Acórdão do Tribunal da Relação do Porto
Processo:
621/16.0T8GDM.P1
Nº Convencional: JTRP000
Relator: FRANCISCA MOTA VIEIRA
Descritores: GARANTIA DO FABRICANTE
BENS POR ELE PRODUZIDOS
CONTRATO DE COMPRA E VENDA
AUTONOMIZAÇÃO DAS DECLARAÇÕES DE GARANTIA
REPARAÇÃO DO BEM
Nº do Documento: RP20200423621/16.0T8GDM.P1
Data do Acordão: 04/23/2020
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: REVOGADA A DECISÃO
Indicações Eventuais: 3ª SECÇÃO
Área Temática: .
Sumário: I - A garantia concedida pelo fabricante relativamente aos bens por ele produzidos deve ser perspectivada à luz do artigo 459º do CCivil , isto é, deve ser considerada como um negócio jurídico unilateral não receptício e que assumindo a garantia os contornos de uma promessa pública, ela deverá respeitar os requisitos impostos pelo artigo 459º do C.C.
II - As declarações de garantia emitidas pelo fabricante ou por qualquer intermediário da cadeia de distribuição do bem, independentemente da categoria em que se possa inserir essas declarações são independentes do contrato de compra e venda celebrado entre o vendedor final e o comprador, não revestindo a natureza de pacto acessório desse contrato, assim como a responsabilidade que é imputável ao garante é distinta daquela que decorre para o vendedor
III - Tratando -se de uma condenação da legal representante da fabricante em realizar trabalhos de reparação do veículo, os quais, naturalmente vão ser executados pelo concessionário que vier a ser indicado, não está excluído que a reparação venha ser feita por outro concessionário distinto da 1ª Ré, logo, é legitima a realização das reparações por outrem que não a 1ª ré , a significar que estamos uma prestação de fato de natureza fungível.
Reclamações:
Decisão Texto Integral: Processo n.º 621/16.0T8GDM.P1
Acordam os juízes do Tribunal da Relação do Porto
I - Relatório:
B…, Lda. intentou a presente acção contra C…, S.A. e D…, S.A., alegando, em síntese, que a A. comprou à 1ª R. uma viatura de marca D…, pelo preço de €36.751,00, em estado de nova; a 1ª R. é concessionária oficial da 2ª R., que é importadora e representante em Portugal dos veículos de marca D…. Foi garantido pela 1ª R. os serviços de assistência das peças acessórios e demais componentes do veículo pelo período de 2 anos, assumida também pela fabricante do veículo, representada pela 2ª R.. Desde o início a A. comunicou à 1ª R. que o comportamento da viatura não era normal, tendo-se deslocado às instalações da 1ª R. em 27/11/2014, devido a anomalia no fecho da porta, não tendo sido detectados outros problemas, nomeadamente com o motor. Em 28/01/2015 deslocou-se a outro concessionário, que detectou a falta de potência que confirmava o desligamento automático quando forçado o motor, tendo sido substituídos alguns componentes, que não resolveu o que afectava o seu normal uso, tendo ficado privada do uso da viatura durante algumas semanas, sem que o problema fosse resolvido. Em 20/04/2015 foram realizados diagnósticos que detectaram papel dentro do depósito de combustível, obstruindo a normal admissão de combustível pelos injectores. A viatura continuou a apresentar falta de potência do motor, tendo sido sujeita a novas reparações em 14/08/2015, 17/09/2015 e 03/11/2015. Em 04/12/2015 solicitou à 1ª R. agendamento de reunião para eliminação dos defeitos, insistindo em 05/01/2016, também junto da 2ª R.. A pedido da 1ª R., em 21/01/2016 entregou nos serviços da 1ª R. a viatura, tendo esta apenas reprogramado a centralina electrónica. No dia em que a viatura foi entregue, foi necessário regressar à oficina, pelos mesmos motivos. O mesmo sucedeu em 16/02/2016. Não foram eliminados os defeitos, pelo que a A. se vê privada do seu uso, o que lhe acarreta prejuízos, por não poder cumprir com as obrigações contratuais com os seus clientes, tendo sido forçada a cancelar eventos extracurriculares e outras actividades fora do espaço da A., o que afectou negativamente a sua imagem perante os encarregados de educação e o público. Conclui, peticionando que sejam as RR. condenadas a proceder à eliminação (reparação) dos defeitos existentes e que afectam a normal utilização da viatura. Em alternativa, por se mostrar impossível a reparação, serem as RR. condenadas na substituição da viatura por outra idêntica, no estado de nova. Em alternativa a este pedido, por ser um vício de construção que afecta aquele modelo, ser o contrato resolvido e condenada a 2ª R. a restituir a quantia de €36.751,00; serem as RR. condenadas no pagamento de uma sanção pecuniária compulsória por cada dia de atraso na reparação dos defeitos existentes ou substituição da viatura, entendendo-se como razoável para tal sanção a quantia diária de €100,00; serem as RR. condenadas no pagamento à A. de uma indemnização pelos danos não patrimoniais que causaram, no mínimo de €3.000,00.
Regularmente citada, veio a 1ª R. deduzir contestação a fls. 36 e ss., na qual invoca a caducidade do direito de denúncia e do direito de acção, em virtude de, até ao dia 04/12/2015, a autora não ter comunicado a existência de qualquer defeito à 1ª R. nem as deslocações ao concessionário G…. Alega não fabricar nem representar directamente o produtor das viaturas de marca D… e que em 27/11/2014 não foram apontadas queixas referentes a perda de potência, desactivação do motor ou imobilização do veículo9, que a 1ª R. não verificou e da qual teve conhecimento com o email do I. Mandatário da A.. a 1ª R. interpelou a A. para avaliar a viatura, tendo esta, em 21/01/2016, apresentado o aviso “motor, procure serviço”, por obstrução do filtro de partículas, que foi desobstruído e feita actualização do software. Alega ainda não ter sido possibilitado pela A. um teste de estrada e que se encontra a efectuar diagnósticos e verificações, com instruções para substituir uma peça. Conclui pela procedência das excepções e improcedência da acção.
A 2ª R. deduziu contestação a fls. 57, na qual alega a sua ilegitimidade, em virtude da actividade de manutenção e reparação ser efectuada pelos reparadores autorizados, da qual a 1ª R. faz parte; a 2ª R. foi alheia à venda do veículo; a inaplicabilidade do Decreto-Lei nº 67/2003, de 08/04, em virtude da viatura ser utilizada para fins profissionais e das anomalias serem consequência do modo como a viatura era conduzida; a inaplicabilidade do Decreto-Lei nº 383/89, de 06/11; a inaplicabilidade do disposto nos artigos 913º e ss. do CCivil, em virtude de ter sido alheia ao contrato de compra e venda da viatura. Invoca ainda a caducidade do direito da A., por a acção dever ter sido proposta até 28/07/2015. Impugna o alegado pela A. e alega que em 15/10/2014 o veículo foi inspeccionado pela 1ª R. tendo sido detectado um cabo de massa com ligação deficiente ao módulo de controlo de motor, que foi reparado e sanou a anomalia; no dia 27/11/2014 a A. dirigiu-se à 1ª R, a reclamar falta de potência do veículo, mas apenas foi detectada avaria numa porta; no dia 28/01/2015, na G…, a viatura apresentava sintoma de luz de avaria de motor acesa, perda de potência e mensagem de filtro de combustível obstruído, o que foi confirmado, tendo-se procedido à limpeza do depósito e concluído pelo pleno funcionamento do veículo; os sintomas apresentados podem dever-se à não realização de viagens ocasionais com as condições indicadas no artigo 107º da contestação, o que exclui a responsabilidade da 2ª R.; em 20/04/2015 a viatura apresentava, na G…, falha de motor em andamento, tendo sido detectada a regulação deficiente da bomba injectora, que foi substituída e o sintoma desaparecido; no dia 14/08/2015 apresentava diagnóstico de líquido junto do depósito de combustível, injector de aditivo danificado, entrada de água num farolim traseiro, fuga de óleo na tampa da distribuição e retentor da cambota, que foram substituídos; em 17/09/2015 apresentava indicação de avaria no motor e filtro de partículas diesel totalmente obstruído, tendo este sido substituído e ficado a funcionar de modo normal; em 03/11/2015 apresentava indicação de avaria no motor, tendo sido substituído o sensor de pressão no DPF e a indicação desaparecido. Alega que a partir de 17/09/2015, os testes efectuados pela G… permitem concluir que a causa provável da obstrução do DPF seriam os reduzidos trajectos da A. e não realização de regenerações completas, o que foi explicado à A.. Conclui pela procedência das excepções e improcedência da acção.
A A. deduziu resposta a fls. 766 e ss., na qual pugna pela improcedência das excepções invocadas pelas RR., alegando para o efeito que nenhum defeito foi constatado ou tido como suspeito, não tendo as RR. conseguido detectar a origem dos sintomas, que recorreu a outro concessionário autorizado e reconhecido pela D1… em Portugal, nunca tendo sido identificado um defeito que terá de existir, pois a viatura não tem as características asseguradas pelo vendedor. Alega ainda que o historial de reparações está integrado numa base de dados partilhada online, acessível a todos os concessionários, pelo que a 1ª R. não podia desconhecer a situação da viatura desde que a A. a informou de que iria recorrer aos serviços da G…. Mais alega que em cada intervenção de um concessionário a denúncia é formalmente recebida, do conhecimento da 1ª R.. Alega ainda que nunca lhe foi entregue o manual de instruções nem dadas recomendações ou especiais indicações quanto ao seu uso.

Foi elaborado despacho saneador, no qual foi julgada improcedente a excepção de ilegitimidade passiva invocada pela 2ª R. e proferido o despacho previsto no artigo 596º nº 1 do CPC, sem que se tenha verificado qualquer reclamação (cfr. fls. 956 e ss.).
O objecto do litígio foi fixado nos seguintes termos: do apuramento do direito à eliminação de defeitos da viatura com a matrícula .. – PE - .., da substituição da viatura, da resolução do contrato e restituição da quantia monetária, da sanção pecuniária compulsória, dos danos não patrimoniais, bem como da caducidade do direito de denúncia e do direito de acção.

Realizou-se audiência de discussão e julgamento com observância do legal formalismo e foi proferida sentença cujo dispositivo se reproduz:
“Pelo exposto, julga-se a acção parcialmente procedente e, em consequência:
1) Condena-se a 2ª R. a proceder à reparação da viatura identificada em F) dos factos provados;
2) Condena-se a 1ª R. a proceder à reparação da viatura identificada em F) dos factos provados apenas no caso de a A. ou a 2ª R. a indicarem como concessionária/reparadora oficial para o efeito;
3) Condena-se a 2ª R. no pagamento à A. do valor diário de €35,00 a título de sanção pecuniária compulsória por cada dia de atraso na reparação dos defeitos existentes na viatura, desde a data do trânsito em julgado da presente sentença;
4) Condena-se a 2ª R. [1] no pagamento à A. do valor diário de € 35,00 a título de sanção pecuniária compulsória por cada dia de atraso na reparação dos defeitos existentes na viatura, a iniciar após a autorização da reparação por parte da 2ª R.;
5) Absolvem-se as RR. dos demais pedidos formulados pela A..(…)”
Inconformadas a 1ª e a 2ªRés interpuseram, cada uma, recurso de apelação.
Reproduzem-se aqui as conclusões do recurso de apelação da 1ª Ré, que, no essencial, alega existir nulidade da sentença pelo facto de a decisão estar em contradição com os factos apurados e com a procedência da exceção invocada, alega não se discorrer qual a obrigação que para a recorrente decorreria da sentença, nomeadamente, se deveria a Ré suportar os custos da reparação - o que não concede - caso assim lhe seja exigido pela Autora ou pela 2.ª Ré ou se tal reparação deverá ser feita nos mesmos termos da prestação dos serviços de reparação em garantia, obtendo da 2.ª Ré o reembolso do preço de peças e mão-de-obra, terminando a pedir a revogação dos pontos 2) e 4) do dispositivo e a condenação da recorrente em custas serem dela removidos.
Conclusões :
A. O presente recurso vem interposto do segmento da decisão que condena a 1.ª Ré "a proceder à reparação da viatura identificada em F) dos factos provados apenas no caso de a A. ou a 2.ª R. a indicarem como concessionária/reparadora oficial para o efeito", bem como no pagamento de uma sanção pecuniária compulsória e que a condena em custas do processo na proporção de 1/3.
B. De acordo com o elenco dos factos provados resulta que a Autora verificou o filtro de partículas obstruído o mais tardar em 29.06.2015, e que apenas em 21.01.2016 o comunica à recorrente, com entrega da viatura na oficina desta.
C. De acordo com a sentença recorrida, a garantia de bom funcionamento do bem vendido foi concedida pela recorrente pelo período de 2 anos, nos termos previstos no artigo 921º nº 1 do Código Civil, pelo que, por força do nº 3 da citada norma, teria a A. o prazo de 30 dias a contar do conhecimento do defeito para o denunciar ao vendedor, o que não cumpriu.
D. O tribunal a quo concluiu pela caducidade do direito de denúncia dos defeitos por parte da A. perante a ora recorrente em virtude do contrato de compra e venda celebrado entre ambas, o que se lê ao longo de toda a fundamentação da sentença.
E. A condenação da recorrente se encontra em manifesta contradição com aqueles fundamentos, verificando-se a nulidade da sentença a quo, devendo os pontos 2) e 4) do dispositivo e a condenação da recorrente em custas serem dela retirados.
F. Caso assim não seja entendido, sempre tais segmentos deverão ser revogados pelo facto de não se discorrer qual a obrigação que para a recorrente decorreria da sentença, nomeadamente, se deveria a Ré suportar os custos da reparação - o que não se concede - caso assim lhe seja exigido pela Autora ou pela 2.ª Ré ou se tal reparação deverá ser feita nos mesmos termos da prestação dos serviços de reparação em garantia, obtendo da 2.ª Ré o reembolso do preço de peças e mão-de- obra.
G. Não podendo a 1.ª Ré ser condenada em virtude da caducidade, nunca poderá ser-lhe fixada uma qualquer sanção pecuniária compulsória, não podendo deixar de se manifestar estranheza desde logo pelo facto de não se fixar às rés um prazo razoável para a reparação, bem como pela razão de se considerar o facto a prestar como infungível, o que não se afigura minimamente aceitável.
H. Procedendo todas as conclusões supra referidas, nunca poderia a 1.ª R. ter sido condenada em custas na proporção de um decaimento que se fixou em 1/3 para cada uma das partes, nos termos do disposto no artigo 527º nºs. 1 e 2 do CPC.
I.A sentença recorrida violou pois os artigos 615.º do CPC, 921.º do CC e 527.º do CPC.

A 2ª ré interpôs recurso de apelação, o qual, no essencial, versa sobre a matéria de direito e a decisão relativa à matéria de facto, alegando que se a 2ª ré não interveio de qualquer forma no negócio de compra e venda celebrado entre A. e 1ª R.”, nunca o pedido de reparação ou de substituição fundado na celebração de um contrato onde a Apelante não foi parte, poderia ser considerado procedente e, menos ainda, nunca a condenação nestes dois pedidos poderia ter por base a emissão de uma garantia que não é alegada, pela Autora, como sendo a relação contratual que está na génese da formulação de tais pedidos (ainda que a título subsidiário) contra a Ré D…, alegando que esta a garantia, repisa-se, não era causa de pedir invocada pela Apelada e, como tal, estava o Tribunal impedido de sustentar a condenação da 2.ª Ré na mesma. Conclui, nesta parte pela nulidade da sentença ao abrigo art 615º, nº1, al.d) do CPC.
Alega que resulta da matéria de facto dada como provada e, em especial, (…) destacada, que o motivo essencial pelo qual a viatura dos autos era objeto de serviços de reparação se prendia com a constante obstrução do filtro de partículas, a qual, advinha do insucesso no processo de regeneração do filtro de partículas que todos os veículos a diesel devem efectuar, que enunciado de fato julgado como provado é, por si só, é bastante elucidativo do facto de a viatura em causa não sofrer de qualquer defeito de fabrico que as Rés se tenham furtado a corrigir.
Mais impugna a al. GGG) dos fatos apurados e pede a reapreciação dos esclarecimentos prestados pelo Senhor perito, do depoimento da testemunha E… e pretende que o ponto GGG) dos fatos provados passe a ter a seguinte redacção :
“GGG) O perito foi contactado no dia 30/01/2019 com a informação que o veículo, com 23338 km, ficou com o filtro de partículas obstruído e em modo de segurança. O perito constatou que o filtro de partículas não padece de qualquer defeito e a situação descrita é assacada, pelo perito, ao tipo de condução que é feita pela Autora e ao uso que a mesma faz da viatura (a saber: trajetos curtos e citadinos) que impedem que a regeneração automática de partículas”.
Mais impugna o ponto 16 dos fatos não provados, convocando a reapreciação do relatório pericial e os depoimentos das testemunhas E… e F….
Por último, impugna o ponto 17 dos fatos não provados, convocando a reapreciação de determinados segmentos dos depoimentos das testemunhas E… e F…, concluindo que deve ser dado como provado o seguinte fato:
“Os sintomas apresentados pela viatura apenas poderão ficar a dever-se aos reduzidos trajectos realizados pela A. no exercício da sua actividade e à circunstância de não terem sido realizadas viagens ocasionais com as condições indicadas e consequente não realização de regenerações periódicas.”
Impugna ainda o mérito da sentença, alegando, no essencial, que não existe qualquer defeito de fabrico ou desconformidade pelo qual as Rés poderão ser responsabilizadas, afirmando que a viatura dos autos carece de um tipo de condução para que o processo de regeneração do filtro de partículas seja efetuado de forma bem sucedida, como programado, sendo esta “característica” transversal a veículos de outras marcas que vêm equipados com o mesmo componente.
Alega que a autora desconsiderou as advertências que lhe foram feitas e, nessa medida, atuou de forma a impedir ativamente a regeneração automática do filtro de partículas (sendo certo que, se este processo não for completado com sucesso, diversos componentes da viatura, com especial incidência para os componentes do motor, podem sofrer danos), alega que a autora não pode pretender assacar os problemas da viatura a qualquer defeito de fabrico. Tais anomalias devem-se, única e exclusivamente, a uma condução inadequada da mesma, por parte da Autora.
Mais alega que a reparação ordenada é uma prestação impossível, porquanto, o veículo não padece de defeito.
Nos termos da lei, a obrigação a que a Apelante foi condenada padece de impossibilidade originária de cumprimento, tal como definida no artigo 401.º do CC, a qual, no caso concreto, dará lugar à nulidade da sentença...
Mais alega:
“Não sendo possível à Ré D… reparar a viatura adquirida pela Autora à Ré C…, uma vez que a causa do seu comportamento anómalo se reconduz, exclusivamente, ao tipo de condução efetuado pela Autora, a obrigação de reparação da viatura redundará numa impossibilidade originária que, atendendo ao disposto no n.º 1 do artigo 790.º do CC, fará com que se extinga tal obrigação.
Estando a condenação assente na garantia alegadamente concedida pela Apelada, a possibilidade de substituição da viatura consubstancia mera hipótese académica, por não ter acolhimento em tal documento.
Sem necessidade de outras considerações, considera a Ré D… que está posta de lado a emergência, na sua esfera jurídica, de uma qualquer obrigação de reparação da viatura, quer por via da aplicação do regime jurídico da compra e venda de coisa defeituosa, quer por conta da garantia que alegadamente, razão pela qual a decisão recorrida deve ser revogada.
Mais alega que a reparação que é exigível não tem apoio na garantia legal com base na qual a sentença recorrida estribou a condenação da 2ª ré, assinalando que de acordo com a garantia “o Elemento do filtro de óleo, elemento do filtro de ar, filtro de pólen, DPF (filtro de partículas Diesel) ou elemento do filtro de combustível estão sujeitos a desgaste rápido e apenas estão cobertos até à primeira revisão agendada ou durante 12 meses contados a partir da data do primeiro registo, o que ocorrer primeiro.
E como refere a sentença recorrida:
“(…) a responsabilidade da 2ª R. perante a A. rege-se somente pelo teor do guia de garantia supra identificado e que, no que se refere à A., por não ser consumidora para efeitos do previsto no Decreto-Lei nº 67/2003, apenas abrange a reparação ou substituição de peças com defeito de fabrico.
Por outro lado, estão excluídos de tal responsabilidade os danos identificados a págs. 10 e 17 do guia, ou seja, “excluem toda e qualquer responsabilidade por danos acidentais ou consequentes, verificados como resultado de uma avaria ao abrigo destas Garantias, incluindo, entre outros, incómodos, custos de transporte, chamadas telefónicas, custos de alojamento, perdas de receita e danos de propriedade” e “Quaisquer perdas resultantes direta ou indirectamente da imobilização do veículo (…)”. (realce e sublinhado nosso)
Mostra-se, então, forçoso concluir que a Ré D… já cumpriu tal obrigação, uma vez que, como se recolhe na alínea X) dos factos provados e, bem assim, do elenco de reparações suportadas em garantia (cujo suporte foi junto aos autos por requerimento da Apelante datado de 04.12.201730):
“Foi a viatura sujeita a novas reparações na concessionária G… do Porto, nas seguintes datas (…) 17/09/2015, com 6849 km, por indicador de aviso de motor permanentemente aceso e filtro de partículas diesel (DPF) totalmente obstruído, tendo sido substituído o filtro de partículas diesel; 06/10/2015, com 7052 km, por indicador de aviso de motor permanentemente aceso, com detecção de filtro de partículas obstruído e substituição do sensor do filtro de partículas; (…)”
Nessa medida, tão pouco por esta via lhe pode ser assacada qualquer responsabilidade, dado que, nos termos do artigo 405.º do CC, esta garantia vale nos exatos termos das declarações ali contidas, os quais, como já se viu, foram escrupulosamente cumpridos pela Apelante.
No tocante ao recurso interposto pela 2ª Ré, reproduzem-se qui as conclusões do recurso de apelação da 2ª Ré:
a.A prova produzida, não só aponta para o escrupuloso cumprimento, por parte da Apelante, de todas as obrigações a que legal e contratualmente estava adstrita, como demonstra que a Autora não logrou fazer prova da existência de defeitos na viatura que adquiriu à 1.ª Ré;
b.Importa invocar a alínea d) do n.º 1 do artigo 615.º do CPC, conjugada com o n.º 2 do artigo 608.º do mesmo diploma;
c. A Autora funda o petitório na celebração de um contrato de compra e venda com a Ré C…, que, no seu entender, foi defeituosamente cumprido, uma vez que a viatura que lhe foi alienada padecia de alegados defeitos;
d. Dito de um outro modo, a causa de pedir reconduz-se aos artigos 913.º e seguintes do Código Civil;
e.Em face das alegações da Autora em sede de PI e, bem assim, da matéria de facto dada como provada, concretamente da alínea B) da mesma, nunca o pedido de reparação fundado na celebração de um contrato onde a Apelante não foi parte, poderia ser considerado procedente e, menos ainda, nunca a sua condenação poderia ter por base a emissão de uma garantia que não foi alegada, pela Autora, como sendo a relação contratual que está na génese da formulação de tal pedido (ainda que a título subsidiário) contra a Ré D…;
f. Face ao exposto, impõe-se concluir pela nulidade da sentença;
g.No tocante à reapreciação da matéria de facto considerada provada, resulta inequivocamente demonstrado que o motivo central que levava a que a viatura recorresse a serviços de reparação se reconduzia a obstrução constante do filtro de partículas, a qual está relacionada com a interrupção do processo de regeneração do filtro de partículas;
h.Sobre esta matéria, registe-se que o Tribunal a quo considerou provado o que consta das alíneas AAA), BBB), XX), WW), YY), OO) e VV);
i. Aquele acervo factual é elucidativo de que a viatura não sofre de qualquer defeito de fabrico que as Rés se tenham furtado a corrigir;
j. O veículo em causa carece de um certo tipo de condução para que seja efetuado de forma bem sucedida o processo de regeneração do filtro de partículas, sob pena de a mesma entrar em “safe mode”;
k.Sem prejuízo do acervo probatório que milita em sentido contrário, o Tribunal a quo considerou provados / não provados um conjunto de factos que infirmam tal asserção;
l. Não deveria ter sido incluído no elenco de factos dados como provados o constante da alínea GGG);
m. Atendendo ao relatório pericial, aos esclarecimentos prestados pelo Sr. Perito na sessão da audiência de julgamento de 11.04.2019 (registados no ficheiro áudio20190411143724_14523090_2871513) e ao depoimento prestado por E…, na sessão da audiência de julgamento de 21.11.2017 (registado no ficheiro áudio 20171121160804_14523090_2871513), tal alínea deveria ter a seguinte redação:
“GGG) O perito foi contactado no dia 30/01/2019 com a informação que o veículo, com 23338 km, ficou com o filtro de partículas obstruído e em modo de segurança. O perito constatou que o filtro de partículas não padece de qualquer defeito e a situação descrita é assacada, pelo perito, ao tipo de condução que é feita pela Autora e ao uso que a mesma faz da viatura (a saber: trajetos curtos e citadinos) que impedem que a regeneração automática de partículas”;
n. Mal andou o Tribunal a quo ao considerar não provado o que consta da alínea 16);
o. Em apoio da tese ora sufragada destaca-se a página 6 do relatório pericial e os depoimentos prestados pelas testemunhas F… [na sessão da audiência de julgamentos e 15.12.2017(registado no ficheiro áudio 20171215153008_14523090_2871513)] e E… [na sessão da audiência de julgamento de 21.11.2017];
p. Impunha-se que o facto em causa tivesse sido considerado provado;
q. Na sentença posta em crise foi acolhido o entendimento de que também o facto contido no ponto 17) não devia ser dado como provado;
r. Em sentido contrário, destacam-se os depoimentos das testemunhas E… (na sessão da audiência de julgamento de 21.11.2017) e de F… (na sessão da audiência de julgamento de 15.12.2017);
s. É entendimento da Ré que o facto em análise deveria ter sido considerado provado;
t. No final da fundamentação de direito da decisão de que se recorre, o Tribunal a quo decide assacar responsabilidade à Apelante por via da garantia que foi junta aos autos por requerimento datado de 09.05.2016, cuja emitente é a D2… – como resulta da página 4/49;
v. Como explicou a testemunha da Apelante E…, na sessão da audiência de julgamento de 21.11.2017, a viatura adquirida pela Autora apresentou inicialmente um problema relacionado com o filtro de combustível - o qual se deveu a uma obstrução causada por um pedaço papel de limpeza que terá ficado dentro do depósito de combustível aquando da montagem da viatura -, tendo tal questão sido diagnosticada pelo reparador autorizado G…, onde foi feita uma limpeza ao depósito de combustível, após o que a viatura foi entregue à Autora totalmente operacional;
w. Sendo a viatura empregue em trajetos curtos, mormente citadinos, não se reúnem as condições necessárias para que se conclua de forma bem sucedida o processo de incineração das partículas acumuladas no filtro, pelo que o mesmo apresenta constantes obstruções que, em casos extremos, poderão dar lugar à imobilização da viatura, dado esta entrar em “safe mode”;
x. Da prova testemunhal produzida retira-se que, pese embora todas as intervenções que foram feitas (algumas com cariz meramente preventivo), não estamos perante um defeito na viatura, mas, outrossim, perante uma característica inerente à mesma – que obriga a que seja efetuado um determinado tipo de condução, para que o processo de regeneração do filtro de partículas ocorra de forma automática;
y. Dado que a Autora não tem tal cuidado, periodicamente a sua viatura fica com o filtro de partículas parcial ou até mesmo totalmente obstruído, o que obriga a que seja efetuado, no reparador autorizado, um ciclo de regeneração estático do filtro de partículas;
z. De acordo com o vertido na fundamentação de direito invocada pela Autora (e que consta dos artigos 47.º a 62.º da PI), assim como do petitório com que encerra esse articulado, o fito primordial da Apelada era obter a reparação ou a substituição da viatura que adquiriu à Ré C…, sendo que o Tribunal a quo clarificou que tal apreciação deveria ser efetuada à luz do regime jurídico da compra e venda de coisas defeituosas, previsto nos artigos 913.º e seguintes do Código Civil;
aa. A análise do referido regime legal aponta inequivocamente no sentido de que:
i. O regime em causa apenas pode ser acionado contra o vendedor do bem e nunca contra o fornecedor do bem;
ii. Para que tal regime seja elegível, mostra-se necessário que se comprove a existência de um defeito (o que, in casu, não sucedeu);
iii. Os remédios que assistem ao comprador correspondem à anulação do contrato por erro ou dolo ou à redução do preço e, eventualmente, uma indemnização pelos
u. Não existe qualquer defeito de fabrico ou desconformidade pelo qual as Rés poderão ser responsabilizadas;
v. Como explicou a testemunha da Apelante E…, na sessão da audiência de julgamento de 21.11.2017, a viatura adquirida pela Autora apresentou inicialmente um problema relacionado com o filtro de combustível - o qual se deveu a uma obstrução causada por um pedaço papel de limpeza que terá ficado dentro do depósito de combustível aquando da montagem da viatura -, tendo tal questão sido diagnosticada
pelo reparador autorizado G…, onde foi feita uma limpeza ao depósito de combustível, após o que a viatura foi entregue à Autora totalmente operacional;
w. Sendo a viatura empregue em trajetos curtos, mormente citadinos, não se reúnem as condições necessárias para que se conclua de forma bem sucedida o processo de incineração das partículas acumuladas no filtro, pelo que o mesmo apresenta constantes obstruções que, em casos extremos, poderão dar lugar à imobilização da viatura, dado esta entrar em “safe mode”;
x. Da prova testemunhal produzida retira-se que, pese embora todas as intervenções que foram feitas (algumas com cariz meramente preventivo), não estamos perante um defeito na viatura, mas, outrossim, perante uma característica inerente à mesma – que obriga a que seja efetuado um determinado tipo de condução, para que o processo de regeneração do filtro de partículas ocorra de forma automática;
y. Dado que a Autora não tem tal cuidado, periodicamente a sua viatura fica com o filtro de partículas parcial ou até mesmo totalmente obstruído, o que obriga a que seja efetuado, no reparador autorizado, um ciclo de regeneração estático do filtro de partículas;
z. De acordo com o vertido na fundamentação de direito invocada pela Autora (e que consta dos artigos 47.º a 62.º da PI), assim como do petitório com que encerra esse articulado, o fito primordial da Apelada era obter a reparação ou a substituição da viatura que adquiriu à Ré C…, sendo que o Tribunal a quo clarificou que tal apreciação deveria ser efetuada à luz do regime jurídico da compra e venda de coisas defeituosas, previsto nos artigos 913.º e seguintes do Código Civil;
aa. A análise do referido regime legal aponta inequivocamente no sentido de que:
i. O regime em causa apenas pode ser acionado contra o vendedor do bem e nunca contra o fornecedor do bem;
ii. Para que tal regime seja elegível, mostra-se necessário que se comprove a existência de um defeito (o que, in casu, não sucedeu);
iii. Os remédios que assistem ao comprador correspondem à anulação do contrato por erro ou dolo ou à redução do preço e, eventualmente, uma indemnização elos danos causados; subsidiariamente, o comprador poderá exigir a reparação ou substituição da coisa.
bb. Tendo em conta a narrativa constante da PI, assim como a matéria dada como provada [concretamente, a alínea B)], é por demais evidente que a Ré D…, para além de ser terceira perante o negócio de compra e venda da viatura, não teve qualquer intervenção nas negociações, ou na formalização do contrato, não sendo possível assacar-lhe qualquer responsabilidade, seja por via do regime dos artigos 913.º e seguintes do Código Civil, seja por via da responsabilidade contratual, seja por via da responsabilidade pré-contratual;
cc. A reparação da viatura não é possível, dado que a mesma não padece de qualquer defeito;
dd. Num curto espaço de tempo, a Autora e a Apelante voltarão ao mesmo ciclo vicioso, traduzido em recorrentes idas, por parte da Apelada, a oficinas de reparadores autorizados para reparação de uma viatura que não tem qualquer defeito;
ee. A obrigação a que a Apelante foi condenada falece por impossibilidade originária do seu cumprimento, tal como definida no artigo 401.º do CC, a qual dá lugar à nulidade da sentença;
ff. Não sendo possível à Ré D… reparar a viatura adquirida pela Autora à Ré C…, sem que com isso troque o filtro de partículas existente por outro idêntico, o qual continuará a carecer de um tipo de condução que a Autora não pretende dar ao veículo, a obrigação de reparação redundará numa impossibilidade originária que, atendendo ao disposto no n.º 1 do artigo 790.º do CC, determinará a extinção da obrigação;
gg. Mesmo que tal assim não se considerasse, importa realçar o que é referido na página 8 da garantia em relação aos itens sujeitos a desgaste (“Os itens sujeitos a desgaste são geralmente divididos em duas categorias Aqueles especificados para substituição ou regulação durante a manutenção programada e aqueles que necessitem ser substituídos ou afinados em função das condições de utilização. Os itens que se seguem estão cobertos até à primeira revisão agendada ou durante 12 meses contados a partir da data do primeiro registo, o que ocorrer primeiro: (…) Elemento do filtro de óleo, elemento do filtro de ar, filtro de pólen, DPF (filtro de partículas Diesel) ou elemento do filtro de combustível. (…)”;
hh. Mostra-se forçoso concluir que a Ré D… já cumpriu tal obrigação, tendo em conta o teor da alínea X) dos factos provados e o elenco de reparações suportadas em garantia cujo suporte documental foi junto aos autos em 04.12.2017;
ii. Tão pouco por aquela via lhe pode ser assacada qualquer responsabilidade, dado que, nos termos do artigo 405.º do CC, esta garantia vale nos exatos termos das declarações ali contidas, os quais foram escrupulosamente cumpridos pela Apelante;
jj. Entende a Apelante que a sentença posta em crise viola os artigos 914.º, 921.º e 405.º do Código Civil, razão pela qual deverá ser revogada.
VI. PEDIDO nestes termos e nos demais que v.ªs exas. Doutamente suprirão, deve o presente recurso ser julgado procedente e, em consequência, deverá a sentença proferida ser revogada, por verificação da nulidade prevista na alínea d) do n.º 1 do artigo 615.º do cpc.
Caso assim não se entenda, deve o presente recurso ser julgado procedente e, em consequência, deverá a sentença proferida pelo tribunal a quo ser substituída por outra que absolva a ré D… de todos os pedidos contra ela formulados.
A autora-apelada apresentou contra-alegações relativamente aos recursos interpostos por cada uma das Rés-recorrentes, concluindo pela manutenção da sentença recorrida.

No tribunal recorrido foi proferido no dia 03-12-2019 despacho para efeitos do nº 1 do artigo 617º do CP , o qual, julgou não verificadas as referidas nulidades, cujo conteúdo aqui se reproduz:
“A 1ª R., em sede de alegações de recurso, invoca a nulidade da sentença ao abrigo do disposto no artigo 615º nº 1 alínea c) do CPC, alegando para o efeito que a sua condenação se encontra em contradição com a procedência da excepção de caducidade por si invocada.
No entanto, e como resulta bem explícito na sentença, a 1ª R., para além da responsabilidade contratual que lhe advém enquanto vendedora do veículo (única relativamente à qual foi invocada e apreciada a excepção de caducidade), tem também responsabilidade enquanto concessionária da 2ª R., tendo sido nessa qualidade condenada.
Inexiste assim qualquer contradição entre os fundamentos e a decisão que determine a nulidade da sentença.
*
A 2ª R., em alegações de recurso, invoca também a nulidade da sentença com base na alínea d) do nº 1 do artigo 615º do CPC, alegando para o efeito que a A. apenas invocou a garantia de venda da 1ª R..
No entanto, a A. alega, em sede de petição inicial, expressamente, que a 2ª R. prestou também garantia enquanto representante da fabricante do veículo (cfr. artigos 3º e 7º daquele articulado, para justificar a sua legitimidade passiva), tendo sido tal responsabilidade a apreciada em sede de sentença quanto a esta R..
Assim, não padece a sentença da nulidade invocada.
Atento o exposto, e ao abrigo do disposto no artigo 617º nº 2 do CPC, indeferem-se as invocadas nulidades.
Notifique e, após, conclua à Mma. Juiz titular do processo para efeitos de prolação de despacho sobre a admissibilidade de recurso.”

Colhidos os vistos legais, cumpre decidir.
II. DELIMITAÇÃO DO OBJETO DOS RECURSOS.
2.1.No recurso interposto pela 1º Ré são colocadas as seguintes questões:
.Da nulidade da sentença, com fundamento na alegada contradição verificada entre a condenação da 1ª ré e os fatos apurados e a procedência da exceção de caducidade invocada ; a nulidade invocada tem ainda como fundamento a alegada obscuridade da sentença por alegadamente não se conseguir discorrer qual a obrigação que para a recorrente decorreria da sentença, nomeadamente, se deveria a Ré suportar os custos da reparação - o que, alega, não se concede - caso assim lhe seja exigido pela Autora ou pela 2.ª Ré ou se tal reparação deverá ser feita nos mesmos termos da prestação dos serviços de reparação em garantia, obtendo da 2.ª Ré o reembolso do preço de peças e mão-de-obra, terminando a pedir a revogação dos pontos 2) e 4) do dispositivo e a condenação da recorrente em custas serem dela removidos.
.Do mérito da decisão recorrida na parte em que a 1ª ré-ora recorrente é condenada, na hipótese de não ser julgada procedente a alegada nulidade da sentença.
2.2.No recurso interposto pela 2ª ré são colocadas as seguintes questões:
.Da nulidade da sentença, em virtude da alegação da petição e da matéria de fato apurada não permitir a procedência do pedido de reparação fundado na celebração de um contrato onde a Apelante não foi parte, na medida em que, alega, o acervo factual é elucidativo de que a viatura não sofre de qualquer defeito de fabrico que as Rés se tenham furtado a corrigir, e em virtude da sua condenação ter por base a emissão de uma garantia que não foi alegada, pela Autora, como sendo a relação contratual que está na génese da formulação de tal pedido (ainda que a título subsidiário) contra a Ré D…;
Impugnação da matéria de fato vertida na al. GGG) dos fatos provados e nas alíneas 16 e 17 dos fatos não provados.
Do mérito da decisão recorrida.
III. FUNDAMENTAÇÃO
3.1. Das nulidades da sentença
3.1.1.A 1ª R., em sede de alegações de recurso, invoca a nulidade da sentença ao abrigo do disposto no artigo 615º nº 1 alínea c) do CPC, alegando para o efeito que se verifica contradição entre a condenação da 1ª ré e os fatos apurados e a procedência da exceção de caducidade invocada, bem como, alega existir obscuridade da sentença por alegadamente não se conseguir discorrer qual a obrigação que para a recorrente decorreria da sentença, nomeadamente, se deveria a Ré suportar os custos da reparação - o que não se concede - caso assim lhe seja exigido pela Autora ou pela 2.ª Ré ou se tal reparação deverá ser feita nos mesmos termos da prestação dos serviços de reparação em garantia, obtendo da 2.ª Ré o reembolso do preço de peças e mão-de-obra, terminando a pedir a revogação dos pontos 2) e 4) do dispositivo e a condenação da recorrente em custas serem dela removidos.
Apreciando e decidindo:
Como decorre da análise da sentença recorrida A Autora intentou a presente ação contra ambas as rés alegando, em síntese, que comprou à ora recorrente uma viatura de marca D1…, pelo preço de €36.751,00, em estado de nova, que a 1ª R. é concessionária oficial da 2ª R., que é importadora e representante em Portugal dos veículos de marca D1…. Mais alegou que desde o início a A. comunicou à 1ª R. que o comportamento da viatura não era normal, tendo-se deslocado às instalações da 1ª R. em 27/11/2014, devido a anomalia no fecho da porta, não tendo sido detetados outros problemas, nomeadamente com o motor. Em 28/01/2015 deslocou-se a outro concessionário, onde foram efetuadas diversas queixas relacionadas com a perda de potência e várias reparações, concluindo que os defeitos não foram eliminados, vendo-se a A. privada do uso da viatura, o que lhe acarretaria prejuízos. A Autora concluiu peticionando que fossem as RR. condenadas a proceder à eliminação (reparação) dos defeitos existentes e que afetam a normal utilização da viatura. Em alternativa, por se mostrar impossível a reparação, que fossem as RR. condenadas na substituição da viatura por outra idêntica, no estado de nova. Em alternativa a este pedido, por ser um vício de construção que afectaria aquele modelo, ser o contrato resolvido e condenada a 2ª R. a restituir a quantia de €36.751,00, mais requerendo que as RR. fossem condenadas no pagamento de uma sanção pecuniária compulsória por cada dia de atraso na reparação dos defeitos existentes ou substituição da viatura e condenadas no pagamento à A. de uma indemnização pelos danos não patrimoniais.
A autora juntou vários documentos com a petição, relevando aqui, designadamente cópia do contrato de compra e venda celebrado entre a autora e a 1ª ré, sendo que a última parte desse contrato foi junto já em sede de julgamento pela autora dando cumprimento a uma determinação do tribunal a quo nesse sentido, conforme fls 1292 dos autos, consignando-se que a fls 1292 está junta cópia de parte desse contrato de compra e venda, mais concretamente as Condições Gerais a que ficou submetido esse contrato.
Acresce que na cláusula 3ª dessas Condições Gerais sob a epígrafe “ Prazo de Garantia e Conformidade” resulta que no nº1 dessa cláusula está estabelecido “ O veículo beneficia de garantia concedida pelo Vendedor nos termos e condições legalmente estipulados. E o nº2 dessa cláusula dispõe que o veículo dispõe ainda de garantia de marca da responsabilidade exclusiva do fabricante nos termos e condições consagrados no respectivo livro de garantias e manutenção da marca.
No que concerne à aqui recorrente, esta contestou invocando a caducidade do direito de denúncia e do direito de ação, em virtude de, até ao dia 04/12/2015, a A. não ter comunicado a existência de qualquer defeito à 1ª R. nem as deslocações ao concessionário G…, alegando ainda não fabricar nem representar diretamente o produtor das viaturas de marca D1… e que em 27/11/2014 não foram apontadas queixas referentes a perda de potência, desativação do motor ou imobilização do veículo, que a 1ª R. não verificou e da qual teve conhecimento apenas com o email do I. Mandatário da A.. Alegou ainda que interpelou a A. para poder avaliar a viatura, tendo esta, em 21/01/2016, apresentado o aviso “motor, procure serviço”, por obstrução do filtro de partículas, que foi desobstruído e feita atualização do software.
Feito o julgamento, com relevo para o objeto do recurso acima identificado, resultaram provados os seguintes factos:
A) A 1ª R. é concessionária oficial, no Porto, da 2ª R., sendo que esta é importadora dos produtos de marca D1… (veículos, peças e acessórios), que são posteriormente comercializados por uma rede de concessionários, de que a 1ª R. faz parte;
D) A actividade de manutenção e reparação dos produtos de marca D1… importados pela 2ª R. é levada a cabo por uma rede de reparadores autorizados, de que a 1ª R. e a G…, S.A. (doravante G…) fazem parte;
F) Em 23 de Outubro de 2014, e para uso exclusivo na sua actividade, a A. comprou à 1ª R. a viatura de marca D1…, modelo …, de matrícula .. – PE - .., pelo preço de €36.751,00, em estado de nova, nos termos constantes de fls. 12, 13 e 1292 dos autos e que se dão por integralmente reproduzidas;
G) A 2ª R. é representante em Portugal dos veículos da marca D1…;
H) A 1ª R., como vendedora, comprometeu-se a prestar todos os serviços de assistência inerentes à garantia do bom funcionamento do veículo – das peças, acessórios e demais componentes – durante o período de 2 anos a contar da data de celebração do contrato de compra e venda, nos termos constantes do certificado de garantia que acompanhou a viatura, quando esta foi entregue pela 1ª R. à A., junto a fls. 14 e 1292 dos autos, bem como do guia de garantia e manutenção da marca, junto a fls. 795 e ss. dos autos e que se dão por integralmente reproduzidas, assumida pela fabricante do veículo, representada em Portugal pela 2ª R.;
M) No dia 18/12/2014 a A. apresentou a viatura na 1ª R., com 1541 km, com os seguintes sintomas: desempenho do motor; perda de potência sempre, quando o motor está quente ou frio; o motor não pára automaticamente, tendo sido oferecidos um total de sete testes e executados 3 testes, nos termos constantes de fls. 42 verso a 63 do anexo aos autos e que se dão por integralmente reproduzidas;
N) Descontente com o diagnóstico da 1ª R., a A. decidiu apresentar a viatura no concessionário G… para análise do problema de falta de potência, que tinha como consequência a desactivação automática do motor e imobilização do veículo;
O) Por esse motivo, em 27/01/2015 deslocou-se a outro concessionário D…, a G…, onde a viatura permaneceu e apresentou, com 1857 km, os seguintes sintomas: desempenho do motor: perda de potência durante a aceleração, quando o motor está quente ou frio; o motor vai abaixo; indicador intermitente de aviso do motor aceso, nos termos constantes de fls. 64 a 134 do anexo aos autos e que se dão por integralmente reproduzidas;
P) Após análise daquela concessionária, foi verificada a existência de anomalias, nomeadamente a falta de potência que confirmavam o desligamento automático, quando forçado o motor – aceleração;
X) Foi a viatura sujeita a novas reparações na concessionária G… do Porto, nas seguintes datas: 29/06/2015, com 4676 km, por indicador de aviso de motor permanentemente aceso; 13/08/2015, com 6717 km, em virtude de injector adblue rachado e com fuga de líquido, massa vedante da tampa de distribuição com falhas, vedante da frente da cambota deformado e com fuga de óleo, sanados com a substituição dos componentes afectados; 08/09/2015, com 6849 km, por indicador de aviso de motor permanentemente aceso; 17/09/2015, com 6849 km, por indicador de aviso de motor permanentemente aceso e filtro de partículas diesel (DPF) totalmente obstruído, tendo sido substituído o filtro de partículas diesel; 06/10/2015, com 7052 km, por indicador de aviso de motor permanentemente aceso, com detecção de filtro de partículas obstruído e substituição do sensor do filtro de partículas; 03/11/2015, com 7420 km, por indicador de aviso de motor permanentemente aceso e avaria no sensor de temperatura de gases de escape (sensor de pressão no PDF), que foi substituído, obstruído pela presença de papel de limpeza dentro do depósito de combustível, que não foi desaparecendo a mencionada indicação; 20/11/2015, com 7735 km, por indicador de aviso de motor permanentemente aceso, nos termos constantes de fls. 16 dos autos e 152 verso a 361 do anexo aos autos e que se dão por integralmente reproduzidas;
Y) Em 04/12/2015 a A. remeteu à 1ª R. um email, que esta recebeu, no qual, além do mais, refere “Como é do V/conhecimento a viatura encontra-se neste momento e mais uma vez, imobilizada por motivos desconhecidos, que só podem derivar de defeitos de fabrico/avarias, que apesar das inúmeras intervenções a que foi sujeita pelos concessionários D1…, nunca obteve uma definitiva resolução. Acresce que a viatura ainda se encontra em prazo de garantia, nunca tendo sido sugerido como solução a sua substituição ou, acessoriamente, a cedência de uma viatura similar, com vista a minimizar os prejuízos sofridos pela C…/Constituinte, até que seja de uma vez resolvidos os vícios que afetam a sua normal utilização, caso sejam esses vícios passíveis de eliminação”, a que esta respondeu no mesmo dia, pedindo que aguardasse pela resposta da D1… e que “A ultima visita da viatura em questão à nossa oficina foi em Dezembro de 2014”, nos termos constantes de fls. 17 verso e 18 dos autos e que se dão por integralmente reproduzidas;
CC)A 1ª R. calibrou o módulo de controlo do motor, fez regeneração e procedeu à substituição do vaporizador de combustível;
DD) Assim que entregue à A., em 10/02/2016, e logo no mesmo dia, foi necessário regressar à oficina, pelos mesmos motivos e novamente com a luz amarela avisadora de “oficina”, nos termos constantes de fls. 25 dos autos e fls. 462 verso a 469 do anexo aos autos e que se dão por integralmente reproduzidas, apresentando a viatura, em 11/02/2016, 8638 km;
EE) Na semana seguinte, já no dia 16/02/2016, a 1ª R. entregou a viatura à A., que a devolveu pelos mesmos motivos, nos termos constantes de fls. 26 e 27 dos autos e que se dão por integralmente reproduzidas;
FF) Apesar dessas novas intervenções na oficina da 1ª R., não foram eliminados os defeitos/ problemas que afectam a viatura e impossibilitam a sua normal utilização;
Por sua vez o tribunal recorrido, na fundamentação da sentença, seguiu o entendimento de que do certificado de garantia e condições gerais do contrato de compra e venda celebrado entre a A. e a recorrente, constantes de fls. 13, 14 e 1292 resulta que esta concedeu àquela uma garantia de bom funcionamento de 2 anos, nos termos e condições legalmente estipulados. Em face do carácter profissional desta compra e venda, o tribunal a quo afastou o regime legal de compra e venda de um bem de consumo, previsto no Decreto-Lei nº 67/2003, de 08/04, entendendo ser aplicável à compra e venda dos autos o regime previsto no Código Civil.
Assim, de acordo com a fundamentação de direito da sentença recorrida[2], resulta que, por força do nº 3 do artigo 921º do C Civil tem a A. o prazo de 30 dias a contar do conhecimento do defeito para o denunciar ao vendedor.
E prosseguiu, concluindo que face à data das denúncias de defeitos indicados nos pontos L), M), O), U), W), X) BB), DD), EE) e PP) dos factos provados, que, com o recurso a um outro concessionário D1…, a A. optou pela garantia da D1… em detrimento da garantia do vendedor, ora 1ª R. e, assim, ultrapassou o prazo legal de 30 dias para denunciar os defeitos à 1ª R..( nesta parte o tribunal atentou que apesar de a Autora ter verificado o filtro de partículas obstruído o mais tardar em 29.06.2015, que originava a dita luz de motor acesa, apenas em 21.01.2016 o comunica à recorrente, com entrega da viatura na oficina desta, assinalando o tribunal a quo que esta garantia de venda concedida pela 1ª R. não pode ser invocada perante outro concessionário D1…, uma vez que tal não ficou contratualmente estipulado, razão pela qual não beneficia a A., perante a 1ª R., da contagem de um novo prazo de denúncia após cada intervenção realizada pela G….
E na decorrência dessas considerações o tribunal a quo concluiu pela caducidade do direito de denúncia dos defeitos por parte da A. perante a ora recorrente em virtude do contrato de compra e venda celebrado entre ambas.
No entanto, apesar da verificação desta caducidade, o tribunal a quo condenou a 1.ª Ré, ora recorrente, na reparação da viatura dos autos mas apenas no caso de para tal ser indicada pela Autora ou pela 2.ª Ré para o efeito, bem como no pagamento de uma sanção pecuniária compulsória no valor diário de €35,00 por cada dia de atraso na reparação, a iniciar após a autorização de reparação por parte da 2.ª Ré e ainda nas custas do processo na proporção de 1/3.
Quid Iuris?
Feita a exposição dos fatos apurados que relevam nesta parte, da argumentação da sentença recorrida e condenação que é objecto do presente recurso, à partida diríamos que a condenação da 1ª ré nos termos vertidos no dispositivo da sentença recorrida, contraria a procedência da exceção da caducidade, na medida em que esta determina a extinção a extinção ou perda de um direito ou de uma ação pelo decurso do tempo, ou ainda, pela verificação de uma circunstância que faz desencadear a extinção do direito.[3]
Todavia, como resulta do despacho proferido pelo tribunal a quo sobre a referida nulidade, o qual, acima foi reproduzido, o tribunal a quo, esclareceu que “ e como resulta bem explícito na sentença, a 1ª R., para além da responsabilidade contratual que lhe advém enquanto vendedora do veículo (única relativamente à qual foi invocada e apreciada a excepção de caducidade), tem também responsabilidade enquanto concessionária da 2ª R., tendo sido nessa qualidade condenada.”
Ora, esta pronúncia do tribunal a quo , revela que o Mmo Juiz de 1ª instância condenou a 1ª ré, na qualidade de concessionária da 2ª ré, e, por isso, não se verifica a alegada contradição que é imputada à sentença recorrida, sem prejuízo naturalmente, de na sede própria, este tribunal se pronunciar sobre um eventual erro de julgamento contido na condenação da 1ª ré, bem como, sobre a verificada condenação condicional da 1ª ré.
No que concerne à referida obscuridade da sentença por alegadamente não se conseguir discorrer qual a obrigação que para a recorrente decorreria da sentença, nomeadamente, se deveria a Ré suportar os custos da reparação - o que não se concede - caso assim lhe seja exigido pela Autora ou pela 2.ª Ré ou se tal reparação deverá ser feita nos mesmos termos da prestação dos serviços de reparação em garantia, obtendo da 2.ª Ré o reembolso do preço de peças e mão-de-obra, terminando a pedir a revogação dos pontos 2) e 4) do dispositivo e a condenação da recorrente em custas serem dela removidos, resulta manifesto que a sentença , não padece da alegada obscuridade, porquanto, o tribunal a quo responsabilizou a 1º ré nesta parte enquanto concessionária, sendo que resulta dos autos e é assinalado na motivação da sentença recorrida que resulta das condições gerais do contrato de compra e venda do veículo, cláusula 3ª nº 2, que o veículo beneficia de uma garantia de marca da responsabilidade exclusiva do fabricante nos termos e condições consagrados no respectivo guia de garantia e manutenção da marca, sendo que este, junto a fls. 795 e ss. dos autos, estabelece, na página 3, a ora 2ª R. como contacto da D… enquanto centro de relações com clientes, e estipula na página 7 a garantia normal como sendo garantia base D…, de acordo com a qual “Se alguma peça do veículo necessitar de uma reparação ou substituição no seguimento de um defeito de fabrico, a peça será reparada ou substituída de forma totalmente gratuita por qualquer concessionário autorizado”. Este livro esclarece ainda na página 11 que a garantia normal D… é garantia do fabricante, que complementa e não afecta os direitos do proprietário ao abrigo do contrato de compra e venda do veículo, celebrado com o concessionário D… vendedor, nem os direitos que lhe são conferidos pela legislação aplicável. Por outro lado, do contrato de concessionário celebrado entre as RR. nos presentes autos, junto a fls. 95 e ss., prevê no seu artigo 2º o dever do concessionário comunicar à 2ª R. quaisquer questões e queixas relevantes que não possam ser resolvidas por aquele; no artigo 6º nº 4 estipula que o concessionário prestará assistência em garantia e assistência gratuita a veículos D… trazidos por clientes ao concessionário, independentemente do local da área do EEE onde tenham sido originariamente vendidos, sendo a assistência gratuita definida como qualquer serviço sem custos apenas para o cliente final, de acordo com os termos de pagamento mutuamente acordados entre a D… e o concessionário; no artigo 17º fixa as condições de utilização dos nomes e marcas D…, o que evidencia a sua qualidade de representante desta marca em Portugal. O anexo 8, ponto 15, a fls. 261 dos autos prevê que a garantia dos produtos D1… será a periodicamente indicada por escrito pela D1… no manual de garantia que integra o contrato, ou por carta, não assumindo a D… quaisquer outras responsabilidades além das indicadas nos termos da garantia. Acrescentando que o benefício de todas as garantias da D1… para produtor D1… será transferido para os clientes finais de acordo com o manual de garantia. O apêndice 1.2.3 do contrato de reparador autorizado, a fls. 177 dos autos, prevê o equipamento electrónico de diagnóstico e reparação que deve estar operacional, sendo que o procedimento metodológico inclui a comunicação de dados à D… através do session feedback.(…)
Posto isto, resulta da sentença recorrida que a reparação que eventualmente fosse feita pela 1ª Ré, ora recorrente, na hipótese de ser confirmada a sentença nesta parte, deveria ser feita nos mesmos termos da prestação dos serviços de reparação em garantia, obtendo a 1ª ré da 2.ª Ré o reembolso do preço de peças e mão-de-obra.
Inexiste assim qualquer contradição entre os fundamentos e a decisão que determine a nulidade da sentença, sem prejuízo, como já assinalamos, de não ser confirmada a sentença recorrida nesta parte.
3.1.2.Da nulidade da sentença alegada pela 2ª Ré, em virtude da alegação da petição e da matéria de fato apurada não permitir a procedência do pedido de reparação fundado na celebração de um contrato onde a Apelante não foi parte, na medida em que, alega, o acervo factual é elucidativo de que a viatura não sofre de qualquer defeito de fabrico que as Rés se tenham furtado a corrigir, e em virtude da sua condenação ter por base a emissão de uma garantia que não foi alegada, pela Autora, como sendo a relação contratual que está na génese da formulação de tal pedido (ainda que a título subsidiário) contra a Ré D….
Nesta parte, como foi referido pelo tribunal a quo, a A. alega expressamente em sede de petição inicial que a 2ª R. prestou também garantia enquanto representante da fabricante do veículo (cfr. artigos 3º e 7º daquele articulado, para justificar a sua legitimidade passiva).
Resulta também que nesse articulado a autora juntou o certificado de garantia comprovativo da garantia de bom funcionamento prestado pela 2ª ré, enquanto represente da produtora do veículo adquirido por contrato de compra e venda à 1ª ré e até argumentou que esse certificado vincularia ambas as rés.
Mais, ao longo do processo a autora e a 2ª ré referiram-se à garantia ( de bom funcionamento prestada pelo fabricante) conforme, designadamente: requerimento da autora de 29.11.2016, artigo 79º da contestação da 2ª ré, no qual, esta afirma que a 1ª ré ao abrigo da garantia de bom funcionamento constante dos autos e referida na petição se obrigou a reparar e a substituir veículo e resposta às exceções apresentada a 23.06.2016, sendo que no artigo 70º a autora expressamente afirma que os direitos que pela presente acção pretende exercer estão estribados também na garantia oferecida pelo fabricante, de 2 anos após a venda.
E a fls 794 a 812, no cumprimento do despacho do tribunal a autora apresentou cópia integral da “ guia de garantia e manutenção, da qual faz parte o Certificado de Garantia.
Por último, não podemos deixar de assinalar que no despacho saneador proferido a 08.03.2017, o senhor juiz a quo afirma :
“Ora, da análise do articulado da petição inicial, verifica-se que a autora afirma que a ré é representante do fabricante em Portugal. Acresce que, mais afirmou, posteriormente, que no certificado de garantia a 2.ª ré consta como contacto do fabricante. Refira-se ainda que a 2.ª ré, no seu articulado, mais concretamente no artigo 19.º, afirma: “o produtor (única qualidade que, (…) pode ser atribuída à ré”. Não obstante a 2.ª ré afirmou também que não é “representante do fabricante” (v. artigo 82.º da contestação).”
Resulta assim do exposto, que a autora fundamentou a responsabilidade que imputa à 2ª Ré , enquanto representante do produtor , na garantia prestada pelo fabricante , pela qual, este assumiu a obrigação de reparar/ substituir o veículo, pelo prazo de 2 anos.
E como resulta da sentença recorrida o tribunal apreciou e decidiu a responsabilidade da 2ª Ré, enquanto representante do fabricante, com fundamento na garantia prestada pelo fabricante.
Pelo exposto, não padece a sentença recorrida da nulidade invocada.
3.2.DA DISCUSSÃO DA CAUSA RESULTARAM PROVADOS OS SEGUINTES FACTOS:
Factos assentes por acordo:
A) A 1ª R. é concessionária oficial, no Porto, da 2ª R., sendo que esta é importadora dos produtos de marca D1… (veículos, peças e acessórios), que são posteriormente comercializados por uma rede de concessionários, de que a 1ª R. faz parte;
B) A 2ª R. não interveio de qualquer forma no negócio de compra e venda celebrado entre A. e 1ª R.;
C) A A. remeteu à 2ª R., que recepcionou em 07/01/2016, carta registada com aviso de recepção, datada de 05/01/2016, da qual consta, além do mais, “Em seguimento às diversas interpelações efectuadas quanto aos diversos defeitos de fabrico que afetam a carrinha D1… de matrícula .. – PE - .., vimos mais uma vez apresentar reclamação pela impossibilidade de utilização do veículo pelos motivos já por V/Exas. conhecidos, que são causa de inúmeros prejuízos para a nossa empresa”, nos termos constantes de fls. 19 verso e 20 dos autos e que se dão por integralmente reproduzidas;
D) A actividade de manutenção e reparação dos produtos de marca D1… importados pela 2ª R. é levada a cabo por uma rede de reparadores autorizados, de que a 1ª R. e a G…, S.A. (doravante G…) fazem parte;
Factos demonstrados por produção de prova:
E) A A. é uma sociedade de ensino particular que se dedica a prestação de serviços de infantário, creche e jardim-de-infância;
F) Em 23 de Outubro de 2014, e para uso exclusivo na sua actividade, a A. comprou à 1ª R. a viatura de marca D1…, modelo …, de matrícula .. – PE - .., pelo preço de €36.751,00, em estado de nova, nos termos constantes de fls. 12, 13 e 1292 dos autos e que se dão por integralmente reproduzidas;
G) A 2ª R. é representante em Portugal dos veículos da marca D1…;
H) A 1ª R., como vendedora, comprometeu-se a prestar todos os serviços de assistência inerentes à garantia do bom funcionamento do veículo – das peças, acessórios e demais componentes – durante o período de 2 anos a contar da data de celebração do contrato de compra e venda, nos termos constantes do certificado de garantia que acompanhou a viatura, quando esta foi entregue pela 1ª R. à A., junto a fls. 14 e 1292 dos autos, bem como do guia de garantia e manutenção da marca, junto a fls. 795 e ss. dos autos e que se dão por integralmente reproduzidas, assumida pela fabricante do veículo, representada em Portugal pela 2ª R.;
I) Compete à 1ª R. prestar assistência técnica ao veículo que vendeu e, como concessionária, analisar as anomalias que lhe sejam reportadas, identificar os problemas e encontrar as soluções com vista à reparação, quando possível, comunicando à representante da fabricante o resultado, solicitando que seja accionada a garantia;
J) Após a concretização do referido negócio e entrega da viatura, a A. passou a utilizá-la na sua actividade profissional, nomeadamente no transporte diário de crianças;
K) No dia 15/10/2014 a viatura identificada em F), com 33 km, foi objecto de reparação junto da 1ª R., por apresentar os seguintes sintomas: “A ligar e carregar: Arranque: Motor não arranca: É accionado mas não arranca: Quando o motor está quente ou frio”, tendo sido executado teste de diagnóstico geral do sistema de arranque, detectado ponto de massa junto ao módulo de controlo do motor solto, que foi fixado, nos termos constantes de fls. 3 a 21 do historial de reparações anexo aos autos e que se dão por integralmente reproduzidas;
L) No dia 27/11/2014 a A. deslocou-se com a viatura identificada em F) às instalações da 1ª R., com 1232 km, com queixas de interruptor de escada que não funciona, ruído no motor e não aparecer km, tendo a viatura sido inspeccionada e apenas reconhecida uma anomalia no fecho da porta, que foi reparada, não tendo sido detectados outros problemas, nomeadamente “problemas com o motor”;
M) No dia 18/12/2014 a A. apresentou a viatura na 1ª R., com 1541 km, com os seguintes sintomas: desempenho do motor; perda de potência sempre, quando o motor está quente ou frio; o motor não pára automaticamente, tendo sido oferecidos um total de sete testes e executados 3 testes, nos termos constantes de fls. 42 verso a 63 do anexo aos autos e que se dão por integralmente reproduzidas;
N) Descontente com o diagnóstico da 1ª R., a A. decidiu apresentar a viatura no concessionário G… para análise do problema de falta de potência, que tinha como consequência a desactivação automática do motor e imobilização do veículo;
O) Por esse motivo, em 27/01/2015 deslocou-se a outro concessionário D1…, a G…, onde a viatura permaneceu e apresentou, com 1857 km, os seguintes sintomas: desempenho do motor: perda de potência durante a aceleração, quando o motor está quente ou frio; o motor vai abaixo; indicador intermitente de aviso do motor aceso, nos termos constantes de fls. 64 a 134 do anexo aos autos e que se dão por integralmente reproduzidas;
P) Após análise daquela concessionária, foi verificada a existência de anomalias, nomeadamente a falta de potência que confirmavam o desligamento automático, quando forçado o motor – aceleração;
Q) Nessa intervenção, a viatura foi submetida a reparação, com substituição do filtro de combustível e da válvula doseadora de combustível, por estar presa, tendo sido na sessão de 27/01/2015 apresentado como procedimento de reparação oferecido a bomba injectora de combustível, que não foi o procedimento de reparação executado, e que não resolveu o que afectava o normal uso da viatura;
R) Uma vez que a substituição do referido filtro não permitiu a eliminação daqueles sintomas, foram realizados mais testes a todos os circuitos de baixa e alta pressão;
S) Tendo surgido a suspeita de contaminação de combustível, o depósito foi desmontado, o que permitiu concluir que o fluxo se encontrava retirado aquando da montagem do veículo, obstruindo a normal admissão de combustível pelos injectores, pelo que foi submetida a nova reparação;
T) A G… procedeu à limpeza do depósito, testou o veículo e concluiu que o mesmo se encontrava em perfeitas condições de funcionamento;
U) Em 23/03/2015 a viatura foi novamente verificada, com 2906 km, tendo apresentado os seguintes sintomas: motor hesita/ dá sacudidelas/trepida/vibra e apresenta ruído, quando está quente ou frio, nos termos constantes de fls. 135 e 136 do anexo aos autos e que se dão por integralmente reproduzidas;
V) Embora o comportamento da viatura tivesse melhorado com essa intervenção, a verdade é que continuava a demonstrar falta de potência do motor, frequentemente acendendo no painel de instrumentos a luz indicadora de necessidade de verificação pela oficina;
W) Em 20/04/2015 a viatura foi verificada pela G…, com sintoma de motor engasgado e grila em andamento, tendo sido detectada falta de pressão na régua de injecção e bomba de alta pressão de combustível que não regulava a pressão de combustível, com substituição da bomba, o que fez o sintoma desaparecer;
X) Foi a viatura sujeita a novas reparações na concessionária G… do Porto, nas seguintes datas: 29/06/2015, com 4676 km, por indicador de aviso de motor permanentemente aceso; 13/08/2015, com 6717 km, em virtude de injector adblue rachado e com fuga de líquido, massa vedante da tampa de distribuição com falhas, vedante da frente da cambota deformado e com fuga de óleo, sanados com a substituição dos componentes afectados; 08/09/2015, com 6849 km, por indicador de aviso de motor permanentemente aceso; 17/09/2015, com 6849 km, por indicador de aviso de motor permanentemente aceso e filtro de partículas diesel (DPF) totalmente obstruído, tendo sido substituído o filtro de partículas diesel; 06/10/2015, com 7052 km, por indicador de aviso de motor permanentemente aceso, com detecção de filtro de partículas obstruído e substituição do sensor do filtro de partículas; 03/11/2015, com 7420 km, por indicador de aviso de motor permanentemente aceso e avaria no sensor de temperatura de gases de escape (sensor de pressão no PDF), que foi substituído, obstruído pela presença de papel de limpeza dentro do depósito de combustível, que não foi desaparecendo a mencionada indicação; 20/11/2015, com 7735 km, por indicador de aviso de motor permanentemente aceso, nos termos constantes de fls. 16 dos autos e 152 verso a 361 do anexo aos autos e que se dão por integralmente reproduzidas;
Y) Em 04/12/2015 a A. remeteu à 1ª R. um email, que esta recebeu, no qual, além do mais, refere “Como é do V/conhecimento a viatura encontra-se neste momento e mais uma vez, imobilizada por motivos desconhecidos, que só podem derivar de defeitos de fabrico/avarias, que apesar das inúmeras intervenções a que foi sujeita pelos concessionários D1…, nunca obteve uma definitiva resolução. Acresce que a viatura ainda se encontra em prazo de garantia, nunca tendo sido sugerido como solução a sua substituição ou, acessoriamente, a cedência de uma viatura similar, com vista a minimizar os prejuízos sofridos pela M/Constituinte, até que seja de uma vez resolvidos os vícios que afetam a sua normal utilização, caso sejam esses vícios passíveis de eliminação”, a que esta respondeu no mesmo dia, pedindo que aguardasse pela resposta da D1… e que “A ultima visita da viatura em questão à nossa oficina foi em Dezembro de 2014”, nos termos constantes de fls. 17 verso e 18 dos autos e que se dão por integralmente reproduzidas;
Z) Volvido um mês desde essa interpelação e porque nenhuma resposta obteve, a A. remeteu à 1ª R., que recepcionou em 07/01/2016, carta registada com aviso de recepção, datada de 05/01/2016, da qual consta, além do mais, “Em seguimento às diversas interpelações efectuadas quanto aos diversos defeitos de fabrico que afetam a carrinha D1… de matrícula .. – PE - .., vimos mais uma vez apresentar reclamação pela impossibilidade de utilização do veículo pelos motivos já por V/Exas. conhecidos, que são causa de inúmeros prejuízos para a nossa empresa”, nos termos constantes de fls. 18 verso e 19 dos autos e que se dão por integralmente reproduzidas;
AA)A A. remeteu ainda à 2ª R. carta registada com aviso de recepção, datada de 05/01/2016, que esta recepcionou em 07/01/2016, da qual consta, além do mais, “Em seguimento às diversas interpelações efectuadas quanto aos diversos defeitos de fabrico que afetam a carrinha D1… de matrícula .. – PE - .., vimos mais uma vez apresentar reclamação pela impossibilidade de utilização do veículo pelos motivos já por V/Exas. conhecidos, que são causa de inúmeros prejuízos para a nossa empresa”, nos termos constantes de fls. 19 verso e 20 dos autos e que se dão por integralmente reproduzidas;
BB)Em consequência, e a pedido da 1ª R., em 21/01/2016 a A. entregou nos seus serviços a viatura, com 8603 km, para que, mais uma vez, fosse submetida a testes e eventual intervenção técnica, com nota de avaria de filtro de partículas obstruído e sintoma de indicador de aviso de motor permanentemente aceso: “motor, procure serviço”, nos termos constantes de fls. 24 e 1117 dos autos e 419 verso a 462 do anexo aos autos e que se dão por integralmente reproduzidas;
CC)A 1ª R. calibrou o módulo de controlo do motor, fez regeneração e procedeu à substituição do vaporizador de combustível;
DD)Assim que entregue à A., em 10/02/2016, e logo no mesmo dia, foi necessário regressar à oficina, pelos mesmos motivos e novamente com a luz amarela avisadora de “oficina”, nos termos constantes de fls. 25 dos autos e fls. 462 verso a 469 do anexo aos autos e que se dão por integralmente reproduzidas, apresentando a viatura, em 11/02/2016, 8638 km;
EE) Na semana seguinte, já no dia 16/02/2016, a 1ª R. entregou a viatura à A., que a devolveu pelos mesmos motivos, nos termos constantes de fls. 26 e 27 dos autos e que se dão por integralmente reproduzidas;
FF)Apesar dessas novas intervenções na oficina da 1ª R., não foram eliminados os defeitos/ problemas que afectam a viatura e impossibilitam a sua normal utilização;
GG)As intervenções efectuadas na viatura identificada em F) e o seu estado acarretou prejuízos à A., pois depende do uso de uma viatura com aquelas características para efectuar o transporte diário de crianças, educadoras de infância e auxiliares da acção educativa entre os estabelecimentos de ensino;
HH) Tendo sido mesmo forçada a cancelar a realização de eventos extracurriculares e outras actividades que se realizam fora do espaço detido pela A., por não ter como efectuar o transporte; II) O que afectou negativamente a imagem da A. como prestadora de serviços, perante os encarregados de educação e o público em geral, com pelo menos uma situação em que, durante o trajecto efectuado da praia para as instalações da A., a viatura veio a ficar imobilizada, sendo necessário efectuar o “transbordo” das crianças e funcionários, em plena via pública e com os riscos inerentes, censurado pelos pais;
JJ) Até ao dia 04/12/2015 a A. não comunicou à 1ª R. as variadas deslocações ao concessionário G…;
KK)A 1ª R. é concessionária da 2ª R., procedendo à importação de viaturas novas que, por meio de contrato de concessão com esta celebrado, vende aos seus clientes, como foi o caso da viatura identificada em F);
LL) A 1ª R. não fabrica nem representa directamente o produtor das viaturas de marca D1…;
MM)A 1ª R. procedeu à substituição do interruptor do degrau lateral e efectuou diagnóstico electrónico, não tendo detectado nenhuma anomalia;
NN)Foi entregue à A. um documento intitulado Manual do Proprietário, do qual constam todas as instruções necessárias para o seu bom funcionamento;
OO)A G… recorreu a um analisador de dados que permitiu detectar o acumular de fuligem, a qual desaparecia assim que era efectuado um ciclo de regeneração completa;
PP)Após a propositura da presente acção, a viatura identificada em F) foi apresentada junto da 1ª R. nas seguintes datas: 07/06/2016, com 8865 km, por indicador de aviso de motor permanentemente aceso e filtro de partículas obstruído; 29/06/2016, com 9677 km, por indicador de aviso de motor permanentemente aceso e indicação de que não desenvolve; 13/09/2016, com 11421 km, por indicador de aviso de motor permanentemente aceso e indicação de que não desenvolve, tendo sido substituídas juntas, junta de vedação, anilha vedante e válvula-recirculação de gases de escape; 20/09/2016, para fazer regenerações, medir cablagens e seguir procedimentos; 27/09/2017, com 11598 km, por indicador de aviso de motor permanentemente aceso e filtro de partículas obstruído; 03/10/2016, por indicador de aviso de motor permanentemente aceso;
19/01/2017, com 15179 km, por indicador de aviso permanentemente aceso, sinal sonoro de nível baixo de adblue, tendo sido verificado o módulo de controlo de carroçaria;
QQ) Em 20/03/2017 a viatura identificada em F) foi apresentada junto da 1ª R. em virtude de não pegar, tendo sido detectado falta de adblue e cujo custo foi suportado pela A.;
RR)As intervenções técnicas/mecânicas efectuadas na viatura desde o momento da compra encontram-se registados no historial de reparações do veículo, pois quando esta é submetida ao diagnóstico electrónico, fica automaticamente registado;
SS)Esse historial está integrado numa base de dados partilhada on-line, acessível a todos os concessionários, bastando que estes insiram os dados do veículo para que tenham o total acesso a esse histórico;
TT) As intervenções indicadas de K) a M), O), U), W), BB), CC) e QQ) sempre foram prestadas gratuitamente à A., ao abrigo da garantia do fabricante, autorizadas e pagas pela 2ª R. à 1ª R.;
UU)No dia 14/03/2018 a viatura identificada em F) apresentava 21.774 km, com obstrução do filtro de partículas;
VV)Em 05/09/2017 o veículo apresentava 19131 km e, no dia 08/11/2017 21006 km, realizando poucos quilómetros por dia com velocidades máximas de aproximadamente 60 km/hora;
WW)A circulação do veículo em modo de emergência provoca maior saturação do filtro de partículas e deve ser temporária, pois a contínua utilização do veículo com esta mensagem poderá levar a danos noutros componentes ou mesmo risco de incêndio;
XX)O modelo da viatura identificada em F) não possui um aviso de necessidade de realizar um ciclo de regeneração ; a regeneração na viatura é automática/activa e é realizada sempre que existem partículas em excesso no filtro de partículas; no entanto, só pode ser executada quando o veículo circula a mais de 70 km/hora num período mínimo de 20 minutos; quando a regeneração não é executada, o filtro de partículas vai ficando cada vez mais congestionado, até ficar obstruído; nesse momento, a viatura entra em modo de segurança;
YY)O veículo identificado em F), em circuito citadino, não realiza regeneração do filtro de partículas;
ZZ) A obstrução do filtro de partículas detectada em 14/03/2018 poderá ser atribuída à falta de regeneração do equipamento, provocada pelo facto da viatura realizar poucos quilómetros por dia, com velocidades máximas de aproximadamente 60 km/hora;
AAA) O filtro de partículas diesel do veículo necessita de uma regeneração periódica, de modo a manter o seu funcionamento correcto;
BBB) Em princípio, o veículo executará este processo de forma automática, no entanto, depende do veículo (estado mecânico, modelo) e modo de condução;
CCC) No dia 29/01/2019, quando o veículo identificado em F) apresentava 23208 km, o perito nomeado nos autos procedeu à inspecção visual do filtro de partículas, regeneração estática do filtro de partículas e regeneração dinâmica do filtro de partículas (prova de estrada), tendo concluído que o filtro de partículas não apresenta indícios de danificação ou manipulação e que os seus componentes e respectivos elementos de ligação ao veículo apresentam a sua configuração original;
DDD) No dia indicado em DDD) o veículo encontrava-se com o filtro de partículas obstruído e em modo de segurança (potência limitada forçada SAFEMODE) com uma percentagem de “DPF_LOAD” acima dos 350%, tendo realizado regeneração estática que demorou aproximadamente 30 minutos, após o que o filtro de partículas ficou parcialmente desobstruído com uma percentagem de “DPF_LOAD” de 113%;
EEE)No decorrer da regeneração estática identificada em FFF), ocorreu uma fuga de combustão na área do motor, especificamente no colector de escape;
FFF) A prova de estrada indicada em DDD) foi realizada na auto-estrada A.. e teve uma duração de 35 minutos, ao longo da qual a percentagem de “DPF_LOAD” foi progressivamente diminuindo, apresentando, no final, 14%, com a viatura com 23263 km;
GGG) O perito foi contactado no dia 30/01/2019 com a informação que o veículo, com 23338 km, ficou com o filtro de partículas obstruído e em modo de segurança, situação que o perito concluiu da seguinte forma: “pode ser considerada irregular e demonstra que o veículo inspeccionado não consegue realizar trajetos curtos sem sofrer uma obstrução completa do filtro de partículas. Esta obstrução impede consequentemente uma circulação livre e normal do veículo contribuindo para o desgaste e deterioração de diversos componentes do circuito de exaustão. Refere-se que quando o automóvel obtém este nível de obstrução é necessário realizar novamente uma regeneração estática seguido de uma regeneração dinâmica. Esta situação implica tempo e custos acrescidos ao utilizador do veículo”.
Da discussão da causa não resultaram provados os seguintes factos:
1) Logo desde o primeiro momento, esta comunicou à 1ª R. que o desempenho da viatura não era normal para uma viatura dotada de um motor com a anunciada cilindrada e potência;
2) O indicado em K) dos factos provados foi sempre tentado justificar pela 1ª R. com o facto de ser um novo modelo e o motor ainda se encontrar em fase de rodagem;
3) Inconformada com a permanente falta de potência, a A. foi insistindo com os serviços da 1ª R. de que algo não poderia estar bem;
4) No dia 27/11/2014 a A. dirigiu-se às instalações da 1ª R., reclamando falta de potência do veículo dos autos;
5) Em BB) dos factos provados a 1ª R. apenas reprogramou a “centralina eletrónica”, de forma a desligar a luz amarela avisadora de “oficina”;
6) Desde 16/02/2016, a A. vê-se totalmente privada do uso desta viatura;
7) O que a 1ª R. sempre teve conhecimento e nunca apresentou qualquer solução para minimizar os prejuízos causados pela falta de qualidade da viatura que vendera;
8) A A., no momento em formulou a sua vontade de adquirir o novo modelo … da D…, acreditou que a viatura teria as qualidades de fabrico e as prestações de utilização que lhe foram asseguradas pela 1ª R., acrescido da confiança que merece uma marca conhecida como a que a 2ª R. representa;
9) Até ao dia 04/12/2015, a A. não comunicou a existência de qualquer defeito à 1ª R.; 10)A 1ª R. nunca verificou quaisquer queixas respeitantes a perdas de potência,desactivação do motor ou imobilização do veículo; - ponto L) provado
11)Até ao email identificado em Y) dos factos provados, a 1ª R. não teve qualquer notícia da A.;
12)Com a substituição do vaporizador de combustível, a viatura ficou em perfeitas condições de circular, ficando definitivamente reparada;
13)No dia 28.01.2015 a viatura identificada em F) dos factos provados deu entrada nas instalações da 1ª R.;
14)O manual entregue à A. e indicado em OO) dos factos provados corresponde ao manual junto a fls. 706 a 751 dos autos e que se dão por integralmente reproduzidas, do qual consta “Regeneração (…) O filtro de partículas Diesel do veículo necessita de uma regeneração periódica, de modo a manter o funcionamento correcto. O veículo executará este processo de forma automática. Se as suas deslocações satisfizerem uma das seguintes condições: · Apenas percorre distâncias curtas. · Liga e desliga a ignição com frequência. · As suas viagens incluem um elevado número de acelerações e desacelerações. É necessário realizar viagens ocasionais com as seguintes condições para ajudar ao processo de regeneração: Conduza o veículo em condições mais favoráveis, as quais poderão verificar-se a velocidades mais elevadas do veículo em condução normal, numa estrada principal ou em auto-estrada, durante 20 minutos, no mínimo. Este percurso poderá incluir breves paragens que não afectem o processo de regeneração. · Evite uma velocidade de ralenti prolongado e respeite sempre os limites de velocidade e as condições do piso. · Não desligue a ignição. · Seleccione uma mudança adequada para manter a velocidade de rotação do motor entre as 1500 e as 3000 RPM, de preferência”;
15)O Manual do Proprietário indicado em OO) dos factos provados foi entregue à A. aquando da entrega da viatura;
16)Com a viatura identificada em F) a A. apenas percorre distâncias curtas; liga e desliga a ignição com frequência e tem um elevado número de acelerações e desacelerações;
17)Os sintomas apresentados pela viatura apenas poderão ficar a dever-se aos reduzidos trajectos realizados pela A. no exercício da sua actividade e à circunstância de não terem sido realizadas viagens ocasionais com as condições indicadas e consequente não realização de regenerações periódicas;
18)No dia 20/04/2015 a indicação dada pela A. foi de falha do motor em andamento; 19)Com a substituição do filtro de partículas diesel ocorrida na reparação de 17/09/2015,a viatura passou a funcionar de modo totalmente normal;
20)Na sequência da entrega do veículo no dia 21/01/2016 a 1ª R. não concluiu pela existência de qualquer defeito no veículo dos autos;
21)A 2ª R. respondeu à A. por carta datada de 19/02/2016;
22)As características asseguradas pela 1ª R. quando fez a proposta negocial à A. não se enquadravam no que esta tinha como legítima expectativa;
23)Nunca foram dadas à A. recomendações ou especiais indicações quanto ao uso do veículo.
Consigna-se que não se respondeu ao demais alegado pelas partes por se revelar conclusivo ou irrelevante para a decisão da causa.
Consigna-se que os pontos K), M), U), X), DD), EE), PP), QQ) e UU) a GGG) foram incluídos na matéria de facto provada por terem resultado da prova produzida no processo, e ao abrigo do disposto no artigo 5º nº 2 alíneas a) e b) do CPC.
3.3. DO RECURSO DA MATÉRIA DE FACTO
No recurso de apelação interposto a 2ª Ré-recorrente impugna a al GGG) dos fatos provados e ainda os pontos 16 e 17 dos fatos não provados.
No que concerne à al. GGG) a apelante convoca a reapreciação dos esclarecimentos prestados pelo senhor perito e o depoimento da testemunha E… e pede que essa al GGG) passe a ter a seguinte redacção:
“GGG) O perito foi contactado no dia 30/01/2019 com a informação que o veículo, com 23338 km, ficou com o filtro de partículas obstruído e em modo de segurança. O perito constatou que o filtro de partículas não padece de qualquer defeito e a situação descrita é assacada, pelo perito, ao tipo de condução que é feita pela Autora e ao uso que a mesma faz da viatura (a saber: trajetos curtos e citadinos) que impedem que a regeneração automática de partículas”.
Mais impugna o ponto 16 dos fatos não provados, convocando a reapreciação do relatório pericial e os depoimentos das testemunhas E… e F….
Por último, impugna o ponto 17 dos fatos não provados, convocando a reapreciação de determinados segmentos dos depoimentos das testemunhas E… e F…, concluindo que deve ser dado como provado o seguinte fato:
“Os sintomas apresentados pela viatura apenas poderão ficar a dever-se aos reduzidos trajectos realizados pela A. no exercício da sua actividade e à circunstância de não terem sido realizadas viagens ocasionais com as condições indicadas e consequente não realização de regenerações periódicas.”
Em virtude do recurso sobre a decisão da questão-de.facto observar os requisitos legalmente exigidos no artigo 640º do CPC passamos a apreciar e a decidir este segmento do recurso de apelação da 2ª Ré, importando desde já tecer algumas considerações relevantes relativamente ao filtro de partículas Diesel, as quais, foram por nós retiradas do sítio https://www.acp.pt/automovel/ .
“Em 2009, a norma Euro 5 tornou obrigatória a introdução de filtros de partículas nos escapes dos carros a gasóleo. No entanto, em antecipação a esta tendência, muitos fabricantes já tinham adotado este filtro nos seus automóveis. Para os carros a gasolina, esta regra data de 2017.
A função do filtro de partículas é a retenção de resíduos nocivos no seu interior, de modo a impedir o seu lançamento para a atmosfera. Em boas condições, um filtro de partículas permite reter até 80% de elementos nocivos para o ambiente.
Posteriormente, o andamento do seu veículo incinera esses resíduos. No entanto, para chegar a essas temperaturas (cerca de 300°C), o carro tem de rolar a velocidades mais altas para impedir que o filtro funcione (nos carros a gasolina é mais fácil atingir estas temperaturas).
Basta conduzir durante alguns minutos a uma velocidade superior a 70 km/h e acima das 2500 rotações/minuto para efetuar a chamada regeneração passiva do filtro de partículas.
Se apenas faz trajetos curtos, sem “esticar” o carro, é natural que a fuligem se acumule no filtro de partículas. Nesse caso, podem surgir problemas.
A Regeneração ativa acontece sobretudo em carros com sistema "start and stop". Já lhe aconteceu estar no “para-arranca” e o carro não se desligar? E, pelo contrário, parecer que o ralenti se eleva? Significa que o filtro chegou a cerca de 50% da sua capacidade.
O que acontece é que o próprio motor eleva a temperatura dos gases do escape para queimar essas impurezas, num processo denominado regeneração ativa. É como se o carro lhe estivesse a pedir para o “soltar” na autoestrada mais próxima.
Aproveite e saia da cidade com a família. Ou conceda a si e aos seus uma “escapadinha”, ao mesmo tempo que aproveita para regenerar o filtro de partículas.
Quando as luzes acendem, pode não ser bom sinal!
Se continuar na rotina da cidade, dos engarrafamentos, usando e abusando do "start and stop", a fuligem no filtro de partículas atinge os 75%. E este valor já implica uma ida à oficina.
A manutenção (limpeza) do filtro de partículas deve ser feita a cada cem mil quilómetros e normalmente pode custar-lhe entre 100€ e 150€. Se ignorar estes avisos nada de bom pode vir daí. Pode muito bem vir a ter que substituir o filtro de partículas. Um novo pode começar nos 1500€. E não pode circular sem ele.”
E da consulta de outros artigos da especialidade disponíveis online retiramos que o FPD está concebido para eliminar as partículas de fuligem dos gases de escape, e está localizado no sistema de escape. É uma tecnologia mais recente que a tecnologia EGR, e passou a ser obrigatório a partir de 2010, para cumprir as normas anti-poluição Euro 5.
Ao contrário de um catalisador em que os gases passam por canais abertos nos monólitos cerâmicos ou metálicos, no filtro de partículas isso não acontece. A finalidade destes filtros é prender a fuligem e a seguir eliminá-la, incinerando-as a altas temperaturas.
Como qualquer filtro, estes sistemas também precisam de ser limpos regularmente, de forma a poderem manter a sua função. O processo de regeneração é periódico, despoletado após a fuligem acumulada atingir um certo nível. É possível eliminar, durante este processo, até 85% da fuligem e em algumas situações quase 100%.
Causas e consequências
A forma de fazer esta regeneração do filtro, varia consoante a tecnologia usada pelos fabricantes automóveis, no entanto pressupõem sempre uma determinada temperatura do motor e gases de escape (entre 650 e 1000 ºC) e um certo período de tempo. Pelo que a forma como usamos o carro determina e muito a saúde e longevidade deste componente.
O problema é que este filtro de partículas pode obstruir, afetando o funcionamento do motor.
Nem todas as partículas produzidas são carvão. O enxofre presente no gasóleo e as pequenas quantidades de metais que se utilizam em compostos lubrificantes geram cinzas capazes de resistir mais de 1000 graus que vão obstruindo o filtro de forma progressiva.
Existe ainda o problema da regeneração ativa falida. Acontece quando se realizam percursos muito curtos e o motor não tem tempo de perpetuar a regeneração ativa. Se forem interrompidos vários ciclos consecutivos de regeneração, a quantidade de carvão vai crescer até um ponto crítico e um testemunho (luz) na instrumentação vai informar o condutor de que deve conduzir e acelerar de forma a forçar a regeneração do filtro. Se ignorar o aviso, o filtro vai entupir.”
E como se retira do sítio https://www.circulaseguro.pt/conducao-eficiente/filtro-de-particulas-o-que-fazer-quando-falha:
“Como prevenir este problema
Se se acumula uma quantidade excessiva de carvão, este pode compactar-se e não se queimar por muito que o filtro de partículas aqueça. Em princípio, a regeneração ativa deverá impedir este problema. O condutor pode interromper essa regeneração muito facilmente e de forma acidental: basta desligar o motor. Para além disso, como a regeneração ativa aumenta o consumo de combustível até 20% no caso de se realizarem apenas percursos urbanos.
Mais vale prevenir… para regenerar passivamente o filtro, basta conduzir a mais de 60 km/h em quinta ou em quarta relações durante pelo menos 15 minutos. O ideal seria realizar um destes trajetos a cada 200 km. Em qualquer caso, se acender o testemunho superior, é imperativo realizar um percurso em autoestrada. Senão, o filtro corre o risco de se obstruir. Dependendo dos quilómetros realizados, a luz de avaria do motor pode acender-se, obrigando a passar por uma oficina para que seja apagada.
O problema é que o próprio carvão deixa resíduos atrás de si. Uma vez que se acumule um pouco de cinza nalgum ponto do canal, este fica obstruído para sempre. Por isso, um filtro de partículas deveria durar legalmente pelo menos 160 mil km, mas é normal que comece a dar problemas aos 120 mil km ou aos 80 mil km no caso do veículo realizar apenas trajetos urbanos.”

E por forma a avaliar a pretensão da recorrente procedemos à reapreciação do relatório pericial de fls 1173 e seguintes a fls 1184 e esclarecimentos escritos prestados por escrito a fls 1235 a 1241, a fls 1256 a 1259, e fls 1271 a 1275 no 5º volume, bem como, procedemos à reapreciação dos esclarecimentos orais prestados pelo Perito H… na sessão de julgamento de 11 de abril de 2019 e ainda reapreciamos o depoimento integral da testemunha E…, licenciado em gestão de empresas, funcionário da 2ª Ré desde 2005, desempenhando funções desde 2014 no departamento de Garantias, Departamento Técnico e Relação com Clientes, referindo conhecer a autora e ainda a 1ª ré, que depôs nas sessões de julgamento de 21-11-2017 e 11-04-2019 e reapreciamos o depoimento da testemunha F…, engenheiro mecânico de transportes, funcionário da sociedade G… Porto SA, concessionária da 2ª Ré, desde Abril de 2006, testemunha que depôs no dia 15.12.2017 e que, além do mais, circulou no veículo dos autos com um equipamento de diagnóstico para analisar os parâmetros relacionados com o filtro de partículas que iam sendo exibidos no painel.
E feita essa reapreciação, observamos que as transcrições feitas nas alegações de recurso e nas contra-alegações correspondem àquilo que em parte foi referido quer pelo senhor perito em sede de esclarecimentos orais em julgamento, quer pelas testemunhas convocadas.
Relativamente à al. GGG) dos fatos apurados importa assinalar o seu conteúdo que a seguir se reproduz:
GGG)O perito foi contactado no dia 30/01/2019 com a informação que o veículo, com 23338 km, ficou com o filtro de partículas obstruído e em modo de segurança, situação que o perito concluiu da seguinte forma: “pode ser considerada irregular e demonstra que o veículo inspeccionado não consegue realizar trajetos curtos sem sofrer uma obstrução completa do filtro de partículas. Esta obstrução impede consequentemente uma circulação livre e normal do veículo contribuindo para o desgaste e deterioração de diversos componentes do circuito de exaustão. Refere-se que quando o automóvel obtém este nível de obstrução é necessário realizar novamente uma regeneração estática seguido de uma regeneração dinâmica. Esta situação implica tempo e custos acrescidos ao utilizador do veículo”.
Da análise desta alínea resulta que o tribunal recorrido verteu na mesma o último parágrafo dos últimos esclarecimentos escritos ( 07.08.2018) prestados pelo senhor perito a fls 1273 a 1275 dos autos, perícia que foi iniciada no dia 14 de Março de 2018 ao veículo dos autos de matrícula .. – PE - .. e cujo objectivo foi avaliar o estado actual desse veículo, verificar componentes mecânicos através de um diagnóstico geral do veículo e averiguar o tacógrafo e respectiva leitura, veículo que se encontrava nesse dia imobilizado no Colégio I… sito na Rua … no Porto- ver fls 1173 e ss dos autos, fls 1235 a 1241, fls 1256 e ss e 1271 a 1275.
E da análise desse relatório conjugada com os esclarecimentos escritos prestados nos autos e com os esclarecimentos orais prestados pelo senhor perito em julgamento, os quais, foram por nós ouvidos na totalidade, resulta no essencial o seguinte:
no dia 14.03.2018 o veículo tinha percorrido 21.774 KM/h
no dia 14.03.2018 o veículo apresentava o DPF ( filtro de partículas ) obstruído.
da análise das leituras do tacógrafo digital resulta que desde o dia 08.11.2017 até ao dia 8.11.2011 ( 64 dias ) o veículo percorreu 29,296875‬ quilómetros diários.
que neste tipo de veículo ( mini bus a gasóleo) é recomendado que o condutor circule na auto-estrada a velocidades superiores a 70 Km/h a 2500rpm durante um espaço de tempo a ser determinado pelos sensores existentes no veículo, ou seja, quando termine a regeneração o veículo deixará de transmitor mensagens ou avidos de filtro obstruído..
A circulação do veículo em modo de emergência ( safe-modo) isto é com condução limitada provoca maior daturação do filtro de partículas ( FPD), sendo que a circulação em safe mode deve ser temporária sob pena de levar a outros danos noutros componentes do veículo ou mesmo risco de incêndio.
A partir de cerca de 45% da capacidade do PDF será promovida a regeneração.
A regeneração do veículo dos autos é automática/ativa sempre que existem partículas em excesso no filtro de partículas, no entanto, só pode ser executada quando o veículo circula a mais de 70Km7h num período mínimo de 20 minutos.
Não é possível estimar a média de quilómetros percorridos paera promover o ciclo de regeneração porque depende do percurso e da dinâmica da condução.
Em circuito citadino por norma não se excede velocidades superiores a 70 KM/H e rotações acima das 2500rpm e deste modo a regeneração não se pode iniciar.
Num cenário de elevado número ede acelerações e desacelerações ( para –arranca) ligar e desligar ignição, velocidades baixas e trajectos curtos a saturação do Filtro de partículas aumenta rapidamente e num cenário com trajectos prolongados, rotação elevada e velocidades altas a saturação do Filtro de partículas progride forma mais lenta e controlada.
.As condições adequadas para promover o ciclo de regeneração será realizar uma condução acima dos 70 KM/h a 2500rpm numa auto estrada durante um período de tempo a ser estimado e conrolado por sensores a viatura, sendo que o sr perito a fls 1238 que o veículo dos autos não possui um aviso de necessidade de realizar um ciclo de regeneração.
Por norma o filtro de partículas deve estar a mais de 45% obstruído paea promover o ciclo de regeneração.
O início do ciclo de regeneração depende de vários factores, tais como, temperatura exterior, temperatura do motor e temperatura do filtro de partículas.
O processo de activação do modo de emergência “safe mode” pode ser influenciado por uma condução a velocidade
Resulta também do relatório pericial , a fls 1274 a 1275, que no dia 29.01.2019, na oficina G… SA o veículo dos autos foi inspeccionado, tendo sido feita inspecção visual ao filtro de partículas, regeneração estática do filtro de partículas e regeneração dinâmica do filtro de partículas ( prova de estrada).
E dessas diligências resultou que o filtro de partículas não apresentava indícios de viciação ou manipulação e que os componentes que constituem o filtro de partículas e respectivos elementos de ligação ao veícuo apresentavam a sua configuração original.
A pedido do Sr. Perito foi pedido que a autora após essas diligências informasse quando o filtro de partículas ficasse novamente obstruído e o modo de segurança ficasse activado ( potência limitada).
No dia seguinte, 30.01.2019, a autora contactou o sr perito e informou, o que foi confirmado pelo envio de fotografia da quilometragem e do apinel de controlo do veículo, que o veículo com 23.338 KM/H tinha ficado novamente com o filtro de partículas obstruído e em modo de segurança. Assim, o Sr. perito afirmou que após 75 KM percorridos em cidade o filtro de partículas do veículo dos autos ficou novamente obstruído (DPF LOAD acima dos 350% e consequentemente em modo de segurança.
.Em resultado dessa informação o Sr. perito que elaborou o relatório pericial afirmou:” Esta situação ode ser considerada irregular e demonstra que o veículo inspeccionado não consegue realizar trajetos curtos sem sofrer uma obstrução completa do filtro de partículas. Esta obstrução impede consequentemente uma circulação livre e normal do veículo contribuindo para o desgaste e deterioração de diversos componentes do circuito de exaustão. Refere-se que quando o automóvel obtém este nível de obstrução é necessário realizar novamente uma regeneração estática seguido de uma regeneração dinâmica. Esta situação implica tempo e custos acrescidos ao utilizador do veículo”.
Assim, verificamos que a redacção dada à al. GGG) que foi impugnada corporiza afinal aquilo que o senhor perito afirmou acerca da situação que verificou.
Acresce ainda que nos esclarecimentos orais prestados em julgamento o sr perito referiu que de acordo com os profissionais da D1… a entrada em “ safe mode” tem como causa habitual o congestionamento do veículo acima dos 300 e exige uma regeneração estática seguida de um regeneração dinâmica ou de estrada, referindo ainda no início dos esclarecimentos orais que neste motor deste ano e deste veículo o FPD (filtro de partículas) congestiona rapidamente e que o veículo não é adequado para fazer trajeto de cidade e que por isso a solução é complementar o trajeto de cidade com percurso de estrada durante 75 KM a uma velocidade de 50/60 KM/h, acrescentando ainda que é habitual neste tipo de veículo ocorrer saturação do FPD após percurso de 75 Km, obrigando a uma regeneração estática seguida de uma regeneração de estrada, e nesta parte, conforme decorre dos esclarecimentos prestados, esta situação não é normal noutros veículos a gasóleo.
De seguida, referiu ainda que em termos rigorosos, de acordo com os parâmetros de engenharia, a forma mais correcta de abordar o problema apresentado por este veículo é afirmar que existe “ uma irregularidade”.
Todavia, analisado de forma rigorosa o relatório e os esclarecimentos do perito não se trata de um defeito do FPD em si, isto é, o problema evidenciado durante a condução deste veículo não reside no FPD em si mesmo, enquanto componente físico do veículo, aliás, o senhor perito fez questão de o referir.
Prosseguindo.
Também reapreciamos na íntegra os depoimentos de E… (esta testemunha depôs nas sessões de julgamento de 21 e 23 de Novembro de 2017 e na sessão de 11 de abril de 2019) e de F… (depôs no dia 15 de Novembro de 2017)
A testemunha E…, licenciado em gestão de empresas, com domicilio profissional em Almada referiu trabalhar para a 2ª Ré desde 2005 e que desde 2014 trabalha no departamento ligado às garantias, reclamações e problemas técnicos. No essencial referiu que receberam reclamação da A relativamente ao veículo dos autos no início de 2016 queixando-se do desempenho do motor, referiu-se às reclamações anteriores que a autora fez relativamente ao veículo e que foram registadas, abordando no seu depoimento as anomalias que foram reclamadas e verificadas quer junto da 1º ré, quer junto da G…, outra concessionária da 2ª Ré, esclareceu de forma sintética o que é o FPD( sistema de partículas) enquanto componente dos veículos a diesel e referiu-se às condições necessárias para que a regeneração do veículo ocorra. Esta testemunha não deixou de se referir e admitir todas as anomalias ocorridas no veículo dos autos e que estão elencadas nos fatos provados e que foram objecto de reparação junto da 1º e 2º ré.
A testemunha F…, engenheiro mecânico que trabalha para a G…, referiu no essencial que o veículo dos autos foi para a oficina da 2ª Ré com problemas de obstrução do FPD e que fez várias regenerações estáticas nessas oficinas até que explicaram à autora que a utilização que esta dava ao veículo não era adequada para o veículo e fazer a regeneração automática do FPD, explicando à autora o tipo de utilização adequado para tanto. Referiu que a autora fazia com o veículo percursos diários de 6 Km dentro da zona do Porto e que durante essa distância fazia paragens seguidas de novos percursos pequenos para levar e trazer as crianças para e do colégio I….
Assinamos também que a testemunha F… revelou que não acha normal que um veículo como o dos autos necessite de fazer nova regeneração estática, seguida de uma dinâmica, após ter feito essas regenerações no dia anterior e depois de percorrer 75 Km e referiu que actualmente o veículo dos autos está imobilizado no colégio da autora e que esta entretanto utiliza no transporte de crianças outros veículos sendo um deles um D1… de modelo mais antigo do que aquele dos autos.
Assim, estes dois depoimentos não lograram convencer este colectivo de juízes no sentido de ser o tipo de utilização dada ao veículo pela autora a única causa para a frequente obstrução do FPD do veículo dos autos.
Assim, não lograram explicar porque é que no período em que o veículo estava a ser reparado na oficina da G…, um dia, após o veículo ter sido sujeito no dia anterior a uma regeneração estática, seguida de uma regeneração na estrada, concretamente, deslocação do veículo do Porto para as colónias de férias (Póvoa de Varzim) e regresso no mesmo dia, apresentou nova obstrução do sistema de partículas.
Também não lograram explicar por que razão tendo o veículo sido sujeito no dia 29-01-2019 a uma regeneração estática, seguida de uma regeneração na estrada, apresentou no dia 30 desse mês, após ter percorrido 75 Km, nova obstrução do FPD, conforme fatos vertidos nas alíneas CCC) a GGG).
Repara-se que o veículo dos autos no início da perícia, a 14.03.2019 tinha percorrido 21.774 Km e no final da perícia (29.01.2019) tinha percorrido 23 263 km.(ver relatório pericial).
Acresce que, conforme resulta do acima exposto um filtro de partículas deveria durar legalmente pelo menos 160 mil km, mas é normal que comece a dar problemas aos 120 mil km ou aos 80 mil km no caso do veículo realizar apenas trajetos urbanos.
Ora, o veículo dos autos foi adquirido em Outubro do ano de 2014 e apenas tina percorrido no final da perícia ( 29.01.2019) 23 263 km.( ver relatório pericial)e após ter feito a regeneração estática seguida de dinâmica obstruiu novamente após ter percorrido num dia 75 km!
Logo, acolhemos o parecer do senhor Perito quando conclui que este veículo apresenta uma irregularidade.
Logo nada há a alterar na alínea impugnada, sendo que, a convocação de determinados segmentos , escolhidos cirurgicamente, dos depoimentos de duas testemunhas ligadas às rés, não tem o condão de nos convencer no sentido pretendido pela recorrente.
Consequentemente, não acolhemos a requerida alteração da redacção da alínea GGG)da decisão de fato, improcedendo nesta parte o recurso sobre a matéria de fato.
Relativamente aos pontos de fato nºs 16 e 17 julgados não provados, resulta da reapreciação feita dos meios de prova atrás referidos que os depoimentos das testemunhas E… e de F…, não lograram criar neste colectivo de juízes convicção diversa daquela que foi alcançada pelo tribunal recorrido, improcedendo também nesta parte o recurso da 2ª ré-recorrente sobre a matéria de fato.
E apoiando-nos nas considerações atrás expostas é também nosso entendimento que não merece provimento a pretensão da 2ª ré-recorrente quanto aos pontos 16 e 17º dos fatos julgados não provados.
Do que se deixa dito conclui-se não haver fundamento para alterar a matéria de facto dada como provada e não provada, improcedendo, nesta parte, a apelação da 2ª ré/ recorrente.
Concluindo: Improcede, portanto, na totalidade o recurso da decisão sobre a matéria de fato vertido no recurso de apelação da 2ª ré-recorrente.
3.4 DAS RAZÕES DE DIREITO.
Considerando que o recurso da decisão de facto não obteve provimento nenhuma alteração se poderá introduzir nos factos julgados provados e não provados na decisão de facto proferida pêlo tribunal de 1ª instância.
Todavia, impõe-se apreciar se a factualidade apurada e dada como provada, é suficiente para suportar as condenações da 1ª e 2ª rés nos termos vertidos no dispositivo.
Vejamos.
Acerca da situação do estado do veículo dos autos, designadamente sobre se o funcionamento do veículo permite revelar que o veículo apresenta desconformidade que o desvalorize ou impeça a realização do fim a que é destinado, ou não tem as qualidades asseguradas pelo vendedor ou necessárias para a realização daquele fim, atenta a redacção do artigo 913º do CCivil, norma que como sabemos acolhe um conceito de «coisa defeituosa» menos amplo do que aquele que está acolhido no regime de defesa do consumidor – cfr. art.º 2.º, n.º 2 do Dec.-Lei n.º 67/2003 -, que se baseia no n.º 2 do art.º 35.º da Convenção de Viena sobre os contratos de compra internacional de mercadorias, urge tecer as considerações que se seguem.
O artº. 913º., do Cód. Civil (C.C.), consagrando como essencial o critério funcional da coisa, permite dizer que são coisas defeituosas as que sofram de: a) vício que as desvalorize; b) vício que impeça a realização do fim a que é destinada; c) em que faltem as qualidades asseguradas pelo vendedor; d) em que faltem as qualidades necessárias para a realização do fim a que a coisa se destina (cfr. P. LIMA e A. VARELA, in “Código Civil Anotado”, vol. II, 2.ª ed., revista e actualizada, pág. 187).
Para LUIS MANUEL TELES DE MENEZES LEITÃO, “a expressão “vícios”, tendo um conteúdo pejorativo, abrangerá as características da coisa que levam a que esta seja valorada negativamente”, e a “falta de qualidades”, “embora não implicando a valoração negativa da coisa, coloca-a em desconformidade com o contrato”. E prossegue: “para que os defeitos da coisa possam desencadear a aplicação do regime da venda de coisas defeituosas torna-se necessário que eles se repercutam no programa contratual, originando uma de três situações: a desvalorização da coisa; a não correspondência com o que foi assegurado pelo vendedor; e a sua inaptidão para o fim a que é destinada” (in “Direito das Obrigações”, vol. III, 2016-11ª ed., págs. 121).
Posto isto, afigura-se-nos que é boa prática não verter na decisão de fato afirmações relativas à existência ou inexistência de “ defeitos” e “vícios”, optando-se antes pela descrição do real funcionamento do veículo tal como foi observado pelo senhor perito nomeado para elaborar a perícia.
Assim, observamos nomeadamente que o senhor perito referiu :
“Há duas formas de abordar esse problema. A forma que eu sinto que é a mais correta mecanicamente, em termos de engenharia, é afirmar que existe uma irregularidade. Os automóveis têm que circular sem ter o filtro de partículas congestionado mais quilómetros do que setenta e cinco. Setenta e cinco é uma quilometragem muito muito muito baixa, para este género de veículos. E o raro é que este género de veículos congestione assim: a menos de 100 km percorridos a baixa velocidade. Este veículo, com esta motorização, e este género de veículos, que são grandes, são pesados, a diesel. Existe este motor a diesel noutros veículos, mas este em especial, deste ano, deste fabrico, congestiona rapidamente. Para evitar isto, convém ter uma condução moderada. E isso é verdade. E era é o que os profissionais da D1… me diziam. Que isto acontecia e que era muito susceptível de acontecer e que de certeza iria acontecer, mas que o normal seria andar em cidade e depois andar um bocado de estrada e depois complementar sempre assim a condução.
(…)
Mas não há nada que se possa modificar intrinsecamente no carro para que não faça isto, a não ser que se tire o filtro de partículas, mas isso é proibido”
Mais verificamos que o senhor perito a certa altura referiu: “ Se calhar este veículo podia estar preparado de outro modo,. Ali aquele motor…
Acresce por outro lado que os mini-bus, ( carro pesado) categoria na qual se inclui o veículo dos autos, são todos a diesel.
No final dos seus esclarecimentos o sr perito referiu que estes motores , iguais àquele do veículo dos autos, foram descontinuados, e que foram mudados os sistemas de injecção, de combustão, os tabliers foram melhorados por forma a revelar mais informação e que o computador de bordo é mais interactivo.
E também assinalamos que a redacção da al GGG) dos fatos provados reproduz a parte final do relatório pericial, mais concretamente , dos esclarecimentos escritos prestados pelo senhor perito.
De resto, na motivação da decisão da sentença recorrida, no tocante a esta alínea GGG) dos fatos provados, o tribunal a quo , de forma simples e assertiva justifica a decisão de julgar provado este fato, a qual, por não merecer qualquer censura da nossa parte aqui se reproduz:
“Os pontos UU) a GGG) foram evidenciados pelo teor do relatório pericial e esclarecimentos prestados, nos termos constantes de fls. 1174 e ss., 1235 e ss., 1256 e ss. e 1273 e ss. dos autos. Salienta-se, ainda que, em sede de esclarecimentos orais em audiência de julgamento, o perito nomeado declarou não ter detectado desconformidade no filtro de partículas, que verificou exteriormente e que não sabe se o veículo tem outra causa para entrar em safe mode, afirmando que existe uma irregularidade porque o veículo tem de circular muito mais do que 75 km até à obstrução total do filtro de partículas deste tipo de veículo, isto não obstante tenha referido que este modelo, ano e fabrico congestiona muito rápido, sendo necessário uma condução moderada e complementar o trajecto de cidade com o de estrada. Foi ainda claro ao afirmar que não é possível congestionar o filtro em 1ª ou 2ª mudança a 20-30 km/hora, porque o veículo tem de circular e que não acredita que o filtro não tenha um defeito, não obstante não seja um veículo adequado para trajectos curtos. Mais afirmou que estes motores foram alterados e na Europa não são comercializados, tendo sido optimizados.”

Considerando que são diferentes os regimes jurídicos que urge convocar para apreciar os dois recursos de apelação interpostos iremos apreciar e decidir separadamente as questões suscitadas por cada uma das recorrentes.
A. Da apelação da 1ª ré/ recorrente.
Conforme já assinalamos o tribunal recorrido conclui pela caducidade do direito de denúncia dos defeitos por parte da A. perante a 1ª R. em virtude do contrato de compra e venda celebrado entre ambas celebrado, sendo que nesta parte a decisão já transitou em julgado uma vez que nem a 1ª ré , nem a autora, impugnam esse segmento da sentença recorrida.
E, conforme já assinalado, a 1ª ré-recorrente alegou que a condenação da 1ª ré nos termos vertidos no dispositivo da sentença recorrida, contraria a procedência da exceção da caducidade, na medida em que esta determina a extinção a extinção ou perda de um direito ou de uma ação pelo decurso do tempo, ou ainda, pela verificação de uma circunstância que faz desencadear a extinção do direito.
Todavia, como resulta das considerações atrás expostas é nosso entendimento que não se verifica essa contradição na medida em que o tribunal recorrido esclareceu que “ e como resulta bem explícito na sentença, a 1ª R., para além da responsabilidade contratual que lhe advém enquanto vendedora do veículo (única relativamente à qual foi invocada e apreciada a excepção de caducidade), tem também responsabilidade enquanto concessionária da 2ª R., tendo sido nessa qualidade condenada.”
E como dissemos atrás, esta pronúncia do tribunal a quo , revela que o Mmo Juiz de 1ª instância condenou a 1ª ré, na qualidade de concessionária da 2ª ré, e, por isso, não se verifica a alegada contradição que é imputada à sentença recorrida, sem prejuízo naturalmente, de na sede própria, este tribunal se pronunciar sobre um eventual erro de julgamento contido na condenação da 1ª ré, bem como, sobre a verificada condenação condicional da 1ª ré.
Aqui chegados, importa afirmar que é nosso entendimento que o vendedor não é tido como auxiliar do produtor-fabricante para efeitos do artigo 808º do C.Civil e que permanece estranho à garantia prestada pelo fabricante, sem prejuízo, naturalmente, do vendedor celebrar com o comprador uma garantia de bom funcionamento ao abrigo do artigo 921º do CCivil, norma que consagra uma responsabilidade especial de natureza objectiva do vendedor, que tem por base a assunção pelo vendedor do risco relativo a defeitos de funcionamento da coisa mesmo em caso de força maior[4], a significar que o devedor assume o risco da não verificação do resultado pretendido, independentemente de culpa[5] , encontrando-se o devedor vinculado a uma obrigação de resultado, exceto no caso de uma impossibilidade objectiva não imputável ao devedor em que este fica exonerado da sua obrigação.
Assim, as declarações de garantia emitidas pelo fabricante ou por qualquer intermediário da cadeia de distribuição do bem, independentemente da categoria em que se possa inserir essas declarações[6] são independentes do contrato de compra e venda celebrado entre o vendedor final e o comprador, não revestindo a natureza de pacto acessório desse contrato, assim como a responsabilidade que é imputável ao garante é distinta daquela que decorre para o vendedor[7].
Consequentemente, porque , como afirma o tribunal a quo “ está excluída a responsabilidade contratual da 1ª Ré-recorrente com fundamento na procedência da exceção da caducidade suscitada, bem como, não se verificando provada factualidade para responsabilizar a 1º ré por violação dos princípios da boa –fé e informação pré-contratual” não acolhemos a decisão recorrida na parte em que condenou a 1ª ré-recorrente nos termos vertidos nos pontos 2 e 4 do dispositivo:
“2) Condena-se a 1ª R. a proceder à reparação da viatura identificada em F) dos factos provados apenas no caso de a A. ou a 2ª R. a indicarem como concessionária/reparadora oficial para o efeito;
4) Condena-se a 2ª R. no pagamento à A. do valor diário de €35,00 a título de sanção pecuniária compulsória por cada dia de atraso na reparação dos defeitos existentes na viatura, a iniciar após a autorização da reparação por parte da 2ª R.”.
A condenação efectuada teve por base a garantia de fábrica prestada pela 2ª ré, na qualidade de representante legal do fabricante, garantia que, como assinalamos, é independente do contrato de compra e venda celebrado entre a autora/recorrida e a 1ª ré-recorrente.
Acresce que a condenação da 1ª ré, tal como foi feita não deve permanecer, porquanto, trata-se de uma condenação condicional, na medida em que só adquire eficácia condenatória se e na medida em que a A. ou a 2ª R. indicarem aquela como concessionária/reparadora oficial para o efeito.
Ora, como é pacífico, a condição é definida como a cláusula em virtude da qual a eficácia de um negócio jurídico é posta na dependência de um acontecimento futuro e incerto, de forma a que só a sua verificação determinará a produção dos efeitos desse negócio (condição suspensiva) ou só nessa eventualidade é que o negócio deixará de os produzir (condição resolutiva)[8]. Isto mesmo deriva da noção legal de condição, tida como a subordinação, pelas partes, a um acontecimento futuro e incerto da produção dos efeitos de um negócio jurídico ou a sua resolução, qualificando-se como suspensiva no primeiro caso e resolutiva no segundo (artigo270º do Código Civil).
No que agora releva os segmentos 2 e 4 do dispositivo da sentença recorrida subordinam a eficácia dessas condenações a dois atos voluntários tidos como possíveis, provenientes da vontade da 2ª Ré ou da vontade da Autora, não dando assim como certa a condenação da 1ª Ré-recorrente.
Centrados nos segmentos da sentença em causa, porque toda a decisão judicial é incondicionável, por razões de tutela do interesse público e até pelo antagonismo desses segmentos com o devir do processo judicial, submetido a um conjunto de princípios e de procedimentos que, embora protegendo os interesses das partes, visa atingir um interesse público a realização de uma justiça célere e eficaz, segue-se que não pode permanecer a condenação da 1ª Ré.
O processo desenrola-se segundo regras certas e definidas, previamente estabelecidas pela lei adjectiva e a eficácia de qualquer condenação não pode ser condicionada a um evento futuro e incerto que o tribunal faça depender da vontade de uma das partes.
Assim, porque tais segmentos da condenação não podem valer com a condição porque a lei o não consente, nem podem valer sem ela porque o tribunal recorrido apenas condenou a 1ª ré se e na medida em que se verificasse a condição, porque a condição aposta é contrária à lei, impõe-se a revogação desses segmentos do dispositivo vertidos nos pontos 2 e 4.
Por tal razão não podem subsistir as condenações da 1ª Ré-recorrente vertidas nos pontos 2 e 4 do dispositivo, as quais, revogamos em conformidade com as considerações tecidas.
Por último, sempre se dirá que não acolhemos o entendimento do tribunal recorrido na parte em que configurou a obrigação de reparação do veículo como uma prestação de fato infungível para efeitos de condenação das rés no pagamento à A. do valor diário de €35,00 a título de sanção pecuniária compulsória por cada dia de atraso na reparação dos defeitos existentes na viatura, desde a data do trânsito em julgado da presente sentença, conforme adiante iremos desenvolver.
B. Da apelação da 2ª ré/ recorrente.
Começa a apelante por referir, sem daí retirar consequências, que o tribunal a quo condenou-a assacando-lhe responsabilidade por via de garantia junta aos autos a 09.05.2016 e que a emitente dessa garantia nem sequer é a própria D….
Ora, nesta parte, adianta-se que esse argumento não constitui verdadeiro entrave à responsabilidade da 2ª Ré.
De resto, é estranho que nesta fase a recorrente use esse argumento, porquanto, como resulta do próprio certificado de garantia junto aos autos a fls 807, o mesmo apenas é válido quando emitido no momento da entrega do veículo novo e devidamente assinado pelo Concessionário vendedor ao Cliente, ou por um seu representante, assinalando-se que esse certificado de garantia faz parte integrante do “ Guia de Garantia e Manutenção” que acompanha o veículo, constituído por 42 páginas, a significar que esse certificado de garantia de fabricante para vincular este não necessita da assinatura deste, bastando que este seja o emitente, como é o caso.
Prosseguindo.
Quanto à alegada “1. DA INEXISTÊNCIA DE DEFEITO”, inserida em “B. DA REAPRECIAÇÃO DO DIREITO APLICADO AO CASO”, entente a 2.ª Recorrente que não existe qualquer defeito de fabrico ou desconformidade pelo qual possa ser responsabilizada.
Quid iuris?
Como resulta das considerações atrás expostas sobre garantia de fábrica prestada pelo fabricante, a responsabilidade da 2ª Ré deriva da garantia de fabricante concedida, a qual, como dissemos, deve ser perspectivada à luz do artigo 459º do CCivil , isto é, deve ser considerada como um negócio jurídico unilateral não receptício e que assumindo a garantia os contornos de uma promessa pública, ela deverá respeitar os requisitos impostos pelo artigo 459º do C.C. e seguintes, o que significa que a promessa da prestação tem de tornar-se cognoscível pelo público através de um anúncio, cristalizando- se por meio de publicidade ou até mesmo pelas informações de rotulagem contidas da embalagem do bem. Os promissários da garantia, no momento em que esta é emitida, encontram-se indeterminados, porém são determináveis, sendo considerados como beneficiários aqueles sujeitos que se achem nas condições elencadas na garantia, tenham ou não conhecimento da mesma.
E atentando ao caso dos autos reproduz-se aqui o enunciado dessa garantia na parte que releva tendo em atenção a pág. 7 do “ Guia de Garantia e Manutenção” que acompanha o veículo, constituído por 42 páginas e que está junto a fls 795 e ss do 3ª volume junto no dia 4-10-2016.
“ O seu veículo desfruta de uma Garantia Base D1… providenciada pelos Concessionários autorizados.
Se alguma peça do veículo necessitar de uma reparação ou substituição no seguimento de um defeito de fabrico, a peça será reparada ou substituída de forma totalmente gratuita por qualquer concessionário autorizado, independentemente de qualquer mudança de proprietário do veículo durante o período de Garantia.
( …)
Todas as peças D… originais montadas durante reparações ao abrigo da garantia são cobertas até ao fim do período da garantia inicial.
(…) Os itens sujeitos a desgaste são geralmente divididos em duas categorias. Aqueles especificados para substituição ou regulação durante a manutenção programada e aqueles que necessitam ser substituídos ou afinados em função das condições de utilização.
Os itens que se seguem estão cobertos até à primeira revisão agendada ou durante 12 meses contados a partir da data do primeiro registo, o que ocorrer primeiro:
(…).Elemento do filtro de óleo, .. DPF ( filtro partículas Diesel) ou elemento do filtro de partículas.( …)”
Assim, a responsabilidade da 2ª R. perante a A/Recorrida rege-se somente pelo teor do guia de garantia supra identificado e, no que se refere à A., por não ser consumidora para efeitos do Decreto-Lei nº 67/2003, apenas abrange a reparação ou substituição de peças com defeito de fabrico.
Por outro lado, estão excluídos de tal responsabilidade os danos identificados a págs. 10 e 17 do guia, ou seja, “excluem toda e qualquer responsabilidade por danos acidentais ou consequentes, verificados como resultado de uma avaria ao abrigo destas Garantias, incluindo, entre outros, incómodos, custos de transporte, chamadas telefónicas, custos de alojamento, perdas de receita e danos de propriedade” e “Quaisquer perdas resultantes directa ou indirectamente da imobilização do veículo (…)”.

Importa ainda assinalar que o cumprimento defeituoso tem como pressuposta a ideia de que, aquando da entrega da coisa, o comprador desconhecia o vício ou inexactidão da prestação efectuada pela outra parte.
Quando haja cumprimento defeituoso, ou, seja, quando a prestação seja defeituosamente cumprida, o devedor, cuja culpa se presume, responde pelo prejuízo causado ao credor, nomeadamente pela eliminação dos defeitos–cfr. artigos 798.º, 799.º, nº 1, 913.º e 914.º todos do C. Civil.
Em caso de cumprimento defeituoso, a lei impõe, pois, ao devedor a prova de que o mesmo não procede de culpa sua.
A execução defeituosa da prestação contratual, como violação do contrato, é um acto ilícito, elemento integrante da responsabilidade contratual.
No domínio desta responsabilidade, presume-se, como se disse, a culpa, mas, na falta de norma que o permita, o mesmo não acontece relativamente aos restantes requisitos da responsabilidade civil.
Assim, há-de ser sobre quem invoca a prestação inexacta da outra parte como fonte da responsabilidade que há-de recair o ónus de demonstrar os factos que integram esse incumprimento (facto ilícito), bem como os prejuízos dele decorrentes (dano)–artigo 342.º, nº 1 C.Civil.
E no tocante ao ónus da denúncia importa assinalar que apesar de ser exigido que a denúncia de defeitos seja feita de forma precisa e circunstanciada, a fim de que o responsável possa determinar a respectiva natureza e importância [9], não se torna necessário indicar a causa dos defeitos, porque, por um lado, pode ser de conhecimento difícil e, por outro, não é fato constitutivo da responsabilidade derivada do cumprimento defeituoso.
No caso da compra e venda o vendedor, adstrito ao dever de entregar a coisa objecto mediato do contrato, pode violar esse seu dever de prestar por uma de duas formas: ou pelo puro e simples incumprimento ou impossibilitando a prestação (artºs 798 e 801 nº 1 do Código Civil). Existe, no entanto, uma terceira possibilidade, que, relativamente ao contrato de compra e venda, é objecto de previsão específica: a de ter havido um cumprimento defeituoso ou inexacto (artº 913 e ss. do Código Civil). O vendedor não está só adstrito à obrigação de entregar certa coisa; ele encontra-se ainda vinculado a entregar uma coisa isenta de vícios e conforme com o convencionado, quer dizer, sem defeitos (artº 913 Código Civil).Coisa defeituosa é, portanto, aquela que tiver um vício ou se mostrar desconforme com aquilo que foi acordado. O vício corresponde a imperfeições relativamente à qualidade normal de coisas daquele tipo; a desconformidade representa uma discordância com respeito a fim acordado.
É portanto, à luz do fim da coisa prestada pelas partes – concepção subjectivo-concreta de defeito – ou, na sua falta, à luz do uso corrente, habitual – noção objectiva do defeito – que se aprecia a existência do vício. Cfr. João Calvão da Silva, Estudos Jurídicos (Pareceres), Almedina, Coimbra, 2001, págs. 335 e 336.
O vício ou defeito da coisa é determinado à data do cumprimento e a ela se reporta. Deve, pois, existir nesse momento, embora eventualmente oculto.

Feitas estas considerações, analisando a factualidade apurada, afigura-se-nos correcta, a seguinte afirmação vertida na sentença recorrida :
“Resulta da matéria dada como provada, e que, actualmente, o veículo aqui em causa apresenta, desde 03/11/2015, indicações de aviso de motor permanentemente aceso e filtro de partículas obstruído, sendo que resulta da própria perícia realizada que esta viatura, após uma regeneração estática completa e prova de estrada, com redução de percentagem de obstrução do filtro para 14%, estava com o filtro obstruído e em estado de safe mode ao fim de apenas ter percorrido 75 km, concluindo o perito que esta situação pode ser considerada irregular.”
Acresce que as reparações a que o veículo dos autos foi sujeito, ( com as inerentes deslocações a oficinas) as quais a seguir elencamos,
a.a obstrução da admissão de combustível pela existência de papel no depósito – alínea S) dos factos demonstrados com produção de prova;
b.o injector adblue rachado e com fuga de líquido - alínea X) dos factos demonstrados com produção de prova;
c. massa vedante da tampa de distribuição com falhas - alínea X) dos factos demonstrados com produção de prova;
d. vedante da frente da cambota deformado e com fuga de óleo e avaria no sensor de temperatura de gases de escape (sensor de pressão no PDF) – alínea X) dos factos demonstrados com produção de prova;
e. falta de pressão na régua de injecção e bomba de alta pressão de combustível que não regulava a pressão de combustível – alínea W) dos factos demonstrados com produção de prova;
f.detectado ponto de massa junto ao módulo de controlo do motor solto, que foi fixado –alínea K) dos factos demonstrados com produção de prova;
g. desempenho do motor: perda de potência durante a aceleração, quando o motor está quente ou frio – alínea O) dos factos demonstrados com produção de prova;
h o motor vai abaixo – alínea O) dos factos demonstrados com produção de prova;
i. indicador intermitente de aviso do motor aceso – alínea O) dos factos demonstrados com produção de prova;
j. foi verificada a existência de anomalias, nomeadamente a falta de potência que confirmavam o desligamento automático, quando forçado o motor – aceleração - alínea P) dos factos demonstrados com produção de prova;
k.com substituição do filtro de combustível e da válvula doseadora de combustível, por estar presa - alínea Q) dos factos demonstrados com produção de prova;

não permitem afirmar, como faz a 2ª ré-recorrente, que inexiste defeito do veículo na medida em que a causa estava na obstrução do filtro de partículas .
Afigura-se-nos, como assinala a autora-recorrida, que “ padecendo a viatura de diversas anomalias conforme atrás descritas, todas contribuíram para o normal desempenho do motor, comprometendo o funcionamento de todos os componentes, nomeadamente do filtro de partículas, que como é referido pela própria 2.ª Recorrente é um equipamento de desgaste que depende do “bom uso” dado ao veículo, permitindo concluir que, nunca poderia ser dado o referido “bom uso” quando este é afetado pelos demais vícios dados como provados, o que rebate a tese do alegado “indevido uso da viatura”, conforme previsto nas clausulas de exclusão da garantia pelo fabricante”

Consequentemente, também não acolhemos a alegação da 2ª ré –recorrente na parte em que afirma:
“Tendo a Autora desconsiderado as advertências que lhe foram feitas e, nessa medida, atuado de forma a impedir ativamente a regeneração automática do filtro de partículas (sendo certo que, se este processo não for completado com sucesso, diversos componentes da viatura, com especial incidência para os componentes do motor, podem sofrer danos), não pode pretender assacar os problemas da viatura a qualquer defeito de fabrico. Tais anomalias devem-se, única e exclusivamente, a uma condução inadequada da mesma, por parte da Autora.”

Pelo contrário.
A tese que a 2ª ré/ recorrente pretende que seja por nós validada parece tentar encobrir os reais factos ocorridos, mas que o Tribunal a quo, atento aos pormenores que envolviam a discussão da causa, teve em consideração e fez verter na sua motivação, conforme se evidencia na transcrição abaixo:

“Por outro lado, não se pode deixar de afirmar que o demonstrado nos pontos K) – anomalia detectada mesmo antes da venda à A., em estado de nova - e S) dos factos provados, esta última com a quilometragem já percorrida de 2906 km, evidencia que o estado desta viatura revela um fraco controle de qualidade de produção por parte do fabricante e que, não obstante tenha sido referido pelas testemunhas K…, mecânico da G…, que a bola de papel encontrada no depósito de combustível não passa no filtro de combustível e que o motor não pode ter danos porque tem filtros de papel para isolamento; e J…, engenheiro mecânico da G…, que afirmou que este lixo não causa problemas ao motor por causa do filtro, o certo é que o filtro referido por estas testemunhas tem por objectivo impedir a passagem de detritos de combustível e não de papel, não sendo possível determinar o comportamento do papel após 2906 km percorridos, ao longo de 5 meses após a primeira reparação, a absorver combustível, não se podendo considerar credíveis estes depoimentos, nesta parte, já que não foi revelado existir ou ter sido feito qualquer estudo quanto a este comportamento, mas apenas o controle do circuito até ao filtro, o que se revela insuficiente.”

Desde logo, porque, como referido na resposta ao recurso, “ não é expectável que em circuitos menores de 75 quilómetros, o referido filtro fique totalmente obstruído e tenha como consequência a entrada em modo “safemode”, conforme os esclarecimentos prestados pelo perito e que constam dos pontos UU) e GGG) da motivação, que transcrevemos:

“Os pontos UU) a GGG) foram evidenciados pelo teor do relatório pericial e esclarecimentos prestados, nos termos constantes de fls. 1174 e ss., 1235 e ss., 1256 e ss. e 1273 e ss. dos autos.
Salienta-se, ainda que, em sede de esclarecimentos orais em audiência de julgamento, o perito nomeado declarou não ter detectado desconformidade no filtro de partículas, que verificou exteriormente e que não sabe se o veículo tem outra causa para entrar em safe mode, afirmando que existe uma irregularidade porque o veículo tem de circular muito mais do que 75 km até à obstrução total do filtro de partículas deste tipo de veículo, isto não obstante tenha referido que este modelo, ano e fabrico congestiona muito rápido, sendo necessário uma condução moderada e complementar o trajecto de cidade com o de estrada. Foi ainda claro ao afirmar que não é possível congestionar o filtro em 1ª ou 2ª mudança a 2030 km/hora, porque o veículo tem de circular e que não acredita que o filtro não tenha um defeito, não obstante não seja um veículo adequado para trajectos curtos. Mais afirmou que estes motores foram alterados e na Europa não são comercializados, tendo sido optimizados.”

Acresce que a 2.ª Recorrente, como representante da fabricante do veículo e, se infere dos esclarecimentos prestados pelo senhor perito, sabe que o motor que equipa o modelo em causa foi descontinuado logo após o decurso de 2 anos sobre o lançamento desse novo modelo “Mini Bus”.

Aliás, como refere a recorrida:

“a ocorrência deste “problema dos motores a diesel” que vieram a ser constantemente adaptados para cumprirem com as novas normativas europeias sobre os limites de emissão de gases provenientes da combustão, foi e é recorrente para os fabricantes que desde 1998, se viram confrontados com o que a UE designou de norma Euro 1 e atualmente, com a adenda à norma em vigor desde 2015, de Euro 6.2, apertando o cerco quanto aos valores máximos de NOx, CO e partículas finas e hidrocarbonetos não queimados, considerados venenosos e como tal prejudiciais para o ambiente.
Essencialmente e para que o caso em apreço importa, é na adaptação do anterior motor que equipa a viatura adquirida pela Recorrida, a um filtro de partículas que cumpra os requisitos da normativa então em vigor, que faz com o defeito que esta evidencia seja, na realidade, um defeito de conceção do motor, visto como um todo e não apenas o circuito de combustão, que ao ser rapidamente obstruído, impede a normal circulação do veículo com a ativação do sistema “safe mode”.

A tudo isto, teremos de adicionar os problemas (defeitos) que foram detetados na viatura e vieram a ser reparados/ substituidos, sem que se consiga mensurar os efeitos nocivos perante a robustez do motor, ainda mais quando estes se verificaram logo no início da sua utilização – o chamado período de rodagem do veículo, em que, nomeadamente, se encontrava papel dentro do depósito de combustível que condicionava a normal admissão de combustível e “asfixiava” o motor, redundando no sintoma de perda de potência e o acender da luz de avaria no quadro dos manómetros do veículo”

De igual modo, não poderá prevalecer o entendimento da 2ª Ré/Apelante no sentido de não ser possível a reparação da viatura, pelo motivo de esta não padecer de qualquer defeito.
Quanto à reparação do veículo, esta sempre poderá passar pela instalação naquele veículo do novo motor que veio substituir o antigo que foi descontinuado, sendo que, conforme referiu o perito, o motor foi melhorado com vista a permitir a utilização citadina, evitando os problemas que afetavam como ainda afetam, o antigo e descontinuado motor … que equipa o modelo adquirido pela Recorrida.
Falece assim a argumentação da 2.ª Recorrente quanto à impossibilidade de reparação da viatura, assim como se demonstra evidente que, os defeitos (problemas) que impedem a normal utilização da viatura, são e sempre foram do conhecimento do fabricante, que de tudo tem feito para os corrigir.

A significar também, como assertivamente refere a recorrida na resposta, que “ não age com a lisura devida, quem fabrica e coloca em comercialização um veículo que se destina ao transporte de passageiros, que não permite a utilização normal em circuito citadino, mas apenas em circuito de autoestrada, fazendo uma pequena orientação como conselhos de utilização, para circulação em rotações acima das 3.000 rpm´s e por períodos superiores a 20 minutos, de forma esporádica, sem que se alcance a frequência dessa necessidade e os efeitos da sua não observância, para depois invocar um indevido uso que sustente a sua desresponsabilização”[10]

Com efeito, a quantidade de peças substituídas numa viatura nova e em período de garantia, é manifestamente exagerada e evidencia que desde o início, esta viatura apresenta defeitos que determinam a limitação da sua circulação, evidenciados nas reparações indicadas em DD) e EE) e que se mantiveram.

E ao contrário do que alega a apelante, a elevada frequência e num curto espaço de tempo com que o veículo entra em modo “safe mode”, obrigando ao referido procedimento para que que se faça a regeneração forçada do filtro não nos permite concluir que o veículo da recorrida apresenta as qualidades e desempenho habituais neste tipo de viaturas e com que a recorrida podia razoavelmente contar, antes se devendo concluir que as não apresenta, falta de qualidades que desvalorizam naturalmente o veículo, impedem que o veículo efectue o transporte de alunos, objectivo naturalmente pretendido pela autora.

Assim, não merece censura a sentença recorrida quando concluiu pela condenação da 2ª Ré/ recorrente e julgou procedente o pedido de condenação da 2ª R. na reparação da viatura da A, improcedendo também nesta parte o recurso em análise.

Resta-nos apreciar os pontos 3 e 4 do dispositivo da sentença, os quais, reproduzimos:

“3) Condena-se a 2ª R. no pagamento à A. do valor diário de €35,00 a título de sanção pecuniária compulsória por cada dia de atraso na reparação dos defeitos existentes na viatura, desde a data do trânsito em julgado da presente sentença;
4) Condena-se a 2ª R. no pagamento à A. do valor diário de €35,00 a título de sanção pecuniária compulsória por cada dia de atraso na reparação dos defeitos existentes na viatura, a iniciar após a autorização da reparação por parte da 2ª R.”

Como já atrás assinalamos, não acolhemos o entendimento do tribunal recorrido na parte em que configurou a obrigação de reparação do veículo como uma prestação de fato infungível para efeitos de condenação das rés no pagamento à A. do valor diário de €35,00 a título de sanção pecuniária compulsória por cada dia de atraso na reparação dos defeitos existentes na viatura, desde a data do trânsito em julgado da presente sentença.

Conforme resulta do dispositivo da sentença recorrida na parte em que agora foi confirmada, a 2ªré/recorrente foi condenada na obrigação principal de realizar trabalhos de reparação.

Dispõe o artigo 829º- A, n.º 1, do Código Civil, que nas prestações de facto infungível, positivo ou negativo, salvo nas que exigem especiais qualidades científicas ou artísticas do obrigado, o tribunal deve, a requerimento do credor, condenar o devedor ao pagamento de uma sanção pecuniária por cada dia de atraso no cumprimento ou por cada infracção, conforme for mais conveniente às circunstâncias do caso.
Assim, resulta do disposto no citado artigo, que a sanção pecuniária compulsória é aplicável no caso das prestações de facto infungíveis.
A lei faculta ao requerente, nos casos em que esteja em causa uma prestação de facto infungível, positivo ou negativo, um instrumento jurídico impulsionador do cumprimento dessas obrigações, a denominada “ sanção pecuniária compulsória”, que traduz uma ameaça para o devedor de uma sanção pecuniária, para a hipótese do devedor não obedecer à condenação principal.
E resulta do n.º 1 do citado artigo que o legislador confinou essa sanção às obrigações de carácter pessoal.
A prestação é por natureza não fungível (não podendo, quando assim seja, ser efectuada por terceiro, sem o consentimento do credor) se estiver directamente relacionada com a pessoa do devedor, por atender às qualidades ou à situação especial deste – Antunes Varela, Direito das Obrigações, 4ª edição, V. II, pág. 25.
Em certos casos pode dar-se a substituição sem convenção, mas não vigora essa regra em geral.
A prestação obrigacional diz-se fungível quando pode ser realizada tanto pelo devedor como por outra pessoa, sem prejuízo para o credor, conforme resulta do nº1 do art. 767º do CCivil; e não fungível quando tenha de ser necessariamente cumprida pelo devedor.

E conforme decorre do disposto no artigo 767º, n.º 2 do Código Civil, a infungibilidade da prestação resulta ou da sua própria natureza, ou da vontade das partes.
Pelo que, conforme referido por Calvão da Silva, Cumprimento e Sanção Pecuniária Compulsória, Coimbra, 1987, págs. 367 e 367: “A questão da fungibilidade ou da infungibilidade da prestação resolve-se, assim, no aspecto prático, pela possibilidade ou impossibilidade de ter lugar o cumprimento por terceiro. Se, de acordo com o critério contido no artigo 767º o cumprimento por terceiro é admissível, a prestação é fungível; se, ao invés, o cumprimento por terceiro for de excluir, a prestação é infungível”

Ora, no caso dos autos, considerando que se trata de uma condenação da legal representante da fabricante em realizar trabalhos de reparação do veículo, os quais, naturalmente vão ser executados pelo concessionário que vier a ser indicado pela 2ª ré ou pela autora, não está excluído que a reparação venha ser feita por outro concessionário distinto da 1ª Ré, logo, é legitima a realização das reparações por outrem que não a 1ª ré .[11]
De resto, , como refere Calvão da Silva, na obra citada, quando a substituição do devedor por terceiro prejudique o credor, este pode recusar a prestação, não havendo lugar ao chamado cumprimento por terceiro.[12]
E assim, só em função do interesse concreto do credor, se pode resolver a questão da fungibilidade ou infungibilidade.
Ponderando o caso concreto, nada obsta que, a autora ou a 2ª ré indiquem outro concessionário, que não a 1ª ré, para proceder às reparações da viatura.
Consequentemente, porque a obrigação principal em que a 2ª ré foi condenada tem a natureza de uma prestação de fato positivo fungível, segue-se que não tem suporte legal a referida condenação da 2ª Ré no pagamento à A. do valor diário de €35,00 a título de sanção pecuniária compulsória por cada dia de atraso na reparação dos defeitos existentes na viatura, a iniciar após a autorização da reparação por parte da 2ª R, a significar , que essa parte da sentença recorrida deve ser revogada, procedendo nesta parte o recurso da 2ª Ré.

Concluímos assim pela procedência total do recurso de apelação interposto pela 1ª ré , revogando a condenação da 1ª Ré nos termos vertidos nos pontos 2 e 4 do dispositivo(2.Condena-se a 1ª R. a proceder à reparação da viatura identificada em F) dos factos provados apenas no caso de a A. ou a 2ª R. a indicarem como concessionária/reparadora oficial para o efeito; 4) Condena-se a 2ª R. no pagamento à A. do valor diário de €35,00 a título de sanção pecuniária compulsória por cada dia de atraso na reparação dos defeitos existentes na viatura, a iniciar após a autorização da reparação por parte da 2ª R.).
Concluímos pela procedência parcial do recurso de apelação interposto pela 2ª ré , revogando a condenação da 2ª Ré nos termos vertidos no ponto 3 do dispositivo (3. Condena-se a 2ª R. no pagamento à A. do valor diário de €35,00 a título de sanção pecuniária compulsória por cada dia de atraso na reparação dos defeitos existentes na viatura, desde a data do trânsito em julgado da presente sentença) mantendo a parte restante da sentença recorrida na parte em que absolveu esta 1ª ré dos demais pedidos formulados.
Sumário.
.......................................................
.......................................................
.......................................................
4. DISPOSITIVO:
Nestes termos, acordam os juízes do Tribunal da Relação do Porto em:
1. Julgar totalmente procedente o recurso de apelação interposto pela 1ª ré , revogando a condenação da 1ª Ré nos termos vertidos nos pontos 2 e 4 do dispositivo (2.Condena-se a 1ª R. a proceder à reparação da viatura identificada em F) dos factos provados apenas no caso de a A. ou a 2ª R. a indicarem como concessionária/reparadora oficial para o efeito; 4) Condena-se a 2ª R. no pagamento à A. do valor diário de €35,00 a título de sanção pecuniária compulsória por cada dia de atraso na reparação dos defeitos existentes na viatura, a iniciar após a autorização da reparação por parte da 2ª R.), mantendo a parte restante da sentença recorrida na parte em que absolveu esta 1ª ré dos demais pedidos formulados.
2. Não conceder provimento ao recurso sobre a matéria de fato interposto pela 2ª Ré.
3. Julgar parcialmente procedente o recurso de apelação interposto pela 2ª ré, revogando a condenação da 2ª Ré nos termos vertidos no ponto 3 do dispositivo (3. Condena-se a 2ª R. no pagamento à A. do valor diário de €35,00 a título de sanção pecuniária compulsória por cada dia de atraso na reparação dos defeitos existentes na viatura, desde a data do trânsito em julgado da presente sentença) mantendo a parte restante da sentença recorrida na parte em que absolveu esta 1ª ré dos demais pedidos formulados.
Custas do recurso de apelação interposto pela 1ª Ré a cargo da recorrida.
Custas do recurso de apelação interposto pela 2ª Ré a cargo da recorrente e da recorrida, na proporção de 5/6 e 1/6, respectivamente.

Porto, 23-04-2020
Francisca Mota Vieira
Paulo Dias da Silva
João Venade
________________
[1] Esta condenação na reparação, constante do pronto 4) do dispositivo respeitará à 1.ª Ré e não à 2.ª como, por lapso, dali consta, uma vez que tal condenação parece retirar-se da fundamentação da sentença.
[2] Reproduz-se aqui a fundamentação quanto ao regime jurídico que o tribunal a quo aplicou á 1ª ré-recorrente:
“No caso em apreço, a garantia foi concedida pela 1ª R. pelo período de 2 anos, pelo que um prazo de garantia de bom funcionamento, nos termos previstos no artigo 921º nº 1 do CCivil.Mas, por força do nº 3 da citada norma, tem a A. o prazo de 30 dias a contar do conhecimento do defeito para o denunciar ao vendedor.
No caso em apreço, dos factos provados resulta que a A. denunciou defeitos à 1ª R. em 27/11/2014 e 18/12/2014, tendo então recorrido a outro concessionário D…, onde a viatura foi sujeita a várias intervenções, sendo que, pelo menos a partir de 29/06/2015 o veiculo passou a apresentar como sintoma o indicador de aviso de motor permanentemente aceso e, em 17/09/2015, o filtro de partículas obstruído, que era reparado pelo concessionário D…. Em 21/01/2016 foi a viatura verificada pela 1ª R. com sintomas de avaria de filtro de partículas obstruído e sintoma de indicador de aviso de motor permanentemente aceso, o que se manteve nas reparações de 10/02/2016, 16/02/2016 e nas sete subsequentes, ocorridas entre 07/06/2016 e 19/01/2017.
Ora, face à data das denúncias e defeitos indicados nos pontos L), M), O), U), W), X)BB), DD), EE) e PP) dos factos provados, constata-se que, com o recurso a um outro concessionário D…, a A. optou pela garantia da D… em detrimento da garantia do vendedor, ora 1ª R. e, assim, ultrapassou o prazo legal de 30 dias para denunciar os defeitos à 1ª R..
Sendo certo que esta garantia de venda concedida pela 1ª R. não pode ser invocada perante outro concessionário D…, uma vez que tal não ficou contratualmente estipulado, razão pela qual não beneficia a A., perante a 1ª R., de contagem de um novo prazo de denúncia após cada intervenção realizada pela G….
De igual modo, o acesso que todos os concessionários D1… têm ao sistema electrónico integrado e através do qual a 1ª R. poderia consultar a situação do veículo da A. não se pode considerar como uma denúncia por parte desta nem impor à 1ª R. tal obrigação para salvaguarda de um direito da A..
Poderia afirmar-se que, não obstante tal facto, a 1ª R. aceitou proceder a reparações posteriores, pelo que aceitou a sua responsabilidade em termos de garantia de venda e que a invocação desta excepção constitui uma situação de abuso de direito, na modalidade de “Venire contra factum proprium”.
No entanto, ficou demonstrado pelo email remetido pela 1ª R. à A. e indicado em Y), que aquela aguardava pela resposta da D…, ou seja, estava, naquele momento, a agir enquanto concessionária da D… para efeitos de garantia da marca, facto evidenciado pela cobrança dos serviços à 2ª R. e pagamento dos mesmos por esta, pelo que não pode o Tribunal concluir por um abuso de direito da 1ª R., até porque a A. Tinha conhecimento deste facto através do email referido.
Consequentemente, conclui-se pela caducidade do direito de denúncia dos defeitos por parte da A. perante a 1ª R. em virtude do contrato de compra e venda celebrado entre ambas.”
[3] Artigo 298.º(Prescrição, caducidade e não uso do direito)
1. Estão sujeitos a prescrição, pelo seu não exercício durante o lapso de tempo estabelecido na lei, os direitos que não sejam indisponíveis ou que a lei não declare isentos de prescrição.
2. Quando, por força da lei ou por vontade das partes, um direito deva ser exercido dentro de certo prazo, são aplicáveis as regras da caducidade, a menos que a lei se refira expressamente à prescrição.
[4] Luís Manuel Teles de Menezes Leitão, Direito das O brigações, Vol III, Contratos em especial, pág. 130-131, convocando Luciana Cabella Pisu, Garanzia e responsabilitá nelle vendite commerciale, Milano, Guifrè, 1983, pp 246 e ss e outro.
[5] A propósito da convenção de garantia e da distinção entre obrigação de resultado e obrigação de meios vide, António Pinto Monteiro, in Claúsula Penal e Indemnização, Livraria Almedina, Coimbra, 1990, pp 1265 e ss.
[6] Como dá nota Ana Manuela Costa Fernandes in “ A Compra e Venda de Bens Defeituosos – A Garantia de Bom Funcionamento”, Dissertação apresentada à Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra no âmbito do 2.º Ciclo de Estudos em Direito (conducente ao grau de Mestre), na Área de Especialização em Ciências Jurídico- Forenses, orientada pela Dr.ª Maria Olinda Garcia, Coimbra,2015, disponível online: “Alguns autores consideram os enunciados de garantia como contratos de garantia ao abrigo da liberdade contratual consagrada no artigo 405º do CCivil, configurando essa declaração como uma proposta contratual dirigida ao público, dando-se a aceitação do beneficiário quando este remete ao garante o documento devidamente preenchido, dando-se a individualização dessa garantia nesse momento. Outros, consideram que a garantia prestada pelo fabricante ou por qualquer dos sujeitos intermediários da cadeia de distribuição do bem, pode ser configurada como um negócio jurídico unilateral não receptício e que assumindo a garantia os contornos de uma promessa pública, ela deverá respeitar os requisitos impostos pelo artigo 459º do C.C. e seguintes, o que significa que a promessa da prestação tem de tornar-se cognoscível pelo público através de um anúncio, cristalizando- se por meio de publicidade ou até mesmo pelas informações de rotulagem contidas da embalagem do bem. Os promissários da garantia, no momento em que esta é emitida, encontram-se indeterminados, porém são determináveis, sendo considerados como beneficiários aqueles sujeitos que se achem nas condições elencadas na garantia, tenham ou não conhecimento da mesma.”
[7] Carlos Ferreira de Almeida, Texto e Enunciado na Teoria Geral do Negócio Jurídico, V. II, Almedina, Coimbra, 1992, p. 1017-a 1020.
[8] Manuel Domingues de Andrade, Teoria Geral do Direito Civil, Coimbra, 1983, pág. 356; Carvalho Fernandes, Teoria Geral do Direito Civil, II, Lex, 3ª ed. revista e atualizada, págs. 380.
[9] Cfr. Pedro Romano Martinez, in Cumprimento Defeituoso , em especial na compra e venda e na empreitada, pp 332 e ss .
[10] Vide Supremo Tribunal de Justiça no Ac. n.º 1857/09.9TJVNF.S1.P1, de 18/09/2014, em que é relator Lopes do Rego, disponível para consulta em: www.dgsi.pt
[11] Calvão da Silva, Cumprimento e Sanção Pecuniária Compulsória, Coimbra, 1987, págs. 367 e 367.
[12] Cfr. Ac Relação Guimarães de 11 de Outubro de 2007, relatado por Conceição Bucho.