Acórdão do Tribunal da Relação do Porto | |||
| Processo: |
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| Nº Convencional: | JTRP000 | ||
| Relator: | LÍGIA FIGUEIREDO | ||
| Descritores: | CONSTITUIÇÃO DE ARGUIDO PRAZO DE CONSTITUIÇÃO DE ASSISTENTE NOTIFICAÇÃO DE DENUNCIANTE | ||
| Nº do Documento: | RP202312192060/18.9PIPRT.P2 | ||
| Data do Acordão: | 12/19/2023 | ||
| Votação: | UNANIMIDADE | ||
| Texto Integral: | S | ||
| Privacidade: | 1 | ||
| Meio Processual: | CONFERÊNCIA | ||
| Decisão: | CONCEDIDO PROVIMENTO AO RECURSO INTERPOSTO PELO ASSISTENTE | ||
| Indicações Eventuais: | 1ª SECÇÃO | ||
| Área Temática: | . | ||
| Sumário: | I - Após a jurisprudência fixada pelo acórdão do Supremo Tribunal de Justiça n.º 1/2011, inexistem dúvidas quanto à natureza perentória do prazo previsto no artº 68.º, n.º 2, do Código de Processo Penal, o qual se inicia com a notificação efetuada nos termos do art.º 246.º, n.º 4, do Código de Processo Penal. II - No caso em apreço, em que ocorreram duas notificações, uma efetuada pela autoridade policial e outra pelo Ministério Público, a notificação a considerar deve ser a que foi ordenada pelo Ministério Público, não porque as notificações efetuadas pela autoridade policial não tenham aptidão para desencadear o início da contagem do prazo processual de dez dias para a constituição de assistente, mas porque a notificação efetuada pela autoridade policial não cumpriu os requisitos previstos no art.º 246.º, n.º4, do Código de Processo Penal (quento à indicação dos procedimentos a adotar), e, por isso, a mesma não pode considerar-se válida para os efeitos legais. III - Este entendimento é também o que melhor se coaduna com os princípios da previsibilidade e da confiança que são uma das vertentes do Estado de Direito Democrático consagrado no art.º 2.ª da Constituição. | ||
| Reclamações: | |||
| Decisão Texto Integral: | 1ª secção criminal Proc. nº 2060/18.9PIPRT.P2 Acordam em conferência no Tribunal da Relação do Porto: I – RELATÓRIO: No processo comum (tribunal singular), nº2060/18.9PIPRT.P1 do Juízo Local Criminal do Porto, juiz 5 do Tribunal Judicial da Comarca do Porto, em que são arguidos AA nascido em 1/12/66 e BB, nascido em 27/4/79, foi proferido o seguinte despacho (transcrição): (…) Compulsados os presentes autos, designadamente o teor da contestação, atinente à referência nº 33602014, vieram os arguidos suscitar, como questão prévia, a caducidade do exercício do direito do ofendido se constituir assistente, nos termos e fundamentos aí melhor expostos e, nessa sequência, sustentam que se deve declarar-se tal caducidade, determinando-se a extinção do procedimento criminal e o arquivamento dos autos. * Cumpre decidir.* Analisados os autos, constata-se o seguinte:- está em causa um crime de injúria, p. e p. pelo artº 181º do Código Penal (CP), imputado aos arguidos, crime esse que assume natureza procedimental particular (cfr., referência nº 437781373); - em 26-12-2018, o ofendido apresentou queixa na PSP, no Porto (cfr., referência nº 21111507); - apresentada tal queixa, o ofendido foi notificado pela PSP com a informação dos seus direitos e obrigações, com a advertência, “nos termos do Artigo 246.º, n.º 4, do CPP, de que deve constituir-se assistente no processo mediante requerimento a apresentar no prazo de 10 dias a contar desta data, conforme estipulado no Artigo 68.º, n.º 2, do CPP” (cfr., referência nº 21112782); - o prazo de 10 dias assinalado ao ofendido para se constituir assistente no processo iniciou-se no dia 4-1-2019 e terminou no dia 13-1-2019, um Domingo, transferindo-se então para o dia útil seguinte, 14-1-2019, e - nem em 14-1-2019, nem nos três dias úteis posteriores, há notícia de o ofendido se ter constituído como assistente nos autos. Ora, como é sabido, nos crimes de natureza particular o procedimento criminal depende de queixa, da constituição de assistente e da dedução de acusação particular (cfr., artº 50º, nº 1, do Código de Processo Penal (CPP)). Acresce referir, neste âmbito, que o Acórdão n.º 1/2011, fixou a seguinte jurisprudência: “Em procedimento dependente de acusação particular, o direito à constituição como assistente fica precludido se não for apresentado requerimento para esse efeito, no prazo fixado no n.º 2 do artigo 68.º do Código de Processo Penal” (cfr., a este propósito, DR 18 Série I, de 2011-01-26). Por outro lado, ainda, importa salientar que é entendimento pacífico, devidamente consolidado na jurisprudência dos tribunais superiores, que a admissão do ofendido a intervir no processo com a qualidade de assistente não faz caso julgado formal, uma vez que não fica vedada a possibilidade de ser posteriormente julgado parte ilegítima. Ora, no caso ora em apreço, tendo sido dirigida notificação ao ofendido com a expressa e inequívoca advertência de que devia constituir-se assistente no prazo de 10 dias, a sua inércia no cumprimento desse prazo peremptório determina inelutavelmente a preclusão do exercício do direito de se constituir assistente. Face ao exposto e ao abrigo do disposto no artº 68º, nº 2 do CPP, julgando procedente a referida questão prévia, declaro a caducidade do exercício do direito do ofendido, CC, se constituir assistente, carecendo o mesmo, em consequência, de legitimidade processual para deduzir acusação particular e sustentá-la em Juízo, determinando-se a extinção do procedimento criminal e o oportuno arquivamento dos autos. * - Pedido cível de fls. 99 a 101:Atento o atrás decidido, julgo extinta a instância cível, por impossibilidade superveniente da lide (artº 277º, al. e) do CPC). Sem custas (artº 4º, nº 1, al. n) do RCP). (…) * Inconformado, CC interpôs recurso, no qual formula as seguintes conclusões:(…) I - O presente recurso versa sobre matéria de direito vertida no despacho com a ref. 447610963, por via do qual o Tribunal recorrido julgou procedente a caducidade do direito do Recorrente a constituir-se Assistente e, nessa sequência, determinou a extinção do procedimento criminal e extinta a instância cível. II - A 24-01-2019 (ref. 400385902) foi emitida notificação para o ofendido, aqui recorrente, se constituir Assistente no prazo de 10 dias. III - Nesse prazo, o Recorrente apresentou pedido na Segurança Social, por via do qual solicitou que lhe fosse nomeado patrono e, ainda, a dispensa total de pagamento de taxa de justiça e demais encargos com o processo (fls...). IV - No dia 11-03-2019, foi nomeado o patrono (fls...). V - No dia 18/03/2019, o Recorrente constitui-se Assistente (fls...). VI - A denúncia foi apresentada contemplando crimes de natureza particular e semi-pública. VII - Tendo sido formulado pedido de apoio judiciário na modalidade de nomeação de patrono, o prazo em curso interrompe-se, reiniciando-se a sua contagem a partir da notificação ao patrono nomeado da sua designação ou a partir da notificação ao requerente da decisão de indeferimento do pedido de nomeação de patrono [cfr. artigo 24.º, n.ºs 4 e 5, als. a) e b), da Lei nº 34/2004 de 29 de Julho]. VIII - No despacho proferido pelo Ministério Público (ref. 403281473), a 23-04-2019, lê-se: “[c]onforme resulta de fls. 10, o pedido foi efetuado no âmbito do processo sendo efetuado para constituição como assistente (...)”. IX - Acresce que o despacho proferido a fls 34, pelo Juiz de instrução, o qual admitiu o Assistente/recorrente como tal, não foi objeto de recurso e, por isso, transitou em julgado (art. 628.º do CPC). X - Destarte, o Tribunal recorrido violou o disposto no art. 24.º, n.ºs 4 e 5, als. a) e b), da Lei nº 34/2004 de 29 de Julho, bem como o art. 628.º do CPC (ex vi art. 4.º do CPP), pelo que o despacho ora sob censura deve ser revogado e substituído por outro que determine o normal prosseguimento da lide. NESTES TERMOS E NOS MELHORES DE DIREITO QUE V. EXAS. MUI SABIAMENTE SURPRRIÃO, DEVERÁ SER CONCEDIDO PROVIMENTO AO PRESENTE RECURSO E, POR VIA DISSO, DEVE SER SUBSTITUÍDO O DESPACHO RECORRIDO POR OUTRO QUE ESTEJA EM HARMONIA COM O DIREITO! (…) O Magistrado do Ministério Público respondeu, pugnando pela improcedência do recurso. Nesta instância, o Exmº Procurador-Geral Adjunto emitiu cuidado parecer no sentido do provimento do recurso. Cumprido que foi o disposto no artº 417º nº2 do CPP os arguidos apresentaram reposta na qual pugnam pela manutenção da decisão recorrida. * Foram colhidos os vistos legais e realizou-se a conferência.* Constitui jurisprudência corrente dos tribunais superiores que o âmbito do recurso se afere e se delimita pelas conclusões formuladas na respectiva motivação, sem prejuízo da matéria de conhecimento oficioso.No caso vertente e vistas as conclusões do recurso, há que decidir as seguintes questões: . saber o requerimento de constituição de Assistente é tempestivo; . se o despacho proferido nos autos que admitiu a constituição de assistente fez caso julgado formal; * II - FUNDAMENTAÇÃO:A decisão recorrida, considerou verificada a caducidade do exercício do direito do ofendido se constituir assistente. O recorrente alega ter exercido tempestivamente tal direito face à notificação que lhe foi efectuada pelo Ministério Público em 24/1/2019. À dilucidação da questão recorrida relevam as seguintes ocorrências processuais: .Em 26/12/2018 CC participou criminalmente junto da PSP do Porto contra o arguido AA e um outro indivíduo não identificado, imputando-lhes a prática de factos causadores de danos no veículo e proferimento de expressões injuriosas, cf auto de denúncia de fls.3.; .Na mesma data foi o denunciante notificado pelo OPC, sob a epígrafe – Termo de Notificação da Vítima – e além do mais, de que “Fica advertido, nos termos do Artigo 246º nº4, do CPP, de que deve constituir-se assistente no processo mediante requerimento a apresentar no prazo de 10 dias a contar desta data, conforme estipulado no Artigo 68º nº2 do CPP. Foi verbalmente informado sobre o regime do direito de queixa e suas consequências processuais, conforme o estipulado no nº2 do artº 247º do CPP.”; Autuado os autos de inquérito, o Magistrado do Ministério Público, em 23/1/2019 proferiu despacho a ordenar a notificação do ofendido nos termos do artº 246º nº4 do CPP; No cumprimento de tal despacho em 28/1/2019, foi o denunciante notificado por via postal simples nos seguintes termos: “Tratando-se de factos susceptíveis de integrar um crime de natureza particular, fica desde já o participante notificado, nos termos disposto no artº 246º nº4 e 68º nº2, ambos do Código de Processo Penal, de que é obrigatória a sua constituição como assistente, sob pena de arquivamento do inquérito, devendo, para o efeito, requerer tal constituição como assistente e constituir advogado NO PRAZO DE 10 DIAS a contar da data desta notificação. A taxa de justiça devida pela constituição de assistente é de uma Unidade de Conta (UC =102,00) e deve ser auto liquidada, podendo ser corrigida, a final pelo juiz, para entre um valor entre 1 e 10 UC, tendo em consideração o desfecho do processo e a concreta actividade processual do assistente –artº 8º do R.C. Judiciais.” .Em 29/1/2019 o ofendido juntou aos autos comprovativo do requerimento de Apoio judiciário com nomeação de patrono; .Em 11 de Março de 2019 foi junto aos autos pela OA a nomeação de Advogado ao ofendido; .Em 18 de Março de 2019 o ofendido CC requereu a constituição de Assistente; .Por despacho de 2/5/2019 foi o requerente admitido como assistente nos presentes autos; .O MP ordenou a notificação do assistente nos termos do artº 285º do CPP, consignando entender que “não foram reunidos indícios do que vem denunciado”; .O Assistente deduziu acusação particular contra os Arguidos, pela prática de um crime de injúria previsto pelo artº 181º do CP e um crime de ameaça p.p. pelo artº 153º do CP; .O Ministério Público proferiu despacho de arquivamento nos termos do artº 277º nº2 do CPP, em relação aos crimes de injúrias e ameaça e não acompanhou a acusação particular; .Os arguidos requereram a abertura de instrução pretendendo não ser pronunciados pelo crime de injúria; .Realizado debate instrutório foi proferido despacho de não pronúncia dos arguidos pelo crime de injúrias; . Na sequência de recurso interposto pelo ofendido/assistente por acórdão desta Relação de 2/9/2021 foi determinada a pronúncia dos arguidos pela prática do crime de injúrias pelo qual foram acusados; Proferido despacho de pronúncia e remetidos os autos para julgamento, foi proferido despacho nos termos do artº 311º do CPP; Junta a contestação pelos Arguidos, foi então proferido o despacho ora recorrido; Relevam também as seguintes normas e Jurisprudência Fixada: Dispõe o artº 246º nº 4 do CPP que: «.O denunciante pode declarar, na denúncia, que deseja constituir-se assistente. Tratando-se de crime cujo procedimento depende de acusação particular, a declaração é obrigatória, devendo, neste caso, a autoridade judiciária ou o órgão de polícia criminal a quem a denúncia for feita verbalmente advertir o denunciante da obrigatoriedade de constituição de assistente e dos procedimentos a observar..» Dispondo o artº 68º nº2 do CPP que «. Tratando-se de procedimento dependente de acusação particular, o requerimento tem lugar no prazo de 10 dias a contar da advertência referida no n.º 4 do artigo 246.º.» O Ac do STJ nº1/2011 fixou a seguinte Jurisprudência: “Em procedimento dependente de acusação particular, o direito à constituição como assistente fica precludido se não for apresentado requerimento para esse efeito, no prazo fixado no n.º 2 do artigo 68.º do Código de Processo Penal.” Sendo estes os elementos normativos em que se movem as questões recorridas, passamos de imediato à sua apreciação. Ainda que na ordem do recurso, seja a segunda questão do recurso, por razões de precedência lógico-processual começaremos pela apreciação da questão de saber se o despacho que admitiu a constituição de Assistente fez caso julgado formal, impedindo por isso que tal questão pudesse ser reapreciada na decisão ora recorrida. Como expõe o Prof. Manuel de Andrade, o caso julgado formal consiste na força obrigatória que os despachos e as sentenças possuem relativa unicamente à relação processual, dentro do processo, impedindo a sua reapreciação dentro do mesmo processo. O fundamento do caso julgado formal prende-se com “uma razão de disciplina ou ordem no desenvolvimento do processo.”.[1] Está ligado ao princípio da preclusão, aplicável às decisões dos magistrados, sentenças e despachos, cf. disposto no artº 613º/CPC, aplicável em processo penal por força da remissão do artº 4º do CPP, e nos termos do qual proferida a sentença, fica esgotado o poder jurisdicional do juiz quanto à matéria em causa. Sobre o despacho que admitiu a constituição de assistente, tem vindo a jurisprudência a pronunciar-se no sentido de tal despacho não faz caso julgado formal sobre a legitimidade do mesmo.[2] E a favor de tal posição, com a qual concordamos, invoca-se o facto de na fase inicial do processo se exigir apenas um juízo perfunctório de verosimilhança de que, perante os factos denunciados, o denunciante é ofendido no crime que admite a sua constituição como assistente. Como tal se em momento posterior, como acontece após dedução da acusação ou do requerimento de abertura de instrução e perante a qualificação jurídica então efectuada pelo tribunal se concluir que a pessoa admitida nos autos como assistente não é ofendida pelo crime em causa nos autos, nada impede que o tribunal o possa declarar. Neste sentido se pronuncia também Paulo Pinto de Albuquerque escrevendo que “a decisão de admissão da constituição de assistente tomada antes da dedução de acusação ou do arquivamento só faz caso julgado rebus sic standibus.” [3] Mas este entendimento tem-se também estendido em relação aos outros pressupostos para o exercício da acção penal, designadamente quanto à tempestividade. Neste sentido escreveu-se no ac. da RG de 9/4/2018, já referido “quando o despacho proferido for meramente genérico ou tabelar, meramente tabelar, limitando-se, na parte em apreço, a declarar a tempestividade do requerimento, pressupondo-a em termos genéricos ou tabelares, mas sem apreciar e sem se pronunciar diretamente sobre os respetivos fundamentos, razão pela qual não deverá ter a virtualidade de conduzir à formação de caso julgado formal sobre essa questão, podendo esta ser posteriormente suscitada perante o tribunal, que poderá livremente alterar a decisão anteriormente proferida”. Aplicando estas noções ao despacho de admissão de Assistente de fls.34, extrai-se que o mesmo relativamente à tempestividade limitou-se a dizer “por estar em tempo”, sem qualquer apreciação concreta, e como tal comporta uma afirmação genérica e tabelar não impeditiva do conhecimento dessa mesma tempestividade. . A questão da tempestividade do requerimento da constituição de Assistente. Já posteriormente à prolação do acórdão desta Relação que determinou a pronúncia dos arguidos, e após ter sido proferido despacho nos termos do artº 311º do CPP, foi proferido o despacho recorrido que declarou a extinção do procedimento criminal por considerar verificada “a caducidade do exercício do direito do ofendido, CC se constituir assistente”. Para tal, considerou o despacho recorrido a notificação efectuada ao ofendido pela PSP em 26/12/2018, o disposto nos artsº 246º nº4 e 68º nº2 do CPP, e a jurisprudência fixada no Ac do STJ nº1/2011. Por sua vez o recorrente alega o teor da notificação emitida em 24/1/2019, e efectuada em 28/1/2019, a interrupção do prazo para constituição de Assistente por força da formulação de pedido de apoio judiciário e o disposto no artº 24º nº4 e 5, al.a) e b) da Lei 34/2004, pelo que o pedido de constituição de Assistente estava em tempo. Vejamos Após a jurisprudência fixada pelo Ac. do STJ nº1/2011, inexistem dúvidas quanto à natureza peremptória do prazo previsto no artº 68º nº2 do CPP, o qual se inicia com a notificação efectuada nos termos do artº 246º nº4 do CPP. Porém, o que está em causa nos autos, não é a natureza daquele prazo, mas antes qual a notificação que deverá ser considerada para o início do mesmo, se a notificação efectuada pela PSP se a notificação efectuada nos autos por determinação do MP. Desde já se adianta entendermos, tal como expõe o Srº Procurador Geral Adjunto nesta Relação que a notificação a considerar para aquele efeito, só pode ser aquela que foi ordenada pelo Ministério Público por despacho de 23/1/2019. E esta afirmação não tem por base, estarmos a defender que as notificações efectuadas pela autoridade policial não têm aptidão, para desencadear o início da contagem do prazo processual de 10 dias para a constituição de assistente, mas sim que no caso concreto a notificação efectuada não cumpre os requisitos previstos na lei, artº 246º nº4 do CPP, e por isso a mesma não se pode considerar válida para os efeitos legais. Efectivamente, e como bem evidencia o MP nesta Relação, o artº 246º nº4 do CPP resulta que o órgão de polícia criminal a quem a denúncia for feita verbalmente deve advertir o denunciante, não só da obrigatoriedade da constituição de assistente mas também dos procedimentos a observar. Ora, a notificação efectuada pelo OPC, cujos termos se transcreveram supra, adverte o ofendido “de que deve constituir-se assistente no processo mediante requerimento a apresentar no prazo de 10 dias a contar desta data, conforme estipulado no Artigo 68º nº2 do CPP..”, sem explicitar o carácter obrigatório dessa constituição e as consequências que advinham de não a fazer, e não o adverte minimamente dos procedimentos a observar, advertências que apenas lhe são efectuadas através da notificação ordenada pelo MP e enviada em 24/1/2019 nos termos também supra transcritos. Como tal, só a notificação efectuada por ordem do MP se mostra válida e eficaz para desencadear o início do prazo para a constituição de Assistente. Este entendimento é também o que melhor se coaduna com os princípios da previsibilidade e da confiança que são uma das vertentes do Estado de Direito Democrático consagrado no artº 2ª da CRP. Sobre o conteúdo do princípio geral da segurança jurídica, e da confiança escreve o Prof. Gomes Canotilho: “O homem necessita de segurança para conduzir, planificar e conformar autónoma e responsavelmente a sua vida. Por isso desde cedo se consideram os princípios da segurança e da protecção jurídica da confiança como elementos constitutivos do Estado de Direito (…).O princípio geral da segurança jurídica em sentido amplo (abrangendo a ideia de protecção de confiança) pode formular-se do seguinte modo: o indivíduo tem o direito de poder confiar em que aos seus actos ou decisões públicas incidentes sobre os seus direitos, posições ou relações jurídicas alicerçadas em normas jurídicas vigentes e válidas por esses atos jurídicos deixado pelas autoridades com base nessas normas se ligam os efeitos jurídicos previstos e prescritos no ordenamento jurídico”. [4] Face ao que vem de se expor e uma vez que o pedido de constituição de Assistente formulado pelo ofendido na sequência da notificação ordenada pelo MP por despacho de 23/1/2019, efectivada em 28/1/2019, considerada a interrupção do prazo decorrente da apresentação nos autos do pedido de apoio judiciário, nos termos do arº 24º nº4 e 5 al.a) da Lei 34/2004 de 29 de Julho, mostra-se tempestivo, o despacho recorrido não pode subsistir, devendo os autos prosseguir. * III – DISPOSITIVO:* Pelo exposto, acordam os juízes desta Relação em, no provimento do recurso interposto pelo recorrente CC, revogar o despacho recorrido, o qual deverá ser substituído por outro que pressuponha a tempestividade do pedido de constituição de Assistente, e ordene o prosseguimento dos autos em conformidade. Elaborado e revisto pela relatora Porto, 19/12/2023 Lígia Figueiredo Maria Joana Grácio Castela Rio ______________ [1] Noções Elementares de Processo Civil”, Coimbra Editora, 1979, pág. 304. [2] Ac. STJ de 31 de Janeiro de 2002, proc.453/01 citado por Manuel Lopes Maia Gonçalves, Código de Processo Penal Anotado, Almedina, Coimbra 2009, pág 214, Ac .RP de 22/9/2010, proc3642/09.5TDPRT-A.P1, (relator José Piedade) ac.RP 29/4/2009 , proc. 1837/08.TAMAI –A-P1 (relator António Gama) e ac. RP 6/5/2009 Proc. 5851/06.0TDPRT, (relatora Maria do Carmo Silva Dias), Ac. Rel. Coimbra, 29/5/2013, proc.762/10.7TAFIG.C1 (relatora Maria Pilar de Oliveira) , Ac.Rel.Guimarães 9/4/2018,proc 470/15.2PBGMR.G1,(relator Jorge Bispo). [3] Cf. Paulo Pinto de Albuquerque, Comentário do Código de Processo Penal, á luz da Constituição da República e da Convenção Europeia dos Direitos do Homem. 3ª edição actualizada, Universidade Católica 2009, pág.206. [4] José Joaquim Gomes Canotilho, Direito Constitucional e Teoria da Constituição, Almedina, 7ª ed. 2003. p.257. |