Acórdão do Tribunal da Relação do Porto | |||
Processo: |
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Nº Convencional: | JTRP000 | ||
Relator: | JORGE SEABRA | ||
Descritores: | GRADUAÇÃO DE CRÉDITOS EM INSOLVÊNCIA CONTRATO-PROMESSA DE COMPRA E VENDA EXECUÇÃO ESPECÍFICA INCUMPRIMENTO DEFINITIVO DIREITO DE RETENÇÃO PROMITENTE VENDEDOR INSOLVENTE PROMITENTE COMPRADOR CONSUMIDOR ÓNUS DA PROVA | ||
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Nº do Documento: | RP20170508989/07.9TBMCN-Y.P1 | ||
Data do Acordão: | 05/08/2017 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Texto Integral: | S | ||
Privacidade: | 1 | ||
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Meio Processual: | APELAÇÃO | ||
Decisão: | CONFIRMADA | ||
Indicações Eventuais: | 5ª SECÇÃO (LIVRO DE REGISTOS Nº 650, FLS. 458-478) | ||
Área Temática: | . | ||
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Sumário: | I - A execução específica de contrato-promessa [com eficácia meramente obrigacional] depende, regra geral, da verificação de uma situação de mora, estando afastada nas situações de incumprimento definitivo. II - Encontrando-se o promitente vendedor impossibilitado de efectuar a venda prometida, por ter alienado a terceiro o imóvel objecto mediato do contrato promessa de compra e venda, não poderá, igualmente, o tribunal proferir sentença que produza os efeitos da declaração negocial do promitente-vendedor, o que significa que, independentemente de estarem preenchidos os restantes requisitos legais, não é possível a execução específica do contrato-promessa. III - Segundo a interpretação restritiva do art. 755º, n.º 1 al. f) do Código Civil que emerge do Acórdão Uniformizador de Jurisprudência n.º 4/2014, o credor de uma empresa insolvente com crédito derivado do incumprimento definitivo de contrato-promessa celebrado com a insolvente só pode beneficiar do direito de retenção se, além dos demais requisitos gerais, demonstrar ser consumidor. IV - A Lei de Defesa do Consumidor (Lei n.º 24/96 de 31.07) consagra um conceito restrito de consumidor, segundo o qual é assim considerado o adquirente de bens que não se destinem a uso profissional mas antes a um fim pessoal ou privado, isto é, não integrado no exercício de uma actividade comercial, industrial, artesanal. V - Tendo por objecto o contrato-promessa de compra e venda a futura aquisição de uma fracção autónoma destinada ao exercício do comércio e/ou serviços e estabelecimento de restauração e bebidas o respectivo promitente-comprador não é de considerar como consumidor. VI - O direito de retenção é um direito real de garantia, cuja função social não é proporcionar ao retentor o gozo da coisa mas apenas servir de garantia de pagamento de um crédito, pelo que, em caso de venda coerciva do bem sobre que esse direito incide, tal direito não obsta à apreensão nem à venda do bem, transferindo-se a garantia para o produto da venda. | ||
Reclamações: | |||
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Decisão Texto Integral: | Processo n.º 989/07.9TBMCN-Y.P1 - Apelação Origem: Amarante – Instância Central – Secção Comércio – J2. Relator: Jorge Seabra 1º Adjunto Des. Sousa Lameira. 2º Adjunto Des. Oliveira Abreu * * Sumário: I. A execução específica de contrato-promessa [com eficácia meramente obrigacional] depende, regra geral, da verificação de uma situação de mora, estando afastada nas situações de incumprimento definitivo. II. Encontrando-se o promitente vendedor impossibilitado de efectuar a venda prometida, por ter alienado a terceiro o imóvel objecto mediato do contrato promessa de compra e venda, não poderá, igualmente, o tribunal proferir sentença que produza os efeitos da declaração negocial do promitente-vendedor, o que significa que, independentemente de estarem preenchidos os restantes requisitos legais, não é possível a execução específica do contrato-promessa. III. Segundo a interpretação restritiva do art. 755º, n.º 1 al. f) do Código Civil que emerge do Acórdão Uniformizador de Jurisprudência n.º 4/2014, o credor de uma empresa insolvente com crédito derivado do incumprimento definitivo de contrato-promessa celebrado com a insolvente só pode beneficiar do direito de retenção se, além dos demais requisitos gerais, demonstrar ser consumidor. IV. A Lei de Defesa do Consumidor (Lei n.º 24/96 de 31.07) consagra um conceito restrito de consumidor, segundo o qual é assim considerado o adquirente de bens que não se destinem a uso profissional mas antes a um fim pessoal ou privado, isto é, não integrado no exercício de uma actividade comercial, industrial, artesanal. V. Tendo por objecto o contrato-promessa de compra e venda a futura aquisição de uma fracção autónoma destinada ao exercício do comércio e/ou serviços e estabelecimento de restauração e bebidas o respectivo promitente-comprador não é de considerar como consumidor. VI. O direito de retenção é um direito real de garantia, cuja função social não é proporcionar ao retentor o gozo da coisa mas apenas servir de garantia de pagamento de um crédito, pelo que, em caso de venda coerciva do bem sobre que esse direito incide, tal direito não obsta à apreensão nem à venda do bem, transferindo-se a garantia para o produto da venda. * * Acordam, em conferência, no Tribunal da Relação do Porto:I. RELATÓRIO: 1. Por apenso aos autos de insolvência de “B..., Lda.” veio C..., divorciado, residente na Rua ..., ..., Bloco .., R/C Esquerdo, freguesia e concelho de Penafiel, intentar a presente ação para verificação ulterior de créditos nos termos do artigo 146.º do CIRE, contra “ Insolvente B..., Lda.”, “Massa Insolvente de B..., Lda.” e “ Credores de B..., Lda.”, pedindo, a final, que se reconheça o direito de retenção exercido desde 5 de Maio de 2006 a seu favor sobre a fração A do prédio descrito na Conservatória do Registo Predial de Penafiel, sob o n.º 904/20021015-A, da freguesia ..., concelho de Penafiel, composto pelo R/C, para comércio e/ou serviços e estabelecimento de restauração e bebidas, com arrecadação na cave, sinalizada com a letra da fração e inscrita na matriz predial rústica sob o artigo 623-A, condenando-se os Réus a verem reconhecido o direito de retenção; se declare a separação, ou caso assim não se entenda, a restituição da aludida fração. Alega, para tanto, que em 05.05.2006 “B..., Lda.” celebrou com o Autor e seu irmão, D..., um acordo que intitularam “contrato promessa de compra e venda” relativo à fração A do prédio descrito na Conservatória do Registo Predial de Penafiel sob o nº 904/20021015-A, da freguesia ..., concelho de Penafiel, composto pelo R/C, para comércio e/ou serviços e estabelecimento de restauração e bebidas, com arrecadação na cave, sinalizada com a letra da fração e inscrita na matriz predial rústica sob o artigo 623-A. Por força desse acordo prometeu o Autor comprar a descrita fração pelo montante de € 99.759,00, montante que foi entregue a “B..., Lda.” na data da outorga do aludido acordo. Nessa mesma data a sociedade “B..., Lda.” outorgou a favor do seu irmão D..., uma procuração irrevogável para que ele e seu irmão pudessem realizar a respetiva escritura pública relativa à mencionada fração quando assim o entendessem. Com a outorga do designado “contrato promessa” a “B..., Lda.” entregou as chaves da fração em causa encontrando-se, desde então, a ocupá-la. Na altura da outorga do intitulado “contrato promessa” a empresa “B..., Lda.” obrigou-se a entregar ao autor a documentação necessária para que o mesmo pudesse celebrar a escritura do aludido contrato, nomeadamente a escritura de propriedade horizontal e certidão do seu registo e licença de utilização, todavia nunca logrou o autor celebrar a escritura de compra e venda, desde logo, por a fracção em causa não possuir licença de utilização e, por outro lado, sobre a mesma existir uma penhora. Entretanto por sentença, datada de 17.09.2007, foi a “B..., Lda.” declarada insolvente tendo sido, em 28.04.2008 a descrita fração apreendida em benefício da massa insolvente. Em 28.10.2013 o Senhor Administrador de Insolvência adjudicou a fração em questão a E... pelo valor de € 9500,00. A 14.02.2014 o Administrador da Insolvência na presença da força pública despejou o Autor da fração em causa, todavia recusou-se a sair mantendo no local os seus pertences continuando a usá-la e fruí-la, nela depositando bens, materiais e haveres. * 2. Efectuadas as legais citações, não foi deduzida contestação.* 3. Na ausência de contestação, foi proferido despacho a julgar confessados os factos alegados pelo Autor e oferecidas pelo mesmo alegações escritas.* 4. Efectuada uma tentativa de conciliação entre as partes e decorridos os períodos de suspensão da instância requeridos pelas partes para uma solução amigável do litígio – que não veio a ser alcançada -, foi proferida sentença que julgou improcedente a presente acção, absolvendo os réus do pedido. * 5. Inconformado com sentença proferida, veio o Autor interpor recurso de apelação da mesma, em cujo âmbito deduziu as seguintes CONCLUSÕES ii) Do Erro de Julgamento do tribunal a quo quanto ao facto provado no ponto 16 da sentença- “O senhor Administrador de Insolvência, em representação da massa insolvente, não logrou informar o Autor se iria ou não cumprir com o negócio, de acordo com o preceituado no artigo 102º do CIRE, não obstante, por várias vezes se ter pronunciado sobre o contrato-promessa”. iii) O tribunal a quo não se poderia olvidar do facto de em 02.03.2015, no decurso do prazo de contestação, o senhor Administrador de Insolvência, por requerimento com Ref: 710328, propugnou o seguinte: “Assim, no apenso da apreensão, vamos tomar a posição de requerer a anulação de todo o processado com a apreensão do bem e ainda da sua alienação, pedindo a consequente anulação dos registos de adjudicação na liquidação. Desta forma, o bem fica disponível para o A. da separação – C... - e o adjudicatário receberá da MI o que pagou pela aquisição. Como consequência desta posição, o AJ informa e justifica, que não contestará a presente acção”. iv) Em 14.05.2015, foi proferiu despacho judicial, com Ref: 66728851, com o seguinte teor: “Aguardem os presentes autos a separação da fração autónoma aqui em causa da massa insolvente e sua restituição ao autor (cf. apenso C) atentos os inerentes reflexos na decisão a proferir”. v) Atento ao exposto, foi criada uma expetativa, legitima, no Autor, relativamente à restituição da fração e ao cumprimento do contrato-promessa pelo Senhor Administrador de Insolvência. vi) Assim, na procedência do presente recurso, cumpre revogar a sentença no segmento que foi objecto de impugnação e considerar o PONTO 16) constante dos Factos Provados com a seguinte redação: O senhor Administrador de Insolvência, em representação da massa insolvente, não logrou informar o Autor se iria ou não cumprir com o negócio, de acordo com o preceituado no artigo 102º do CIRE, não obstante, por várias vezes se ter pronunciado sobre o contrato-promessa, tendo em 02.03.2015, por requerimento ao processo, garantido que iria proceder à anulação de todo o processado com a apreensão do bem e ainda da sua alienação, pedindo a consequente anulação dos registos de adjudicação na liquidação. vii) Da obrigatoriedade de Cumprimento do contrato promessa pelo Senhor Administrador de Insolvência entendeu o tribunal a quo “no caso em apreço, as partes não celebraram o contrato-promessa por escritura pública e lhe não atribuíram eficácia real e o Senhor Administrador de Insolvência não optou pelo cumprimento do contrato, tendo a fracção sido alienada a terceiro não pode o autor arrogar-se o direito à separação e restituição do bem da massa insolvente.” viii) Ora, atenta a posição assumida pelo tribunal a quo, entendemos que a mesma é digna de censura porquanto e, por um lado, atendendo aos factos dados como provados e, por outro, atenta à errada interpretação que realizada do artigo 441º 442º, 830º do CCivil e dos artigos 102º a 119º do CIRE. ix) Além do tribunal a quo ter dado como provado no ponto 16, dos factos provados do qual resulta que o Senhor administrador de insolvência, em representação da massa insolvente, não logrou informar o Autor se iria ou não cumprir com o negócio, de acordo com o preceituado no artigo 102.º do CIRE, não obstante por várias vezes se ter pronunciado sobre o contrato-promessa. x) Teve, também, conhecimento que o próprio administrador de insolvência, no âmbito dos presentes autos (já após a venda da fração) veio manifestar vontade na execução do contrato promessa, por requerimento junto aos autos em 02.03.2015, com Ref: 710328. xi) Nessa esteira, o tribunal a quo em 14.05.2015, proferiu o despacho judicial, com Ref: 66728851. xii) Com efeito, não se compreende, de que forma é que o tribunal a quo concluiu pela existência do incumprimento definitivo do contrato-promessa, porquanto não ocorreu, no caso dos presentes autos, a situação da falta de cumprimento ou do incumprimento definitivo, nem a mora verificada se transformou em incumprimento definitivo, propriamente dito, que tem lugar, tão-só, nas três situações tipificadas, nos termos das disposições conjugadas dos artigos 801º, 802º e 808º, nº 1, todos do CCivil. xiii) Assim sendo, o contrato-promessa continuava válido e operante, a vincular ambas as partes. xiv) Por sentença proferida em 17.09.2007, transitada em julgado, o Requerido B..., Lda. foi declarado insolvente. xv) O administrador da insolvência nunca se pronunciou sobre o cumprimento ou incumprimento do contrato promessa até ao momento da citação da massa insolvente para a presente acção, que o fez e por meio de um requerimento, datado de 02.03.2015, com Ref: 710328. xvi) Com efeito, preceitua o artigo 102º, nº 1, do CIRE, a suspensão obrigatória do contrato-promessa, exige o preenchimento de três requisitos, ou seja: 1) a natureza bilateral do contrato, 2) o seu não cumprimento total, por ambas as partes, e 3) a inexistência de regime diferente para os negócios, especialmente, regulados nos artigos seguintes. xvii) Uma vez verificados estes pressupostos e tendo sido declarada a insolvência, o cumprimento do contrato fica, automaticamente, suspenso, sendo, então, atribuídas ao administrador, em alternativa, duas faculdades potestativas, cabendo-lhe optar entre a execução do contrato ou a recusa do seu cumprimento. xviii) Atenta a redação do artigo 106º do CIRE verifica-se que apenas se encontra regulado, de modo directo, a situação do contrato-promessa com eficácia real, ou seja, o artigo 106º nº 1, do CIRE, omite a situação de o beneficiário da promessa sem eficácia real se encontrar na posse da coisa a que se refere o contrato prometido, pelo crédito resultante do não cumprimento imputável à outra parte, nos termos do artigo 442º, hipótese em que lhe é atribuído o direito de retenção, por força do disposto no artigo 755º, nº 1, f), do CCivil, que constitui uma garantia real atendível, em sede de insolvência. xix) Todavia, se o artigo 106º nº 1, do CIRE, só se aplica ao contrato- promessa com eficácia real, numa manifestação da relevância da situação real, já o respectivo nº 2 se reporta a todo o contrato-promessa, com eficácia real ou obrigacional, em que ainda não ocorreu a entrega da coisa ao promitente-comprador, o que é confirmado pela epígrafe do artigo «promessa de contrato» e não «contrato promessa com eficácia real», ao estatuir que “à recusa de cumprimento de contrato-promessa de compra e venda pelo administrador da insolvência é aplicável o disposto no nº 5 do artigo 104º [respeitante à «venda com reserva de propriedade e operações semelhantes»], com as necessárias adaptações, quer a insolvência respeite ao promitente-comprador quer ao promitente-vendedor”, podendo haver recusa de cumprimento, nos termos gerais. xx) Assim, o contrato-promessa de compra e venda, sem eficácia real, não pode ser objecto de recusa de cumprimento se tiver ocorrido a tradição da coisa, a favor do promitente-comprador, de modo que só poderá haver recusa de execução do contrato se não tiver acontecido a entrega da coisa ao mesmo, ou se, tendo-se a mesma verificado, nenhuma das partes tiver cumprido, integralmente, a sua prestação. xxi) Defender-se possibilidade diferente é, com o devido respeito, esquecer que o artigo 106º do CIRE constitui uma situação particular, expressamente, tipificada na lei, que, no aludido artigo 102º, do CIRE, encontra a regra geral da suspensão, obrigatória e automática, do cumprimento do contrato. xxii) Por outro lado, atento ao exposto, o condicionalismo da hipótese versada pela norma do artigo 106º nº 1, não é de molde a podê-la considerar como excepcional, de modo a fundar, a partir dela, um regime oposto, que seria o regime-regra, quando este já existe e consta do artigo 102º nº 1, ambos do CIRE. xxiii) Isto posto, entendemos que o tribunal a quo realizou uma interpretação errada dos artigos 441º, 442º, 830º do CCivil e dos artigos 102º a 119º do CIRE, pelo que merece, nesta parte censura. xxiv) Inexistindo o direito potestativo de recusa do cumprimento pelo administrador de insolvência, ocorre o dever de celebrar o contrato prometido, sob pena da prática de um acto ilícito e culposo. xxv) E, não podendo o administrador da insolvência recusar ao cumprimento do contrato-promessa, terá de proceder a acção, condenando-se os Requeridos, na pessoa do Administrador da Insolvência, a celebrar a correspondente escritura pública de compra e venda da fracção predial em causa, nos termos das disposições conjugadas dos artigos 827º, 830º e 442º, nº 3, do CCivil. xxvi) Com efeito deverá a sentença proferida ser revogada, por uma outra que declare a restituição da fração ao Autor/Recorrente, ordenando-se que o Senhor Administrador de Insolvência cumpra o contrato-promessa, nos termos em que o mesmo foi outorgado, uma vez que não o poderia ter recusado cumprir (nos termos dos dispositivos normativos supra citados), anulando-se todo o processado com a apreensão do bem e ainda da sua alienação, diligenciando no sentido de serem cancelados todos os registos de aquisição relativamente à fração referenciada, realizado na liquidação, restituindo a Massa Insolvente ao E... o que pagou pela aquisição (tal como foi propugnado pelo seu Administrador de Insolvência em 02.03.2015, no Requerimento com Ref: 710328). xxvii) Partindo do pressuposto que existiu incumprimento definitivo do contratopromessa, por parte do Senhor Administrador de Insolvência, o tribunal a quo considerou na douta sentença o seguinte: “No caso vertente, constata-se que o promitente-comprador prometeu comprar a fração A do prédio descrito na Conservatória do Registo Predial de Penafiel sob o n.º 904/20021015- A, da freguesia ..., concelho de Penafiel, composto pelo R/C, para comércio e/ou serviços e estabelecimento de restauração e bebidas, com arrecadação na cave, sinalizada com a letra da fração e inscrita na matriz predial rústica sob o artigo 623-A. que não assume a qualidade de consumidor”. Não detendo, pois, o autor e promitente-comprador a qualidade de consumidor, no caso vertente, atenta a finalidade do contrato promessa outorgado, não pode o mesmo, nos termos expostos, beneficiar, no âmbito do processo de insolvência em que nos situamos, do direito de retenção previsto no artigo 755.º, n.º 1, alínea f), do Código Civil, para satisfação do seu crédito, cujo montante não é reclamado nos presentes autos ” (sublinhado nosso). xxviii) Ora, não obstante o douto tribunal partir da correta noção de consumidor, concluiu de forma errada e oposta à jurisprudência e doutrina invocada. xxix) O direito de retenção é um direito real de garantia que se traduz na faculdade de que goza uma pessoa de reter ou não restituir uma coisa alheia que possui ou detém enquanto não for paga do que lhe é devido, por causa dessa coisa, pelo respectivo proprietário. xxx) O Autor/Recorrente goza do direito de retenção sobre o imóvel, na qualidade de beneficiário da promessa de transmissão do mesmo e respectiva tradição, pelo crédito resultante do não cumprimento imputável à outra parte, nos termos do artigo 442º, por força do disposto pelo artigo 755º nº 1, f), do CCivil. xxxi) Por outro lado, esta norma do artigo 755º nº 1, f), do CCivil, é, também, materialmente, uma norma de tutela do consumidor, pois para que goze do direito de retenção o Recorrente terá de ser incluído no conceito de consumidor. xxxii) A Lei n.º 24/96 define no artigo 2.º, n.º1, consumidor como “todo aquele a quem sejam fornecidos bens, prestados serviços ou transmitidos quaisquer direitos, destinados a uso não profissional, por pessoa que exerça com carácter profissional uma atividade económica que vise a obtenção de benefícios.” xxxiii) Já o Decreto-Lei n.º24/2014, de 14.2 define consumidor, pare efeitos deste normativo, como “a pessoa singular que atue com fins que não se integrem no âmbito da sua atividade comercial, industrial, artesanal ou profissional ”. xxxiv) Este Decreto-Lei transpôs a Diretiva n.º 2011/83/EU do Parlamento e do Conselho, de 25.10.2011, que, no artigo 2.º, define, para efeitos dela mesma: “Consumidor: qualquer pessoa singular que, nos contratos abrangidos pela presente directiva, actue com fins que não se incluam no âmbito da sua actividade comercial, industrial, artesanal ou profissional; Profissional: qualquer pessoa singular ou coletiva, pública ou privada, que, nos contratos abrangidos pela presente directiva, actue, incluindo através de outra pessoa que actue em seu nome ou por sua conta, no âmbito da sua actividade comercial, industrial, artesanal ou profissional.” xxxv) É manifesto que todos estes textos legais conferem ao conceito de consumidor o sentido estrito. Mas fica alguma dúvida sobre a opção pela distinção que fizemos dentro do conceito estrito, parecendo até pela definição de “profissional” constante da diretiva – que não passou para o texto de origem interna, mas que será de atender em obediência ao princípio da interpretação conforme – que a exclusão se situa só nos casos em que a aquisição, posse, ou uso faz parte da própria atividade profissional. xxxvi) A inclusão do consumidor no Acórdão Uniformizador do STJ de 20.3.2014 (citado na sentença recorrida) apoiou-se, como da fundamentação consta, no que defende Miguel Pestana de Vasconcelos, em Cadernos de Direito Privado, n.º33, 3 e seguintes: “consumidor a pessoa singular que actue para a prossecução de fins alheios ao âmbito da sua actividade profissional, através do estabelecimento de relações jurídicas com quem, pessoa singular ou colectiva, se apresenta como profissional.” referido relativamente às pessoas coletivas. xxxvii) O próprio texto do Acórdão Uniformizador fornece na nota n.º 10 elementos que permitem vislumbrar o que se quis incluir e excluir quando se inseriu o conceito na parte da uniformização. xxxviii) Do texto do Acórdão Uniformizador, conjugado com o que vimos referindo em abstrato, cremos poder concluir que do conceito de “consumidor” inserto no texto da uniformização só está excluído aquele que adquire o bem no exercício da sua atividade profissional de comerciante de imóveis. xxxix) No caso em apreço, o Autor/Recorrente não exerce qualquer actividade profissional no ramo imobiliário ou construção. xl) Por isso, não releva no sentido da exclusão que a fração prometida comprar pelo Recorrente seja “para comércio e/ou serviços e estabelecimento de restauração e bebidas” e não para habitação. xli) Atento ao exposto, se se considerar que o senhor administrador de insolvência recusou o cumprimento do contrato-promessa, terá de proceder a acção, no sentido de ser reconhecido ao Autor/Recorrente do direito de retenção previsto no artigo 755º, nº1, al. f) do CCivil, para satisfação do seu crédito, no valor de € 99.750,00 (uma vez que foi dado como provado que o preço da fração foi paga ao Requerido/Insolvente – facto 3 dos factos dados como provados), detendo o Autor/Recorrente a qualidade de consumidor final. xlii) A sentença recorrida fez uma errada interpretação do artigo 755º nº 1 al. f) do CCivil, bem como concluiu, de forma, totalmente, contrária ao sustentado pelo STJ, no Acórdão Uniformizador de Jurisprudência. * 6. Não foram oferecidas contra-alegações. * 7. Foram cumpridos os vistos legais.* II- FUNDAMENTOS:O objecto do recurso é delimitado pelas conclusões da alegação do recorrente, não podendo este Tribunal conhecer de matérias nelas não incluídas, a não ser que as mesmas sejam de conhecimento oficioso - cfr. arts. 635º, nº 3, e 639º, nsº 1 e 2, do novo Código de Processo Civil, na redacção emergente da Lei n.º 41/2013 de 26.06 [doravante designado apenas por CPC]. * No seguimento desta orientação, as questões a decidir no presente recurso são as seguintes:a)- da alteração do ponto 16 dos factos provados na sentença recorrida; b)- do cumprimento específico do contrato promessa; c)- do incumprimento do contrato promessa e do direito de retenção do autor; d)- do direito à restituição ou separação do imóvel objecto (mediato) do contrato promessa. * II.I. FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO:O Tribunal de 1ª instância julgou factualmente a causa nos seguintes termos: 1 - Em 05.05.2006 B..., Lda. celebrou com o Autor e seu irmão, D..., um contrato que designaram “contrato promessa de compra e venda”. 2 - Por esse contrato, o Autor prometeu comprar a B..., Lda. e esta prometeu vender a fracção A do prédio descrito na Conservatória do Registo Predial de Penafiel sob o n.º 904/20021015-A, da freguesia ..., concelho de Penafiel, composto pelo R/C, para comércio e/ou serviços e estabelecimento de restauração e bebidas, com arrecadação na cave, sinalizada com a letra da fração e inscrita na matriz predial rústica sob o artigo 623-A. 3 - As partes convencionaram o preço de € 99.759,00 (noventa e nove mil, setecentos e cinquenta e nove euros), que foi entregue à sociedade B..., Lda. na data da outorga do intitulado “contrato - promessa”. 4 - Na data referida em 1. a sociedade promitente-vendedora passou a favor do irmão do Autor uma procuração irrevogável para que o Autor e seu irmão pudessem realizar a respectiva escritura pública do contrato prometido de compra e venda quando assim entendessem. 5 - Com a outorga do intitulado contrato promessa, a promitente-vendedora B..., Lda. entregou as chaves da fração ao Autor, encontrando-se o mesmo a ocupar a fração desde então. 6 - Desde 05 de Maio de 2006 que o Autor se encontra, de forma exclusiva, a usar, fruir e administrar a dita fração, ocupando-a, reparando-a, conservando-a, nela depositando bens, materiais e haveres, dele retirando todos os seus frutos e rendimentos à vista de todas as pessoas e sem oposição de quem quer que seja de forma ininterrupta e consecutiva, na convicção de que a fração lhes pertencia. 7 - Tendo celebrado contratos de fornecimento de água, electricidade e gás, relativos à fracção e pago as respectivas facturas e as contribuições para as despesas do condomínio. 8 - Com a outorga do intitulado contrato-promessa, a sociedade promitente-vendedora obrigou-se a entregar ao Autor a documentação necessária, para este pudesse celebrar a escritura compra venda do contrato prometido, nomeadamente a escritura de propriedade horizontal e certidão do seu registo e a licença de utilização. 9 - A promitente-vendedora do prédio referido em 2. não entregou ao Autor os documentos referidos em 9., o que inibiu-o de celebrar a escritura de compra e venda, porque a referida fracção não tinha a devida licença de utilização. 10 - Quando o Autor pretendia outorgar a escritura pública de compra e venda da fracção descrita em 2., constatou que existia uma penhora, constando como sujeito passivo F.... 11 - O Autor prometeu comprar e a promitente-vendedora prometeu vender a fracção referida em 2, sem ónus ou encargos e desde que a mesma tivesse concluído as obras, com a emissão pelo órgão competente da licença de utilização. 11 - Encontra-se registado pela Ap. 18/10072006 o intitulado contrato- promessa referido em 1. 12 - O Autor foi sucessivamente renovando o registo da sua aquisição, ainda que provisória. 13 - Por sentença judicial datada de 17.09.2007, a promitente vendedora foi declarada insolvente no âmbito do processo 989/07.9TBMCN, a correr termos no 2º juízo do Tribunal Judicial do Marco de Canavezes. 14 - Em 14 de Maio de 2008, o irmão do Autor, D..., informou os autos de insolvência do negócio celebrado. 15 - Em 28.04.2008, o imóvel descrito em 2. foi apreendido em benefício da massa insolvente, tendo sido essa apreensão registada em 2008.07.02, pela AP 40., ficando o registo provisório por natureza. 16 - O Senhor administrador de insolvência, em representação da massa insolvente, não logrou informar o Autor se iria ou não cumprir com o negócio, de acordo com o preceituado no artigo 102.º do CIRE, não obstante por várias vezes se ter pronunciado sobre o contrato-promessa. 17 - Em 28.10.2013 o Sr. Administrador de insolvência adjudicou o prédio a E..., pelo valor de € 9.500,00. 18 - Em 14 de Fevereiro de 2014, o Administrador de insolvência, na presença da força pública despejaram o Autor do imóvel. 19 – O Autor recusou-se a sair do imóvel continuando a ocupar, usar, fruir, nele depositando bens materiais e haveres, bem como guardando vários pertences. * III- FUNDAMENTAÇÃO JURÍDICA.A. Da alteração da factualidade provada. A primeira questão suscitada pelo apelante, refere-se, como resulta das conclusões do recurso, à alteração da factualidade provada sob o ponto 16 do elenco da sentença recorrida, invocando, neste conspecto, o mesmo apelante o teor do requerimento do Sr. Administrador a fls. 61 dos autos. Neste sentido, pugna o apelante que, além da factualidade já constante do dito ponto 16. seja, ainda, aditado que o mesmo Administrador a 2.03.2015, por requerimento ao processo [o aludido requerimento a fls. 61 dos autos], garantiu que iria proceder à anulação do processado com a apreensão do bem e ainda da sua alienação, pedindo a consequente anulação dos registos de ajudicação na liquidação. Nesta matéria, cumpre dizê-lo, não se vê que da factualidade que ora se pretende ver aditada resulte um qualquer efeito relevante em sede de solução jurídica do pleito. De facto, como bem se compreende – e resulta evidenciado dos demais factos provados e das próprias diligências que o tribunal a quo encetou com o propósito de obter uma composição amigável do litígio -, a circunstância de o Sr. Administrador ter suscitado ou aventado, no processo, a possibilidade de «anulação» da adjudicação do imóvel efectuada no apenso de liquidação dos bens da massa insolvente [imóvel esse que constitui o objecto mediato do contrato promessa de compra e venda em que o ora autor figura como promitente comprador e cujo incumprimento constitui o fundamento da presente acção] não prejudica, nem anula o facto indesmentível [vide ponto 18. da sentença recorrida] de o imóvel prometido vender a 5.05.2006 ao aqui autor pela sociedade “B..., Lda. “ [vide pontos 1. e 2. da mesma sentença] ter sido vendido/adjudicado por aquele Administrador da Insolvente “B..., Lda. “, a 28.10.2013, a um terceiro, E..., no âmbito da liquidação dos bens que tinham sido apreendidos a favor da massa insolvente, nele se incluindo o aludido imóvel [prometido vender ao aqui autor] que era, à data da declaração de insolvência, propriedade da sociedade promitente vendedora cuja insolvência foi decretada a 17.09.2007. Ora, a sobredita factualidade – que se mostra provada em conformidade com o alegado pelo próprio autor e por via da ausência de contestação – torna seguro, a nosso ver, que, de facto, o Sr. Administrador, sem prejuízo das diligências que julgou dever encetar para «reverter» o status quo ante e das expectativas que o autor criou a partir desse cenário ou dessa eventualidade, incumpriu definitivamente o ajuizado contrato promessa de compra e venda antes outorgado entre a dita sociedade (posteriormente declarada insolvente) e o aqui autor, enquanto, respectivamente, promitente-vendedora e promitente-comprador. Com efeito, ainda que de forma tácita, mas concludentemente – isto é, sem que restem quaisquer dúvidas sobre o significado de tal conduta, analisada de um ponto de vista objectivo e exterior -, o Sr. Administrador, ao alienar a favor de terceiro o imóvel prometido vender, colocou-se numa situação de impossibilidade (jurídica) de cumprir a aludida promessa, o que equivale, como se sabe, ao incumprimento definitivo do contrato (arts. 798º e 801º, n.º 1 do Cód. Civil). É que decorrendo da mera celebração do contrato de compra e venda como seu efeito a transmissão da propriedade do respectivo objecto para o adquirente (cfr. arts. 408º, n.º 1 e 879º, al. a) do Cód. Civil), em tais circunstâncias, seria impossível – pelo menos, sem o acordo do terceiro adquirente no sentido da reversão do negócio – ao Sr. Administrador honrar a promessa em apreço, celebrando o prometido/definitivo contrato de compra e venda com o aqui autor, relativamente a um bem do qual já não tinha (por o ter alienado a terceiro) a respectiva disponibilidade jurídica. Uma tal venda seria nula por ser reportar a um bem alheio, não pertencente já, a partir da data da alienação/ajudicação, à sociedade insolvente, mas a um terceiro, o aludido E.... Com efeito, conforme vem sendo reiterado pela doutrina e pela jurisprudência, estando em causa – como ora sucede – um contrato promessa de compra e venda com efeitos meramente obrigacionais [sem eficácia real], a venda do imóvel (prometido vender) a favor de um terceiro por parte do promitente vendedor equivale a uma declaração inequívoca da intenção de não cumprir a promessa, pois que, em tais circunstâncias, se torna inviável/impossível, como se referiu, o cumprimento da promessa por parte do promitente alienante. [1] Ora, se assim é, seguro se nos apresenta que a factualidade em apreço não teria que figurar no elenco dos factos provados da sentença recorrida, pois que a mesma não assume, como se expôs, relevo para a solução jurídica do pleito e, naturalmente, para a própria decisão da causa, sendo certo, ademais, que sempre esse requerimento poderia ser convocado em sede argumentativa pois que se mostra comprovado documentalmente nos autos por via do requerimento junto aos mesmos. Como assim, à luz do exposto, improcedem as conclusões ii) a vi) da apelação e a reclamação/impugnação quanto à factualidade provada e elencada na sentença recorrida, factualidade que é de manter. * * B. Do cumprimento específico ou execução específica do contrato promessa de compra e venda – Incumprimento definitivo/mora no cumprimento da promessa de compra e venda.O segundo tema colocado sob apreciação no presente recurso reconduz-se, no essencial, às questões do cumprimento e/ou incumprimento do contrato promessa com efeitos meramente obrigacionais e suas consequências, ao nível da execução específica de tal contrato, tudo no quadro da insolvência do promitente vendedor. Neste conspecto, ter-se-á como adquirido que o negócio celebrado a 5.05.2006, entre o autor (e ora recorrente) e a sociedade “B..., Lda.”, se consubstancia num contrato promessa (bilateral) de compra e venda, mediante o qual, o dito autor, declarou prometer comprar a “B..., Lda.”, que, por seu turno, declarou prometer vender a fracção A do prédio descrito na Conservatória do Registo Predial de Penafiel sob o n.º 904/20021015 – A, da freguesia ... - Penafiel, composto de r/c, para comércio e/ou serviços e estabelecimento de restauração e bebidas, pelo preço de € 99. 759, 00, preço que foi integralmente pago à promitente sociedade na data da outorga do negócio. Vide factos provados em 1., 2., 3. De facto, como é consabido, o contrato – promessa consiste, precisamente, na convenção pela qual uma das partes ou ambas (promessa unilateral ou bilateral) se obrigam a celebrar no futuro determinado negócio jurídico – art. 410º, n.º 1 do Cód. Civil. Desta forma, em termos essenciais, o contrato promessa cria uma obrigação de contratar, isto é a obrigação (de uma ou ambas as partes) de emitir no futuro a declaração de vontade correspondente ao contrato prometido celebrar, que poderá ser, como ora sucede, de compra e venda. [2] Por outro lado, ainda, ter-se-á por assente que o ajuizado contrato promessa de compra e venda não possui, como se referiu, eficácia real, pois que para além de do mesmo não constar qualquer declaração das partes no sentido da atribuição de tal efeito real, além disso a promessa não foi submetida à forma específica exigida para tal fim, qual seja escritura pública ou documento particular autenticado – cfr. arts. 413º e 875º do Cód. Civil. Dito isto, no que se refere, em termos gerais, ao cumprimento contratual, preceitua o art. 762º do Cód. Civil que «o devedor cumpre a obrigação quando realiza a prestação a que está vinculado»; Ao invés, o devedor incorre em não cumprimento «lato sensu» da obrigação quando não realize a prestação a que está adstrito ou quando a realização da prestação não satisfaz, de pleno, os interesses do credor. Todavia, dentro da figura do não cumprimento «lato sensu» impõe-se a distinção entre a mora ou atraso na realização da prestação e, por outro, o não cumprimento definitivo da prestação, além, ainda, da categoria do cumprimento defeituoso. [3] Neste particular, como vem sendo salientado entre a nossa doutrina e jurisprudência, ao lado dos casos em que a prestação, não tendo sido efectuada, já não é realizável no contexto da obrigação, porque se tornou impossível ou porque, sendo ainda materialmente possível, deixou de possuir interesse para o credor – incumprimento definitivo –, outros existem em que a prestação não foi executada no momento próprio, mas ainda é possível, por continuar a corresponder ao interesse do credor – atraso ou mora no cumprimento. No caso do contrato promessa e em face do regime específico associado ao seu incumprimento «lato sensu», a destrinça entre as hipóteses de não cumprimento definitivo ou mora assume especial relevo, pois que, como é consabido, a cada uma das ditas hipóteses, assinala a nossa lei civil efeitos distintos, em específico quanto à questão da restituição do «sinal» em dobro ou – como ora releva - da execução específica da promessa. De facto, como é posição pacífica na doutrina e na jurisprudência, o efeito sancionatório previsto no art. 442º, n.º 2 do Cód. Civil quanto à restituição do sinal em dobro apenas pode ser desencadeado pelo promitente fiel em caso de resolução por incumprimento definitivo da promessa imputável à parte contrária, mas já não perante a simples mora ou atraso no seu cumprimento. [4] Por seu turno, segundo a mesma doutrina e jurisprudência, a execução específica da promessa supõe, ao invés, uma situação de mora ou retardamento na realização da prestação, sendo de afastar nas hipóteses de incumprimento definitivo do contrato promessa. [5] Feitas estas considerações prévias, e no que se refere à pretensão da execução específica do ajuizado contrato promessa, várias razões militam para o afastamento claro da pretensão do recorrente. In limine, avulta, desde logo, a circunstância de em nenhum momento dos autos e, em especial, na sua sede própria (petição inicial), o ora recorrente ter suscitado a questão da execução específica do ora ajuizado contrato promessa, no sentido de pretender da parte do Sr. Administrador a celebração do prometido contrato de compra e venda. Com efeito, como se lê da aludida peça processual, em nenhum momento e, em especial, no petitório final, formulou o autor e ora recorrente a pretensão da execução específica do contrato promessa por parte do administrador da insolvente e promitente vendedora, concretamente através da emissão pelo tribunal da declaração de venda omitida pelo promitente faltoso. Neste conspecto, como é consabido, a execução específica traduz-se, precisamente, na obtenção de decisão judicial que supra «os efeitos da declaração negocial do faltoso», isto é da emissão de uma sentença substitutiva do contrato final. [6] Aliás, sintomático disto mesmo é o facto de a sentença recorrida não ter – e bem, pois que tal pedido não se mostra formulado nos autos – conhecido da questão da execução específica do ajuizado contrato promessa e do seu deferimento/indeferimento, antes reconduzindo o objecto do litígio [tal como delineado pelo autor] às pretensões formuladas pelo mesmo, quais sejam o direito de retenção sobre o imóvel prometido vender (enquanto direito real de garantia do crédito decorrente do incumprimento definitivo do contrato promessa) – vide pedido formulado em a) do petitório – e o direito à separação ou restituição do imóvel em face da massa insolvente – vide pedido formulado em b) do petitório. [7] Ora, sendo assim, torna-se evidente que a pretensão de execução específica do ajuizado contrato promessa, mostrando-se suscitada e formulada apenas nesta fase recursiva, consubstancia nova questão, pois que não foi colocada na fase declarativa e em 1ª instância, única sede em que o podia ter sido para poder ser, primeiro, dirimida na sentença proferida em 1ª instância e ora reapreciada por este tribunal ad quem. Com efeito, neste conspecto, conforme vem sendo posição unânime da jurisprudência, o sistema português, em matéria de recursos, segue o modelo do recurso de revisão ou reponderação e não da revisão da instância. «Daí o tribunal ad quem produzir um novo julgamento sobre o já decidido pelo tribunal a quo, baseado nos factos alegados e nas provas produzidas perante este. Os juízes da 2ª instância, ao proferirem a sua decisão estão numa situação idêntica à do juiz de 1ª instância no momento de editar a sua sentença, valendo também para a 2ª instância as preclusões ocorridas na 1ª.» Neste contexto, refere, ainda, F. AMÂNCIO FERREIRA, «…os recursos são os meios para obter o reexame de questões já submetidas à apreciação dos tribunais inferiores, e não para criar decisões sobre matéria nova, não submetida ao exame do tribunal de que se recorre.» [8] Em consequência, por via desta regra de preclusão aplicável a este tribunal ad quem, a pretensão de execução específica seria, liminarmente, de afastar no caso dos autos. Mas, ainda, outra razão avulta para, no caso dos autos, justificar, de forma evidente, a improcedência de tal pretensão quanto à execução específica da promessa. De facto, como já antes se deixou consignado e decorre do ensinamento uniforme da doutrina e da jurisprudência [a que já fizemos referência sob a nota 5], a execução específica só colhe fundamento legal na hipótese de mora ou atraso no cumprimento da prestação a cargo do promitente vendedor, mas já não nas hipóteses de incumprimento definitivo da promessa, «maxime» quando esse incumprimento definitivo assume a vertente ou a modalidade de impossibilidade (jurídica) de cumprimento da promessa, como ora sucede por força da venda/ajudicação do imóvel prometido vender a um terceiro. De facto, como bem se alcança, sendo impossível ao promitente vendedor cumprir a promessa – pois que alienou o bem prometido vender a um terceiro - o mesmo sucede, necessariamente, com o tribunal, que não pode, em sede de execução específica e de substituição da declaração de venda do promitente vendedor faltoso, sob pena de incorrer em venda de bem alheio, suprir a declaração de vontade daquele promitente. Com efeito, o tribunal só se pode substituir ao devedor faltoso no caso de este se recusar a celebrar o contrato prometido, podendo fazê-lo; Assim, se o promitente faltoso não poder, no momento, validamente, e sem mais, celebrar o contrato prometido, também não poderá o tribunal suprir a sua omissão, mediante uma sentença produtora de iguais efeitos. [9] Neste mesmo sentido, refere ANA PRATA [10] que, «como decorre dos princípios gerais (…) ainda que se considere que o não cumprimento é pressuposto de recurso ao instrumento da execução específica, sempre esse não cumprimento é apenas aquele que for temporário, pois que, se já existir definitivo inadimplemento – qualificado ou não por impossibilidade -, a execução específica encontra-se então precludida.» [sublinhados nossos] Pela mesma posição alinha, ainda, de forma lapidar, L. MENEZES LEITÃO [11], quando refere que «a execução específica deixa de ser possível, a partir do momento em que se verifique uma impossibilidade definitiva de cumprimento, como no caso de o bem que se prometeu vender já ter sido alienado a um terceiro. Efectivamente, nesse caso, a sentença judicial já não poderia produzir os efeitos de um contrato definitivo válido, mas antes os efeitos de uma venda de bens alheios nula (arts. 892º e ss.), o que não é admissível.» [sublinhados nossos] Assim, ainda por esta outra razão, a execução específica da ajuizada promessa seria de afastar. Mas, ainda, que não se colhessem os argumentos antes expostos para afastar a visada execução específica da promessa, um último, ainda, se poderia invocar. Como é consabido, no âmbito do contrato promessa de compra e venda, considera o legislador no art. 441º do Cód. Civil que é de presumir [presunção iuris tantum] que tem caracter de sinal toda a quantia entregue pelo promitente-comprador ao promitente vendedor, ainda que a título de antecipação ou princípio de pagamento do preço.» No caso em apreço, nada tendo sido alegado pelo autor em contrário por forma a ilidir a dita presunção de caracter de sinal das quantias entregues pelo promitente-comprador ao promitente vendedor, resulta da factualidade provada que, a título de antecipação (total) do preço pela aquisição do bem prometido vender, o autor pagou á então promitente-vendedora (ora insolvente) a quantia de € 99.750, 00. Como assim, a dita quantia é de presumir – por presunção não ilidida – como tendo a natureza de sinal, sendo certo que, como já se viu, estamos na presença de um contrato promessa bilateral de compra e venda. – cfr. art. 441º do Cód. Civil. Ora, sendo assim, resulta, ainda, do preceituado no art. 830º, n.ºs 1 e 2 do Cód. Civil que, existindo – como é o caso -, sinal passado, este equivale a convenção em sentido contrário à aplicação da execução específica do contrato-promessa. Neste sentido, embora censurando a opção legislativa, refere J. CALVÃO da SILVA [12] que «a existência de sinal no contrato-promessa faz presumir convenção contrária à execução específica (art. 830º, n.º 2). Será, portanto, na presunção iuris tantum da lei, um sinal penitencial, correspectivo do direito de desistência ou retractação da promessa. Não só se presume, embora relativamente, que tem caracter de sinal toda a quantia entregue pelo promitente-comprador ao promitente vendedor, ainda que a título de antecipação ou princípio de pagamento do preço (art. 441º), como ainda esse sinal se presume penitencial no art. 830º, n.º 2», ou seja, dito de outra forma, presume-se que, em caso de incumprimento da promessa, as partes atribuíram à existência do sinal um valor específico: o de ser o único efeito do incumprimento, afastando, em tal hipótese, o recurso à execução específica.» [13] [sublinhado nosso] Como assim, por força das sobreditas razões, e por via de qualquer uma das mesmas, sempre terá que improceder esta (nova) pretensão do recorrente quanto à execução específica do contrato-promessa invocado nos autos e, por inerência, as conclusões vii) a xxvi) da apelação que lhe subjazem, sendo certo que o específico regime insolvencial do contrato promessa, convocado pelo recorrente, não afasta ou prejudica – bem pelo contrário - os aspectos antes referidos do regime legal civilístico do contrato promessa. Improcede, pois, nesta parte, a apelação. * * C. Incumprimento definitivo do contrato promessa – Direito de Retenção – Consumidor.Como resulta já do antes exposto, a situação dos autos reconduz-se ao incumprimento definitivo de contrato promessa bilateral de compra e venda, com efeitos meramente obrigacionais, em que o promitente-comprador obteve a tradição do bem (imóvel) objecto mediato da promessa. A situação ora em apreço – supondo, à partida, que o contrato-promessa se encontra «em curso de execução» à data da declaração de insolvência [no sentido de que não se mostra definitivamente incumprido ou resolvido à data da declaração de insolvência do promitente-vendedor], como se refere na sentença recorrida e nas alegações do recorrente, foi objecto de pronúncia recente por parte do Supremo Tribunal de Justiça no seu Acórdão Uniformizador n.º4/2014 de 20.03.2014. [14] Ora, sobre esta matéria ali se consignou, no segmento uniformizador, que «no âmbito da graduação de créditos em insolvência o consumidor promitente-comprador em contrato, ainda que com eficácia meramente obrigacional com traditio, devidamente sinalizado, que não obteve o cumprimento do negócio por parte do administrador da insolvência, goza do direito de retenção nos termos do estatuído no artigo 755º, n.º 1 alínea f) do Código Civil.» [sublinhados nossos] Em suma, no que ora releva, e ultrapassando as várias querelas doutrinais e jurisprudenciais sobre o tema – que nos escusamos aqui a repetir, remetendo para a sua recensão constante do acórdão do STJ -, deste aresto uniformizador resulta, por um lado, que, na hipótese ora em apreço (promessa obrigacional com tradição da coisa e com prestação de sinal) se reconhece ao promitente- comprador, em caso de incumprimento definitivo do contrato promessa por parte do administrador da insolvência, o direito indemnizatório correspondente ao dobro do sinal passado e, por maioria de razão, à restituição do seu valor em singelo (art. 442º, n.º 2 do Cód. Civil), como, ainda, em especial, para o caso que ora nos ocupa, se reconhece ao mesmo promitente-comprador consumidor o direito de retenção, previsto no art. 755º, n.º 1 al. f) do Cód. Civil, enquanto garantia real do crédito emergente do citado incumprimento da promessa. Com efeito, não obstante as vozes discordantes quanto à interpretação restritiva do art. 755º, n.º 1 al. f) do Cód. Civil, interpretação que, na hipótese de insolvência do promitente-vendedor, conduziu ao reconhecimento do citado direito de retenção apenas e só a favor do promitente-comprador consumidor [15], dúvidas não subsistem que que foi esta interpretação restritiva, na senda da posição defendida na doutrina por L. MIGUEL de VASCONCELOS, que vingou no aludido acórdão uniformizador e que assim se nos impõe. [16] Neste sentido, refere-se, de forma expressa, entre outros, no AC STJ de 14.02.2017, no AC STJ de 5.07.2016 e no AC STJ de 24.05.2016 [17], todos posteriores ao aludido AC UJ, que «nos termos do acórdão de Uniformização de Jurisprudência n.º 4/2014, o credor de uma empresa insolvente com crédito derivado de um contrato promessa celebrado com a insolvente e não cumprido (…), só pode beneficiar do direito de retenção previsto no art. 755º, al. f) do Cód. Civil, se demonstrar ser consumidor.» [sublinhado nosso] Sendo assim, e tendo presente que os acórdãos de uniformização de jurisprudência, apesar de não disporem de força obrigatória geral, criam um precedente qualificado de carácter persuasivo, a desconsiderar apenas com fundamentos em fortes razões ou especiais circunstâncias que não tenham sido suficientemente ponderadas [18]– o que, no caso dos autos, não se vislumbra -, segue-se, logicamente, que a única questão que importa dirimir, para efeitos de conhecimento do direito de retenção invocado pelo recorrente é, como já dirimido – e bem – na sentença recorrida, é saber se o mesmo recorrente (promitente-comprador) é de considerar consumidor para efeitos do preceituado no art. 755º, nº 1 al. f) do Cód. Civil, na sobredita interpretação acolhida pelo Acórdão Uniformizador n.º 4/2014. Neste conspecto, a primeira nota que se impõe deixar expressa é que, como reconhecido de forma expressa nos antes citados arestos do STJ de 24.05.2016 e 5.07.2016, o aludido AC UJ n.º 4/2014 não incluiu no seu segmento uniformizador o conceito de consumidor. De facto, se é certo que pelo texto da fundamentação do aresto uniformizador se depreende que ali se teve em vista e presente o conceito restrito de consumidor – afastando, pois, do âmbito de aplicação do segmento uniformizador as situações em que a actuação vise fins que se incluam no âmbito da actividade comercial, industrial, artesanal ou profissional do contratante -, certo é que a noção de consumidor, na sua dimensão ou sentido normativo aplicáveis, não foi ali fixada ou determinada em termos uniformes. Como assim, importa, no caso dos autos, determinar a noção relevante de consumidor, por forma a colher do alegado direito de retenção do recorrente/promitente-comprador. Vejamos. A Lei n.º 24/96 de 31.07 (Lei de Defesa do Consumidor - LDC) define consumidor como «todo aquele a quem sejam fornecidos bens, prestados serviços ou transmitidos quaisquer direitos, destinados a uso não profissional, por pessoa que exerça com carácter profissional uma actividade económica que vise a obtenção de benefícios.» Por seu turno, o DL n.º 24/2014 de 14.02. ao transpor a Directiva 2011/83/EU do Parlamento e do Conselho, de 25.10.2011, que, no seu art. 2º, define, para os efeitos nela consignados, que é considerado «consumidor: qualquer pessoa singular que, nos contratos abrangidos pela presente directiva, actue com fins que não se incluam no âmbito da sua actividade comercial, industrial, artesanal ou profissional;» veio a fazer constar como consumidor «a pessoa singular que actue com fins que não se integrem no âmbito da sua actividade comercial, industrial, artesanal ou profissional.» Ao nível da doutrina, salienta J. CALVÃO da SILVA [19], que, em sentido estrito, consumidor é apenas aquele que adquire, possui ou utiliza um bem ou um serviço para uso privado (pessoal, familiar ou doméstico), de modo a satisfazer as necessidades pessoais e familiares, mas já não o que obtém ou utiliza bens e serviços para satisfação das necessidades da sua profissão ou da sua empresa. Como dá nota o Il. Professor é esta última noção a mais corrente e generalizada, sendo, nessa perspectiva, consumidor o adquirente, possuidor ou utilizador de bens de consumo ou de serviços destinados ao seu uso pessoal, familiar ou doméstico, portanto ao seu uso privado, não ao seu uso profissional. Em sentido similar sustenta J. MORAIS de CARVALHO [20], que o conceito restrito de consumidor exclui do seu âmbito «todas as pessoas, físicas ou jurídicas, que atuam no âmbito de uma atividade profissional, independentemente de terem ou não conhecimentos específicos no que respeita ao negócio em causa. Incluem-se, contudo, no conceito as pessoas jurídicas que não destinem o bem a uma atividade profissional, como associações ou fundações. Encontram-se igualmente incluídas as pessoas que, apesar de terem conhecimentos específicos no que respeita ao negócio em causa, atuam fora do âmbito de uma actividade profissional.» Em suma, segundo cremos, à luz da melhor doutrina, será de perfilhar um conceito restrito de consumidor, nele se contemplando apenas o adquirente de bens que não os destine a um uso profissional mas antes a um fim pessoal ou privado, isto é, não integrado no exercício de uma actividade comercial, industrial, artesanal ou profissional. [21] Ora, dito isto, no caso dos autos, e não obstante a reduzida factualidade alegada pelo autor [que não indica a sua profissão ou a actividade empresarial/individual a que se dedica ou, ainda, o concreto uso ou fim pretendido com uma eventual aquisição do imóvel em apreço], certo é que a fracção prometida vender destina-se, conforme se alcança da respectiva certidão do registo predial e dos factos provados (ponto 2.), a «comércio e/ou serviços e estabelecimento de restauração e bebidas». Ora, sendo este o destino ou finalidade legalmente consentida da fracção prometida vender – e já não, v.g., a habitação –, estamos em crer que o promitente adquirente da sobredita fracção – que a destinará, pois, em conformidade com a funcionalidade que lhe foi atribuída, a comércio/serviços ou estabelecimento de restauração e bebidas, não pode ser, na hipótese de que versam os autos – insolvência do promitente-vendedor -, considerado, como já declarado na douta sentença recorrida, como consumidor, pois que não é, manifestamente, o interesse social associado ao exercício de uma actividade comercial o que subjaz à protecção concedida pelo direito de retenção. Dito de outra forma, as razões que justificam a particular protecção dedicada ao adquirente-consumidor encontram-se associadas a uma noção de parte contratante mais débil, menos protegida – com menor capacidade de negociação, com menor informação e inferior protecção dos seus próprios interesses em face do contratante profissional -, o que não ocorre, a nosso ver, com alguém, como ora recorrente, que adquire uma fracção autónoma para, segundo a função que lhe é legalmente reconhecida e atribuída, a aplicar para o exercício do comércio, prestação de serviços ou instalação de um estabelecimento comercial de restauração e bebidas ou, ainda, para, eventualmente, proceder à sua alienação, com fins lucrativos; Neste conspecto, aliás, os autos nada dizem sobre a concreta aplicação a que o autor destinará a fracção em apreço, mas, em face das aplicações legalmente possíveis, apenas se vislumbram as hipóteses já referidas, ou seja a aplicação para o exercício pelo autor (ou por outrem, com o seu consentimento/autorização) de comércio, prestação de serviços, instalação de estabelecimento de restauração e bebidas ou, em alternativa, a sua alienação, com fins lucrativos. Como assim, a nosso ver, à luz do acórdão uniformizador já citado e da interpretação restritiva que o mesmo consagrou expressamente não poderá, pois, o recorrente, não se encontrando demonstrada a sua qualidade de consumidor (cujo ónus de prova lhe incumbe), beneficiar do arrogado direito de retenção e para garantia do crédito pelo incumprimento definitivo da promessa de compra e venda em apreço nos autos. Com efeito, e resumindo a nossa posição na matéria – tal como a mesma decorre do sentido normativo do acórdão n.º 4/2014 quanto ao direito de retenção previsto no art. 755º, n.º 1 al. f) do Cód. Civil -, não sendo o promitente-comprador consumidor não se verificam relativamente ao mesmo as razões sociais que justificam a preferência na satisfação do seu crédito em detrimento do credor hipotecário e/ou dos demais credores comuns do insolvente. Aliás, neste conspecto, e ao contrário do que sustenta o recorrente, a sentença recorrida efectuou, a nosso ver, a devida e correcta interpretação do citado acórdão uniformizador n.º 4/2014, o qual, como já antes se referiu, tomou expressa posição quanto à questão da interpretação normativa do art. 755º, n.º 1 al. f) do Cód. Civil e, em particular, quanto à exigência de que o promitente-comprador, para poder beneficiar do direito de retenção, seja considerado como consumidor, sendo certo, ainda, que o dito acórdão não tomou já posição normativa (e uniformizadora) quanto a este último conceito, embora tenha tido presente a sua noção mais restrita. Com efeito, como dá nota MARIA do ROSÁRIO EPIFÂNIO [22], o aludido acórdão uniformizador n.º 4/2014, pronunciou-se, sobre as seguintes questões: (1ª) «a sujeição do contrato-promessa meramente obrigacional, com tradição da coisa, ao disposto no art. 106º, n.º 2 [do CIRE]; (2ª) o direito do promitente-comprador a uma indemnização e qual o regime desse crédito; (3ª) a existência de um direito de retenção e qual o seu âmbito subjetivo.» E prossegue a mesma autora, referindo que quanto à segunda questão, o citado acórdão toma posição no sentido de que «o incumprimento do contrato-promessa pelo administrador enquadra-se no regime do art. 442º, n.º 2 do CCivil, pois que existe uma imputabilidade reflexa, uma vez que o comportamento do insolvente esteve na origem do processo insolvencial.» Por outras palavras, o dito acórdão reconhece, como já antes se aduziu, que o incumprimento definitivo da promessa de compra e venda por parte do Sr. Administrador de Insolvência implica o efeito sancionatório previsto no art. 442º, n.º 2 do Cód. Civil, ou seja a restituição do sinal em dobro ou a opção pelo aumento do valor da coisa a favor do promitente-comprador. E, ainda, segundo a mesma autora, pronunciou-se o dito acórdão uniformizador quanto à terceira questão, no sentido de que «o crédito indemnizatório do promitente-comprador que seja consumidor, e que beneficie da traditio da coisa, é tutelado pelo disposto no art. 755º, n.º 1 al. f) do CCivil.» Em suma, por outras palavras, como já antes se aduziu e se mostra expressamente acolhido na sentença recorrida - em consonância, pois, com a doutrina firmada pelo acórdão uniformizador do STJ) -, para efeitos de afirmação do direito de retenção a favor do promitente-comprador, além dos requisitos gerais do direito de retenção enquanto direito real de garantia do crédito devido pelo incumprimento da promessa (incumprimento definitivo da promessa sinalizada; traditio da coisa a favor do promitente adquirente) é, ainda, suposto que o promitente-comprador possa ser considerado como consumidor, incumbindo a este último, em conformidade com o preceituado no art. 342º, n.º 1 do Cód. Civil, a alegação e demonstração dos respectivos pressupostos de facto. [23] Por conseguinte, também neste outro segmento deverá improceder a apelação e as conclusões xxvii) a xli) que lhe subjazem. * * D. Restituição ou Separação do Imóvel prometido vender.Sobre esta concreta questão escreveu-se na sentença recorrida: «Conforme acima referimos o contrato-promessa a que se referem os artigos 410º e segs., 441º, 442º e 830º do Código Civil é, em princípio, um contrato de eficácia obrigacional, o mesmo é dizer que só produz efeitos entre as partes e seus herdeiros. Podem, porém, as partes atribuir-lhe eficácia real (erga omnes) quando tenha por objeto a transmissão ou constituição de direitos reais sobre imóveis ou móveis sujeitos a registo. Estabelece a este título o artigo 413.º do Código Civil, no seu n.º 1, que “à promessa de transmissão ou constituição de direitos reais sobre imóveis, ou móveis sujeitos a registo, podem as partes atribuir eficácia real, mediante declaração expressa e inscrição no registo”. No caso em apreço, o contrato promessa outorgado reveste a natureza de puro contrato obrigacional. Trata-se de um “pactum de contrahendo”, sem eficácia real. Ora, os efeitos de um contrato-promessa de compra e venda, a que as partes não atribuíram eficácia real, têm natureza obrigacional, vinculam somente os seus contraentes e são inoponíveis a terceiros detentores de direitos reais incompatíveis, ainda que adquiridos posteriormente. Como já se decidiu no Acórdão da Relação de Lisboa de 17.03.1994, “Os efeitos de um contrato-promessa de compra e venda, a que as partes não atribuíram eficácia real, têm natureza obrigacional, vinculam somente os seus contraentes e são inoponíveis a terceiros detentores de direitos reais incompatíveis, ainda que adquiridos posteriormente. A acção de execução específica daquele contrato-promessa, mesmo que respeitante à alienação de imóvel, não está sujeita a registo obrigatório nos termos do artigo 3.º, n.º 1, alínea a), do Código do Registo Predial. O registo desta acção não cria, em benefício do autor, qualquer eficácia real dos direitos meramente obrigacionais, que nela se vise exercer, tornando-os oponíveis a terceiros” (in BMJ 435º, 883) (cf. no mesmo sentido, os Acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça de 20.01.2009, Processo n.º 08A3800, e de 11.12.2008, Processo n.º 08B1375, disponíveis no ITIJ). Então, tendo o contrato eficácia meramente obrigacional, a eventual venda da coisa a terceiro não perde por isso a sua validade. Assim sendo, e porque, no caso em apreço, as partes não celebraram o contrato-promessa por escritura pública e lhe não atribuíram eficácia real e o Senhor Administrador de Insolvência não optou pelo cumprimento do contrato, tendo a fracção sido alienada a terceiro não pode o autor arrogar-se o direito à separação e restituição do bem da massa insolvente. Como se refere no Acórdão Uniformizador de Jurisprudência nº 4/98 de 5/11/1998, “A hipótese que está em julgamento, em que o contrato-promessa não tem eficácia real, dá lugar a conflito entre o direito de crédito do promitente-comprador, destituído de eficácia erga omnes, e o direito real do terceiro adquirente da coisa; e não a conflito entre dois direitos reais. Um tal conflito não pode deixar de ser resolvido dando prevalência ao direito real do terceiro sobre a coisa, com sacrifício do direito de crédito do promitente-comprador decepcionado à prestação dessa mesma coisa pelo promitente-vendedor faltoso, dado que este direito é ineficaz em relação àquele terceiro.”. Por outro lado, também a existência do registo provisório da aquisição da dita fração, em nome do promitente-comprador, não impedia a celebração da escritura de compra e venda entre a massa insolvente e um terceiro, tendo por objeto essa mesma fração, sendo certo que a factualidade alegada não é suficiente para alicerçar a aquisição por usucapião do direito de propriedade da fração em causa pelo autor.» Perante o que já antes se expôs, ou seja, afastada a execução específica do ajuizado contrato-promessa e, ainda, afastado o direito de retenção invocado pelo recorrente e promitente-comprador (pois que não possui ele a qualidade de consumidor para os efeitos de aplicação do preceituado no art. 755º, n.º 1 al. f), na interpretação que decorre do Acórdão Uniformizador de Jurisprudência n.º 4/2014), nada mais resta, de facto, salientar, para além do já referido na sentença e ora transcrito, salvo que ao autor e ora recorrente apenas assiste um direito de crédito (comum) correspondente ao valor indemnizatório pelo incumprimento definitivo da promessa, crédito este que apenas poderia ser feito valer nos termos consignados no processo de insolvência e mediante a sua tempestiva reclamação naquele processo, não consentindo, pois, um tal direito de crédito, qualquer pretensão de separação ou restituição do imóvel alienado pelo Sr. Administrador a terceiro, o qual, aliás, diga-se, nem sequer se mostra demandado, enquanto tal, nestes autos. Aliás, ainda que fosse (e não é) de reconhecer o arrogado direito de retenção do aqui recorrente, ainda assim a pretensão de restituição ou separação do imóvel em apreço sempre teria que improceder pelas razões que em seguida se expõem. O direito de retenção é um dos direitos reais de garantia previstos no nosso ordenamento jurídico. Os direitos reais de garantia são aqueles que conferem o poder de, pelo valor da coisa ou pelo valor dos seus rendimentos, o respectivo beneficiário obter, com preferência sobre todos os outros, o pagamento de uma dívida de que é titular activo. O direito de retenção, em particular, consiste no direito conferido ao credor de, tendo em seu poder uma coisa do devedor que lhe devia entregar, se recusar a entregar a coisa ao devedor, apesar de ela lhe pertencer, enquanto o devedor não cumprir e, se necessário, inclusivamente executar a coisa para se pagar à custa do valor dela, com preferência sobre os demais credores – cfr. 759.º do Cód. Civil. Através dos direitos reais de garantia, o credor garante-se quanto à obtenção da satisfação do seu crédito através do valor do bem objecto da garantia. O seu interesse é puramente acessório ou instrumental, na medida em que a sua finalidade não é a de assegurar um autêntico gozo dos bens mas antes assegurar o cumprimento de outro direito (de crédito). Por outro lado, segundo o artigo 601.º do Cód. Civil, todos os bens do devedor susceptíveis de penhora, respondem pelo cumprimento da obrigação. O que significa, portanto, que fora as situações de bens impenhoráveis e dos regimes especiais de separação de patrimónios, para obter do devedor a satisfação do seu crédito, o credor pode requerer a execução coerciva de todo o seu património, nomeadamente procedendo à penhora dos bens que o integram. Em conformidade com estes normativos, visto que o processo de insolvência é um processo de liquidação coerciva do activo em benefício dos credores do devedor, uma vez proferida a sentença declaratória da insolvência, procede-se à imediata apreensão de todos os bens do insolvente susceptíveis de penhora, ainda que arrestados, penhorados ou por qualquer forma apreendidos ou detidos (art. 36º, al. g) do CIRE); E isto porque nos termos do artigo 158º, n.º 1 do mesmo CIRE, uma vez transitada em julgado a sentença declaratória da insolvência e realizada a assembleia de apreciação do relatório, deve o administrador proceder à venda de todos os bens apreendidos para a massa insolvente, ou seja, de todo o activo que responde pelas dívidas do insolvente. Todavia, uma vez instaurada a execução por um credor e penhorado um imóvel onerado com uma garantia real a favor de terceiro, este terceiro não perde a sua garantia. O que sucede é que ele é obrigado a ir ao processo executivo reclamar o seu crédito dotado de garantia real a fim de o mesmo ser graduado e oportunamente pago pelo produto da venda do bem que é objecto da garantia e pela ordem que resultar da graduação dos diversos créditos – cfr. art. 824.º, n.º 3, do Cód. Civil. O mesmo se passa, naturalmente, com o processo de insolvência, porquanto, nos termos do artigo 128º, n.º 1 do CIRE, para poderem obter pagamento dos seus créditos, dentro do prazo fixado na sentença declaratória da insolvência, os credores do insolvente devem reclamar a verificação dos seus créditos, quer comuns, quer preferenciais. Sucede ainda que nos termos dos n.ºs 1 e 2 do artigo 824.º do Cód. Civil a venda coerciva transfere para o adquirente os direitos do executado sobre a coisa vendida. Contudo, os bens são transmitidos livres dos direitos reais de garantia que os onerarem, os quais caducam, transferindo-se para o produto da venda dos respectivos bens. Dito de outra forma, os direitos reais de garantia, que oneravam o bem vendido extinguem-se, o adquirente adquire o bem sem esse ónus e o credor garantido passa a exercer a sua garantia de pagamento através do produto da venda do bem. Em suma, como se alcança do exposto, o direito de retenção reconhecido ao promitente-comprador nas condições em análise, não visa proporcionar-lhe a fruição de qualquer direito de gozo sobre o imóvel retido, mas antes garantir o pagamento do seu crédito emergente do incumprimento da promessa imputável ao promitente-vendedor que recebeu o sinal. Conferindo o direito de retenção ao seu titular, o direito de preferência que se sobrepõe, até, ao crédito hipotecário, a penhora/apreensão judicial, não afectando tal garantia, assegura, ainda, ao credor/retentor o poder de reclamar os seus créditos em sede executiva para poder receber o seu crédito pelo produto da venda. [24] A penhora/apreensão deixa intocado, não só o crédito como a garantia do promitente-comprador, que serão chamados à reclamação e à graduação preferencial do que lhes é devido, em resultado da quantia que prestaram a título de sinal, aquando da celebração dos contrato-promessa de compra e venda da coisa que retêm – cfr. arts. 786º, n.º 1 al. b) e 788º, n.º 1 do CPC. O direito de retenção não é, assim, incompatível com a penhora ou apreensão judicial, porque o seu titular encontra amparo para o seu direito de crédito no esquema da acção executiva. [25] Sendo assim, como nos parece, também no processo de insolvência e na venda coerciva nele realizada os bens são vendidos livres de ónus e encargos e os direitos dos credores transferem-se para o produto da venda, naturalmente com as características e as preferências de pagamento de que dispunham anteriormente. [26] O que significa que ainda que tivesse o autor o alegado direito de retenção sobre a coisa que lhe foi prometida vender – o que ora não sucede, como se expôs -, o mesmo apenas podia reclamar o seu crédito relativo à indemnização pelo não cumprimento do contrato e obter a sua graduação em correspondência com a preferência de pagamento associada a esse direito de retenção; Mas já não podia e não pode impedir que o bem seja apreendido para a massa insolvente e aí vendido livre de ónus e encargos, pois isso já não corresponde à satisfação da essência do seu direito – de retenção, ou real de garantia –, mas à criação de um obstáculo atípico de natureza real à responsabilidade/liquidação da totalidade do património do insolvente pela satisfação do seu passivo. Destarte, poder-se-á, pois, concluir que apesar da celebração de um contrato-promessa sem eficácia real e da tradição do imóvel, não tendo este contrato sido cumprido pelo liquidatário judicial, o autor não tem o direito de se opor à apreensão do imóvel para a massa insolvente e à sua venda na respectiva liquidação do património e, consequentemente, também não tem o direito de exigir a separação ou restituição desse imóvel entretanto apreendido, sendo certo que, à data dessa apreensão, se mostra indiscutido que o dito imóvel (prometido vender) integrava o património da insolvente. O que, portanto, para concluir, ainda que fosse (e não é) de reconhecer o direito de retenção invocado pelo recorrente, sempre o pedido de restituição ou separação do imóvel prometido vender estaria condenado à inevitável improcedência. * * IV-DECISÃOPelos fundamentos acima expostos, acordam os Juízes deste Tribunal da Relação em julgar improcedente a apelação, confirmando a sentença recorrida. * Custas pelo apelante, pois que ficou vencido - art. 527º, n.ºs 1 e 2 do CPC.* Porto, 8.05.2017* Jorge Seabra Sousa Lameira Oliveira Abreu _________ [1] Vide, neste sentido, por todos, ao nível da doutrina, ANA PRATA, “O Contrato-Promessa e o seu regime civil”, 2ª reimpressão, 2006, pág. 692-695, F. GRAVATO MORAIS “Contrato-Promessa em Geral; Contratos Promessa em Especial”, pág. 168-169, A. VARELA, “Das Obrigações em Geral”, I vol., 6ª edição, pág. 336 e, ao nível da jurisprudência, por todos, AC RP de 7.03.1995, processo n.º 9420879, AC RP de 28.03.2000, processo n.º 9820886, AC RP de 15.01.2013, processo n.º 1134/10.9TJVNF.P1, relator MARIA JOÃO AREIAS, AC RP de 14.03.2017, processo n.º 3540/08.0TBMTS.P1, relator MARIA CECÍLIA AGANTE ou, ainda, AC STJ de 23.11.2006, processo n.º 06B4160, relator SALVADOR da COSTA, todos in www.dgsi.pt. [2] Sobre a noção de contrato promessa, vide, por todos, com maiores desenvolvimentos, A. VARELA/P. LIMA, “Código Civil Anotado”, 4ª edição, I vol., pág. 376, I. GALVÃO TELLES, “Direito das Obrigações”, 6ª edição, pág. 82 a 84 e F. GRAVATO MORAIS, op. cit., pág. 24/25 [3] Sobre a noção de não cumprimento «lato sensu» e as suas várias modalidades (mora/incumprimento definitivo /cumprimento defeituoso), vide, por todos, A. COSTA, “Direito das Obrigações”, 11ª edição, pág. 1034-1035, A. VARELA, “Das Obrigações em Geral”, II volume, 4ª edição, págs. 61-63, L. M. MENEZES LEITÃO, “Direito das Obrigações”, II volume, 6ª edição, págs. 231-232 e, ainda, I. GALVÃO TELLES, op. cit., págs. 333-334. [4] Vide, neste sentido, J. CALVÃO da SILVA, “Sinal e Contrato Promessa”, 2017, pág. 100-103, I. GALVÃO TELLES, op. cit., pág. 112, A. VARELA, op. cit., I volume, pág. 336-337; a nível da jurisprudência vide, ainda, por todos, AC STJ de 19.05.2016, processo n.º 924/14.8TVLSB.C1.S1, relator LOPES do REGO, AC STJ de 12.01.2010, processo n.º 628/09.3YFLSB, relator PAULO SÁ, além, ainda, da vasta recensão de jurisprudência mais recente do Supremo e das Relações efectuada por J. CALVÃO DA SILVA, op. cit., pág. 106-120. [5] Vide, por todos, neste sentido, J. CALVÃO da SILVA, op. cit., pág. 137 [com menção de vasta jurisprudência do Supremo e das Relações no mesmo sentido sob a nota 179], ANA PRATA, op. cit., pág. 920, L. MENEZES LEITÃO, op. cit., I vol., pág. 229 e, ainda, desta Relação, AC RP de 9.10.2012, processo n.º 7883/10.4TBVNG.P1, relator RODRIGUES PIRES e AC RP de 6.03.2008, relator MANUEL CAMPELO, ambos disponíveis. [6] Sobre a natureza da acção de execução específica, vide, por todos, ANA PRATA, op. cit., pág. 977 e segs… e J. CALVÃO da SILVA, “Cumprimento e Sanção Pecuniária Compulsória”, Separata do volume XXX do Suplemento ao BFDC, 1987, pág. 498-501. [7] Note-se que, neste conspecto, a pretensão de execução específica do contrato-promessa poderia – a ter sido formulada pelo autor (que não foi) – considerar-se contraditória com a pretensão de reconhecimento do direito de retenção. Com efeito, como se refere no AC RP de 10.09.2012, Processo n.º 272/09.5TBMTR.P1, relator ANABELA LUNA de CARVALHO, disponível in www.dgsi.pt, a formulação do pedido de execução específica da promessa exclui o direito de crédito previsto no n.º 2 do art. 442º do Cód. Civil, considerando o caracter alternativo e único consignado no n.º 3 do art. 442º, privando-se desse modo, os beneficiários da promessa que formularam aquele pedido (de execução específica), de beneficiarem também do direito de retenção. Na verdade, constituiria uma contradição nos seus próprios termos, pretender-se a execução específica da promessa (a remoção do incumprimento «lato sensu») e, do mesmo passo, pretender-se o reconhecimento do crédito por esse mesmo incumprimento (art. 442º, n.º 2 do Cód. Civil) e a consequente garantia (real) do mesmo crédito por via do direito de retenção (art. 755º, n.º 1 al. f) do Cód. Civil), quando as aludidas sanções para o incumprimento «lato sensu» do contrato promessa são, de facto, alternativas e não cumulativas. [8] Vide, neste sentido, FERNANDO AMÂNCIO FERREIRA, “Manual dos Recursos em Processo Civil”, 8ª edição, pág. 147, A. ABRANTES GERALDES, “Recursos no Novo Código de processo Civil”, 2ª edição, pág. 92-93 (e jurisprudência citada) e, ainda, por todos, AC RL de 3.03.2011, Processo n.º 535/08.7TCLRS.L1-2, relator HENRIQUE ANTUNES ou AC RC de 15.02.2011, Processo n.º 706/09.9TBLRA.C1, relator A. BEÇA PEREIRA, ambos in www.dgsi.pt. [9] Vide, neste sentido, em situações similares à dos presentes autos [de impossibilidade de celebração do prometido contrato], por todos, AC RC de 15.02.2011, Processo n.º 1301/09.8TBTNV-A.C1, relator A. BEÇA PEREIRA e AC RP de 24.10.2006, Processo n.º 0623772, relator ANABELA DIAS da SILVA, ambos in www.dgsi.pt. [10] ANA PRATA, op. cit., pág. 920. [11] L. MENEZES LEITÃO, op. cit., I volume, pág. 229. [12] J. CALVÃO da SILVA, op. cit., pág. 140. [13] Vide, neste sentido, ainda, além de J. CALVÃO da SILVA, também F. GRAVATO MORAIS, op. cit., pág. 112-113 e 120, I. GALVÃO TELLES, op. cit., pág. 121-124, A. MENEZES CORDEIRO, “Tratado de Direito Civil – Direito das Obrigações”, Tomo II, 2010, pág. 424 e na jurisprudência, por todos, AC RP de 19.10.2015, Processo n.º 251/14.0T8PNF.P1, relator JOSÉ EUSÉBIO ALMEIDA, disponível in www.dgsi.pt. [14] Publicado no DR, Iª série, n.º 95, de 19.05.2014 e relatado pelo Sr. Juiz Conselheiro TÁVORA VICTOR. [15] Vide, por todos, os votos de vencido, constantes do Acórdão Uniformizador, subscritos pelos Srs. Juízes Conselheiros A. ABRANTES GERALDES, SALRETA PEREIRA, JOÃO BERNARDO, JOÃO CAMILO e LOPES do REGO. [16] A dita interpretação restritiva do art. 755º, n.º 1 al. f) do Código Civil vinha sendo defendida por L. MIGUEL PESTANA VASCONCELOS, em particular nos seus estudos publicados in Cadernos de Direito Privado, n.º 33 (Janeiro/Março de 2011) – “ Direito de Retenção, contrato promessa e insolvência ”, pág. 3 a 29 – ou, nos mesmos Cadernos de Direito Privado, n.º 41 (Janeiro/Março de 2013) – “Direito de Retenção, par conditio creditorum, justiça material”, pág. 3/17; Em sentido idêntico, secundando a posição vertida no AC UJ, se veio a pronunciar também J. CALVÃO da SILVA, “Sinal e Contrato Promessa”, cit., pág. 164. [17] AC STJ de 14.02.2017, Processo n.º 427/12.5TBFAF-F.G1.S1, relator JOÃO CAMILO, AC STJ de 5.07.2016, Processo n.º 1129/11.5TBCVL-C.C1.S1, relator ANA PAULA BOULAROT e AC STJ de 24.05.2016, Processo n.º 3374/07.9TBGMR-C.G2.S1, relator NUNO CAMEIRA, todos disponíveis in www.dgsi.pt. [18] Vide, neste sentido, por todos, A. ABRANTES GERALDES, “Recursos no Novo Código de Processo Civil”, cit., pág. 395-397 e AC STJ de 24.05.2016, antes citado. [19] J. CALVÃO da SILVA, “Responsabilidade Civil do Produtor”, Reimpressão, 1999, pág. 59 e, ainda, do mesmo autor “Compra e Venda de Coisas Defeituosas”, Reimpressão, 2002, pág. 111-112. [20] JORGE MORAIS de CARVALHO, “Manual de Direito do Consumo”, 3ª edição, pág. 20-21. [21] Vide, neste sentido, AC STJ de 5.07.2016 e AC STJ de 14.02.2017, ambos já citados. [22] MARIA do ROSÁRIO EPIFÂNIO, “Manual de Direito da Insolvência”, 6ª edição, pág. 188-189. [23] Sobre o ónus de prova dos elementos de facto necessários à qualificação do promitente-comprador como consumidor e no sentido por nós sustentado no texto, vide, por todos, AC STJ de 14.02.2017, antes citado. [24] Vide, neste sentido, MIGUEL TEIXEIRA DE SOUSA, “A Penhora de Bens na Posse de Terceiros”, in ROA, Ano 51.º, Abril de 1991, pág. 83; AMÂNCIO FERREIRA, “Curso de Processo de Execução”, 2.ª edição, pág. 212. [25] Vide, neste sentido, por todos, J. LEBRE de FREITAS, CPC anotado, I volume, pág. 616 e SALVADOR da COSTA, “Concurso de Credores”, 3ª edição, pág. 221 (e doutrina e jurisprudência citada sob as notas 315 e 316). [26] Vide, neste sentido, AC RP de 16.03.2010, Processo n.º 2384/08.3TBSTS-AA.P1, relator SILVIA PIRES, AC RP de 3.12.2012, Processo n.º 474/08.1TYVNG-M.P1, relator MARIA CECÍLIA AGANTE e AC RP de 7.03.2013 [que aqui seguimos de perto], Processo n.º 652/03.0TYVNG-R.P2, relator ARISTIDES RODRIGUES de ALMEIDA, todos in www.dgsi.pt. |