Acórdão do Tribunal da Relação do Porto
Processo:
487/11.6TBMTS.P1
Nº Convencional: JTRP000
Relator: RUI MOREIRA
Descritores: CONTRATO DE SEGURO
PÓS-EFICÁCIA DAS OBRIGAÇÕES
Nº do Documento: RP20150708487/11.6TBMTS.P1
Data do Acordão: 07/08/2015
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: REVOGADA
Indicações Eventuais: 2ª SECÇÃO
Área Temática: .
Sumário: I - O instituto da pós-eficácia das obrigações ou culpa post pactum finitum corresponde a um dever lateral de conduta de lealdade, no sentido de que a boa-fé exige, segundo as circunstâncias, que os contratantes, depois do fim da relação contratual, omitam toda conduta mediante a qual a outra parte se veria despojada ou essencialmente reduzida das vantagens oferecidas pelo contrato.
II - Se, depois da extinção das obrigações, mas mercê das circunstâncias por ela criadas, surgirem ou se mantiverem condições que, na sua vigência, podem motivar a constituição de deveres acessórios, eles mantêm-se.
III - Mesmo no caso de um contrato cuja natureza é tendencialmente adversa à identificação de uma pós-eficácia obrigacional, por do seu cumprimento decorrer uma definitiva cessação da relação contratual, por o seu fim ser plenamente alcançado por esse cumprimento, podem vir a identificar-se em concreto deveres acessórios que continuem a vincular as partes do contrato extinto e cuja violação determine um ilícito ainda contratual.
Reclamações:
Decisão Texto Integral: PROC. Nº 487/11.6TBMTS.P1
Comarca do Porto – Tribunal da Póvoa de Varzim
Inst. Central - 2ª Secção Cível - J3

REL. N.º 253
Relator: Rui Moreira
Adjuntos: Henrique Araújo
Fernando Samões
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ACORDAM NO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DO PORTO:

1 - RELATÓRIO

COMPANHIA DE SEGUROS B…, SA, com sede no …, em Lisboa intentou contra C…, residente na Rua …, …., sala .., em Matosinhos, acção de condenação com processo ordinário, pedindo a sua condenação a pagar-lhe a quantia de € 77.832,10, acrescida dos juros de mora à taxa legal, desde a data da p.i até integral pagamento, a contar sobre €68.263,93, quantia esta que lhe deve já que, em execução de um contrato de seguro entre ambos celebrado, acabou por lha entregar duas vezes, com o que o réu teria violado as suas obrigações contratuais.
Sustentando a sua pretensão, alegou que celebrou com o réu um contrato de seguro do ramo vida, titulado pela apólice n° …….., por força do qual ele tinha direito a receber da autora, decorridos 8 anos, isto é em 22 de Maio de 2006, a quantia de € 68.263,93 euros. Tendo-se vencido este crédito, o réu reclamou-lhe o seu pagamento, que afirma ter satisfeito.
Porém, o réu omitiu-lhe que havia dado à penhora esse mesmo crédito, em execução movida pela Fazenda Nacional, no âmbito de uma execução contra si instaurada; e bem assim que, na sequência dessa penhora, o D… operara o resgate antecipado e total do produto financeiro em causa, entregando a quantia daí resultante em pagamento à Fazenda Nacional, na medida do necessário, e o remanescente ao próprio réu.
Na tese da ora apelante, então autora, tendo o réu omitido que já havia recebido o valor do seguro e reclamando o mesmo perante a autora, teria violado um dever essencial do cumprimento das obrigações a que estava sujeito no âmbito de tal contrato de seguro, constituindo-se assim na obrigação de a indemnizar pelo prejuízo causado, prejuízo este correspondente à quantia de € 68.263,93 que embolsou e não deveria ter recebido.
Contestou o réu, dizendo que desconhecia qualquer penhora, tendo sempre actuado de boa-fé. Concluiu pela improcedência total do pedido. Mais pediu a condenação da autora como litigante de má-fé, alegando que ela distorceu a realidade dos factos e dos direitos, com o propósito de se locupletar à sua custa.
Replicou a autora, defendendo-se da imputação de litigância de má-fé e concluindo como na p.i.
O processo foi preparado para julgamento e, realizada a audiência, foi proferida sentença que declarou a acção improcedente, por não se reconhecer o incumprimento contratual invocado pela autora, pois que o contrato já se encontrava extinto ao tempo em que lhe fez o pagamento do valor de € 68.263,93; e, bem assim, por se ter entendido não poder subsumir-se a situação sub judice ao regime do enriquecimento sem causa.
É esta sentença que a autora vem impugnar através do presente recurso, que termina com as seguintes conclusões:
1. Perante a prova testemunhal produzida em audiência de julgamento e face aos documentos juntos aos autos (nomeadamente, a apólice de seguro e os documentos juntos pela Autora e pelo Réu na sessão da audiência de julgamento de 26 de Junho de 2014.) nunca o Tribunal recorrido podia dar como provado o facto constante do nº 10 da douta sentença recorrida nos termos em que o fez.
2. Nos termos das alíneas a), b) e c) do nº 1 do art. 640º do CPC, entende e defende a Ré que o facto constante do n° 10 da douta sentença recorrida tem de ser dado como provado nos termos seguintes: "O D…, SA tinha autorização da Autora para proceder ao débito na conta desta aberta naquele banco, n° ……….. de pagamentos relacionados com o resgate antecipado do produto financeiro …, estando autorizada a pagar ao Réu o montante do capital seguro devido em caso de resgate".
3. E isto porque o depoimento da testemunha E… é inequívoco em tal matéria, bem como os documentos juntos aos autos o comprovam.
4. Assim, face aos meios probatórios indicados pela Autora neste seu recurso, não pode dar-se como provado o facto que consta do n° 10 da douta sentença recorrida nos termos em que da mesma consta, devendo revogar-se a douta sentença recorrida nesta parte e dar-se como provado o referido facto nos termos que constam do nº 2 destas conclusões.
5. É o que se requer nos termos do art. 662° do CPC.
6. Face aos factos provados - aí se incluindo o que resulta do alegado no presente recurso - entende a Autora que a acção deve proceder.
7. De tais factos resulta que o Réu incumpriu a prestação, a que estava obrigado - incumprimento esse que se verificou ainda quando o contrato estava em execução
8. Resulta do recibo de quitação junto aos autos na sessão da audiência de julgamento de 26 de Junho de 2014, que a Autora apenas pagou ao Réu a quantia devida na data do respectivo vencimento em 5 de Junho de 2006 - logo, o contrato não se extinguiu em 3 de Maio de 2006.
9. Resulta dos autos que o Réu recebeu em 3 de Maio de 2006 a quantia devida a título de resgate, pelo que em 22 de Maio de 2006 não devia solicitar (como vem provado) o pagamento da quantia devida na data do vencimento.
10. Mas solicitou o pagamento de tal quantia, que lhe foi paga porque a Autora ignorava o resgate - logo, ardilosamente, o Réu enganou a Autora c obteve uma quantia que não lhe era devida.
11. A lei impõe que as partes de um contrato cumpram as prestações que lhe são devidas – nº 1 do art. 762º do cevo
12. "A prestação devida" tem de ser vista pelo lado activo, como ainda pelo lado passivo, ou seja e quanto a este, a parte num contrato tem de se abster de actos que ponham em cousa a boa execução e o pontual cumprimento do contrato pela outra parte.
13. E cada uma das partes, num contrato, deve agir de boa fé.
14. Os factos provados revelam que o Réu não só não cumpriu a prestação que lhe era devida, como ainda agiu de má fé, pelo que,
15. Deve a acção proceder e o Réu deve ser condenado no pedido - se assim não for, está a ser violado o art. 762º do CC.
16. Se assim se não entender, deve - na mesma - a acção proceder, pois que o Réu recebeu duas vezes o capital seguro, quando o que contratualmente lhe era devido era apenas uma prestação.
17. Há lugar, assim, à repetição do indevido, sob pena de enriquecimento do Réu - foram violados os arts. 463º e seguintes do CCV - pelo que a acção deve proceder e o Réu deve ser condenado no pedido.
18. E nem se diga que a fundamentação jurídica da Autora é o incumprimento contratual, pois que o Tribunal não está sujeito à aplicação das regras de direito invocadas pela Autora.
19. Se é certo que o Tribunal recorrido decidiu bem quando disse que não é de aceitar a excepção de prescrição, por alegação extemporânea,
20. Não menos verdade é que não seguiu as regras do direito processual, tendo sido violado o art. 531º do CPC.
O recorrido apresentou resposta, defendendo a confirmação da decisão da 1ª instância, não sem antes ter alertado da pendência de um recurso sobre a decisão de realização da audiência de julgamento na ausência do seu mandatário, o que tenderia a determinar a anulação do processado ulteriormente, incluindo o julgamento e a sentença recorrida.
O recurso foi admitido como de apelação, com subida nos próprios autos e com efeito devolutivo.
Foi depois recebido nesta Relação, considerando-se o mesmo devidamente admitido, no efeito legalmente previsto.
Indagada a situação referente ao alegado recurso processado em separado, foi obtida a informação constante de fls. 344, reveladora de que foi decretado o desentranhamento das alegações desse recurso, face “à inércia do recorrente e à omissão de pagamento da respectiva taxa de justiça,… por aplicação do disposto no art. 642º, nº 2 do C.P. Civil (…)”. Tal despacho não mereceu qualquer impugnação do aqui recorrido, em tempo útil.
Por conseguinte, o julgamento do presente recurso não se revela dependente da decisão de qualquer outra questão que se mostre válida e eficazmente colocada e subsista por apreciar.
Cumpre, pois, decidir as questões que constituem o seu objecto.

2- FUNDAMENTAÇÃO

O objecto do recurso é delimitado pelas conclusões da alegação do recorrente, não podendo este Tribunal conhecer de matérias nelas não incluídas, a não ser que as mesmas sejam de conhecimento oficioso (cfr. art. 639º e nº 4 do art. 635º, ambos do CPC).
No caso, em função das conclusões formuladas, identificam-se as seguintes questões a decidir:
1ª – Se, na hipótese da admissão do recurso sobre a decisão da matéria de facto, deve ser alterado o teor do facto descrito sob o ponto 10 da sentença (item 1º da base instrutória), de forma a que passe a expressar "O D…, SA tinha autorização da Autora para proceder ao débito na conta desta aberta naquele banco, n° ……….. de pagamentos relacionados com o resgate antecipado do produto financeiro …, estando autorizada a pagar ao Réu o montante do capital seguro devido em caso de resgate", representando o segmento em destaque a alteração pretendida;
2ª – Se o contrato de seguro em questão não se pode ter por extinto em 3/5/2006, aquando do resgate pago pelo E…, já que foi em razão da sua vigência ainda em 5/6/2006 que a autora lhe fez nessa data o pagamento do capital seguro.
3ª – Se foi, assim, em razão de um comportamento contratualmente inadmissível e imbuído de má fé, traduzido na apresentação de um pedido de pagamento indevido, que se deu o prejuízo da autora;
4ª – Se, caso assim se não entenda, o pedido deve proceder ao abrigo do instituto do enriquecimento sem causa.
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É essencial, para a decisão a proferir, ter presente a decisão do tribunal recorrido sobre a matéria de facto em discussão, que consistiu no seguinte:
1 -A autora exerce a actividade de seguradora;
2-No exercício da sua actividade, a autora celebrou com o réu um contrato de seguro do ramo "Vida Individual", titulado pela apólice n º ……;
3-O réu, em 22 de Maio de 1998 aderiu ao referido contrato, aos balcões do "D…, SA", em Matosinhos, subscrevendo a modalidade de "…";
4-De acordo com a adesão/subscrição efectuada pelo réu, o mesmo subscreveu um capital seguro pelo período de oito anos;
5-Para esse efeito, pagou um prémio de € 43.879,79 euros;
6-De acordo com o aludido contrato de seguro, o réu tinha direito - decorridos que fossem os oito anos - a receber da ré o capital seguro, correspondente a um crédito que seria no montante liquido de € 68.263,93 euros (valor bruto ou ilíquido de € 69.029,94);
7- Tendo-se vencido em 22 de Maio o crédito do réu sobre a autora, no montante de € 68.263,93, o réu solicitou à autora que esta efectuasse o respectivo pagamento;
8-Atento o supra referido em 7, a autora emitiu um recibo do montante de € 68.263,93 em nome do réu;
9- O réu cobrou o recibo na agencia de Matosinhos recebendo da autora, que lha pagou, a quantia de 68.263,93 €;
10- O D…, SA tinha autorização da autora para proceder ao débito na conta desta aberta naquele banco (nº ………..) de pagamentos relacionados com o resgate antecipado do produto financeiro ….
11-O Réu, mediante requerimento que apresentou em 30 de Janeiro de 2006, no Serviço de Finanças de Matosinhos, no processo ……………. Aps, em que era executado, ofereceu à penhora "para cumprimento da quantia exequenda, o depósito bancário do montante de €282.228,62, que detinha no D…, "constituído por depósito à ordem, carteira de títulos e fundo de investimento", no qual se incluía o Fundo de Investimento Rendimento Fixo, com o n° ..................., com o valor investido de € 49.879,79 euros;
12-A Fazenda Nacional efectuou a penhora do crédito do réu sobre a autora decorrente do contrato supra referido em 2;
13-Efectuada a penhora, porque o réu não pagou a divida que tinha para com a Fazenda Nacional, esta notificou o D…, Sa para que lhe entregasse a quantia penhorada;
14-Na sequência da penhora, no dia 3 de Maio de 2006, o D… creditou a conta do réu com a quantia de € 66.597,66 euros, correspondente ao valor do resgate antecipado do produto financeiro …, do qual era titular o aqui réu, quantia à qual veio a ser deduzido o valor de € 16.649,42, que foi entregue ao Serviço de Finanças de Matosinhos, por força da penhora supra referida;
15-O réu sabia que em 3.5.2006 a sua conta bancária foi creditada com a quantia de € 66.597,66 euros, correspondente ao resgate antecipado do produto financeiro …;
16-O réu não deu conhecimento desse facto à autora quando reclamou o pagamento do crédito na data de vencimento do aludido produto financeiro;
17-A autora só pagou a quantia de €68.263,93 euros ao réu porque desconhecia que o montante correspondentc ao crédito do autor já havia sido pago à Fazenda Nacional, na sequência da penhora do mesmo por parte da mesma Fazenda nacional;
18-O D…, por nota de débito de 28 de Novembro de 2006 informou a autora que havia pago em 3 de Maio de 2006, a quantia de € 66.597,66 € correspondente ao "…";
19-O D… não identificava qual o segurado a que dizia respeito o pagamento efectuado, pelo que houve necessidade de efectuar averiguações com vista a esclarecer a quem dizia respeito tal pagamento;
20-Só em Abril de 2007 é que a autora teve conhecimento de que o pagamento efectuado pelo D…, SA dizia respeito ao réu e ao contrato de seguro supra referido em 2;
21-A autora interpelou o réu, por carta de 29 de Junho de 2007, solicitando que o mesmo lhe entregasse a quantia de e 68.263,93 €.
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Como se referiu anteriormente, veio a autora, ora reclamante, impugnar a decisão proferida sobre a matéria de facto. Nessa tarefa apontou especificamente o facto que pretende ver julgado diferentemente, bem como o sentido em que o novo juízo deve ser proferido: pretende que se adite ao ponto 10 do elenco dos factos provados na sentença o segmento que infra se destaca graficamente: "O D…, SA tinha autorização da Autora para proceder ao débito na conta desta aberta naquele banco, n° ……….. de pagamentos relacionados com o resgate antecipado do produto financeiro …, estando autorizada a pagar ao Réu o montante do capital seguro devido em caso de resgate".
Por outro lado, aponta os meios de prova em que baseia essa sua convicção: o depoimento de E… – a cujo concreto conteúdo alude - e a apólice de seguro apresentada como meio de prova por documento. A referência genérica a outros “documentos juntos aos autos” é obviamente imprestável, face ao disposto no art. 640º, nº 1, al b), que exige a concretização dos meios de prova a reapreciar.
Podemos, nessa medida, considerar cumprido pela apelante o ónus processual que, para este tipo de impugnação se encontra previsto no art. 640º, nºs 1 e 2 do CPC.
Sem prejuízo, esta pretensão da apelante não deverá proceder, já que tem por alvo não um facto real, mas uma mera conclusão que, de resto, se retira da conjugação da restante factualidade provada.
Com efeito, sem que tal esteja posto em causa por qualquer forma, o tribunal a quo deu por provado que o D…, SA tinha autorização da Autora para proceder ao débito na conta desta, para operar pagamentos relacionados com o resgate antecipado do produto financeiro …. Mais deu por provado (ponto 14) que, em 3/5/2006 – na sequência de uma execução tributária que ao caso não interessa - o D… creditou a conta do réu com a quantia de € 66.597,66 euros, correspondente ao valor do resgate antecipado do produto financeiro ….
A conjugação destes factos permite concluir, tanto mais que nada o põe em causa na presente acção, que aquele pagamento de 66.597,66€, resultante do resgate do produto financeiro em questão, foi efectuado à luz daquela autorização referida no ponto 10, ou seja, que o banco estava autorizado a pagar aquele capital, operando um tal resgate. Esta asserção é, assim, uma conclusão extraída das referidas premissas, não tendo, em si mesma, um conteúdo fáctico. Por conseguinte, nada justifica o seu tratamento enquanto tal e, nessa medida, a sua adição ao teor do ponto 10 da sentença recorrida.
Nestes termos, quanto a esta questão, não poderá proceder a apelação.
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As questões sucessivamente identificadas reconduzem-nos à essência da causa e do próprio recurso.
A causa de pedir invocada pela autora é constituída pelo contrato de seguro do ramo vida, designado por “…”. Na sua tese, o réu teria violado o seu estatuto contratual ao actuar de forma que lhe permitiu receber duas vezes o capital que, segundo o contrato, a autora haveria de lhe pagar aquando da sua cessação, quer esta viesse a ocorrer no termo do prazo estipulado, quer numa circunstância de resgate antecipado, nos termos contratualmente previstos. Ao actuar dessa forma, o réu teria actuado com má fé na execução daquele contrato, incumprindo deveres contratuais em termos que legitimariam a sua responsabilização contratual, a traduzir na obrigação de restituir o capital recebido pela segunda vez.
O tribunal acolheu uma tal causa de pedir, o que se revelou na circunstância de os factos correspondentes terem sido discutidos na causa. Em resultado dessa discussão, após identificar e classificar o contrato invocado pela autora, concluiu que o mesmo se extinguiu através do resgate antecipado do capital seguro. Por conseguinte, inexistia já uma relação contratual entre as partes quando o réu solicitou directamente à autora o pagamento do mesmo capital e esta lho prestou. Consequentemente, a sua actuação jamais poderia consubstanciar um ilícito contratual, por já não haver vínculo contratual perante o qual pudesse afirmar-se essa ilicitude.
É isto que a apelante impugna, por entender que o contrato se mantinha em vigor à data do pedido de reembolso do réu, de 22/5/2006, já que foi por referência a um tal contrato que foi apresentado esse pedido e que ele foi satisfeito.
Para decidir esta questão, não é tão relevante a interpretação de cada situação jurídica por cada uma das partes, mas aquilo que foi estipulado no contrato sobre os termos, designadamente sobre os factos ou circunstâncias, determinantes da respectiva extinção. Mais do que o que qualquer das partes, certa ou erroneamente, entendeu ser o seu estatuto contratual em determinado momento, caberá aferir qual era o estado desse contrato em cada momento, seja em razão da sua execução pelas partes, seja em razão de qualquer facto previsto como contratualmente relevante.
Como assinalou o tribunal a quo, e não sendo útil repetir aqui o que na sentença se referiu sobre a qualificação do contrato pressuposto nos pontos 2 e 3 da matéria provada, é inequívoca a sua sujeição às cláusulas gerais e especiais subscritas por ambas as partes, constantes de fls. 13 e ss e 26, respectivamente. Entre estas últimas, destacam-se as descritas sob os pontos 6.2. e 9. Segundo estas, o contrato extingue-se por morte da pessoa segura (9.) e dá-se a sua “anulação” com o resgate (6.2.). Este “resgate” e as condições de fixação do valor a reembolsar no momento do exercício desse direito são descritos no ponto 6.1. das condições especiais, bem como por remissão para as condições gerais. Nestas, sob o nº 5 do art 11º, prevê-se que “O resgate total determina a extinção do contrato, cessando, por isso, todas as suas garantias”.
Sem prejuízo, no caso de não verificação de qualquer dessas condições (morte da pessoa segura ou resgate) tal como resulta da cláusula 1ª, o contrato extinguir-se-ia igualmente no termo do seu prazo, tendo por efeito “o pagamento do prémio investido, capitalizado à taxa fixa previamente garantida”.
Assim, e tal como bem assinalou a sentença recorrida, o resgate total do capital aplicado no contrato e da remuneração devida a esse momento tem um efeito inequívoco e incontornável: a extinção do contrato, incluindo todas as suas garantias, isto é, a extinção de todas as obrigações que dele advinham para a seguradora.
No caso em apreço, apesar de o contrato celebrado entre as partes em 22/5/1998 ter um prazo de oito anos, prevendo-se o seu termo para 22/5/2006, o que é certo é que se operou o seu resgate integral em 3/5/2006, a pedido do aqui réu/apelado, a propósito de uma execução fiscal então movida contra este, que ao caso é indiferente.
Tal como se descreve no ponto 14 da matéria provada, o D…, junto do qual fora contratado tal produto financeiro “…” pelo réu e que estava autorizado a operar o respectivo resgate (conclusão que se afirma em função do facto provado sob o ponto 10 e sem prejuízo de ela mesma não se classificar como matéria de facto como pretendia a apelante, em termos que assim se vê realizarem igualmente o seu objectivo) creditou a conta deste com a quantia de € 66.597,66 euros, correspondente ao valor do resgate antecipado desse mesmo produto.
Em consequência dessa actuação contratualmente relevante e consequente, nos termos das cláusulas referidas – art. 11º, nº 5 das cláusulas gerais e 6º, nº 2 das cláusulas especiais (aqui sob a designação imperfeita de anulação) só pode concluir-se pela extinção da relação contratual que unia ambas as partes. O contrato findou e, como contratualmente previsto, igualmente findaram todas as obrigações da seguradora para com o subscritor daquele produto financeiro, tal como, em reverso, findaram todas as obrigações contratuais deste para com a seguradora. Pelo menos, adianta-se por ora, todas as obrigações essenciais do contrato, em função das quais se deve aferir o seu adimplemento.
Nestas circunstâncias, aliás devidamente avaliadas na decisão recorrida, é impossível sustentar, como o faz a apelante, que o contrato continuou em vigor, estando em plena vigência quando, 19 dias depois, o réu se lhe dirigiu e lhe solicitou o reembolso do capital investido e da remuneração prevista, como se ele não se tivesse extinto antes. Pelo contrário, a 22/5, o contrato de “…” era já uma relação contratual acabada, sem que dela tivessem sobrevivido para as partes direitos ou obrigações fundamentais.
É certo que a autora não tinha conhecimento dessa extinção. Isso é explicado pelo sistema de resgate previsto para aquele produto, passível de ser operado directamente pelo D…, sem prévio conhecimento e necessidade de específica autorização da autora. Foi isso, com efeito, que permitiu que o réu requisitasse o resgate do seu investimento directamente ao Banco, que o satisfez a 3/5/2006, apenas disso informando a autora a 28/11/2006. Nesse entretanto, a 22/5/2006, o réu solicitou o reembolso do mesmo capital directamente à autora, que igualmente lho satisfez, no desconhecimento de que o capital devido já havia sido pago. No entanto, face aos termos do próprio contrato, esse desconhecimento da autora, que a terá feito incorrer em erro sobre a sobrevivência do contrato até ao termo do seu prazo de vigência de oito anos, não exclui a conclusão acima enunciada: por aplicação das regras do próprio contrato, ele tinha-se extinto com o resgate de 3/5/2006.
Foi, pois, no pressuposto errado de uma sobrevivência do contrato até ao fim do seu prazo que a ré efectuou ao réu o pagamento dos €68.263,93 (cfr. ponto 17); desconhecia ela que o capital devido já havia sido pago. E, nos termos expostos, que o contrato se havia extinto antecipadamente, por via do resgate ocorrido. Mas esse desconhecimento e uma actuação desconforme com essa realidade, do próprio réu, tendente a obter um segundo e indevido pagamento do mesmo capital, não têm por pressuposto ou por consequência a sobrevivência do contrato para além daquele que foi o momento da sua extinção.
Sem prejuízo do exposto, aliás correctamente ajuizado na decisão recorrida, e tendo por certo que inexistia qualquer contrato que legitimasse o pagamento dos €68.263,93 referidos ao réu, não deverá deixar de se indagar se, pelo menos à luz daquilo que a doutrina vem designando por pós-eficácia das obrigações, alicerçada nos ditames da boa fé e de obrigações de lealdade, em razões de equilíbrio contratual e do fim social dos contratos, não poderá identificar-se ainda um qualquer dever contratual que a atitude obviamente injustificada do réu tenha violado (note-se que a própria causa não proporcionou qualquer fundamento para o que foi o segundo pagamento ao réu, de €68.263,93), sendo por isso adequado sancionar ainda numa vertente de responsabilidade contratual (como pretendido pela apelante) a sua actuação.
Como refere Maurício Mota, (A Pós-eficácia das Obrigações Revisitada, disponível em http://www.estig.ipbeja.pt/~ac_direito/0310-PosEficaciaObrigaRevisitadas.pdf) o instituto da pós-eficácia das obrigações ou culpa post pactum finitum corresponde a um dever lateral de conduta de lealdade, no sentido de que a boa-fé exige, segundo as circunstâncias, que os contratantes, depois do fim da relação contratual, omitam toda conduta mediante a qual a outra parte se veria despojada ou essencialmente reduzida das vantagens oferecidas pelo contrato. Esses deveres laterais de lealdade traduzem-se primordialmente em deveres de reserva quanto ao contrato concluído, deveres de segredo dos factos conhecidos em função da participação na relação contratual e deveres de garantia da fruição pela contraparte do resultado do contrato concluído.
São diversos os exemplos que se podem convocar para a ilustração destes interesses, que vão desde a obrigação de não concorrência, às obrigações de assistência, de fornecimento de peças que assegurem no futuro a reparação da coisa vendida em caso de avaria, de não diminuição das vantagens de uma coisa vendida (como é o caso da construção de um imóvel em frente a outro que foi vendido pelo construtor, a pretexto da qualidade de uma particular vista), tudo conforme o elemento preponderante para a justificação da existência da referida pós eficácia das obrigações, que o referido Professor assinala como a boa fé objectiva, a função social do contrato ou o equilíbrio contratual.
Menezes Cordeiro (Da Pós-eficácia das Obrigações. Estudos de Direito Civil. vol. I. Coimbra, Almedina, 1991) refere “A ideia da sobrevivência dos deveres acessórios é a de que ao Direito repugna que o sentido das obrigações seja desvirtuado por cumprimentos vazios ou outras fórmulas chicaneiras ou a que, a coberto das obrigações, sejam infligidos danos às partes. Se, depois da extinção das obrigações, mas mercê das circunstâncias por ela criadas, surgirem ou se mantiverem condições que, na sua vigência, podem motivar a constituição de deveres acessórios, eles mantêm-se. As razões de busca de saídas jurídicas materiais que levam, independentemente da vontade das partes, a admitir deveres acessórios durante a vigência da obrigação são sobejamente fortes para os impor, depois da extinção.”
A pós-eficácia das obrigações sedia-se, para a doutrina, no princípio da boa fé no cumprimento dos contratos, como um dever lateral de lealdade. Como refere Maurício Mota, em plena concordância com Menezes Cordeiro, tal dever será necessariamente funcionalizado ao fim do contrato, autonomizando-se em relação à prestação principal, para assegurar a realização do escopo do contrato. Assim, subsistem deveres pós-eficazes ao termo do cumprimento do contrato, no interesse da correcta concretização do seu fim. Como consta do texto citado “A fundamentação dogmática da pós-eficácia das obrigações está nos princípios sociais do Código Civil: a boa-fé objectiva, o equilíbrio contratual e a função social dos contratos. Assim, devem as partes lealdade à convenção livremente celebrada. A lealdade em causa traduzir-se-ia, nomeadamente, na necessidade jurídica de, para além da realização formal da prestação, providenciar a efectiva obtenção e manutenção do escopo contratual. Essa manutenção do escopo contratual perdura, naturalmente, para além da extinção da obrigação nuclear do contrato, configurando-se, pois, a pós-eficácia.”
No caso em apreço, a natureza do contrato celebrado entre as partes é tendencialmente adversa à identificação de uma pós-eficácia obrigacional, já que, da extinção do contrato por resgate antecipado, ou por pagamento no termo do prazo do contrato, decorre uma pura e definitiva cessação da relação contratual, concretizada na entrega, pela seguradora ao cliente, do dinheiro por ele investido e da remuneração de capital contratada. Num tipo de contrato como aquele que é causa de pedir nesta acção, o respectivo fim é plenamente alcançado por essa via, no momento da sua extinção, não se justificando, em princípio, a permanência ultra-contratual de quaisquer deveres laterais tendentes, por exemplo, a que cada contraente possa continuar a aproveitar a utilidade da prestação recebida da parte contrária.
No entanto, a situação em apreço revela aspectos especiais que devem merecer atenção. Com efeito, apesar de o contrato ter sido celebrado com a autora, os termos da sua concretização implicaram a interposição de uma outra entidade: o D…. Nas circunstâncias da celebração e execução do contrato, era facultado ao D…, designadamente em caso de resgate antecipado, o pagamento directo ao cliente, in casu ao réu, sem necessidade, por exemplo, de uma prévia comunicação ou autorização da própria autora. A razão de ser desta faculdade é facilmente compreensível: a facilitação do resgate, da satisfação do interesse e vontade do cliente, tornando o produto financeiro em questão e o relacionamento do cliente com a parte “vendedora” mais agradáveis.
Certo é, no entanto, que tal solução, desde logo por desacompanhada – ao que resulta do processo – de um sistema eficaz de controlo, apresentava alguma fragilidade. Veja-se que, no caso em apreço, o D… operou o resgate antecipado do produto em 3/5/2006, debitando o valor devido ao réu na conta da autora e depositando-o na conta do próprio réu (sem prejuízo do desconto da parcela que interessava ao fisco e lhe foi entregue), apenas informando disso mesmo a autora em 28 de Novembro de 2006. Ao que acresce que o Banco nem sequer informava a que segurado dizia respeito o resgate, mais dificultando qualquer controlo da seguradora sobre o estado das aplicações em causa (cfr. ponto 19 da matéria de facto).
Tal sistema gerou uma situação na qual o próprio réu tinha conhecimento de que, em 3/5/2006, havia resgatado a sua aplicação financeira e de que o valor correspondente havia sido depositado na sua conta; mas a autora não o sabia; e não o sabia em 22/5/2006, quando o réu, consciente do reembolso de que beneficiara, lhe solicitou o pagamento do capital que, na proporção que lhe era devida, já recebera. E por não o saber, pagou-lhe €68.263,93.
Relacionando os factos referidos com o que supra se referiu sobre a relevância do princípio da boa fé no cumprimento do contrato, consagrado no art. 762º, nº 2 do C. Civil, e na permanência de deveres laterais de lealdade mesmo para além do adimplemento contratual, quando as circunstâncias do caso o justificarem, podemos afirmar que, não obstante ter ocorrido o pleno cumprimento deste contrato e sua inerente extinção com o resgate operado pelo Totta & Açores, os termos em que ocorreu esse cumprimento, sem intervenção directa da autora e em termos obviamente tendentes à facilitação do exercício dos direitos contratuais do réu acarretavam para o réu uma obrigação complementar de não aproveitar o desconhecimento da autora quanto a tal resgate e a sua errada convicção sobre a sobrevivência do mesmo contrato até ao termo do respectivo prazo, como meio para receber nova e duplamente a prestação contratual que já lhe fora efectuada.
Há, no caso, uma violação de um dever de lealdade que é ainda claramente reconduzível à vinculação recíproca da autora e do réu no contrato que é causa de pedir nesta acção, não obstante ser necessário reconhecer, em sintonia com o tribunal a quo, que ele já se encontrava extinto quando o réu reclamou da autora um novo cumprimento, a que sabia não ter direito. É que ele reclamou um tal cumprimento por causa desse mesmo contrato e aproveitando o desconhecimento da autora sobre a sua já ocorrida extinção. Desconhecimento esse, como vimos, facultado por uma solução contratual tendente a facilitar o exercício dos seus direitos contratuais, designadamente o direito de resgate do capital aplicado. Em função dessa solução, construída em seu benefício mas em prejuízo do controlo da própria execução e cumprimento do contrato pela autora, um dever lateral de lealdade, referível à obrigação de boa fé prescrita no nº 2 do art. 762º do C. Civil, impunha-lhe que não tirasse proveito ulterior desse desconhecimento, dessa falta de controlo.
Foi, no entanto, esse mesmo dever que o réu infringiu, conseguindo obter da ré aquele pagamento de 68.263,93€, não obstante já ter previamente embolsado o capital a que tinha direito por efeito do cumprimento pela autora desse mesmo contrato.
Entendemos, pois, que as circunstâncias descritas traduzem uma violação do réu, relativamente ao estatuto contratual que lhe advinha do contrato em questão, invocado pela autora como causa de pedir nesta acção.
Tal violação presume-se culposa, nos termos do art. 799º do C. Civil, impondo ao réu a obrigação de indemnizar a autora pelos prejuízos que a sua conduta contratualmente ilícita lhe determinou – art. 798º, nº 1 do C. Civil.
No caso, esses prejuízos correspondem simples e directamente ao valor indevidamente pago ao réu, num total de 68.263,93€. O seu ressarcimento deverá ocorrer através da condenação do réu no respectivo pagamento à autora.
A essa quantia acrescerão juros de mora, à taxa anual de 4%, a contar desde a data em que a autora interpelou o réu para a respectiva restituição, isto é, desde 29/6/2007 (cfr. ponto 21 da matéria provada).
Deverá, pois, proceder a pretensão do autor, na procedência da presente apelação, com a pressuposta revogação da sentença recorrida.
Fica, assim, prejudicado o outro fundamento invocado pela apelante para a procedência da sua pretensão, que se traduzia no apelo ao instituto do enriquecimento sem causa.
Em situações com alguma semelhança com a dos autos, o referido instituto tem sido utilizado como o regime de regulação do litígio, determinando a repetição do indevidamente recebido (cfr, entre outros, Ac. do TRP de 11/4/2013, proc. nº 563/10.2TBVFR.P1). No entanto, no caso dos autos, face à expressa rejeição declarada pela autora quanto a uma tal causa de pedir, ocorrida aquando da invocação do que seria a correspondente prescrição, pelo réu, seria incontornável concordar com a solução afirmada na sentença recorrida, sobre a insusceptibilidade de tutela da pretensão da autora à luz desse instituto. No entanto, como se referiu, essa tutela deve ocorrer com o fundamento anteriormente verificado.
Resta pois, na procedência da presente apelação, revogar a decisão recorrida, que se substitui por outra que, decretando a procedência da acção, condena o réu no pagamento à autora do valor peticionado, de 68.263,93€, a que acrescerão juros de mora, à taxa anual de 4%, a contar desde 29/6/2007 até integral pagamento.
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Resumindo (art. 663º, nº 7 do CPC):
- O instituto da pós-eficácia das obrigações ou culpa post pactum finitum corresponde a um dever lateral de conduta de lealdade, no sentido de que a boa-fé exige, segundo as circunstâncias, que os contratantes, depois do fim da relação contratual, omitam toda conduta mediante a qual a outra parte se veria despojada ou essencialmente reduzida das vantagens oferecidas pelo contrato.
- Se, depois da extinção das obrigações, mas mercê das circunstâncias por ela criadas, surgirem ou se mantiverem condições que, na sua vigência, podem motivar a constituição de deveres acessórios, eles mantêm-se.
- Mesmo no caso de um contrato cuja natureza é tendencialmente adversa à identificação de uma pós-eficácia obrigacional, por do seu cumprimento decorrer uma definitiva cessação da relação contratual, por o seu fim ser plenamente alcançado por esse cumprimento, podem vir a identificar-se em concreto deveres acessórios que continuem a vincular as partes do contrato extinto e cuja violação determine um ilícito ainda contratual.

3 - DECISÃO

Pelo exposto, acordam os juízes que constituem este Tribunal em julgar procedente a presente apelação, em conformidade com o que, revogando a douta decisão recorrida, a substituem por outra que, julgando provada e procedente a presente acção, condena o réu no pagamento à autora do valor peticionado, de 68.263,93€ (sessenta e oito mil duzentos e sessenta e três euros e noventa e três cêntimos), a que acrescerão juros de mora, à taxa anual de 4%, a contar desde 29/6/2007 até integral pagamento.
Custas pelo apelado.
Registe e notifique.

Porto, 8 /7 /2015
Rui Moreira
Henrique Araújo
Fernando Samões