Acórdão do Tribunal da Relação do Porto | |||
Processo: |
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Nº Convencional: | JTRP000 | ||
Relator: | MIGUEL BALDAIA DE MORAIS | ||
Descritores: | SOCIEDADE ANÓNIMA ACIONISTAS DIREITO À INFORMAÇÃO ASSEMBLEIA GERAL DELIBERAÇÕES SOCIAIS ANULÁVEIS LUCROS DISTRIBUIÇÃO DE LUCRO | ||
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Nº do Documento: | RP202211144957/20.7T8VNG.P1 | ||
Data do Acordão: | 11/14/2022 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Texto Integral: | S | ||
Privacidade: | 1 | ||
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Meio Processual: | APELAÇÃO | ||
Decisão: | CONFIRMADA | ||
Indicações Eventuais: | 5ª SECÇÃO | ||
Área Temática: | . | ||
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Sumário: | I - O direito que, em geral, assiste ao sócio de obter informações sobre a vida da sociedade de cujo capital participa manifesta-se em três diferentes vertentes: como direito à informação stricto sensu, que permite ao sócio formular questões sobre a vida da sociedade e desta exigir resposta verdadeira, completa e elucidativa; como direito de consulta, para cujo exercício o sócio pode solicitar que a sociedade exiba, para exame, os livros de escrituração e outros documentos descritivos da atividade social; como direito de inspeção, assim podendo o sócio vistoriar os bens da sociedade. II - No que diz respeito ao direito de informação que assiste aos acionistas, o legislador, nos artigos 288º a 290º do Código das Sociedades Comerciais, estabeleceu um distinguo entre um direito mínimo à informação, um direito a informações preparatórias da assembleia geral e de um direito à informação em assembleia geral. III - O direito a informações preparatórias da assembleia geral destina-se a facultar ao acionista a possibilidade de recolher os elementos e as informações necessárias para tomar posição relativamente aos assuntos que irão ser debatidos nesse ato e para exercer o seu direito de voto de forma consciente e fundamentada. IV- Sendo essa a ratio essendi da consagração desse direito, somente deverá conduzir à anulação da deliberação, à luz do disposto na alínea a) do nº 1 do artigo 58º do Código das Sociedades Comerciais, a falta de informação que seja suscetível de afetar e viciar a manifestação de vontade por parte do acionista relativamente à concreta deliberação que se pretende ver anulada, isto é, torna-se necessário que a não prestação de informação tenha influído direta e decisivamente no sentido da deliberação, por ter impedido que a sua vontade se manifestasse de forma completamente esclarecida. V - O sócio/acionista, enquanto proprietário de uma participação social, fica investido num conjunto unitário de direitos e obrigações, sendo uns de natureza patrimonial, enquanto outros assumem uma natureza “administrativa”, que servem, essencialmente, a participação no funcionamento da sociedade (como é o caso do direito de voto). VI - No que tange aos direitos patrimoniais, destaca-se o direito a quinhoar nos lucros, o qual traduz uma caraterística essencial da sociedade, sendo, por isso, irrenunciável e inderrogável. VII - Por força do regime imperativamente estabelecido nos artigos 32 e 33º do Código das Sociedades Comerciais, enquanto houver prejuízos a cobrir e reservas a constituir ou reforçar, não poderão os sócios/acionistas receber quaisquer quantias ou bens a título de lucros, pelo que, nessas circunstâncias, somente havendo o que se vem denominando de “lucro de balanço” (diferença entre o património social líquido e a soma do capital social e das reservas) pode chegar ao património pessoal daqueles o que usa designar-se dividendo (ou direito ao lucro periódico) e que é o fruto de cada participação social. VIII - No que se refere às sociedades anónimas, por mor do disposto no artigo 294º do Código das Sociedades Comerciais, havendo lucro de exercício distribuível, não pode, por via de regra, deixar de ser distribuída aos acionistas metade desse lucro. IX - No entanto, o direito dos acionistas à distribuição dessa percentagem do lucro distribuível não é um direito absoluto, podendo ser afastado, mediante uma de duas formas: (i) através de uma cláusula do pacto que estabeleça regime diverso; (ii) através de uma deliberação aprovada por uma maioria qualificada de ¾ dos votos correspondentes ao capital social. | ||
Reclamações: | |||
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Decisão Texto Integral: | Processo nº 4957/20.7T8VNG.P1 Origem: Tribunal Judicial da Comarca do Porto, Vila Nova de Gaia – Juízo de Comércio, Juiz 1 Relator: Miguel Baldaia Morais 1º Adjunto Des. Jorge Miguel Seabra 2ª Adjunta Desª. Maria de Fátima Andrade * SUMÁRIO……………………………… ……………………………… ……………………………… * Acordam no Tribunal da Relação do Porto:I- RELATÓRIO “M..., Lda.” veio intentar a presente ação declarativa em processo comum contra “B..., S.A.”, pedindo que seja declarada nula a deliberação tomada na assembleia geral da ré realizada em 16 de julho de 2020. Para substanciar tal pretensão alega ser acionista da ré, tendo sido convocada para uma assembleia geral a realizar na referida data, sendo que da respetiva convocatória faziam parte os seguintes pontos da ordem de trabalhos: “A) Discussão e votação das contas do exercício de 2019; B) Discussão e votação da proposta do Administrador Único sobre aplicação dos resultados do exercício constante do relatório de gestão”. Acrescenta que na convocatória vinha anexo o Balanço de 2019 e o relatório de gestão, não tendo sido enviado o parecer do ROC. Mais alegou que, na data agendada, realizou-se a assembleia geral da ré, na qual não esteve presente o fiscal único, tendo estado presentes todos os acionistas, sendo que a autora, através do seu representante, pediu esclarecimentos, aos quais o administrador único respondeu, considerando a autora que as respostas dadas foram evasivas, sem qualquer concretização ou explicação plausível. Referiu ainda que não teve acesso ao parecer do Fiscal único sobre as contas do exercício do ano de 2019, facto que não lhe permitiu obter a informação necessária sobre a vida da sociedade, tendo sérias dúvidas sobre os esclarecimentos prestados na assembleia geral pelo administrador dada a ausência do fiscal único e inexistência do respetivo parecer. Conclui dizendo que, por violação do direito à informação, se viu impedida de votar esclarecidamente as deliberações em crise, sendo que estas são nulas por ofensivas dos bons costumes, constituindo um manifesto abuso de direito por parte dos sócios que votaram favoravelmente a deliberação de distribuição de apenas 50% dos lucros, já que a mesma visou prejudicá-la, obstando a que pudesse obter a adequada rentabilidade pela sua participação social. Devidamente citada, a ré deduziu contestação, pugnando pela improcedência da presente ação. Alega, para tanto, que a ata da assembleia geral foi lavrada em colaboração com o representante da autora, que aceitou a sua redação. Por outro lado, entre a convocatória da Assembleia Geral (08.06.2020) e a referida Assembleia Geral (16.07.2020) decorreram quase 5 semanas, sendo que durante tal período nenhum pedido de esclarecimento ou dúvida foi transmitida à Ré. A autora, simplesmente, compareceu na Assembleia Geral, aí solicitando os esclarecimentos que ficaram lavrados em ata, não tendo requerido qualquer outro esclarecimento, sendo certo que se outras questões tivessem sido levantadas, teriam as mesmas sido certamente esclarecidas. Alega também que todos os elementos de informação relativos à atividade da R. estiveram sempre à disposição da A., inclusive na Assembleia Geral, sendo que o parecer do ROC foi, efetivamente, enviado posteriormente à convocatória, mas a tempo de ser estudado pela autora, não tendo esta levantado qualquer objeção nessa assembleia no que respeita à falta do relatório do ROC, quer à ausência deste. Acrescenta que todos os elementos de informação relativos à atividade da Ré estiveram sempre à disposição da autora, quer anteriormente, quer no dia da Assembleia Geral, não tendo a mesma manifestado qualquer intenção de consultar qualquer informação, nem se “queixou” de lhe ter sido sonegada ou escondida informação. Por último, refere que, nessa assembleia, a autora não apresentou qualquer outra proposta de distribuição dos lucros, limitando-se a votar “contra” a proposta de aplicação de resultados, sendo que a deliberação em causa foi tomada por não se revelar aconselhável uma maior distribuição dos lucros em face das circunstâncias do mercado. Foi proferido despacho saneador em termos tabelares, definiu-se o objeto do litígio e fixaram-se os temas de prova. Realizou-se audiência de julgamento, vindo a ser proferida sentença que julgou a ação improcedente. Não se conformando com o assim decidido, veio a autora interpor o presente recurso apelação, que foi admitido a subir nos próprios autos e com efeito meramente devolutivo. Com o requerimento de interposição do recurso apresentou alegações, formulando, a final, as seguintes CONCLUSÕES: 1. A sentença recorrida acabou por considerar a acção totalmente improcedente e em consequência absolveu a Ré B... do pedido. 2. A aqui recorrente não pode aceitar o entendimento do tribunal recorrido. 3. Conforme resulta dos factos provados na assembleia geral de 16 de Julho de 2020 foram aprovadas as contas do exercício do ano de 2019 e a proposta do Administrador Único sobre a aplicação dos resultados do exercício. 4. Na acção interposta pela Autora discutiam-se duas questões: a violação do dever de informação e a violação do dever de distribuição dos lucros. 5. Começando pela violação do dever de informação, a aqui recorrente alega que o relatório do ROC não foi enviado com a convocatória nem o Fiscal único esteve presente na assembleia geral de aprovação de contas. 6. Ora sobre a questão do relatório do Fiscal Único a sentença recorrida de forma surpreendente dá como não provado factos negativos (“não tenha sido enviado posteriormente o parecer do ROC à A. e “a autora, antes da assembleia, não tenha consultado na sede social os documentos de suporte da contabilidade”). 7. Ora tendo a Autora alegado que não lhe foi enviado o referido relatório cabia à Ré a prova do respetivo envio! E tendo sido notificada para o efeito não o fez! 8. A Ré foi notificada para o efeito e apenas em 16/3/2022 juntou o mesmo aos autos, apesar de na contestação (artigo 14º da contestação) referir que o mesmo tinha sido enviado à Autora! 9. Parece-nos pois claro que não se pode extrair a conclusão de que não tendo a Autora referido na ata que faltava o relatório do ROC que o mesmo tivesse sido enviado! 10. Sendo certo que a Fiscal Único não esteve presente na assembleia geral de aprovação de contas (dever esse previsto no artigo 422º nº 1 alinea a) do Código das Sociedades Comerciais). 11. O Fiscal Único ao não estar presente impediu de facto o accionista de obter uma informação profícua e verdadeira sobre as contas do exercício do ano de 2019, sendo certo que ao votar contra as contas do ano de 2019 mesmo após os esclarecimentos do Administrador Único a aqui recorrente apenas o fez por não ter um interlocutor que em principio será uma entidade independente e credível no sentido de ter efectuado uma fiscalização conscienciosa e imparcial das contas do ano de 2019. 12. Parece-nos assim claro que ao não ter tido acesso à certificação das contas do ano de 2019 por parte do ROC e à não comparência do ROC na assembleia geral a Autora viu coartado o seu direito à informação previsto no artigo 290º do Código das Sociedades Comerciais. 13. Já quanto à questão do dever de distribuição dos lucros. 14. Sabemos que esta questão é pouco debatida em termos de jurisprudência e doutrina sendo certo que ao contrário do que defende a sentença recorrida não se pode considerar como principio base o de que sendo distribuídos 50% dos lucros fica satisfeito o escopo legal. 15. O principio legal de distribuição mínima dos lucros pelos sócios (artigos 217 nº 1 e 294º nº 1 CSC) não pode implicar que não tenha que existir uma justificação por parte da Administração da sociedade para não ir além desse mesmo mínimo legal! 16. E no caso concreto vemos que a proposta de aplicação de resultados em momento algum justifica a razão de apenas serem distribuídos 50% dos lucros! 17. A sentença recorrida de forma surpreendente vem justificar estes 50% com o relatório do fiscal único junto aos autos em 16/03/2022! A assembleia geral realizou-se em 16 de Julho de 2020. 18. Na opinião da aqui recorrente e tendo por base o principio da defesa do interesse dos accionistas minoritários (e a aqui Recorrente é minoritária dado que as participações sociais ligadas ao Administrador Único AA levam-no a ter mais de 50% dos votos) a deliberação de distribuição dos lucros deve ser justificada no sentido de os sócios conseguirem perceber que determinada distribuição dos lucros (quer seja o mínimo legal ou sejam 60, 70 ou 80% dos lucros) é a que melhor serve os interesses da sociedade. Sendo que no caso vertente nenhuma justificação existe para que sejam distribuídos apenas 50% dos lucros do exercício. 19. Como sabemos nas sociedades existe a tendência para que a mesma se possa transformar numa relação de poder ou domínio da maioria. No caso do direito ao lucro, importa, a este respeito, diferenciar o direito a quinhoar nos lucros que a sociedade venha a distribuir (ou direito ao lucro stricto sensu) que constitui um núcleo inderrogável do sócio, não estando sob o império do princípio maioritário, mas tal já assim não sucede com o direito a uma efetiva distribuição de lucros distribuíveis. 20. Parece-nos assim claro que atendendo à tendência moderna da protecção das minorias, nomeadamente, naquelas sociedades em que não ocupam cargos sociais remunerados (e, portanto, não têm acesso às vantagens que, por essa via, a corporação proporciona aos maioritários) nem conseguem beneficiar efetivamente da valorização que a sociedade vai tendo, por via da alienação das participações, no todo ou em parte, dada a ausência de mercado para as mesmas. 21. Acresce que, com frequência, a situação dos minoritários ainda é agravada pela circunstância de, em relação a eles, a sociedade funcionar, não como uma plataforma de colaboração na realização do fim comum, mas como uma estrutura de poder de que a maioria se serve para a gerir como coisa própria. 22. Entendemos assim que existe de facto a nulidade da deliberação que aprova a distribuição de 50% dos lucros sem que tal deliberação tenha qualquer justificação no sentido de que a mesma é que a melhor defende os interesses da sociedade e dos sócios. 23. Violou pois a sentença recorrida o vertido no artigo 56º nº 1 d) do CSC. * Não foram apresentadas contra-alegações.* Após os vistos legais, cumpre decidir.*** II- DELIMITAÇÃO DO OBJETO DO RECURSOO objeto do recurso é delimitado pelas conclusões da alegação do recorrente, não podendo este tribunal conhecer de matérias nelas não incluídas, a não ser que as mesmas sejam de conhecimento oficioso – cfr. arts. 635º, nº 4, 637º, nº 2, 1ª parte e 639º, nºs 1 e 2, todos do Código de Processo Civil. Porque assim, atendendo às conclusões das alegações apresentadas pela apelante, a questão solvenda traduz em saber se as deliberações aprovadas em assembleia geral da ré realizada no dia 16 de julho de 2020 enfermam de vício de invalidade por violação do dever de informação e do dever de distribuição de lucros. *** III. FUNDAMENTOS DE FACTO III.1. Factualidade considerada provada na sentença O tribunal de 1ª instância considerou provada a seguinte matéria de facto: 1. A sociedade «B..., S.A.» é uma sociedade anónima, cuja atividade consiste na comercialização por grosso e a retalho de computadores, periféricos, equipamentos informáticos e Software; outras atividades relacionadas com as tecnologias da informação e informática; Equipamentos de videovigilância; material eletrónico, audiovisual e telecomunicações; prestação de serviços de internet, multimédia, de formação, consultadoria e programação informática. 2. O capital social da sociedade Ré é de € 50.000,00 correspondente a cinquenta mil ações de € 1,00 cada uma e encontra-se repartido da seguinte forma: - AA é titular de 2000 ações de € 1,00 cada uma; - BB titular de 2000 ações de € 1,00 cada uma; - “A..., Lda.” é titular de 15834 ações com o valor nominal de € 1,00 cada uma; - “A1..., Lda.” titular de 11550 ações com o valor nominal de € 1,00 cada uma; - CC é titular de 2000 ações com o valor nominal de € 1,00 cada uma; - a Autora é titular de 16.666 ações com o valor nominal de € 1,00 cada uma. 3. O sócio AA é o Administrador Único da Ré. 4. Por carta registada datada de 08 de junho de 2020 foi convocada assembleia geral ordinária da Ré, a ter lugar em 16.07.2020 pelas 14h30m, na sede social da Ré. 5. Da convocatória da reunião faziam parte os seguintes pontos da ordem de trabalhos: “A) Discussão e votação das contas do exercício de 2019; B) Discussão e votação da proposta do Administrador Único sobre aplicação dos resultados do exercício constante do relatório de gestão”. 6. Na convocatória vinha anexo o balanço de 2019 e o relatório de gestão. 7. Em 16 de julho de 2020 pelas 14h30 realizou-se a assembleia geral da Ré, tendo estado presentes todos os sócios, sendo a Autora representada pelo Dr. DD. 8. Entrando no primeiro ponto da ordem de trabalhos consta da ata que “Em relação ao ponto 1, foram pedidos esclarecimentos pelo representante da acionista M... aos quais o Administrador Único respondeu, a saber: a) No balanço em inventários, qual a razão para o acréscimo de cerca de 75.000,00 Euros; o Administrador esclareceu que tal se deveu à oportunidade de adquirir equipamentos a melhores preços para revenda e que se tratou de um lote que aliás foi vendido durante o período de confinamento decorrente do COVID; b) Qual a razão para o financiamento de 67.248,91 Euros contraído ? O Administrador esclareceu que se trata de um financiamento PME Investe, a taxa reduzida, para apoio a tesouraria; c) A razão para o acréscimo de gastos com pessoal, de cerca de 10.500,00? O Administrador respondeu ter sido admitido um novo funcionário, o que justificaria o acréscimo”. 9. As contas do exercício de 2019 foram aprovadas pela maioria dos sócios presentes e com o voto contra da aqui Autora - cfr. doc. 2 cujo conteúdo se dá por reproduzido para todos os efeitos legais. 10. Entrando no ponto 2 da ordem de trabalhos, relativo à aplicação dos resultados, foi deliberado que ao resultado liquido de 2019 seja dada a seguinte aplicação: - 5% para reserva legal, no valor de €1.613,92; - 50% para distribuição dos resultados, no valor de €15.332,27; - o restante para a conta de resultados transitados, no valor de €15.332,27. 11. Em relação ao ponto 2 consta da ata que a aqui Autora efetuou a seguinte declaração: “ Entende que deveria existir a distribuição integral do lucro do exercício, apenas com a dedução da reserva legal, considerando inclusivamente que a sociedade tem apresentado sucessivos lucros e nos últimos anos é sempre proposto que os mesmos sejam levados à conta de resultados transitados, o que é contraditório com a assunção de financiamentos bancários conforme resulta das contas de 2019 e anteriores, entendendo por isso a sócia M... que esta proposta visa tão só prejudicá-la enquanto acionista minoritária, com vista receber um dividendo inferior ao que efetivamente teria direito a receber “. E em consonância a aqui Autora votou também contra o segundo ponto da ordem de trabalhos - cfr. doc. 2 cujo conteúdo se dá por reproduzido para todos os efeitos legais. 12. Relativamente à aprovação das contas do ano de 2019 a aqui A., conforme consta da ata pediu alguns esclarecimentos e acabou por votar contra as referidas contas. 13. Não foram pedidos quaisquer outros esclarecimentos ou feitas outras declarações. 14. O fiscal único não esteve presente na assembleia. 15. A autora entre a altura em que recebeu a convocatória para a assembleia geral de 16.07.2020 e a realização desta não solicitou à ré qualquer esclarecimento ou informação. 16. Com convocatória para a assembleia geral a ré não remeteu à autora o parecer do ROC. 17. A autora não referiu na AG a falta de acesso aos documentos nem invocou a falta do fiscal único. * III.2. Factualidade considerada não provada na sentençaO tribunal de 1ª instância considerou que não se provaram os seguintes factos: 1. Não tenha sido enviado posteriormente o parecer do ROC à A. 2. A autora, antes da assembleia, não tenha consultado na sede social os documentos de suporte da contabilidade. 3. A situação financeira e económica da sociedade seja folgada. *** IV. FUNDAMENTOS DE DIREITOComo resulta da materialidade apurada (que não foi, fundadamente, posta em crise nas alegações recursivas), a ré é uma sociedade anónima cujo capital (de €50.000,00, correspondente a cinquenta mil ações de €1,00 cada uma) se mostra repartido da seguinte forma: - AA é titular de 2000 ações de € 1,00 cada uma; - BB é titular de 2000 ações de € 1,00 cada uma; - “A..., Lda.” é titular de 15834 ações com o valor nominal de € 1,00 cada uma; - “A1..., Lda.” é titular de 11550 ações com o valor nominal de € 1,00 cada uma; - CC é titular de 2000 ações com o valor nominal de € 1,00 cada uma; - A Autora é titular de 16.666 ações com o valor nominal de € 1,00 cada uma. Em conformidade com o regime vertido no Código das Sociedades Comerciais (CSC), por força da assunção da qualidade de acionista da sociedade ré, a autora ficou investida num conjunto unitário de direitos e obrigações (atuais e potenciais), contando-se entre aqueles, no que ao caso releva, o de “quinhoar nos lucros”, de “obter informações sobre a vida da sociedade” e de “participar nas deliberações de sócios” (cfr. art. 21º, nº 1, als. a), b) e c) do CSC), sendo que é através do voto que o sócio/acionista manifesta a sua vontade[1], contribuindo, assim, para a formação da vontade social. Deriva ainda dessa materialidade que a autora foi convocada, por carta registada datada de 8 de junho de 2020, para uma reunião da assembleia geral ordinária da ré a realizar no dia 16 de julho desse mesmo ano, cuja ordem de trabalhos, de acordo com o respetivo aviso convocatório, consistia “(i) na discussão e votação das contas do exercício de 2019; (ii) discussão e votação da proposta do administrador único sobre a aplicação dos resultados do exercício constante do relatório de gestão”. Realizada a referida assembleia geral, nela estiveram presentes ou representados todos os acionistas, sendo que as contas do exercício de 2019 foram aprovadas pela maioria (3/4) dos acionistas presentes, com o voto contra da ora autora. De igual modo a referida maioria (e também com o voto contra da autora) aprovou a proposta referente à aplicação de resultados desse exercício, deliberando-se que ao respetivo resultado líquido fosse dado o seguinte destino: . 5% para reserva legal, no valor de €1.613,92; . 50% para distribuição dos resultados, no valor de €15.332,27; . o restante para a conta de resultados transitados, no valor de €15.332,27. Não se conformando com tais deliberações, veio a autora veio, através da presente ação declaratória, impugná-las por reputar que as mesmas são inválidas por violarem o seu direito à informação (por não lhe ter sido enviado o parecer do fiscal único sobre as contas do exercício do ano de 2019 e por este fiscal não ter estado presente na assembleia geral) e bem assim violarem o dever de distribuição de lucros (por ter sido deliberada a não distribuição da totalidade dos lucros sem qualquer justificação). Tomando posição sobre tal matéria, na decisão recorrida o juiz a quo concluiu pela inverificação de qualquer um dos apontados vícios, por considerar que o substrato factual apurado evidencia que a ré não “violou qualquer direito de informação à autora de forma a invalidar a deliberação referente ao ponto 1 da ordem de trabalhos [isto é, quanto à discussão e votação das contas do exercício de 2019]”, nem afrontou o direito que lhe assiste em quinhoar nos lucros, porquanto “a deliberação referente ao ponto 2 dessa ordem de trabalhos [ou seja, discussão e votação da proposta do administrador único sobre a aplicação dos resultados do exercício constante do relatório de gestão] se mostra em conformidade com o disposto no art. 294º, nº 1, do CSC”. A apelante rebela-se contra esse segmento decisório, argumentando que, ao invés do que aí se afirma, registou-se efetivamente o desrespeito pelo seu direito à informação, posto que, com a convocatória para a ajuizada assembleia geral, não lhe foi remetido o parecer do fiscal único sobre as contas do exercício do ano de 2019, sendo certo outrossim que esse fiscal não esteve presente, como se impunha, nesse ato. Já relativamente à deliberação referente à distribuição de “apenas 50% dos lucros do exercício”, a mesma atinge o seu direito ao lucro, dado que foi tomada sem “qualquer justificação no sentido de que a mesma é a que melhor defende os interesses da sociedade e dos sócios”. Quid juris? Começando pelo primeiro dos vícios assacados às ajuizadas deliberações sociais, conforme deflui do respetivo regime jurídico, o direito do sócio/acionista de obter informações sobre a vida da sociedade manifesta-se em três diferentes vertentes: como direito à informação stricto sensu, que permite ao sócio formular questões sobre a vida da sociedade e desta exigir resposta verdadeira, completa e elucidativa; como direito de consulta, para cujo exercício o sócio pode solicitar que a sociedade exiba, para exame, os livros de escrituração e outros documentos descritivos da atividade social; como direito de inspeção, assim podendo o sócio vistoriar os bens da sociedade. O direito à informação tem sido caraterizado como um direito social autónomo, pois não pode dizer-se meramente instrumental ou acessório dos restantes direitos sociais, designadamente do direito de voto. Neste conspecto, a doutrina[2] converge no sentido de considerar que a atribuição desse direito ao sócio tem uma dupla justificação: por um lado, é corolário do risco que se corre com a entrada na sociedade, permitindo a reclamação de dados essenciais à salvaguarda da posição financeira e social do sócio (e assim se compreende a intensificação do direito com o aumento da responsabilidade pessoal), funcionando como uma “ferramenta de controlo social”; por outro lado, está associado ao elemento do contrato de sociedade “atividade em comum” (utilizado no art. 980º do Cód. Civil), uma vez que, independentemente do grau de participação na gestão, o sócio necessita conhecer todos os factos que sejam imprescindíveis ao exercício dessa função. No caso vertente, estamos em presença de uma sociedade anónima em que, de acordo com o respetivo regime legal, a responsabilidade pessoal e o envolvimento na gestão é menor para os acionistas do que para os sócios dos outros tipos de sociedades comerciais, não surpreendendo, por isso, que o direito de informação daqueles seja objeto de uma proteção menos intensa. Assim, no que diz respeito aos acionistas, o legislador, nos arts. 288º a 290º do CSC, estabeleceu um distinguo entre um direito mínimo à informação, um direito a informações preparatórias da assembleia geral e de um direito à informação em assembleia geral. Relativamente ao direito mínimo à informação, resulta do citado art. 288º que o mesmo não é reconhecido a todo e qualquer acionista, mas apenas aos que possuírem ações correspondentes a, pelo menos, 1% do capital social. Esse direito, na economia do preceito, traduz-se num direito de consulta (pelo próprio ou por pessoa que o possa representar na assembleia geral), na sede da sociedade, dos elementos taxativamente mencionados nas diversas alíneas do seu nº 1, sendo que essa consulta está subordinada à alegação de um “motivo justificado”, isto é, deve ser um motivo minimamente relevante e sério. Já no concernente às informações preparatórias da assembleia geral visam as mesmas permitir ao acionista preparar a sua participação nesse ato e até decidir se quer ou não nele participar. Para esse efeito, o art. 289º menciona quais as informações que devem estar à disposição dos acionistas da sociedade na sede desta[3], tratando-se de informações que qualquer deles pode consultar, independentemente da sua posição na sociedade. No entanto, tratando-se de acionista que seja titular de ações correspondentes a, pelo menos, 1% do capital social, podem estes, nos termos da al. a) do nº 3 do citado artigo, requerer que tais informações (e cópias dos respetivos documentos) lhes sejam remetidas através de carta, no prazo de oito dias. Por último, por mor do disposto no art. 290º do CSC, confere-se ao acionista o direito de, na assembleia geral, requerer que lhe sejam prestadas “informações verdadeiras, completas e elucidativas que lhe permitam formar opinião fundamentada sobre os assuntos sujeitos a deliberação”. Portanto, para além de verdadeira, completa e elucidativa[4], o acionista tem direito a que lhe sejam prestadas informações que permitam formar opinião fundamentada sobre os assuntos sujeitos a deliberação. E é precisamente para isso que pode pedir informações na assembleia. Balizado, deste modo sumário, o conteúdo do direito de informação que, em geral, assiste ao acionista na sociedade anónima em cujo capital participe, cumpre, então, agora apurar se a autora viu ser coartado esse seu direito social, sendo que, na sua alegação, essa violação ocorreu na vertente do direito a informações preparatórias da ajuizada assembleia geral. Já se deu nota, que o direito em causa se destina a facultar aos sócios/acionistas a possibilidade de recolherem os elementos e as informações necessárias para tomar posição relativamente aos assuntos que irão ser debatidos na assembleia e para exercer o seu direito de voto de forma consciente e fundamentada. Sendo essa a respetiva ratio essendi, não é, pois, de estranhar que a lei (art. 58º, nº 1 al. c), do CSC) determine a anulabilidade da deliberação que venha a ser tomada sem respeitar aquele direito; a deliberação é anulável porque a falta de informação aos sócios/acionistas é suscetível de afetar e viciar o processo que conduz à formação da vontade que se exprime pelo exercício do direito de voto. Mas, porque assim é, só deverá conduzir à anulação da deliberação a falta de informação que seja suscetível de afetar e viciar a manifestação de vontade por parte do sócio/acionista relativamente à concreta deliberação que se pretende ver anulada. Isso mesmo se enfatiza no acórdão do STJ de 16/03/2011[5] quando aí se refere que “só quando a falta de informação tenha efetivamente viciado a manifestação de vontade do sócio sobre o assunto sujeito a deliberação é que deverá admitir-se a solução da anulabilidade: é necessário que a não prestação de informação tenha influído direta e decisivamente no sentido da deliberação, por ter impedido que a vontade do sócio votante se manifestasse de forma completamente esclarecida”. Idêntico posicionamento é sustentado por PINHEIRO TORRES[6], que, perante a questão de saber qual o critério com base no qual se pode atribuir à falta de informações o efeito de produzir a anulabilidade de uma deliberação social, escreve que “não pode ligar-se, sem um qualquer critério, à omissão ou recusa de prestação de informações, esse efeito anulatório, sob pena de se criarem condições propícias a uma instabilidade inaceitável na vida da sociedade (…). Assim, só quando a falta de informação tenha efetivamente viciado a manifestação de vontade do sócio sobre o assunto sujeito a deliberação é que deverá admitir-se a solução da anulabilidade: é necessário que a não prestação de informação tenha influído direta e decisivamente no sentido da deliberação, por ter impedido que a vontade do sócio votante se manifestasse de forma completamente esclarecida (…)”. In casu, a violação do direito de informação que possa ter existido é meramente formal, uma vez que tal violação apenas se reconduz ao facto de, com a convocação para a assembleia geral, não ter sido remetido à apelante o parecer do fiscal único e de esse fiscal não ter comparecido nesse ato. Ora, se por um lado, não se nos afigure que a falta do referido fiscal constitua elemento mínimo de informação para os efeitos do disposto no art. 58º, nº 1, al. c) e nº 4, do CSC (sendo que o nº 4 do art. 422º deste mesmo diploma estabelece para esse comportamento uma sanção de diversa índole), por outro lado, resulta da materialidade apurada que o parecer do fiscal (cuja envio, note-se, não foi oportunamente requerido pela apelante, tal como determina a al. b) do nº 3 do art. 289º, do CSC) esteve disponível para consulta na sede da ré, sendo que aquando da realização da assembleia geral aquela não referiu que não lhe tivesse sido disponibilizada essa consulta, nem sequer invocou esse facto bem como a falta do fiscal como impedimentos para a manifestação do seu sentido de voto (sendo que, caso o fizesse, poderia justificar-se a suspensão dos trabalhos, nos termos do art. 387º do CSC), malgrado tenha aí formulado os pedidos de esclarecimento mencionados no ponto nº 8 dos factos provados, relativamente aos quais o administrador único respondeu (conforme decorre da ata que ficou a documentar a assembleia geral). Como assim, afigura-se-nos ser razoavelmente de concluir que a autora foi colocada em condições de analisar a informação referente aos assuntos que constavam da ordem de trabalhos e de, por essa via, poder formar uma opinião fundamentada e exercer o seu direito de voto de forma consciente, importando notar que não alegou que a informação que lhe foi entregue e os esclarecimentos que lhe foram prestados não fossem verdadeiros, estivessem incompletos ou que lhe tivessem sido recusados quaisquer outros elementos ou informações que tivesse solicitado. Entendemos, portanto, em face do exposto – tal como se considerou na sentença recorrida – que não há fundamento para anular a deliberação ao abrigo do disposto no artigo 58º, nº 1, alínea c), ou seja, por não ter sido precedida do fornecimento à autora/apelante de “elementos mínimos de informação”. * Importa agora apreciar o segundo fundamento invocado como causa de anulação das deliberações tomadas na assembleia geral ordinária, qual seja a circunstância de se ter deliberado não haver lugar a distribuição de lucros em montante superior a 50% do lucro distribuível. Como já anteriormente se deu nota, o sócio/acionista – enquanto proprietário de uma participação social - fica investido num conjunto unitário de direitos e obrigações, sendo uns de natureza patrimonial, enquanto outros assumem uma natureza “administrativa”, que servem, essencialmente, a participação no funcionamento da sociedade (como é o caso do direito de voto). No que tange aos direitos primeiramente referidos, destaca-se, desde logo, o direito a quinhoar nos lucros, o qual, aliás, traduz uma caraterística essencial da sociedade, sendo, por isso, irrenunciável e inderrogável[7]. De facto, como é pressuposto na constituição de uma sociedade (cfr. art. 980º do Cód. Civil), um dos seus elementos definidores[8] é, precisamente, a repartição entre os sócios dos lucros resultantes da sua atividade. A lei permite que se proceda a distribuições periódicas desse lucro (por via de regra, anualmente – cfr. arts. 65 e 376º, do CSC), efetuando-se, para esse efeito, uma avaliação daquilo que o ente societário tinha ao início e no fim do exercício, sendo que, havendo saldo positivo, o mesmo será partilhado entre os sócios em razão daquilo com que cada um contribuiu (cfr. art. 22º do CSC). No entanto, por força do regime imperativamente estabelecido nos arts. 32 e 33º do CSC, enquanto houver prejuízos a cobrir e reservas a constituir ou reforçar, não poderão os sócios receber quaisquer quantias ou bens a título de lucros, pelo que, nessas circunstâncias, somente havendo o que se vem denominando de “lucro de balanço” (diferença entre o património social líquido e a soma do capital social e das reservas) pode chegar ao património pessoal daqueles o que usa designar-se dividendo (ou direito ao lucro periódico) e que é o fruto de cada participação social. Sobre esta matéria – no que se refere às sociedades anónimas - rege o art. 294º do CSC, em cujo nº 1 se postula que “[S]alvo diferente cláusula contratual ou deliberação tomada por maioria de três quartos dos votos correspondentes ao capital social em assembleia geral para o efeito convocada, não pode deixar de ser distribuída aos acionistas metade do lucro do exercício que, nos termos desta lei, seja distribuível”. Deste inciso normativo resulta, assim, que, registando-se um lucro de balanço, a sociedade está vinculada a distribuir aos acionistas esse incremento patrimonial no final de cada exercício, atribuindo-lhes, em determinados termos, o direito à repartição de, pelo menos, metade do lucro do exercício distribuível, sendo que a substanciação deste lucro resulta, entre nós, do disposto no artigo 33º, norma que estabelece uma vinculação imperativa para os lucros de exercício, regulando o destino que, prioritariamente, lhes deve ser dado. Assim, esse normativo estabelece que os lucros de exercício devem, em primeiro lugar, ser destinados à cobertura de prejuízos transitados e à formação das reservas legais ou estatutárias, só podendo ser distribuído pelos sócios o valor remanescente. Portanto, é sobre este valor remanescente que os sócios poderão reclamar a sua distribuição parcial, nos termos do citado art. 294º. Haverá, contudo, que atentar que, de acordo com essa normatividade, o direito dos sócios à distribuição de, pelo menos, metade do lucro de exercício distribuível não é um direito absoluto, já que ele pode ser afastado pelos acionistas, mediante uma de duas formas: (i) através de uma cláusula do pacto que estabeleça regime diverso do previsto nessa norma; (ii) na ausência de cláusula contratual que disponha de modo diverso, através de uma deliberação aprovada por uma maioria qualificada de ¾ dos votos correspondentes ao capital social. Como a este propósito sublinha TARSO DOMINGUES[9], com este regime, “pretendeu a lei alcançar uma solução de compromisso entre, por um lado, a vontade dos acionistas maioritários que, as mais das vezes, desde por estarem associados à gestão da empresa societária, pretenderão não distribuir lucros, e, por outro, lado, o interesse dos sócios minoritários que, por via de regra, desejarão a maior distribuição possível do lucro. O equilíbrio destes dois interesses foi na nossa lei estabelecido através da exigência de uma maioria alargada, para que possa deixar de ser distribuída aquela parcela correspondente a 50% do lucro de exercício distribuível”. Ora, no caso vertente, a deliberação tomada na assembleia geral não só respeitou a distribuição (mínima) de 50% do lucro de exercício legalmente estabelecida, como também a distribuição global desse lucro foi deliberada por uma maioria qualificada representativa de 75% dos votos correspondentes ao capital social (que, nos termos expostos, serviria, aliás, para legitimar uma distribuição do lucro de exercício até inferior à referida distribuição mínima legalmente fixada). Consequentemente, também neste ponto, não se antolha em que medida as deliberações em crise enfermem de vício que importe a sua invalidade. *** V. DISPOSITIVOPelos fundamentos acima expostos, acordam os Juízes deste Tribunal da Relação em julgar a apelação improcedente, confirmando-se a decisão recorrida. Custas a cargo da apelante (art. 527º, nºs 1 e 2). Porto, 14.11.2022 Miguel Baldaia de Morais Jorge Seabra Fátima Andrade ______________ [1] O voto é, pois, uma declaração de vontade, sendo que a doutrina pátria vem discutindo a finalidade do direito de voto, advogando uns que ele serve os interesses do sócio, enquanto outros consideram que ele é antes instrumento de defesa do interesse social – cfr. sobre a questão, entre outros, PEREIRA DE ALMEIDA, Sociedades Comerciais, 4ª edição, Coimbra Editora, págs. 151 e seguintes. [2] Cfr., neste sentido, RAUL VENTURA, in Sociedades por quotas – Comentário ao Código das Sociedades Comerciais, vol. I, 2ª edição, Almedina, págs. 282 e seguinte e COUTINHO DE ABREU, in Curso de Direito Comercial, vol. II, 3ª edição, Almedina, págs. 254 e seguinte. [3] Tais informações são: a) Os nomes completos dos membros dos órgãos de administração e de fiscalização, bem como da mesa da assembleia geral; b) A indicação de outras sociedades em que os membros dos órgãos sociais exerçam cargos sociais, com exceção das sociedades de profissionais; c) As propostas de deliberação a apresentar à assembleia pelo órgão de administração, bem como os relatórios ou justificação que as devam acompanhar; d) Quando estiver incluída na ordem do dia a eleição de membros dos órgãos sociais, os nomes das pessoas a propor, as suas qualificações profissionais, a indicação das atividades profissionais exercidas nos últimos cinco anos, designadamente no que respeita a funções exercidas noutras empresas ou na própria sociedade, e do número de ações da sociedade de que são titulares; e) Quando se trate da assembleia geral anual prevista no n.º 1 do artigo 376.º, o relatório de gestão, as contas do exercício, demais documentos de prestação de contas, incluindo a certificação legal das contas e o parecer do conselho fiscal, da comissão de auditoria, do conselho geral e de supervisão ou da comissão para as matérias financeiras, conforme o caso, e ainda o relatório anual do conselho fiscal, da comissão de auditoria, do conselho geral e de supervisão e da comissão para as matérias financeiras. [4] Como, a este respeito, escreve SOVERAL MARTINS (in Código das Sociedades Comerciais em Comentário, vol. V, 2ª edição, Almedina, pág. 233), “informação verdadeira é a que não é falsa. É a que corresponde à realidade. E será completa a informação que não omite factos relevantes, que integra todos os dados que permitem formar opinião fundamentada quanto aos assuntos sujeitos a deliberação. Por fim, é elucidativa a informação que é clara”. [5] Prolatado no processo nº 1560/08.3TBOAZ.P1.S1; em análogo sentido decidiu o acórdão do STJ de 11.10.2022 (processo nº 2418/21.6T8VNG.S1), ambos acessíveis em www.dgsi.pt. [6] In O direito à informação nas sociedades comerciais, 1998, Almedina, pág. 283. [7] Cfr., sobre essa caraterização, entre outros, PEREIRA DE ALMEIDA, ob. citada, págs. 127 e seguinte e FERRER CORREIA, in Lições de Direito Comercial, vol. II, págs. 260 e seguintes. [8] Para uma análise desses elementos, vide, por todos, PINTO FURTADO, in Curso de Direito das Sociedades, 2ª edição, Almedina, págs. 22 e seguintes. [9] In Código das Sociedades Comerciais em Comentário, vol. V, 2ª edição, Almedina, pág. 294. |