Acórdão do Tribunal da Relação do Porto | |||
Processo: |
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Nº Convencional: | JTRP000 | ||
Relator: | RUI MOREIRA | ||
Descritores: | PROPOSITURA DA AÇÃO AUTOR MORTE HABILITAÇÃO DE HERDEIROS | ||
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Nº do Documento: | RP20241211288/20.0T8ILH.P1 | ||
Data do Acordão: | 12/11/2024 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Texto Integral: | S | ||
Privacidade: | 1 | ||
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Meio Processual: | APELAÇÃO | ||
Decisão: | CONFIRMADA | ||
Indicações Eventuais: | 2ª SECÇÃO | ||
Área Temática: | . | ||
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Sumário: | I - À luz do disposto no art. 351º, nº 3 do CPC, numa acção proposta depois de falecido o autor e pretendendo sustentar-se que o processo se não extinga numa das hipóteses previstas no art. 1175º do C. Civil, haverá o advogado que exerceu o mandato depois do falecimento do mandante alegar que o fez sem que soubesse desse falecimento, ou as razões pelas quais, sabendo-o, propôs a acção, em ordem a prevenir prejuízos para os respectivos herdeiros. E de tudo o que alegar deve oferecer a respectiva prova, assim se processando o incidente. II - O incumprimento do ónus de formulação de requerimento probatório não é susceptível de ser ignorado e superado por via de um convite a aperfeiçoamento. III - Perante um requerimento instrutório, num incidente de habilitação de herdeiros, em que apenas é oferecida prova sobre a qualidade dos sucessores da parte falecida, mas nada é requerido quanto à verificação de uma excepção apta a permitir a continuidade de uma acção proposta depois do falecimento da autora, excepção esta impugnada pela parte contrária, não cabe ao tribunal convidar o respectivo Il. Mandatário a vir indicar a prova dessa excepção (o seu conhecimento tardio daquele falecimento). Isso constituiria puro atropelo do regime estabelecido no art. 293º do CPC, não legitimado, nem pelo princípio da cooperação (art. 7º), nem pelo princípio do inquisitório (art. 411º). | ||
Reclamações: | |||
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Decisão Texto Integral: | Proc. nº 288/20.0T8ILH.P1 Tribunal Judicial da Comarca de Aveiro Juízo de Competência Genérica de Ílhavo - Juiz 2 REL. N.º 918 Relator: Juiz Desembargador Rui Moreira 1º Adjunto: Juíza Desembargadora Lina Castro Batista 2º Adjunto: Juiz Desembargador Rodrigues Pires * ACORDAM NO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DO PORTO1 – RELATÓRIO * AA, representada pela sua procuradora BB, intentou a presente ação declarativa de condenação contra as rés A...; B..., Compañia de Seguros Y Reaseguros, SA-Sucursal em Portugal, pedindo que as mesmas fossem condenadas à realização de diversos trabalhos na sua casa, tendentes à reparação de danos causados no respectivo telhado, por funcionário da 1ª ré, aquando da instalação de equipamento necessário à prestação de serviços de televisão, internet e telefone que com ela contratara, ou a pagarem-lhe a quantia necessária para realizar tais reparações, num valor nunca inferior a €20.229,00 (vinte mil duzentos e vinte e nove euros), acrescido do respetivo IVA.Em face dos danos provocados no telhado, com telhas partidas, removidas e cumes partidos, originando infiltrações para o interior, concluiu a autora, que a ré A... é responsável pela respectiva reparação, sendo que tal responsabilidade havia sido transferida para a ré B..., Compañia de Seguros Y Reaseguros, SA-Sucursal em Portugal. Regularmente citadas, as rés, por exceção e por impugnação, pugnaram pela improcedência da ação. Foi admita a intervenção principal provocada, pelo lado passivo, de “C..., SA” e de “D... – Companhia de Seguros, SA; E..., Lda [substituída por CC e DD; F... Limited – Sucursal em Portugal e de G..., Lda e de H..., Companhia de Seguros, S.A No essencial, pugnaram pela improcedência da ação. Foi prolatado despacho saneador, com a fixação do objeto do litígio, bem como dos temas da prova. Por requerimento de 26.10.2024, a ilustre advogada subscritora da petição inicial, que dera entrada em 18.06.2020, veio informar, com cópia da certidão de óbito, que a autora havia falecido no dia 01.10.2019, e BB e EE, na qualidade de herdeiros da falecida, requereram a sua habilitação para intervirem nos autos, no lugar da autora. Cumprido o contraditório, C..., S.A., B... Compañia de Seguros Y Reaseguros, S.A. – Sucursal em Portugal; A..., S.A e D... – Companhia de Seguros, S.A., contestaram tal incidente de habilitação de herdeiros onde, no essencial, pugnaram pela absolvição da instância, porquanto se verificou que, na data em que a petição inicial deu entrada em juízo, já AA havia falecido, razão pela qual a procuração junta pela ilustre advogada subscritora da petição inicial já havia perdido qualquer efeito e valor jurídico. Ouvida a ilustre advogada, referiu que entre o decesso de AA e a propositura da ação havia decorrido hiato de tempo considerável, sem que, contudo, tivesse conhecimento do seu falecimento pugnando, no final, pelo prosseguimento dos autos. Foi, então, proferida a decisão sob recurso, de onde se retiram os seguintes excertos: “(…) Ora, tendo em consideração que a ilustre advogada subscritora da petição inicial deu entrada da mesma neste juízo no dia 18.06.2020; sendo que a mesma era instruída com uma procuração datada do dia 05.06.2018 e que AA faleceu no dia 01.10.2019, isto é, no período compreendido entre a assinatura da dita procuração e o momento em que foi intentada a presente ação, rapidamente se conclui que estamos perante uma situação de inexistência de mandato. (…) Além do mais, como se pode extrair do acórdão citado pela ilustre advogada, prolatado pelo Tribunal da Relação do Porto de 26.09.2022 (P. 1134/21.3T8MCN.P1) “… Quer isto dizer que, mesmo tendo falecido o A. antes da proposição da ação, o respetivo mandatário que ignore o seu falecimento e a caducidade do mandato, pode propor a ação, que se suspende com o conhecimento do óbito, podendo os seus sucessores ser habilitados no incidente próprio. É nesse incidente que o mandatário deverá alegar ter tido conhecimento do óbito do mandante só depois de instaurar a ação, não sendo em articulado de resposta à contestação que o deverá fazer.” Com efeito, confrontando com o requerimento de incidente à habilitação de herdeiros, verifica-se que esta circunstância não foi devidamente alegada, apenas e tão-só, em requerimento de resposta às contestações apresentadas. Neste conspecto, nos termos do preceituado no artigo 48.º, n.º 2 do Código de Processo Civil, tendo sido intentada a presente ação com base numa procuração que já havia caducado e sendo impossível fixar prazo para suprir a falta de procuração, com a respetiva ratificação pela parte do processado, fica sem efeito tudo o que tiver sido praticado pelo respetivo advogado subscritor, devendo este ser condenado nas custas respetivas. O que se decidirá Tendo em consideração o que antecede, a verificação da falta de procuração configura uma exceção dilatória, com a consequente absolvição da instância dos réus e demais intervenientes – cfr. artigos 576.º, n. º1 e n.º 2 e 577.º, al. h), ambos do CPC. O que se decidirá.” Sucessivamente, foi dado sem efeito tudo o que foi praticado nestes autos pela Advogada subscritora da petição inicial que deu origem à presente ação declarativa e absolvidos réus e intervenientes da correspondente instância, ficando prejudicada a apreciação do incidente de habilitação de herdeiros e imputando-se à Il. Advogada as custas devidas. * É desta decisão que vem interposto o presente recurso, sendo indicados como apelantes a própria autora falecida AA e os requerentes no incidente de habilitação BB e EE.Concluem nos termos seguintes: “1 - O presente recurso tem por objecto a douta sentença proferida nos autos supra, datada de 08.04.2024. 2 - Ora salvo o devido respeito, discordam os aqui Recorrentes, da decisão do Sr. Meritíssimo Dr. Juiz a quo, pelos fundamentos que se passarão a explanar. 3 — Com o presente recurso, os Recorrentes têm em vista, a interpretação e a aplicação da lei aos factos, considerando ser a sentença proferida nestes autos, defeituosa na aplicação do direito, 4 - Pelo que o presente Recurso versará sobre matéria de direito no sentido da sua errônea aplicação, mais concretamente: - violação dos arts. 1175”, nº.2 do Código Civil, dos arts. 48" e 351º, nº3 do Código Processo Civil, - violação dos artigos 411“, 412º, 590º nº 3 do Código de Processo Civil, - violação dos artigos 48º, nº?. e l95º, nº1, do Código de Processo Civil, - Da inexistência e/ou caducidade do mandato: 5 — Entendeu o Tribunal a quo que “tendo em consideração que a ilustre advogada subscritora da petição inicial deu entrada da mesma neste juízo no dia 18.06.2020; sendo a mesma em instruída com uma procuração datada do dia 05.06.2018 e que AA faleceu no dia 01.10.2019 isto é, no período compreendido entre a assinatura da dita procuração e o momento em que foi intentada a presente ação, rapidamente se conclui que estamos perante uma situação de inexistência de mandato”, 6 - Considerando que “no presente caso constata—se que uma destas situações ocorre, na medida em que quando a presente acção foi intentada, AA já havia falecido e a procuração junta a estas autos caducado o que, como é de elementar evidencia, impossibilitará o Tribunal de dirigir qualquer convite para sanar tal vício.” 7 - Nada mais versando a douta sentença sobre a alegada inexistência e/ou caducidade do mandato, 8 - Entendendo os Recorrentes, antes de mais, que a douta sentença é extremamente escassa relativamente à fundamentação da aplicação da lei nos termos em que o fez, não analisando toda a factualidade, e, inclusivamente, desatendendo a toda a informação que consta dos requerimentos juntos aos autos, 9 - O que levou a uma errada aplicação da lei, como se demonstrará. 10 — Nos termos do artigo 1174.º, a) e 1175º, nº2 do CC, apesar de caducado o mandato por morte do mandante, caso o mandatário não tenha conhecimento desse facto, poderá continuar a praticar os atos incluídos no contrato. 11 — Ora, efectivamente, e conforme consta da douta sentença a advogada subscritta da petição inicial deu entrada da mesma neste juízo no dia 18.06.2020; sendo a mesma em instruída com uma procuração datada do dia 05.06.2018, 12 — E, a Autora, AA faleceu no dia 01.10.2019, 13 » Ou seja, no período compreendido entre a assinatura da dita procuração e o momento em que foi intentada a presente ação, 14 — O que levaria, à primeira vista, & considerar—se tal procuração caducada em 01.10.2019, data do óbito da autora, nos termos do artigo 1174º, nºl do CC, 15 — Contudo, e conforme alegado em requerimento “junto aos autos em 26.01.2024 aquando da junção da certidão de óbito da Autora só nesta data é que a Mandatária da Autora tomou conhecimento do seu falecimento. 16 - Tendo, desde logo, comunicado tal facto aos autos, 17 - E, em 02.04.2024, notificada para se pronunciar relativamente às contestações (à habilitação de herdeiros) apresentadas por alguns dos Réus, a Advogada subscritora da petição inicial veio juntar aos autos, um requerimento no qual explicitou, de forma mais detalhada, as razões de facto por que esse desconhecimento se verificava, 18 - Concretamente que, de facto a procuração a favor da aqui signatária foi outorgada, pela Autora AA, em 05.06.2018, 19 - Sendo que, apenas em 18.06.2020 foi apresentada em juízo a petição inicial que deu origem aos presentes autos, 20 - Referindo que reuniu várias vezes com a Autora com vista a obter toda a informação e documentação necessária para intentar a presente acção, 21 - Sendo que, a última vez que havia estado reunida com a Autora foi no dia 17.05.2019, 22 - Tendo nessa data, ficado munida de todos os documentos e de todas as informações necessárias para intentar a presente acção, 23 — Não tendo, após a referida data, a aqui Signatária, tido qualquer outro contacto com a Autora, nem com nenhum dos seus familiares, 24 - Acontece que, devido ao excesso de trabalho no escritório da aqui Signatária e devido aos períodos de confinamento causados pela pandemia Covid—19 que assolou o nosso país e o mundo, só foi possível à aqui Signatária dar entrada do presente processo em 18.06.2020. 25 — Sendo que, a Mandatária ao ser notificada do despacho saneador proferido nos presentes autos em 03.01.2024, tentou contactar 3 aqui Autora, 26 - Tendo, só nessa data, tomado conhecimento, através da sobrinha da Autora, que a Autora havia falecido, 27 - Facto este que foi imediatamente comunicado aos presentes autos. através do iá mencionado herdeiros. 28 - Pelo que, claro está que a Mandatária desconhecia o falecimento da Autora à data da propositura da acção, 29 — O que alegou, não só no seu requerimento de 26.01.2023, anterior à habilitação de herdeiros, 30 - Como também no seu requerimento de 08.04.2024, já no âmbito da habilitação de herdeiros. 31 - Sendo de salientar que o Tribunal simplesmente ignorou todos os factos alegados pela mandatária neste requerimento, o que não poderia ter feito. 32 — Pelo que, nos termos do art. 1175º, nº2 do CC, só a partir do momento em que o óbito foi conhecido pela Mandatária é que se poderia considerar caducado tal mandato. 33 - Entendendo também os Recorrentes que, neste caso em concreto, a morte também não poderá fazer caducar o mandato porquanto desta caducidade resultam prejuízos para os seus herdeiros, nos termos do art. 1175º, nº2 do CC, parte final, 34 - Pois, como é evidente a não manutenção dos efeitos do mandato causam prejuízos aos herdeiros da mandante, uma vez que na situação concreta, da extinção da instância resultam prejuízos para os herdeiros da autora, 35 - Considerando-se pertinente referir que, inclusivamente, uma das herdeiras, BB, detinha uma procuração outorgada pela Autora, a qual também foi junta aos autos aquando da instauração da presente acção, 36 — Assim, ao verem extinta a presente instância ao invés de a mesma prosseguir os seus termos, vêm precludido o seu direito de responsabilizar os Réus pelos danos causados, pois que, a presente acção visa & responsabilização dos Réus pelos danos causados em 05.08.2017, sendo que, actualmente, caso os herdeiros pretendessem avançar com uma nova acção contra os Réus, já não o poderiam fazer, por verem prescrito o seu direito, nos termos do art. 498º do CC. 37 - Pelo exposto, também por esta razão não pode o falecimento da Autora produzir a caducidade imediata do mandato judicial conferido à advogada constituída. 38 — Ora, é certo que com o falecimento cessa a personalidade jurídica e judiciária, processualmente se determinando, então, a suspensão da instância (arts. 269.º, n.º 1 e 270.º CPC). 39 - O que, diga-se, foi desde logo requerido pela Mandatária da Autora, em requerimento junto aos autos em 26.01.2024, tendo sido a mesma declarada suspensa por despacho datado de 30.01.2024. 40 — E, quando a instância é suspensa mediante a demonstração do óbito da parte, só se reinicia depois da habilitação do sucessor (art. 276.º, n.() 1 CPC), incidente a suscitar por este ou pelas partes sobrevivas. 41 - Sendo que, a falta de personalidade, no caso do decesso da parte, não tem como consequência imediata a verificação da pertinente exceção dilatória, 42 - Daí que, como se consagra no n.º 3, do art.º 371, do CPC, se o Autor falecer depois de ter conferido o mandato para a proposição da acção e antes de esta ser interposta, pode promover-se a habilitação dos sucessores quando se verifique algum dos casos em que o mandato é susceptível de ser exercido após a morte do mandante. 43 - Quer isto dizer que, mesmo tendo falecido a Autora antes da proposição da ação, o respetivo mandatário que ignore o seu falecimento e a caducidade do mandato, pode propor a ação, que se suspende com o conhecimento do óbito, podendo os seus sucessores ser habilitados no incidente próprio. 44 — Contudo a douta sentença entende que, e apenas com base na citação de Lebre de Freitas e Isabel Alexandre, “Nesta situação, segundo propõem Lebre de Freitas e Isabel Alexandre, citando Alberto dos Reis, “cabe ao mandatário do autor alegar, no incidente de habilitação, que desconhecia o falecimento ou extinção à data da propositura da ação” (Código de Processo Civil Anotado, Vol. I, 3.ª Ed., p. 682)”. 45 - Considerando que, uma vez que não foi alegado no requerimento inicial de incidente à habilitação de herdeiros que se verificava esta circunstância, “Fica sem efeito tudo o que tiver sido praticado pelo respetivo advogado subscritor, devendo este ser condenado nas custas respetivas.” 46 — Acontece que, em primeiro lugar cumpre referir que falta o Tribunal a quo à verdade quando afirma que “confrontando com o requerimento de incidente à habilitação de herdeiros, verifica-se que esta circunstância não foi devidamente alegada, apenas e tão só, em requerimento de resposta às contestações apresentadas.” 47 — Pois, como já se referiu, a mandatária da Autora, em 26.01.2024 logo após ter tido conhecimento do óbito da Autora, e mesmo antes do incidente de habilitação de herdeiros, comunicou tal facto aos presentes autos, 48 - Alegando, desde logo em tal requerimento, de que, só naquela data é que havia tido conhecimento do óbito da Autora, 49 — Sendo, por isso, totalmente falso que tal. só tenha sido alegado “apenas e tão-só, em requerimento de resposta às contestações apresentadas.”, como se refere na douta sentença. 50 - Por outro lado, o Tribunal a quo baseou e fundamentou tal entendimento e a sua decisão apenas com base numa citação de Lebre de Freitas e Isabel Alexandre, que consta do Acórdão proferido pelo Tribunal da Relação do Porto de 26.09.2022, 51 - E, assim o fez, pois, na verdade, tal entendimento e decisão não tem qualquer fundamento legal 52 — Senão vejamos, os citados Autores Lebre de Freitas e Isabel Alexandre, como bem refere o douto Acórdão, “propõem” que cabe ao mandatário do autor alegar, no incidente de habilitação, que desconhecia o falecimento ou extinção à data da propositura da ação, não sendo em articulado de resposta à contestação que o deverá fazer, 53 - Sendo de salientar que tal, como se disse, é apenas uma proposta de entendimento apresentada pelos citados Autores, porquanto, não existe qualquer obrigação legal nesse sentido, 54 — Não estando previsto na lei que tal tenha que ser, obrigatoriamente alegado no incidente de habilitação, 55 - Além de que, importa ter em consideração de que, no processo referente a tal Acórdão, tal circunstância foi apenas alegada posteriormente a instauração do incidente de habilitação de herdeiros, na resposta à contestação, 56 — O que, repita-se, não é o caso dos presentes autos, porquanto a mandatária da Autora, em 26.01.2024, logo após ter tido conhecimento do óbito da Autora, c mesmo antes do incidente de habilitação de herdeiros, comunicou tal facto aos presentes autos, 57 — Alegando, desde logo em tal requerimento, de que, só naquela data é que havia tido conhecimento do óbito da Autora, ou seja, que à data da propositura da acção, a Signatária desconhecia o falecimento da Autora. 58 - Pelo que, tal facto, impeditivo da verificação da caducidade do mandato foi, desde logo, alegado pela mandatária da Autora, mesmo antes do incidente de habilitação, sendo, assim, já do conhecimento do Tribunal a quo, 59 — Sendo de referir que o incidente de habilitação de herdeiros, não correu por apenso, mas sim nos próprios autos, nos termos do art. 353º, nº1 do CPC 60 - Ora, uma coisa era se tal facto e circunstância nunca tivesse sido invocado/alegado pela mandatária da Autora, e viesse ª ser apenas alegado em sede de resposta à contestação do incidente de habilitação, 61 - Mas não foi esse o caso, como já se disse, porquanto a mandatária da Autora, em 26.01.2024 logo após ter tido conhecimento do óbito da Autora, e mesmo antes do incidente de habilitação de herdeiros, comunicou tal facto aos presentes autos, 62 - Alegando, desde logo em tal requerimento, de que, só naquela data é que havia tido conhecimento do óbito da Autora, 63 - Pelo que, mal andou o Tribunal a quo em desconsiderar, por completo, o alegado pela mandatária da autora no seu requerimento junto aos autos em 26.01.2024, 64 — Tentando fazer crer que, tal facto apenas foi alegado na resposta à contestação, 65 - O que não corresponde à verdade. 66 - Assim, por força das disposições conjugadas dos artigos 351.º, n.” 3 e 1175.º do Código de Processo Civil, a referida caducidade não pode operar nesta situação concreta, 67 — Aliás diga-se que, se a lei permite que o Autor demande um Réu que sabe (anteriormente) que já faleceu, situação igualmente anômala, não o impedindo que suscite incidente de habilitação, ao abrigo do disposto no art. 351º, nº 2 do CPC, 68 — E para que isso suceda o preceito apenas exige que, "em consequência das diligências para citação do réu, resultar certificado o falecimento deste". 69 - O legislador não nos diz que para esse efeito é relevante apurar igualmente se o autor tinha conhecimento de tal morte quando desencadeou o processo; dito de outra forma, nada se encontra na letra do n.º 2 do artigo 351.º que impeça suscitar o incidente de habilitação dos sucessores do réu quando o autor instaurou a ação com plena consciência de que nesse momento aquele já tinha falecido. 70 — Então, por analogia e interpretação coerente da lei, nada se encontra na letra do nº3 do art. 351º que obrigue a que o mandatário a alegar tais circunstâncias aquando do requerimento que dá origem ao incidente de habilitação, 71 - Exigíndo apenas que, quando se verifique algum dos casos excecionais em que o mandato é suscetível de ser exercido depois da morte do constituinte, pode promover—se & habilitação dos seus sucessores, 72 — Ora, nos presentes autos, e como já se disse, tal circunstância (caso excepcional) de o mandatário só ter tido conhecimento do óbito muito depois da instauração da acção, verificou-se e foi desde logo, alegada pela Mandatária, ainda antes de suscitado o incidente de habilitação, 73 — Pelo que, nos termos do art 351º, nº3 do CPC verificava-se um dos casos excecionais cm que o mandato é suscetível de ser exercido depois da morte do constituinte, 74 — Podendo, assim, ter sido promovida a habilitação dos seus sucessores, como o foi nos presentes autos. — Cfr. Acórdão do Tribunal da Relação do Porto, processo nº 1134/21.3T8MCN.P1, datado de 26—09-2022. 75 - Sendo que, caso o Tribunal tivesse dúvidas relativamente aos factos alegados pela mandatária da Autora, deveria ter promovido a produção de prova que considerasse pertinente”. — Cfr. Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo, de 28-11—2015, proferido no processo n.º 1091/13. 76 - No entanto, o Tribunal a quo desconsiderou por completo o requerimento junto aos autos pela Mandatária da Autora em 26.01.2024, no qual alegou que só naquele momento teve conhecimento do óbito da Autora, 77 — Pelo que, mais uma vez, mal andou o Tribunal a quo em determinar caducado o mandato outorgado pela Autora à sua mandatária, sem antes ter determinado quaisquer outras diligências que se entendesse serem devidas, 78 — Dando sem efeito tudo o que foi por esta praticado, 79 - Sem, sequer, analisar o incidente de habilitação de herdeiros requerido pelos sucessores da Autora, 80 _ Quando, como já se demonstrou, tal mandato não caducou por força do art. 1175“, nº.? do CC., 81 - Não se verificando, assim, a excepção dilatória de falta de procuração. 82 - Por outro lado, ainda que ao Tribunal recorrido assistisse fundamento quanto à invocada falta de alegação, por parte da Mandatária, do momento em que tomou conhecimento do óbito, deveria, ainda assim, ter proferido despacho de aperfeiçoamento, 83 — Sendo que, tal falta de alegação da mencionada circunstância constituiria mera irregularidade que deveria ser sanada através de convite ao aperfeiçoamento; 84 - Cabendo ao Tribunal recorrido a prolação de dcspacho-convíte ao aperfeiçoamento do articulado inicial e ao oferecimento de outro tipo de prova, 85 - Para se obter, com brevidade e eficácia, a justa composição litígio”, goza, assim, o juiz do poder / dever - e não do poder discricionário — de, não só ouvir os mandatários judiciais das partes, “convidando-os a fornecer esclarecimentos sobre a matéria de facto ou de direito que se afigurern pertinentes”, como também a completar articulados, que, em seu entender, encerrem insuficiência ou imprecisão na exposição ou concretização da matéria de facto alegada, 86 — Violando, assim, a sentença recorrida os artigos 411º, 4'12º, 590º nº 3 do Código de Processo Civil. 87 - Pelo exposto, deverá a douta sentença ser revogada e ordenada a baixa dos autos à 1ª instância, onde deverá ser analisado e apreciado o incidente de habilitação suscitado, prosseguindo o processo os seus termos, 88 - Sendo, consequentemente, ordenada a revogação da condenação em custas. Caso assim não se entenda, - Da condenação da mandatária em custas: 89 — Entendeu o douto Tribunal a quo que: “Neste conspecto, nos termos do preceituado no artigo 48.º, n.0 2 do Código de Processo Civil, tendo sido internada a presente ação com base numa procuração que já havia caducado e sendo impossível fixar prazo para suprir a falta de procuração, com a respetiva ratificação pela parte do processado, fica sem efeito tudo o que tiver sido praticado pelo respetivo advogado subscritor, d vendo e te ser condenado nas custas res ativas.” 90 - Constando, assim, da sentença recorrida que “As custas ficarão a cargo da ilustre advogada subscritora da petição inicial, nos termos e para efeitos do artigo 48.º, nº.? do CPC.” 91 - ora, de acordo com o nº 1 do art. 48º do CPC a falta de procuração pode, em qualquer momento, ser suscitada oficiosamente pelo Tribunal, 92 - Determinando o nº 2 do mesmo artigo: «O juiz fixa o prazo dentro do qual deve ser suprida a falta ou corrigido o vício e ratificado o processado, findo o qual, sem que esteja regularizada a situação, fica sem efeito tudo o que tiver sido praticado pelo mandatário, devendo este ser condenado nas custas respetivas e, se tiver agido culposamente, na indemnização dos prejuízos a que tenha dado causa». 93 - Assim, esta disposição legal prevê as consequências na falta de suprimento, nos casos de falta, insuficiência ou irregularidade de procuração, 94 - Entendendo os Recorrentes que tal disposição legal e tais consequências não são aplicáveis ao caso dos presentes autos, 95 — Pois vejamos, mesmo a entender—se que se verificou a caducidade do mandato com a morte da Autora, antes da propositura da acção, a verdade é que, aquando da instauração da presente acção, a Mandatária juntou uma procuração forense que lhe dava poderes para tal, 96 - Não tendo, nessa data, a referida Mandatária conhecimento do óbito da Autora, 97 — Pelo que, a Mandatária agiu da forma como se estivesse, efectivamente, mandatada para tal, de forma regular, 98 — Sendo que tal não pode ser equiparável aos casos de falta, insuficiência ou irregularidade da procuração, previstos no mencionado art. 48º do CPC 99 - Pois tal disposição legal está prevista para os casos em que, no momento da propositura da acção se verifica a falta ou irregularidade de procuração a advogado nas causas cm que é obrigatória a sua constituição, 100 - E, para os casos em que tal irregularidade ou falta não é suprida. 101 — Pelo que, ou o Tribunal a quo, entendia ser possível suprir a alegada falta de procuração, nomeadamente através do incidente de hablitação de herdeiros e ratificação do processado, 102 - Sendo que, no presente caso, já havia sido suscitado o correspondente incidente de habilitação de herdeiros, com procuração dos herdeiros a favor da mesma mandatária, 103 — Não existindo, assim, fundamento para a mandatária condenada nas custas. 104 - Devendo assim, ser revogada da condenação da mandatária em custas. 105 - Ou, caso se entendesse existir outra forma de suprimento, teria, sempre, o Tribunal a quo que notificar a mandatáría do despacho a fixar o prazo para a sua regularização - como refere José Lebre de Freitas, Código de Processo Civil Anotado, Volume lº, Coimbra Editora, pág. 81, citando Castro Mendes, Direito Processual Civil. Vol. II, pág. 183, «Uma vez que houve actuação do advogado ou solicitador, a notificação do despacho em que o juiz fixe o prazo para a sua regularização deve ser feita à parte e ao mandatário aparente, embora só a primeira possa suprir a falta ou corrigir o vício e ratificar o processado. (...)» 106 - Assim, a notificação do despacho que fixe prazo para ser sanada a falta ou o vício do mandato e a respectiva cominação deve fazer-se, à luz do disposto no artigo 48º nº 2 do Código de Processo Civil, ao mandatário aparente e à parte e só após tal notificação é lícito extrair, em caso de inércia da parte, as consequências previstas naquele normativo. 107 - Neste sentido se tem pronunciando, maioritariamente, a jurisprudência — ver, entre outros e para além dos citados pelo apelante, os Acs. da RL de 21.3.2012, P. 259/09.8TTLSB.L1—4 (Filomena Carvalho), de 8.11.2012, P. 1346/05.7TCSN'I'.L1—6 (Fernanda Isabel Pereira), de 15.5.2014, P. 19145/12.8YYLSB—B.Ll—6 (Fátima Galante), de 21.12.2017, P. 1921/16.4T8BRRL1—4 (Albertina Pedroso), da RP de 16.1.21 ) (19, P. 0846188 (Paula Leal de Carvalho), de 28.6.2012, P. 758/09.1'BLMG.P1 (Filipe Caroço), da RC de 26.10.2016, P. 3635/15.3T8ACB.C1 (Maria José Nogueira), e da RE de 20.10.2011, P. 620/ 10.5 TZSTC (Rosa Barroso), todos em www.dgsi.pt. 108 - Ota, no processo sub judice, o Tribunal a quo omitiu, por completo, o cumprimento do art. 48º, nº 2, do CPC, 109 - Sendo que, a omissão da notificação à parte consubstancia omissão de uma formalidade prescrita na lei susceptível de influir no exame e decisão da causa, integrando nulidade secundária prevista no artigo 195º, nº 1 do Código de Processo Civil. — neste sentido vide Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, processo nº 1346/05.7TCSNT.L1—6. 110 - Devendo, se assim se entender, declarar a nulidade da decisão recorrida, e, em consequência, ser ordenada a baixa dos autos à 1ª instância, tendo em vista o seu prosseguimento nessa instância para apreciação do mérito da acção. Com o que se fará inteira e a sempre desejada e devida JUSTIÇA!!!” * A ré B... ofereceu resposta ao recurso, pronunciando-se pela confirmação da decisão recorrida. Alegou, além de outras razões, que a Il. Mandatária, nem no requerimento para suspensão da Instância, a 26.01.2024, nem no requerimento de habilitação de herdeiros, em 29.01.2024, a Mandatária constituída nos autos alegou quando tomou conhecimento da morte da Autora. Apenas em requerimento de resposta às contestações apresentadas ao incidente de habilitação de herdeiros, a Mandatária veio alegar quando terá tomado conhecimento da morte da Autora e alegar o motivo pelo qual terá apresentado a ação após a morte daquela, sem apresentar quaisquer meios de provaA ré A... alegou e concluiu no mesmo sentido. O recurso foi admitido como apelação, com subida nos próprios autos e com efeito devolutivo. Com efeito, apesar de os apelantes terem requerido o reconhecimento de efeito suspensivo para este recurso, tal pretensão carece de fundamento, atento o disposto no art. 647º, nº1, por não se verificar qualquer das hipóteses previstas no nº 2 da mesma norma. * No requerimento de interposição de recurso, aparece indicada a falecida AA como autora nos autos e como se também ela viesse interpor tal recurso.É, todavia, inequívoco o seu falecimento e que o que se discute é se a acção deve prosseguir com BB e EE, seus herdeiros, a ocupar o respectivo lugar, para o que pretenderam ser habilitados. A decisão recorrida considerou que o mandato forense que era pressuposto processual da propositura da acção já caducara quando a acção entrou em juízo, o que implica a extinção da instância e prejudica tal substituição processual. Pelo contrário, em recurso pretende-se que se reconheça que o mandato não caducou, podendo ocorrer a habilitação de sucessores requerida e o prosseguimento da causa. É, pois, por referência à não extinção do mandato que se compreende a indicação de AA ainda como recorrente. Cumpre, assim, decidir o presente recurso. * 2- FUNDAMENTAÇÃONão podendo este Tribunal conhecer de matérias não incluídas nas conclusões, a não ser que as mesmas sejam de conhecimento oficioso - arts. 635º, nº 4 e 639º, nºs 1 e 3 do CPC - é nelas que deve identificar-se o objecto do recurso. No caso, as conclusões oferecidas são prolixas, repetitivas e prejudiciais para a identificação das questões em razão das quais os recorrentes entendem dever ser revogada a decisão de absolvição da instância. Surpreendem-se ali, todavia, as seguintes questões a decidir: 1 – Se, nas circunstâncias do caso, a Il. Mandatária alegou devidamente o desconhecimento da morte da autora/mandante, o que impede a ocorrência da caducidade do mandato ao tempo da propositura da acção. 2 – Se não era condição, para esse efeito, a alegação de factos aptos a justificar o desconhecimento da morte do mandante, ao tempo da propositura da acção; 3 – Se, caso se conclua pela necessidade dessa alegação, deveria o tribunal ter convidado ao aperfeiçoamento do requerimento; 4 – Se o mandato não caducou por morte da mandante, porque daí adviriam prejuízos para os seus herdeiros; 5- Se a situação em apreço não configura a propositura de uma acção com falta de procuração, o que obsta à condenação da Il. Mandatária em custas. 6 – Se foi omitido um necessário convite à sanação da falta de procuração, o que determina a nulidade da decisão de condenação em custas. * Para a discussão das questões apontadas, é útil ter presente, além dos elementos processuais anteriormente mencionados, o requerimento apresentada em 26/1/2024, em que a Il. Mandatária dá conta do falecimento da autora. Consta do seguinte: “FF, Mandatária da Autora AA, vem expor e requerer a V. Exa, o seguinte: 1º - A aqui Signatária, ao ser notificada do despacho saneador proferido nos presentes autos tentou contactar a aqui Autora, 2º - Tendo tomado conhecimento, através da sobrinha da Autora, que a Autora havia falecido. 3º - Pelo que se requer a junção aos autos da sua certidão de óbito - 4° - Mais se requer que se declare suspensa a instância nos termos do art.269°, n°1 a) do C.P.C., informando-se, desde já, que irá ser suscitando o competente incidente de habilitação de herdeiros.” Em 29/1/2024 foi apresentado tal requerimento de habilitação de herdeiros, por BB e EE, que o tribunal determinou haver de ser processado nos próprios autos e não por apenso. Seguidamente, após oposição ao incidente de habilitação, foi apresentado requerimento, subscrito pela Il. Mandatária dos apelantes, onde se destaca a seguinte alegação (descartando-se a argumentação de direito): “1º Efetivamente, a procuração a favor da aqui signatária foi outorgada, pela Autora AA, em 05.06.2018, 2º Sendo que, apenas em 18.06.2020 foi apresentada em juízo a petição inicial que deu origem aos presentes autos, 3° Ora, a aqui Signatária reuniu várias vezes com a Autora com vista a obter toda a informação e documentação necessária para intentar a presente acção, 4º Sendo que, a última ver quem Signatária esteve reunida com a Autora foi nesse dia 17.05.2019 5º Tendo nessa data, a aqui Signatária ficado munida de todos os documentos e de todas as informações necessárias para intentar a presente acção, 6º Não tendo, após a referida data, a aqui Signatária tido qualquer outro contacto com a Autora, nem com nenhum dos seus familiares, 7º Acontece que, devido ao excesso de trabalho no escritório da aqui Signatária e dos períodos de confinamento derivados da pandemia Covid- 19 que assolou o nosso pais e o mundo, só foi possível à aqui Signatária dar entrada do presente ðrîñåssî em 18.06.2020. 8° Ora, conforme requerimento junto aos presentes autos em 26.01.2024, a aqui Signatária ao ser notificada dos despacho saneador proferido nos presentes autos em 03.01.2024, tentou contactar a aqui Autora, 9º Tendo, só nessa data, tomado conhecimento, através da sobrinha da Autora, que a Autos havia falecido, 10º Facto este que foi imediatamente comunicado aos presentes autos pela aqui Signataria e consequentemente requerida a correspondente habilitação de herdeiros. (…)”. * Dispõe o art. 1175º, do C. Civil, no respectivo nº 2, para o que aqui interessa, que a morte do mandante só faz caducar o mandato a partir do momento em que seja conhecida do mandatário, ou quando da caducidade não possam resultar prejuízos para o mandante ou seus herdeiros.É também pertinente, designadamente face aos argumentos dos apelantes, considerar o disposto nos nºs 1 e 3 do art. 351º do CPC, de onde resulta que se o autor falecer depois de ter conferido mandato para a proposição da ação e antes de esta ter sido instaurada, pode promover-se a habilitação dos seus sucessores quando se verifique algum dos casos excecionais em que o mandato é suscetível de ser exercido depois da morte do constituinte. Trata-se, neste caso, de uma “habilitação preliminar” no âmbito de um incidente de habilitação, (Geraldes, Pimenta e Pires de Sousa, CPC Anot, Vol. I, pg. 406, notas 5 e 6 ao art. 351º), na qual os requerentes devem alegar desde logo os factos demonstrativos da legitimidade dos sucessores da parte falecida. Constata-se, assim, algum paralelismo entre a situação prevista nesse nº3, e a do falecimento do réu que apenas se vem a conhecer em consequência das diligências tendentes à sua citação, prevista no nº 2 da mesma norma. Aí o legislador pretende assegurar o aproveitamento da instância já iniciada (Geraldes, ob e loc cit., nota 3). Todavia, na hipótese do falecimento do autor, a instância iniciar-se-á também, mas o seu aproveitamento apenas é tido por justificado caso se verifiquem as circunstâncias que motivam que o mandato mantenha a sua eficácia mesmo depois da morte do mandante, previstas no art. 1175º do C. Civil: quando o mandato não deva ter-se por caducado por a morte do mandante não ser conhecida pelo mandatário, ao tempo do acto praticado no exercício do mandato, ou quando da caducidade possam resultar prejuízos para os herdeiros. Como refere Alberto dos Reis (CPC Anotado, vol. I, pg. 879), se inexistir risco de tal prejuízo ou se o mandatário propuser a acção sabendo que o mandante já havia falecido, “o processo tem, em tal caso, de ficar sem efeito”. Prossegue este professor: “Verificado algum dos casos excepcionais, é ao mandatário do autor que incumbe fazer a prova de que podia fazer uso do mandato, isto é, da urgência da acção ou da ignorância da morte. (…) incumbe ao mandatário alegar e provar que à data da proposição estava na ignorância da morte do seu constituinte”. A esta mesma solução, que citam, aderem Isabel Alexandre e Lebre de Freitas, CPC Anot, vol. I, pg. 693). Esta solução é perfeitamente consentânea com a estrutura procedimental do incidente, a que se aplicam as regras do processo comum, atento o disposto no art. 549º. Assim, tal como dispõe a al. d) do nº 1 do art. 552º do CPC, deve o requerimento em que se dá notícia do falecimento do autor, quando apresentado pelo respectivo mandatário, conter os factos essenciais que justificam que tenha exercido o mandato para além do falecimento do mandante e, em ordem ao prosseguimento da acção, sendo essa a vontade, a promoção da habilitação dos respectivos sucessores. E, bem assim, o oferecimento da prova dos factos alegados, em observância do disposto no art. 293º do próprio processo. Como antes se referiu, havendo de sustentar-se uma pretensão contrária à extinção do processo numa das hipóteses previstas no art. 1175º do C. Civil, haverá o advogado que exerceu o mandato depois do falecimento do mandante alegar que o fez sem que soubesse desse falecimento, ou as razões pelas quais, sabendo-o, propôs a acção, em ordem a prevenir prejuízos para os respectivos herdeiros. E de tudo o que alegar deve oferecer a respectiva prova, assim se processando o incidente. Trata-se, cumpre ter presente, de justificar uma solução excepcional, tolerada pelo legislador por razões de ordem pragmática, pois que o resultado normal da situação, isto é, da propositura de uma acção depois de falecido o autor, com a natural caducidade do mandato que era pressupostos dessa propositura, seria a da extinção da instância. No caso em apreço, do requerimento apresentado em 26/1/2024, em que a Il. Mandatária dá conta do falecimento da autora, extrai-se não apenas a informação sobre o falecimento, mas também a afirmação de que a signatária só após ser notificada do despacho saneador é que tentou contactar a autora e que então é que tomou conhecimento, por isso lhe ter sido relatado através da sobrinha, que a mesma havia falecido. Sucessivamente, logo a 29/1, foi deduzido o incidente de habilitação de herdeiros, no qual apenas foi oferecida prova relativamente á sucessão. Depois, na sequência da oposição oferecida ao incidente requerido pelos sucessores da falecida, a Il. Mandatária complementou o alegado sobre o seu tardio conhecimento do falecimento da autora, tratando de o justificar, mas continuando sem oferecer qualquer prova do alegado. É, assim, fácil de constatar que a Il. Advogada não deixou de invocar, logo quando veio informar do falecimento da autora, que apenas teve conhecimento desse facto em momento ulterior à propositura da acção, designadamente após a notificação do saneador que havia sido proferido; mas também o é que não requereu logo o incidente de habilitação, embora o tenha feito no 1º dia útil seguinte (26/1: sexta-feira; 29/1: segunda-feira), bem como que não ofereceu qualquer prova sobre as circunstâncias que pudessem levar o tribunal a dar por verificado aquele pressuposto do art. 1175º,, isto é, o conhecimento do falecimento em momento ulterior à propositura da acção. Atento o regime anteriormente descrito, só pode concluir-se que o mesmo não foi estritamente cumprido. Respondidas, nestes termos, as duas primeiras questões em que se desenvolvia o objecto do recurso, a questão que se coloca de seguida é se, nas específicas circunstâncias do caso, o tribunal deveria ter convidado ao suprimento das irregularidades apontadas, não devendo extrair-se da sua verificação – a falta de requerimento imediato da habilitação de herdeiros e a falta de motivação e oferecimento de prova quanto ao conhecimento tardio do falecimento da autora – a consequência que veio a ser decretada. A questão mostra-se prejudicada quanto ao requerimento de habilitação de herdeiros, pois que o incidente foi deduzido imediatamente e antes de qualquer pronúncia do tribunal sobre o tema. Por outro lado, no requerimento de 26/1/2024, como já se referiu, a signatária alegou o facto essencial à viabilidade do prosseguimento da acção: o conhecimento do óbito já depois do falecimento da autora, aquando da tentativa de contacto que redundou na informação do óbito prestada pela sobrinha, a referida BB. Perante tal facto, os demais relativos à justificação para esse conhecimento tardio são factos complementares, cuja falta de alegação anterior não é apta a determinar o indeferimento. Não há preclusão em relação ao aproveitamento de tais factos se, em sede de decisão do incidente, o tribunal os vier a ter por úteis. Por fim, não foi oferecida qualquer prova quanto a tal conhecimento tardio. Deverá esta circunstância determinar a rejeição da análise desse pressuposto da continuidade da acção? Reconheceu-se já o incumprimento do regime do art. 293º do CPC. Mas os próprios apelantes vêm pronunciar-se sobre a questão, afirmando: “…caso o tribunal tivesse dúvidas relativamente aos factos alegados pela mandatária da autora, deveria ter promovido a produção de prova que considerasse pertinente.” (art. 92º das aqlegações). O regime processual dos incidentes de instância comporta momentos estanques, de que resulta a preclusão para o exercício de direitos processuais que não tenham sido efectivados. A um articulado inicial e a um articulado de oposição, que compreendem a alegação de factos e a formulação de requerimentos probatórios, sucede-se unicamente a produção de prova e subsequente decisão. O incumprimento do ónus de formulação de requerimento probatório não é susceptível de ser ignorado e superado, por exemplo, por via de um convite a aperfeiçoamento. O princípio do inquisitório, tal como consagrado no art. 411º do CPC, não serve para que o tribunal se substitua às partes, produzindo no processo aquilo que qualquer delas, em momento próprio, deixou por declarar pretender. Isso constituiria uma violação de princípios como o da imparcialidade e do dispositivo. Acresce que as rés B... e A... impugnaram a alegação da Il. Mandatária da autora quanto ao seu desconhecimento de que, à data da propositura da acção, aquela já tinha falecido, designadamente em face do disposto no art. 1176º,nº 1 do C. Civil e em atenção ao facto de que BB era, ela própria, procuradora da autora falecida. Por conseguinte, perante um requerimento instrutório, num incidente de habilitação de herdeiros, em que apenas é oferecida prova sobre a qualidade dos sucessores da parte falecida, mas nada é requerido quanto à verificação de uma excepção apta a permitir a continuidade de uma acção proposta depois do falecimento da autora, excepção esta impugnada pela parte contrária, não cabe ao tribunal convidar o respectivo Il. Mandatário a vir indicar a prova dessa excepção (o seu conhecimento tardio daquele falecimento). Isso constituiria puro atropelo do regime estabelecido no art. 293º do CPC, não legitimado nem pelo princípio da cooperação (art. 7º), nem pelo princípio do inquisitório (art. 411º). Rejeita-se, pois, frontalmente a afirmação supra citada, constante do art. 92º das alegações recursivas, atribuindo ao tribunal a incumbência da produção de prova sobre tal matéria, em face da total omissão dos requerentes a esse propósito. Pelo exposto, em face do regime acima descrito, cumpre concluir que, tendo ocorrido o falecimento da autora em momento anterior ao da propositura da acção e não se podendo vir a dar por adquirido que a Il. Mandatária subscritora da p.i. só em momento ulterior ao dessa propositura teve conhecimento daquele anterior falecimento, porquanto não se propôs demonstrá-lo através de qualquer meio de prova, não poderá reconhecer-se a verificação da excepção prevista no art. 351º, nº 3 do CPC. Consequentemente deverá reconhecer-se a caducidade do mandato já à data da propositura da acção, tal como afirmado na decisão recorrida, em razão do disposto no art. 1174º, al. a) do C.Civil. Fica, assim, respondida negativamente a questão assinalada em 3º lugar, integrante do objecto do recurso. O que vem de expor-se responde, por maioria de razão, à questão apontada em quarto lugar, isto é, a de discutir se o mandato não caducou por morte da mandante porque daí adviriam prejuízos para os seus herdeiros. Com efeito, qualquer dos requerimentos referidos é totalmente omisso em relação a um tal fundamento, para que se legitime a continuidade da acção, com os sucessores habilitandos no lugar da autora previamente falecida. Jamais veio a ser invocada, seja no requerimento de 26/1, seja no de 29/1/2024, como fundamento para a propositura da acção depois de falecida a autora, a hipótese de a não instauração da acção poder provocar prejuízos para os herdeiros. Consequentemente, também não seria à luz de um tal motivo que se poderia vir a considerar-se legitimada a propositura desta acção, em nome da autora falecida, já depois do seu falecimento, em ordem a que a mesma prosseguisse com a habilitação dos seus herdeiros para aqui ocuparem o seu lugar. As duas questões seguintes reportam-se à caracterização da presente acção como uma acção proposta sem que a Il. Advogada que a apresentou em juízo estivesse munida do necessário mandato quando o fez, daí lhe resultando a responsabilidade pelo pagamento das custas respectivas. Como vimos, ficou precludida, pelo seu incumprimento de um ónus processual, a possibilidade de demonstrar que só depois de dar entrada à acção em juízo é que conheceu o prévio falecimento da autora. Também não foi alegado outro fundamento que, mesmo não demonstrando esse desconhecimento, a legitimaria à propositura da acção. Por consequência, é inevitável concluir que a personalidade jurídica e judiciária da autora se extinguiram antes da propositura da acção, determinando a caducidade do mandato que havia sido conferido para esse efeito, nos termos do art. 1174º, al. a) do C. Civil. Nestas circunstâncias, e sendo óbvio, por natureza, que não poderá ser suprida a falta do mesmo mandato forense, terá de se reconhecer que a falta de mantado ocorrida à data da propositura da acção é um facto inalterável. Esta conclusão determina os efeitos previstos no art. 48º, nº 2 do CPC: ineficácia de todo o processado, com consequente absolvição da instância dos réus e intervenientes principais associados à sua posição, com responsabilização do correspondente Mandatário pelas custas devidas. Em suma, tal como foi decretado pelo tribunal recorrido. Estes efeitos prejudicam que a acção pudesse continuar, em vez de se extinguir, para durante o seu devir vir a ser substituída a parte falecida, regularizados os poderes com base nos quais foi proposta a acção e convalidado o anteriormente processado. Pelo contrário, a instância extingue-se em consequência da eliminação de todos os efeitos da propositura da própria acção. Por fim, na medida em que tal acto seria completamente inútil, não pode ter-se por verificada qualquer nulidade decorrente de uma eventual falta de notificação para a junção de procuração, por parte da autora. Rejeita-se, pois, a verificação da nulidade invocada, com o que se prescinde da discussão sobre a tempestividade da arguição desta nulidade apenas em sede de recurso. * Resta, por isso, recusar provimento ao recurso, na confirmação da decisão recorrida.* Sumário:……………………………… ……………………………… ……………………………… 3 - DECISÃO Pelo exposto, acordam os juízes que constituem este Tribunal em recusar provimento ao presente recurso, com o que confirmam a decisão recorrida. Custas pelos apelantes. Registe e notifique. * Porto, 11 de Dezembro de 2024Rui Moreira Lina Batista Rodrigues Pires |