Acórdão do Tribunal da Relação do Porto | |||
Processo: |
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Nº Convencional: | JTRP000 | ||
Relator: | EUGÉNIA CUNHA | ||
Descritores: | INCIDENTE DE HABILITAÇÃO DE ADQUIRENTE PRINCÍPIO DA ESTABILIDADE DA INSTÂNCIA FALTA DE PERSONALIDADE E CAPACIDADE JUDICIÁRIAS | ||
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Nº do Documento: | RP2021110813775/18.1T8PRT-B.P1 | ||
Data do Acordão: | 11/08/2021 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Texto Integral: | S | ||
Privacidade: | 1 | ||
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Meio Processual: | APELAÇÃO | ||
Decisão: | CONFIRMADA | ||
Indicações Eventuais: | 5ª SECÇÃO | ||
Área Temática: | . | ||
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Sumário: | I - Na habilitação, que é, no essencial, a prova da aquisição da titularidade da situação jurídica ou do direito, cumpre distinguir a habilitação-legitimidade da habilitação-incidente. Na primeira, os factos de que decorre aquela qualidade são alegados pela parte ativa logo no requerimento com que dá início à causa e por ela provados; nesta apura-se da qualidade que, de harmonia com o direito substantivo, legitima a substituição da parte na pendência da causa (conformando-se a relação processual com a “relação substantiva em litígio” – v. al. a), do art. 262º, do CPC), regulada nos arts 351º e segs de tal diploma. II - Dentro desta, encontra-se o incidente de habilitação de adquirente, especialmente regulado no art. 356º, facultativo (v. art. 263º) e que visa tão só o efeito de natureza meramente processual de modificação dos sujeitos da lide, sendo meio de obter a conformação da relação processual com as vicissitudes do direito substantivo verificadas na pendência da causa (traduzindo a verificação de ocorrência de modificação subjetiva da instância por atos entre vivos - al. a), do art. 262º -, exceção ao princípio da estabilidade da instância, consagrado no art. 260º, preceitos do CPC). III - São pressupostos de admissibilidade do incidente de habilitação de adquirente (cfr. arts 356º e 263º): i) a pendência de uma ação; ii) a existência de uma coisa ou de um direito litigioso; iii) a transmissão da coisa ou direito litigioso na pendência da ação, por ato entre vivos; iv) e o conhecimento da transmissão durante a ação. IV - Tal incidente nunca pode ser usado pela parte com um meio para suprir a falta de pressupostos processuais (como a falta de personalidade judiciária), que, originariamente, se verifique. | ||
Reclamações: | |||
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Decisão Texto Integral: | Apelação nº 13775/18.1T8PRT-B.P1 Processo do Juízo de Execução do Porto – Juiz 4 Relatora: Eugénia Maria de Moura Marinho da Cunha 1º Adjunto: Maria Fernanda Fernandes de Almeida 2º Adjunto: Maria José Simões Acordam na 3ª Secção Cível do Tribunal da Relação do Porto Sumário (cfr nº 7, do art.º 663º, do CPC): ……………………………… ……………………………… ……………………………… * I. RELATÓRIORecorrentes: os Requerentes, B… e mulher, C… Recorrido: o Requerido, D… B… e mulher, C…, deduziram, por apenso à execução em que é executado o D…, ao abrigo do art. 356º, do Código de Processo Civil, incidente de habilitação de adquirente, pedindo se considerem os requerentes habilitados como adquirentes do crédito exequendo para com eles prosseguir a execução. Alegam, para tanto, terem celebrado, na qualidade de únicos sócios da sociedade exequente, “E…, Lda”, que, conforme certidão emitida pela CRP Porto tem a liquidação já, definitivamente, encerrada e a matricula cancelada, o “Acordo Unânime de Partilha” de créditos que juntam, pelo qual procederam à partilha dos ativos da sociedade, adjudicando-os em comum aos requerentes, na proporção das respetivas frações do capital social, ativos de que faziam parte os créditos que a referida sociedade detinha sobre o ora Requerido (executado). O Requerido/executado, regularmente notificado, apresentou-se a contestar sustentando que a referida sociedade foi declarada insolvente e já não existia à data de propositura da ação executiva, pelo que nunca poderiam os Requerentes ser habilitados já que não estamos perante qualquer transmissão do direito litigioso. Os Requerentes apresentaram resposta. * O Tribunal a quo, por considerar que o estado dos autos o permitia, sem necessidade de mais provas, apreciou a pretensão deduzida, proferindo a seguinte “Decisão: Pelo exposto, julgo a presente habilitação do adquirente improcedente, absolvendo o requerido do pedido. Custas do incidente pelos aqui requerentes (cfr. os arts. 527.º, n.ºs 1 e 2, 535.º, n.º 1, e 539.º, n.º 1, todos do CPC), sem prejuízo do apoio judiciário, mantendo-se como valor do mesmo o indicado no requerimento inicial. Notifique e registe. Comunique ao Sr. AE. DN”. * Os Requerentes apresentaram recurso de apelação, pugnando por que seja revogada a decisão e substituída por outra que julgue procedente o pedido de habilitação, formulando as seguintesCONCLUSÕES: “1. O Requerido, D…, contestou o incidente nos exactos termos que resultam da contestação registada no processo desmaterializado sob a referência CITIUS 27590444, de 10/12/2020, dela resultando que em lado suscitou como razão de oposição “que a operada partilha/transmissão dos créditos visou tornar mais difícil a posição processual do aqui requerido/executado”. 2. Ao ter conhecido de tal questão não suscitada pelo aqui Recorrido, a sentença incorreu na nulidade por excesso de pronúncia prevista no artigo 615º, nº 1, al. d) do CPC, invalidade processual que expressamente se invoca e que, uma vez declarada, determina nessa medida a revogação de tal decisão. 3. Resulta documentalmente provado (docs. nºs 1 e 2 da PI), correspondendo ao facto 4 dos provados da sentença recorrida, o que pelos Recorrente foi alegado no artigo 1º da sua Petição Inicial a saber: Por acordo unânime de partilha, celebrado em 28/10/2020, os ora requerentes na qualidade de únicos sócios da sociedade “E…, LDA”, Exequente nos autos principais de que estes são apensos, ao abrigo do disposto no artigo 164º Nº 1 do Código das Sociedades Comerciais, procederam à partilha dos ativos desta sociedade, adjudicando-os em comum aos ora Requerentes, na proporção das respetivas frações do capital social, ou seja, ¾ para o Requerente B… e ¼ para a Requerente C…. 4. A personalidade colectiva é, como a singular, uma realidade do mundo jurídico, mas tendo subjacente uma realidade extra-jurídica, assaz diferente da que intervém nas pessoas singulares pelo que em homenagem às razões subjacentes à finalidade da atribuição de personalidade jurídica a essa realidade diversa, não existe uma estrita identidade, um mimetismo, entre a configuração jurídica da personalidade individual e da personalidade colectiva. 5. O artigo 164º, nº 1 do CSC é uma afloração de tal diversidade e, configura causa de aquisição do direito litigioso e fundamento da requerida habilitação processual. 6. A decisão recorrida violou, por erro de interpretação e aplicação o disposto no artigo 164º, nº 1 do Código das Sociedades Comerciais e nos artigos 262º, al. a) e 356º, nºs 1 e 2 do CPC, devendo ser revogada e substituída por outra que julgue procedente o pedido de habilitação e, em conformidade com a modificação subjectiva da instância, determine o prosseguimento da execução. * Não foram apresentadas contra alegações.* Entendeu o Tribunal a quo não se verificar a nulidade da sentença invocada pelos recorrentes.* Após os vistos, cumpre apreciar e decidir o mérito do recurso interposto.* II. FUNDAMENTOS- OBJETO DO RECURSO Apontemos as questões objeto do presente recurso, tendo presente que o mesmo é balizado pelas conclusões das alegações dos recorrentes, estando vedado ao tribunal conhecer de matérias nelas não incluídas, a não ser que se imponha o seu conhecimento oficioso, acrescendo que os recursos não visam criar decisões sobre matéria nova, sendo o seu âmbito delimitado pelo conteúdo do ato recorrido – cfr. arts 635º, nº4, 637º, nº2 e 639º, nºs 1 e 2, do Código de Processo Civil. Assim, as questões a decidir são as seguintes: 1ª - Se a sentença padece do vício de nulidade por excesso de pronúncia; 2ª- Da verificação dos pressupostos do incidente de habilitação de adquirente (se ocorreu transmissão do crédito motivadora de modificação subjetiva da instância). * II.A – FUNDAMENTAÇÃO DE FACTOFACTOS PROVADOS Foram os seguintes os factos considerados provados pelo Tribunal de 1ª instância: 1. Nos autos de execução instaurados em 08/06/2018, de que o presente incidente de habilitação constitui um apenso, a exequente é a empresa denominada “E…, Lda.”. 2. A citada execução encontra-se na fase de penhora, existindo embargos de executado pendentes (apenso-A), como tudo consta dos autos. 3. A referida sociedade exequente “E…, Lda.”, foi já declarada insolvente em 10/05/2006, sendo registado em 06/03/2017 o encerramento da sua liquidação, por decisão de 01/03/2017, transitada em tal data, estando a matrícula já cancelada desde 06/03/2017, como tudo consta da certidão comercial junta aos autos, sendo também entretanto rejeitada a impugnação judicial da citada decisão do Sr. Conservador da Conservatória do Registo Comercial do Porto, por decisão de 16/09/2019, confirmada na Relação do Porto em 08/09/2020, transitada em julgado, como tudo consta da certidão judicial de 05/11/2020 junta nos embargos, cujo teor aqui se dá por reproduzido. 4. Por documento denominado “acordo unânime de partilha”, datado 28/10/2020, celebrado entre os aqui requerentes B… e mulher C…, na qualidade de sócios da acima referida sociedade, que estava já extinta e com a matrícula cancelada, foi feita a partilha e a adjudicação a tais requerentes/sócios dos créditos da requerida sociedade, incluindo do crédito em causa na execução de que estes autos são um apenso, como tudo consta do documento junto aos autos, cujo teor aqui se dá por reproduzido. * II.B - FUNDAMENTAÇÃO DE DIREITO1ª- Da nulidade da sentença, por vício de excesso de pronúncia Arguem os Apelantes a nulidade da sentença por a mesma padecer de excesso de pronúncia, vício previsto na alínea d), do nº1, do art.º 615.º, do Código de Processo Civil, diploma a que pertencem todos os preceitos citados sem outra referência. Invocada a referida nulidade, tal questão é a que primeiro cumpre apreciar, pois que, contendendo com a validade da própria decisão, só se concluirmos pela efetiva validade, ao menos parcial, se pode entrar na apreciação das demais questões suscitadas, o que de outro modo fica prejudicado. Sustentam os apelantes que a sentença é nula, pois conheceu de questão que não podia apreciar por não suscitada pelo Requerido, D…, pois que das razões de oposição não resulta a de ter a partilha/transmissão dos créditos visado tornar mais difícil a posição processual do aqui requerido/executado. Cumpre apreciar se se verifica a invocada nulidade da sentença. O nº1, do art.º 615º, que consagra, taxativamente, as “Causas de nulidade da sentença”, estabelece que é nula a sentença quando: (…) “d) O juiz deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar ou conheça de questões de que não podia tomar conhecimento”. As nulidades de decisão são vícios intrínsecos (quanto à estrutura, limites e inteligibilidade) da peça processual que é a própria decisão (error in procedendo). E há nulidade da sentença quando a sua parte dispositiva está em contradição com as premissas efetivamente adotadas pelo juiz e não com as premissas que ele poderia ter adotado, no entender de uma das partes, mas não adotou. Como vícios intrínsecos de tal peça processual, são apreciadas em função do texto e do discurso lógico nela desenvolvidos, não se confundindo com a errada aplicação das normas jurídicas aos factos, erros de julgamento, estes, a sindicar noutro âmbito. Tais vícios não se confundem com erros de julgamento (error in judicando), que são erros quanto à decisão de mérito explanada na sentença, decorrentes de má perceção da realidade factual (error facti) e/ou na aplicação do direito (error juris), de forma que o decidido não corresponde à realidade ontológica ou normativa. Nos erros de julgamento assiste-se a uma deficiente análise crítica das provas produzidas ou a uma deficiente enunciação e/ou interpretação dos institutos jurídicos aplicados ao caso concreto. Esses erros, por não respeitarem já a defeitos que afetam a própria estrutura da sentença, mas o mérito da relação material controvertida nela apreciada, não a inquinam de invalidade, mas de error in judicando atacáveis em via de recurso[1]. E os vícios da sentença, taxativamente enumerados no referido preceito, respeitam uns à sua estrutura e outros aos limites da mesma, respeitando àquela os fundamentos das alíneas b) (falta de fundamentação) e c) (oposição entre os fundamentos e a decisão) e a estes os das alíneas d) (omissão ou excesso de pronúncia) e e) (pronúncia ultra petitum)”[2]. Analisemos o vício que lhe é apontado, consagrado na al. d), respeitante aos limites da sentença. Na decisão, devendo o juiz conhecer de todas as questões que lhe são submetidas, isto é, de todos os pedidos deduzidos, todas as causas de pedir e exceções invocadas e todas as exceções de que oficiosamente lhe cabe conhecer (art. 608-2), o não conhecimento de pedido, causa de pedir ou exceção cujo conhecimento não esteja prejudicado pelo anterior conhecimento de outra questão, constitui nulidade, não a constituindo a omissão de consideração de linhas de fundamentação jurídica, diferentes da sentença, que as partes hajam invocado[3], dada, desde logo, a não sujeição do juiz às alegações das partes no que concerne à indagação, interpretação e aplicação das regras de direito (art. 5º, n.º 3 do CPC)[4]. Assim, cabe distinguir “questões” das “razões ou argumentos”, pois que uma coisa é o tribunal deixar de pronunciar-se sobre questões que devia apreciar e outra, diversa, é invocar razão, boa ou má, procedente ou improcedente, para justificar a sua abstenção. “São, na verdade, coisas diferentes: deixar de conhecer a questão de que devia conhecer-se, e deixar de apreciar qualquer consideração, argumento ou razão produzida pela parte. Quando as partes põem ao tribunal determinada questão, socorrem-se, a cada passo, de várias razões ou fundamentos para valer o seu ponto de vista; o que importa é que o tribunal decida a questão posta; não lhe incumbe apreciar todos os fundamentos ou razões em que elas se apoiam para sustentar as suas pretensões”[5]. A não pronúncia pelo tribunal quanto a questões que lhe são submetidas determina a nulidade da sentença, não a sendo suscetível de determinar a falta de discussão das “razões” ou “argumentos” invocados para concluir sobre as questões. A nulidade da sentença, por omissão ou excesso de pronuncia, há de, assim, resultar da violação do dever prescrito no n.º 2 do referido artigo 608º do Código de Processo Civil do qual resulta o dever do juiz de resolver todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação, excetuadas aquelas cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras, e não pode ocupar-se senão das questões suscitadas pelas partes, salvo se a lei permitir ou impuser o conhecimento oficioso de outras. Na verdade, não se verifica omissão de pronúncia quando o não conhecimento de questões fique prejudicado pela solução dada a outras[6] e o dever de pronúncia obrigatória é delimitado pelo pedido e causa de pedir e pela matéria de exceção[7]. O dever imposto no nº2, do artigo 608º diz respeito ao conhecimento, na sentença, de todas as questões de fundo ou de mérito que a apreciação do pedido e da causa de pedir apresentadas pelo autor (ou, eventualmente, pelo réu reconvinte) suscitam. Só estas questões é que são essenciais à solução do pleito e já não os argumentos, razões, juízos de valor ou interpretação e aplicação da lei aos factos. Para que este dever seja cumprido, é preciso que haja identidade entre a causa petendi e a causa judicandi, entre a questão posta pelas partes e identificada pelos sujeitos, pedido e causa de pedir e a questão resolvida pelo juiz[8]. A sentença deve, pois, “começar pelo conhecimento das questões processuais que podem conduzir à absolvição da instância, devendo nela ser consideradas todas as que as partes tenham deduzido, a menos que prejudicadas pela solução dada a questão anterior de que a absolvição tenha já resultado. Se, porém, puder ter lugar uma decisão de mérito inteiramente favorável à parte cujo interesse a exceção dilatória vise tutelar, o juiz deve proferi-la em vez de absolver o Réu da instância (nº5, do art. 278). Não havendo lugar à absolvição da instância, segue-se a apreciação do mérito da causa. O juiz vai agora respondendo aos pedidos deduzidos pelo autor e pelo réu reconvinte, a todos devendo sucessivamente considerar, a menos que, dependendo algum deles da solução dada a outro, a sua apreciação esteja prejudicada pela decisão deste, assim acontecendo quando procede o pedido principal, não havendo lugar à apreciação do pedido subsidiário (ver o nº2, do art. 554), quando, ao invés, não é atendido um pedido prejudicial relativamente a outro cumulativamente deduzido (ver o nº3 do art. 555) e quando identicamente, a procedência ou, ao invés, a improcedência do pedido principal acarreta a não apreciação do pedido reconvencional (…) O mesmo fará relativamente às várias causas de pedir invocadas, se mais do que uma subsidiariamente fundar o pedido, bem como quanto às exceções perentórias que tenham sido deduzidas pelo Réu ou pelo autor reconvindo e àquelas de que deva tomar conhecimento oficioso. (…) “Resolver todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação” não significa considerar todos os argumentos que, segundo as várias vias, à partida plausíveis, de solução do pleito, as partes tenham deduzido ou o próprio juiz possa inicialmente ter admitido: por um lado, através da prova, foi feita a triagem entre as soluções que deixaram de poder ser consideradas e aquelas a que a discussão jurídica ficou reduzida; por outro, o juiz não está sujeito às alegações das partes quanto à indagação, interpretação e aplicação das normas jurídicas (art. 5-3) e, uma vez motivadamente tomada determinada orientação, as restantes que as partes hajam defendido, nomeadamente nas suas alegações de direito, não têm de ser separadamente analisadas (Alberto dos Réis. CPC anotado cit., V. p. 143)”[9], até porque a sentença não é uma “obra doutrinária: o juiz tem de resolver um litígio concreto e não deve perder de vista que o deve fazer com economia processual”[10]. Relativamente ao excesso de pronúncia, diga-se que “Não podendo o juiz conhecer de causas de pedir não invocadas, nem de exceções não deduzidas na exclusiva disponibilidade das partes (art. 608-2), é nula a sentença em que o faça”[11]. No caso estamos perante a dedução de um pedido incidental, de habilitação de adquirente, regulado no art. 356º, para decidir, tão só, da substituição de parte no processo, em função da natureza do específico meio. E certo sendo que para que se considere arguida a situação enunciada na parte final da al. a) do nº1, do art. 356º, não basta a argumentação de que em consequência da substituição se agrava a posição da parte contrária, sendo necessário que se alegue e prove que a transmissão foi feita para atingir esse resultado (RE 23-5-13, 520/11)[12], não sendo admissível o conhecimento oficioso desta questão[13], não foi, contudo, a situação enunciada na parte final da al. a) do nº1, do art. 356º que, como veremos, fundamentou a decisão, mas sim a falta de verificação dos pressupostos legais de procedência de tal incidente, pelo que nunca a nulidade arguida pode proceder. Com efeito, não padece a sentença da apontada nulidade, não tendo o juiz conhecido de questão que lhe não foi colocada pelas partes, antes, até, mesmo, o Requerido/executado refere, na sua contestação, que se não verifica superveniência do crédito e que os Requerentes, bem sabendo de toda a situação, como descreve, e de que a sociedade já não existia à data da propositura da execução vieram, agora, com o alegado “Acordo Unânime de Partilha”, estando questões, que se prendem, designadamente, como a falta de pressupostos processuais para serem apreciadas no âmbito dos embargos de executado e o Tribunal a quo limitou-se a considerar assim acontecer. Mas mais do que isso, a decisão recorrida, indo mais longe, julgou improcedente a habilitação de adquirente por “não se verificarem os pressupostos legais” de procedência de tal incidente, pois que, estando já extinta a sociedade à data da propositura da execução e não se destinando o incidente em causa a suprir a falta de personalidade judiciária, não pode o mesmo servir para a obtenção de tal fim. Não decidiu o Tribunal o incidente no sentido da sua improcedência dado que “a operada partilha/transmissão dos créditos visou tornar mais difícil a posição processual do aqui requerido/executado”, mas por inverificados se mostrarem os pressupostos de procedência da pretensão deduzida no incidente, embora, também, bem tenha notado e qualificado a atuação dos apelantes/requerentes no processo, que entendeu maliciosa. A decisão recorrida, apreciando os factos e fundamentando de direito, a final tão só decidiu da verificação dos pressupostos do incidente deduzido, concluindo pelo não preenchimento dos mesmos. De nenhum excesso de pronúncia padece a decisão que, antes, conheceu da questão que lhe foi submetida para apreciação e decisão, fazendo a subsunção jurídica do caso às normas aplicáveis e concluindo pela não verificação dos pressupostos de que depende a procedência do incidente deduzido, que julgou improcedente. Destarte, improcedem, por conseguinte, as referidas conclusões da apelação, não padecendo a decisão do vício, previsto na al. d), do nº1, do art. 615º, nulidade por excesso de pronúncia, antes o Tribunal apreciou e decidiu a questão que lhe foi colocada – a da verificação dos pressupostos do incidente deduzido - decisão essa que, de seguida se passa a apreciar. * 2ª - Da habilitação e seus efeitos e da verificação dos pressupostos do incidente de habilitação de adquirente (art 356º, do CPC)A habilitação é, no essencial, a prova da aquisição, por sucessão ou transmissão, da titularidade de um direito ou de um complexo de direitos ou de outra situação jurídica ou complexo de situações jurídicas[14], devendo a mesma, conforme a situação, ser efetuada no primeiro articulado da causa (habilitação legitimidade) ou em incidente. Assim, a habilitação-legitimidade, em que os factos de que decorre aquela qualidade são, desde logo, alegados pela parte ativa no requerimento com que dá início à causa, distingue-se da habilitação incidental, deduzida já na pendência da causa. Sendo a legitimidade um pressuposto processual, e, desde logo, a ilegitimidade das partes uma exceção dilatória de conhecimento oficioso – cfr. arts 577º, al. e) e 578º - cabe ao juiz conhecer dela, bem como dos demais pressupostos processuais, e, quando o não faça, tem o executado, citado, a possibilidade de se opor à execução por embargos, sempre podendo ser apreciada. Em matéria executiva, existem disposições especiais a regular a legitimidade processual das partes, como decorre, desde logo, dos arts. 53.º, n.º 1 e 54.º, n.º 1. Com efeito, nos termos daquele preceito, surge, como regra geral, o princípio da legitimidade formal ou da coincidência, que impõe “A execução tem de ser promovida pela pessoa que no título executivo figure como credor e deve ser instaurada contra a pessoa que no título tenha a posição de devedor”, bastando, assim, na generalidade dos casos, analisar o documento para definir quem tem interesse direto ativo ou passivo na ação executiva, sem ser, por isso, de proceder à análise, para esse efeito, da relação material controvertida. Apela-se, assim, para a literalidade do título executivo, seja ele sentença, contrato, título de crédito ou qualquer outro. Num certo sentido, a legitimidade singular executiva apura-se por confronto entre o título executivo e as partes da causa[15]. Porém, existem desvios à regra geral da determinação da legitimidade, consagradas em obediência ao princípio da economia processual. O legislador optou, em determinados casos, por derrogar o princípio da legitimidade formal, isto é, permitir que a ação executiva seja intentada por alguém ou contra alguém que não figura no título executivo (ultra titulum), evitando, desse modo, a necessidade de formação de um novo título executivo e subsequente sobrecarga da atividade dos tribunais[16]. Estas exceções integram “vicissitudes dos títulos executivos que, manifestando-se, desde logo, no direito material, não poderiam ser ignoradas pelo direito adjetivo. Assim acontece quando ocorre um fenómeno sucessório, inter vivos ou mortis causa do credor ou do devedor. Em tais circunstâncias, é imposto ao exequente algo mais do que a mera solicitação do cumprimento coercivo da obrigação exequenda, devendo alegar no requerimento executivo factos relevantes da sua legitimidade ativa ou da legitimidade passiva do executado (v.g. a morte e o vinculo sucessório, a cessão do crédito, a assunção de dívida, a extinção e liquidação de sociedade, etc.)”[17]. Deste modo, a regra geral da legitimidade para a ação executiva sofre adaptações nos casos de sucessão, estatuindo o nº1, do art. 54º, que “tendo havido sucessão no direito ou na obrigação, deve a execução correr entre os sucessores das pessoas que no título figuram como credor ou devedor da obrigação exequenda”. Assim, “tendo havido sucessão, entre vivos ou mortis causa, na titularidade da obrigação exequenda, entre o momento da formação do título e o da propositura da ação executiva, seja do lado ativo, seja do lado passivo, devem tomar, desde logo, a posição de parte, como exequentes ou como executados, os sucessores das pessoas que figuram no título como credores ou devedores[18]” sem recurso ao incidente de habilitação, devendo no próprio requerimento para a execução ser alegados os factos constitutivos da sucessão e “ser feita prova complementar no caso de sucessão de quem figure neste como credor ou como devedor … demonstração liminar dos factos constitutivos da sucessão (Lebre de Freitas, A acção executiva cit, nº6)[19], com junção da escritura de habilitação de herdeiros ou do contrato de cessão do crédito. É, assim, dispensado o incidente de habilitação no caso de sucessão ocorrida antes da propositura da ação executiva, mas tem o exequente de, liminarmente, provar, como nele faria, os factos constitutivos que alega[20]. Assim, a sucessão na obrigação tanto pode ser uma sucessão mortis causa como uma transmissão da obrigação para outrem por ato inter vivos, nos termos dos artigos 577º (cessão de créditos) e 595º, ambos do CC, (assunção de dívida) ou endosso (artigos 14º da LULL e LUC)[21]. Assim, como, em elucidativa apreciação conclusiva, refere Rui Pinto[22] “os critérios de atribuição de legitimidade executiva traduzem uma adaptação do artigo 30º à circunstância de a execução ter por base um título executivo, conforme enuncia o artigo 10º nº5. Tanto na ação declarativa como na ação executiva, a legitimidade processual se afere pelos factos principais da causa de pedir, i.e., pelos factos constitutivos do direito da parte ativa. Porém, a causa de pedir da execução não pode ser uma qualquer – ao contrário do que sucede com a causa de pedir declarativa -, mas somente a que consista na aquisição do direito ou poder a uma prestação. Por outro lado, se na ação declarativa a causa de pedir é objeto de mera alegação – a chamada “relação controvertida, tal como é alegada pelo autor” -, na execução a causa de pedir é objeto de representação pelo título executivo, já incontrovertida. Daqui a regra do artigo 53º: têm legitimidade (restrita) para serem partes ativa e passiva os sujeitos que no título figuram como credor e devedor. Essa representação é exigida pela lei processual, como condição formal do exercício do direito à execução (cf. artigo 817º CC). Em ambos os domínios, a legitimidade singular apura-se por confronto[23] ou comparação: na ação executiva, confronto dos sujeitos da instância com o título executivo, na ação declarativa confronto dos sujeitos da instância com a relação controvertida alegada pelo autor. Daqui resulta que há ilegitimidade singular na ação executiva se o exequente ou o executado, apesar de partes processuais, não são os sujeitos do título executivo; tal como há ilegitimidade singular na ação declarativa se o autor e o réu, apesar de partes processuais, não são os sujeitos da relação alegada pelo autor. (…) No entanto, a suficiência formal do título como constitutivo do poder de realização coativa da prestação pode não ser completa, se depois da formação do título ocorrerem modificações na titularidade do crédito ou da dívida. Assim, a lei deve permitir, e, como veremos, permite, que os sucessores ou transmissários possam ser parte na causa por ainda terem um nexo com a legitimidade primária dada no título aos transmitentes – essa é a função do art. 54º, nº1”. Os limites ou critérios excecionais de legitimidade não literal do título – contidos no nº2, do art. 53º, 54º, nº1 e 55º - têm sempre como ponto de partida o título, pelo que a regra é “as partes da execução são sempre credor ou devedor determinados ou determináveis em face do título”[24]. E iniciando-se a instância com a propositura da ação, a mesma estabiliza-se, com a citação da parte contrária, como decorre do disposto no artigo 260º, o que tem “como efeito adjetivo essencial a estabilização da instância no que concerne aos seus elementos subjetivo e objetivo”. É, contudo, desvio a tal regra, o que resulta do incidente de habilitação de sucessores, nos termos assinalados nos arts. 261º e ss, sendo que “estas exceções confirmam a regra de que o autor/exequente, antes de apresentar a acção, deve desenhar a estratégia que prossegue, identificar os sujeitos da relação processual e tomar uma posição clara quer sobre a solução que pretende para o litígio, quer sobre os fundamentos que a sustentam”[25], pois que não é admissível a mera e simples substituição de uma parte por outra e o incidente de habilitação não pode ser utilizado como meio para a obtenção de tal resultado. Com efeito, o princípio da estabilidade da instância impõe que, citado o réu, a instância se mantenha imutável quanto às partes, ao pedido e à causa de pedir, ressalvando o referido preceito “as possibilidades de modificação consignadas na lei”, sendo excecionado, na vertente subjetiva, a “sucessão, por ato entre vivos na relação substantiva em litígio” (cfr. al. a), do art. 262º). Assim, estando já a instância estável, não pode ser substituída uma parte por outrem, salvo nas situações expressamente consagradas na lei, sendo o caso o de transmissão do crédito litigioso. Na situação de transmissão/cessão do crédito, podendo o transmissário/cessionário ser habilitado no lugar do transmitente/cedente, tal habilitação não condiciona o prosseguimento da ação, que se não suspende, nem afeta a legitimidade do transmitente e, “atenta a norma especial de legitimidade ad causam do art. 263º, a dedução deste incidente é facultativa”[26] (v. art. 263º e art. 356º, do CPC). Na verdade, o conhecimento da transmissão/cessão do crédito nenhuma influência tem na tramitação processual, pois, apesar da transmissão para terceiro, por ato entre vivos, do direito, a legitimidade processual continua a pertencer ao transmitente, enquanto o adquirente ou o cessionário não for habilitado, nos termos do art. 356º. E sendo a habilitação, no essencial, a prova da aquisição, por sucessão ou transmissão, da titularidade de um direito (ou complexo de direitos) ou de uma situação jurídica (ou complexo de situações jurídicas), é a mesma “utilizada para promover a substituição no processo de alguém com a mesma qualidade jurídica, ou para substituir o transmitente ou o cedente da coisa ou do direito litigioso”[27], sendo a habilitação-incidente “a que implica a modificação da instância quanto às pessoas, ou seja, a substituição de alguma das partes na relação jurídica processual em litígio por sucessão ou ato entre vivos. Na habilitação-incidente apura-se, em regra, quem tem a qualidade legitimante da substituição da parte falecida na pendência da causa, de harmonia com o direito substantivo, que pode ocorrer em qualquer tipo de processo, declarativo ou executivo, desde a apresentação em juízo da petição ou do requerimento inicial ou do requerimento executivo até ao transito em julgado da decisão final.”[28]. O incidente de habilitação tem como finalidade modificar a instância quanto às pessoas, substituindo uma das partes principais na relação processual, quer seja por sucessão, quer seja por acto entre vivos (cfr. al. a), do art. 262.º). Assim, a habilitação, que, como vimos, envolve uma exceção ao princípio da estabilidade da instância, estabelecido no art. 260º, - por via da qual esta se modifica pela substituição de alguma das partes na relação substantiva em litígio por sucessão ou por ato entre vivos – é suscetível de ser implementada incidentalmente por morte de uma pessoa singular ou de extinção de pessoa coletiva ou por transmissão entre vivos do direito objeto do litígio. Não se destina a suprir a falta de personalidade judiciária ou de legitimidade mas a efetuar adequação ao direito substantivo, substituindo, de harmonia com ele, a parte falecida ou extinta na pendência da causa (sem prejuízo da via, pragmática, estatuída no nº2, do art. 351º, relativamente ao óbito de Réu). Tem, contudo, a extinção da pessoa coletiva ou a transmissão do direito de se ter verificado na pendência da causa. E a admissibilidade da habilitação de adquirente, incidente regulado no art. 356º e v. art. 263º, depende da verificação dos seguintes pressupostos: i) a pendência de uma ação; ii) a existência de uma coisa ou de um direito litigioso; iii) a transmissão da coisa ou direito litigioso na pendência da ação, por ato entre vivos; iv) e o conhecimento da transmissão durante a ação [29]. Resulta do referido artigo que, se na pendência da causa ocorrer a transmissão, por acto entre vivos, da coisa ou direito litigioso, pode através do meio, incidental, aí regulado ser substituída, na causa principal, quem operou essa transmissão por aquele que dela beneficiou. Deste modo, a finalidade do incidente de habilitação e os efeitos jurídicos por este produzidos na ordem jurídica são meramente processuais, resumem-se a operar a substituição da parte primitiva na ação pendente (autor ou réu) pelo sucessor deste, em caso de falecimento ou extinção dessa parte, ou pelo adquirente da coisa ou do direito em litígio nessa ação em caso de transmissão dessa coisa ou direito, não comportando o incidente de habilitação qualquer discussão sobre a relação de direito substantivo em litígio na ação principal. Assim, e em função disso, no incidente de habilitação de adquirente ou cessionário, o contestante apenas pode deduzir como fundamentos de oposição: i) um fundamento de nulidade ou de anulabilidade (formal ou material) que vicie o negócio de transmissão da coisa ou do direito litigioso; ii) que a transmissão foi realizada com o propósito malicioso de tonar mais difícil a posição processual do contestante; iii) que não se encontra feita a prova legal da transmissão pelo requerente do incidente[30]. A habilitação sub judice configura-se como um incidente de uma causa, sendo uma habilitação incidental, regulada pelos arts 351º e sega, alegadamente baseada na transmissão do direito litigioso. Ora, revertendo para o caso, constata-se que, na verdade, a pretensão dos Requerentes, ora apelantes, formulada no presente incidente, não pode proceder, pois que nenhuma prova de transmissão efetuada pela exequente se mostra realizada. In casu, a extinção da pessoa coletiva ocorreu não na pendência da causa, mas anteriormente à propositura da execução, não tendo, evidentemente, sequer a exequente sido parte em qualquer transmissão, por ato entre vivos, na pendência da causa. E, verificando-se a extinção da pessoa coletiva antes de proposta a ação e nunca se podendo a habilitação destinar a suprir a falta de personalidade jurídica e de personalidade judiciária, não pode o incidente deixar de improceder. Bem entendeu o Tribunal a quo que “Conforme resulta do disposto no art.º 263.º, n.º 1, do CPC, só há lugar a habilitação do adquirente ou cessionário quando, por ato entre vivos, é transmitida a coisa ou direito litigioso – cfr. também o art.º 356.º do CPC. Em face dos factos provados, não pode considerar-se que a sociedade exequente cedeu/transmitiu (por ato entre vivos) à aqui requerente a titularidade da posição jurídica – crédito - que pretendia exercer na presente execução. Com efeito, a sociedade exequente está já extinta há muito tempo, não sendo sequer outorgante/parte no “acordo unânime de partilha” celebrado apenas entre os sócios e que foi junto a estes autos, pelo que não houve qualquer transmissão voluntária por parte da exequente a favor dos aqui requerentes. A partilha dos créditos foi efetuada apenas entre os sócios da sociedade extinta e não configura válida e eficaz transmissão do crédito exequendo por parte da sociedade exequente e para os efeitos do disposto no art.º 356.º do CPC. No caso em apreço, perante os factos provados e o acima referido, conclui-se que a citada partilha dos créditos não determinou a transmissão da coisa ou direito em litígio para os efeitos do disposto no art.º 356.º do CPC. Atento o atual estado da execução e dos embargos de executado, deve manter-se na execução como exequente a pessoa inicialmente indicada – a “E…, Lda.” -, a qual não pode ser substituída nesta execução pelos aqui requerentes”. E bem refere o Tribunal a quo ter a execução sido instaurada por entidade há muito extinta[31] e as manobras empreendidas para contornar a falta de pressupostos processuais bem concluindo que “Tendo a referida sociedade instaurado a execução após a sua extinção, nunca poderia ter lugar a sua substituição na demanda executiva pelos seus sócios, mediante o presente incidente da respetiva habilitação do adquirente, o qual não se destina a suprir a falta de personalidade judiciária, estando legalmente impedido o seu uso para tal fim. Não existindo verdadeira parte exequente nem instância executiva, como sucede no âmbito desta execução, torna-se impossível a sua substituição por outro sujeito”. Com referimos, o incidente de habilitação de adquirente visa, tão só, efeitos de natureza meramente processual – a modificação dos sujeitos da lide -, sendo que, na verdade, tal incidente não se destina a suprir a falta de pressupostos processuais que, originariamente, se verifiquem. Extinta estando a exequente já à data da propositura da ação, nenhum ato entre vivos de transmissão de direito litigioso tendo havido, nenhum efeito de modificação dos sujeitos da lide pode o incidente de habilitação de adquirente produzir, sendo o documento junto insuscetível de provar a transmissão do direito litigioso. Assim, bem conclui, pois, o Tribunal a quo pela não verificação dos pressupostos legais de que depende a procedência da habilitação de adquirente. Improcedem, por conseguinte, as conclusões da apelação, não ocorrendo a violação de qualquer dos normativos invocados pela apelante, devendo, por isso, a decisão recorrida ser mantida. * III. DECISÃOPelos fundamentos expostos, os Juízes desta Secção Cível do Tribunal da Relação do Porto acordam em julgar a apelação improcedente e, em consequência, confirmam, integralmente, a decisão recorrida. * Custas pelos apelantes, pois que ficaram vencidos – art. 527º, nº1 e 2, do CPC –, sem prejuízo do apoio judiciário de que beneficiem.Porto, 8 de novembro de 2021 Assinado eletronicamente pelos Juízes Desembargadores Eugénia Cunha Fernanda Almeida Maria José Simões _______________ [1] Ac. STJ. 08/03/2001, Proc. 00A3277, in base de dados da DGSI. [2] José Lebre de Freitas e Isabel Alexandre Código de Processo Civil Anotado, volume 2º, 3ª Edição Almedina, pág 735 [3] Ibidem, pág 737 [4] Neste sentido Alberto dos Reis, Código de Processo Civil Anotado, 5º vol., págs. 142 e 143. [5] Ibidem, págs. 55 e 143. [6] Ac. do STJ, de 30/9/2014, Processo 2868/03: Sumários, setembro 2014, pág 39 [7] Ac. da RL de 17/3/2016, Processo 218/10: dgsi.net [8] Ac. do STJ, de 20/10/2015, Processo 372/10: Sumários, 2015, p.555 [9] José Lebre de Freitas e Isabel Alexandre, idem, pág 712-713 [10] Ibidem, pág 714 [11] José Lebre de Freitas e Isabel Alexandre, idem, pág 737 [12] V., ainda, Ac. RG de 14/3/2019, proc. 4141/16.4T8GMR-A.G1, in dgsi.pt, onde se escreve “Para que possa proceder a oposição ao incidente de habilitação do adquirente da coisa ou do direito litigioso com fundamento na maior dificuldade da posição processual do oponente, não basta demonstrar essa maior dificuldade, sendo necessário apurar o facto de a transmissão ter sido feita para obter esse resultado, ou seja, que obedeceu a um propósito malicioso (8): “o de criar embaraço ao adversário de fazê-lo sucumbir” (9). Porém, não basta a intenção naquele sentido, independentemente de o resultado se verificar ou não. Para que “a oposição proceda torna-se necessário que o resultado se verifique pois, de outra forma, não teria o preceito qualquer razão de ser. Tratar-se-ia de uma espécie de crime impossível por carência de objeto” (10). Todavia, a inversa não é verdadeira. Isto porque não é suficiente que a posição da parte contrária se tenha tornado mais difícil em consequência da transmissão. É indispensável que haja intenção, pois que a lei expressamente a exige (arts. 263º, n.º 2 e 356º, n.º 1, al. a), ambos do CPC). Os dois fundamentos podem cumular-se, embora só subsidiariamente. O contestante pode invocar, a título principal, que a transmissão enferma de nulidade, e, subsidiariamente, para o caso de não se verificar aquele vício, que visou tornar-lhe mais difícil a posição na causa principal (11). [13] António Santos Abrantes Geraldes, Paulo Pimenta e Luís Filipe Pires de Sousa, O Código de Processo Civil Anotado, vol. I, 2ª edição, Almedina, pág. 433 e v. citado Ac., proferido no proc. 520/11.1TBPTM-C.E1,in dgsi.pt [14] Castro Mendes, Direito Processual Civil, II vol., revisto e actualizado, 1987, p. 294 [15] Rui Pinto, A ação executiva, 2018, AAFDL Editora, pág 278 [16] Marco Carvalho Gonçalves, Lições de Processo Civil Executiva, 2016, Almedina, pág164 [17] António Santos Abrantes Geraldes, Paulo Pimenta e Luís Filipe Pires de Sousa, Idem, pág. 91 [18] José Lebre de Freitas e Isabel Alexandre, Código de Processo Civil Anotado, vol. I, Coimbra Editora, pág. 110 [19] Ibidem, pág 112 [20] José Lebre de Freitas, A ação executiva à luz do Código de Processo Civil de 2013, 7ª Edição Gestlegal, pág 145 [21] Rui Pinto, idem, pág 282 [22] Rui Pinto, idem, pág 293 [23] Ac. RL de 14/4/2016/20376/12.6YYLSB-A-2 [24] Rui Pinto, idem, pág 294 [25] António Santos Abrantes Geraldes, Paulo Pimenta e Luís Filipe Pires de Sousa, Idem, pág. 313 [26] Ibidem, pág. 432 [27] Salvador da Costa, Os incidentes da instância, 2017, 9ª edição, Almedina, pág. 191 e seg. [28] Ibidem, pág. 192 [29] António Santos Abrantes Geraldes, Paulo Pimenta e Luís Filipe Pires de Sousa, Idem, pág. 433 e Ac. RL de 2/12/2015, proc. 691/11.7TYLSB-C.L1-2.dgsi.Net. [30] Acs. da RG de 23/4/2020, proc. 5239/16.4T8GMR-A.G1, e de 14/3/2019, proc. 4141/16.4T8GMR-A.G1, ambos in dgsi.pt. Neste último se refere que “embora a lei o não diga, deve entender-se – como defende Alberto dos Reis (12) – que à parte contrária «é lícito também alegar que não está feita prova legal da cessão ou da transmissão; se pode opor-se com o fundamento de ser nula a transmissão, é claro que também, pode opor-se com o fundamento de que não houve transmissão legal». Isto porque, «se a nulidade intrínseca ou substancial da transmissão é fundamento de oposição, é-o igualmente a nulidade extrínseca ou formal e com maioria de razão a inexistência da cessão ou da transmissão» (negrito e sublinhado nosso). [31] Adianta, até, que “extinguindo-se a sociedade, com a sua extinção, equiparada à morte civil, não podem os seus (ex)sócios propor/continuar ações para defesa de direitos que à extinta sociedade pertenciam, sob pena de se cair no absurdo de poder-se litigar em nome de entidade extinta, sem prejuízo, porém, do disposto no art.º 164.º do CSC (cfr., entre outros, o Ac. do TRP de 27/03/2008, no proc. n.º 0831264, relatado pelo Sr. Des. Dr. Fernando Baptista, in www.dgsi.pt/jtrp.)”. |