Acórdão do Tribunal da Relação do Porto | |||
Processo: |
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Nº Convencional: | JTRP000 | ||
Relator: | PAULO DIAS DA SILVA | ||
Descritores: | DIREITO DE PROPRIEDADE PRESUNÇÃO DA TITULARIDADE DO DIREITO PRESUNÇÃO REGISTAL CONFRONTAÇÕES ÁREA | ||
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Nº do Documento: | RP202501093633/23.3T8AVR.P1 | ||
Data do Acordão: | 01/09/2025 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Texto Integral: | S | ||
Privacidade: | 1 | ||
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Meio Processual: | APELAÇÃO | ||
Decisão: | CONFIRMADA | ||
Indicações Eventuais: | 3. ª SECÇÃO | ||
Área Temática: | . | ||
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Sumário: | I - A presunção registral constante do artigo 7.º do Código do Registo Predial não abrange factores descritivos, como as áreas, limites ou confrontações, cingindo-se apenas à existência do direito e à sua pertença às pessoas em cujo nome se encontra inscrito. II - As inscrições matriciais não fazem prova plena da localização, da área, da composição, dos limites e das confrontações dos prédios a que se referem, pois que nenhum desses elementos concernentes à identificação física destes é atestado pela autoridade ou funcionários competentes com base nas suas percepções. III - Os levantamentos topográficos, as declarações dos municípios e as cartas e plantas cadastrais apenas provam que foram feitas as declarações aí documentadas ou que constam das cartas o que nelas está assinalado, mas já não que corresponda à verdade o seu conteúdo, constituindo documentos sujeitos, nessa parte, à livre apreciação do julgador.” | ||
Reclamações: | |||
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Decisão Texto Integral: | Recurso de Apelação - 3ª Secção
ECLI:PT:TRP:2024:3633/23.3T8AVR.P1
Acordam no Tribunal da Relação do Porto
1. Relatório AA e BB, residentes na Estrada ..., ..., ..., ... ... instauraram acção declarativa sob a forma de processo comum contra o Município ..., representado pela Câmara Municipal ..., sita na Praça ..., Apartado ...44, ... ..., onde concluem pedindo que seja reconhecido e declarado que o prédio urbano sito na Rua ..., ..., ... ..., de que são proprietários, inscrito na matriz predial urbana da freguesia ..., concelho ... sob o artigo matricial ...41 e descrito na Conservatória do Registo Predial de Ílhavo sob o nº ...27, tem a área de 639,00 m2. Alegam, em síntese, que são donos do referido prédio, o qual se encontra registado a seu favor pela inscrição Ap. ...46, de 06 de Setembro de 2021, decorrente da compra a CC e DD. Alegam, ainda, que na caderneta predial urbana, bem como na certidão da conservatória do registo predial, consta que o prédio tem a área de 639 m2, o que resulta dos levantamentos topográficos que junta e foi apurado no local. Acrescentam que ao procederem ao devido processo camarário a fim de construírem uma moradia no referido prédio, foram informados pelo réu que aquele não tem a referida área e que parte da mesma pertence a este último, sendo que no dia 5 de Maio de 2023 o réu colocou uns marcos no meio do terreno dos autores. * Citado, o réu deduziu contestação, impugnando a área, as confrontações norte, nascente e poente do prédio identificado na petição inicial, sustentando que pela “Informação Total” obtida em 27/10/2023 acerca das descrições registrais nº ..46/19910703 e nº ...10/20141127 da freguesia ..., constata-se que em 07/12/1992 foi registada a aquisição por EE e marido, FF, de um “Terreno destinado a construção urbana” com a área total de 840 m², então inscrito na matriz predial respectiva sob o artigo ...85 e descrito na Conservatória do Registo Predial sob o n.º ...46 da freguesia ..., relativamente ao qual foi “Declarada a utilidade pública da expropriação de uma parcela com 542,20 m2”, pelo que dele veio a ser “Desanexado o prédio descrito sob o nº ...10/20121127 (com a área de 297,80m2)”. Mais refere que o mesmo foi depois adquirido, em sucessão hereditária dos referidos EE e FF, por GG, conforme registo de aquisição lavrado em 27/12/2014, que, por sua vez, veio depois a alienar o prédio aos já atrás referidos CC e DD, conforme registo de aquisição lavrado em 09/03/2017. Acrescenta que, em 22/08/2016, era a área de 297,80 m² que constava do registo e da matriz, e que o, então, proprietário GG, estava ciente de que essa era a área do mesmo e resultara da aquisição expropriativa da área restante pelo réu, razão pela qual a sua “ampliação” para a área de 639,00 m², que constaria do registo e da matriz aquando da aquisição do prédio pelos autores, necessariamente terá sido feita em data posterior ao dia 22/08/2016, por GG ou por quem adquiriu deste o prédio e, depois, o veio a revender aos Autores, mas sem que tal correspondesse à realidade. * Dispensada a realização da audiência prévia, foi proferido despacho saneador, no qual se fixou o objecto do litígio e se enunciaram os temas da prova. * Realizou-se a audiência de discussão e julgamento com observância das formalidades prescritas na lei. * Foi proferida sentença que julgou a acção improcedente e decidiu não declarar que o terreno destinado a construção urbana, sito em ..., ..., inscrito na matriz predial urbana com o artigo ...41, descrito na Conservatória do Registo Predial de ... sob o número ...10, identificado em 5) e 6) dos factos provados desta sentença, tem a área efectiva de 639,00 m2. Custas da acção integralmente pelos autores, visto que o réu não põe em causa que aqueles sejam proprietários do prédio identificado em 5) e 6) dos factos provados, mas, apenas, que este possua a configuração alegada, concretamente, a área de 639 m2, pelo que não teve qualquer decaimento - artigo 527º, n.ºs 1 e 2, do Código de Processo Civil. * Não se conformando com a referida decisão, os recorrentes AA e BB, vieram interpor recurso de apelação, em cujas alegações concluem da seguinte forma:
I.Por sentença datada de 29 de junho de 2024, decidiu o Tribunal a quo pela improcedência da Ação apresentada pelo ora Recorrente, não se conformando este com a decisão e não concordando com a fundamentação do Tribunal a quo, vem, agora, apresentar o presente Recurso de Apelação.
II. No tocante aos factos provados e não provados, no que concerne ao ponto a) dos factos dados como não provados - O terreno referido em 5), 6) e 9) possua a área, no local, de 639 m2 e confronte, efectivamente, a norte, com a Rua ...; a sul com HH, a nascente com a Estrada ... e a poente com II; - deve este ser este eliminado do elenco dos factos dados como não provados, devendo, antes, ser acrescentado no elenco dos factos dados como provados.
III. Já que foi oferecida toda a prova documental possível, nomeadamente a certidão registral do imóvel (Cfr. DOC. 1 junto pelo A. na sua petição inicial), a caderneta predial do mesmo (Cfr. DOC. 2 junto pelo A. na sua petição inicial) e os levantamentos topográficos.
IV. O que determinou verdadeiramente a decisão do Tribunal a quo foi o seguinte: o tribunal a quo entendeu que a alegação da inscrição do terreno no registo predial é insuficiente, uma vez que esta apenas prova a existência do direito de propriedade.
V. Acrescentou que os autores/recorrentes teriam de provar que “o prédio de que são donos possui as confrontações e as áreas que alegaram” e que, para tal, teriam que “demonstrar que o prédio já existia na esfera jurídica dos seus antecessores com as concretas confrontações e área que alegam”.
VI. Face a isto, surge um problema relativo ao ónus da prova. O tribunal a quo procedeu bem quando fez impender sobre os autores o ónus de demonstrar a existência das concretas confrontações e área por eles invocadas. No entanto, teria de o fazer também para com o réu, uma vez que este também invocou determinadas confrontações e área distintas das alegadas pelos autores, ora recorrentes. Por outras palavras, teria de exigir do réu o mesmo que exigiu dos autores.
VII. Um outro problema coaduna-se com a prova diabólica ou prova difícil. Recuperando o exigido pelo Tribunal a quo, para que os autores lograssem na demonstração da área e confrontações que alegam, teriam de “demonstrar que o prédio já existia na esfera jurídica dos seus antecessores com as concretas confrontações e área que alegam”.
VIII. Ora, a única forma de procederem àquela demonstração era através da documentação que dispunham, mais concretamente a certidão registral do imóvel que foi junta aos presentes autos.
IX. Apesar disso, o tribunal a quo considerou que essa matéria não era suficiente, violando, portanto, os princípios da proporcionalidade e da proibição da indefesa, exigindo aos autores (e nunca ao réu) uma prova diabólica, já que a imposição de prova documental ou testemunhal respeitante a data que precede o dia 07 de dezembro de 1992 bem como a aspetos técnicos como sendo áreas e confrontações mostrou-se pouco razoável.
X. A prova testemunhal é impossível. Um individuo comum que não pode atestar a área de um terreno.
XI. Aliás, muito estranho se revelasse conhecimento absoluto da área efectiva de um terreno, atestando ser essa e não outra qualquer.
XII. O Tribunal não teve em consideração que quando a R. se deslocou ao local já lá estavam os marcos com a área da Conservatória, com a área da Autoridade Tributária e com a área do levantamento topográfico atestado, ou seja, também havia e sempre houve, um elemento de facto.
XIII. Marcos esses que ainda, nos dias de hoje lá se encontram.
XIV. Questionamo-nos se alguém violar a propriedade de outra e alegar que as áreas da Conservatória, Autoridade Tributária e marcos podem não ser verdadeiras, é suficiente para não ser punido.
XV. Se a área da Conservatória não faz prova, se a área da Autoridade Tributária não faz prova, se o levantamento topográfico não faz prova, se o Sr Arquitecto que verificou a área do terreno não faz prova, se os marcos não fazem prova, o que faz?
XVI. Com toda a franqueza, não sabemos.
XVII. O Tribunal a quo violou o artigo 4º do CPC, o n.º 1 do artigo 342 do CC, o artigo 362 e ss CC, o artigo 392º e ss CC e o artigo 388 e ss CC.
XVIII. O Tribunal criou uma situação impossível de Direito, pois com a presente decisão, que não se compreende, qual é a área do terreno.
XIX. Pela presente decisão, que não conseguimos compreender, não sabemos, ninguém soube, ninguém saberá a área deste terreno ou qualquer outro, já mais a podendo atestar. * Não foram apresentadas contra-alegações. * Colhidos que se mostram os vistos legais e nada obstando ao conhecimento do recurso, cumpre decidir. * 2. Factos provados O Tribunal a quo considerou provados os seguintes factos: 1.O terreno destinado a construção urbana, sito em ..., inscrito na matriz predial urbana com o artigo ...85, encontrava-se descrito na Conservatória do Registo Predial de …sob o número ...46, da freguesia ..., com a seguinte descrição: 1.1) área total 840 m2; 1.2) confrontações: norte, JJ; sul, HH; nascente, caminho público e poente, II; 1.3) declara a utilidade pública da expropriação de uma parcela com 542,20 m2; 1.4) desanexado o descrito sob o n.º ...10/20141127 (com a área de 297,80 m2). 2. O terreno referido em 1) encontrava-se descrito a favor de EE, casada com FF no regime de comunhão de adquiridos, por compra, pela ap. ...3 de 1992/12/07 – Aquisição. 3. Em 2001, para implantação do Estádio ... e respectivas infra-estruturas, o réu Município ... adquiriu, por expropriação por utilidade pública, uma parcela do terreno referido em 1), com 542,20 m² (quinhentos e quarenta e dois metros e vinte centímetros quadrados), correspondente à parte poente do mesmo, 4. passando a parcela remanescente, sita a nascente, com a área sobrante de 297,80 m2 (duzentos e noventa e sete metros e oitenta centímetros quadrados), a confrontar a norte com o réu, a poente com arruamentos do Estádio ... e a nascente com a Rua .... 5. O terreno destinado a construção urbana, sito em ..., ..., inscrito na matriz predial urbana com o artigo ...41, encontra-se descrito na Conservatória do Registo Predial de ... sob o número ...10/2014112, da freguesia ..., com a seguinte descrição: 5.1) área total 639 m2; 5.2) confrontações: norte, Rua ...; sul, HH; nascente, Estrada ... e poente, II; 5.3) Desanexado do descrito sob o n.º ...46/19910703. Recurso à faculdade prevista no artigo 28º C, n.º 2 do CRP. 6. Da certidão registral do terreno referido em 5) constam, nomeadamente, as seguintes inscrições: 6.1) Ap. ...19 de 2021/07/19 – Averbamento: Averbamento de Alteração, área total 297,8 m2; 6.2) Ap. ...07 de 2014/11/27 – Aquisição a favor de GG, por sucessão hereditária de EE e de FF; 6.3) Ap. ...07 de 2017/03/09, Aquisição a favor de CC e de DD, casados no regime de comunhão de adquiridos, por compra a GG; 6.4) Ap. ...46 de 2021/09/06, Aquisição a favor dos autores AA e BB, casados no regime de comunhão de adquiridos, por compra a CC e de DD. 7. Em 21-02-2017 GG apresentou modelo 1 de IMI, junto da Autoridade Tributária e Aduaneira, a solicitar a alteração da área do terreno identificado em 5) e 6), para 639 m2 (seiscentos e trinta e nove metros quadrados). 8. Em 19-07-2021, CC apresentou pedido na Conservatória do Registo Predial, de rectificação da descrição do terreno identificado em 5) e 6), quanto à área, passando esta a ser de 639 m2 (seiscentos e trinta e nove metros quadrados). 9. Por escritura pública outorgada em 18-08-2021, designada de “Compra e Venda”, CC, por si e como gestor de negócios da sua mulher, DD, declarou vender, e o autor AA declarou comprar, pelo preço de vinte e seis mil euros, o prédio urbano, composto de terreno para construção, sito em ..., ..., freguesia ..., concelho ..., inscrito na matriz sob o artigo ...41, descrito na competente Conservatória do Registo Predial sob o número .... 10. A escritura referida em 9) foi ratificada em 19-08-2021. 11. Consta da escritura referida em 9) que houve intervenção de mediador imobiliário, com a denominação “A..., Unipessoal, Lda.”, titular da licença n.º ...25 - AMI. 12. Os autores compraram o terreno referido em 5) e 6) para aí construírem uma moradia, tendo contactado a Câmara Municipal ... com vista a iniciar o respectivo licenciamento camarário. 13. Na sequência do referido em 12), o réu comunicou aos autores que o terreno referido em 5) e 6) não possui a área de 639 m2 (seiscentos e trinta e nove metros quadrados) e que parte da mesma lhe pertence. 14. Nessa sequência, os autores e o seu arquitecto, KK, reuniram com técnicos camarários. 15. No dia 05-05-2023 os funcionários do réu foram ao terreno identificado em 5) e 6), juntamente com a autora mulher, efectuar a delimitação das estremas norte e sul do mesmo, mediante a colocação de estacas. * 2.2 Factos não provados O Tribunal a quo considerou não provados os seguintes factos: a) o terreno referido em 5), 6) e 9) possua a área, no local, de 639 m2 e confronte, efectivamente, a norte com a Rua ...; a sul com HH, a nascente com a Estrada ... e a poente com II; b) as estacas referidas em 15) tivessem sido colocados a meio do terreno referido em 5), 6) e 9); c) a parcela sobrante, referida em 4), tivesse passado a confrontar, a sul, com o réu e com um dono (privado); d) quando do referido em 15), os autores tivessem concordado com a delimitação efectuada pelos técnicos do réu. * 3. Delimitação do objecto do recurso; questões a apreciar: Das conclusões formuladas pelos recorrentes as quais delimitam o objecto do recurso, tem-se que as questões a resolver no âmbito do presente recurso prendem-se com saber: - Do mérito da decisão. * 4. Conhecimento do mérito do recurso 4.1 Da impugnação da matéria de facto Os apelantes, em sede recursiva, manifestam-se discordantes da decisão que apreciou a matéria de facto quanto à alínea a) dada como não provada. Consta da referida alínea: “a) o terreno referido em 5), 6) e 9) possua a área, no local, de 639 m2 e confronte, efectivamente, a norte com a Rua ...; a sul com HH, a nascente com a Estrada ... e a poente com II.” Pugnam que a referida alínea seja dada como provada. Vejamos, então. No caso vertente, mostram-se cumpridos os requisitos da impugnação da decisão sobre a matéria de facto previstos no artigo 640.º, do Código de Processo Civil, nada obstando a que se conheça da mesma. Entende-se actualmente, de uma forma que se vinha já generalizando nos tribunais superiores, hoje largamente acolhida no artigo 662.º do Código de Processo Civil, que no seu julgamento, a Relação, enquanto tribunal de instância, usa do princípio da livre apreciação da prova com a mesma amplitude de poderes que tem a 1ª instância (artigo 655.º do anterior Código de Processo Civil e artigo 607.º, n.º 5, do actual Código de Processo Civil), em ordem ao controlo efectivo da decisão recorrida, devendo sindicar a formação da convicção do juiz, ou seja, o processo lógico da decisão, recorrendo com a mesma amplitude de poderes às regras de experiência e da lógica jurídica na análise das provas, como garantia efectiva de um segundo grau de jurisdição em matéria de facto; porém, sem prejuízo do reconhecimento da vantagem em que se encontra o julgador na 1ª instância em razão da imediação da prova e da observação de sinais diversos e comportamentos que só a imagem fornece. Como refere A. Abrantes Geraldes, in Recursos no Novo Código de Processo Civil, 2013, Almedina, págs. 224 e 225, “a Relação deve alterar a decisão da matéria de facto sempre que, no seu juízo autónomo, os elementos de prova que se mostrem acessíveis determinem uma solução diversa, designadamente em resultado da reponderação dos documentos, depoimentos e relatórios periciais, complementados ou não pelas regras de experiência”. Importa, pois, por regra, reexaminar as provas indicadas pelos recorrentes e, se necessário, outras provas, máxime as referenciadas na fundamentação da decisão em matéria de facto e que, deste modo, serviram para formar a convicção do Julgador, em ordem a manter ou a alterar a referida materialidade, exercendo-se um controlo efectivo dessa decisão e evitando, na medida do possível, a anulação do julgamento, antes corrigindo, por substituição, a decisão em matéria de facto. Tendo presentes os elementos probatórios e demais motivação, vejamos então se, na parte colocada em crise, a referida análise crítica corresponde à realidade dos factos ou se a matéria em questão merece, e em que medida, a alteração pretendida pelos apelantes. Insurgem-se os Apelantes contra a referida decisão por entenderem que o Tribunal a quo valorou erradamente a prova oferecida no segmento fáctico em causa - alínea a) dos factos não provados. Entendemos, porém, que a Senhora Juiz a quo fundamentou devidamente a sua decisão, à luz da prova oferecida, invocando sempre com ponderação as regras da experiência comum e o juízo lógico-dedutivo. Com efeito, a formação da convicção do juiz não pode resultar de partículas probatórias, mas tem necessariamente de provir da análise global do conjunto de toda a prova produzida. A actividade dos Juízes, como julgadores, não pode ser a de meros espectadores, receptores de depoimentos. A sua actividade judicatória há-de ter, necessariamente, um sentido crítico. Para se considerarem provados factos não basta que as testemunhas chamadas a depor se pronunciem sobre as questões num determinado sentido, para que o Juiz necessariamente aceite esse sentido ou essa versão. Os Juízes têm necessariamente de fazer uma análise crítica e integrada dos depoimentos com os documentos e outros meios de prova que lhes sejam oferecidos. No caso vertente, não podemos deixar de acompanhar a Sr.ª Juiz a quo na análise crítica e extensa que fez da prova relativamente ao segmento fáctico impugnado. Conforme é jurisprudência pacífica, «A presunção registral não abrange fatores descritivos, como as áreas, limites ou confrontações, cingindo-se apenas à existência do direito e à sua pertença às pessoas em cujo nome se encontra inscrito»[1] Destarte, as inscrições matriciais não fazem prova plena da localização, da área, da composição, dos limites e das confrontações dos prédios a que se referem, pois que nenhum desses elementos concernentes à identificação física destes é atestado pela autoridade ou funcionários competentes com base nas suas perceções. De resto, os levantamentos topográficos, as declarações dos municípios e as cartas e plantas cadastrais apenas provam que foram feitas as declarações aí documentadas ou que constam das cartas o que nelas está assinalado, mas já não que corresponda à verdade o seu conteúdo, constituindo documentos sujeitos, nessa parte, à livre apreciação do julgador. Assim, o valor probatório de tais elementos não é vinculativo, mas sujeito à livre apreciação[2]. Não ignoramos que, no caso vertente, o levantamento topográfico efectuado no ano de 2017, por LL, a pedido de GG, (documento 3 junto com a petição inicial), retrata o prédio em discussão nos autos com uma área de 639 m2. No entanto, cabe salientar que a representação do prédio e a respectiva área, constantes de tal documento, não possuem correspondência com a representação do prédio assinalada na fotografia aérea apresentada na Câmara Municipal ..., pelo próprio GG, em 09-02-2015 (cf. documento 7 junto com a contestação), nem com o desenho e com a área do prédio constante da planta apresentada na Câmara Municipal ..., pelo proprietário anterior, FF, pai de GG, em 21-12-1992 (cf. documento 3 junto com a contestação). Já as plantas da parcela da qual foi desanexado o prédio dos autores, que foram apresentadas pelo, então, proprietário FF, na Câmara Municipal ..., em 21-12-1992 (com 13-15 metros de largura por 66-68 de comprimento), (documento 3 junto com a contestação), possuem correspondência com a planta que instruiu o processo de expropriação por utilidade pública (cf. documento 5 junto com a contestação), com a planta emitida pela Câmara Municipal ... em Outubro de 2014, a pedido de GG (documento 6 junto com a contestação) e, ainda, com a fotografia aérea apresentada por este último, junto daquela, em 09-02-2015 (documento 7 junto com a contestação). Analisamos, também, a informação remetida aos autos pela Conservatória do Registo Predial em 25-01-2024, da qual decorre que em 19-07-2021 aí foi apresentado um pedido de rectificação da descrição do prédio descrito sob o n.º ...10, da freguesia ..., por parte de CC, de forma a passar a constar que o mesmo possuía a área de 639 m2. Para o efeito, CC, que foi quem vendeu o terreno dos autos aos autores, alegou que a área primitiva do prédio era de 1.181,20 m 2, e não de apenas 840 m2, pelo que, após a expropriação de 542,20 m2, a área restante é de 639 m2. Tal pedido foi instruído com um levantamento topográfico efectuado pelo topógrafo LL, igual ao levantamento junto com a petição inicial, do ano de 2017, ressalvando que o prédio foi delimitado «conforme indicado pelo proprietário no local». Analisamos, ainda, a informação remetida aos autos pela Direcção de Finanças ..., em 01-02-2024, da qual decorre que em 21-02-2017 foi apresentado um pedido de alteração de área do prédio inscrito na matriz com o artigo ...41, por GG, alegando que o mesmo possui a área total de 639 m2. Tal pedido foi instruído com um levantamento topográfico datado de 2017, atrás referido, elaborado por LL (o mesmo que foi junto com a petição inicial), que retrata o prédio dos autos como tendo a área de 639 m2, afirmando que o prédio «se encontra delimitado conforme indicado pelo proprietário no local». Ora, a prova documental atrás mencionada, por si e quando conjugada com a prova por declarações prestada na audiência de julgamento, não permite, conforme, aliás, sustentou o Tribunal a quo, demonstrar que o terreno que os autores adquiriram possui, efectivamente, as características por estes alegadas, em termos de área e confrontações. Com efeito, além da ausência de factos relativos à aquisição originária do prédio dos autos, verifica-se que os Autores/Apelantes não lograram provar que o prédio já existia com a configuração que alegam, na esfera jurídica dos anteriores donos. De resto, as únicas pessoas inquiridas que possuíam ou deveriam possuir conhecimento efectivo acerca da área e das confrontações do prédio foram GG, que adquiriu o prédio dos autos por sucessão hereditária dos seus pais, EE e FF, e LL, topógrafo que elaborou o levantamento topográfico junto aos autos, pelos autores, que esteve na origem da alteração da área do mesmo, na matriz e no registo. Ora, conforme bem havia referido o Tribunal a quo, GG, apesar de ter afirmado que pediu uma rectificação das áreas do terreno porque as medidas estavam incorrectas, admitiu que não estava a par dos limites do prédio, e que só teve contacto com o mesmo após o adquirir por partilha, nunca o tendo conhecido antes disso. Admitiu, também, ter sido quem indicou, mais ou menos, os limites do terreno ao topógrafo, com base no que estava nos papéis que o seu pai tinha e no que lhe disse um senhor que mora em frente, sem ter feito qualquer diligência junto dos proprietários confinantes e sem ter ligado muito aos documentos «porque não percebo nada disto». Assim, da análise do depoimento de GG decorreu quer a ausência de rigor na alteração das áreas do prédio vendido aos Autores/Apelantes, na matriz e no registo, quer o desconhecimento, por aquele, da configuração, dos limites e da área efectiva do prédio, antes ou depois de ter sido por si adquirido. Acresce que o pai da testemunha GG, que era, juntamente com a mãe do mesmo, proprietário do prédio dos autos quando ocorreu a expropriação parcial pela Câmara Municipal ..., presumindo-se, como tal, conhecedor das configuração e limites do prédio, apresentou um requerimento àquela no ano 1992, com documentos que evidenciam que aquele tinha cerca de 840 m2 (documento 3 junto com a contestação). LL, topógrafo que elaborou o levantamento junto com a petição inicial, que serviu para instruir os pedidos de rectificação da área do prédio dos autos, junto da Conservatória do Registo Predial e das Finanças, afirmou que fez o mesmo em 2017, que em 2021 não deve ter voltado ao local e que atesta a área de acordo com os limites indicados pelo proprietário. Asseverou que não se recorda, sequer, de ter ido ao terreno dos autos. Ora, do depoimento de GG decorreu que foi este quem indicou os limites do prédio dos autos ao topógrafo, limites esses que, como vimos, aquele desconhecia. Assim, em sintonia com o Tribunal a quo, também para nós é patente que o levantamento topográfico em causa é inidóneo para demonstrar qual a área efectiva do terreno dos Apelantes, sendo certo que o respectivo teor surge infirmado pelos restantes documentos juntos aos autos, nos termos atrás analisados. Em sintonia com a resposta dada ao facto impugnado relativo à área efectiva do seu terreno, temos, ainda, os depoimentos, que também consideramos claros e consistentes, desde logo, de MM, topógrafo por conta do réu, há 20 anos, que se deslocou ao terreno no dia 05-05-2023, com vista a fazer a demarcação do mesmo, descreveu os elementos que consultou previamente, de que forma fez a marcação do prédio e o desfasamento que constatou existir, de 2/3 metros, em relação ao cadastro (no que concerne ao prédio inscrito na matriz rústica com o artigo ...47, que confronta a Norte com o prédio dos autores). Bem como de NN, técnica superior por conta do réu, desde 2006, e OO, técnico superior por conta do réu, há 22 anos, que relataram o pedido que foi feito pelos Apelantes, de aquisição do prédio do réu que confronta com o daqueles, a norte, e o que apuraram nessa sequência, quanto à sobreposição de ambas as parcelas, relataram, ainda, a deslocação que fizeram ao local, para marcar as estremas a sul e a norte do terreno dos autores, e com base em que elementos (declaração de utilidade pública, no âmbito do qual foram feitas negociações com os anteriores proprietários do prédio, que indicaram os respectivos limites). OO referiu, ainda, as confrontações do prédio dos Apelantes, bem como com base em que elementos o réu tem conhecimento dos limites dos seus terrenos, maxime, da parcela que integrava o prédio que hoje pertence aos autores. Nenhum dos restantes depoimentos aportou qualquer contributo relevante quanto à configuração e à área do prédio dos autos, na medida em que as restantes pessoas inquiridas desconheciam o mesmo, em termos efectivos. Assim, os autores AA e BB, prestaram declarações de forma espontânea e clara, relatando os termos em que adquiriram o terreno em discussão nos autos, os contactos que encetaram com a Câmara Municipal ... com vista à aquisição do terreno destes, que confronta a norte com aquele e, posteriormente, quanto à sobreposição de áreas dos terrenos, e que culminou com uma deslocação ao local, para delimitação de estremas. No entanto, desconheciam totalmente os limites efectivos do prédio dos autos, antes da respectiva aquisição. Na realidade, AA declarou expressamente que o único contacto que teve com o vendedor do terreno foi no dia da escritura, que os limites lhe foram indicados pela imobiliária, que foi através desta que obtiveram o levantamento topográfico junto com a petição inicial e que nunca esteve com o topógrafo. A autora BB, por seu turno, confirmando que nunca falou com o anterior proprietário acerca dos limites e da área do terreno e que desconhece o histórico do mesmo, esclareceu que a imobiliária lhes facultou um primeiro levantamento topográfico, mas sem georreferenciação e que foi já depois da compra, através do arquitecto que contrataram, que foi feito um novo levantamento; quem colocou estacas no terreno, a delimitar o mesmo, por referência à área de 639 m2, foi o topógrafo que contrataram e não ter falado com o topógrafo. De resto, pese embora ambos os autores tenham mencionado ter ideia que o pai de AA esteve presente no primeiro levantamento topográfico, junto aos autos com a petição inicial, tal surge contrariado pela circunstância de o mesmo ter sido elaborado em 2017, muito antes da respectiva compra pelos autores e o topógrafo que o elaborou, LL, ter declarado que em 2021, quando assinou o levantamento que instruiu o pedido de alteração de áreas junto das Finanças, não deve ter ido ao local novamente, sendo certo que não se recordava de lá ter ido. KK, arquitecto contratado pelos Apelantes, para elaborar o projecto da moradia que pretendiam construir no terreno dos autos, apesar de ter afirmado que sempre viu no local as estacas a delimitar o prédio dos autores com a área de 639 m2, a autora BB, todavia, afirmou que isso foi feito, apenas, pelo topógrafo que contrataram através da própria testemunha, ou seja, já após a compra do terreno, quando da elaboração do projecto de arquitectura da moradia que nele pretendiam construir. Por outro lado, KK admitiu não ter estado presente no levantamento topográfico anterior, efectuado através da imobiliária, nem no realizado através do topógrafo PP, não ter falado com o topógrafo que fez o levantamento topográfico anterior, LL; que foram os autores que lhe transmitiram os limites do terreno e que não sabe desde quando lá estavam as estacas a delimitar o mesmo e que o levantamento junto com a petição inicial, que lhe foi apresentado pelos autores, é daqueles que se fazem para rectificação de áreas de registo. Neste contexto, é manifesto que também temos que concluir, em sintonia com o Tribunal a quo, que KK desconhece a configuração, os limites e a área do terreno dos autores, máxime, antes da respectiva compra por estes, bem como o historial do mesmo. Nessa medida, o seu depoimento assomou-se inidóneo para indiciar que a área de 639 m2, que consta actualmente da caderneta predial e do registo predial, é a área real ou efectiva do terreno em discussão nos autos. Refira-se, ainda, que a circunstância de a Câmara Municipal ... ter indicado inicialmente que a área de sobreposição entre o seu terreno e o adquirido pelos Apelantes era menor do que aquela que veio a demarcar no local, conforme referido pelos autores e por KK, não assume qualquer relevo, por ser incapaz de demonstrar qual a área efectiva do terreno adquirido pelos autores, concretamente, que é de 639 m2, facto que a estes competia provar, o que não lograram fazer. Por fim, QQ, presidente da Câmara Municipal ... desde Outubro de 2013, no seu depoimento de parte, declarou desconhecer as confrontações do prédio dos autores, revelando escasso conhecimento dos factos controvertidos (como é natural, visto que compreendem questões técnicas, adstritas a departamentos específicos do réu, como é do conhecimento geral) e, como tal, pouco contribuindo para o esclarecimento dos mesmos. Verifica-se, assim, em sintonia com o Tribunal a quo, que inexiste qualquer meio de prova que indicie que o prédio dos autos, adquirido pelos autores, possui actualmente a área efectiva de 639 m2 e, menos ainda, que quando da expropriação por utilidade pública, por parte do réu, a parcela em causa possuísse a área total de 1.181,20 m2, que foi o argumento utilizado para rectificar a área na Conservatória do Registo Predial, no ano de 2021 (cf. documentos juntos aos autos pela Conservatória do Registo Predial em 25-01-2024). No que respeita às confrontações do prédio dos autores, refira-se que os próprios declararam e reconheceram que a norte o mesmo confronta com um terreno do réu (que pretendiam adquirir). Já as confrontações a nascente, poente e a sul que foram alegadas na petição inicial, foram contrariadas pelo depoimento de OO e pelos documentos n.ºs 5, 6 e 10, juntos com a contestação. Afigura-se-nos, por isso, à luz da globalidade da prova produzida conjugada com as regras da lógica e da experiência comum que não merece crítica as respostas à matéria de facto provada no segmento impugnado, improcedendo, por isso, a impugnação apresentada. * A matéria de facto que fica em definitivo julgada provada é assim fixada em 1ª instância. * 4.2 Do mérito da decisão No caso vertente, os Apelantes pugnam pela alteração da decisão. Sustentam tal pretensão na alteração da matéria de facto. Mantendo-se, todavia, inalterada a mesma impõe-se o não provimento da apelação. De resto, conforme dimana do acórdão de 14-11-2024 do Supremo Tribunal de Justiça[3] “A presunção da titularidade do direito de propriedade constante do artigo 7.º do Código do Registo Predial não abrange a área, limites, estremas ou confrontações dos prédios descritos no registo, pois o registo predial não é constitutivo e não tem como finalidade garantir os elementos de identificação do prédio.” Assim, afigura-se-nos que o Tribunal a quo, ao decidir como decidiu, o fiz com acerto. Expliquemos. O registo predial destina-se essencialmente, conforme se diz no artigo 1.º do Código do Registo Predial e ninguém ignora, a dar publicidade à situação jurídica dos prédios, tendo em vista a segurança do comércio jurídico imobiliário. Ao pronunciar-se sobre ele, escreveu Vaz Serra[4] que a sua função “é assegurar a quem adquire direitos de certa pessoa sobre um prédio que esta não realizou em relação a ele actos susceptíveis de prejudicar o mesmo adquirente”. A isto se limitando, no entanto, o registo predial - é até usual dizer-se, dada a sua natureza declarativa e não constitutiva no nosso sistema jurídico, que "o regime não dá direitos, mas apenas os conserva"[5] - que não já a garantir que "o direito pertença, na realidade, à pessoa que figura no registo como seu titular ou que esse direito não esteja desfalcado no seu valor por alguns encargos: em primeiro lugar, porque não estão sujeitos a registo todos os actos que o deviam estar; em segundo lugar, porque o registo não sana radicalmente os defeitos de que porventura enfermem os títulos apresentados para o registo"[6] forçosa parece ser a conclusão de que o artigo 7.º do Código de Registo Predial, ao preceituar que "o registo definitivo constitui presunção de que o direito existe e pertence ao titular inscrito, nos precisos termos em que o registo o define", se propõe firmar apenas esta dupla presunção: a) a de que o direito registado existe; e b) a de que o mesmo pertence ao titular inscrito, nos precisos termos em que o registo o define. A presunção que a lei estabelece sobre esta "situação jurídica" (que a inscrição visa tornar conhecida - artigo 91.º, n.º 1 do Código do Registo Predial), situação só respeitante, como se vê, à existência do direito registado e à identificação do titular inscrito, nos termos em que o registo o define, não abrange, assim, a área e confrontações do prédio. A inclinar-nos neste sentido está o facto de só os factos jurídicos e as acções e decisões indicados nos artigos 2.º e 3.º do Código do Registo Predial, em que se não incluem as descrições dos prédios, estarem sujeitos a registo. Não se ignora que a descrição tem por fim a identificação física, económica e fiscal dos prédios (artigo 79.º, n.º 1 do Código do Registo Predial) e que o registo se compõe da descrição predial, da inscrição dos factos e respectivos averbamentos, ... (artigo 76º, n.º 1 do Código do Registo Predial), mas não fazendo a descrição parte do elenco dos factos a registar que se mencionam nos citados artigos 2.º e 3.º do Código do Registo Predial, não podem a área e confrontações dos imóveis constantes da descrição considerar-se abrangidas pela presunção que se estabelece no citado artigo 7.º. Mal se compreenderia, de resto, que, destinando-se o registo a dar sobretudo publicidade à verificação de certos "factos jurídicos" e não a garantir os elementos de identificação dos prédios descritos, bastasse a simples indicação da área e confrontações constantes de uma descrição para, sem mais, as mesmas se terem de aceitar como factos presumidos. Só estabelecendo-o a lei, como faz em relação àqueles "factos", assim se teria de entender. Não sendo este o caso, não são eles de presumir. Quanto mais não seja, por os "factos jurídicos" a registar se terem de basear em "documentos que legalmente os comprovem" (artigo 43.º do Código do Registo Predial actual) e a descrição poder resultar de simples declarações complementares dos interessados (artigos 29º, n.º 2 e 30º do Código do Registo Predial vigente) que, conforme se observa no acórdão do STJ de 1 de Junho de 1978 (Boletim 278/205), não oferecem as mesmas condições de segurança. A corroborar a solução por que se opta está ainda o facto de a descrição dos prédios rústicos se dever harmonizar quanto à área com a inscrita na matriz (artigos 28º, 29º e 30º do Código do Registo Predial vigente) - um dos objectivos cada vez prosseguidos pelo legislador, conforme se infere do preâmbulo do Decreto-Lei n.º 60/90, de 14 de Fevereiro e preceituado no artigo 30 do Código do Registo Predial na redacção que lhe deu este diploma, ao determinar que, em caso de divergência, se junte "planta do prédio, assinada por todos os proprietários confinantes". De resto, no caso em apreço, os Apelantes não alegaram quaisquer factos susceptíveis de demonstrar a aquisição originária do prédio, por via de usucapião, nomeadamente, no que respeita à concreta configuração do mesmo, incluindo a respectiva área. Limitaram-se a alegar a inscrição do terreno em discussão nos autos no registo predial, a seu favor, o qual, conforme já tivemos oportunidade de assinalar supra, faz presumir que o direito de propriedade existe e que pertence ao titular inscrito. Ora, da factualidade provada decorre que o terreno destinado a construção urbana, sito em ..., ..., inscrito na matriz predial urbana com o artigo ...41, encontra-se descrito na Conservatória do Registo Predial de ... sob o número ...10, a favor dos autores, pela Ap. ...46 de 2021/09/06, por compra a CC e de DD – 5) e 6.4) dos factos provados. Presume-se, assim, que os autores são os proprietários de tal prédio – artigo 7.º do Código do Registo Predial. Sucede, porém, conforme atrás referimos, que tal presunção não abrange os limites/confrontações ou as áreas/dimensões dos prédios. Como tal, as características dos prédios que constam das certidões registrais da Conservatória do Registo Civil, ou das cadernetas prediais da “Autoridade Tributária e Aduaneira”, não estão abrangidas pela força probatória que tais documentos possuem e, como tal, são insusceptíveis de demonstrar que aqueles possuem a concreta configuração neles referida. Como tal, competia aos Apelantes provar que o prédio de que são donos possui as confrontações e a área que alegaram, o que não constituía prova impossível e que não lograram fazer – cf. 1) a 5) dos factos provados e a) dos factos não provados. Ou seja, não abrangendo a presunção consignada no artigo 7.º do Código do Registo Predial a área e confrontações dos prédios descritos, claro que, para estes elementos se poderem dar como assentes, tinha a autora, que realmente os alegou como factos constitutivos do seu direito, que fazer a prova deles (artigo 342.º, n.º 1 do Código Civil). Não o tendo conseguido, é evidente que, dependendo o êxito da acção da prova destes dados, não podia a decisão a proferir divergir da que se ditou. Consequentemente, não merece provimento o recurso. Impõe-se, por isso, o não provimento da apelação. * Sumariando, em jeito de síntese conclusiva: …………………………………………….. …………………………………………….. …………………………………………….. * 5. Decisão Nestes termos, acorda-se neste Tribunal da Relação do Porto no não provimento do recurso de apelação, confirmando a decisão recorrida. * Custas a cargo dos Apelantes. * Notifique.
Porto, 09 de Janeiro de 2025 Os Juízes Desembargadores Relator: Paulo Dias da Silva 1.º Adjunto: Judite Pires 2.º Adjunto: Paulo Duarte Teixeira
(a presente peça processual foi produzida com o uso de meios informáticos e tem assinaturas electrónicas e por opção exclusiva do relator, o presente texto não obedece às regras do novo acordo ortográfico, salvo quanto às transcrições/citações, que mantêm a ortografia de origem) _____________________________ [1] Cf. Acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça de 18.1.2018, relator José Rainho, 668/15, de 28.9.2017, relatora Fernanda Isabel Pereira, 809/10, publicados na base de dados da dgsi.[2] Cf. Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 10.12.2019, Graça Amaral, 1808/03, publicado na base de dados da dgsi. |