Acórdão do Tribunal da Relação do Porto
Processo:
0838116
Nº Convencional: JTRP00042283
Relator: DEOLINDA VARÃO
Descritores: CONTRATO-PROMESSA DE COMPRA E VENDA
DIREITO DE RETENÇÃO
PROMITENTE-COMPRADOR
USUCAPIÃO
Nº do Documento: RP200901290838116
Data do Acordão: 01/29/2009
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: APELAÇÃO.
Decisão: REVOGADA.
Indicações Eventuais: LIVRO 785 - FLS. 18.
Área Temática: .
Sumário: I – O direito de retenção é uma garantia real que, por definição, se exerce sobre coisa alheia.
II – O direito de retenção previsto no art. 754º do CC depende de três requisitos: a) – a detenção lícita de uma coisa que deve ser entregue a outrem; b) – apresentar-se o detentor, simultaneamente, credor da pessoa com direito à entrega; c) – a existência de uma conexão directa e material entre o crédito do detentor e a coisa detida, quer dizer, resultante de despesas realizadas com ela ou de danos pela mesma produzidos.
III – A tradição da coisa, só por si, não confere a posse ao promitente-comprador, mas apenas um direito pessoal de gozo que, aliado ao incumprimento contratual do promitente-vendedor, é suficiente para que o promitente-comprador possa exercer o direito de retenção.
IV – Se, para além do elemento material da posse (corpus) que lhe é conferido pela tradição da coisa, existir também o elemento subjectivo (animus), o promitente-comprador poderá adquirir a posse e, eventualmente, o direito de propriedade sobre a coisa que foi objecto do contrato prometido, tendo, então, de invocar a aquisição deste direito, que, necessariamente, é incompatível com a invocação do direito de retenção.
Reclamações:
Decisão Texto Integral: Proc. nº 8116/08 – 3ª Secção (Apelação)
Procedimento Cautelar nº …../08-A – 5º Juízo Cível do Tribunal Judicial de Matosinhos
Rel. Deolinda Varão (362)
Adj. Des. Freitas Vieira
Adj. Des. Cruz Pereira

Acordam no Tribunal da Relação do Porto

I.
B………………. e mulher C…………….. instauraram procedimento cautelar comum contra D…………… e mulher E……………, e F…………… e marido G……………..
Pediram para serem mantidos na posse do prédio rústico inscrito na matriz da freguesia de ………, do concelho de Matosinhos, sob o artº 3749 e descrito na CRP de Matosinhos sob o nº 2090, devendo os requeridos serem intimados a absterem-se de praticar quaisquer actos ou factos que contendam com a posse dos requerentes, devendo absterem-se de penetrar no prédio rústico dos autos seja para que fim for e, nomeadamente, para aí levarem a cabo movimentações de terras e desaterros ou actos preparatórios de realização de obras.
Como fundamento, alegaram, em síntese, que, em 11.06.84, o requerente acordou verbalmente com H……….. e com os requeridos F……………. e G…………., filha e genro daquele, a compra do referido prédio rústico, sendo que, anteriormente, os requerentes eram arrendatários rurais de parte do mencionado prédio. Em 10.04.85, celebraram contrato-promessa escrito de compra e venda, pelo qual H………….., F…………… e G……………. prometeram vender ao requerente, e este prometeu comprar-lhes, o referido prédio pelo preço de 1 800 000$00, tendo os primeiros declarado que receberam do requerente, a título de sinal e princípio de pagamento, o montante de 300 000$00.
Mais alegaram que, a partir de Abril de 1984, deixaram de pagar a renda anual pela parte do prédio rústico do qual eram arrendatários e passaram a agricultá-la e a tratá-lo na sua totalidade e que o pai da requerida F…………… tratou de obter junto dos demais rendeiros do prédio as parcelas que estes agricultavam para delas fazer entrega aos requerentes, a todos dizendo que estes o haviam comprado e que lhes tinha que ser entregue, passando os requerentes, a partir de Junho de 1984, a agricultar e a tratar o prédio rústico dos autos como seus donos e como tal se intitulando, até à actualidade, sem qualquer interrupção.
Todavia, os requeridos F…………… e G………….., em 05.11.01, por escritura pública de compra e venda, venderam aos requeridos D…………… e mulher E………….. o referido prédio rústico, pelo preço declarado de 5 000 000$00, que posteriormente viriam a rectificar, não sendo essa venda outorgada pelo pai da requerida F……………, porquanto este já havia falecido, sendo aquela a sua única e universal herdeira, tendo sido declarado nessa escritura que o prédio objecto da mesma era um terreno para construção. Os requeridos D……………. e mulher registaram a aquisição do referido prédio e, em inícios de 2001, compareceram junto ao prédio dos autos dizendo que eram seus donos e que iam levar a cabo no mesmo uma construção, anunciando que se iniciariam os trabalhos da preparação do terreno com máquinas que fariam movimentações de terras a curto prazo, tendo sido, pouco tempo após, colocada no prédio uma placa onde se dava conhecimento de que se ia iniciar processo de construção.
Os requeridos D…………… e mulher E………… deduziram oposição, invocando a excepção do caso julgado e defendendo que não assiste aos requerentes direito de retenção sobre o prédio em causa.
Pediram ainda a condenação dos requerentes como litigantes de má-fé no pagamento de multa e indemnização em montante nunca inferior a € 10.000,00.
Foi, de imediato, proferida decisão que julgou verificados os pressupostos do procedimento cautelar não especificado requerido e, em consequência, determinou que os requerentes sejam mantidos na posse do prédio rústico inscrito na matriz da freguesia de …………, concelho de Matosinhos, sob o artº 3749 e descrito na CRP de Matosinhos sob o nº 2090, devendo os requeridos serem intimados a absterem-se de praticar quaisquer actos ou factos que contendam com a posse dos requerentes, devendo abster-se de penetrar no prédio rústico dos autos, seja para que fim for, e, nomeadamente, para aí levarem a cabo movimentações de terras e desaterros ou actos preparatórios de realização de obras.
Os requeridos recorreram, formulando as seguintes

Conclusões
1ª – A sentença em causa não deu mínima relevância a qualquer um dos pressupostos que determinam o decretamento de uma providência cautelar, nomeadamente ao requisito do fumus boni juris, qual seja o da aparência séria da existência na esfera jurídica dos requerentes de um qualquer direito de retenção sobre o imóvel dos autos.
2ª – Nos termos do preceito na al. f) do nº 1 do artº 755º do CC, para que assista ao promitente-comprador o direito de retenção sobre o imóvel, a tradição do mesmo terá de ter ocorrido na sequência da celebração do contrato-promessa.
3ª – O conceito jurídico de tradição de qualquer coisa implica um acto voluntário, simbólico ou material de entrega daquele que tem a posse da coisa para um outro que a aceita, o que não se verificou in casu.
4ª – É pressuposto essencial que o retentor seja credor de que tem o direito de exigir a entrega, em regra, o titular do respectivo direito de propriedade.
5ª – A decisão proferida mostra-se em absoluta contradição como decidido pelo STJ por sentença já transitada em julgado.
6ª – O alcance do caso julgado abrange também os fundamentos ou questões preliminares que constituam um antecedente lógico do julgado.
7ª – O direito de retenção tem como objectivo fundamental coagir o devedor a cumprir a sua obrigação, objectivo que não poderá lograr-se neste caso, uma vez que a providência nunca funcionará como coação junto dos promitentes vendedores que não são já proprietários do prédio.

Os requerentes contra-alegaram, pugnando pela improcedência do recurso.
Colhidos os vistos legais, cumpre decidir.
*
II.
O tribunal recorrido considerou provados os seguintes factos (com fundamento no acordo das partes e no teor dos documentos juntos aos autos):
Em 11.06.84, o requerente, casado com a requerente, acordou verbalmente com H……………, então viúvo, e F………….. e G……………., estes respectivamente filha e genro daquele H…………….., a compra de um prédio rústico que a estes requeridos F…………. e G…………… e àquele H………….., pertencia, prédio esse sito no lugar de ……. da freguesia de ….. do concelho de Matosinhos, inscrito na matriz no artº 3749 (antes 1026) – e actualmente descrito na CRP de Matosinhos sob o n.º 2090, freguesia de …… .
Anteriormente, os requerentes eram arrendatários rurais de parte do mencionado prédio, pelo qual até então pagaram a renda anual de 17 000$00 à usufrutuária do mesmo, sendo essa a renda global paga pelos requerentes e demais rendeiros.
O acordo verbal de compra e venda celebrado entre os requerentes e os então proprietários desse prédio viria a ser reduzido a escrito mediante celebração de contrato-promessa de compra e venda, no dia 10.04.85, nos termos do documento junto aos autos com o requerimento inicial, como documento nº 2, cujo teor se dá por integralmente reproduzido.
Nos termos desse contrato, H…………., F………….. e G…………… prometeram vender ao requerente, e estes comprar-lhes o referido prédio pelo preço de 1 800 000$00.
A título de sinal e princípio de pagamento, os requeridos F………….. e G………….. e H………….. declararam terem recebido do requerente o montante de 300 000$00.
A partir de Abril de 1984, os requerentes deixaram de pagar a renda anual pela parte do prédio rústico do qual eram arrendatários e passaram a agricultá-lo e a tratá-lo na sua totalidade.
O pai da requerida F…………… tratou de obter junto dos demais rendeiros do prédio as parcelas que estes agricultavam para delas fazer entrega aos requerentes, a todos dizendo que estes o haviam comprado e que lhes tinha que ser entregue.
A partir de Junho de 1984, os requerentes passaram a agricultar e a tratar o prédio rústico dos autos como seus donos e como tal se intitulando, aí plantando batatas, couves, semeando ervas e apascentando gado, bem como colhendo tais produtos.
Os requerentes procederam a movimentações de terras no prédio e a aterros nas suas zonas mais baixas junto ao riacho que aí corre de forma a permitirem um melhor aproveitamento dos solos para fins agrícolas.
Vedaram o prédio junto à via pública – Rua da ….. – de forma a não permitir a introdução no mesmo de pessoas, coisas ou animais.
Tal factualidade dura desde 1985 até à actualidade, sem qualquer interrupção.
Os requeridos F………….. e marido G…………., em 05.11.01, por escritura pública de compra e venda outorgada no 1° Cartório Notarial do Porto, a fls. 37 do L. 289-B de escrituras diversas, venderam aos requeridos D………….. e mulher E…………… o referido prédio rústico, pelo preço aí declarado de 5 000 000$00, que posteriormente viriam a rectificar no sentido de ser tal preço superior.
Tal venda não seria outorgada pelo pai da requerida F………….., porquanto este já havia falecido, sendo aquela a sua única e universal herdeira.
Na escritura de compra e venda referida, foi declarado que o prédio objecto da mesma era um terreno para construção.
Os requeridos D………….. e mulher registaram a aquisição do referido prédio, na CRP, pela inscrição G-3 Ap. 64/121201.
D…………… e mulher E………….., em inícios de 2001, compareceram junto ao prédio dos autos dizendo que eram seus donos, já que o haviam comprado e que iam levar a cabo no mesmo uma construção, anunciando que se iniciariam os trabalhos da preparação do terreno com máquinas que fariam movimentações de terras a curto prazo de tempo.
Pouco tempo após foi colocada no prédio uma placa onde se dava conhecimento de que se ia iniciar processo de construção.
O que determinou que os requerentes intentassem contra D………….. e mulher E……………. providência cautelar comum que correu seus termos sob o nº ….1/02, pelo 3° Juízo Cível deste Tribunal, e que viria a ser decretada e, posteriormente apensada aos autos de acção declarativa que, na forma ordinária, os requerentes intentaram contra os referidos requeridos e que correu os seus termos sob o nº …./02, pelo 5° Juízo Cível deste Tribunal, porquanto os requerentes consideravam que desde 1984 tinham posse sobre o prédio dos autos e o haviam adquirido por usucapião, pedido este de declaração de aquisição por usucapião que faziam na acção principal.
Por Acórdão proferido pelo STJ e que aos requerentes foi notificado por carta sob registo com data de 14.03.08, não lhes foi reconhecido terem adquirido por usucapião o prédio dos autos, ai se referindo antes que os requerentes eram meros detentores do mesmo, detenção esta que nunca poderia conduzir à aquisição por usucapião.
Do referido Acórdão consta que: “No caso concreto, o acordo verbal referido (cfr. ponto de facto G), por via do qual os A.A. acordaram com os proprietários dos prédio em lide a respectiva compra, não parece representar mais do que a preparação do negócio futuro que as partes pretendiam efectuar. Estaremos, assim, perante uma fase pré contratual, insusceptível de transmitir qualquer direito sobre o prédio. De qualquer modo, a ter-se esse acordo como um contrato de compra e venda seria absolutamente nulo por falta de forma legal, portanto igualmente insusceptível de transmitir a propriedade ou a posse do terreno em causa.
Por sua vez o contrato promessa que se lhe seguiu (contrato de 10/04/85) não tem eficácia translativa da propriedade visto tratar-se de um contrato de natureza meramente obrigacional cujo objecto não é o contrato prometido mas a obrigação de o celebrar (obrigação de facere). Não é, pois, título de posse. (…) Por outro lado verifica-se do mesmo contrato promessa que não foi intenção das partes celebrarem logo a escritura pública de compra e venda, até porque existia um usufruto sobre o prédio (usufruto pertence a pessoa diferente dos promitentes vendedores cuja renuncia estes se propunham conseguir e porque parte do terreno prometido vender estava ocupado por outras pessoas). Não se verificou, pois, qualquer tradição do prédio, apenas se mantendo os A.A. na exploração de uma parte dele, como já vinham fazendo anteriormente com base em contrato de arrendamento rural.”
No dia 01.04.08, um mediador imobiliário deslocou-se ao prédio em causa que referiu a possibilidade de os requeridos venderem esse prédio.
O prédio dos autos continua a ser afecto à agricultura.
*
III.
As questões a decidir – delimitadas pelas conclusões da alegação dos apelantes (artºs 684º, nº 3 e 685º-A, nº 1 do CPC) – são as seguintes:
- Caso julgado;
- Requisitos do procedimento cautelar comum.

1. Caso julgado
Sustentam os requeridos que a decisão proferida nos autos de acção ordinária nº …./02 do 5º juízo Cível do Tribunal recorrido constitui caso julgado em relação ao presente procedimento cautelar.

O caso julgado constitui hoje uma excepção dilatória que, como tal, obsta ao conhecimento do mérito da causa e dá lugar à absolvição da instância (artºs 493º, nºs 1 e 2 e 494º, al. i) do CPC).
A excepção do caso julgado pressupõe a repetição de uma causa depois de a primeira causa ter sido decidida por sentença que não admite recurso ordinário (artº 497º, nº 1 do CPC).
E há repetição de uma causa quando se propõe uma acção idêntica a outra quanto aos sujeitos, ao pedido e à causa de pedir, como se estipula no nº 1 do artº 498º do CPC.
A excepção do caso julgado, conforme se refere no nº 2 do citado artº 497º, tem como fim evitar que o tribunal seja colocado na alternativa de contradizer ou de reproduzir uma decisão anterior.
E a sua razão de ser consiste na salvaguarda do prestígio dos tribunais e da certeza e da segurança jurídicas.
Com a excepção do caso julgado defende-se o prestígio dos tribunais evitando que seja proferida uma sentença igual a outra já existente e, portanto, inútil, ou que seja proferida uma sentença contrária a outra.
E defendem -se a certeza e a segurança jurídicas evitando que alguém veja um seu direito ser reconhecido judicialmente e que posteriormente esse reconhecimento lhe seja retirado, criando-se assim uma instabilidade nas relações jurídicas, que, nas palavras de Manuel de Andrade, é fonte perene de injustiças e paralizadora de todas as iniciativas[1].
Define-se o que é identidade de sujeitos, de pedido e de causa de pedir nos nºs 2, 3 e 4 do citado artº 498º do CPC.
Há identidade de sujeitos quando as partes são as mesmas do ponto de vista da sua qualidade jurídica (nº 2).
Há identidade de pedido quando numa e noutra causa se pretende obter o mesmo efeito jurídico (nº 3) e há identidade de causa de pedir quando a pretensão deduzida nas duas acções procede do mesmo facto jurídico (nº 4).
No que respeita à causa de pedir, a nossa lei processual civil consagrou a teoria da substanciação, segundo a qual não basta a indicação genérica do direito que se pretende tornar efectivo, sendo necessária a indicação específica do facto constitutivo desse direito.
A acção ordinária nº …./02 foi instaurada pelos ora requerentes contra os ora requeridos D………… e mulher E…………., pelo que existe claramente identidade de sujeitos entre aquela acção e o presente procedimento cautelar.
Naquela acção, os ora requerentes pediram o reconhecimento do seu direito de propriedade sobre o prédio que haviam prometido comprar, invocando como forma de aquisição daquele direito a usucapião.
No presente procedimento cautelar, os requerentes pedem que os requeridos se abstenham de praticar quaisquer actos sobre o prédio acima referido, alegando, como fundamento, que lhes assiste o direito de retenção sobre o mesmo em consequência do incumprimento do contrato-promessa que celebraram com segundos requeridos.
Como se vê, são diferentes o pedido e a causa de pedir da acção e do procedimento cautelar, pelo que não existe a tríplice identidade exigida pelo artº 498º, nº 1 do CPC para que se verifique a excepção dilatória do caso julgado a que se reporta o artº 497º, nº 1 do mesmo Diploma.

No entanto, no que respeita ao caso julgado, coloca-se outra questão, que tem a ver com os seus limites objectivos.
Nos termos do artº 673º do CPC, a sentença constitui caso julgado nos precisos limites e termos em que julga.
Como se tem vindo a entender de forma dominante na doutrina e na jurisprudência, aqueles limites não se confinam à parte injuntiva da decisão, mas atingem os fundamentos da própria decisão.
Entende-se que o caso julgado existe em relação a todo o objecto da causa e não apenas em relação à sua procedência ou improcedência[2], ou que, pelo menos, existe em relação aquelas questões preliminares que forem antecedente lógico indispensável à emissão da parte dispositiva do julgado.
Como se diz no Ac. desta Relação de 12.12.02[3], a excepção do caso julgado não se confunde com a autoridade do caso julgado; esta tem o efeito positivo de impor à primeira a decisão como pressuposto indiscutível da segunda decisão de mérito. Sem tornar extensiva a eficácia do caso julgado a todos os motivos objectivos da sentença, deve reconhecer-se essa autoridade à decisão daquelas questões preliminares que forem antecedente lógico indispensável à emissão da parte dispositiva do julgado.
O critério acima expresso é aquele que melhor defende o prestígio dos tribunais, que, como acima se disse, é a razão de ser do caso julgado, assegurando a certeza e a estabilidade das relações jurídicas.

Importa então ver se a decisão proferida na acção nº …../02 impõe a sua autoridade nos presentes autos.
Naquela decisão entendeu-se que não houve tradição do prédio prometido vender e que, em consequência, não se verificou a posse dos requerentes sobre o mesmo prédio, por forma a levar à aquisição do direito de propriedade por usucapião.
Nos presentes autos, haverá também que apreciar se houve tradição do prédio, mas tão só para aferir se assiste aos requerentes o direito de retenção sobre o mesmo.
Trata-se de realidades distintas, que se opõem, uma vez que quem invoca o direito de retenção não pode arrogar-se proprietário da coisa que pretende reter: o direito de retenção é uma garantia real que, por definição, se exerce sobre coisa alheia (cfr. artº 754º do CC – Diploma a que pertencem todas as normas adiante citadas sem menção de origem).
Como adiante melhor explicaremos, a tradição da coisa, só por si, não confere a posse ao promitente-comprador, mas apenas um direito pessoal de gozo, que, aliado ao incumprimento contratual do promitente-vendedor, é suficiente para que o promitente-comprador possa exercer o direito de retenção.
Se, para além do elemento material da posse (corpus) que lhe é conferido pela tradição da coisa, existir também o elemento subjectivo (animus), o promitente-comprador poderá adquirir a posse e, eventualmente, o direito de propriedade sobre a coisa que foi objecto do contrato prometido. Terá então de invocar a aquisição deste direito, que, necessariamente, é incompatível com a invocação do direito de retenção.
Foi precisamente o direito de propriedade que os ora requerentes invocaram na acção nº …../02 e que não lhes foi reconhecido.
Assim, se nos presentes autos se entender que houve tradição do prédio para efeito de os requerentes poderem exercer direito de retenção sobre o mesmo até à satisfação do crédito resultante do incumprimento do contrato-promessa, não se corre o risco de contradizer a decisão tomada na acção nº …../02 no sentido de que não houve tradição do prédio para efeito de aquisição da posse e da propriedade dos requerentes sobre o mesmo.
A decisão proferida naquela acção não tem assim a virtualidade de impor a sua autoridade no presente procedimento cautelar.

2. Requisitos do procedimento cautelar comum
Com a reforma processual introduzida pelo DL 329-A/95 de 12.12, as providências cautelares não especificadas foram eliminadas e substituídas por um “procedimento cautelar comum”.
Conforme se salienta no relatório daquele Diploma, instituiu-se, por esta via, uma verdadeira acção cautelar geral para a tutela provisória de quaisquer situações não especialmente previstas e disciplinadas, comportando o decretamento das providências conservatórias ou antecipatórias adequadas a remover o periculum in mora concretamente verificado e a assegurar a efectividade do direito ameaçado, que tanto pode ser um direito já efectivamente existente, como uma situação jurídica emergente de sentença constitutiva, porventura ainda não proferida.
Diz o artº 381º, nº 1 do CPC que sempre que alguém mostre fundado receio de que outrem cause lesão grave e dificilmente reparável ao seu direito, pode requerer a providência conservatória ou antecipatória concretamente adequada a assegurar a efectividade do direito ameaçado.
Por seu turno, o artº 387º, nº 1 do mesmo Diploma dispõe que a providência é decretada desde que haja probabilidade séria da existência do direito e se mostre suficientemente fundado o receio da sua lesão.
Resulta do disposto nos normativos citados que o decretamento de um procedimento cautelar comum depende da verificação dos seguintes requisitos:
a) probabilidade séria da existência de um direito;
b) fundado receio de lesão grave e dificilmente reparável a esse direito;
c) inadequação ao caso concreto de qualquer uma das providências cautelares especificadas previstas nos artºs 393º e seguintes do CPC.
Apesar das diferenças em relação ao regime anterior, continuam a ser válidas as construções doutrinárias e jurisprudenciais que se teceram, no domínio de aplicação daquele, sobre o conceito e a função das providências cautelares e sobre os seus requisitos e respectiva prova.
Como refere Alberto dos Reis[4], a providência cautelar surge como antecipação e preparação de uma providência ulterior e final. É um fim e não um meio, uma vez que não se propõe dar realização directa e imediata ao direito substancial, mas apenas tomar medidas que assegurem a eficácia de uma providência subsequente, esta sim destinada à actuação do direito material.
Por isso, a providência cautelar tem carácter provisório e é sempre dependente de uma causa (preliminar ou incidentalmente) – artº 383º, nº 1 do CPC.
A emissão de uma providência provisória, destinada a antecipar a providência definitiva, justifica-se pelo chamado periculum in mora.
Há casos em que a formação lenta e demorada da decisão definitiva expõe o presumido titular do direito a riscos sérios de dano jurídico; para afastar esses riscos, para eliminar o dano, é que se admite a emanação de uma providência provisória ou interina, destinada a durar somente enquanto não se elabora e profere o julgamento definitivo.
A função das providências cautelares consiste precisamente em eliminar o periculum in mora, em defender o presumido titular do direito contra os danos e prejuízos que lhe pode causar a demora da decisão definitiva.
E o mecanismo usado nas providências cautelares para prover aquele fim consiste em submeter a relação jurídica litigiosa a um exame sumário, rápido, tendente a verificar se a pretensão do requerente tem probabilidades de êxito e se, além disso, da demora do julgamento final pode resultar, para o interessado, dano irreparável ou, pelo menos, considerável.
O sucesso da acção cautelar depende, pois, de dois requisitos: a) a verificação da aparência de um direito; b) a demonstração do perigo de insatisfação desse direito aparente.
Se o tribunal, naquele exame preliminar e perfunctório, se apercebe da existência dos dois requisitos, decreta a providência, autorizando os actos ou meios necessários e aptos para pôr o requerente a coberto do dano provável, do perigo iminente de insatisfação do direito.
Quanto ao primeiro requisito, pede-se ao tribunal uma apreciação ou um juízo de mera probabilidade ou verosimilhança (bonus fumus iuris). Quanto ao segundo, pede-se-lhe um juízo, senão de certeza e segurança absoluta, ao menos de probabilidade mais forte e convincente[5].
O receio de lesão grave e de difícil reparação referido no artº 387º, nº 1 do CPC significa “receio fundado e actual”.
O receio é fundado quando é de tal ordem que justifique a providência requerida; e só a justifica, quando as circunstâncias se apresentem de modo a convencer que está iminente a lesão do direito.
E é actual quando o titular do direito se encontra perante simples ameaças: se a lesão já está consumada, a providência não tem razão de ser.
Sobre este segundo aspecto, há no entanto que referir que constitui entendimento doutrinário e jurisprudencial unânime o de que a existência de lesões ao direito, já consumadas à data da instauração da providência, não afasta o requisito do periculum in mora; pelo contrário, a existência de tais lesões constitui um indício de probabilidade de lesões futuras, tornando, até, tal probabilidade mais forte e mais certa do que nos casos em que nunca existiu qualquer lesão[6]. A circunstância de existirem lesões anteriores só obstaria ao prosseguimento da providência se aquelas lesões tivessem terminado e não constituíssem indício de futuras lesões[7]. Ou seja, quando se tratasse de uma situação pontual, que se tivesse esgotado numa actuação específica, sem qualquer hipótese de prosseguimento.

No caso concreto, o direito invocado pelos requerentes é o direito de retenção pelo crédito resultante do incumprimento do contrato-promessa que celebraram com os requeridos F………….. e G…………. e com o falecido pai e sogro daqueles, H…………...
Diz o artº 754º do CC que o devedor que disponha de um crédito contra o seu credor goza do direito de retenção se, estando obrigado a entregar certa coisa, o seu crédito resultar de despesas feitas por causa dela ou de danos por ela causados.
Em síntese, o direito de retenção previsto naquele normativo depende de três requisitos: a) a detenção lícita de uma coisa que deve ser entregue a outrem; b) apresentar-se o detentor, simultaneamente, credor da pessoa com direito à entrega; c) a existência de uma conexão directa e material entre o crédito do detentor e a coisa detida, quer dizer, resultante de despesas realizadas com ela ou de danos pela mesma produzidos.
A conexão objectiva entre o crédito e a coisa (“debitum cum re iunctum”) constitui o alicerce básico do direito de retenção[8].
O direito de retenção mostra-se assim consagrado na lei como um verdadeiro real de garantia, equiparando-se o seu titular ao credor pignoratício ou hipotecário, consoante o objecto do direito seja uma coisa móvel ou uma coisa imóvel (artºs 758º e 759º).
Segundo Calvão da Silva[9], para além da função de garantia, o direito de retenção tem ainda a função coercitiva, sendo um meio de pressão sobre o devedor para o determinar a pagar as despesas feitas por causa da coisa legitimamente retida ou por causa dos danos por ela causados.
Torna-se assim possível definir o direito de retenção, com a necessária segurança, como o direito conferido ao credor, que se encontra na posse de certa coisa pertencente ao devedor de, não só recusar a entrega dela enquanto o devedor não cumprir, mas também, de executar a coisa e se pagar à custa do valor dela, com preferência sobre os demais credores[10].
O direito de retenção pode ser exercido antes do vencimento da obrigação, desde que se verifique alguma das circunstâncias que importam a perda do benefício do prazo e não depende da liquidez do crédito do seu titular (artº 757º, nºs 1 e 2).

Para além das situações que derivam da aplicação do critério geral consagrado no artº 754º, existem os casos especiais de direito de retenção previstos nas diversas alíneas do nº 1 do artº 755º.
Nalguns daqueles casos especiais, há lugar a direito a retenção apenas com base na simples origem comum dos dois créditos, sem que se verifique a conexão objectiva entre o direito e a coisa.
Dispõe a al. f) do nº 1 do citado artº 755º que goza de direito de retenção o beneficiário da promessa de transmissão ou constituição de direito real que obteve a tradição da coisa a que se refere o contrato prometido, sobre essa coisa, pelo crédito resultante do não cumprimento imputável à outra parte, nos termos do artº 442º.
Foi apenas com o DL 379/86 de 11.11 que o direito de retenção conferido ao promitente-comprador passou a constar da al. f) do nº 1 do artº 755º do CC.
O direito de retenção do promitente-comprador havia sido introduzido no artº 442º, nº 3 pelo DL 236/80 de 18.07 – aplicável ao caso dos autos por força do disposto no artº 12º, nº 2, 1ª parte, uma vez que o contrato-promessa em causa foi celebrado em 10.04.85[11].
Dizia então aquele preceito que, no caso de ter havido tradição da coisa objecto do contrato-promessa, o promitente-comprador gozava, nos termos gerais, do direito de retenção sobre ela, pelo crédito resultante do incumprimento pelo promitente-vendedor.
O DL 379/86 deslocou a norma para a sede própria, corrigiu a errada terminologia do nº 3 do artº 442º (a coisa sobre que recai o direito de retenção não é objecto do contrato-promessa, mas sim do contrato prometido)[12] e alargou o direito de retenção ao beneficiário de qualquer promessa com traditio rei [13].
No mais, não há diferenças significativas entre os dois regimes.
Segundo o artº 442º, nº 2, 2ª parte (na redacção do DL 236/80), se o promitente-comprador tiver constituído sinal e o não cumprimento do contrato for devido ao promitente-vendedor, tem aquele a faculdade de exigir o dobro do houver prestado ou, tendo havido tradição da coisa, o valor que esta tiver ao tempo do incumprimento ou, em alternativa, o de requerer a execução específica do contrato, nos termos do artº 830º.
Afirma Almeida Costa[14] que a constituição de sinal e a tradição da coisa têm subjacente uma forte confiança na firmeza e concretização do negócio. Daí que se imponha, com particularíssima acuidade, defender o mais possível o exacto cumprimento do contrato e que a execução específica não resulte inoperante, mercê da alienação da coisa a terceiro, quando a promessa se encontre destituída de eficácia real. Nessa mesma linha se concede o direito de retenção sobre ela, nos termos gerais, pelo crédito de indemnização.
A tradição da coisa traduz-se na entrega antecipada da mesma, a qual, como se diz no Acórdão do STJ de 04.12.07[15], não é um efeito do contrato, mas resulta de uma convenção de natureza obrigacional entre o promitente-vendedor (dono da coisa) e o promitente-comprador.
Como vem sendo orientação da doutrina e da jurisprudência, a tradição da coisa objecto do contrato prometido, só por si, não confere a posse ao promitente-comprador.
Sendo a posse constituída por dois elementos - o corpus e o animus – a tradição da coisa confere apenas o corpus[16], ou seja, o elemento material da posse. Por força da tradição da coisa, o promitente-comprador é, assim, apenas um detentor precário (artº 1253º), titular de um direito pessoal de gozo, que pode compreender as faculdades de uso e fruição da coisa.
Pode, no entanto, haver aquisição da posse se o promitente-comprador, após ter adquirido o corpus pela tradição, praticar actos de posse com o animus de estar a exercer o correspondente direito de propriedade em nome próprio – o que fará na pressuposição e na expectativa fundada do cumprimento do contrato-promessa. Hão-de ser o acordo de tradição e as circunstâncias relativas ao elemento subjectivo a determinar a qualificação da detenção[17].
O promitente-comprador a quem tenha sido entregue a coisa e que, por falta do animus, não tenha adquirido a posse da mesma (sendo, por isso, um detentor precário, titular de um direito pessoal de gozo), pode ver surgir na sua esfera jurídica também um direito real de garantia (o direito de retenção) se houver incumprimento contratual do promitente-vendedor.
A tradição da coisa pode ser material ou simbólica (artº 1263º, al. b) do CC).
Na tradição material, há uma actividade exterior que traduz os actos de entregar e receber. Na tradição simbólica, tudo se passa a nível da comunicação humana, sem directa interferência no controlo material da coisa[18].

No caso, antes da celebração do contrato-promessa, os requerentes eram arrendatários rurais de uma parte do prédio que prometeram comprar.
Está provado que, desde Abril de 1984, os requerentes deixaram de pagar a renda anual pela parte do prédio e que o falecido H………….. tratou de obter junto dos demais arrendatários do prédio as parcelas que aqueles agricultavam para delas fazer entrega aos requerentes, a todos dizendo que estes o haviam comprado e que tinha de lhes ser entregue.
Mais se provou que, a partir de Junho de 1984, os requerentes passaram a cultivar a totalidade do prédio, praticando sobre ele, desde aquela data e até à actualidade, os actos materiais que vêm descritos na matéria de facto.
O contrato-promessa veio a ser celebrado em 10.04.85.
O comportamento de um dos promitentes-vendedores, ao pedir aos arrendatários rurais do prédio que entregassem as respectivas parcelas aos requerentes e o facto de estes terem deixado de pagar renda e terem passado a cultivar a totalidade do prédio (quando até aí, cultivavam apenas uma parte do prédio na qualidade de arrendatários) não pode deixar de significar que o prédio foi entregue aos requerentes, que o passaram a usar e fruir enquanto detentores, como titulares de um direito de pessoal de gozo.

Concluindo-se que houve tradição do prédio, basta que tenha havido incumprimento contratual por parte dos requeridos F…………. e G…………… (promitentes-vendedores) para que se mostrem preenchidos os requisitos de que depende o exercício do direito de retenção por parte dos requerentes.
O incumprimento definitivo do contrato-promessa rege-se pelas normas gerais aplicáveis.
A lei considera definitivamente não cumprida a obrigação com as respectivas consequências nos casos de estipulação de cláusula resolutiva ou termo essencial e de impossibilidade culposa da prestação por parte do devedor (artº 801º, nº 1).
O incumprimento contratual definitivo também pode resultar da conversão da mora por força de interpelação admonitória ou de perda de interesse do credor na prestação (artº 808º, nº 1).
Para além daqueles casos expressamente previstos na lei, tem-se entendido que também configura incumprimento contratual definitivo a ocorrência de um comportamento do devedor que exprima inequivocamente a vontade de não querer o contrato[19].
Exemplo nítido desse comportamento é precisamente a venda a terceiro da coisa prometida vender, tal como sucedeu no caso em apreço, em que os requeridos F…………… e G…………… venderam o prédio aos requeridos D………….. e E…………..
O contrato-promessa terá assim de se considerar como definitivamente não cumprido por causa imputável aos primeiros requeridos (artº 801º, nº 1), o que terá como consequência a resolução do contrato, nos termos gerais (artºs 801º, nº 2 e 432º, nº 1) e a restituição do sinal em dobro (artº 442º, nº 1).
Mostram-se assim preenchidos os requisitos de que a lei faz depender o exercício do direito de retenção por parte dos requerentes.
Sendo um direito real de garantia, o direito de retenção é válido erga omnes, pelo que os requerentes podem opô-lo aos requeridos D…………. e E…………., adquirentes do prédio que era objecto do contrato prometido.
Mostra-se assim preenchido o primeiro requisito dos procedimentos cautelares comuns: probabilidade séria da existência de um direito dos requerentes.

Quanto ao periculum in mora:
Para fundamentar o fundado receio de lesão grave e dificilmente reparável ao seu direito de retenção, alegaram (e provaram) os requerentes apenas um facto: que, no dia 01.04.08, um mediador imobiliário se deslocou ao prédio em causa e referiu a possibilidade de os requeridos D………….. e E…………. o venderem.
Dizemos que é aquele o único facto porque os factos ocorridos em inícios de 2001 (em que os mesmos requeridos disseram aos requerentes que iam iniciar trabalhos de movimentação de terras no prédio com vista a futura construção) foram invocados como fundamento do procedimento cautelar que foi instaurado como dependência da acção ordinária nº …./02, acção esta que veio a ser julgada improcedente por decisão transitada em julgado, como já vimos.
Ora, a improcedência da acção por decisão transitada em julgado acarretou a caducidade da providência decretada no âmbito do procedimento cautelar que dela dependia (artº 389º, nº 2, al. c) do CPC).
De qualquer forma, não há diferença entre os factos ocorridos em 2001 e o facto ocorrido em 2008: o que está em causa é, fundamentalmente, a possibilidade de o prédio ser vendido ou de nele se construir.
Porém, a iminência de venda ou de construção só poderia causar aos requerentes uma lesão grave ou dificilmente reparável se estivesse em causa o seu direito de propriedade sobre o prédio: haveria então que obstar a tais actos a fim de acautelar aquele direito.
Mas o direito que os requerentes pretendem acautelar nos presentes autos é, tão só, o direito de retenção sobre o prédio.
Sendo o direito de retenção uma garantia real, como tal, oponível erga omnes, a alteração do destino ou da fisionomia do prédio com a construção ou a sua venda em nada perturbam o direito de retenção dos requerentes.
No caso específico de o prédio ser vendido, os requerentes terão apenas o incómodo de ter de instaurar uma acção também contra os terceiros adquirentes com vista ao exercício do seu direito de retenção.
Não ocorre assim lesão grave ou dificilmente reparável do direito de retenção dos requerentes, pelo que, falta um dos pressupostos de que o artº 387º, nº 1 do CPC faz depender o decretamento da providência cautelar.

Assiste, pois, razão aos apelantes, nesta parte, pelo que, na procedência da reclamação, há que julgar improcedente o presente procedimento cautelar.
*
III.
Pelo exposto, acorda-se em julgar procedente a apelação e, em consequência:
- Julga-se improcedente o procedimento cautelar, absolvendo-se os requeridos do pedido formulado pelos requerentes.
Custas pelos apelados.
***
Porto, 29 de Janeiro de 2009
Deolinda Maria Fazendas Borges Varão
Evaristo José Freitas Vieira
José da Cruz Pereira
____________
[1] Noções Elementares de Processo Civil, 2ª ed., pág. 305; sobre esta matéria, ver também Alberto dos Reis, CPC Anotado, III, 3ª ed., pág. 94.
[2] Ac. da RC de 09.12.81, CJ-81-V-76.
[3] www.dgsi.pt.
[4] CPC Anotado, I, 3ª ed., págs. 623 e segs.
[5] Alberto dos Reis, CPC Anotado, I, pág. 621.
[6] Alberto dos Reis, CPC Anotado, I, pág. 684 e, entre outros, os Acs. desta Relação de 17.01.80, CJ-80-I-13 e de 19.10.82, CJ-82-IV-246, da RE de 03.03.88, CJ-88-II-281 e da RL de 27.04.95, CJ-95-II-130.
[7] Neste sentido, Acs. da RE de 24.07.86, BMJ 361º-628 e da RP de 23.10.90, BMJ 400º-736.
[8] Almeida Costa, Direito das Obrigações, 6ª ed., pág. 852.
[9] Cumprimento e Sanção Pecuniária Compulsória, 4ª ed., pág. 346.
[10] Antunes Varela, Das Obrigações em Geral, II, 7ª ed., pág. 579.
[11] Neste sentido, ver o Ac. do STJ de 06.05.08, www.dgsi.pt.
[12] Cfr. Antunes Varela, Sobre o Contrato-Promessa, pág. 108.
[13] Calvão da Silva, Sinal e Contrato-Promessa, 8ª ed., pág. 164.
[14] Obra citada, pág. 358.
[15] www.dgsi.pt.
[16] Cfr. Pires de Lima e Antunes Varela, CC Anotado, III, pág. 28.
[17] No sentido desta orientação, ver Pires de Lima e Antunes Varela, CC Anotado, III, 2ª ed., pág. 6, Calvão da Silva, Sinal e Contrato-Promessa, 8ª ed., pág. 215, nota 55, e, entre outros, os Acs. do STJ de 17.04.07, 13.09.07, 06.11.07, 04.12.07, 18.12.07, 06.05.08 e 11.12.08, todos em www.dgsi.pt.
[18] Menezes Cordeiro, A Posse: Perspectivas Dogmáticas Actuais, 3ª ed., pág. 107.
[19] Cfr. Ac. do STJ de 27.05.03 e doutrina e jurisprudência ali citadas, www.dgsi.pt.