Acórdão do Tribunal da Relação do Porto
Processo:
4463/19.2T8MTS.P1
Nº Convencional: JTRP000
Relator: JERÓNIMO FREITAS
Descritores: RETRIBUIÇÃO
PRINCÍPIO DA IRREDUTABILIDADE
CATEGORIA PROFISSIONAL
PRINCÍPIO DA IRREVERSIBILIDADE DA CARREIRA
Nº do Documento: RP202102224463/19.2T8MT.P1
Data do Acordão: 02/22/2021
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: IMPROCEDENTE, CONFIRMADA A SENTENÇA
Indicações Eventuais: 4ª SECÇÃO (SOCIAL)
Área Temática: .
Sumário: I - O princípio da irredutibilidade da retribuição não incide sobre a globalidade da retribuição, mas apenas sobre a retribuição estrita, ficando afastadas as parcelas correspondentes a maior esforço ou penosidade do trabalho, a situações de desempenho específicas, como é o caso da isenção de horário de trabalho, ou a maior trabalho, como ocorre com a prestação de trabalho além do período normal de trabalho (vulgo, trabalho suplementar).
II - Não estando submetidas ao princípio da irredutibilidade da retribuição, essas prestações retributivas apenas são devidas enquanto perdurar a situação em que assenta o seu fundamento, sendo permitido à entidade empregadora suprimi-las quando cesse a situação específica que esteve na base da sua atribuição.
III - Na medida em que reflecte a posição contratual do trabalhador e sinaliza o seu estatuto sócio profissional, a categoria é objecto de protecção legal e convencional que se evidencia, sobretudo, a três níveis: (i) na actividade a desenvolver; (ii) na remuneração devida; (iii) na hierarquização do trabalhador no seio da empresa.
IV - Expressão legal dessa protecção resulta do disposto no art.º 129.º n.º1, al. e), CT/2009, estabelecendo a lei que o empregador não pode baixar a categoria ao trabalhador, consagrando, assim, o denominado princípio da irreversibilidade da carreira.
V - A autora não questiona que esteja correctamente qualificada na categoria profissional e, por via disso, inserida no lugar próprio na estrutura organizacional da empresa Ré e auferindo a retribuição correspondente. A sua pretensão cinge-se, pois, a que lhe sejam atribuídas a globalidade das funções constantes do descritivo da categoria profissional contratada.
VI - Para que o trabalhador esteja a “exercer funções correspondentes à atividade para que foi contratado”, não é indispensável que exerça todas aquelas que estão previstas na descrição funcional da categoria, sendo bastante que exerça parte delas. Mais, mesmo que existam outros trabalhadores que as exerçam integralmente, o afirmado continua a ser válido, embora neste caso seja necessário que existam razões atendíveis para justificar essa diferenciação.
VII - Cremos estar perante razões válidas, licitas e suficientes para justificarem o facto da autora não ter atribuída “carteira de clientes”. A autora não é a única trabalhadora com a categoria de Gestor de cliente que não tem atribuída carteira de clientes, mas uma de entre um conjunto de 60 trabalhadores. A razão resulta da realidade actual do Banco em número de balcões, reduzidos de cerca de 450 em 2012, para 330 na actualidade, não gerando necessidades suficientes para atribuir carteira de clientes aos 413 trabalhadores com aquela categoria, já que a regra é de uma por cada balcão.
VIII - Acresce dizer, que inexistem provados quaisquer outros factos que possam por em causa quer essa realidade, quer a lisura e boa-fé da Ré na tomada dessa decisão, mormente, no que concerne à autora.
Reclamações:
Decisão Texto Integral: APELAÇÃO n.º 4463/19.2T8MTS.P1
SECÇÃO SOCIAL

ACORDAM NA SECÇÃO SOCIAL DO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DO PORTO

I.RELATÓRIO
I.1 No Tribunal da Comarca do Porto – Juízo do Trabalho de Matosinhos, B… intentou a presente acção declarativa de condenação com processo comum, emergente de contrato de trabalho, contra C…, S.A., pedindo a condenação desta no seguinte:
Primeiro:
A pagar à autora a quantia de € 35.130,66, sendo € 32.185,75 correspondentes ao montante devido pelas horas de isenção de horário de trabalho não pago desde 19 de setembro de 2015 até 31 de agosto de 2019, e € 2.944,91 correspondentes aos juros moratórios vencidos e não pagos contados até 31 de agosto de 2019, a que devem acrescer juros de mora calculados à taxa de 4% sobre o referido montante de € 32.185,75, até efetivo e integral pagamento;
Segundo:
A pagar à autora a quantia mensal de € 679,50, a título de isenção de horário de trabalho, em simultâneo com o pagamento da retribuição e catorze vezes por ano;
Terceiro:
A pagar à autora a quantia de € 6.587,38, correspondente aos montantes indevidamente debitados à autora relativamente aos seus empréstimos e conta acima identificada, acrescido de juros de mora calculados à taxa de 4% a partir da data da citação;
Quarto:
A atribuir à autora uma carteira de clientes, passando esta a fazer o atendimento, representação e negociação com os clientes que integram essa carteira, respeitando e cumprindo a categoria profissional da autora, tal como está fixada no respetivo contrato de trabalho;
Quinto:
A pagar uma sanção pecuniária compulsória de € 50,00 por cada dia em que o banco réu não atribua à autora uma carteira de clientes conforme a respetiva categoria profissional de gestora de clientes fixada no seu contrato de trabalho.
Alegou, para tanto em suma, que após ter sido despedida pela ré, foi tal decisão anulada pelo Tribunal, tendo então a autora obtido a reintegração. No entanto, a Ré retirou-lhe a isenção de horário, bem assim debitou-lhe juros, despesas, prémios e comissões dos empréstimos que havia contraído junto dela, sem que após a sua reintegração os tenha devolvido. Para além disso, não lhe atribuiu funções próprias da sua categoria de gestora de clientes.
Realizada a audiência de partes, e frustrada que se mostrou a conciliação, foi designada data para a realização da audiência de julgamento e notificada a ré para contestar.
A Ré contestou alegando que embora a Autora não tenha carteira de clientes atribuída, exerce funções próprias da sua categoria, tais como angariar novo negócio e contratação de novas operações bem como prospecionar o mercado, estando em situação similar a 60 outros trabalhadores com a mesma categoria, dada a redução de balcões, desde 2012, de 450 para 330.
Ao contrário do que alega a Autora, o acordo de isenção de horário de trabalho não está integrado no contrato de trabalho, mas em documento autónomo e remete para a cláusula 54.ª do ACT do sector bancário, prevendo-se a possibilidade da sua cessação mediante denúncia com a antecedência de um mês. Em Abril de 2015, no âmbito da política geral da Ré, decidiu a Ré rever a vigência das isenções de horário de trabalho dos seus trabalhadores, fazendo cessar aquele regime nos casos em que não se justificava a sua manutenção. No caso da Autora, como sucedeu com dezenas de trabalhadores da Ré, foi entendido que não era necessário manter esse regime, como lhe deu conta na comunicação enviada.
Os débitos referidos pela autora prenderam-se com os incumprimentos no pagamento das prestações mensais. Os benefícios para trabalhadores da Ré foram instituídos através do Protocolo de Colaboradores que entrou em vigor no final de Outubro de 2015, só sendo elegíveis produtos/serviços associados à conta à ordem aberta na Ré e onde está domiciliado o vencimento e desde que o trabalhador seja associado efetivo da Associação Mutualista, requisitos que A não preenche.
A Ré não sabe quais são as fontes de rendimento da Autora, apenas sabendo que na pendência do processo de impugnação de despedimento auferiu o subsídio de desemprego. A Ré cumpriu escrupulosamente a decisão proferida no processo que julgou o despedimento ilícito.
Concluiu pedindo a improcedência da acção.
Foi proferido despacho saneador, tendo sido fixado o objecto do litígio e dispensada a fixação dos temas de prova.
Foi, ainda, fixado o valor da acção em € 41.718,04.
Realizou-se, depois, a audiência de discussão e julgamento.
I.2 Subsequentemente, foi proferida sentença encerrada com o dispositivo seguinte:
-“Nestes termos, e com fundamento no exposto, julgo:
- improcedentes os pedidos primeiro, segundo, quarto e quinto, pelo que deles absolvo a ré;
- parcialmente procedente o pedido terceiro formulado pelo autora, pelo que condeno a ré a pagar-lhe a quantia de €122,50 acrescida quantia referente ao imposto de selo.
Custas a cargo de autora e ré na proporção do respetivo decaimento.
Notifique.
Registe.
(..)».
I.3 Inconformada com esta sentença, a Autora apresentou recurso de apelação, o qual foi admitido e fixado o modo de subida e efeito adequados. Encerrou as alegações com as conclusões seguintes:
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………………………………
………………………………
Termos em que se requer a V Exas se dignem conceder provimento ao presente recurso ordinário de apelação, revogando-se a sentença recorrida, e condenando-se a C…, SA nos termos peticionados.
I.4 A recorrida apresentou contra-alegações, finalizando-as com as conclusões seguintes:
………………………………
………………………………
………………………………
Pugna pela improcedência do recurso.
I.5 O Ministério Público junto desta Relação emitiu parecer nos termos do art.º 87.º3, do CPT, pronunciando-se no sentido da improcedência do recurso, em concordância com a resposta às alegações de recurso.
I.6 Cumpridos os vistos legais, remeteu-se o projecto de acórdão aos excelentíssimos adjuntos e determinou-se a inscrição para julgamento em conferência.
I.7 Delimitação do objecto do recurso
Sendo o objecto do recurso delimitado pelas conclusões das alegações apresentadas, salvo questões do conhecimento oficioso [artigos 87.º do Código do Processo do Trabalho e artigos 639.º, 635.º n.º 4 e 608.º n.º2, do CPC, aprovado pela Lei n.º 41/2013, de 26 de Junho] as questões suscitadas para apreciação consistem em saber se o Tribunal a quo errou o julgamento na aplicação do direito aos factos quanto ao seguinte:
i) Na interpretação do “Acordo com a Isenção de Horário” [conclusões B a M];
ii) Ao ter julgado improcedente o pedido de condenação da Ré no de € 6.587,38, correspondente aos montantes que lhe debitou relativamente aos seus empréstimos, por incumprimento, na consideração de não estar demonstrado existir nexo de causalidade entre o despedimento e o incumprimento da autora [conclusões N a X];
iii) Ao ter julgado improcedente o pedido de condenação da Ré a atribuir-lhe uma carteira de clientes [conclusões Y a EE].
II. FUNDAMENTAÇÃO
II.1. MOTIVAÇÃO DE FACTO
O Tribunal a quo fixou o elenco factual seguinte:
1. Com início em 19 de outubro de 2009 a autora celebrou com o D…, SA um contrato de trabalho.
2. De acordo com o documento subscrito por autora e aquela sociedade D…, S.A. na mesma data de 19/10/2009, intitulado “Acordo com a Isenção de Horário”, a autora “com a categoria profissional de Gestor de Cliente, desempenhando funções de atendimento, representação e negociação com as pessoas que integram a carteira de clientes que lhe está atribuída, com o objetivo de satisfazer as necessidades financeiras destes e promover os produtos e serviços da Instituição, nos termos que se encontram previstos no Acordo Coletivo de Trabalho Vertical do Setor Bancário, com a retribuição base de €1.305,90, bem como outras prestações regulares e periódicas EUR 80,80 pela qual fica estabelecida:
(…)
alínea b) – a possibilidade de alargamento da prestação a 10 horas por semana
(…)
Pela isenção de horário de trabalho, o trabalhador tem direito a receber uma retribuição especial, no montante de €653,73 a ser paga com a mesma periodicidade com que é paga a retribuição base.
A isenção de horário de trabalho ora acordada, no respeito pela disciplina dos vários números da Cláusula 54º do Acordo Coletivo de Trabalho Vertical do Setor Bancário, não prejudica o direito do trabalhador aos dias de descanso semanal obrigatório, aos feriados obrigatórios e aos dias e meios-dias de descanso complementar, nem ao descanso diário previsto no art. 176º do Código do Trabalho.”
3. O estabelecimento relativo à atividade exercida pelo D…, SA foi adquirido pelo banco réu, passando a autora a integrar os respetivos quadros, trabalhando atualmente no seu Balcão de …, sito na Avenida …, nº …/…, ….-… Matosinhos, sem “perda ou diminuição dos seus direitos, mantendo-se o contrato de trabalho com todo o seu conteúdo, designadamente no que se refere à antiguidade e retribuição”, conforme carta do banco réu, de 25 de março de 2011, junta aos autos a fls. 12 e que aqui se dá por reproduzida.
4. A autora desde 1 de fevereiro de 2004 que é sócia do E….
5. O banco réu despediu a autora em 16 de agosto de 2012.
6. Sendo que até ao mês de julho de 2012 o banco réu pagou-lhe a IHT, a qual, naquela data ascendia ao montante de € 660,25.
7. Em consequência do despedimento o banco réu passou a tratar a conta, produtos e serviços titulados e utilizados pela autora como se fosse uma cliente não trabalhadora.
8. A autora, não se conformando com o despedimento, procedeu à sua impugnação, a qual foi tramitada no mencionado Proc.º nº 723/12.1TTMTS, do 2º Juízo do Tribunal do Trabalho de Matosinhos.
9. Esta ação foi julgada parcialmente procedente por sentença transitada em julgado, tendo o banco réu sido condenado, entre o mais, a reintegrar a autora no seu posto de trabalho, sem prejuízo da sua categoria e antiguidade.
10. Em cumprimento da sentença condenatória o banco réu procedeu à reintegração da autora.
11. Retomando o pagamento da IHT no mês de março de 2015, no montante mensal de € 679,50.
12. Por carta, datada de 11 de junho de 2015, o banco réu comunicou à autora que por deliberação do Conselho de Administração Executivo e do disposto na cláusula 54º do Acordo Coletivo de Trabalho para o Setor Bancário, cessava em 19 de setembro de 2015 o regime da isenção de horário de trabalho em que vinha exercendo a sua atividade.
13. A autora não tem atribuída uma carteira de clientes.
14. A autora, enquanto trabalhadora do banco réu, contraiu junto deste os seguintes empréstimos:
a. Credito pessoal nº ………….-.;
b. Crédito à habitação nº ………….-.;
c. Crédito à habitação nº …………..-..
15. Estes créditos foram contraídos nas condições especiais aplicáveis aos trabalhadores do banco réu:
• Crédito Pessoal: ………….-. = Euribor 6 meses acrescida de 2,5%
• Crédito à Habitação n.º. …………..-. = Euribor 6 meses acrescida de 0,75%
• Crédito à Habitação n.º. …………..-. = Euribor 6 meses acrescida de 0,75%
16. A reintegração da autora no banco réu ocorreu no início do ano de 2015.
17. A autora cessou pagamentos das prestações mensais de tais créditos e, em consequência, o réu debitou-lhe:
a. Despesas relativas ao não pagamento pontual da prestação dos empréstimos, resultante do não pagamento da retribuição à autora pelo banco réu;[ alterado, pelas razões adiante constantes]
b. Juros moratórios, correspondentes ao não pagamento da prestação dos empréstimos, como se tal não fosse consequência do não pagamento da retribuição à autora pelo banco réu; [alterado, pelas razões adiante constantes]
c. Imposto de selo incidente sobre o valor dos juros moratórios.
18. Ascendendo aos seguintes montantes:
a. Crédito pessoal nº …-…-…….-.
i. De despesas: € 240,83;
ii. De juros de mora: € 2.958,77;
iii. De imposto de selo sobre os juros indevidos: € 187,84;
b. Crédito à habitação nº …-..-……-.
i. De despesas: € 524,00;
ii. De juros de mora: € 427,94;
iii. De imposto de selo sobre os juros indevidos: € 88,90;
c. Crédito à habitação nº …-..-……-.
i. De despesas: € 482,87;
ii. De juros de mora: € 1.330,07;
iii. De imposto de selo sobre os juros indevidos: € 72,46;
19. O réu debitou despesas à autora, na respetiva conta de depósitos à ordem no valor de €273,70 e a seguir discriminadas:
Data valor - Descrição - Importância
13-02-2015 - com.recup.divid ………… - 25,00 €
13-02-2015 - com.recup.divid ………… - 25,00 €
13-02-2015 - com.recup.prest. ………… - 30,00 €
28-11-2016 - com.recup.divid ………… - 12,00 €
28//11/16 - com.recup.divid ………… - 12,00 €
29-11-2016 - comissões manutenção - 4,70 €
29-11-2016 - comissões manutenção - 5,00 €
29-11-2016 - comissões manutenção - 5,00 €
29-11-2016 - comissões manutenção - 5,00 €
29-11-2016 - comissões manutenção - 5,00 €
29-11-2016 - comissões manutenção - 5,00 €
29-11-2016 - comissões manutenção - 5,00 €
29-11-2016 - comissões manutenção - 5,00 €
29-11-2016 - comissões manutenção - 5,00 €
29-11-2016 - comissões manutenção - 5,00 €
03-12-2016 - comissões manutenção - 5,00 €
26-12-2016 - com.recup.prest. ………… - 30,00 €
03-01-2017 - comissões manutenção - 5,00 €
26-01-2017 - com.recup.divid ………… - 12,00 €
02-02-2017 - comissões manutenção - 5,00 €
05-05-2017 - comissões manutenção - 5,00 €
02-06-2017 - comissões manutenção - 5,00 €
04-04-2017 - comissões manutenção - 5,00 €
26-07-2017 - com.recup.divid …..……. - 12,00 €
28-08-2017 - com.recup.divid ………… - 12,00 €
28-08-2017 - com.recup.divid ………… - 12,00 €
28-08-2017 - com.recup.divid ………… - 12,00 €
20. Na sequência do despedimento em julho de 2012 a autora auferiu da Segurança Social a quantia global de €24.021,30 a título de subsídio de desemprego.
21. No contrato referente ao crédito ………….-. a autora entrou em incumprimento em 2012-09-26 (prestação 32), 1.ª prestação vencida e não paga. A regularização dos valores em dívida (prestações 32 a 81 inclusive) apenas foi efetuada em 2016-11-15, com cobrança dos seguintes montantes:
Despesas: 448,37 + I.S.
Juros de Mora: 1 330,01 + I.S.
22. No contrato referente ao crédito ………….-. a autora entrou em incumprimento em 2012-09-26 (prestação 32), 1.ª prestação vencida e não paga. A regularização dos valores em dívida (prestações 32 a 81 inclusive) apenas foi efetuada em 2015 e o remanescente em 2016-11-15, com cobrança dos seguintes montantes:
Despesas: 482,00 + I.S.
Juros de Mora: 305,43 + I.S.
23. Em relação a este contrato, a 2015-02-26, o sistema efetuou a cobrança automática da prestação 32 até à prestação 37 (parcial), relativos ao período entre 2012-09-26 a 2013-02-26;
24. Nessa mesma data, o operador 7.090-3 tentou efetuar o estorno dessa cobrança via EM39.
25. A EM39 nunca deve ser efetuada no dia da cobrança a estornar, porque a transação ainda não reconhece essas cobranças.
26. Se a EM39 for efetuada no dia da cobrança a estornar, o sistema vai efetuar estornos das cobranças anteriores até perfazer o montante inserido na EM39.
27. O sistema estornou as cobranças relativas às prestações 25, 26, 27, 28, 29, 30 e 31 (relativas ao período entre 2012-02-26 a 2012-08-26), que – originalmente – tinham sido regularizadas no respetivo dia de débito.
28. Essas 7 prestações foram regularizadas posteriormente, com cobrança indevida de Juros de Mora no valor global de 122,50€ + I.S.
29. No contrato referente ao crédito ………….-. a autora entrou em incumprimento em 2012-09-26 (prestação 33), 1.ª prestação vencida e não paga. A regularização dos valores em dívida (prestações 33 a 60 inclusive) apenas foi efetuada em 2015 e o remanescente em 2016-11-15, com cobrança dos seguintes montantes:
Despesas: 240,83 + I.S.
Juros de Mora: 2.958,77 + I.S.
30. Os benefícios para trabalhadores da Ré foram instituídos através do Protocolo de Colaboradores entrou em vigor no final de outubro de 2015.
31. Com a entrada em produção do protocolo de colaboradores do grupo C2…, os benefícios, que constam no preçário capítulo 12, só são elegíveis para os produtos/serviços associados à conta à ordem aberta na Ré e onde está domiciliado o vencimento e desde que o trabalhador seja associado efetivo da C1….
32. A conta à ordem da autora associada aos contratos é a …-..-…….-. e a conta para crédito do seu vencimento, desde maio de 2015, é a …-..-……-..
33. A Autora deixou de ser associada da C1… pelo menos em fevereiro de 2016.
34. Por regra, a cada balcão da Ré corresponde uma carteira de clientes.
35. No caso da Ré, existe um total de 413 trabalhadores com a categoria de Gestor de Cliente.
36. Após a reestruturação da rede de balcões da Ré, esta rede foi reduzida, desde 2012, de cerca de 450 balcões para, atualmente, cerca de 330 balcões, pelo que nem todos os Gestores de Clientes podem ter atribuída uma carteira de clientes.
37. Há cerca de 60 trabalhadores da Ré com a categoria de Gestor de Cliente que não têm carteira de clientes atribuída.
38. Os quais têm por função a angariação de novo negócio e contratação de novas operações bem como na prospeção do mercado.
*
De resto não se provaram outros factos, nomeadamente:
a) o alegado nos artigos 53º e 54º da petição inicial.
b) o alegado nos artigos 54º da contestação.
II.1.1 ALTERAÇÃO DA MATÉRIA DE FACTO POR INICIATIVA DESTE TRIBUNAL DE RECURSO
Impõe-se proceder a alterações à matéria de facto fixada, mas por iniciativa desta Relação, no âmbito dos poderes oficiosos de que dispõe (art.º 662.º 1, CPC), em razão de se encontrar matéria conclusiva nos factos provados.
Conforme é entendimento pacífico da jurisprudência dos tribunais superiores, mormente do Supremo Tribunal de Justiça, as conclusões apenas podem extrair-se de factos materiais, concretos e precisos que tenham sido alegados, sobre os quais tenha recaído prova que suporte o sentido dessas alegações, sendo esse juízo conclusivo formulado a jusante, na sentença, onde cabe fazer a apreciação crítica da matéria de facto provada. Dito de outro modo, só os factos materiais são susceptíveis de prova e, como tal, podem considerar-se provados. As conclusões, envolvam elas juízos valorativos ou um juízo jurídico, devem decorrer dos factos provados, não podendo elas mesmas serem objecto de prova [cfr. Acórdão de 23.9.2009, Proc. n.º 238/06.7TTBGR.S1, Bravo Serra; e, mais recentemente, reiterando igual entendimento jurisprudencial: de 19.4.2012, Proc.º 30/08.4TTLSB.L1.S1, Pinto Hespanhol; de 23/05/2012, proc.º 240/10.4TTLMG.P1.S1, Sampaio Gomes; de 29/04/2015, Proc .º 306/12.6TTCVL.C1.S1, Fernandes da Silva; de 14/01/2015, Proc.º 488/11.4TTVFR.P1.S1, Fernandes da Silva; 14/01/2015, Proc.º 497/12.6TTVRL.P1.S1, Pinto Hespanhol; todos disponíveis em http://www.dgsi.pt/jstj].
Entendimento igualmente sustentado no Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 12-03-2014, afirmando-se que “Só acontecimentos ou factos concretos podem integrar a seleção da matéria de facto relevante para a decisão, sendo, embora, de equiparar aos factos os conceitos jurídicos geralmente conhecidos e utilizados na linguagem comum, verificado que esteja um requisito: não integrar o conceito o próprio objeto do processo ou, mais rigorosa e latamente, não constituir a sua verificação, sentido, conteúdo ou limites objeto de disputa das partes” [Proc.º n.º 590/12.5TTLRA.C1.S1, Conselheiro Mário Belo Morgado, disponível em www.dgsi.pt].
Assim, as afirmações de natureza conclusiva devem ser excluídas do elenco factual a considerar, se integrarem o thema decidendum, entendendo-se como tal o conjunto de questões de natureza jurídica que integram o objeto do processo a decidir, no fundo, a componente jurídica que suporta a decisão. Daí que sempre que um ponto da matéria de facto integre uma afirmação ou valoração de factos que se insira na análise das questões jurídicas a decidir, comportando uma resposta, ou componente de resposta àquelas questões, tal ponto da matéria de facto deve ser eliminado [Ac. STJ de 28-01-2016, Proc. nº 1715/12.6TTPRT.P1.S1, Conselheiro António Leones Dantas, www.dgsi.pt.].
Significando isto, que quando tal não tenha sido observado pelo tribunal a quo e este se tenha pronunciado sobre afirmações conclusivas, que essa pronúncia deve ter-se por não escrita. E, pela mesma ordem de razões, que o tribunal de recurso não pode considerar provadas alegações conclusivas que se reconduzam ao thema decidendum.
Importa ainda relembrar, que nos termos do disposto no n.º1 do art.º 5.º do CPC, [Às] partes cabe alegar os factos essenciais que constituem a causa de pedir e aqueles que se baseiam as excepções invocadas”.
No facto 17 consta, para além do mais o seguinte:
17. A autora cessou pagamentos das prestações mensais de tais créditos e, em consequência, o réu debitou-lhe:
a. Despesas relativas ao não pagamento pontual da prestação dos empréstimos, resultante do não pagamento da retribuição à autora pelo banco réu;
b. Juros moratórios, correspondentes ao não pagamento da prestação dos empréstimos, como se tal não fosse consequência do não pagamento da retribuição à autora pelo banco réu;
[..]»
Conforme referido na fundamentação da decisão sobre a matéria de facto, o Tribunal a quo considerou o facto provado “por acordo das partes resultante dos articulados”.
Nas alínea a) e b), parte final de ambas, consta, respectivamente, “resultante do não pagamento da retribuição à autora pelo banco réu” e “como se tal não fosse consequência do não pagamento da retribuição à autora pelo banco réu”.
Um dos pedidos formulados pela autora consiste no pedido de condenação da Ré a pagar-lhe “(..) a quantia de € 6.587,38, correspondente aos montantes indevidamente debitados à autora relativamente aos seus empréstimos e conta acima identificada, acrescido de juros de mora calculados à taxa de 4% a partir da data da citação”, para o sustentar alegando, no essencial, que “Em consequência do despedimento e da perda do salário, deixou de ter capacidade financeira para proceder ao pontual pagamento dos empréstimos acima referidos”.
Assim, aquelas partes, não são só conclusivas, por encerrarem um juízo valorativo de causa efeito, como para além disso o seu conteúdo reconduz-se a uma das questões controvertidas em discussão.
Por conseguinte, eliminam-se essas partes finais das alíneas a) e b), do facto 17, que passam ter a redacção seguinte:
17. [..]:
a. Despesas relativas ao não pagamento pontual da prestação dos empréstimos;
b. Juros moratórios, correspondentes ao não pagamento da prestação dos empréstimos;
[..]».
II.2 MOTIVAÇÃO DE DIREITO
A relação de trabalho subordinado em presença iniciou-se a 19 de outubro de 2009 (facto 1), aplicando-se o Código do Trabalho de 2009, aprovado pela Lei n.º 7/2009, de 12 de Fevereiro.
Concomitantemente, sendo certo que a autora, desde 1 de fevereiro de 2004, é sócia do E… (facto 4), haverá que ter em conta o instrumento de regulamentação colectiva aplicável, nomeadamente, o ACT para o sector bancário, celebrado entre diversas instituições de crédito e aquela associação sindical, publicado no BTE, 1.ª série, n.º 4, de 29/1/2005 [Alteração salarial e outras e texto consolidado], com a subsequente revisão, cujos texto consolidado consta publicado no BTE n.º 20, 29/5/2011, bem assim o Acordo Coletivo entre a C… e outros e a Federação dos Sindicatos Independentes da Banca - FSIB - Revisão global, publicado no BTE n.º 7, de 22/2/2017, dado que a autora passou a ser trabalhadora daquele Banco, em razão da transmissão do contrato de trabalho.
II.2.1 A recorrente, reiterando a posição assumida na petição inicial, começa por se insurgir contra a sentença, alegando que o Tribunal a quo errou na aplicação do direito ao s factos quanto à interpretação do “Acordo com a Isenção de Horário” [conclusões B a M], não reconhecendo fundamento aos pedidos que formulou de condenação da Ré a pagar-lhe quantia de € 35.130,66 correspondente ao valor do subsídio de isenção de horário não pago desde 19/9/22015 e até 31/8/2019, acrescido da quantia de €2.944,91 a título de juros de mora, bem como na continuidade no pagamento daquele subsídio, no valor mensal de € 679,50, em simultâneo com o pagamento da retribuição e catorze vezes por ano.
Na fundamentação da sentença, a este propósito, consta o seguinte:
-«[..]
Como se escreveu no acórdão da Relação do Porto de 14/12/2014 (in www.dgsi.pt, processo n.º 1109/11.0TTPRT.P1) “O regime da isenção de horário de trabalho (IHT) constitui uma forma de organização do tempo de trabalho que permite que o trabalhador não esteja adstrito ao cumprimento do horário de trabalho nos termos e na medida do que foi previsto na isenção […] mediante o pagamento de uma contrapartida remuneratória, o já designado subsídio de isenção de IHT”.
Aquando da celebração do contrato de trabalho, e de acordo com o documento subscrito por autora e aquela sociedade D…, S.A. na mesma data de 19/10/2009, intitulado “Acordo com a Isenção de Horário”, a autora “com a categoria profissional de Gestor de Cliente, desempenhando funções de atendimento, representação e negociação com as pessoas que integram a carteira de clientes que lhe está atribuída, com o objetivo de satisfazer as necessidades financeiras destes e promover os produtos e serviços da Instituição, nos termos que se encontram previstos no Acordo Coletivo de Trabalho Vertical do Setor Bancário, com a retribuição base de €1.305,90, bem como outras prestações regulares e periódicas EUR 80,80 pela qual fica estabelecida:
(…)
alínea b) – a possibilidade de alargamento da prestação a 10 horas por semana
(…)
Pela isenção de horário de trabalho, o trabalhador tem direito a receber uma retribuição especial, no montante de €653,73 a ser paga com a mesma periodicidade com que é paga a retribuição base.
A isenção de horário de trabalho ora acordada, no respeito pela disciplina dos vários números da Cláusula 54º do Acordo Coletivo de Trabalho Vertical do Setor Bancário, não prejudica o direito do trabalhador aos dias de descanso semanal obrigatório, aos feriados obrigatórios e aos dias e meios-dias de descanso complementar, nem ao descanso diário previsto no art. 176º do Código do Trabalho.”
Por carta, datada de 11 de junho de 2015, o banco réu comunicou à autora que por deliberação do Conselho de Administração Executivo e do disposto na cláusula 54º do Acordo Coletivo de Trabalho para o Setor Bancário, cessava em 19 de setembro de 2015 o regime da isenção de horário de trabalho em que vinha exercendo a sua atividade.
Resulta expressamente do documento subscrito pela autora e o D…, S.A. (o qual se transmitiu para a ré e, por tal, a vincula) e intitulado de “Acordo com a Isenção de Horário de Trabalho” que o mesmo fica sujeito à disciplina da cláusula 54º do ACT para o Sector Bancário.
Aquando da celebração de tal acordo de isenção de horário de trabalho estava em vigor o ACT para o Setor Bancário publicado no BTE n.º 5 de 29/1/2005, o qual havia sido celebrado entre várias instituições (entre elas D… e a aqui ré) e o E…, no qual está a autora filiada.
De acordo com o n.º 1 da cláusula 54º de tal acordo (cuja redação permaneceu igual com as alterações introduzidas ao ACT e publicadas no BTE n.º 20, de 30/5/2011), “por acordo escrito, podem ser isentos de horário de trabalho os trabalhadores com funções específicas ou de enquadramento e todos aqueles cujas funções o justifiquem”
Por sua vez, o n.º 4 estipula que “o regime de isenção de horário de trabalho cessará nos termos acordados ou, se o acordo for omisso, mediante denúncia de qualquer das partes feita com a antecedência mínima de um mês”, sendo certo que “se a denúncia for da iniciativa da instituição, é devido o pagamento da retribuição adicional até três meses depois de a mesma ter sido comunicada ao trabalhador.” (n.º 5 da mesma cláusula)
O regime da isenção de horário de trabalho prende-se, como já se disse, com a necessidade previsível do trabalhador prestar sua actividade laboral para além do horário normal de trabalho. Há assim uma correspetividade entre a necessidade de prestação recorrente de trabalho suplementar e o pagamento de uma quantia fixa mensal como contrapartida desse esforço do trabalhador.
Perante a desnecessidade da prestação desse trabalho suplementar é lícito à entidade patronal fazer cessar tal regime, aqui nos termos previsto no n. 4 da referida cláusula 54ª, conforme o fez.
Nestes termos, e com fundamento no exposto improcede assim o pedido formulado pela autora relativo a esta isenção de horário de trabalho».
Argumenta a recorrente, no essencial, o seguinte:
- O artigo 129 nº 1 alínea d) do Código do Trabalho determina que é proibido ao empregador diminuir a retribuição;
- No último parágrafo do Acordo com a Isenção de Horário estabeleceu-se que a isenção de horário de trabalho ora acordada, não prejudica o direito do trabalhador aos dias de descanso semanal obrigatórios, aos feriados obrigatórios e aos dias e meio-dia de descanso complementar, nem ao descanso diário previsto no artigo 176 do Código do Trabalho; ou seja, a referência ao artigo 54 do ACT do Sector Bancário no referido último parágrafo visou reforçar os direitos da recorrente, a saber – o direito ao descanso, não conferindo à recorrida o direito de unilateralmente lhe retirar a IHT.
Contrapõe a recorrida que a retribuição especial por isenção de horário de trabalho não está sujeita ao princípio da irredutibilidade da retribuição, invocando em sua defesa o disposto no artigo 129.º, n.º 1, alínea d) do Código do Trabalho. As Partes convencionaram que o regime de isenção de horário de trabalho ficou sujeito à disciplinar da cláusula 54.ª do ACT do sector bancário que previa, expressamente, no seu n.º 4, a possibilidade de cessação do regime de IHT com aviso prévio, tendo sido nesse contexto contratual que fez cessar licitamente o regime de IHT.
O fulcro da questão prende-se com a noção de retribuição e o princípio da irredutibilidade da retribuição, para apurar se prestação que era paga pela R. em virtude do “Acordo com a Isenção de Horário” integra a retribuição da Autora e, em caso afirmativo, se a mesma podia ser retirada sem que tal consubstanciasse violação das garantias do trabalhador quanto à não diminuição da retribuição.
O artigo 258.º do CT, com a epígrafe “Princípios gerais sobre a retribuição”, estabelece o seguinte:
1 - Considera-se retribuição a prestação a que, nos termos do contrato, das normas que o regem ou dos usos, o trabalhador tem direito em contrapartida do seu trabalho.
2 - A retribuição compreende a retribuição base e outras prestações regulares e periódicas feitas, directa ou indirectamente, em dinheiro ou em espécie.
3 - Presume-se constituir retribuição qualquer prestação do empregador ao trabalhador.
4 - À prestação qualificada como retribuição é aplicável o correspondente regime de garantias previsto neste Código.
Desta noção legal de retribuição retira-se que a mesma compreende o conjunto de valores que a entidade empregadora está obrigada a pagar regular e periodicamente ao trabalhador em contrapartida da actividade por ele desempenhada, presumindo-se, até prova em contrário, constituir retribuição toda e qualquer prestação da entidade patronal ao trabalhador.
Tratando-se de uma presunção ilidível recai sobre a entidade empregadora o ónus de alegar e provar os factos necessários para a afastar (art.º 350.º CC).
Como melhor elucida Monteiro Fernandes, reportando-se ao actual art.º 258.º do CT/09, a noção legal de retribuição consiste no conjunto de valores (pecuniários ou não) que a entidade patronal está obrigada a pagar regular e periodicamente ao trabalhador em razão da actividade por ele desempenhada (ou, mais rigorosamente, da disponibilidade da força de trabalho por ele oferecida) [Direito do Trabalho, 14.ª Edição, Almedina, 2009, p. 479].
A Lei não diz quando se deve considerar que uma prestação é regular e periódica.
Como assinala aquele mesmo autor, “O problema da qualificação jurídica de cada uma das atribuições patrimoniais feitas pelo empregador ao trabalhador, por referência ao conceito de retribuição, ganhou uma acuidade singular com a amplificação do leque daqueles atribuições, na contratação colectiva e na prática das empresas. (.. ). Em muitos casos, com efeito, o trabalhador não recebe apenas da entidade patronal a quantia certa, paga no fim de cada semana, quinzena ou mês, que vulgarmente se designa salário, ordenado ou vencimento (e a que, tecnicamente, se costuma aplicar o rótulo de vencimento base). Certo é que essa prestação regular e periódica é aquela que não só pretende corresponder directamente a uma certa «medida» da prestação de trabalho, mas também acompanha um dado «ritmo» de satisfação de necessidades – a das necessidades correntes, do dia a dia – do trabalhador e da sua família” [Op. cit. pp. 476/477].
No mesmo sentido, Maria do Rosário Palma Ramalho, reportando-se igualmente ao CT/09, sobre o conceito de retribuição escreve o seguinte: “Reportando-nos agora especificamente ao conceito de retribuição a sua noção legal, (…) permite isolar os seguintes elementos essenciais: a retribuição constituiu um direito do trabalhador; (…) que decorre do próprio contrato; (…) é a contrapartida da actividade laboral; (…) é regular e periódica; (…) é uma prestação patrimonial”. Mais adiante, prossegue para observar que “Para além da retribuição base, o trabalhador pode ter direito a determinados complementos remuneratórios, os quais integram ou não o conceito de retribuição, consoante partilhem os respectivos elementos essenciais. No caso afirmativo, estes complementos beneficiam da tutela da irredutibilidade e do regime de tutela dos créditos retributivos; no caso negativo poderão ser retirados ao trabalhador, se a razão pela qual foram atribuídos deixar de existir. A multiplicidade e diversidade dos complementos remuneratórios auferidos pelo trabalhador em execução do contrato de trabalho, tornam difícil a sua enumeração e, sobretudo a sua qualificação, que só pode ser feita no caso concreto, aferindo da presença, em cada um deles das características que permitem a sua recondução ao conceito de retribuição” [Tratado do Direito do Trabalho, Dogmática Geral, 4º Ed., Almedina 2015, p. 571 e 574].
Essas prestações complementares, embora não possa dizer-se que essa seja a regra, em muitos casos estão ligadas a particularidades da prestação do trabalho. Assim acontece, com mais evidência, entre outros, nos casos da prestação de trabalho suplementar, da prestação de trabalho nocturno, da deslocação em trabalho, do trabalho com penosidade ou com perigo ou, ainda, com determinados níveis de produtividade.
Nesses casos, em que são pagas como contrapartida da prestação de trabalho em determinadas condições, por regra, essas prestações complementares apenas são devidas quando se verifique uma efectiva prestação de trabalho no condicionalismo que justificou o seu estabelecimento e apenas integrarão o conceito de retribuição se forem percebidas com uma regularidade e periodicidade tal que criem no trabalhador uma legítima expectativa quanto ao seu recebimento.
Nesse pressuposto, de acordo com o entendimento pacífico dos tribunais superiores, mormente do Supremo Tribunal de Justiça consistem em “(..) prestações complementares auferidas em função da natureza das funções ou da especificidade do desempenho (subsídio nocturno, isenção de horário e outros subsídios) [que] apenas são devidas enquanto persistirem as situações que lhes servem de fundamento, podendo a entidade empregadora suprimir as mesmas logo que cesse a situação específica que esteve na base da sua atribuição, sem que isso implique violação do princípio da irredutibilidade da retribuição“[Acórdão de 22-09-2011, proc.º 913/08.1TTPNF.P1.S1, Conselheiro SAMPAIO GOMES, disponível em www.dgsi.pt].
Estes ensinamentos permitem retirar uma ideia fulcral, em suma, não basta o mero recebimento regular e periódico de uma dada prestação para lhe atribuir a natureza de retribuição, por força da presunção (ilidível) estabelecida na lei (n.º3, do art.º 258º do CT/03), impondo-se, concomitantemente, num trabalho de interpretação sobre a sua fonte legal ou convencional, indagar sobre a razão de ser da sua atribuição.
O princípio da irredutibilidade da retribuição consta actualmente consagrado no art.º 129.º/1 al. d), do CT, ao estabelecer: (1) É proibido ao empregador: [d)] Diminuir a retribuição, salvo nos casos previstos neste Código ou em instrumento de regulamentação colectiva de trabalho.
Porém, como flui do que já ficou exposto, a irredutibilidade da retribuição não significa que não possam diminuir-se ou extinguir-se certas prestações retributivas complementares.
Com efeito, o princípio da irredutibilidade da retribuição não incide sobre a globalidade da retribuição, mas apenas sobre a retribuição estrita, ficando afastadas as parcelas correspondentes a maior esforço ou penosidade do trabalho, a situações de desempenho específicas, como é o caso da isenção de horário de trabalho, ou a maior trabalho, como ocorre com a prestação de trabalho além do período normal de trabalho (vulgo, trabalho suplementar).
Como observado no aresto do STJ acima citada, essas prestações remuneratórias não se encontram submetidas ao princípio da irredutibilidade da retribuição, por essa razão apenas sendo devidas enquanto perdurar a situação em que assenta o seu fundamento, sendo permitido à entidade empregadora suprimi-las quando cesse a situação específica que esteve na base da sua atribuição.
Nesse sentido, Pedro Romano Martinez [Direito do Trabalho, 3.ª edição, Almedina, pág. 595.], observa que «(..) os complementos salariais que são devidos enquanto contrapartida do modo específico do trabalho – como um subsídio de “penosidade”, de “isolamento”, de “toxicidade”, de “trabalho nocturno”, de “turnos”, de “risco” ou de “isenção de horário de trabalho” – podem ser reduzidos, ou até suprimidos, na exacta medida em que se verifique modificações ou a supressão dos mencionados condicionalismos externos do serviço prestado.
O princípio da irredutibilidade da retribuição não obsta a que sejam afectadas as parcelas correspondentes ao maior esforço ou penosidade do trabalho sempre que ocorram, factualmente, modificações ao nível do modo específico de execução da prestação laboral.
Tais subsídios apenas são devidos enquanto persistir a situação de base que lhes serve de fundamento».
Na mesma linha de entendimento, Monteiro Fernandes, reportando-se às “prestações complementares que são determinadas pela penosidade, pelo risco, pelo isolamento, etc. (..), ou seja, pelo próprio condicionalismo externo da prestação de trabalho”, para equacionar se “face ao princípio da irredutibilidade da retribuição (art.º 129.º al. d) CT), eles deverão ser mantidos mesmo quando se alterem condições externas do serviço prestado (..)”, refere que a seu ver a resposta afirmativa conduziria a um patente absurdo, para concluir, afirmando que “(..) os referidos subsídios apenas são devidos enquanto persistir a situação que lhes serve de fundamento (..)” [Op. cit. p. 494/495].
Em suma, parafraseando o Acórdão desta Relação e Secção 10-10-2016 [Proc.º 25236/15.6T8PRT.P1, Desembargadora Paula Leal de Carvalho, disponível em www.dgsi.pt], no qual interveio como adjunto o aqui relator, diremos:
I. O princípio da irredutibilidade da retribuição não é extensivo a toda e qualquer prestação que tenha natureza retributiva, havendo que apreciar, caso a caso, da concreta função ou razão da sua atribuição de tal modo que, cessando licitamente a causa justificativa da sua atribuição, poderá igualmente cessar o pagamento da contrapartida correspondente.
II - É este o caso da isenção de horário de trabalho, em que o trabalhador não fica sujeito, na medida da isenção concedida, aos limites do horário de trabalho fixado, podendo, dentro do limite dessa isenção, ser-lhe exigida a prestação de trabalho e sem que o trabalhador possa reclamar o pagamento do correspondente trabalho que seria considerado como suplementar. E, daí, que deva o trabalhador ser por isso compensado com a atribuição de um acréscimo remuneratório, vulgo subsídio de isenção de horário de trabalho.
III - Mas, pese embora a natureza retributiva de tal prestação, ela não está sujeita ao princípio da irredutibilidade da retribuição, podendo deixar de ser paga se cessar licitamente a causa justificativa da sua atribuição, qual seja a prestação de trabalho em regime de isenção de horário de trabalho.
Reportando-se especificamente às importâncias pagas a título de retribuição especial por isenção de horário de trabalho, no Acórdão do STJ de 9 de Janeiro de 2011 [Proc. 557/06.2TTPRT.P1.S1, Conselheiro Pinto Hespanhol, www.dgsi.pt], escreve-se o seguinte:
«(..) o regime de isenção de horário de trabalho é, por natureza, transitório e reversível, dependendo de uma acção cuja iniciativa repousa na vontade da entidade empregadora, sendo que a correspectiva retribuição especial só é devida se e enquanto o trabalhador desfrutar dele.
Assim, tal como afirma o acórdão deste Supremo Tribunal, de 9 de Janeiro de 2008, Processo n.º 2906/07, da 4.ª Secção, disponível em www.dgsi.pt, com o n.º de documento SJ200801090029064, embora as importâncias pagas a título de retribuição especial por isenção de horário de trabalho, dadas as características de periodicidade e regularidade, não possam deixar de assumir natureza retributiva, daí não se pode concluir, sem mais, que as mesmas não possam ser retiradas».
II.2.2 Importa agora que nos detenhamos sobre a figura da “isenção de horário de trabalho”.
No Código do Trabalho de 2003, vigente à data da celebração do ACT aqui aplicável, sobre esta matéria regiam os artigos 177.º e 178.º, referindo-se o primeiro artigo às “Condições de isenção de horário de trabalho” e o segundo aos “Efeitos da isenção de horário de trabalho”.
No primeiro deles, cingindo-nos ao que aqui interessa, estabelecia-se o seguinte:
[1] Por acordo escrito, pode ser isento de horário de trabalho o trabalhador que se encontre numa das seguintes situações:
[a] Exercício de cargos de administração, de direcção, de confiança, de fiscalização ou de apoio aos titulares desses cargos;
[b] Execução de trabalhos preparatórios ou complementares que, pela sua natureza, só possam ser efectuados fora dos limites dos horários normais de trabalho;
[c] Exercício regular da actividade fora do estabelecimento, sem controlo imediato da hierarquia.
[2] Podem ser previstas em instrumento de regulamentação colectiva de trabalho outras situações de admissibilidade de isenção de horário de trabalho para além dos indicados nas alíneas do número anterior.
[3] (..)
E, no segundo (178.º), estabelecia-se:
1 - Nos termos do que for acordado, a isenção de horário pode compreender as seguintes modalidades:
a) Não sujeição aos limites máximos dos períodos normais de trabalho;
b) Possibilidade de alargamento da prestação a um determinado número de horas, por dia ou por semana;
c) Observância dos períodos normais de trabalho acordados.
2 - Na falta de estipulação das partes o regime de isenção de horário segue o disposto na alínea a) do número anterior.
3 - A isenção não prejudica o direito aos dias de descanso semanal obrigatório, aos feriados obrigatórios e aos dias e meios dias de descanso complementar, nem ao descanso diário a que se refere o n.º 1 do artigo 176.º, excepto nos casos previstos no n.º 2 desse artigo.
4 - Nos casos previstos no n.º 2 do artigo 176.º deve ser observado um período de descanso que permita a recuperação do trabalhador entre dois períodos diários de trabalho consecutivos.
Decorre do primeiro artigo, que a lei não admite genericamente a possibilidade do trabalhador exercer as suas funções em regime de isenção de horário de trabalho, antes a limitando quanto a determinados trabalhadores, indicados na lei, nomeadamente, os que exercem “cargos de administração, de direcção, de confiança, de fiscalização, ou de apoio a titulares desses órgãos”, alargando essa possibilidade aos que executem a prestação de trabalho nas condições referidas nas alíneas b) e c). Admite-se, ainda, outras situações de isenção de horário de trabalho, para além daquelas indicadas na lei, mediante previsão em instrumentos de regulamentação colectiva (n.º 3), o que constituiu uma inovação em relação ao precedente regime.
Outra inovação, no que aqui releva, resulta do facto da isenção de horário, que no domínio da LDT apenas abrangia a modalidade dos trabalhadores não ficarem sujeitos aos limites máximos dos períodos normais, poder agora corresponder a uma das modalidades especificadas nas três alíneas do n.º1 do art.º 178.º.
Por seu turno, na Cláusula 54.ª [Isenção de horário de trabalho] do instrumento de regulamentação colectiva de trabalho aplicável, estabelecia-se na versão de 2005, e continuou a estabelecer-se na revisão e texto consolidado de 2011 [BTE n.º 20, 29/5/2011] o seguinte:
1 — Por acordo escrito, podem ser isentos de horário de trabalho os trabalhadores com funções específicas ou de enquadramento e todos aqueles cujas funções o justifiquem.
2 — Os trabalhadores isentos de horário de trabalho têm direito a uma retribuição adicional, que não será inferior à remuneração correspondente a uma hora de trabalho suplementar por dia, no caso de, em média, não excederem em uma hora o seu período normal de trabalho diário; de outra forma, a remuneração adicional não será inferior à correspondente a duas horas de trabalho suplementar por dia.
3 — A isenção de horário de trabalho não prejudica o direito aos dias de descanso semanal e aos feriados previstos neste acordo.
4 — O regime de isenção de horário de trabalho cessará nos termos acordados ou, se o acordo for omisso, mediante denúncia de qualquer das partes feita com a antecedência mínima de um mês.
5 — Se a denúncia for da iniciativa da instituição, é devido o pagamento da retribuição adicional até três meses depois de a mesma ter sido comunicada ao trabalhador.
Por último, no actual Código do Trabalho/09, a figura da isenção de horário de trabalho encontra-se regulada nos artigos 218.º e 219.º.
No primeiro deles (218.º), com a epígrafe “Condições de isenção de horário de trabalho”, consta o seguinte:
Condições de isenção de horário de trabalho
1 - Por acordo escrito, pode ser isento de horário de trabalho o trabalhador que se encontre numa das seguintes situações:
a) Exercício de cargo de administração ou direcção, ou de funções de confiança, fiscalização ou apoio a titular desses cargos;
b) Execução de trabalhos preparatórios ou complementares que, pela sua natureza, só possam ser efectuados fora dos limites do horário de trabalho;
c) Teletrabalho e outros casos de exercício regular de actividade fora do estabelecimento, sem controlo imediato por superior hierárquico.
2 - O instrumento de regulamentação colectiva de trabalho pode prever outras situações de admissibilidade de isenção de horário de trabalho.
No segundo (219.º), com epígrafe “Modalidades e efeitos de isenção de horário de trabalho”, estabelece-se o seguinte:
1 - As partes podem acordar numa das seguintes modalidades de isenção de horário de trabalho:
a) Não sujeição aos limites máximos do período normal de trabalho;
b) Possibilidade de determinado aumento do período normal de trabalho, por dia ou por semana;
c) Observância do período normal de trabalho acordado.
2 - Na falta de estipulação das partes, aplica-se o disposto na alínea a) do número anterior.
3 - A isenção não prejudica o direito a dia de descanso semanal, obrigatório ou complementar, a feriado ou a descanso diário.
4 - Constitui contra-ordenação grave a violação do disposto no número anterior.
Importa referir que não se regista alteração de relevo entre o regime consagrado no actual CT/09 e o precedente CT/03, apenas sendo de assinalar que o legislador veio fazer referência expressa ao “teletrabalho”, como uma das situações de “exercício regular de actividade fora do estabelecimento, sem controlo imediato por superior hierárquico”, em que é admissível a prestação de trabalho em regime de isenção de horário de trabalho. As alterações de relevo haviam já sido introduzidas com o CT/03.
A este propósito, Monteiro Fernandes observa o seguinte:
O CT inova consideravelmente nesta matéria. A isenção de horário de trabalho, outrora tratada como um mecanismo absolutamente excepcional, cuja aplicação estava sujeita a controlo administrativo – tendo em vista que a existência de horário de trabalho era de interesse de ordem pública -, é agora regulada como mais um instrumento de flexibilidade na organização do trabalho, entre outros cujo uso fica entregue à gestão dos interessados.
Desde logo, o CT admite a previsão (por via regulamentar colectiva) de novas hipóteses de isenção, para além daquelas que são contempladas nas alíneas do art.º 218.º/1.» [Op. cit. p. 383].
Por outro lado, cabe também assinalar que conteúdo da cláusula 54.ª do CT aplicável é consonante com o regime estabelecido na lei, nomeadamente, com o disposto nos artigos 177.º e 178.º do CT/03, então vigente.
II.2.3 Revertendo ao caso, está provado que a autora celebrou um acordo escrito com o D…, então a sua entidade empregadora, em 19/10/2009, intitulado “Acordo com a Isenção de Horário”, do qual consta o seguinte
- “(..) com a categoria profissional de Gestor de Cliente, desempenhando funções de atendimento, representação e negociação com as pessoas que integram a carteira de clientes que lhe está atribuída, com o objetivo de satisfazer as necessidades financeiras destes e promover os produtos e serviços da Instituição, nos termos que se encontram previstos no Acordo Coletivo de Trabalho Vertical do Setor Bancário, com a retribuição base de €1.305,90, bem como outras prestações regulares e periódicas EUR 80,80 pela qual fica estabelecida:
(…)
alínea b) – a possibilidade de alargamento da prestação a 10 horas por semana
(…)
Pela isenção de horário de trabalho, o trabalhador tem direito a receber uma retribuição especial, no montante de €653,73 a ser paga com a mesma periodicidade com que é paga a retribuição base.
A isenção de horário de trabalho ora acordada, no respeito pela disciplina dos vários números da Cláusula 54º do Acordo Coletivo de Trabalho Vertical do Setor Bancário, não prejudica o direito do trabalhador aos dias de descanso semanal obrigatório, aos feriados obrigatórios e aos dias e meios-dias de descanso complementar, nem ao descanso diário previsto no art. 176º do Código do Trabalho.”
A recorrente não põe em causa a validade desse acordo, quer no aspecto formal relativo à sua celebração, quer quanto à sua admissibilidade face às exigências legais e convencionais, quer ainda quanto à sua execução prática.
Não obstante, brevemente, deve referir-se que o acordo foi celebrado por escrito, observando a exigência formal imposta pelo art.º 218.º 1, do CT (vigente à data da sua celebração), bem assim pelo n.º1, da cláusula 54.ª, do ACT aplicável.
Para além disso, importando ter presente que a lei veio admitir a possibilidade dos instrumentos de regulamentação colectiva de trabalho poderem prever outras situações de admissibilidade de isenção de horário de trabalho (art.ºs 177.º2/CT 03 e 218.º2/CT09), a sua celebração foi justificada em razão das exigências das funções desempenhadas pela Autora, visando assegurar “a possibilidade de alargamento da prestação a 10 horas por semana”, em contrapartida tendo aquela “ direito a receber uma retribuição especial, no montante de €653,73 a ser paga com a mesma periodicidade com que é paga a retribuição base”, o que se mostra também conforme com o disposto nos n.º1 e 2, da Cláusula 54ª, do ACT aplicável, a qual, como já se disse, é consonante com o regime estabelecido na lei, nomeadamente, com o disposto nos artigos 177.º e 178.º do CT/03, sendo que essa conformidade não foi subsequentemente posta em causa pelos artigos 218.º e 219.º, do CT/09.
Neste quadro, conclui-se que o valor de €653,73, pago com a mesma periodicidade da retribuição, auferido pela A. em contrapartida do “Acordo com a isenção de horário” celebrado com a sua entidade empregadora, através do qual ficou acordada “a possibilidade de alargamento da prestação a 10 horas por semana”, consubstancia a atribuição de uma prestação complementar com natureza retributiva, auferida em função da natureza das suas funções e das especificidades do respectivo exercício.
Ora, como se deixou explicado, o princípio da irredutibilidade da retribuição não incide sobre a globalidade da retribuição, mas apenas sobre a retribuição estrita, ficando afastadas as parcelas correspondentes a maior esforço ou penosidade do trabalho, a situações de desempenho específicas, como é o caso da isenção de horário de trabalho, apenas sendo devidas enquanto perdurar a situação em que assenta o seu fundamento, significando isto que a entidade empregadora pode suprimi-las quando cesse a situação específica que esteve na base da sua atribuição.
De resto, como expressamente previsto no n.º4, da cláusula 54.ª do ACT aplicável, para a qual remete expressamente o “Acordo com a isenção de horário”.
Argumenta a recorrente que “a referência ao artigo 54 do ACT do Sector Bancário no referido último parágrafo visou reforçar os direitos da recorrente, a saber – o direito ao descanso, não conferindo à recorrida o direito de unilateralmente lhe retirar a IHT”.
Com o devido respeito, o argumento não tem qualquer cabimento, desde logo, por constar expressamente no acordo que “A isenção de horário de trabalho ora acordada, no respeito pela disciplina dos vários números da Cláusula 54º do Acordo Coletivo de Trabalho Vertical do Setor Bancário (…), remissão que necessariamente abarca o n.º4, da aludida cláusula, onde consta que “O regime de isenção de horário de trabalho cessará nos termos acordados ou, se o acordo for omisso, mediante denúncia de qualquer das partes feita com a antecedência mínima de um mês”. Mas ainda que não houvesse essa previsão expressa, sempre assistiria à entidade empregadora a possibilidade de fazer cessar a situação justificativa de isenção de horário de trabalho, desde que o fizesse licitamente, em consequência fazendo igualmente cessar o pagamento da contrapartida correspondente.
Concluindo, quanto a esta questão improcede o recurso.
II.3 Numa segunda linha de fundamentação vem a recorrente autora insurgir-se contra a sentença por ter absolvido a Ré do pedido de condenação no pagamento de € 6.587,38, correspondente aos montantes que lhe debitou por incumprimento relativamente aos seus empréstimos [conclusões N a X].
Sobre este pedido, da fundamentação da sentença consta o seguinte:
- «Pede também a autora a condenação da ré no pagamento da quantia de € 6.587,38, correspondente aos montantes que lhe foram debitados à autora aos seus empréstimos e conta (despesas, juros e imposto de selo), acrescido de juros de mora calculados à taxa de 4% a partir da data da citação
Alega para tanto a autora que, enquanto trabalhadora da ré, contraiu junto desta três empréstimos, em condições especiais perante essa sua qualidade de trabalhadora, mas que com o despedimento no ano de 2012 cessou o pagamento das prestações mensais para amortização de tais créditos, já que seu salário era a única fonte de rendimento e, perante a ausência deste, deixou de ter capacidade para solver suas obrigações. Estabelece, assim, a autora o nexo causal entre o seu despedimento ilícito e o incumprimento que originou o débito das quantias discriminadas sob o ponto 18. dos factos provados.
Em resposta a ré afirmou que tais débitos decorrem apenas do incumprimento em que a autora entrou, cujo fundamento desconhece, admitindo, porém, ter sido indevidamente debitada a quantia de €122,50, acrescida de imposto de selo, a título de juros.
Em audiência de julgamento resultou provado a existência dos três contratos de créditos, a cessação de pagamento pela autora das prestações mensais acordadas para amortização dos mesmos a partir de setembro de 2012 (mês seguinte ao do despedimento) e o débito pela ré das quantias alegadas pela autora a título de despesas, juros e imposto de selo.
No entanto, não logrou a autora provar que esse incumprimento, que a cessação e pagamento das prestações mensais se tenha devido a uma qualquer situação de insuficiência económica (que tenha deixado de ter rendimentos bastantes para tal pagamento). Apenas resultou provado o efetivo não pagamento das prestações mensais acordadas, o montante auferido pela autora à titulo de subsídio de desemprego, e ainda que ocorreu o débito indevido pela ré da quantia de €122,50 e respetivo imposto de selo que a ré confessou.
Deste modo, não estando estabelecida a causalidade entre o ato ilícito da ré (despedimento da autora) e o incumprimento pela autora das suas obrigações contratuais, não pode ser a ré responsável pelos danos sofridos pela autora em consequência de tal incumprimento.
O não pagamento das prestações mensais para amortização dos créditos contraídos pela autora junto da ré (contrato independentes do contrato de trabalho em causa nos autos) consubstancia um incumprimento contratual, que por tal se presume culposo nos termos do art. 799º do Código Civil. Como tal, incumbia a autora a prova de que este incumprimento não adveio de culpa sua, conforme lhe competia (art. 344º, n.º 1, do Código Civil). Não o tendo feito, improcede o peticionado».
Alega a recorrente que a declaração de ilicitude do despedimento impediu a recorrida de passar a tratar a conta, produtos e serviços titulados e utilizados pela recorrente como se fosse um cliente não trabalhador, não podendo tirar vantagem financeira da sua conduta ilegal, debitando a recorrente por despesas, juros moratórios e imposto de selo, relativamente aos créditos que tinha contratado como trabalhadora. A privação da remuneração impossibilitou a recorrente de proceder ao pagamento mensal dos seus créditos, “havendo óbvio nexo de causalidade entre o despedimento ilícito da recorrente, o não pagamento ilegal das suas retribuições, e a impossibilidade de pagamento dos créditos, contraídos como trabalhadora”.
Contrapõe a recorrida, que a Recorrente não fez prova que pudesse estabelecer um nexo causal entre o despedimento e o incumprimento, prova que a ela cabia fazer. Não havendo qualquer nexo demonstrado, não pode o incumprimento da Recorrente ser imputado à Recorrida.
Diremos desde já que concordamos com a fundamentação da sentença e, logo, com a decisão a que conduziu.
Justificando essa asserção, começaremos por dizer que a autora sustentou este pedido alegando, no essencial, o seguinte:
i) “como trabalhadora do banco réu contraiu junto deste os seguintes empréstimos: a. Credito pessoal nº ………….-.; b. Crédito à habitação nº ………….-.; c. Crédito à habitação nº …………..-..”.
ii) Esses “créditos foram contraídos nas condições especiais aplicáveis aos trabalhadores do banco réu”.
iii) Constituindo o seu salário a única fonte de rendimento para solver os respetivos compromissos.
iv) “Em consequência do despedimento e da perda do salário, deixou de ter capacidade financeira para proceder ao pontual pagamento dos empréstimos acima referidos”.
No recurso, no essencial, a recorrente vem reiterar a posição que afirmou na petição inicial, defendendo “have(r) óbvio nexo de causalidade entre o despedimento ilícito da recorrente, o não pagamento ilegal das suas retribuições, e a impossibilidade de pagamento dos créditos, contraídos como trabalhadora”. Para estribar essa afirmação invoca ter resultado provado o seguinte:
- A recorrida despediu a recorrente em 16 de agosto de 2012 (Facto nº 5);
- Em consequência do despedimento a recorrida passou a tratar a conta, produtos e serviços titulados e utilizados pela recorrente como se fosse uma cliente não trabalhadora (facto nº 7);
- O despedimento da recorrente pela recorrida foi julgado ilícito (facto nº 9);
- Com o despedimento a recorrente cessou o pagamento das prestações mensais dos seus créditos e a recorrida debitou-lhe despesas, juros moratórios e imposto de selo no valor global de € 6.587,38 (factos 17, 18 e 19).
Não questionamos que a perda da retribuição mensal, como consequência do despedimento, tenha tido repercussão na situação económica da autora, pese embora tenha passado a receber subsídio da situação de desemprego, mais precisamente, a quantia global de €24.021,30.
Porém, não estão provados factos suficientes, que de resto nem foram alegados, para se poder concluir que o seu salário fosse a única fonte de rendimento para pagar as prestações relativas aos três créditos contraídos junto da Ré e, em consequência, que tendo ficado sem o receber, tal implicou, como consequência directa e necessária, ter ficado sem capacidade financeira para proceder ao pontual pagamento das mesmas.
Veja-se que dos três empréstimos, dois respeitam a Crédito à habitação (nº ………….-. e nº …………..-.). Ora, não se sabe se respeitam a um só imóvel para habitação da Autora, ou a dois imóveis, caso em que interessaria saber se algum deles lhe proporcionava algum rendimento. Assim como não se sabe qual a constituição do agregado familiar da autora, ou seja, se é apenas ela ou se é casada ou vive em união de facto, sendo que nesta última hipótese importaria também estar demonstrado o rendimento global do agregado familiar. Para além destas, que referimos a título meramente exemplificativo, outras questões mais se podem colocar.
Por conseguinte, com o devido respeito, o Tribunal a quo ajuizou bem ao considerar que “não logrou a autora provar que esse incumprimento, que a cessação e pagamento das prestações mensais se tenha devido a uma qualquer situação de insuficiência económica (que tenha deixado de ter rendimentos bastantes para tal pagamento”.
Por último, no que respeita às despesas debitadas, que a Recorrente refere, mas sem concretizar quais são exctamente aquelas a que se está a referir, umas respeitam a despesas de recuperação de crédito e outras a despesas de manutenção, sendo que todas elas foram debitadas na sequência da regularização dos empréstimos, nos anos de 2015 e 2016 (factos 19, 21 e 22).
A autora alegou e ficou demonstrado (facto 15) que os 3 créditos foram contraídos nas condições especiais aplicáveis aos trabalhadores do banco réu: Crédito Pessoal: ………….-. = Euribor 6 meses acrescida de 2,5%; Crédito à Habitação n.º. …………..-. = Euribor 6 meses acrescida de 0,75%; e, Crédito à Habitação n.º. …………..-. = Euribor 6 meses acrescida de 0,75%.
Mas já não está demonstrado, nem foi alegado sequer, que esses créditos ou as contas a que estão associados beneficiavam de outras condições especiais para além da taxa Euribor.
Em contraponto, alegou a recorrida e demonstrou-o, como resulta dos factos 30, 31, 32 e 33, o seguinte:
30. Os benefícios para trabalhadores da Ré foram instituídos através do Protocolo de Colaboradores entrou em vigor no final de outubro de 2015.
31. Com a entrada em produção do protocolo de colaboradores do grupo C2…, os benefícios, que constam no preçário capítulo 12, só são elegíveis para os produtos/serviços associados à conta à ordem aberta na Ré e onde está domiciliado o vencimento e desde que o trabalhador seja associado efetivo da C1….
32. A conta à ordem da autora associada aos contratos é a …-..-…….-. e a conta para crédito do seu vencimento, desde maio de 2015, é a …-..-……-..
33. A Autora deixou de ser associada da C1… pelo menos em fevereiro de 2016.
Destes factos retira-se que os benefícios não são elegíveis para todas as contas, mas apenas “para os produtos/serviços associados à conta à ordem aberta na Ré e onde está domiciliado o vencimento”, bem assim que para deles beneficiar o trabalhador tem que ser associado efetivo da C1….
No caso temos despesas com fundamentos diferentes e respeitantes a três contas, acrescendo que a Autora deixou de ser associada da C1…, pelo menos em fevereiro de 2016.
Neste quadro, como parece forçoso concluir, nem sequer se consegue determinar quais seriam as despesas que eventualmente não deveriam ser cobradas, alegadamente por não serem devidas em virtude de estarem a coberto de algum dos benefícios elegíveis.
Ora, cabia à autora ter alegado os factos necessários e suficientes para demonstrar, caso os provasse (art.º 342.º do CC), quais as despesas que terão sido indevidamente cobradas pela Ré, ónus que não cumpriu.
Concluindo, também quanto a este ponto improcede o recurso.
II.3 Por último, discorda a recorrente da sentença por ter julgado improcedente o pedido de condenação da Ré a atribuir-lhe uma carteira de clientes [conclusões Y a EE].
Quanto a esta questão, pronunciou-se o Tribunal a quo como segue:
Por fim, pede a autora a condenação da ré em atribuir-lhe uma carteira de clientes.
Conforme resulta dos factos provados, a autora tem a categoria profissional de gestora de cliente e não tem carteira de clientes atribuída.
Como supra se deixou expresso às partes é aplicável o ACT para o Setor Bancário publicado no BTE n.º 20, de 30/5/2011. Mais recentemente foi celebrado entre a ré o sindicato em que a autora é filiada um Acordo Coletivo cuja revisão global está publicada no BTE n.º 7 de 22/2/2017.
Conforme consta no Anexo I deste último Acordo Coletivo, a descrição funcional de Gestor de Cliente vem expressa nos seguintes termos: “Exerce os poderes que lhe são superiormente delegados para atender, contactar, representar e negociar com as pessoas que integram a carteira de clientes que acompanha, por forma a satisfazer as necessidades financeiras destes e promover os produtos e serviços das instituições subscritoras. Angaria novo negócio, podendo assumir a responsabilidade de monitorizar todo o processo de contratação de novas operações bem como de efetuar prospeções de mercado.”
A autora, a par de cerca de 60 outros gestores de clientes da ré não tem carteira de clientes atribuída e tem por função a angariação de novo negócio e contratação de novas operações bem como na prospeção do mercado.
Defende a ré a impossibilidade de atribuir à autora uma específica e individual carteira de clientes, pois, após a reestruturação da rede de balcões da Ré, esta rede foi reduzida, desde 2012, de cerca de 450 balcões para, atualmente, cerca de 330 balcões.
De acordo com a cláusula 26º do Acordo Coletivo:
“1- O trabalhador deve exercer funções correspondentes à atividade para que foi contratado.
2- Nos termos da lei, a atividade contratada abrange ainda as funções compreendidas no grupo profissional em que o trabalhador se encontra integrado.”
Na verdade, dispõem o n.º 2 e 3 do art. 118º do Código do Trabalho que: “2 - A atividade contratada, ainda que determinada por remissão para categoria profissional de instrumento de regulamentação coletiva de trabalho ou regulamento interno de empresa, compreende as funções que lhe sejam afins ou funcionalmente ligadas, para as quais o trabalhador tenha qualificação adequada e que não impliquem desvalorização profissional. 3 - Para efeitos do número anterior e sem prejuízo do disposto em instrumento de regulamentação coletiva de trabalho, consideram-se afins ou funcionalmente ligadas, designadamente, as funções compreendidas no mesmo grupo ou carreira profissional.”
Ora, apesar de se entender que as funções exercidas pela autora se integram no descritivo funcional de sua categoria profissional (já que se dedica à angariação de novo negócio, contratação de novas operações e prospeção do mercado) a verdade é que dentro do grupo profissional da autora se insere o Assistente Comercial, cujo descritivo funcional consta do acordo coletivo (de igual modo no Anexo I) nos seguintes termos: “Integrado numa rede comercial, promove o atendimento geral de clientes e assegura o tratamento operacional de acordo com as regras instituídas. Pode ter uma carteira de clientes alocada de pequena dimensão.” Como tal, ainda que a autora sinta que nem todas as suas funções correspondem inteiramente à sua categoria profissional, a verdade é que as pode ver mitigadas com funções de outra categoria profissional, dentro do grupo profissional em que se insere.
Deste modo, e considerando o exposto, improcede também o pedido da autora de atribuição de carteira de clientes.
Em consequência, fica prejudicado o conhecimento do pedido de condenação da ré em sanção pecuniária compulsória por cada dia em que não atribua à autora uma carteira de clientes».
Sustenta a recorrente que as funções para que foi contratada, gestor de cliente, envolvem o atendimento, representação e negociação com as pessoas que integram a carteira de clientes que lhe está atribuída. No balcão onde está colocada há uma carteira de clientes que foi atribuída a outra trabalhadora colocada posteriormente no Balcão. Os contratos, são para serem cumpridos nos exatos termos em que foram celebrados, não podendo esse cumprimento ser “mitigado” pelo exercício da função de outra categoria profissional, como a sentença recorrida erradamente defende.
Responde a recorrida, alegando que não só as funções que a Recorrente exerce se enquadram no âmbito do descritivo de funções do Gestor de Cliente - a sua categoria profissional-, como também, as demais funções integram-se em categoria profissional do mesmo Grupo, o que é expressamente admitido pela cláusula 26.ª do ACT e pelo artigo 118.º, n.ºs 2 e 3 do Código do Trabalho.
Refere, ainda, que como ficou provado – factos 35, 36 e 37 –, existe um total de 413 trabalhadores com a categoria de Gestor de Cliente e após a reestruturação da rede de balcões, esta foi reduzida, desde 2012, de cerca de 450 balcões para, atualmente, cerca de 330 balcões, pelo que nem todos os Gestores de Clientes podem ter atribuída uma carteira de clientes, havendo cerca de 60 trabalhadores da Ré com a categoria de Gestor de Cliente que não têm carteira de clientes atribuída. A não atribuição de carteira de clientes resulta simplesmente do facto de a Recorrida não ter carteiras de clientes que possa atribuir a todos os seus trabalhadores com a categoria de Gestor de Cliente.
Concordamos, no essencial, com a fundamentação da sentença recorrida, crendo-se que faz uma correcta aplicação do direito aos factos.
Em contraponto, importa começar por assinalar que a recorrente vem invocar factos que nem estão provados e, para além disso, ignora factos relevantes que constam provados, referidos na fundamentação e essenciais para a apreciação da questão. Melhor explicando, não está provado que a carteira de clientes do balcão onde a autora está colocada tenha sido atribuída a outra trabalhadora ali colocada posteriormente, mas está provado o que consta dos factos 34 a 38, resultantes de alegação da Ré para justificar não ter atribuída carteira de clientes.
Adiante justificaremos estas asserções.
II.3.1 Antes de nos determos sobre a argumentação da recorrente, afigura-se-nos pertinente deixar as noções essenciais a propósito da noção de “categoria profissional”.
A posição do trabalhador na organização em que se integra define-se a partir daquilo que lhe cabe fazer, isto é, pelo conjunto de tarefas serviços e tarefas que formam o objecto da prestação de trabalho, o qual determina-se a partir da actividade contratada com o empregador [art.º 111.º n.º1 /CT 2003 e 115.º n.º 1, do CT 09].
É neste contexto que surgem as referências à categoria do trabalhador e ao seu “direito à categoria”. Contudo, como aponta a doutrina, há que destrinçar entre os vários significados da designação categoria com efeitos juridicamente relevantes [Cfr. Bernardo da Gama Lobo Xavier Iniciação ao Direito do Trabalho, 2.ª Edição, Verbo, Lisboa, 1999, pp. 171].
A definição da actividade contratada, isto é, daquele conjunto de tarefas e serviços que formam o objecto do contrato de trabalho, pode ser feita por remissão para a categoria constante de regulamentação colectiva aplicável ou de regulamento interno da empresa [art.º 111.º n.º 2, CT/2003; e, 118.º n.º2, CT/09]. Neste caso, a categoria representa o objecto da prestação de trabalho. O género de tarefas e serviços a prestar pelo trabalhador são identificados com referência à qualificação de funções de um profissional-tipo.
Pelas palavras de António Monteiro Fernandes, “A categoria exprime, assim, um «género» de actividades contratadas - Há-de caber nesse género, pelo menos na sua parte essencial ou característica, a função principal que ao trabalhador está atribuída na organização (art.º 118.º), e que é já uma aplicação ou concretização da «actividade contratada». [Op. cit. p. 200].
Mas como elucida Maria do Rosário Palma Ramalho, “A situação jurídica do trabalhador no contrato de trabalho envolve também uma componente vertical, que tem a ver com a posição que ele ocupa no seio da organização do empregador.(..) Por força da componente organizacional do contrato de trabalho, o trabalhador integra-se necessariamente na organização do trabalhador e essa integração tem efeitos na sua situação juslaboral” [Op. Cit, p. 459].
Aqui saímos do plano relativo à delimitação das funções que ao trabalhador cabe desempenhar, que dependem do objecto fixado no contrato, isto é da categoria objectiva, para se entender a referência a categoria já como reportada a um certo estatuto, nomeadamente retributivo [cfr. Bernardo da Gama Lobo Xavier, op. cit., pp. 174].
Em suma, consideradas essas diferentes vertentes, pode dizer-se, pelas palavras de Monteiro Fernandes, que “A categoria constitui um fundamental meio de delimitação de direitos e garantias do trabalhador – ou, noutros termos, de caracterização do seu estatuto profissional na empresa. É ela que define o posicionamento do trabalhador na hierarquia salarial, é ela que o situa no sistema de carreiras profissionais, é também ela que funciona como referencia para se saber o que pode e o que não pode a entidade empregadora exigir ao trabalhador” [Op. cit., pp. 200].
Não se esgota aqui o sentido da expressão categoria, mas no caso em apreço não se justifica aprofundar este ponto.
A lei não define categorias profissionais. Mas como decorre do art.º 1º do CT 09 (e decorria do art.º 1.º do CT/03), “O contrato de trabalho está sujeito, em especial, aos instrumentos de regulamentação colectiva de trabalho (..)”.,
É nesse pressuposto que se compreende que a definição de categorias esteja remetida para a contratação colectiva, no âmbito da qual se estabelecem os quadros de categorias, classes, níveis ou graus profissionais, acompanhados da descrição das funções correspondentes, que se correlacionam com um certo estatuto ou tratamento contratual, desde logo, ao nível remuneratório. A categoria “(..) assume, assim, a natureza de conceito normativo – no sentido de que converte a realidade empírica, a da execução consensual de certos trabalhos, num título de acesso a certos direitos, benefícios e garantias pré-definidas, integradores de um estatuto profissional reivindicável pelo trabalhador” [António Monteiro Fernandes, op. cit, pp. 204]
Justamente por tudo isso, na medida em que reflecte a posição contratual do trabalhador e sinaliza o seu estatuto sócio profissional, a categoria é objecto de protecção legal e convencional que se evidencia, sobretudo, a três níveis: (i) na actividade a desenvolver; (ii) na remuneração devida; (iii) na hierarquização do trabalhador no seio da empresa [Ac. STJ de 12-03-2008, Proc.º n.º 07S4219, Conselheiro Sousa Grandão, disponível em www.dgsi.pt/jstj].
Expressão legal dessa protecção resulta dos disposto no art.º 129.º n.º1, al. e), CT/2009 (e, resultava, nos mesmos termos, do art.º 122.º n.º 1 al. e), do CT/2003), estabelecendo a lei que o empregador não pode baixar a categoria ao trabalhador, consagrando, assim, o denominado princípio da irreversibilidade da carreira.
Como também elucida Maria do Rosário Palma Ramalho, “O conceito-chave para apreciar os elementos de inserção organizacional no contrato de trabalho na situação jurídica do trabalhador é ainda o conceito de categoria. (..) são relevantes para o recorte da posição do trabalhador na organização empresarial a categoria normativa (ou categoria-estatuto), denominação formal correspondente à função desempenhada pelo trabalhador, dada pelo instrumento de regulamentação colectiva de trabalho aplicável ou pelo regulamento de empresa em vigor; é a categoria interna à empresa, que define a posição concretamente ocupada pelo trabalhador na hierarquia empresarial” [Op. cit., p. 459].
Reportando-se igualmente à categoria do trabalhador, no sentido de categoria normativa, Bernardo da Gama Lobo Xavier escreve que “Tratar-se-á da posição em que o prestador de trabalho se encontra por determinação da regulamentação colectiva aplicável, pela correspondência das suas funções ou posto de trabalho a uma dada «categoria» ou «classe», relevante para efeitos de hierarquia salarial e outros. (..) Categoria, nesta acepção, significa, pois, uma designação à qual se reporta um estatuto próprio de acordo com o prescrito por referência aos quadros, descritivos e tabelas dos instrumentos de regulamentação colectiva. Neste sentido se poderá falar de um verdadeiro direito à categoria ou qualificação (..).Estaremos assim em presença de categoria normativa ou estatutária” [op. cit. p. 172].
A classificação profissional atribuída pelo empregador ao trabalhador, porque “(..) redunda na fixação de direitos e expectativas, está sujeita a controlo externo, nomeadamente judicial, que obedece a um critério único – o de privilegiar a função efectiva sobre a designação categorial com vista à polarização do estatuto do trabalhador em causa” [António Monteiro Fernandes, Op. cit., p. 205].
A qualificação correcta na categoria assume-se como um direito do trabalhador, na medida em que lhe fixa direitos, nomeadamente, integrando-o numa determinada carreira e sendo o factor de referência para a determinação da retribuição devida em contrapartida da prestação da sua actividade.
Contudo, poderá acontecer não ser viável o enquadramento pleno em determinado descritivo.
Mas se assim for, então “(..) deve ser reconhecida a categoria cujo «descritivo» mais se aproxime do tipo de actividade concretamente prestado; se duas categorias parecem igualmente ajustadas, tem de atribuir-se a mais elevada (isto é, a correspondente a funções mais valorizadas, de entre as quês estão cometidas ao trabalhador. Estas directrizes reflectem (..) o primado de um critério normativo de classificação profissional – critério ao qual não pode substituir-se o da entidade empregadora. Convém ter presente, neste ponto, que a categoria significa, para o trabalhador, não só a garantia de um certo estatuto remuneratório, mas também um referencial indispensável à salvaguarda da sua profissionalidade” [António Monteiro Fernandes, Op. cit., p. 211].
Por outras palavras, escreve-se no Acórdão de 12-03-2008, do Supremo Tribunal de Justiça [Proc.º n.º 07S4219, Conselheiro Sousa Grandão, disponível em www.dgsi.pt], “(..) a categoria profissional deve corresponder ao núcleo essencial das funções a que o trabalhador se vinculou legal ou contratualmente, não sendo necessário que exerça todas as funções que a essa categoria correspondem. O apelo ao “núcleo essencial” ou à “actividade predominante” constitui o parâmetro atendível quando o trabalhador exerça diversas actividades enquadráveis em diferentes categorias profissionais. Ademais, em caso de dúvida, deve o trabalhador ser classificado na categoria mais elevada que se aproxima das funções efectivamente exercidas”. Este é, desde há muito, o entendimento pacífico e uniforme da jurisprudência dos Tribunais superiores, como o ilustram, entre outros, os Acórdãos do STJ, de 23-05-2001, processo n.º 01S266, Conselheiro Almeida Deveza, e de 23-02-2012, processo n.º 4535/06.3TTLSB.L1.S1, Conselheiro Sampaio Gomes.
II.3.2 Revertendo ao caso, a autora foi contratada pelo D…, SA, para desempenhar as funções inerentes à categoria profissional de Gestor de Cliente.
No ACT aplicável, na versão vigente à data - publicado no BTE, 1.ª série, n.º 4, de 29/1/2005-, essa categoria profissional constava definida nos termos seguintes:
Gestor de cliente. — É o trabalhador a quem são conferidos poderes delegados para atender, representar e negociar com as pessoas que integram a carteira de clientes que lhe está atribuída, com o objectivo de satisfazer as necessidades financeiras destes e promover os produtos e serviços da instituição.
Na revisão desse ACT, publicada no BTE n.º 20, 29/5/2011, a definição daquela categoria profissional manteve-se inalterada.
Como resulta do facto 3, o contrato de trabalho da autora veio a ser transmitido para o Banco aqui Réu – C…, S.A. - em 25 de Março de 2011, em consequência deste ter adquirido o estabelecimento relativo à atividade exercida pelo D…, SA.
Em 2017, foi celebrado o “Acordo coletivo entre a C… e outros e a Federação dos Sindicatos Independentes da Banca - FSIB - Revisão global”, publicado no BTE n.º 7, 22/2/2017, instrumento de regulamentação colectiva de trabalho que passou a ser aplicado à relação de trabalho subordinado existente entre a autora e o Réu.
Na acção, a autora veio invocar este ACT, nomeadamente, a descrição da categoria profissional de Gestor de Cliente e a cláusula 26.º n.º1, para alegar que no exercício das funções que lhe estão atribuídas “limita-se a promover o atendimento geral de clientes e a assegurar o tratamento operacional resultante desse atendimento” (art.º 76.º), não lhe estando atribuída carteira de clientes, “somente (…) por decisão superior e como retaliação pela ação de impugnação do despedimento” (art.º 78.º), defendendo que o Réu deve “ser condenado a atribuir à autora uma carteira de clientes, de modo a que esta possa exercer as funções de atendimento, representação e negociação com os clientes que integram essa carteira profissional fixada no contrato de trabalho”.
Adianta-se, desde já, estar apenas provado que a autora não tem atribuída uma carteira de clientes (facto 13).
No ACT de 22-02-2017, a categoria profissional de Gestor de cliente, consta descrita nos teros seguintes:
- Exerce os poderes que lhe são superiormente delegados para atender, contactar, representar e negociar com as pessoas que integram a carteira de clientes que acompanha, por forma a satisfazer as necessidades financeiras destes e promover os produtos e serviços das instituições subscritoras. Angaria novo negócio, podendo assumir a responsabilidade de monitorizar todo o processo de contratação de novas operações bem como de efetuar prospeções de mercado”.
Em face da pretensão deduzida pela autora quanto a este ponto, reclamando a atribuição de uma carteira de clientes para que “possa exercer as funções de atendimento, representação e negociação com os clientes que integram essa carteira profissional fixada no contrato de trabalho”, não está aqui em causa o desempenho de funções próprias de categoria inferior, o que se traduziria numa baixa de categoria, nem o inverso, ou seja, exercer funções de categoria superior sem que esta lhe fosse reconhecida. Para além disso, não está igualmente em causa o valor da retribuição correspondente à categoria profissional.
Dito por outras palavras, a autora não questiona que esteja correctamente qualificada na categoria profissional e, por via disso, inserida no lugar próprio na estrutura organizacional da empresa Ré e auferindo a retribuição correspondente. A sua pretensão cinge-se, pois, a que lhe sejam atribuídas a globalidade das funções constantes do descritivo da categoria profissional contratada, que na sua perspectiva não lhe estarão a ser destinadas “somente (…) por decisão superior e como retaliação pela ação de impugnação do despedimento”.
Importa fazer aqui um parêntesis e assinalar, para que fique devidamente esclarecido, que aquela alegação não foi sequer sustentada com factos concretos e precisos, que caso viessem a ser provados, pudessem conduzir à conclusão do insinuado propósito do Réu. A autora apenas veio invocar que uma outra trabalhadora colocada depois dela naquele balcão tem atribuída carteira de clientes, o que não seria suficiente, só por si, para demostrar o alegado propósito de “retaliação”, argumento que agora vem reiterar. Certo é, que nem tal consta provado, nem a autora impugnou a decisão sobre a matéria de facto, por isso não sendo sequer tal eventual facto invocável, como o vem aqui fazer.
A este propósito, embora também não conste na matéria provada, por uma questão de igualdade, deve referir-se que em contraponto o Réu veio alegar que a aludida trabalhadora tem maior antiguidade na categoria que a autora (desde 2005).
Avançando, na Cláusula 26.ª do ACT/22-02-2017, cuja violação é invocada pela autora e recorrente, consta o seguinte:
1- O trabalhador deve exercer funções correspondentes à atividade para que foi contratado.
2- Nos termos da lei, a atividade contratada abrange ainda as funções compreendidas no grupo profissional em que o trabalhador se encontra integrado».
Por seu turno, o artigo 118.º do CT/09, com a epígrafe “Funções desempenhadas pelo trabalhador”, no que aqui releva estabelece o seguinte:
1 - O trabalhador deve, em princípio, exercer funções correspondentes à actividade para que se encontra contratado, devendo o empregador atribuir-lhe, no âmbito da referida actividade, as funções mais adequadas às suas aptidões e qualificação profissional.
2 - A actividade contratada, ainda que determinada por remissão para categoria profissional de instrumento de regulamentação colectiva de trabalho ou regulamento interno de empresa, compreende as funções que lhe sejam afins ou funcionalmente ligadas, para as quais o trabalhador tenha qualificação adequada e que não impliquem desvalorização profissional.
3 - Para efeitos do número anterior e sem prejuízo do disposto em instrumento de regulamentação colectiva de trabalho, consideram-se afins ou funcionalmente ligadas, designadamente, as funções compreendidas no mesmo grupo ou carreira profissional».
Deste artigo resulta, no essencial, o propósito de delimitar o poder de direcção da entidade empregadora, para em contraponto assegurar o direito dos trabalhadores ao exercício das funções contratadas, mas abrangendo estas, ainda que a actividade contratada tenha sido determinada por remissão para categoria profissional, “as funções que lhe sejam afins ou funcionalmente ligadas, para as quais o trabalhador tenha qualificação adequada e que não impliquem desvalorização profissional”, considerando-se como tal, “designadamente, as funções compreendidas no mesmo grupo ou carreira profissional”.
Confrontado o teor da cláusula 26.º com o estabelecido no art.º 118.º, constata-se que aquela compagina-se com este, designadamente no seu n.º2, ao referir que “a atividade contratada abrange ainda as funções compreendidas no grupo profissional em que o trabalhador se encontra integrado”, que mais não é que uma síntese dos n.ºs 2 e 3 daquele artigo.
Como se deixou assinalado, a recorrente autora argumenta que as funções para que foi contratada envolvem o atendimento, representação e negociação com as pessoas que integram a carteira de clientes que lhe está atribuída. É certo, mas também não o é menos, que as funções compreendidas na descrição funcional da categoria “gestor de cliente” não se esgotam no acompanhamento da carteira de clientes, dado prever-se, também, que o trabalhador com essa qualificação “Angaria novo negócio, podendo assumir a responsabilidade de monitorizar todo o processo de contratação de novas operações bem como de efetuar prospeções de mercado”.
Mais do que isso, nos termos em que está feita a descrição, colocando em paridade duas vertentes diferentes do exercício das funções próprias da categoria profissional, nem pode dizer-se que qualquer uma delas constitua o “núcleo essencial”, isto é, que seja a predominante.
Ora, para que o trabalhador esteja a “exercer funções correspondentes à atividade para que foi contratado”, não é indispensável que exerça todas aquelas que estão previstas na descrição funcional da categoria, sendo bastante que exerça parte delas. Mais, mesmo que existam outros trabalhadores que as exerçam integralmente, o afirmado continua a ser válido, embora neste caso seja necessário que existam razões atendíveis para justificar essa diferenciação.
É o que acontece no caso em presença, tendo a Ré alegado e demonstrado os factos referidos na fundamentação da sentença recorrida, relativamente aos quais nada veio dizer a recorrente, ignorando-os como se fossem irrelevantes para a decisão, nomeadamente, os seguintes:
34. Por regra, a cada balcão da Ré corresponde uma carteira de clientes.
35. No caso da Ré, existe um total de 413 trabalhadores com a categoria de Gestor de Cliente.
36. Após a reestruturação da rede de balcões da Ré, esta rede foi reduzida, desde 2012, de cerca de 450 balcões para, atualmente, cerca de 330 balcões, pelo que nem todos os Gestores de Clientes podem ter atribuída uma carteira de clientes.
37. Há cerca de 60 trabalhadores da Ré com a categoria de Gestor de Cliente que não têm carteira de clientes atribuída.
38. Os quais têm por função a angariação de novo negócio e contratação de novas operações bem como na prospeção do mercado.
Perante este quadro, cremos estar perante razões válidas, licitas e suficientes para justificarem o facto da autora não ter atribuída “carteira de clientes”. A autora não é a única trabalhadora com a categoria de Gestor de cliente que não tem atribuída carteira de clientes, mas uma de entre um conjunto de 60 trabalhadores. A razão resulta da realidade actual do Banco em número de balcões, reduzidos de cerca de 450 em 2012, para 330 na actualidade, não gerando necessidades suficientes para atribuir carteira de clientes aos 413 trabalhadores com aquela categoria, já que a regra é de uma por cada balcão.
Acresce dizer, que inexistem provados quaisquer outros factos que possam por em causa quer essa realidade, quer a lisura e boa-fé da Ré na tomada dessa decisão, mormente, no que concerne à autora.
Alega a recorrente que os contratos são para serem cumpridos nos exatos termos em que foram celebrados, não podendo esse cumprimento ser “mitigado” pelo exercício da função de outra categoria profissional. Refere-se à categoria de Assistente comercial, mencionada na fundamentação da sentença, cuja descrição funcional é a seguinte:
- “Integrado numa rede comercial, promove o atendimento geral de clientes e assegura o tratamento operacional de acordo com as regras instituídas. Pode ter uma carteira de clientes alocada de pequena dimensão”.
Com o devido respeito, a recorrente está a fazer uma interpretação da sentença recorrida que não é rigorosa, não tendo em conta que o Tribunal a quo começou por concluir que “que as funções exercidas pela autora se integram no descritivo funcional de sua categoria profissional (já que se dedica à angariação de novo negócio, contratação de novas operações e prospeção do mercado)”.
A parte que se segue é um argumento complementar, que o tribunal entendeu acrescentar, como se extrai deste segmento: “Como tal, ainda que a autora sinta que nem todas as suas funções correspondem inteiramente à sua categoria profissional, a verdade é que as pode ver mitigadas com funções de outra categoria profissional”.
Mas tendo previamente cuidado de deixar afirmado que a categoria profissional de Assistente Comercial integra o grupo profissional da autora, afirmação que deve ser contextualizada com o disposto no n.º2, da cláusula 26.ª, que já fora referida na fundamentação, onde se estabelece, repete-se, que “Nos termos da lei, a atividade contratada abrange ainda as funções compreendidas no grupo profissional em que o trabalhador se encontra integrado”.
Com efeito, a categoria de Gestor de cliente, tal como a de assistente comercial, integram-se ambas no Grupo B, designado por Comercial.
Assim sendo, em conformidade com o disposto na cláusula 26.ª, bem assim no art.º 118.º do CT, nada obsta a que a autora, para além das funções próprias da sua categoria, complementarmente execute ainda funções da categoria de Assistente comercial, designadamente, assegurando “o atendimento geral de clientes e assegura o tratamento operacional de acordo com as regras instituídas”.
Foi isso que o Tribunal a quo quis deixar esclarecido e, na nossa perspectiva, com acerto.
Por conseguinte, não se reconhece razão à recorrente, assim improcedendo também este ponto do recurso.
III. DECISÃO
Em face do exposto, acordam os Juízes desta Relação em julgar o recurso improcedente, em consequência confirmando-se a sentença recorrida.

Custas pela recorrente, atento o decaimento (art.º 527.º 2, CPC).

Porto, 22 de Fevereiro de 2021
Jerónimo Freitas
Nelson Fernandes
Rita Romeira