Acórdão do Tribunal da Relação do Porto | |||
Processo: |
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Nº Convencional: | JTRP000 | ||
Relator: | CARLOS GIL | ||
Descritores: | ACOMPANHAMENTO DE MAIOR INTERVENÇÃO PRINCIPAL | ||
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Nº do Documento: | RP202106218177/20.2T8PRT-B.P1 | ||
Data do Acordão: | 06/21/2021 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Texto Integral: | S | ||
Privacidade: | 1 | ||
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Meio Processual: | APELAÇÃO | ||
Decisão: | CONFIRMADA | ||
Indicações Eventuais: | 5ª SECÇÃO | ||
Área Temática: | . | ||
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Sumário: | Não é legalmente admissível o incidente de intervenção principal espontâneo do lado ativo no processo especial de acompanhamento de maior. | ||
Reclamações: | |||
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Decisão Texto Integral: | Processo nº 8177/20.2T8PRT-B.P1 Sumário do acórdão proferido no processo nº 8177/20.2T8PRT-B.P1 elaborado pelo seu relator nos termos do disposto no artigo 663º, nº 7, do Código de Processo Civil: ……………………………… ……………………………… ……………………………… *** Acordam os juízes subscritores deste acórdão, da quinta secção, cível, do Tribunal da Relação do Porto:1. Relatório Em 01 de fevereiro de 2021, no processo especial de acompanhamento de maior que com o nº 8177/20.2T8PRT corre termos no Juízo Local Cível do Porto, J9, Comarca do Porto, instaurado em 20 de maio de 2020 por B… e em que é beneficiária visada com a medida de acompanhamento D… nascida em 27 de novembro de 1941, F… e G… vieram requerer a sua intervenção espontânea nos citados autos, aderindo ao requerimento que deduziram em 06 de julho de 2020[1]. Em 11 de março de 2021 foi proferido o seguinte despacho que se reproduz na parte pertinente ao conhecimento do objeto do recurso[2]: “Vieram F… e G… requerer, nos termos dos art.ºs 311.º e segs. do Código de Processo Civil a sua intervenção espontânea, alegando, para o efeito, a sua condição de filhos da beneficiária e irmãos da requerente. Apreciemos a pretensão dos requerentes. Dispõe o art.º 311.º do Código de Processo Civil que “Estando pendente causa entre duas ou mais pessoas, pode nela intervir como parte principal aquele que, em relação ao seu objeto, tiver um interesse igual ao do autor ou do réu, nos termos dos art.ºs 32º, 33º e 34º.” Além disso, preceitua o art.º 312.º do Código de Processo Civil que “O interveniente principal faz valer um direito próprio, paralelo ao do autor ou do réu, apresentando o seu próprio articulado ou aderindo aos apresentados pela parte com que se associa.”. Por seu turno o art.º 315.º, nº 1, do CPC, 1ª parte, prevê a possibilidade de rejeição liminar da intervenção espontânea requerida. Ora, os arts. 32º, 33º e 34º referidos no transcrito art.º 311.º do Código de Processo Civil reportam-se à situação de litisconsórcio, quer voluntário, quer necessário. No caso, tal situação de litisconsórcio não se verifica. Na verdade, não obstante a eventual legitimidade dos requerentes, nos termos do art.º 141.º do Código Civil, para a interposição de ação de acompanhamento relativamente à aqui requerida, a verdade é que os mesmos não têm direito ou interesse próprio, paralelo ao da autora ou do réu nos presentes autos, que justifique a sua intervenção na ação, ao lado daquela, nos termos dos arts. 32º e 33º do CPC. Com efeito, refere Emídio Santos, em Das Interdições e Inabilitações, págs. 49 e 50, relativamente ao antigo processo de interdição – sendo que tais considerações mantêm total pertinência no âmbito do atual processo de acompanhamento de maior - , o seguinte: “Partindo-se, certamente, das regras da experiência comum, atribui-se legitimidade [para interposição da acção de interdição] àquelas pessoas que provavelmente estarão próximas do incapaz e que, por isso, estarão em condições de requerer ao tribunal as medidas de protecção. A atribuição de legitimidade concorrente a uma pluralidade de pessoas é, pois, inequivocamente feita em benefício do incapaz. Assim sendo, requerida a protecção por uma das pessoas a quem a lei reconhece legitimidade para tanto, fica alcançado o objectivo pretendido pelo legislador com a atribuição da legitimidade plural concorrente. Em suma, as restantes pessoas não têm direito ou interesse próprio, paralelo ao do autor ou réu, que justifiquem a sua intervenção na acção.”. Como se escreveu no acórdão proferido pelo Tribunal da Relação, em 15/6/2020, no processo n.º 17743/19.8T8PRT que corre termos neste Juízo Local Cível, perante o Juiz 1 “É portanto claro o interesse que este processo especial visa garantir – o do beneficiário de tais medidas de acompanhamento. Nos termos do artigo 141º do CC é conferida legitimidade para requerer o acompanhamento quer ao próprio destinatário das medidas de acompanhamento quer e “mediante autorização deste” ao “cônjuge, (…) unido de facto, (…) qualquer parente sucessível ou, independentemente de autorização, pelo Ministério Público.” Autorização do beneficiário que poderá ser suprida pelo tribunal (vide nºs 2 e 3 deste artigo 141º) “quando, em face das circunstâncias, este não a possa livre e conscientemente dar, ou quando para tal considere existir um fundamento atendível” [pedido que pode ser cumulado com o pedido de acompanhamento]. Relevam estes considerandos para e no seguimento do afirmado pelo tribunal a quo realçar que os legitimados a impulsionar este processo especial (quando não o próprio destinatário das medidas de acompanhamento) – cabalmente identificados no artigo 141º do CC – não o fazem em defesa ou no interesse de um direito próprio, mas sempre no interesse e em benefício daquele que identificam como carecido de tal acompanhamento. Como tal, a legitimidade conferida às pessoas identificadas no atual artigo 141º (tal como na anterior lei) é “concorrente e não subsidiária ou sucessiva” motivo por que uma vez proposta tal ação por um dos legitimados que assim assegura o exercício do direito próprio do beneficiário visado com as medidas a tomar, não podem os demais legitimados invocando um interesse igual ao do autor ou do réu, deduzir incidente de intervenção principal espontânea. Tal como já se entendia na vigência do anterior regime e era então entendimento dominante. Note-se que o incidente de intervenção espontânea (vide artigos 311º e 312º do CPC) visa integrar como parte principal na lide processual o terceiro que em relação ao objeto da causa apresenta um interesse igual ao do autor ou do réu nos termos dos artigos 32º a 34º do CPC, os quais regulam o litisconsórcio necessário ou voluntário. Fazendo valer, o interveniente, um direito próprio, paralelo ao do autor ou do réu. Como já acima referimos, nestes autos o único interesse que se visa acautelar é o do beneficiário da medida de acompanhamento. E este pela instauração da ação está garantido. Inexiste como tal fundamento para a dedução e admissão da requerida intervenção espontânea, não obstante a requerente na qualidade de unida de facto – situação jurídica que invocou e que nesta sede não nos compete apreciar - ser também pessoa legitimada para promover a instauração de processo de acompanhamento, tal como resulta do artigo 141º vindo de analisar.” Assim, fazendo nossas as considerações tecidas no acórdão supra transcrito e não ignorando o que foi escrito no acórdão proferido no âmbito desta ação quanto à questão do acesso permanente ao processo por terceiros, concluímos que não se verificam, “in casu”, os fundamentos que justificariam a admissão da intervenção espontânea dos requerentes nos presentes autos. De todo o modo, sempre se dirá que, caso o Tribunal considere, face aos elementos constantes dos autos, que se justificará, oportunamente, a inquirição dos requerentes na qualidade de testemunhas, tal diligência será determinada, nos termos dos arts. 891º, nº 1, 897º, nº 1, e 986º, nº 2, todos do Código de Processo Civil. Em conclusão, entendemos ser de indeferir liminarmente a requerida intervenção espontânea. Pelo exposto, rejeito liminarmente a requerida intervenção espontânea de F… e G… nos presentes autos.” Em 22 de março de 2021, inconformados com a decisão que precede, F... e G… interpuseram recurso de apelação, terminando as suas alegações com as seguintes conclusões: “I.O Douto despacho ora recorrido que decidiu rejeitar liminarmente a requerida intervenção espontânea de F… e G… nos presentes autos, não se pode manter. II.Os Recorrentes, conforme decorre já dos autos, são filhos de D… e E…, sendo que a sua irmã, B…, decidiu por sua iniciativa e sem comunicar aos seus irmãos, os aqui Recorrentes, interpor o presente processo de acompanhamento de maior. III.A interposição do presente processo ocorreu à total revelia dos Recorrentes que ficaram muito surpreendidos com o mesmo e, assim que se aperceberam da sua existência, informaram os autos que a filha, B…, não é a única descendente da Maior, tendo, ainda, solicitado, o acompanhamento do presente processo. IV.Tal acompanhamento não foi autorizado por parte do Tribunal “a quo”, tendo os Recorrentes interposto o competente recurso de Apelação, recurso esse já decidido por essa Exma. Relação, no âmbito do apenso A dos autos. V.Esse Venerando Tribunal, em tal aresto, decidiu o seguinte, com manifesto interesse para a apreciação do presente recurso: “Caso os mesmos pretendam participar nos autos como terceiros intervenientes, têm de provocar essa intervenção. (…) Neste caso haverá certamente um interesse dos recorrentes em agir, porquanto os mesmos são filhos da eventual beneficiária. Mas esse interesse, seja em demandar, seja em contradizer, está intimamente conexionado com a legitimidade processual, não subsistindo só por si (artigo 30.º NCPC). Nesta conformidade, sem a posição processual de parte, que não são, ou de terceiros intervenientes, que não suscitaram até ao momento, não ocorre qualquer ilegitimidade constitucional na interpretação conferida ao artigo 164.º, n.º 1 e 2, alínea d) do NCPC.”. VI.Face ao que foi decidido por V. Exas. no citado Acórdão os Recorrentes, de imediato, suscitaram ao abrigo do disposto no artigo 311.º, do Código do Processo Civil, a sua INTERVENÇÃO PRINCIPAL ESPONTÂNEA, mediante adesão ao seu requerimento apresentado nos autos em 6 de Julho de 2020, entendendo, assim, dar cumprimento ao que decorre do Acórdão proferido nos presentes autos. VII.Entendimento diverso teve o Tribunal “a quo” ao proferir o despacho de que agora se recorre e com o qual não se concorda, pois viola o determinado por esse Venerando Tribunal, decidindo em sentido contrário ao determinado, facto que não se pode manter. VIII.Os Recorrentes têm um evidente interesse em acompanhar os autos, já que está em causa a vida da sua Mãe, cuja irmã pretende a todo o custo monopolizar e gerir, tudo à revelia dos seus irmãos. IX.Para que tal ocorra, afigura-se imperativo que os Recorrentes tenham acesso aos autos e neles possam intervir, por forma a defender os legítimos interesses da sua Mãe, pessoa interessada nos presentes autos. X.A não ser assim prefigurada a possibilidade de intervenção nos autos, por parte dos Recorrentes, tal configura uma evidente situação de desigualdade entre os filhos da Maior, facto que não se pode, naturalmente, manter. XI.Tal desigualdade acentua-se de uma forma desproporcional e sem assento legal quando a sua irmã tem acesso aos presentes autos e os Recorrentes, tendo suscitado a sua intervenção principal provocada, a mesma lhes é negada, por parte do Tribunal “a quo”, no despacho que proferiu. XII.Neste sentido pronunciou-se igualmente o Acórdão proferido no apenso A, por parte dessa Exma. Relação, referindo o seguinte: “A propósito ainda consideram que tal normativo, na interpretação conferida pelo despacho recorrido, viola o princípio da igualdade constante no artigo 13.º, assim como o acesso ao direito e a uma tutela jurisdicional efectiva da previsão do artigo 20.º e outros direitos pessoais da previsão do artigo 26.º n.º 1 e 2, sendo todas estas disposições citadas da Constituição, já que a recorrida/requerente tem acesso aos autos, sendo a mesma sua irmã. No que concerne ao direito de igualdade e o acesso ao direito e a uma tutela jurisdicional efectiva, tal apenas estaria em causa se os recorrentes tivessem suscitado a sua intervenção de terceiros…” (sublinhado nosso). XIII.Foi precisamente o que os Recorrentes fizeram: suscitaram a sua intervenção nos autos, dando assim cumprimento ao Acórdão proferido, sendo que o Tribunal “a quo”, em clara violação do mesmo, decide de forma contrária, não interpretando e aplicando correctamente o decidido por esse Venerando Tribunal. XIV.Negar a possibilidade de acompanhamento do presente processo por parte dos Recorrentes, processo este fulcral para a vida da sua Mãe, mas garantindo tal acesso à sua filha e irmã dos Recorrentes, configura uma situação violadora do disposto no artigo 13.º, da Constituição da República Portuguesa. Sem prescindir de tudo quanto foi exposto, mas em seu complemento: XV.Tendo em conta a finalidade dos autos e atendendo ao que está subjacente, afigura-se que os Recorrentes têm todo o interesse em agir nos presentes autos, pois está em causa a vida e futuro da sua Mãe, existindo da sua parte interesse em agir, ao contrário do que determinou o despacho de que se recorre. XVI.O Tribunal “a quo” conduziu a presente questão a uma possibilidade de litisconsórcio, quando, na verdade o que subjaz aos autos é o interesse em agir dos Recorrentes. XVII.O interesse em agir deve nortear a intervenção dos Recorrentes nos autos. XVIII.No sentido de que os Recorrentes têm interesse em agir, veja-se o que decorre do Acórdão proferido pelo Tribunal da Relação de Lisboa, que sintetiza o interesse processual em agir da seguinte forma, em Acórdão proferido em 19.01.2017: I–O interesse em agir é também apelidado de “interesse de agir”, “interesse processual”, “causa legítima da acção”, “motivo justificativo dela”, “necessidade de agir, ou necessidade de tutela jurídica”. Como resulta de todas estas designações, consiste na necessidade de recorrer ao processo. II–O art 3º do CPC estrutura a acção judicial – qualquer acção - na base de um conflito de interesses, e este evidencia-se numa acção de simples apreciação positiva, perante a configuração pelo seu autor, através de factos, de uma atitude do réu que implique colocar em dúvida o seu direito ou a consistência do mesmo, e implicando para esse direito, um grave e objectivo estado de incerteza que possa comprometer o valor ou negociabilidade da própria relação jurídica; e numa acção de condenação, na configuração pelo seu autor, igualmente através de factos, de comportamentos do réu que impliquem a violação pelo mesmo daquele direito, ou a ameaça dessa violação.” (negrito nosso). XIX.O reconhecimento de que os Recorrentes têm interesse em agir, igualmente decorre do Acórdão proferido por V. Exas. no apenso A, onde foi claramente tomada a seguinte posição, já supra referida: “Neste caso haverá certamente um interesse dos recorrentes em agir, porquanto os mesmos são filhos da eventual beneficiária. Mas esse interesse, seja em demandar, seja em contradizer, está intimamente conexionado com a legitimidade processual, não subsistindo só por si (artigo 30.º NCPC).”. XX.Assim sendo e em conclusão, atento o que decorre do citado Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, bem como o que decorre dos presentes autos, mormente do Acórdão proferido por V. Exas. no apenso A, que é bem explicito e bastante clarificador sobre o interesse em agir por parte dos Recorrentes, e atento o facto dos Recorrentes terem agido de acordo com o que decorre do mesmo, torna-se incompreensível o despacho proferido. XXI.Impõe-se, assim, a revogação do despacho recorrido, porquanto o interesse em agir e em ser parte no presente processo se encontra mais do que justificado pelos Recorrentes, tendo esta posição sido sancionada por V. Exas. no Acórdão proferido. XXII.Desta feita, e em conformidade com o decidido por V. Exas., deve ser o despacho proferido revogado e substituído por outro que admita a intervenção dos Recorrentes presente processo, conforme por estes requerido, o que se requer que V. Exas. determinem.” A Digna Magistrada do Ministério Público contra-alegou pugnando pela total improcedência do recurso. A requerente do processo de acompanhamento de maior contra-alegou pugnando pela confirmação da decisão recorrida. O recurso foi admitido como de apelação, com subida imediata[3], em separado e no efeito meramente devolutivo. Atenta a natureza estritamente jurídica do objeto do recurso, os precedentes jurisprudenciais e doutrinais existentes, com o acordo dos restantes membros do coletivo dispensaram-se os vistos, cumprindo apreciar e decidir de imediato. 2. Questões a decidir tendo em conta o objeto do recurso delimitado pelos recorrentes nas conclusões das suas alegações (artigos 635º, nºs 3 e 4 e 639º, nºs 1 e 3, ambos do Código de Processo Civil, na redação aplicável a estes autos), por ordem lógica e sem prejuízo da apreciação de questões de conhecimento oficioso, observado que seja, quando necessário, o disposto no artigo 3º, nº 3, do Código de Processo Civil Da admissibilidade da intervenção principal espontânea dos recorrentes no processo de acompanhamento de maior instaurado para proteção da mãe dos recorrentes. 3. Fundamentos de facto Os fundamentos de facto necessários e suficientes ao conhecimento do objeto do recurso constam do relatório deste acórdão, resultam dos próprios autos, nesta parte com força probatória plena e não se repetem nesta sede por evidentes razões de concisão. 4. Fundamentos de direito Da admissibilidade da intervenção principal espontânea dos recorrentes no processo de acompanhamento de maior instaurado para tutela da mãe dos recorrentes Os recorrentes pugnam pela revogação da decisão recorrida e pela admissão da intervenção principal espontânea que deduziram, citando em abono da sua pretensão excertos dos fundamentos de direito do acórdão deste Tribunal da Relação de 29 de janeiro de 2021 que apreciou e negou a pretensão dos ora recorrentes a acederem ao processo de acompanhamento em que é beneficiária da eventual medida de acompanhamento a decretar a mãe de ambos, afirmando que o entendimento da decisão recorrida gera desigualdade entre os diversos filhos da beneficiária da eventual medida de acompanhamento, sendo ostensivo que ambos os recorrentes têm interesse em agir. Cumpre apreciar e decidir. A questão a apreciar nestes autos não é virgem doutrinal e jurisprudencialmente[4], pois que embora a produção doutrinal e jurisprudencial tenha incidido sobre o processo especial de interdição, as razões aduzidas são inteiramente transponíveis para o processo de acompanhamento de maior que veio substituir o processo especial de interdição. Assim, na doutrina, o Sr. Juiz Desembargador Emídio Santos[5] debruça-se sobre esta problemática nos seguintes termos: “Embora seja certo que o conceito de direito próprio tanto abrange os direitos subjectivos como os interesses próprios […], não se vê que, uma vez proposta acção de interdição ou inabilitação por alguma das pessoas a quem a lei reconhece legitimidade para tanto, os outros sujeitos a quem a lei também reconhece legitimidade para requerer a interdição ou habilitação [rectius inabilitação] possam invocar, em relação ao objecto da causa, um interesse igual ao do autor ou ao do réu. O único interesse a tomar em linha de conta é o do requerido. O requerente ou qualquer outra pessoa incluída no círculo definido pelo artigo 141.º do Código Civil, não pode invocar o direito de obter a interdição ou a inabilitação. É certo que até pode ter interesse em ver decretada a incapacidade do requerido. Não é, no entanto, o seu interesse que justifica a atribuição a si da legitimidade para instaurar a acção. O pedido de interdição ou inabilitação não visa, pois, dar satisfação a um direito ou interesse próprio de quem o faz; o beneficiário do pedido é o requerido.” Na jurisprudência, no sentido por que propugnam os recorrentes, pronunciou-se o acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, relatado em 05 de maio de 2009 pela Sra. Juíza Desembargadora Dina Monteiro, no processo nº 5198/07.4TVLSB-A.L1-7. No sentido da decisão recorrida recenseámos as seguintes decisões ordenadas por ordem cronológica: - acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra, relatado em 29 de maio de 2012 pelo então Sr. Juiz Desembargador Barateiro Martins, no processo nº 114/11.1TBFIG; - acórdão do Tribunal da Relação de Évora, relatado em 11 de abril de 2013 pela Sra. Juíza Desembargador Maria Alexandra A. Moura Santos, no processo nº 2362/09.5TBPTM-A.E1-A; - acórdão do Tribunal da Relação do Porto, relatado em 19 de setembro de 2013 pelo Sr. Juiz Desembargador Carlos Portela, no processo nº 2872/12.7TBGDM-A.P1; - acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães, relatado em 20 de março de 2018 pela Sra. Juíza Desembargadora Anabela Tenreiro, no processo nº 87/17.7T8BRG-A.G1. Que dizer? Nos termos do artigo 141º, do Código Civil, o acompanhamento é requerido pelo próprio ou, mediante autorização deste, pelo cônjuge, pelo unido de facto, por qualquer parente sucessível ou, independentemente de autorização, pelo Ministério Público. A autorização do beneficiário do acompanhamento para instauração do processo de acompanhamento pode ser suprida judicialmente quando este, em face das circunstâncias, não a possa livre e conscientemente dar ou quando para tal exista um fundamento atendível (artigo 141º, nº 2, do Código Civil), sendo que o pedido de suprimento da autorização do beneficiário pode ser cumulado com o pedido de acompanhamento (artigo 141º, nº 3, do Código Civil). Nos termos do artigo 311º do Código de Processo Civil, estando pendente causa entre duas ou mais pessoas, pode nela intervir como parte principal aquele que, em relação ao seu objeto, tiver um interesse igual ao do autor ou do réu, nos termos dos artigos 32º, 33º, e 34º, normativos que se referem, respetivamente, ao litisconsórcio voluntário, ao litisconsórcio necessário e à legitimidade conjugal. O interveniente principal faz valer um direito próprio, paralelo ao do autor ou do réu, apresentando o seu próprio articulado ou aderindo aos apresentados pela parte com quem se associa (artigo 313º do Código de Processo Civil). No caso dos autos, certamente para contornar os constrangimentos temporais de admissibilidade do incidente (veja-se o artigo 314º do Código de Processo Civil), pois que tinha sido já ultrapassada a fase dos articulados, os recorrentes declararam aderir ao seu requerimento de 06 de julho de 2020, inexistente processualmente como se deu já conta no relatório deste acórdão, sendo certamente o requerimento a que pretendiam referir-se o de 07 de julho de 2020 e do qual ressalta o interesse patrimonial próprio que os recorrentes têm neste caso e não propriamente um interesse na proteção da sua progenitora, único interesse relevante em sede de processo de acompanhamento de maior. De todo o modo, é algo caricata esta pretensão de adesão dos recorrentes a um requerimento próprio, requerimento que além disso é formulado por alguém a quem não é reconhecido a qualidade de parte, como se fosse possível aderir a um nada processual... A legitimidade que poderia assistir aos recorrentes em sede de processo de acompanhamento de maior cingia-se à instauração do processo, esgotando-se nesse ato e consumindo-se com esse mesmo ato a legitimidade concorrente dos restantes legitimados legalmente para essa propositura. Estando em causa com a instauração do processo de acompanhamento de maior a proteção do requerido nesses autos, inexiste qualquer tratamento desigualitário dos legitimados concorrentes se um deles se adianta na propositura da ação, ficando assim vedada aos restantes legitimados a manifestação de idêntica pretensão pois está concretizada processualmente a possibilidade de vir a ser apreciada a necessidade do acompanhamento requerido e, na afirmativa, a determinação concreta do figurino que esse acompanhamento pode assumir. Não existe no caso em apreço qualquer situação de litisconsórcio voluntário ou necessário e muito menos se coloca uma hipótese de legitimidade conjugal. Assim, por tudo quanto precede, é ostensivo que a requerida intervenção principal espontânea não é legalmente admissível. A circunstância de no acórdão proferido por este Tribunal da Relação em 29 de janeiro de 2021, em sede de fundamentos jurídicos, se ter admitido que a pretensão de acesso aos autos podia ser lograda mediante a dedução do incidente de intervenção principal é um mero obter dictum que não tem qualquer vinculatividade jurídica, pois que não constituía objeto do recurso aí conhecido, nem integrou o dispositivo do mesmo aresto. Assim, como todo o respeito pela opinião manifestada no aludido acórdão, pelas razões antes expostas diverge-se da mesma, confirmando-se a douta decisão recorrida. As custas do recurso são da responsabilidade dos recorrentes pois que decaíram (artigo 527º, nºs 1 e 2, do Código de Processo Civil). 5. Dispositivo Pelo exposto, os juízes subscritores deste acórdão, da quinta secção, cível, do Tribunal da Relação do Porto acordam em julgar improcedente o recurso de apelação interposto por F… e G… e, em consequência, em confirmar a decisão recorrida proferida em 11 de março de 2021. Custas do recurso a cargo dos recorrentes, sendo aplicável a secção B, da tabela I, anexa ao Regulamento das Custas Processuais, à taxa de justiça do recurso. *** O presente acórdão compõe-se de treze páginas e foi elaborado em processador de texto pelo primeiro signatário.Porto, 21 de junho de 2021 Carlos Gil Mendes Coelho Joaquim Moura ______________ [1] Não existe qualquer requerimento dos ora recorrentes com data de 06 de julho de 2020, apenas existindo um requerimento entrado via citius em 07 de julho de 2020, com o seguinte teor: “F… e G…, filhos da Beneficiária D… e Interessados nos presentes autos, vêm expor e requerer a V. Exa. o seguinte: A)DOS FACTOS, OMISSÕES E INVERDADES ALEGADOS PELA REQUERENTE NESTE PROCESSO 1º Importa em primeiro lugar rebater os factos não verdadeiros já invocados pela Requerente nesta lide. 2º Assim, há que inicialmente salientar de que os ora Interessados sempre acompanharam e acompanham a Beneficiária de forma regular até porque vivem cerca da sua residência e sempre zelaram pelo seu bem-estar, dando-lhe carinho e amor. 3º Inclusivamente foi o Interessado “F…” quem contratou as duas primeiras empresas de apoio domiciliário (H… e I…), por sua própria iniciativa, as quais se mantiveram ao serviço dos Pais, no período compreendido entre 2014 a 2019. (doc.1) 4º Aliás, as tarefas necessárias ao acompanhamento da Beneficiária (e também do seu marido) sempre foram divididas entre os três filhos, conforme é infra descrito aquando da “proposta de atribuição de funções a cada filho”. 5º Importa salientar, em segundo lugar, de que a procuração emitida pelo marido da Beneficiária a favor da Requerente aludia aos seus bens próprios os quais, conforme infra se evidenciará, eram pura e simplesmente inexistentes ou seja, o marido da Beneficiária nunca possuiu qualquer bem próprio. 6º Acresce que a procuração foi emitida numa época em que o marido da beneficiária, em função das doenças que padecia (demência da doença de Parkinson e demência da doença de Corpus de Lewy) já tinha dificuldade em acompanhar a gestão de dinheiros, tarefa que sempre confiara ao Interessado “F…” a quem, carinhosamente apelidava de “ministro das finanças”, devido à sua formação académica e profissional em economia e finanças, nele delegando total confiança. (doc.2) 7º Ora, a verdade é que a Requerente, através do mandato conferido e de forma abusiva, desviou as receitas da J… (bem próprio da Beneficiária) e da S… na … (bem comum do casal), para uma conta que foi aberta na L… em 27/10/2016 com o nº …………., em nome do marido da Beneficiária, o qual já padecia das graves limitações inerentes seu estado de saúde supra mencionadas. 8º E assim, a Requerente como única procuradora da conta bancária em causa, acabou por ser a única pessoa que efetivamente a movimentou, a seu bel-prazer e em evidente proveito próprio. 9º Ora, é evidente que esta decisão da Requerente lesou objetivamente os interesses da Beneficiária pois sempre ocultou as informações relativas a esta conta bancária, nunca tendo, em momento algum, prestado contas dos valores recebidos. 10º Assim, as despesas desses prédios continuaram a ser pagas pela conta da Família no Banco M…, S.A. com o nº …….., conta essa em que o marido da Beneficiária, a Beneficiária e cada um dos três filhos são individualmente solidários, 11º e os rendimentos reverteram para essa conta sempre oculta, sem que os Interessados pudessem efectuar qualquer supervisão, apesar de por diversas vezes o terem solicitado. (doc.3) 12º Importa ainda corrigir e comunicar de que: - O artigo rústico nº 228º da freguesia …, Fafe, é um bem próprio da Beneficiária e não um bem comum do casal; (doc.nº 4) - A Requerente omite na relação os seguintes imóveis: i. Artigo rústico 402 em … Fafe bem próprio da Beneficiária ii. Artigo urbano 4864-W em … Porto (apartamento onde a própria habita com a sua família desde 1989 e a título gratuito), bem comum do casal B)DO PATRIMÓNIO E DA GESTÃO CORRENTE 13º Há um claro propósito nos articulados já juntos pela Requerente a estes autos, em acrescentar despesas e desconsiderar receitas, subvertendo a realidade económica e financeira da Beneficiária, que é tudo menos precária, como adiante se explanará. 14º Assim, as despesas invocadas pela Requerente estão empoladas com gastos não recorrentes (sem periodicidade mensal), como são as despesas de funeral (que serão parcialmente reembolsadas), despesas de luz (acerto anual EDP Conta Certa), IRS (acerto anual), IMI (um terço do valor anual), as quais por manifesto interesse são incluídas na descrição. 15º Efetivamente as despesas regulares mensais ascendem a, aproximadamente, €: 5.000,00 (cinco mil euros) excluindo a J…, onde se incluem as cuidadoras, empregada domestica, fornecimentos e serviços de terceiros (FST’s), alimentação, terapeuta, medicação e material geriátrico. 16º Do lado das receitas, a Requerente, apesar de referir os rendimentos de casas na …, Algarve, não as considera no somatório, fazendo descer consideravelmente o seu valor. 17º Assim, para além da sua própria pensão, a Beneficiária irá receber uma pensão de viuvez por morte do seu marido, que deverá rondar os 300€ mensais. (docs.5 e 6) 18º Assim, considerando as pensões e a renda de um escritório, bem comum do casal, estes rendimentos ascendem a cerca de 14.000€ anuais. 19º Acrescem os rendimentos das casas na …, Algarve, cujos valores declarados pela Requerente deturpam de forma indigna a realidade. 20º Os números apresentados pela Requerente referem-se apenas a três das quatro casas no aldeamento, excluindo deliberadamente a S…, que a própria administra em proveito próprio e em prejuízo da Beneficiária, cujo contrato de exploração com o empreendimento da … foi cancelado, por sua única e exclusiva iniciativa e à total revelia dos Interessados, em Abril de 2017 e cujas receitas revertem para a conta bancária referida nos artigos 7º e 8º supra. 21º Acresce que as contas apresentadas das restantes casas da … se referem apenas ao segundo semestre de 2019 (pagamento de 25% em 26/06/2020), omitindo deliberadamente os rendimentos do primeiro semestre (pagamento em 14/02/2020), e induzindo assim a uma leitura deficiente e subestimada das receitas respectivas. (doc.7) 22º Para comparação, apresentam-se os mesmos rendimentos auferidos nos anos de 2016 e 2017 ou seja, os últimos dois anos em que as quatro casas estiveram entregues à exploração e a totalidade dos rendimentos foram creditados na mencionada conta da Família no Banco M…, os quais evidenciam uma média anual de cerca de 40.000€. ou seja: - Ano de 2016: 36.988,09€ - Ano de 2017: 42.855,08€ (doc.8) 23º Para além dos rendimentos supra mencionados existe um património financeiro em duas contas da Família (a dita conta no Banco M… e outra no N…, também com cinco titulares solidários), para além da conta na L… referida no ponto 7 supra, que permite a obtenção de alguns rendimentos adicionais e cuja “declaração de saldos por óbito do cliente” se anexa e ascende a 419.391,15€. (doc.9) 24º A totalidade dos rendimentos anuais ascende portanto a aproximadamente 54.000€, não estando assim muito abaixo das despesas anuais supra mencionadas. 25º Conclui-se assim que é completamente falso que a Beneficiária esteja numa situação financeira precária, dramática, aflitiva, como a Requerente pretende fazer crer. 26º E mesmo que suceda qualquer calamidade, que não se vislumbra, a Beneficiária tem os seus três filhos no ativo, com rendimentos e património suficientes para acudirem a qualquer necessidade extrema. 27º Assim, inexiste a necessidade de serem decretadas medidas provisórias e urgentes, como é solicitado pela Requerente, 28º e só prosseguindo fins ínvios e inconfessáveis é que se entende a sua insistência em peticionar o sigilo desta ação e em dispensar o seu necessários acompanhamento por parte dos Interessados. 29º Mais “espanto” causa ainda a alegada ignorância declarada pela Requerente sobre as receitas e despesas dos Pais, declarando que só nestes últimos dois meses (maio e junho 2020) tomou conhecimento da realidade, quando a troca de informação tem sido constante (doc.nº 10) 30º E quando é certo de que todos documentos, que ela própria apresenta nos seus articulados sempre foram do inteiro e total conhecimento de toda a Família, Requerente obviamente incluída. 31º Com efeito, a Requerente sempre teve ao longo dos anos acesso “online” à conta por onde se faziam os pagamentos, assim como cartão multibanco das mencionadas contas. 32º O desplante é tal que a Requerente indicia no artigo 27º do requerimento junto a estes autos a 30.06.2020 de que houve o risco de não se proceder ao pagamento das despesas, com as inerentes consequências. 33º Ora, qualquer um dos filhos pode movimentar as duas contas do M… e do N…, conforme documentos que se juntam como anexos (v.g. doc.9) pelo que esse risco nunca existiu. C)A INTERDIÇÃO DA J… 34º Conforme supra descrito, a partir de 2016 e fazendo uso da predita procuração, a Requerente passou a administrar, para além da S… da … (bem comum do casal), a J… (bem próprio da Beneficiária), 35º sendo esta uma unidade de turismo de habitação em … Fafe, em moldes que mereceram constantes objeções e reparos por parte dos Interessados, por nunca lhes ter apresentado contas dessa gestão, 36º para além de ter sonegado as receitas da conta da Família, desviando-as para a já várias vezes referida conta na L…. 37º Argumenta a Requerente no requerimento de 30.06.2020, de que o pedido de aplicação imediata de medidas provisórias e urgentes se justifica com o facto de “estar a decorrer a época alta do turismo, que importará rentabilizar, de forma a assegurar a sustentabilidade económica da Beneficiária”. 38º Ora, a Requerente está, intencional e gravemente, a omitir a Verdade dos factos ao Tribunal. 39º Com efeito, a utilização da J… foi INTERDITADA pelas autoridades competentes. 40º Com efeito, esta ocorrência também foi ocultada pela Requerente aos Interessados e, apesar da sua insistência para esclarecer o ocorrido, nada disse. 41º Dada a impossibilidade de os interessados obterem esclarecimentos por parte da Requerente, e de conseguirem consultar junto do ACT o processo, evidenciam-se os seguintes factos: - Em meados de 2019 o ACT fez uma inspeção à J…, tendo detetado irregularidades nos contratos de trabalho dos empregados. - Terá sido instaurado um processo de contraordenação e consequente interdição da J…; - Em 31/07/2019 é cessada a actividade que sempre havia estado em nome da Beneficiária transmitindo-a para o seu marido, com efeitos retroagidos a 01/07/2019. (docs.nºs 11, 12 e 13) - No dia 03/10/2019 os dois empregados da J… recebem por parte da Requerente uma carta a declarar a caducidade do contrato de trabalho por encerramento da empresa a partir de 02/12/2019, alegando que o estado de saúde do marido da Beneficiária não permitia a continuação da atividade turística. (doc.nº 14) - No dia 31/10/2019 os dois empregados da J… enviam carta de “denúncia do contrato pelo trabalhador durante o aviso prévio”, alegando despedimento coletivo. (doc.nº 15) - No dia 5 de Novembro de 2019 a Requerente informa que a pretensão dos dois trabalhadores não é invocável. (doc.nº 16) - No dia 02/12/2019 os dois empregados cessam o seu vínculo à J…, conforme resulta do mencionado doc.nº 14. - No mesmo dia 02/12/2019 é encerrada atividade de Turismo no Espaço Rural em nome do marido da Beneficiária. (doc.nº 17) 42º A realidade é que a J… está encerrada, não sabendo os Interessados até que data esse encerramento está determinado e se o foi por mais do que uma autoridade, ACT, ASAE e/ou Turismo de Portugal… 43º A verdade é que a Requerente sempre se recusou e recusa a prestar qualquer informação aos Interessados… 44º E é também verdade que neste momento a plataforma “Booking” não aceita reservas para os meses de julho e agosto 2020, só as permitindo a partir do dia 1 de setembro. (doc.18) 45º Porém, pelo que foi informalmente referido aos Interessados, a suspensão determinada estender-se-á pelo prazo de um ano, só sendo levantada no próximo mês de dezembro de 2020. 46º Pelo exposto, os factos alegados pela Requerente, mormente os referidos nos artigos 17 a 19 do seu requerimento de 30.06.2020 não colhem, dado que o real motivo para a recusa das reservas não é o apresentado, mas antes o facto da J… estar interditada. 47º Tanto assim é que a atividade turística poderia ser reaberta sem qualquer entrave, não fora a dita interdição, ao contrário do que é invocado no artigo 23 de tal requerimento, (doc.19) 48º E a atividade turística esteve aberta em nome do marido da Beneficiária apenas durante 5 meses, e por motivos diferentes do invocado no artigo 22 respectivo. 49º Os factos aqui descritos denotam uma evidente administração deficiente e pouco zelosa do património da Beneficiária, a qual levou ao encerramento da atividade turística, 50º perdendo a Beneficiária e toda a sua Família várias dezenas de milhares de euros em reservas, durante este período temporal. 51º Toda esta pressão, todo este secretismo para obter um rápido deferimento às suas pretensões, o pedido de caráter de urgência, são de molde a levantar legítimas dúvidas (se não mesmo certezas…) junto dos Interessados sobre as verdadeiras motivações e objetivos da Requerente ao interpor a presente lide. D)PROPOSTA DE ATRIBUIÇÃO DE FUNÇÕES A CADA FILHO 52º Decorre do exposto que a pretensão da Requerente em ser nomeada Acompanhante da Beneficiária, com exclusividade de poderes para si e excluindo os Interessados de toda e qualquer função, não é de todo Beneficiária. 53º Assim e em alternativa, propõem os Interessados atento o supra exposto, ao abrigo do disposto no artigo 143º nº 3 do Código Civil e tendo em conta a evidente gravidade da conduta da Requerente, que todos os filhos sejam nomeados como Acompanhantes de sua Mãe e com a seguinte distribuição de funções, tendo em conta a competência académica/profissional e as tarefas já desempenhadas por cada um em vida do marido da Beneficiária: - Requerente: formação universitária em Letras, professora -Interessado F…: formação universitária em Economia, gestor de patrimónios/ativos financeiros, empresário - Interessado G…: formação universitária em Engenharia, diretor técnico engenharia 54º Os três filhos, sem excepção, faziam e fazem o acompanhamento das necessidades diárias dos Pais e da dinâmica da sua residência, prestando carinho e bem-estar. 55º Os Pais têm desde novembro 2012 acompanhamento 24h/dia de cuidadoras especializadas, inicialmente a nível particular e a partir de julho 2014 através de empresas especializadas (contratadas e geridas pelo Interessado F… até abril 2019) e que acompanham todas as necessidades de cuidados pessoais. 56º Noutras áreas que os Pais necessitavam de apoio, destaca-se o seguinte: Requerente: - gestão do turismo da J…, a partir da incapacidade da Beneficiária. - gestão de uma das casas da … (S…), que estava entregue à exploração do aldeamento, e que em 2017 foi retirada para gestão da própria; Interessado F…: -gestão das aplicações financeiras -gestão e pagamentos ao pessoal, auxiliares, empresas de cuidados ao domicílio, obrigações fiscais Interessado G…: -gestão de obras efectuadas -tratamento de avarias, manutenções e reparações -manutenção da piscina 57º Justificação da Proposta de Divisão de Tarefas Apesar da gravidade da conduta da Requerente detalhadamente explanada neste requerimento, a verdade é que os Interessados não pretendem responder “na mesma moeda”, sempre pugnando de que todos são filhos da Beneficiária e que a repartição de funções deve ter em conta a natural competência e conhecimentos técnicos de cada um. Assim, considerando que: - Os cuidados diários de alimentação e higiene da Mãe estão entregues a uma empresa especializada, que assegura esses cuidados ao domicílio 24h por dia, durante todo o ano e também está ao serviço uma terapeuta ocupacional. - Adicionalmente a Beneficiária usufrui ainda do acompanhamento da O…, empregada doméstica na casa há 32 anos (durante as tardes dos dias úteis). - Regularmente recebe a visita dos três filhos. - Os três filhos têm estado sempre disponíveis para qualquer necessidade extraordinária, como seja acompanhamento a consultas externas, compras de medicação, bens de primeira necessidade. - A Requerente por uma questão de maior disponibilidade pessoal que os irmãos e por ser mulher e portanto mais íntima da Beneficiária, estará habilitada a prestar os cuidados relacionados com as necessidades pessoais da Mãe, não invalidando que os Interessados a possam substituir em caso de necessidade, como sempre aconteceu. - Os Interessados estarão mais habilitados a cuidar das tarefas que já desempenhavam até à presente data, conforme resulta do artigo 56º supra. - Que relativamente à gestão do património imóvel da Beneficiária (bens próprios e bens do casal), a situação atual é a seguinte: a)P… (art. urbano nº 2332, UF … Porto): habitada pela Beneficiária; b)Escritório (art. urbano nº 5683-C39, … Porto) arrendado a Q…, Lda c)Apartamento … (art. urbano nº 4864-W, … Porto): habitado pela Requerente desde 1989 a título gratuito e que não foi por ela relacionado nestes autos, conforme supra referido d)T…, U… (usufruto) e V… (art. urbano nº 1137, nº 5992-J e nº 1277-A, respetivamente, todos em … Portimão): exploração entregue ao aldeamento da … e)S… (art. urbano nº 1146, … Portimão) e J… (art. urbano nº 63, … Fafe): a gestão destas casas sempre foi totalmente ocultada como já foi amplamente supra relatado e não tem a confiança dos Interessados. - Que urge clarificar os rendimentos destes prédios, os quais deverão ser revertidos para contas bancárias onde todos os irmãos a elas tenham acesso e possam realizar o devido escrutínio, devendo a casa S… da … regressar à exploração do aldeamento (onde sempre esteve até 2017), a qual merece toda a confiança dos Interessados e apresenta-se como a solução mais prática, económica, e que melhor salvaguarda o património da Beneficiária. - Que relativamente à gestão da J…, dada a sua dimensão e complexidade, deverá ser repartida por funções entre os três filhos, cabendo a cada um oferecer os seus préstimos nas áreas onde são mais competentes e têm experiência demonstrada. Requer-se a V. Exa. se digne ordenar o seguinte: Tarefas a desempenhar pelos filhos no Acompanhamento da Beneficiária: Requerente: i. gestão das necessidades pessoais e cuidados especiais da Mãe (consultas, medicamentos, produtos de cuidados de saúde, vestuário e calçado, alimentação, produtos para casa) ii. responsabilidade pela supervisão operacional do pessoal ao serviço da P… (empregada doméstica, cuidadoras domiciliárias, terapeutas), de forma a zelar pelo bom funcionamento da Casa e desempenho dos serviços das cuidadoras e serviços domésticos. iii. Gestão administrativa/operacional da J…, nomeadamente gestão das reservas, supervisão operacional dos empregados, zelar pelo bom funcionamento da actividade turística, compras de mantimentos e produtos para casa. iv. responsabilidade pela administração das áreas agrícolas adjacentes à J…, assim como zelar pela boa manutenção dos jardins da casa Interessado F…: i. gestão financeira e pagamentos ao pessoal, auxiliares, empresas de cuidados ao domicílio, e restantes obrigações emergentes na P… ii. gestão financeira da J…, nomeadamente gestão das necessidades de investimento e/ou reparações necessárias, gestão das receitas do turismo, pagamento das despesas de pessoal e de funcionamento iii. gestão do património financeiro da Beneficiária, incluindo obrigações fiscais iv. gestão dos contratos de trabalho e serviços da J… e da P… Interessado G…: i. gestão técnica da J… (manutenções, reparações, necessidades de investimento, obras) ii. gestão técnica da P… (manutenções, reparações, necessidades de investimento, obras, jardim e piscina) iii. responsável pela boa execução dos contratos de arrendamento do consultório e das quatro Casas do Aldeamento da … iv. Manutenção das viaturas Volkswagen … ..-..-UJ e Ford … ..-..-RQ”. [2] Notificado às partes e aos requerentes do incidente de intervenção mediante expediente eletrónico elaborado em 12 de março de 2021. [3] No atual Código de Processo Civil não há recursos com subida imediata ou diferida mas apenas decisões passíveis de recurso autónomo ou não autónomo. [4] Referimo-nos a jurisprudência publicada na base de dados da DGSI. [5] In Das Interdições e Inabilitações, Quid Juris 2011, páginas 47 a 50, sendo o trecho transcrito da página 49. |