Acórdão do Tribunal da Relação do Porto
Processo:
7902/22.1T8VNG.P1
Nº Convencional: JTRP000
Relator: MIGUEL BALDAIA DE MORAIS
Descritores: EMBARGO DE OBRA NOVA
CONTRATO DE ARRENDAMENTO
BENFEITORIAS ÚTEIS
Nº do Documento: RP202305087902/22.1T8VNG.P1
Data do Acordão: 05/08/2023
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: RECURSO IMPROCEDENTE; DECISÃO CONFIRMADA
Indicações Eventuais: 5ª SECÇÃO
Área Temática: .
Sumário: I - O embargo judicial de obra nova é uma providência cautelar nominada com função preventiva ou conservatória que, no seu desenho legal, visa impedir a violação (ou a continuação da violação) do direito de propriedade, ou outro direito real ou pessoal de gozo ou da posse, em consequência da execução de uma obra, trabalho ou serviço novo, que cause ou ameace causar prejuízo ao seu titular.
II - Findo o contrato de arrendamento, o arrendatário que haja realizado benfeitorias úteis no imóvel locado, tem direito a proceder ao levantamento das mesmas contanto que daí não resulte o detrimento da coisa; quando, para evitar esse detrimento, não seja possível esse levantamento, o senhorio satisfará ao arrendatário o valor dessas benfeitorias, calculado segundo as regras do enriquecimento sem causa.
III - O direito atribuído ao arrendatário de ser indemnizado pelo locador é subsidiário do direito de levantar as benfeitorias, não se estando, pois, em presença de dois direitos de exercício alternativo consoante o interesse daquele. Assim o arrendatário, querendo exercer direito em relação a essas benfeitorias, deve levantá-las; só não o poderá fazer no caso excecional de o levantamento causar detrimento ao prédio arrendado.
IV - Esse detrimento há de, contudo, constituir um dano notável do prédio, de difícil ou muito onerosa reparação.
V - A este respeito tem sido estabelecido um distinguo consoante as benfeitorias constituam partes componentes ou partes integrantes do prédio onde foram realizadas. No primeiro caso, o detrimento ocorrerá, posto que as mesmas, fundindo-se na sua estrutura, não se podem retirar sob pena de destruição; já no segundo, o levantamento não implicará, por via de regra, o detrimento do imóvel por não se incorporarem aquelas na sua estrutura.
Reclamações:
Decisão Texto Integral: Processo nº 7902/22.1T8VNG.P1
Origem: Tribunal Judicial da Comarca do Porto, Vila Nova de Gaia – Juízo Local Cível, Juiz 1
Relator: Miguel Baldaia Morais
1ª Adjunta Desª. Maria de Fátima Andrade
2ª Adjunta Desª. Eugénia Marinho da Cunha
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Sumário
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Acordam no Tribunal da Relação do Porto:

I- RELATÓRIO

A..., Ldª intentou o presente procedimento cautelar contra B..., S.A. requerendo que seja ratificado o embargo extrajudicial da obra que esta pretendia realizar nos prédios urbanos pertencentes à requerente.
Citada a requerida deduziu oposição, pronunciando-se no sentido da inverificação dos requisitos necessários para ser decretada a requerida providência cautelar.
Procedeu-se à inquirição das testemunhas arroladas pelas partes, vindo após a ser proferida decisão que não ratificou o embargo extrajudicial efetivado pela requerente.
Não se conformando com o assim decidido, veio a requerente interpor o presente recurso, que foi admitido como apelação, a subir nos próprios autos e com efeito meramente devolutivo.
Com o requerimento de interposição do recurso apresentou alegações, formulando, a final, as seguintes
CONCLUSÕES:
A - Na Sentença recorrida o Mm.º Juiz a quo não especificou os fundamentos de facto que justificam a decisão no que respeita a cada facto julgado não provado e não efetivou uma apreciação crítica da prova, muito menos por referência a cada facto, porquanto tão só aduz uma conclusão – “Nessa sequência resultam os factos não provados, tendo em linha de conta os já mencionados documentos juntos com a oposição.” – que, sendo por si só insuficiente, remete para uma consideração prévia insuscetível de a elucidar -“Assim, não se mostra relevante se o posto de abastecimento teve sempre a mesma configuração ou se a família que explora o posto está aborrecida com a falta de investimento da requerida no local ao longo dos últimos anos, mas se está acordado se os reservatórios são ou não da requerida e, no caso, são, mesmo que não tenha sido a própria a implantá-los lá”.
B – Entende a Recorrente, pelo exposto e na esteira dos doutos Arestos citados no corpo da presente, que a Sentença recorrida viola os art.ºs 205º, nº 1, da CRP e os art.ºs 154º, nº 1, e 607º, nº 4, do Cód. Proc. Civil, padecendo de nulidade por falta de fundamentação, nos termos estabelecidos no art.º 615º, nº 1, al. b), 1ª parte do Cód. Proc. Civil, que expressamente se invoca e se requer seja deferida, com as legais consequências.
Sem prescindir,
C – A Recorrente discorda do julgamento da matéria de facto e está em crer que, da prova produzida nos presentes autos, encontram-se incorretamente julgados o ponto 26 dos factos indiciariamente julgados provados e os pontos I, III, IV, V e VI dos factos indiciariamente julgados não provados.
D – A Recorrente entende que deve ser alterado o julgamento do ponto 26 dos factos provados, sendo julgado não provado o respetivo segmento “(…) e, estando consciente e ciente de que tal cessação conferia à requerida o direito ao levantamento dos seus bens e equipamentos, entre os quais os reservatórios (…)” (mantendo-se o demais) e que deve ser julgado provado o ponto I dos factos julgados não provados, considerando que, por um lado, no que respeita àquele (segmento do 26) não foi produzida qualquer prova, documental ou testemunhal que o sustente e, quanto a este, considerando os seguintes meios probatórios: (i) depoimento de AA (gravado no sistema de gravação Habilus Media Studio, a 22.11.2022, no ficheiro de áudio 20221122144045_16275169_2871620, com início de gravação: 00.00.01/fim da gravação: 00:32:14, in casu concretamente com início a 12:30) e (ii) a factualidade julgada provada sob 13) e 14) e teor dos documentos da qual a mesma emerge (juntos com o requerimento inicial sob os nºs 5 e 9).
E - A Recorrente entende que deve ser alterado o julgamento do ponto III dos factos julgados não provados, julgando-se tal factualidade provada, considerando o facto julgado provado enunciado sob 31), documento junto sob o nº 3 com a oposição e documentos juntos com o Req.to da Recorrida de 21.11.2022, com a ref.ª 4393138, e, bem assim, os seguintes meios probatórios: (i) depoimento de AA (gravado no sistema de gravação Habilus Media Studio, a 22.11.2022, no ficheiro de áudio 20221122144045_16275169_2871620, com início de gravação: 00.00.01/fim da gravação: 00:32:14 in casu concretamente com início a 17:00), (ii) a factualidade julgada provada sob 13) e 14) e (iii) o depoimento de BB (gravado no sistema de gravação Habilus Media Studio, a 22.11.2022, no ficheiro de áudio 20221122151353_16275169_2871620, com início de gravação: 00.00.01/fim da gravação: 00:14:18, in casu concretamente com início a 03:09 e ainda 10:29).
F - A Recorrente entende que deve ser alterado o julgamento do ponto IV dos factos julgados não provados, julgando-se tal factualidade provada, considerando os seguintes meios probatórios: (i) depoimento de AA (gravado no sistema de gravação Habilus Media Studio, a 22.11.2022, no ficheiro de áudio 20221122144045_16275169_2871620, com início de gravação: 00.00.01/fim da gravação: 00:32:14, in casu concretamente com início a 18:00) e (ii) o depoimento de BB (gravado no sistema de gravação Habilus Media Studio, a 22.11.2022, no ficheiro de áudio 20221122151353_16275169_2871620, com início de gravação: 00.00.01/fim da gravação: 00:14:18, in casu concretamente com início a 03:09).
G - A Recorrente entende que deve ser alterado o julgamento do ponto V dos factos julgados não provados, julgando-se tal factualidade provada, considerando os seguintes meios probatórios: (i) depoimento de AA (gravado no sistema de gravação Habilus Media Studio, a 22.11.2022, no ficheiro de áudio 20221122144045_16275169_2871620, com início de gravação: 00.00.01/fim da gravação: 00:32:14, in casu concretamente com início a 18:00) e (ii) o depoimento de BB (gravado no sistema de gravação Habilus Media Studio, a 22.11.2022, no ficheiro de áudio 20221122151353_16275169_2871620, com início de gravação: 00.00.01/fim da gravação: 00:14:18, in casu concretamente com início a 10:29).
H - A Recorrente entende que deve ser alterado o julgamento do ponto VI dos factos julgados não provados, julgando-se tal factualidade provada, considerando os seguintes meios probatórios: (i) depoimento de AA (gravado no sistema de gravação Habilus Media Studio, a 22.11.2022, no ficheiro de áudio 20221122144045_16275169_2871620, com início de gravação: 00.00.01/fim da gravação: 00:32:14, in casu concretamente com início a 18:00) e (ii) o depoimento de BB (gravado no sistema de gravação Habilus Media Studio, a 22.11.2022, no ficheiro de áudio 20221122151353_16275169_2871620, com início de gravação: 00.00.01/fim da gravação: 00:14:18, in casu concretamente com início a 10:00, também 10:29 e, ainda, 15:10).
I - A Recorrente entende que deve ser alterado o julgamento do ponto VII dos factos julgados não provados, julgando-se tal factualidade provada, considerando os seguintes meios probatórios: (i) depoimento de AA (gravado no sistema de gravação Habilus Media Studio, a 22.11.2022, no ficheiro de áudio 20221122144045_16275169_2871620, com início de gravação: 00.00.01/fim da gravação: 00:32:14, in casu concretamente com início a 14:30).
Sem prescindir,
J - O Mm.º Juiz enunciou doutamente e sem mácula a natureza dos procedimentos cautelares e em particular a providência cautelar de embargo de obra nova e, bem assim, os respetivos requisitos legais e concluiu, depois, sucintamente, contudo, que, porque a Req.te não é proprietária dos reservatórios que a requerida pretende retirar do posto de abastecimento, nem que o enchimento dos reservatórios com areia, nem a sua posterior retirada sejam ilícitos. A requerida está a exercer um direito que é seu.
K – Desconsiderou e não conheceu o Mm.º Juiz o fundamento da providência, consubstanciado no invocado direito, contratual e legal, de que a Recorrente entende ser titular, de se opor ao levantamento dos reservatórios (com as legais consequências indemnizatórias a que fica obrigada) atento o estabelecido na cláusula 4ª, n.º 4, e na cláusula 10ª do contrato e, bem assim, nos art.ºs 1273º e 1074º, nº 5, do Código Civil que consagram limitações, respetiva e precisamente, convencionais e legais, àquele direito de propriedade que não é absoluto.
L – Releva a factualidade julgada provada enunciada na sentença recorrida – máxime sob os respetivos pontos 1), 4), 6), 7), 8), 9), 11), 13), 14), 15), 19), 20), 21), 22), 24) e 31) - e, bem assim, considerando que atento o teor do projecto de demolição e montagem (cfr. facto julgado provado enunciado sob o nº 31), a obra, depois de licenciada, demorará 4 meses a ser executada (cfr. aquele projeto, pág. 21 sob a epígrafe “calendarização da execução da obra”) e que a Recorrida já requereu o licenciamento dos trabalhos de remoção dos reservatórios em 29/09/2022 (cfr. documentos juntos com o requerimento da Recorrida de 21.11.2022, com a ref.ª 43939138).
M – Releva, atenta aquela factualidade, também o disposto nos art.ºs 1273º e 1074º, nº 5, do Código Civil.
N - É pacifico que nos prédios arrendados “se encontram instalados dois postos de abastecimento de combustíveis com loja de conveniência” e que, como se referiu, de acordo com o projecto de demolição dos reservatórios, estes serão retirados e a respetiva vala será objeto de aterro com inertes (cfr. facto provado 31), sendo que aqueles não funcionam sem estes (um posto de abastecimento de combustíveis não poderá abastecer de combustíveis se os não tiver por não ter reservatórios onde os guardar para posterior venda), pelo que sem aqueles o estabelecimento comercial – consubstanciado nos postos de abastecimento de combustíveis instalados nos arrendados - não existe – rectius, deixa de existir.
O - A descrita situação consubstancia um dano na coisa principal benfeitorizada que é o estabelecimento comercial de abastecimento de combustíveis que, com o pretendido levantamento dos respetivos reservatórios de combustível veria não apenas a sua integridade e funcionalidade significativamente afetadas e danificadas, mas integralmente aniquiladas, o que consubstancia, precisamente, um detrimento da coisa, traduzido numa ofensa grave à integridade do património da Recorrente (cfr. art.º 1273º do Cód. Civil).
Acresce que,
P - Mesmo que assim não se entendesse é, também, pacífico nos autos que a Recorrida requereu o licenciamento dos trabalhos de remoção dos reservatórios em 29/09/2022 (cfr. documentos juntos com o requerimento da Recorrida de 21.11.2022, com a ref.ª 43939138) e que a obra, depois de eventualmente vir a ser licenciada – acontecimento futuro e incerto -, demorará 4 meses a ser executada (cfr. aquele projeto, pág. 21 sob a epígrafe “calendarização da execução da obra”).
Q – Assim, a prossecução dos trabalhos embargados determinaria que o estabelecimento em causa – o posto de abastecimento de combustível – ficasse inativo por um alargadíssimo período que seguramente não é – já não é - inferior a sete meses e que não se sabe por quantos mais perduraria, pelo que com a prossecução daqueles não ficaria incólume o estabelecimento comercial, antes consubstanciaria um dano significativo no mesmo, assim inoperacional por alargado período de, pelo menos, muitos meses (aliás, com necessárias consequências na deterioração, senão mesmo perda, do respetivo aviamento), o que não é, pois, de pouca monta ou facilmente reparável e colocando em causa os correspondentes postos de trabalho (cfr. art.º 285º do Cód. do Trabalho).
R – Pelo exposto, assistia à Recorrente o direito de obstar à remoção dos reservatórios de combustível, porquanto a respetiva efetivação implicaria necessariamente, desde logo, o “detrimento da coisa” (sic. cláusula 10ª do contrato junto sob o nº 1), verificando-se os pressupostos legais estabelecidos no artigo 397º do Código de Processo Civil e doutamente explicados na Sentença recorrida.
S - Consequentemente, deveria ter sido julgado procedente a peticionada ratificação judicial do embargo extrajudicial efetuado nos termos do disposto nos artigos 397º e 400º, ambos do Cód. Proc. Civil, por se verificarem os respetivos pressupostos, demonstrado que ficou, atenta a factualidade julgada provada, o direito de propriedade da Recorrente sobre os prédios e o estabelecimento comercial nos mesmos instalado, mostrando-se ostensivamente pretendido ofender pela Recorrida com a referida obra de remoção dos reservatórios, a qual causaria àquela um grave e definitivo prejuízo, ostensivamente violador da cláusulas 4ª, nº 4, e 10ª do contrato celebrado, e, bem assim, do disposto no art.º 1273º do Cód. Civil, pelo que estavam – como estão - verificados os pressupostos legalmente exigidos para o embargo de obra nova que a Recorrida ia executar no arrendado,
T - Tudo, o exposto, evidentemente sem prejuízo do direito da Recorrida a ser indemnizada nos exatos termos legalmente estabelecidos nos art.ºs 1273º, nº 2, e 1074º, nº 5, do Código Civil.
U - Verificados que estão, como se deixou já alegado, os pressupostos para se proceder ao embargo de obra nova e observados que foram, também, os requisitos para tal embargo ser operado extrajudicialmente, conclui-se que, na procedência da presente Apelação, deve a Sentença recorrida ser revogada, julgando-se ratificado o embargo extrajudicial de obra nova, nos termos peticionados, nos termos do disposto nos art.ºs 397º, nº 3, e 400º, ambos do Cód. Proc. Civil.
V – Salvo o devido respeito, a douta Sentença recorrida violou o disposto nos enunciados preceitos nestas conclusões.
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Notificada a requerida apresentou contra-alegações pugnando pela improcedência do recurso.
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Após os vistos legais, cumpre decidir.
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II- DO MÉRITO DO RECURSO
1. Definição do objeto do recurso

O objeto do recurso é delimitado pelas conclusões da alegação do recorrente, não podendo este tribunal conhecer de matérias nelas não incluídas, a não ser que as mesmas sejam de conhecimento oficioso – cfr. arts. 635º, nº 4, 637º, nº 2, 1ª parte e 639º, nºs 1 e 2, todos do Código de Processo Civil[1].
Porque assim, atendendo às conclusões das alegações apresentadas pela apelante, são as seguintes as questões solvendas:
. da nulidade da sentença por falta de especificação dos fundamentos de facto que a justificam;
. determinar se o tribunal a quo incorreu num error in iudicando, por deficiente avaliação ou apreciação das provas e assim na decisão da matéria de facto;
. decidir em conformidade face à alteração, ou não, da materialidade objeto de impugnação, mormente dilucidar se se mostram reunidos os pressupostos para a ratificação judicial do embargo de obra nova realizado pela requerente.
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2. Da nulidade da sentença por falta de especificação dos fundamentos de facto que justificam a decisão

A apelante inicia as suas alegações recursivas imputando à decisão recorrida o vício de nulidade previsto na alínea b) do nº 1 do art. 615º, posto que nela “não se especificaram os fundamentos de facto que justificam a decisão no que respeita a cada facto julgado não provado”.
Dispõe o citado normativo que a sentença é nula “[q]uando não especifique os fundamentos de facto e de direito que justificam a decisão”.
Isto dito, afigura-se-nos, desde logo, existir por parte da apelante alguma confusão conceptual no vício que assaca ao ato decisório recorrido.
Com efeito, uma coisa é a falta de fundamentação da decisão da matéria de facto, outra coisa é nulidade da sentença quando não especifique os fundamentos de facto e de direito que justificam a decisão.
A nulidade da falta de fundamentação de facto e de direito está relacionada com o comando plasmado no nº 3 do art. 607.º, que impõe ao juiz o dever de discriminar os factos que considera provados e indicar, interpretar e aplicar as normas jurídicas correspondentes.
Como é entendimento pacífico da doutrina, só a falta absoluta de fundamentação, entendida como a total ausência de fundamentos de facto e de direito, gera a nulidade prevista na al. b) do nº 1 do citado artigo 615º. A fundamentação deficiente, medíocre ou errada afeta o valor doutrinal da sentença, sujeita-a ao risco de ser revogada ou alterada em recurso, mas não produz nulidade[2].
Ora, para que haja falta de fundamentação, como causa de nulidade da sentença, torna-se mister que o juiz não concretize os factos que considera provados e os não coloque na base da decisão[3], coisa que, manifestamente não ocorre in casu, pois que o juiz a quo, como o evidencia a sentença recorrida, aí discriminou os factos que resultaram provados e não provados, como também especificou os fundamentos de direito que estiveram na base da decisão.
Portanto, ao contrário do que afirma a apelante, a sentença recorrida não enferma do apontado vício formal.
Todavia, diferente deste vício, é a falta de fundamentação da decisão da matéria de facto.
Dispõe, a este respeito, o nº 4 do art. 607.º que “[n]a fundamentação da sentença, o juiz declara quais os factos que julga provados e quais os que julga não provados, analisando criticamente as provas, indicando as ilações tiradas dos factos instrumentais e especificando os demais fundamentos que foram decisivos para a sua convicção; o juiz toma ainda em consideração os factos que estão admitidos por acordo, provados por documentos ou por confissão reduzida a escrito, compatibilizando toda a matéria de facto adquirida e extraindo dos factos apurados as presunções impostas pela lei ou por regras de experiência”.
Resulta deste normativo que a motivação não pode nem deve ser meramente formal, tabelar ou formatada, antes devendo expressar as verdadeiras razões que conduziram à decisão no culminar da audiência de discussão e julgamento.
O juízo probatório é a decisão judicativa pela qual se julgam provados ou não provados os factos relevantes, controvertidos e carecidos de prova, mediante a livre valoração dos meios probatórios apresentados pelas partes ou determinados oficiosamente.
O tribunal deve, assim, indicar os fundamentos suficientes para que, através das regras da ciência, da lógica e da experiência, se possa controlar a razoabilidade daquela convicção sobre o julgamento do facto provado ou não provado. A exigência da motivação da decisão não se destina pois a obter a exteriorização das razões psicológicas da convicção do juiz, mas a permitir que o juiz convença os terceiros da correção da sua decisão, sendo que, como sublinha TEIXEIRA DE SOUSA[4], “através da fundamentação, o juiz passa de convencido a convincente”.
Neste contexto, impondo-se, de acordo com as circunstâncias do caso concreto, que se estabeleça o fio condutor entre os meios de prova usados na aquisição da convicção (fundamentos) e a decisão da matéria de facto (resultado), fazendo a apreciação crítica daqueles, nos seus aspetos mais relevantes, a decisão encontrar-se-á viciada quando não forem observadas as regras contidas no transcrito nº 4 do 607.º.
No entanto, apesar do juiz dever efetuar o exame crítico das provas respetivas, não é falta de tal exame que basta para preencher a nulidade prevista na al. b) do artigo 615.º nº 1, posto que esse vício somente se verifica nos termos atrás referidos.
De facto, de acordo com o regime plasmado na lei adjetiva, a falta de motivação no julgamento da matéria de facto não gera a nulidade da sentença, podendo apenas determinar a remessa do processo ao tribunal da 1ª instância, nas circunstâncias previstas no artigo 662.º, nº 2 al. d) ou a anulação do julgamento, ao abrigo da al. c) do mesmo número.
Consequentemente a sentença recorrida não pode ser havida por não motivada no sentido supra considerado, não incorrendo, pois, no vício de falta de fundamentação.
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3. Recurso da matéria de facto
3.1. Factualidade considerada provada na sentença

O tribunal de 1ª instância considerou provada a seguinte matéria de facto:
1) A requerente é dona e legítima possuidora do prédio urbano sito no lugar ..., com a área total de 2962,9 m2, com a área coberta de 124,6 m2 e descoberta de 2838,3m2, inscrito na matriz predial sob os nºs ... e ..., da freguesia ... e ..., concelho de Vila Nova de Gaia, e descrito na 2.ª Conservatória do Registo Predial de Vila Nova de Gaia sob o número ... da freguesia ..., separado pela Estrada Nacional ..., Av. ..., no qual se encontram instalados dois postos de abastecimento de combustíveis com loja de conveniência;
2) Por escritura pública, datada de 06/10/1997, CC e mulher DD, na qualidade de primeiros outorgantes, constituíram o direito de superfície sobre o mencionado prédio, pelo preço de trezentos e oitenta mil contos, a favor de B..., S.A., na qualidade de segunda outorgante – documento junto, cujo teor se dá integralmente por reproduzido;
3) Nessa escritura pública consta que “O direito de superfície sobre os dois prédios atrás descritos, é constituído com a faculdade de a representada dos segundos outorgantes manter, durante a vigência do contrato, os edifícios neles existente para exploração de um posto duplo de abastecimento de combustíveis, gás lubrificantes para veículos automóveis e quaisquer outros produtos petrolíferos do seu fabrico e comércio (…)
2.º
O direito de superfície é constituído pelo prazo de quinze anos com início hoje.
3.º
A representada dos segundos outorgantes terá a faculdade, durante a vigência do direito de superfície, de efectuar, por sua conta e risco, sempre que entender necessário, oportuno e conveniente à prossecução das suas actividades, obras de conservação e remodelação ou beneficiação, quer do posto duplo de abastecimento, quer dos edifícios e instalações que o integram, assim como poderá fazer demolições, reconstruções, modificações, acrescentamentos ou substituições dos edifícios existentes, por forma a adaptar o local e o posto duplo à acepção, imagem e padrões que, em cada momento, utilizar ou defina para os seus postos de abastecimento.
§ 1.º - Contudo, a representação dos segundos outorgantes ou pessoa singular ou colectiva, a quem ela venha a entregar a exploração do posto duplo, não poderá fazer quaisquer obras ou edifícios de cércea superior a rés-do-chão, e muito menos em frente da casa de habitação pertencente aos primeiros outorgantes (…).
§ 2.º - Em frente destes prédios (…) em toda a sua largura apenas poderão existir os depósitos subterrâneos as ilhas de bombas e as respectivas palas de cobertura, como já acontece actualmente.
§ 3.º A representada dos segundos outorgantes ou a pessoa singular ou colectiva, a que ela venha a entregar a exploração do posto duplo, não poderá, sem autorização ou indicação por escrito dos primeiros outorgantes, proceder ao corte ou derrube das árvores hoje existentes em ambos os prédios superficiários.
(…)
6.º
1 – Finda a vigência do direito de superfície, todas as construções e quaisquer benfeitorias realizadas pela representada dos segundos outorgantes ficam a fazer parte integrante dos prédios e a pertencer aos primeiros outorgantes, ou seja, sem que esta tenha direito a qualquer indemnização.
2 – Da reversão, porém, ficam excluídos os bens mobiliários, tais como as bombas, compressores, reservatórios, maquinismos e outros equipamentos, que sejam propriedade da representada dos segundos outorgantes, bem como as benfeitorias que esta tenha efectuado e que possam ser levantadas sem detrimento dos prédios. Tais bens e benfeitorias deverão ser removidas e levantadas dos prédios no prazo máximo de quinze dias a contar do termo do direito de superfície, sob pena de os primeiros outorgantes poderem mandar levantá-los e armazena-los, imputando à representada dos segundos outorgantes os custos do levantamento e armazenamento.
Ainda por esta escritura, a representada dos primeiros outorgantes (…) cede a tulo gratuito à representada dos segundos outorgantes o uso e fruição, durante a vigência do direito de superfície ora constituído, de todos os materiais, maquinismos, incluindo máquina de lavagem automática de veículos automóveis e utensílios que lhe pertencem e que são os seguintes, e aos quais, para efeitos fiscais, atribuem o valor de cem contos:
(…)
- Um reservatório de fibrocimento “lusalite” de 1000 de capacidade; (…)” – documento cujo teor se dá integralmente por reproduzido;
4) Por documento escrito, denominado “contrato de arrendamento de duração limitada para fins não habitacionais”, o referido prédio foi dado de arrendamento à requerida pelos respectivos ante possuidores, CC e cônjuge DD – documento 1 do requerimento inicial, cujo teor se dá por reproduzido;
5) Tal prédio foi aí descrito como: a. Prédio urbano composto de edifício de um só piso, destinado a comércio, com a área coberta de dezanove metros e sessenta decímetros quadrados, sito no lugar ... da freguesia ... do concelho de Vila Nova de Gaia, a confinar do norte, sul e nascente com EE, poente Avenida ..., inscrito na matriz sob o artigo ...; e Prédio urbano, composto de um só piso destinado a comércio, com a área coberta de cento e cinco metros quadrados e descoberta de mil duzentos e noventa metros e cinquenta e cinco centímetros quadrados, sito no mesmo lugar ..., a confinar de norte e poente com EE, sul com FF, nascente com Avenida ..., inscrito na matriz sob o artigo ...;
6) Por documento escrito, denominado “Contrato de Cessão de Posição Contratual”, datado de 03/12/2012, aqueles ante possuidores dos identificados prédios declararam que “cedem a sua posição contratual naquele contrato pelo preço de €270.000,00 (duzentos e setenta mil euros), a pagar no acto da escritura à sociedade A..., Lda.” e a requerida declarou que “reconhecem esta cedência e por via disso obrigam-se a reconhecer como senhoria a sociedade identificada como segunda outorgante e a pagar-lhe a respectiva renda nos termos do respectivo contrato de arrendamento.”, o qual, no mais, se manteve inalterado – documento 2 do requerimento inicial, cujo teor se dá por reproduzido;
7) Através dos identificados acordos os proprietários dos prédios descritos cederam à requerida o gozo e a utilização destes, pelo período de dez anos, com início a 06/10/2012 e mediante a retribuição mensal que esta se obrigou a pagar àqueles, no montante de 7500,00€ mensais;
8) Consta do referido contrato de arrendamento que “O arrendado destina-se à instalação e exploração de um posto de abastecimento de combustíveis, aliás já instalado, “ao abrigo de um outro contrato de cedência de superfície”, gás, lubrificantes para veículos automóveis e quaisquer outros produtos petrolíferos do seu fabrico e comércio, podendo ainda neles ser desenvolvidas outras actividades complementares ou conexas, tais como loja de assistência ao cliente, tabacaria, lavagem automática e manual de automóveis, estação de serviço, mini-mercado e outras usuais em instalações desta natureza, incluindo todos os edifícios existentes no imóvel que a segunda outorgante se obriga a manter em bom estado de conservação” – cláusula 2.ª, parágrafo 2;
9) Mais acordaram as partes naquele contrato que:
a. “O prédio arrendado é, nesta data, entregue à arrendatária, inteiramente livre de qualquer pessoal, e devoluta de quaisquer bens, com excepção dos equipamentos e utensílios que integram o posto de abastecimento, identificados como propriedade dos senhorios, devidamente referidos na cláusula 8.ª e os que embora já se encontrem instados no mesmo posto à data do arrendamento são já propriedade da arrendatária e que constam do anexo II” – cláusula 3.ª, parágrafo 1;
b. “A arrendatário poderá, livremente, instalar no local arrendado os equipamentos e quaisquer outros bens destinados ao exercício das usas actividades comerciais, sobre os quais manterá o direito de propriedade” – cláusula 4.ª, parágrafo 1;
c. “A Arrendatária terá a faculdade de efectuar, por sua conta e risco, sempre que julgar necessário ou conveniente à prossecução dos fins do contrato, obras de conservação, remodelação e beneficiação do posto de abastecimento e das instalações que integram o estabelecimento, no seu conjunto, e, desde que sejam autorizadas pelos senhorios, podendo, inclusivamente, fazer demolições reconstruções, modificações, acrescentamentos ou substituições dos edifícios existentes, por forma a adaptar o arrendado e o estabelecimento à concepção, imagem e padrões que, em cada momento, utilize ou defina para os seus postos de abastecimento, desde que autorizada por escrito.” - cláusula 4.ª, n.º 2;
d. “No termo do contrato, a arrendatária obriga-se a entregar o locado livre e devoluto de pessoas e coisas com excepção das construções já existentes e de quaisquer outras que venham a fazer ao abrigo da cláusula 4.ª, n.º 2, a menos que os senhorios aceitem que fiquem no local a fazer parte integrante dos prédios.” - cláusula 4.ª, n.º 4;
e. “Os senhorios cedem, a título gratuito, à arrendatária o uso e fruição, durante e vigência do arrendamento, de todos os materiais, maquinismo e utensílios, aos quais para efeitos fiscais, atribuem um valor de €500,00, e que são os seguintes: a) Um reservatório em fibrocimento “Lusalite” de 1000 litros de capacidade; (…)
f. “A cessação do contrato, por denúncia ou por qualquer outra causa permitida na lei, importará para a Arrendatária o direito “e obrigação” de proceder ao levantamento dos bens, equipamentos e outros materiais que sejam ou se presumam ser de sua propriedade, desde que sejam susceptíveis de ser removidos sem detrimento da coisa.” - cláusula 10.ª;
g. “Anexo II - Equipamentos da propriedade da arrendatária” – cláusula 14.ª;
h. “Anexo II
2. A arrendatária restituirá aos senhorios, no termo do arrendamento, todos esses materiais e maquinismos, tudo em bom estado de conservação, ressalvadas as deteriorações decorrentes da sua utilização normal” – cláusula 8.ª;
(…)
3 Reservatórios de 10000 L
1 Reservatório de 18000 L
2 Reservatórios de 24000 L
1 Reservatório de 5000 L
1 Reservatório de 40000 L (…)” – anexo II do mencionado contrato;
10) Com o aproximar do termo final de vigência do contrato celebrado, requerente e requerida estabeleceram contactos, mas não acordaram na prorrogação do contrato então vigente ou na celebração de um outro com idêntico objecto;
11) Por carta registada com aviso de recepção remetida pela requerente à requerida em 04/05/2022 e por esta recebida no dia 05/05/2022, aquela comunicou a esta a denúncia do identificado contrato de arrendamento;
12) Após o envio da referida missiva, as partes voltaram a reunir, sem que, contudo, tenham obtido qualquer entendimento, persistindo, pois, a comunicada denúncia do contrato;
13) A requerente remeteu à requerida, em 29/08/2022, a carta através da qual transmitiu que “Assunto: V/ carta datada de 16.08.2022
Exmos. Senhores,
Presente a V. missiva datada do pretérito dia 16 de agosto, consequente às reuniões realizadas, cumpre-nos reiterar que o arrendado terá, naturalmente, de ser restituído a esta sociedade até ao dia 6 de outubro, data em que o contrato celebrado termina a respetiva vigência, passando então a estar na nossa exclusiva detenção e utilização, com exclusão de outrem, pelo que, a partir de então, apenas esta sociedade poderá promover no mesmo e com respeito ao mesmo os actos que entender.
Conforme transmitido nas antes referidas reuniões, não prescindimos, naturalmente, da exigência de que a restituição se efetue nos termos legais e contratuais, do que, desde logo, decorre que não poderão proceder à remoção de equipamentos e outros materiais que implique detrimento do locado.
Aproveitamos a presente para reiterar que, em conformidade com o estabelecido na cláusula 5.º, n.ºs 2 e 3, do contrato de arrendamento celebrado, oportunamente lhes indicaremos a pessoa ou pessoas para a qual, ou para as quais, terão de transferir as licenças e alvarás do posto.
Apresentando, entretanto, os nossos melhores cumprimentos”;
14) A requerente enviou à requerida a carta com o seguinte teor:
“Assunto: V/ carta datada de 23.09.2022;
Exmos. Senhores,
Considerando que a carta que lhes remetemos em 29.09.2022 apenas hoje, 28 dias depois (!), lhes mereceu resposta, é, desde logo e no mínimo, despropositada a pretensa imposição de um “prazo máximo de 24 (vinte e quatro) horas” vertida na v. missiva em epígrafe identificada e hoje recebida.
Relativamente ao pretenso historial que vertem naquela v. identificada carta, fica o mesmo rejeitado por não ser conforme o sucedido. Diversamente, o que se verificou foi, como bem sabem, a impossibilidade de chegar a um encontro de vontades, por razões que que não cumpre na presente enunciar, para a celebração de novo contrato de arrendamento ou para a renovação, determinou que esta sociedade se limitasse a proceder em absoluta conformidade com a Lei e os próprios termos do contrato celebrado.
Efetivamente, no percurso negocial e no exercício dos seus direitos, agiu esta sociedade, como sempre e sem exceção, em absoluto respeito pela Lei e pelo contrato e, bem assim, com total lealdade e boa-fé.
Quanto à retirada dos v.s pertences, cumpre-nos reiterar, uma vez mais, que o arrendado terá de ser restituído a esta sociedade até ao dia 6 de outubro, data em que o contrato celebrado termina a respetiva vigência, passando então a estar na nossa exclusiva detenção e utilização, com exclusão de outrem, pelo que, a partir de então, apenas esta sociedade poderá promover no mesmo e com respeito ao mesmo os atos que entender, não prescindido esta sociedade que a restituição se efetue nos termos legais e contratuais, do que, desde logo, decorre que não poderão proceder à remoção de equipamentos e outros materiais que implique detrimento do locado.
Apresentando, entretanto, os nossos melhores cumprimentos”:
15) No dia 27/09/ 2022, a requerida iniciou os trabalhos de remoção dos seus pertences, designadamente retiraram o combustível que se encontrava nos tanques ou depósitos e retiraram as bombas medidoras;
16) No dia 28/09/2022 a requerida prosseguiu os trabalhos tendo iniciado a remoção da “imagem corporativa” e procedeu à limpeza dos referidos tanques com a sua desgaseificação;
17) No dia 29/09/2022, a requerida terminou a limpeza dos tanques e prosseguiu com a remoção da “imagem corporativa”;
18) No dia 30/09/2022, pelas nove horas voltaram a comparecer no locado diversos trabalhadores da requerida, designadamente GG, “gestora de área” da requerida e sua representante e mais tarde apresentaram-se no local HH, inspector da obra ao serviço da Requerida e II, superior hierárquico de GG, também funcionário da requerida e, bem assim, trabalhadores;
19) Pelas 09H23, chegou um camião de grandes dimensões, carregado com areia, que estacionou na parte poente do arrendado, no sentido ...-... da Estrada Nacional ..., próximo dos referidos tanques ou reservatórios de combustível;
20) Pouco depois, alguns dos trabalhadores presentes retiraram uma das tampas de um reservatório de combustível, sendo evidente que iriam proceder ao respectivo enchimento com areia proveniente do antes referido camião, tendo os referidos trabalhadores presentes confirmado que assim mesmo iriam proceder, após que avançariam para a “selagem” das respectivas “caixas” de acesso, com recurso a betão;
21) Perante o exposto, AA, mandatado pela requerente, dirigiu-se a II e GG, e, na presença de duas testemunhas, JJ, com domicílio na Rua ..., ..., ..., ..., Vila Nova de Gaia, e KK;
22) E de modo a ser ouvido por todos, como foi, disse “ficam notificados do embargo extrajudicial da obra e portanto não podem continuar a execução da mesma”;
23) Ulteriormente os referidos representantes da requerida contactaram diversas vezes a requerida;
24) Ainda durante a manhã, um dos trabalhadores presentes colocou o referido camião em funcionamento com a intenção de iniciar o enchimento dos tanques com areia, assoreamento, reiterando a requerente que não o podia fazer por a obra ter sido embargada;
25) Militares da Guarda Nacional Republicana compareceram no local arrendado tendo lavrado o respectivo auto;
26) Aquando da comunicação da requerente em fazer cessar o contrato de arrendamento acima mencionado e, estando consciente e ciente de que tal cessação conferia à requerida o direito ao levantamento dos seus bens e equipamentos, entre os quais os reservatórios, a requerente apresentou uma proposta para aquisição dos bens da requerida, o que não foi aceite por esta;
27) Numa das reuniões havidas entre as partes e por carta enviada, a requerida propôs à requerente a preparação, em conjunto, do projecto global de remodelação do posto de abastecimento, o qual visava a execução da obra de desmantelamento dos equipamentos e remoção dos bens da requerida e a colocação, pela requerente de equipamentos de sua propriedade, o que não foi aceite por esta;
28) No dia 27/09/2022, a requerida, conforme acima mencionado, iniciou os trabalhos de levantamento dos bens e equipamentos que não careciam de licenciamento camarário prévio;
29) Na sequência da actuação da requerente, a requerida viu-se impossibilitada de concluir os trabalhos até ao dia 06/10/2022, data do término do contrato;
30) A requerida procedeu à entrega do prédio acima identificado à requerente;
31) De acordo com o projecto de demolição e montagem, a requerida obriga-se a “…4 – Trabalhos a realizar para a remoção dos reservatórios; - Recolha por trasfega de todo o combustível restante em todos os reservatórios enterrados. - Desativação, desmontagem e levantamento de todo o equipamento de superfície incluindo o seu transporte para estaleiro da companhia. - Pré-tratamento de desgaseificação de todos os reservatórios de combustíveis enterrados para preceder ao seu levantamento conforme especificações técnicas adotadas pela companhia para o efeito. - Trabalho de retirada dos reservatórios e seu transporte por empresa com certificação para o efeito e para local a indicar pela companhia. - Aterro com inertes apropriados para enchimento da vala inerente dos reservatórios. ‐ Reposição global de pavimentos diversos e em tudo idênticos aos existentes principalmente as características dos materiais (…)”.
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3.2. Factualidade considerada não provada na sentença

O Tribunal de 1ª instância considerou não provados os seguintes factos:
I. No decurso das referidas conversações mantidas entre a requerente e a requerida sempre aquela comunicou que a mesma não poderia proceder à remoção ou à inutilização dos tanques ou reservatório de combustível, atentos os termos do contrato e o disposto na Lei;
II. Ulteriormente, HH, funcionário da sociedade C..., Lda., contratada pela requerida, dirigiu-se ao referido representante da requerente questionando-o se podia descarregar a areia no locado o que este não consentiu;
III. Aliás, a pretensão da requerida de encher de areia os depósitos, certamente por carecer de licenciamento para a sua remoção configura um procedimento verdadeiramente insidioso, com o fito óbvio de, precisamente, impedir objectivamente estabelecimento comercial instalado no arrendado, de prosseguir o respectivo funcionamento, colocando em causa os correspondentes postos de trabalho;
IV. A remoção dos tanques implica necessariamente a danificação da estrutura onde estes se encontram, o que naturalmente inviabiliza o funcionamento do posto de abastecimento;
V. A actividade do estabelecimento comercial instalado no arrendado ficaria absolutamente impossibilitada com a remoção dos depósitos de combustível;
VI. O estabelecimento comercial no mesmo instalado ficará inevitavelmente paralisado por um indefinido, mas certamente muito alargado, período de tempo;
VII. A requerida pretendia agir de forma retaliadora, obstando a exploração comercial do locado pela requerente.
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3.3. Apreciação da impugnação da matéria de facto

Nas conclusões recursivas veio a apelante requerer a reapreciação da decisão de facto, em relação a um conjunto de factos julgados provados e não provados, com fundamento em erro na apreciação da prova.
Como é consabido, o art. 640º estabelece os ónus a cargo do recorrente que impugna a decisão da matéria de facto, nos seguintes termos:
1. Quando seja impugnada a decisão sobre a matéria de facto, deve o recorrente obrigatoriamente especificar, sob pena de rejeição:
a) Os concretos pontos de facto que considera incorretamente julgados;
b) Os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida;
c) A decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas.
2. No caso previsto na alínea b) do número anterior, observa-se o seguinte:
a) Quando os meios probatórios invocados como fundamento do erro na apreciação das provas tenham sido gravados, incumbe ao recorrente, sob pena de imediata rejeição do recurso na respetiva parte, indicar com exatidão as passagens da gravação em que funda o seu recurso, sem prejuízo de poder proceder à transcrição dos excertos que considere relevantes;
b) Independentemente dos poderes de investigação oficiosa do tribunal, incumbe ao recorrido designar os meios de prova que infirmem as conclusões do recorrente e, se os depoimentos tiverem sido gravados, indicar com exatidão as passagens da gravação em que se funda e proceder, querendo, à transcrição dos excertos que considere importantes.
3. […]
O presente regime veio concretizar a forma como se processa a impugnação da decisão, reforçando o ónus de alegação imposto ao recorrente, prevendo que deixe expresso a solução alternativa que, em seu entender, deve ser proferida pela Relação em sede de reapreciação dos meios de prova.
Recai, assim, sobre o recorrente, face ao regime concebido, um ónus, sob pena de rejeição do recurso, de determinar com toda a precisão os concretos pontos da decisão que pretende questionar – delimitar o objeto do recurso -, motivar o seu recurso através da transcrição das passagens da gravação que reproduzem os meios de prova, ou a indicação das passagens da gravação que, no seu entendimento, impunham decisão diversa sobre a matéria de facto - fundamentação - e ainda, indicar a solução alternativa que, em seu entender, deve ser proferida pela Relação.
No caso concreto, realizou-se o julgamento com gravação dos depoimentos prestados em audiência e a apelante impugna a decisão da matéria de facto com indicação dos pontos de facto impugnados, prova a reapreciar e decisão que sugere, mostrando-se, assim, reunidos os pressupostos de ordem formal para proceder à reapreciação dessa decisão.
Tal como dispõe o nº 1 do art. 662º a Relação deve alterar a decisão proferida sobre a matéria de facto “ […] se os factos tidos como assentes, a prova produzida ou um documento superveniente impuserem decisão diversa”, o que, na economia do preceito, significa que os poderes para alteração da matéria de facto conferidos ao tribunal de recurso constituem apenas um remédio a utilizar nos casos em que os elementos constantes dos autos imponham inequivocamente (em termos de convicção autónoma) uma decisão diversa da que foi dada pela 1ª instância.
No presente processo a audiência final processou-se com gravação da prova pessoal prestada nesse ato processual.
A respeito da gravação da prova e sua reapreciação, haverá que ter em consideração, como sublinha ABRANTES GERALDES[5], que funcionando o Tribunal da Relação como órgão jurisdicional com competência própria em matéria de facto, nessa reapreciação tem autonomia decisória, devendo consequentemente fazer uma apreciação crítica das provas, formulando, nesse julgamento, com inteira autonomia, uma nova convicção, com renovação do princípio da livre apreciação da prova.
Assim, competirá ao Tribunal da Relação reapreciar as provas em que assentou a parte impugnada da decisão, tendo em atenção o conteúdo das alegações do recorrente e recorrido, sem prejuízo de oficiosamente atender a quaisquer outros elementos probatórios que hajam servido de fundamento à decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados.
Decorre deste regime que o Tribunal da Relação tem acesso direto à gravação oportunamente efetuada, mesmo para além dos concretos meios probatórios que tenham sido indicados pelo recorrente e por este transcritos nas alegações, o que constitui uma forma de atenuar a quebra dos princípios da imediação e da oralidade suscetíveis de exercer influência sobre a convicção do julgador, ao mesmo tempo que corresponderá a uma solução justificada por razões de economia e celeridade processuais[6].
Cumpre ainda considerar a respeito da reapreciação da prova, que neste âmbito vigora o princípio da livre apreciação, conforme decorre do disposto no art. 396º do Cód. Civil.
Daí compreender-se o comando estabelecido na lei adjetiva (cfr. art. 607º, nº 4) que impõe ao julgador o dever de fundamentação da materialidade que considerou provada e não provada.
Esta exigência de especificar os fundamentos decisivos para a convicção quanto a toda a matéria de facto é essencial para o Tribunal da Relação, nos casos em que há recurso sobre a decisão da matéria de facto, poder alterar ou confirmar essa decisão.
É através dos fundamentos constantes do segmento decisório que fixou o quadro factual considerado provado e não provado que este Tribunal vai controlar, através das regras da lógica e da experiência, a razoabilidade da convicção do juiz do Tribunal de 1ª instância.
Atenta a posição que adrede vem sendo expressa na doutrina e na jurisprudência, quando o Tribunal da Relação é chamado a pronunciar-se sobre a reapreciação da prova, no caso de se mostrarem gravados os depoimentos, deve considerar os meios de prova indicados pela partes e confrontá-los com outros meios de prova que se mostrem acessíveis, a fim de verificar se foi cometido ou não erro de apreciação que deva ser corrigido[7].
Tendo presentes estes princípios orientadores, cumpre agora dilucidar se assiste razão à apelante, neste segmento recursório da impugnação da matéria de facto, nos termos por ela preconizados.
Como emerge das respetivas conclusões recursivas, a recorrente advoga que: (i) deve ser alterada a redação do ponto nº 26 dos factos provados; (ii) devem ser dadas como provadas as proposições constantes dos pontos nºs I, III, IV, V, VI e VII dos factos não provados.
No referido ponto nº 26 deu-se como provado que “Aquando da comunicação da requerente em fazer cessar o contrato de arrendamento acima mencionado e, estando consciente e ciente de que tal cessação conferia à requerida o direito ao levantamento dos seus bens e equipamentos, entre os quais os reservatórios, a requerente apresentou uma proposta para aquisição dos bens da requerida, o que não foi aceite por esta”.
Por seu turno, no ponto I deu-se como não provado que “No decurso das referidas conversações mantidas entre a requerente e a requerida sempre aquela comunicou que a mesma não poderia proceder à remoção ou à inutilização dos tanques ou reservatório de combustível, atentos os termos do contrato e o disposto na Lei”.
Sustenta a apelante que o mencionado ponto I deve transitar para o elenco dos factos provados, enquanto que a redação do ponto nº 26 dos factos provados deverá passar a ter o seguinte teor: “Aquando da comunicação da requerente em fazer cessar o contrato de arrendamento acima mencionado, a requerente apresentou uma proposta para aquisição dos bens da requerida, o que não foi aceite por esta”.
Portanto, neste conspecto, a impugnação da apelante traduz-se, na essência, na retirada do facto provado nº 26 da expressão “estando consciente e ciente de que tal cessação conferia à requerida o direito ao levantamento dos seus bens e equipamentos, entre os quais os reservatórios” e bem assim em fazer transitar para a materialidade provada que a requerente transmitiu à requerida que não poderia proceder à remoção ou à inutilização dos tanques/reservatórios de combustível.
Desde logo, resulta manifesto que à redação do aludido ponto nº 26 não pode permanecer nos exatos termos que dela constam, posto que a mencionada expressão envolve uma conclusão jurídica na parte em que afirma a dominialidade da requerida sobre os reservatórios de combustível e da possibilidade do seu levantamento, matéria essa que constitui, precisamente, uma das questões de direito que se debate no presente procedimento cautelar.
Ora, como emerge do nº 3 do art. 607º, apenas os factos concretos podem integrar a seleção da matéria de facto relevante para a decisão, não devendo, assim, constar desse segmento do ato decisório conceitos de direito ou conclusões jurídicas, o que, a ocorrer, sempre implicará que tal matéria seja considerada não escrita, sendo certo que o facto de o nº 4 do art. 646º do pretérito Código de Processo Civil[8] não ter sido transposto para a versão atual do Código não implica que não se acolha (como, aliás, constitui, posicionamento jurisprudencial e doutrinal pacífico[9]) a mesma solução caso o tribunal faça indevidamente incluir no elenco dos factos provados matéria de direito.
Por essa razão não pode a sublinhada expressão constar do ponto nº 26 que passará a ter a seguinte redação: “Aquando da comunicação da requerente a que se alude em 11º, esta apresentou uma proposta para aquisição de bens da requerida, o que não foi aceite por esta”.
Já no concernente à materialidade plasmada no referido ponto I, a mesma mostra-se comprovada pelos suportes documentais que foram juntos com a petição como documentos nºs 5 e 7 (cujo teor foi, aliás, dado como provado nos pontos nºs 13 e 14), dos quais se extrai que nas comunicações que direcionou à requerida, a requerente transmitiu-lhe não poderia proceder à remoção (ou à inutilização) dos tanques ou reservatórios de combustível, suportes documentais que, neste conspecto, se mostram corroborados pelo depoimento prestado por AA (sócio da requerente) que adiantou que no âmbito das negociações que foram encetadas entre as partes aquando da cessação do contrato de arrendamento que entre elas vigorava, por diversas vezes foi transmitido pela “A...” à requerida que não aceitava a remoção dos reservatórios de combustível.
Como assim, a mencionada afirmação de facto deve transitar para os factos provados (onde assumirá o nº 27º-A) com o seguinte teor: “No decurso das referidas conversações mantidas entre a requerente e a requerida sempre aquela comunicou que a mesma não poderia proceder à remoção ou à inutilização dos tanques ou reservatório de combustível, atentos os termos do contrato e o disposto na Lei”.
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Nos pontos III, IV, V, VI e VII deu-se como não provado que:
. “Aliás, a pretensão da requerida de encher de areia os depósitos, certamente por carecer de licenciamento para a sua remoção configura um procedimento verdadeiramente insidioso, com o fito óbvio de, precisamente, impedir objectivamente o estabelecimento comercial instalado no arrendado de prosseguir o respectivo funcionamento, colocando em causa os correspondentes postos de trabalho” (ponto III);
. “A remoção dos tanques implica necessariamente a danificação da estrutura onde estes se encontram, o que naturalmente inviabiliza o funcionamento do posto de abastecimento” (ponto IV);
. “A atividade do estabelecimento comercial instalado no arrendado ficaria absolutamente impossibilitada com a remoção dos depósitos de combustível” (ponto V);
. “O estabelecimento comercial no mesmo instalado ficará inevitavelmente paralisado por um indefinido, mas certamente muito alargado, período de tempo” (ponto VI).
. “A requerida pretendia agir de forma retaliadora, obstando a exploração comercial do locado pela requerente” (ponto VII).
Vejamos, antes do mais, em que termos o juiz a quo fundamentou o sentido decisório referente à descrita materialidade, sendo que na respetiva motivação escreveu que «[n]o que respeita à prova testemunhal importa ponderar que a testemunha AA revelou um discurso, na primeira pessoa, evidenciando-se a sua opinião e posição sobre os factos em discussão, não decorrendo do seu depoimento factos objetivos que permitam fazer valer a alegação da requerente. Com efeito, do seu depoimento decorre o que o mesmo acha da leitura dos contratos, apenas mencionando que o seu avô assinava à confiança e que assistiu às negociações do contrato de arrendamento. Ora tal, além de insuficiente para demonstrar a alegação da requerente, é também contraditório com o facto, que o mesmo não pode contrariar, que a requerente propôs a aquisição dos reservatórios à requerida.
Torna-se claro que a testemunha sabe que os reservatórios não são da requerente, agarrando-se, de igual modo a requerente, à leitura de que não é possível retirar os reservatórios por deterioração do prédio.
Como é de ver, as negociações não correram como previsto, surgindo agora a requerente a alegar que a requerida está a retaliar e a atuar abusivamente e a requerida a alegar que a requerente está a limitar um direito seu e aproveitar-se do funcionamento do posto para criar um receio e um prejuízo que, a existir, será por sua responsabilidade.
Concluímos da leitura dos contratos, à semelhança da testemunha arrolada pela requerente KK, que os reservatórios descritos no Anexo II do contrato de arrendamento são propriedade da requerida.
Nesse pressuposto e considerando o já mencionado, assim como os documentos 2, 3, 4 e 6 (este, com referência 33692059) da oposição e documentos juntos com a referência 33931826 têm-se como demonstrados os factos descritos de 26) a 31), prevalecendo a versão factual da requerida.
Nesse contexto, valoram-se os testemunhos de II, GG, LL, MM e NN que depuseram de acordo com o conhecimento que têm do funcionamento da requerida, mas que vai de encontro à motivação que se expende.
Os testemunhos de BB e de JJ vão de encontro à matéria de facto assente e aceite pelas partes. Todavia, não são atendidos, porque sem verosimilhança, para afastar o teor e o alcance dos documentos mencionados, destacadamente, a escritura pública e o contrato de arrendamento.
Assim, não se mostra relevante se o posto de abastecimento teve sempre a mesma configuração ou se a família que explora o posto está aborrecida com a falta de investimento da requerida no local ao longo dos últimos anos, mas se está acordado se os reservatórios são ou não da requerida e, no caso, são, mesmo que não tenha sido a própria a implantá-los lá.
Nessa sequência resultam os factos não provados, tendo em linha de conta os já mencionados documentos juntos com a oposição.
Na verdade, não se ignora que seja fisicamente impossível retirar os reservatórios sem perfurar e desfazer parte do pavimento e, portanto, que se não forem colocados outros reservatórios e pavimentada de novo a superfície o posto possa ficar sem funcionar. Todavia, e por isso se elencam estes factos como não provados – I. a VII. - não está demonstrado que seja por causa da actuação da requerida que a requerente possa ficar sem laborar. Não está demonstrado que não tenha sido acautelada a saída dos reservatórios e a colocação de outros propriedade da requerente».
Concorde-se ou não com a referida motivação, ao invés do que sustenta a apelante, o decisor de 1ª instância, no segmento transcrito, deixou consignadas as razões que, em seu critério, presidiram ao juízo probatório negativo que emitiu relativamente às mencionadas proposições.
A tónica desses enunciados reside no alegado propósito de a requerida querer impedir o funcionamento do estabelecimento comercial instalado no locado em virtude de a remoção dos depósitos de combustível que pretende levar a cabo inviabilizar, pelo menos transitoriamente, a exploração do posto de abastecimento.
A generalidade dessas proposições envolve, portanto, uma conclusão (a de que a atividade do ajuizado estabelecimento ficaria absolutamente impossibilitada com a remoção dos depósitos de combustível), que, qua tale e pelas razões já anteriormente alinhadas, não deve transitar para o elenco dos factos provados. Aliás, essas proposições envolvem uma evidência: a de que um posto de abastecimento não pode naturalmente funcionar sem que nele existam depósitos ou tanques que acondicionem o combustível a fornecer aos respetivos clientes.
Problema diverso é o de saber se existe ou não fundamento que impeça a retirada pela requerida dos depósitos/tanques que aí se encontram colocados, questão essa que não é, contudo, uma questão de facto, mas antes a questão jurídica essencial que se debate no âmbito do presente procedimento cautelar.
É certo que sobre tal matéria foram ouvidas na audiência final várias testemunhas, designadamente as indicadas pela apelante na sua peça recursiva - concretamente AA e BB.
Assim, AA (sócio e coordenador comercial da requerente) quando diretamente instado a pronunciar-se sobre se a atividade do estabelecimento arrendado ficaria absolutamente impossibilitada com a remoção dos depósitos afirmou “claro que sim”, declarando ainda que essa remoção implicaria que o posto de abastecimento estivesse fechado durante vários meses, o que importaria a perda dos clientes, já que estes “estão habituados e são fiéis ao local e provavelmente procurariam outras alternativas”, e os funcionários do posto “provavelmente teriam que ir para o fundo de desemprego por não haver trabalho para eles”.
Por seu turno, BB (que desenvolve a sua atividade profissional na área dos combustíveis) adiantou que estava presente quando os funcionários da B... chegaram ao posto de combustível manifestando a intenção de descarregar areia transportada por um camião nos tanques de combustível, o que “não é o procedimento normal e vai prejudicar e muito depois a reabertura do posto de combustível (…) já que os tanques poderiam partir ou rachar e depois para retirar a areia ia ser um processo muito moroso e não sei se depois os próprios tanques dariam para continuar a ter a finalidade que têm que é o armazenamento de combustível”.
Acrescentou ainda que, pela sua experiência profissional, se os depósitos subterrâneos fossem retirados a colocação de outros tanques demoraria, entre licenciamento e trabalhos a executar (escavações, tubagens, etc.), não menos de dois a quatro meses até pôr o estabelecimento (“a bomba”, na expressão da testemunha) a funcionar.
Ora, quer pelo já assinalado cariz conclusivo das ditas proposições, quer pela natureza marcadamente genérica e conjetural dos mencionados depoimentos, afigura-se-nos inexistir razão bastante para divergir do sentido decisório que foi acolhido na decisão recorrida, já que a argumentação expendida pela apelante não teve, quanto a nós, o condão de desconstruir a motivação adrede tecida nesse ato decisório, afigurando-se-nos que a prova produzida não impõe (como é suposto pelo nº 1 do art. 662º) decisão diversa.
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4. FUNDAMENTOS DE FACTO

Face à decisão que antecede, passa a ser a seguinte a factualidade relevante provada:
1) A requerente é dona e legítima possuidora do prédio urbano sito no lugar ..., com a área total de 2962,9 m2, com a área coberta de 124,6 m2 e descoberta de 2838,3m2, inscrito na matriz predial sob os nºs ... e ..., da freguesia ... e ..., concelho de Vila Nova de Gaia, e descrito na 2.ª Conservatória do Registo Predial de Vila Nova de Gaia sob o número ... da freguesia ..., separado pela Estrada Nacional ..., Av. ..., no qual se encontram instalados dois postos de abastecimento de combustíveis com loja de conveniência;
2) Por escritura pública, datada de 06/10/1997, CC e mulher DD, na qualidade de primeiros outorgantes, constituíram o direito de superfície sobre o mencionado prédio, pelo preço de trezentos e oitenta mil contos, a favor de B..., S.A., na qualidade de segunda outorgante – documento junto, cujo teor se dá integralmente por reproduzido;
3) Nessa escritura pública consta que “O direito de superfície sobre os dois prédios atrás descritos, é constituído com a faculdade de a representada dos segundos outorgantes manter, durante a vigência do contrato, os edifícios neles existente para exploração de um posto duplo de abastecimento de combustíveis, gás lubrificantes para veículos automóveis e quaisquer outros produtos petrolíferos do seu fabrico e comércio (…)
2.º
O direito de superfície é constituído pelo prazo de quinze anos com início hoje.
3.º
A representada dos segundos outorgantes terá a faculdade, durante a vigência do direito de superfície, de efectuar, por sua conta e risco, sempre que entender necessário, oportuno e conveniente à prossecução das suas actividades, obras de conservação e remodelação ou beneficiação, quer do posto duplo de abastecimento, quer dos edifícios e instalações que o integram, assim como poderá fazer demolições, reconstruções, modificações, acrescentamentos ou substituições dos edifícios existentes, por forma a adaptar o local e o posto duplo à acepção, imagem e padrões que, em cada momento, utilizar ou defina para os seus postos de abastecimento.
§ 1.º - Contudo, a representação dos segundos outorgantes ou pessoa singular ou colectiva, a quem ela venha a entregar a exploração do posto duplo, não poderá fazer quaisquer obras ou edifícios de cércea superior a rés-do-chão, e muito menos em frente da casa de habitação pertencente aos primeiros outorgantes (…).
§ 2.º - Em frente destes prédios (…) em toda a sua largura apenas poderão existir os depósitos subterrâneos as ilhas de bombas e as respectivas palas de cobertura, como já acontece actualmente.
§ 3.º A representada dos segundos outorgantes ou a pessoa singular ou colectiva, a que ela venha a entregar a exploração do posto duplo, não poderá, sem autorização ou indicação por escrito dos primeiros outorgantes, proceder ao corte ou derrube das árvores hoje existentes em ambos os prédios superficiários.
(…)
6.º
1 – Finda a vigência do direito de superfície, todas as construções e quaisquer benfeitorias realizadas pela representada dos segundos outorgantes ficam a fazer parte integrante dos prédios e a pertencer aos primeiros outorgantes, ou seja, sem que esta tenha direito a qualquer indemnização.
2 – Da reversão, porém, ficam excluídos os bens mobiliários, tais como as bombas, compressores, reservatórios, maquinismos e outros equipamentos, que sejam propriedade da representada dos segundos outorgantes, bem como as benfeitorias que esta tenha efectuado e que possam ser levantadas sem detrimento dos prédios. Tais bens e benfeitorias deverão ser removidas e levantadas dos prédios no prazo máximo de quinze dias a contar do termo do direito de superfície, sob pena de os primeiros outorgantes poderem mandar levantá-los e armazena-los, imputando à representada dos segundos outorgantes os custos do levantamento e armazenamento.
Ainda por esta escritura, a representada dos primeiros outorgantes (…) cede a tulo gratuito à representada dos segundos outorgantes o uso e fruição, durante a vigência do direito de superfície ora constituído, de todos os materiais, maquinismos, incluindo máquina de lavagem automática de veículos automóveis e utensílios que lhe pertencem e que são os seguintes, e aos quais, para efeitos fiscais, atribuem o valor de cem contos:
(…)
- Um reservatório de fibrocimento “lusalite” de 1000 de capacidade; (…)” – documento cujo teor se dá integralmente por reproduzido;
4) Por documento escrito, denominado “contrato de arrendamento de duração limitada para fins não habitacionais”, o referido prédio foi dado de arrendamento à requerida pelos respectivos ante possuidores, CC e cônjuge DD – documento 1 do requerimento inicial, cujo teor se dá por reproduzido;
5) Tal prédio foi aí descrito como: a. Prédio urbano composto de edifício de um só piso, destinado a comércio, com a área coberta de dezanove metros e sessenta decímetros quadrados, sito no lugar ... da freguesia ... do concelho de Vila Nova de Gaia, a confinar do norte, sul e nascente com EE, poente Avenida ..., inscrito na matriz sob o artigo ...; e Prédio urbano, composto de um só piso destinado a comércio, com a área coberta de cento e cinco metros quadrados e descoberta de mil duzentos e noventa metros e cinquenta e cinco centímetros quadrados, sito no mesmo lugar ..., a confinar de norte e poente com EE, sul com FF, nascente com Avenida ..., inscrito na matriz sob o artigo ...;
6) Por documento escrito, denominado “Contrato de Cessão de Posição Contratual”, datado de 03/12/2012, aqueles ante possuidores dos identificados prédios declararam que “cedem a sua posição contratual naquele contrato pelo preço de €270.000,00 (duzentos e setenta mil euros), a pagar no acto da escritura à sociedade A..., Lda.” e a requerida declarou que “reconhecem esta cedência e por via disso obrigam-se a reconhecer como senhoria a sociedade identificada como segunda outorgante e a pagar-lhe a respectiva renda nos termos do respectivo contrato de arrendamento.”, o qual, no mais, se manteve inalterado – documento 2 do requerimento inicial, cujo teor se dá por reproduzido;
7) Através dos identificados acordos os proprietários dos prédios descritos cederam à requerida o gozo e a utilização destes, pelo período de dez anos, com início a 06/10/2012 e mediante a retribuição mensal que esta se obrigou a pagar àqueles, no montante de 7500,00€ mensais;
8) Consta do referido contrato de arrendamento que “O arrendado destina-se à instalação e exploração de um posto de abastecimento de combustíveis, aliás já instalado, “ao abrigo de um outro contrato de cedência de superfície”, gás, lubrificantes para veículos automóveis e quaisquer outros produtos petrolíferos do seu fabrico e comércio, podendo ainda neles ser desenvolvidas outras actividades complementares ou conexas, tais como loja de assistência ao cliente, tabacaria, lavagem automática e manual de automóveis, estação de serviço, mini-mercado e outras usuais em instalações desta natureza, incluindo todos os edifícios existentes no imóvel que a segunda outorgante se obriga a manter em bom estado de conservação” – cláusula 2.ª, parágrafo 2;
9) Mais acordaram as partes naquele contrato que:
a. “O prédio arrendado é, nesta data, entregue à arrendatária, inteiramente livre de qualquer pessoal, e devoluta de quaisquer bens, com excepção dos equipamentos e utensílios que integram o posto de abastecimento, identificados como propriedade dos senhorios, devidamente referidos na cláusula 8.ª e os que embora já se encontrem instados no mesmo posto à data do arrendamento são já propriedade da arrendatária e que constam do anexo II” – cláusula 3.ª, parágrafo 1;
b. “A arrendatário poderá, livremente, instalar no local arrendado os equipamentos e quaisquer outros bens destinados ao exercício das usas actividades comerciais, sobre os quais manterá o direito de propriedade” – cláusula 4.ª, parágrafo 1;
c. “A Arrendatária terá a faculdade de efectuar, por sua conta e risco, sempre que julgar necessário ou conveniente à prossecução dos fins do contrato, obras de conservação, remodelação e beneficiação do posto de abastecimento e das instalações que integram o estabelecimento, no seu conjunto, e, desde que sejam autorizadas pelos senhorios, podendo, inclusivamente, fazer demolições reconstruções, modificações, acrescentamentos ou substituições dos edifícios existentes, por forma a adaptar o arrendado e o estabelecimento à concepção, imagem e padrões que, em cada momento, utilize ou defina para os seus postos de abastecimento, desde que autorizada por escrito.” - cláusula 4.ª, n.º 2;
d. “No termo do contrato, a arrendatária obriga-se a entregar o locado livre e devoluto de pessoas e coisas com excepção das construções já existentes e de quaisquer outras que venham a fazer ao abrigo da cláusula 4.ª, n.º 2, a menos que os senhorios aceitem que fiquem no local a fazer parte integrante dos prédios.” - cláusula 4.ª, n.º 4;
e. “Os senhorios cedem, a título gratuito, à arrendatária o uso e fruição, durante e vigência do arrendamento, de todos os materiais, maquinismo e utensílios, aos quais para efeitos fiscais, atribuem um valor de €500,00, e que são os seguintes: a) Um reservatório em fibrocimento “Lusalite” de 1000 litros de capacidade; (…)
f. “A cessação do contrato, por denúncia ou por qualquer outra causa permitida na lei, importará para a Arrendatária o direito “e obrigação” de proceder ao levantamento dos bens, equipamentos e outros materiais que sejam ou se presumam ser de sua propriedade, desde que sejam susceptíveis de ser removidos sem detrimento da coisa.” - cláusula 10.ª;
g. “Anexo II - Equipamentos da propriedade da arrendatária” – cláusula 14.ª;
h. “Anexo II
2. A arrendatária restituirá aos senhorios, no termo do arrendamento, todos esses materiais e maquinismos, tudo em bom estado de conservação, ressalvadas as deteriorações decorrentes da sua utilização normal” – cláusula 8.ª;
(…)
3 Reservatórios de 10000 L
1 Reservatório de 18000 L
2 Reservatórios de 24000 L
1 Reservatório de 5000 L
1 Reservatório de 40000 L (…)” – anexo II do mencionado contrato;
10) Com o aproximar do termo final de vigência do contrato celebrado, requerente e requerida estabeleceram contactos, mas não acordaram na prorrogação do contrato então vigente ou na celebração de um outro com idêntico objecto;
11) Por carta registada com aviso de recepção remetida pela requerente à requerida em 04/05/2022 e por esta recebida no dia 05/05/2022, aquela comunicou a esta a denúncia do identificado contrato de arrendamento;
12) Após o envio da referida missiva, as partes voltaram a reunir, sem que, contudo, tenham obtido qualquer entendimento, persistindo, pois, a comunicada denúncia do contrato;
13) A requerente remeteu à requerida, em 29/08/2022, a carta através da qual transmitiu que “Assunto: V/ carta datada de 16.08.2022
Exmos. Senhores,
Presente a V. missiva datada do pretérito dia 16 de agosto, consequente às reuniões realizadas, cumpre-nos reiterar que o arrendado terá, naturalmente, de ser restituído a esta sociedade até ao dia 6 de outubro, data em que o contrato celebrado termina a respetiva vigência, passando então a estar na nossa exclusiva detenção e utilização, com exclusão de outrem, pelo que, a partir de então, apenas esta sociedade poderá promover no mesmo e com respeito ao mesmo os actos que entender.
Conforme transmitido nas antes referidas reuniões, não prescindimos, naturalmente, da exigência de que a restituição se efetue nos termos legais e contratuais, do que, desde logo, decorre que não poderão proceder à remoção de equipamentos e outros materiais que implique detrimento do locado.
Aproveitamos a presente para reiterar que, em conformidade com o estabelecido na cláusula 5.º, n.ºs 2 e 3, do contrato de arrendamento celebrado, oportunamente lhes indicaremos a pessoa ou pessoas para a qual, ou para as quais, terão de transferir as licenças e alvarás do posto.
Apresentando, entretanto, os nossos melhores cumprimentos”;
14) A requerente enviou à requerida a carta com o seguinte teor:
“Assunto: V/ carta datada de 23.09.2022;
Exmos. Senhores,
Considerando que a carta que lhes remetemos em 29.09.2022 apenas hoje, 28 dias depois (!), lhes mereceu resposta, é, desde logo e no mínimo, despropositada a pretensa imposição de um “prazo máximo de 24 (vinte e quatro) horas” vertida na v. missiva em epígrafe identificada e hoje recebida.
Relativamente ao pretenso historial que vertem naquela v. identificada carta, fica o mesmo rejeitado por não ser conforme o sucedido. Diversamente, o que se verificou foi, como bem sabem, a impossibilidade de chegar a um encontro de vontades, por razões que que não cumpre na presente enunciar, para a celebração de novo contrato de arrendamento ou para a renovação, determinou que esta sociedade se limitasse a proceder em absoluta conformidade com a Lei e os próprios termos do contrato celebrado.
Efetivamente, no percurso negocial e no exercício dos seus direitos, agiu esta sociedade, como sempre e sem exceção, em absoluto respeito pela Lei e pelo contrato e, bem assim, com total lealdade e boa-fé.
Quanto à retirada dos v.s pertences, cumpre-nos reiterar, uma vez mais, que o arrendado terá de ser restituído a esta sociedade até ao dia 6 de outubro, data em que o contrato celebrado termina a respetiva vigência, passando então a estar na nossa exclusiva detenção e utilização, com exclusão de outrem, pelo que, a partir de então, apenas esta sociedade poderá promover no mesmo e com respeito ao mesmo os atos que entender, não prescindido esta sociedade que a restituição se efetue nos termos legais e contratuais, do que, desde logo, decorre que não poderão proceder à remoção de equipamentos e outros materiais que implique detrimento do locado.
Apresentando, entretanto, os nossos melhores cumprimentos”:
15) No dia 27/09/ 2022, a requerida iniciou os trabalhos de remoção dos seus pertences, designadamente retiraram o combustível que se encontrava nos tanques ou depósitos e retiraram as bombas medidoras;
16) No dia 28/09/2022 a requerida prosseguiu os trabalhos tendo iniciado a remoção da “imagem corporativa” e procedeu à limpeza dos referidos tanques com a sua desgaseificação;
17) No dia 29/09/2022, a requerida terminou a limpeza dos tanques e prosseguiu com a remoção da “imagem corporativa”;
18) No dia 30/09/2022, pelas nove horas voltaram a comparecer no locado diversos trabalhadores da requerida, designadamente GG, “gestora de área” da requerida e sua representante e mais tarde apresentaram-se no local HH, inspector da obra ao serviço da Requerida e II, superior hierárquico de GG, também funcionário da requerida e, bem assim, trabalhadores;
19) Pelas 09H23, chegou um camião de grandes dimensões, carregado com areia, que estacionou na parte poente do arrendado, no sentido ...-... da Estrada Nacional ..., próximo dos referidos tanques ou reservatórios de combustível;
20) Pouco depois, alguns dos trabalhadores presentes retiraram uma das tampas de um reservatório de combustível, sendo evidente que iriam proceder ao respectivo enchimento com areia proveniente do antes referido camião, tendo os referidos trabalhadores presentes confirmado que assim mesmo iriam proceder, após que avançariam para a “selagem” das respectivas “caixas” de acesso, com recurso a betão;
21) Perante o exposto, AA, mandatado pela requerente, dirigiu-se a II e GG, e, na presença de duas testemunhas, JJ, com domicílio na Rua ..., ..., ..., ..., Vila Nova de Gaia, e KK;
22) E de modo a ser ouvido por todos, como foi, disse “ficam notificados do embargo extrajudicial da obra e portanto não podem continuar a execução da mesma”;
23) Ulteriormente os referidos representantes da requerida contactaram diversas vezes a requerida;
24) Ainda durante a manhã, um dos trabalhadores presentes colocou o referido camião em funcionamento com a intenção de iniciar o enchimento dos tanques com areia, assoreamento, reiterando a requerente que não o podia fazer por a obra ter sido embargada;
25) Militares da Guarda Nacional Republicana compareceram no local arrendado tendo lavrado o respectivo auto;
26) (alterada a redação) Aquando da comunicação da requerente a que se alude em 11º, esta apresentou uma proposta para aquisição dos bens da requerida, o que não foi aceite por esta;
27) Numa das reuniões havidas entre as partes e por carta enviada, a requerida propôs à requerente a preparação, em conjunto, do projecto global de remodelação do posto de abastecimento, o qual visava a execução da obra de desmantelamento dos equipamentos e remoção dos bens da requerida e a colocação, pela requerente de equipamentos de sua propriedade, o que não foi aceite por esta;
27-A) (aditado) No decurso das referidas conversações mantidas entre a requerente e a requerida sempre aquela comunicou que a mesma não poderia proceder à remoção ou à inutilização dos tanques ou reservatório de combustível, atendo os termos do contrato e o disposto na Lei.
28) No dia 27/09/2022, a requerida, conforme acima mencionado, iniciou os trabalhos de levantamento dos bens e equipamentos que não careciam de licenciamento camarário prévio;
29) Na sequência da actuação da requerente, a requerida viu-se impossibilitada de concluir os trabalhos até ao dia 06/10/2022, data do término do contrato;
30) A requerida procedeu à entrega do prédio acima identificado à requerente;
31) De acordo com o projecto de demolição e montagem, a requerida obriga-se a “…4 – Trabalhos a realizar para a remoção dos reservatórios; - Recolha por trasfega de todo o combustível restante em todos os reservatórios enterrados. - Desativação, desmontagem e levantamento de todo o equipamento de superfície incluindo o seu transporte para estaleiro da companhia. - Pré-tratamento de desgaseificação de todos os reservatórios de combustíveis enterrados para preceder ao seu levantamento conforme especificações técnicas adotadas pela companhia para o efeito. - Trabalho de retirada dos reservatórios e seu transporte por empresa com certificação para o efeito e para local a indicar pela companhia. - Aterro com inertes apropriados para enchimento da vala inerente dos reservatórios. ‐ Reposição global de pavimentos diversos e em tudo idênticos aos existentes principalmente as características dos materiais (…)”.
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5. FUNDAMENTOS DE DIREITO

A requerente (e ora apelante) intentou o presente procedimento cautelar com o desiderato de obter a ratificação (judicial) do embargo extrajudicial que levou a cabo relativamente à obra que a requerida se aprestava para executar de remoção dos reservatórios/depósitos de combustível instalados no seu (dela, requerente) prédio urbano, no qual se encontram instalados dois postos de abastecimento de combustíveis com loja de conveniência.
Na decisão recorrida julgou-se improcedente a aludida pretensão de tutela jurisdicional com fundamento na falta de verificação dos necessários requisitos normativos para operar a impetrada ratificação judicial.
A apelante rebela-se contra esse sentido decisório, argumentando que, in casu, se mostram efetivamente preenchidos todos os pressupostos que a lei adjetiva estabelece para o decretamento da providência que requereu.
Que dizer?
Como é consabido, o embargo judicial de obra nova é uma providência cautelar nominada que, no seu desenho legal, visa impedir a violação (ou a continuação da violação) do direito de propriedade, ou outro direito real ou pessoal de gozo ou da posse, em consequência da execução de uma obra, trabalho ou serviço novo, que cause ou ameace causar prejuízo ao seu titular.
Trata-se, pois, de uma providência com função preventiva ou conservatória, na medida em que tem como objetivo principal suspender provisoriamente uma obra, evitando danos dela resultantes ou o agravamento dos mesmos, garantindo, dessa forma, a estabilização da situação de facto até que o direito seja declarado e reconhecido na ação principal de que essa providência depende.
Em conformidade com a lei adjetiva (cfr. art. 397º), o titular do direito tem, à sua escolha, dois modos de proceder com vista a obter o referido resultado. Assim, pode lançar mão do embargo judicial (procedimento cautelar instaurado no tribunal visando a prolação de providencia que determine a imediata suspensão da obra, trabalho ou serviço - n.º 1 do art. 397º), ou do embargo extrajudicial, em que o interessado realiza, diretamente ou por “mão própria”, o embargo, intimando verbalmente, perante duas testemunhas, o dono da obra, ou, na sua falta, o encarregado ou quem o substituir, para que este a não continue, ficando dependente, para a sua subsistência, de ratificação judicial (n.ºs 2 e 3 do art. 397º).
Procedendo à exegese do citado normativo, dele emerge que para o decretamento da providência torna-se mister a alegação e prova (ainda que perfunctória, como é suposto nos procedimentos cautelares) de factos donde resulte:
(i) - Ofensa do direito de propriedade, singular ou comum, de qualquer outro direito, real ou pessoal, de gozo ou da posse do requerente;
(ii) - Em razão da execução de uma obra, trabalho ou serviço novo e ainda não concluído;
(iii) - Que cause ou ameace causar prejuízo.
Tratando-se de ratificação de embargo extrajudicial de obra nova (como é o caso dos presentes autos), aos mencionados requisitos legais cumulativos acrescem os seguintes:
(iv) - A notificação verbal ao dono da obra ou, na sua falta, ao encarregado ou quem o substituir para que não continue a obra;
(v) - Que essa notificação seja feita perante duas testemunhas; e
(vi) - O pedido de ratificação judicial do embargo extrajudicial seja realizado no prazo de cinco dias.
Enunciados, desta forma sumária[10], os requisitos normativos de que depende o decretamento da providência cautelar de embargo de obra nova, temos que a divergência recursiva da apelante em relação à decisão sob censura reside em saber se na sua esfera jurídica patrimonial radica, ou não, um direito que impede a requerida de proceder à remoção dos reservatórios/depósitos de combustível instalados no seu prédio urbano.
Nesse ato decisório entendeu-se “que a requerente não é a proprietária dos reservatórios que a requerida pretende retirar do posto de abastecimento, nem que o enchimento dos reservatórios com areia, nem a sua posterior retirada sejam ilícitos. A requerida está a exercer um direito que é seu”, razão pela qual não se decretou a ratificação do embargo que aquela levou a cabo no dia 30 de setembro de 2022.
No sentido de rebater esse entendimento do julgador de 1ª instância, argumenta a apelante que o pedido que aduz nestes autos “não se estriba num seu próprio – não invocado – direito de propriedade relativamente aos reservatórios, mas, diversamente, no direito, contratual e legal, de que entende ser titular, de se opor ao levantamento dos mesmos, com as legais consequências indemnizatórias a que fica obrigada”.
Portanto, tal como a questão se mostra equacionada, cumpre dilucidar se por mor do denominado “contrato de arrendamento de duração limitada para fins não habitacionais” que as partes celebraram entre si no dia 10 de outubro de 2012, assiste à recorrente o direito de impedir o mencionado levantamento (que, in casu, corresponde à obra extrajudicialmente embargada), sendo que em abono desse seu posicionamento convoca o que adrede ficou estipulado nas cláusulas 4ª, nº 4 e 10ª desse contrato e bem assim o regime plasmado nos arts. 1074º, nº 5 e 1273º do Cód. Civil.
Registe-se, desde logo, que, de acordo com o programa negocial estabelecido entre requerente e requerida (cfr., v.g., cláusula 3ª, nº 1 e anexo II do contrato), os ditos reservatórios de combustível pertencem a esta última, afirmação que aquela, verdadeiramente, não põe fundadamente em crise.
Como assim, primo conspectu, findo (por denúncia da requerente/locadora) o ajuizado contrato, assistiria à requerida o direito de retirar do imóvel arrendado todo o equipamento que lhe pertence, como, aliás, concluiu o juiz a quo.
A apelante, como referido, contrapõe que a requerida não pode proceder a esse levantamento, porquanto quer o contrato (cláusula 10ª[11], que, na essência, corresponde a uma cláusula de estilo, mero rappel do regime acolhido no nº 1 do art. 1273º do Cód. Civil), quer a lei (os citados arts. 1074º, nº 5 e 1273º do Cód. Civil), impedem a realização dessa operação material quando a mesma ocasione o detrimento da coisa, como é, na sua perspetiva, a situação sub judicio.
Em consonância com o referido quadro normativo, o arrendatário tem direito, no final do contrato, a compensação pelas obras licitamente feitas, nos termos aplicáveis às benfeitorias[12] realizadas por possuidor de boa-fé, isto é, caso essas obras assumam natureza de benfeitorias necessárias deve ser indemnizado pelo respetivo valor, sendo que na hipótese de se estar em presença de benfeitorias úteis pode proceder ao seu levantamento (ius tollendi), contanto que daí não resulte o detrimento da coisa; quando, para evitar esse detrimento, não seja possível esse levantamento, o senhorio satisfará ao arrendatário o valor dessas benfeitorias, calculado segundo as regras do enriquecimento sem causa[13].
Portanto, sendo as benfeitorias úteis[14], o direito atribuído ao arrendatário de ser indemnizado pelo locador é subsidiário do direito de as levantar, não se estando, pois, em presença de dois direitos de exercício alternativo consoante o interesse daquele. Assim o arrendatário, querendo exercer direito em relação a essas benfeitorias, deve levantá-las; só não o poderá fazer no caso excecional de o levantamento causar ao prédio arrendado detrimento.
Significa isto, pois, que na resolução da questão que é trazida à apreciação deste tribunal ad quem tudo se resume em saber se o levantamento dos reservatórios de combustível implica, ou não, esse detrimento.
Conforme entendimento pacífico[15], o detrimento refere-se à coisa (imóvel arrendado) e não às benfeitorias nela realizadas, já que quanto a estas, a possibilidade de detrimento não tem relevância jurídica, ou seja, se apenas elas resultarem prejudicadas com o possível levantamento, não existe fundamento para o arrendatário exigir o pagamento de qualquer compensação.
Esse detrimento há de, contudo, constituir um dano notável do prédio, de difícil ou muito onerosa reparação.
Como, a este propósito, se escreve no acórdão do STJ de 27.09.2012[16], «o exercício do direito ao levantamento das benfeitorias é sempre suscetível de causar um dano à coisa que foi beneficiada, por mínimo que seja; aliás, a possibilidade de retirar as benfeitorias sem causar qualquer dano é remota já que na maioria dos casos, em condições normais, as operações materiais de separação e levantamento implicam estragos na coisa beneficiada; o que a lei não admite é que esse dano constitua um detrimento, o que deve ser entendido como um dano considerável, irreparável ou de difícil reparação.
O detrimento a que alude o nº1 do art. 1273º in fine é, portanto, a danificação significativa da coisa onde as mesmas (benfeitorias) foram implantadas.
Como condição do seu reconhecimento, a efetividade do direito à separação e ao levantamento das benfeitorias há-de deixar incólume a coisa beneficiada ou, no máximo, há-de causar-lhe danos de pouca monta e facilmente reparáveis.
O detrimento da coisa impeditivo do levantamento consiste, portanto, num estrago elevado, definitivo ou de difícil reparação que, in extremis, pode ir à própria destruição da coisa».
Ainda a este respeito tem sido estabelecido um distinguo consoante as benfeitorias constituam partes componentes ou partes integrantes[17] do prédio onde foram realizadas[18]. Assim, no primeiro caso, esse detrimento ocorrerá, posto que as mesmas, fundindo-se na sua estrutura, não se podem retirar sob pena de destruição; já no segundo, o levantamento não implicará, por via de regra, o detrimento do imóvel por não se incorporarem aquelas na sua estrutura.
Postas tais considerações, revertendo ao caso em apreço, temos que, cessado, por denúncia, o contrato de arrendamento celebrado entre as partes, assistiria à arrendatária o direito (“e obrigação”, na expressão utilizada na mencionada cláusula contratual 10ª) de proceder ao levantamento dos reservatórios de combustível que se encontram instalados no prédio da apelante, os quais, nesse contexto, constituem sua parte integrante que, qua tale, não chegaram a fundir-se na sua essência, permanecendo com autónoma identidade.
Como se deu nota, contrapõe a apelante que esse levantamento causa detrimento ao seu imóvel. Todavia, essa (mera) invocação não é de molde a neutralizar o exercício do ius tollendi por banda da arrendatária/apelada, já que, sob um ponto de vista objetivo, não se antolha (nem o substrato perfunctoriamente provado o revela) que esse levantamento implique uma danificação significativa do prédio (isto é, que fique prejudicado na sua substância), sendo que, conforme vem sendo sublinhado na casuística[19], o detrimento, a que se alude no art. 1273º do Cód. Civil, afere-se em relação à coisa tal como era antes da realização das benfeitorias úteis, pois de contrário, aumentando estas o valor daquela, o levantamento importaria sempre no seu detrimento. Portanto, para este efeito, e contrariamente ao que a apelante entende, o detrimento relevante é o do prédio urbano e não o do estabelecimento comercial nele instalado.
No caso, o levantamento que a apelada pretende realizar é, pela natureza dos trabalhos envolvidos, possível e realizável sem detrimento (no sentido normativo supra exposto) do prédio urbano da requerente, posto que, como resulta evidenciado nos autos, esse serviço passará por uma escavação de molde a possibilitar a retirada dos reservatórios, pela reposição do solo, sua compactação e recolocação do pavimento (ou seja, a reposição do status quo ante).
Consequentemente, nessas circunstâncias, não assiste à apelante qualquer direito[20] (mormente real ou pessoal de gozo) que a legitime a opor-se ao levantamento dos reservatórios pertencentes à requerida, a qual, como se provou, se dispôs (e dispõe) a colocar o imóvel na situação em que se encontrava antes da implantação desse equipamento no terreno.
Impõe-se, por conseguinte, a improcedência do recurso por inverificação, tal como afirmado no ato decisório sob censura, dos requisitos normativos de que depende a ratificação judicial do embargo levado a cabo pela requerente/apelante.
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III- DISPOSITIVO

Pelos fundamentos acima expostos, acordam os Juízes deste Tribunal da Relação em julgar a apelação improcedente, confirmando-se a decisão recorrida.
Custas a cargo da apelante (art. 527º, nºs 1 e 2).

Porto, 8/5/2023
Miguel Baldaia Morais
Fátima Andrade
Eugénia Cunha
________________
[1] Diploma a atender sempre que se citar disposição legal sem menção de origem.
[2] Cfr., por todos, TEIXEIRA DE SOUSA, Estudos sobre o Processo Civil, pág. 220 e seguinte, LEBRE DE FREITAS et alii, Código de Processo Civil Anotado, vol. I, pág. 297 e RODRIGUES BASTOS, Notas ao Código de Processo Civil, vol. III, pág. 194.
[3] Assim ANTUNES VARELA et alii, Manual de Processo Civil pág. 670.
[4] Ob. citada, pág. 348. No mesmo sentido milita LOPES DO REGO (in Comentários ao Código de Processo Civil, vol. I, pág. 434) quando refere que o juiz deve proceder à indicação dos fundamentos que foram decisivos para a sua convicção, com especificação dos meios de prova e das razões ou motivos substanciais por que relevaram ou obtiveram credibilidade.
[5] In Recursos no Novo Código de Processo Civil, pág. 225; no mesmo sentido milita REMÉDIO MARQUES (in A ação declarativa, à luz do Código Revisto, 3ª edição, págs. 638 e seguinte), onde critica a conceção minimalista sobre os poderes da Relação quanto à reapreciação da matéria de facto que vem sendo seguida por alguma jurisprudência.
[6] Isso mesmo é ressaltado por ABRANTES GERALDES, in Temas da Reforma de Processo Civil, vol. II, 3ª ed. revista e ampliada, pág. 272.
[7] Assim ABRANTES GERALDES Recursos, pág. 299 e acórdãos do STJ de 03.11.2009 (processo nº 3931/03.2TVPRT.S1) e de 01.07.2010 (processo nº 4740/04.7TBVFX-A.L1.S1), ambos acessíveis em www.dgsi.pt.
[8] Onde se preceituava que “[t]êm-se por não escritas as respostas do tribunal colectivo sobre questões de direito (…)”.
[9] Cfr., por todos, na doutrina, ABRANTES GERALDES et al., in Código de Processo Civil Anotado, vol. I, 2ª edição, Almedina, pág. 746 e HELENA CABRITA, in A fundamentação de facto e de direito na decisão cível, Coimbra Editora, 2015, págs. 112 e seguintes; na jurisprudência, acórdão do STJ de 1.10.2019 (processo nº 109/17.1T8ACB.C1.S1) e acórdão desta Relação de 26.05.2015 (processo nº 5807/13.6TBMTS.P1), acessíveis em www.dgsi.pt.
[10] Para maior desenvolvimento, vide, entre outros, ABRANTES GERALDES, in Temas da Reforma do Processo Civil, vol. IV, 4ª edição, Almedina, págs. 250 e seguintes, LEBRE DE FREITAS/ISABEL ALEXANDRE, in Código de Processo Civil Anotado, vol. II, 3ª edição, Almedina, págs. 164 e seguintes e CARVALHO GONÇALVES, in Providências Cautelares, 2015, Almedina, págs. 283 e seguintes.
[11] Na qual se preceitua que “[A] cessação do contrato, por denúncia ou por qualquer outra causa permitida na lei, importará para a arrendatária o direito e obrigação de proceder ao levantamento dos bens, equipamentos e outros materiais que sejam ou se presumam ser de sua propriedade, desde que sejam suscetíveis de ser removidos sem detrimento da coisa”.
[12] Conforme tem sido sublinhado pela doutrina (cfr., inter alia, OLIVEIRA ASCENSÃO, in Direito Civil – Reais, 5.ª edição, Coimbra Editora, pág. 109 e VAZ SERRA, in Revista de Legislação e Jurisprudência, ano 106.º, págs. 107 e seguintes), a benfeitoria consiste num melhoramento, ou aperfeiçoamento, feito por quem tem um vinculo à coisa (relação de facto ou de direito), sendo que nos termos do art. 216º do Cód. Civil consideram-se benfeitorias todas as despesas feitas para conservar ou melhorar a coisa, podendo estar em causa a realização de obras, a incorporação de outras coisas ou simplesmente trabalho.
[13] Competindo, nessa situação, ao arrendatário que pretenda o recebimento da indemnização o ónus de provar, enquanto facto constitutivo desse direito, que do levantamento das benfeitorias resulta detrimento para a coisa.
[14] De acordo com o disposto no nº 3 do art. 216º do Cód. Civil, “são benfeitorias úteis as que, não sendo indispensáveis para a sua [do prédio] conservação, lhe aumentam, todavia, o valor”. Quer dizer, as benfeitorias úteis trazem à coisa principal (benfeitorizada) novas utilidades, isto é, aptidão para satisfazer necessidades novas ou, no mínimo, melhoram as aptidões que ela já tinha.
[15] Cfr., por todos, na doutrina, PIRES DE LIMA/ANTUNES VARELA, in Código Civil Anotado, vol. III, 2ª edição revista e atualizada, Coimbra Editora, pág. 42 e ARMANDO TRIUNFANTE, in Comentário ao Código Civil – Direito das Coisas, 2021, Universidade Católica Editora, pág. 71; na jurisprudência, acórdão do STJ de 8.02.2011 (processo nº 12/09.9T2STC.E1.S1), acessível em www.dgsi.pt.
[16] Prolatado no processo nº 1696/08.0TBFAR.E1.S2, acessível em www.dgsi.pt.
[17] Conforme se vem entendendo (cfr., por todos, MENEZES CORDEIRO, in Tratado de Direito Civil, Parte Geral, tomo II, 2ª edição, Almedina, págs. 131 e seguintes e PAIS DE VASCONCELOS, in Teoria Geral do Direito Civil, 3ª edição, Almedina, pág. 222), partes integrantes de prédio são as coisas móveis a ele ligadas material e permanentemente (cfr. art. 204º, nº 3 do Cód. Civil), mantendo, todavia, a sua individualidade, não se fundindo na estrutura da coisa imóvel nem sendo indispensáveis à função normal dela, embora possam aumentar a sua utilidade; já as partes componentes são aquelas que fazem parte da estrutura do imóvel, designadamente por via da incorporação.
[18] Cfr., sobre a questão, SANTOS JUSTO, in Direitos Reais, 7ª edição, Quid Juris, pág. 183 e PINTO FURTADO, in Manual de Arrendamento Urbano, vol. II, 4ª edição atualizada, Almedina, págs. 1090 e seguinte, onde, na esteira da doutrina italiana, considera que as benfeitorias podem constituir modificações na essência intrínseca da coisa, denominando-se então intrínsecas, porque se unem e incorporam, sem identidade própria, na substância mesma do prédio, sendo absorvidas pela essência dele e extrínsecas, quando são separadas ou, embora unidas e incorporadas na estrutura do prédio, não chegam a fundir-se na sua essência, permanecendo com autónoma identidade.
[19] Cfr., neste sentido, acórdão desta Relação de 20.12.1998, publicado na CJ, ano XIII, tomo 5º, pág. 206.
[20] Sem prejuízo naturalmente de a requerente ser indemnizada, ao abrigo do instituto da responsabilidade civil, por eventuais danos que a remoção dos reservatórios lhe ocasione.