disposto no artigo 29º, nº 4, da Constituição da república Portuguesa. Trata-se de mais uma afirmação inconsequente e sem fundamento, pois o arguido não invoca qual foi a norma mais recente que pretende ver aplicada, sendo ainda certo que o crime cometido pelo arguido tem a mesma moldura penal (um a cinco anos de prisão) desde a data dos factos em causa nos presentes autos, não tendo entrado em vigor norma penal mais favorável.
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Em conclusão:
O recurso improcede - in totum - de forma manifesta, conduzindo à sua rejeição.
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Apesar de ter sido liminarmente admitido em primeira instância, essa decisão não vincula este Tribunal (artigo 414º, nº 3, do Código de Processo Penal).
Tendo em consideração o exposto nesta decisão sumária, o recurso é rejeitado por ser manifestamente improcedente (artigos 417º, nº 6, al. b) e 420º, nº 1, al. a), ambos do Código de Processo Penal).
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Das custas processuais:
Impõe-se a condenação do recorrente nos termos previstos nos artigos 513º, 1, do Código de Processo Penal e 8º, nº 5, do Regulamento das Custas Processuais. A taxa de justiça individual será fixada em 3 UC's, nos termos da Tabela III anexa àquele Regulamento.
A rejeição do recurso implica ainda a condenação da recorrente no pagamento de uma importância entre 3 UC e 10 UC (que não são meras custas judiciais, tendo natureza sancionatória), por força do disposto no artigo 420º, nº 3, do Código de Processo Penal.
Atendendo, por um lado, à reduzida complexidade do objeto da decisão e, por outro, às clamorosas insuficiências técnicas evidenciadas no recurso, considera-se ajustado fixar essa importância em 6 (seis) unidades de conta.

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DISPOSITIVO

Pelos motivos concretizados na fundamentação que antecede:
a) Rejeita-se o recurso interposto pelo arguido AA, por ser manifestamente improcedente [artigos 417º, nº 6, al. b) e 420º, nº 1, al. a), ambos do Código de Processo Penal]; e
b) Condena-se o recorrente no pagamento de 3 (três) unidades de conta de taxa de justiça e da quantia de 6 (seis) unidades de conta ao abrigo do estatuído no nº 3 do artigo 420º do Código de Processo Penal.


Nos termos do disposto no art. 94º, 2, do Código de Processo Penal, aplicável por força do art. 97º, 3, do mesmo texto legal, certifica-se que a decisão foi elaborada e integralmente revista pelo relator.

Porto, 25/08/2023.
O relator,
Jorge Langweg
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[1] Germano Marques da Silva, Curso de Processo Penal, III, 2ª edição revista e atualizada, Editorial Verbo, 2000, pág. 335, V.
[2] Como decorre já de jurisprudência datada do século passado, cujo teor se tem mantido atual, sendo seguido de forma uniforme em todos os tribunais superiores portugueses, até ao presente: entre muitos, os acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça, de 19 de Outubro de 1995 (acórdão de fixação de jurisprudência obrigatória), publicado no Diário da República 1ª-A Série, de 28 de Dezembro de 1995, de 13 de Maio de 1998, in B.M.J., 477º,-263, de 25 de Junho de 1998, in B.M.J., 478º,- 242 e de 3 de Fevereiro de 1999, in B.M.J., 477º,-271 e, mais recentemente, de 16 de Maio de 2012, relatado pelo Juiz-Conselheiro Pires da Graça no processo nº. 30/09.7GCCLD.L1.S1.