Acórdão do Tribunal da Relação do Porto | |||
Processo: |
| ||
Nº Convencional: | JTRP000 | ||
Relator: | JOAQUIM MOURA | ||
Descritores: | PROCESSO TUTELAR CÍVEL DILIGÊNCIAS DE PROVA INTERVENÇÃO COERCIVA DO TRIBUNAL | ||
![]() | ![]() | ||
Nº do Documento: | RP202305082182/14.5TBVFR.4.P1 | ||
Data do Acordão: | 05/08/2023 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Texto Integral: | S | ||
Privacidade: | 1 | ||
![]() | ![]() | ||
Meio Processual: | APELAÇÃO | ||
Decisão: | RECURSO IMPROCDENTE; DECISÃO CONFIRMADA. | ||
Indicações Eventuais: | 5. ª SECÇÃO | ||
Área Temática: | . | ||
![]() | ![]() | ||
Sumário: | I – Dada a natureza de processo de jurisdição voluntária do processo tutelar cível (artigo 12.º do RGPTC), o juiz só tem que admitir as provas que considere necessárias para proferir a decisão; logo, pode rejeitar diligências de prova, designadamente a inquirição de testemunhas oferecidas pelas partes e a avaliação psicológica do menor, se considerar que tais diligências não aportariam aos autos qualquer contributo útil para apreciar e decidir da questão essencial; II - Não suscita qualquer controvérsia o entendimento de que só se justifica a intervenção coerciva do tribunal nos termos previstos no artigo 41.º do RGPTC se ocorrer uma situação de incumprimento reiterado do regime de exercício das responsabilidades parentais culposamente imputável a um dos progenitores; III - Constitui entendimento corrente que numa situação de incumprimento do “regime de visitas” em que o jovem adolescente afirma, expressa e inequivocamente, que não quer ter contactos com o progenitor não guardião, o tribunal não deve impor coercivamente esse convívio não desejado (pelo menos, nos termos em que esses convívios se vêm processando). | ||
Reclamações: | |||
![]() | ![]() | ||
Decisão Texto Integral: | Processo n.º 2182/14.5 TBVFR.5.P1 Comarca de Aveiro Juízo de Família e Menores de S.ta M.ª da Feira (Juiz 1) Acordam na 5.ª Secção do Tribunal da Relação do Porto I – Relatório No âmbito do processo de regulação do exercício das responsabilidades parentais que, sob o n.º 2182/14.5 TBVFR, corre termos pelo Juízo de Família e Menores de S.M. da Feira, em que são requerente AA, advogado que litiga em causa própria e com o benefício de apoio judiciário, e requerida BB, foi, em 08.01.2018, proferida decisão, transitada em julgado, que regulou o exercícios das responsabilidades parentais relativamente ao menor, filho de ambos, CC, e, no que para aqui releva, ficou estabelecido um “regime de visitas” que, no essencial, é o seguinte: «O progenitor AA estará com o filho nos primeiros três fins de semana de cada mês, de sexta-feira do fim do horário das atividades letivas a segunda-feira, com cumprimento do horário escolar, sendo as conduções a realizar por referência à escola ou ao ATL frequentado pelo menor, sem prejuízo de as entregas e os horários das mesmas poderem, por acordo entre os progenitores, ser realizados em outros locais e/ou em outras horas. Nas festividades (véspera de Natal, dia de Natal, véspera de Ano Novo, dia de Ano Novo, Domingo de Páscoa) o CC estará alternadamente com cada um dos progenitores, começando com o progenitor com os próximos dias de Natal e de Ano Novo e o próximo Domingo de Páscoa.» Em 23.05.2022, o requerente veio, ao abrigo do disposto no artigo 41.º do Regime Geral do Processo Tutelar Cível (RGPTC) deduzir incidente de incumprimento, alegando, basicamente, o seguinte: Os fins de semana que se iniciaram em 1 e 15 de Abril (que incluía o dia de Páscoa) e em 13 e 19 de Maio de 2022, o CC devia tê-los passado consigo, mas tal não aconteceu e só em relação ao último lhe foi dada uma explicação razoável, que aceitou, para assim ter acontecido. Entende que, por isso, se verifica uma situação de incumprimento, que imputa à requerida («a supressão do direito ao convívio com o Requerente é da total e absoluta responsabilidade da Requerida que, nada fazendo, acabou por caucionar as sobreditas recusas de visitas do menor CC») e termina pedindo: «I. Que [seja reconhecido que] a Requerida incumpriu culposamente o regime de visitas/convívios do menor CC ao Requerente nos seguintes fins de semana: i. 01 a 03.04.2022; ii. 15 a 17.04.2022; iii. 13 a 15.05.2022 e iv. 20 a 21.05.2022 v. Dia de Páscoa (17.04.2022). (…) II. Que a Requerida seja condenada a entregar o menor CC ao Requerente nos rigorosos termos fixados no Douto Acórdão de 08-01-2018, sob pena dessa entrega ser feita coercivamente pelas autoridades policiais. III. Que a Requerida seja condenada em sanção pecuniária compulsória por cada incumprimento que venha a ocorrer e também em multa condigna e indemnização de valor a considerar pelo tribunal a favor do menor CC, com entrega desse valor ao Requerente que o depositará na conta bancária do menor.» * Notificada a requerida para alegar o que tivesse por conveniente (nos termos previstos no n.º 3 do citado artigo 41), veio esta dizer, em síntese, o seguinte:O requerente age com manifesto abuso de direito, pois a sua pretensão é completamente infundada e os factos que alega são falsos ou inexactos. O CC (agora com 14 anos de idade) não quer estar com o pai devido às atitudes deste para com ele e é completamente alheia a essa rejeição de convívio que o menor manifesta. Não lhe é exigível, sequer minimamente aconselhável, que faça uso da força física para obrigar o seu filho a cumprir o regime de visitas, face à sua revolta contra os comportamentos do progenitor, que incluem ameaças de recurso ao tribunal que este dirige ao menor e que lhe provocam estados de ansiedade. Concluiu pedindo a condenação do requerente, como litigante de má-fé, em multa e indemnização, por «alterar voluntária e conscientemente a verdade dos factos, as razões e o modo como os mesmos aconteceram». * Em requerimento apresentado em 13.06.2022, o requerente veio deduzir novo incidente de incumprimento, denunciando que o filho devia ter passado o dia 10 de Junho consigo, mas tal não aconteceu, pretextando o CC que era o dia de aniversário da mãe, o que foi por esta confirmado, mas reafirmando que não influencia as decisões e atitudes do filho para com o progenitor.Em 20 de Junho de 2022, foi deduzido novo incidente de incumprimento. Desta vez, com o fundamento de que no fim-de-semana iniciado a 17 de junho o menor não esteve consigo e nem sequer respondeu à sua mensagem a perguntar se vinha para o pai, não atendeu o telefone ou desliga-o quando está a ser solicitado, algo que nunca aconteceu e indicia a sua instrumentalização por parte da progenitora, o que esta refutou na resposta apresentada. Em 28 de junho e em 04, 13 e 16 de Julho foram apresentados requerimentos a deduzir outros tantos incidentes, com fundamentos idênticos aos anteriores e com resposta idêntica por parte da progenitora. Por isso, sendo idêntico o seu fundamento, foi decidida a tramitação conjunta de todos os requerimentos a deduzir incidentes de incumprimento. * Em 15 de julho de 2022 foi proferida decisão que indeferiu requerimento para que fosse atribuído carácter urgente ao processo, decisão renovada em despacho de 26 de Julho, que o requerente impugnou.* Em 06 de Setembro de 2022, realizou-se uma conferência de pais, na qual foram tomadas declarações ao menor e aos dois progenitores.Em 16.09.2022, a digna Procurado da República pronunciou-se nos seguintes termos: «Incumprimento das Responsabilidades Parentais Incidente 10 e 11: Renovo a anterior posição do Ministério Publico na medida em que inexistiu alteração da factualidade que se vem renovando, do contexto vivencial do menor e do seu posicionamento quanto a convívios estabelecidos com o progenitor. Com efeito, o menor foi ouvido em condições de total autonomia e liberdade e até na ausência dos progenitores. Mais foi colocado à vontade para manifestar a sua vontade e opinião, a qual coincide com falta de vontade em ter visitado de forma regular e estabelecida em decisão com o pai pelos motivos que assinalou e em que não assinalou a intervenção da mãe na formação dessa vontade». Seguidamente, com data de 02.10.2022, foi proferida sentença com o seguinte dispositivo: «Em face do exposto: - Decide-se absolver a requerida do pedido formulados no incumprimentos n.º4 a 11; - Decide-se absolver o requerente dos pedidos de condenação como litigante de má-fé; Custas a cargo do requerido em face do decaimento (artigo 527.º, n.º1 e 2 do Código de Processo Civil).» Inconformado com o decidido, o requerente interpôs recurso de apelação, com os fundamentos explanados na respectiva alegação, que “condensou” nas seguintes “conclusões”[1]: «77. O recorrente AA, apresentou exaustiva e pormenorizadamente as alegações supra, concluindo nos seguintes termos: 78. Intentou o recorrente em 23/5, 13/6, 20/6, 28/6, 4/7, 13/7 e 16/7, todos do ano de 2022, sete incidentes de incumprimento ao regime de visitas judicialmente fixado em sede de Regulação das Responsabilidades Parentais, no apenso D dos presentes autos, no pretérito dia 08-01- 2018, que por desnecessidade e manifesta economia de meios aqui não se transcreve mas se dá totalmente por reproduzido, numeradas como apensos de 4 a 10 79. Intentou também o recorrente em 18/07/2022 uma Providência Tutelar Cível Especial de entrega judicial de menor, que tramitaria sob a forma de incumprimento numerado como 11 ( Apenso Q), que da mesma forma que aqueles se não junta por desnecessidade e manifesta economia de meios, mas que aqui se dá por integralmente reproduzida, que mereceu prolação em forma de despacho com o qual o requerente não se conformou nem se conforma, determinando-se pelo recurso para este Venerando Tribunal. 80. A propósito dir-se-á, primeiro, que aquela providência foi distribuída sob a forma de incumprimento mas de estranha tramitação pois e desde logo é duplamente classificado, ou seja, de incumprimento 11 e de Apenso Q e, segundo, dada a sua especificidade e natureza, salvo melhor opinião, há muito deveria ter subido a este Tribunal Superior, encontrando-se incompreensivelmente retido há quase 3 meses, com todos os prazos já esgotados, não obstante os diversos requerimentos remetidos aos autos pelo recorrente a solicitar informação sobre a sua não subida e que não mereceram do tribunal a quo qualquer resposta. 81. Razão pela qual e ainda salvo melhor douta opinião, não deveria aquela providência especial integrar, como integra, a sentença ora sob recurso até que este Tribunal Superior doutamente aprecie e se pronuncie. 82. Sinteticamente em todos os referidos sete incumprimentos ao regime de visitas/convívios doutamente fixados, o recorrente imputa a responsabilidade desses incumprimentos, com os fundamentos de facto e de direito exarados nas respetivas peças incidentais, à progenitora remissa BB, mãe que detém a guarda do menor de 14 anos de idade CC, filho do recorrente, sobre quem recaiu e recai esse regime. 83. Inexplicavelmente foram doutamente avaliados todos os sete incumprimentos após a conferência de progenitores que ocorreu em 6/9/2022 deles resultando em consequência dessa conferência, a douta sentença a quo aqui recorrida, que julgou totalmente improcedente as pretensões exaradas em todos eles, com a seguinte decisão: (…) 84. A sentença a quo, não obstante ser douta, não resiste a uma análise mais crítica e merece uma cabal revogação. 85. Ao julgar os sobreditos incidentes de incumprimento improcedentes, o tribunal a quo fez, com o devido respeito, uma interpretação ilegal, inadmissível e insustentável e decidiu de modo incorreto e deficiente. VEJAMOS: 86. Porque seria absolutamente fastidioso até inoportunas por complexas e/ou prolixas, repetir-se nas conclusões, detalhadamente, os factos descritos nas alegações supra, o recorrente conclui de forma genérica e sintética aludindo a matéria de facto e de direito que entende adequada ao propósito conclusivo, assim: 87. O regime de visitas/convívios supra referido assentou, primeiro, num regime provisório em 2014, para depois, em janeiro de 2018, assumir caráter definitivo, chamemos-lhe assim, pois é consabido que em matéria tutelar de menores os regimes nunca são definitivos. 88. Importa é referir que após a separação do recorrente da progenitora remissa em outubro de 2013 com quem viveu uma relação de união de facto de mais de 23 anos, foi, primeiro, estabelecido, provisoriamente o referido regime, depois alterado por sentença de 08-01-2018 e que se mantém em vigor, regime que foi cumprido pelas partes sem problemas de maior. 89. Eis que, de repente, passados que estão mais de 9 anos do regime de visitas/convívios, o recorrente é confrontado uma superveniente realidade consubstanciada no facto de, sobretudo, a partir de junho de 2022, o seu filho menor, deixar de o visitar/conviver trisemanalmente como resulta do referido regime. 90. Efetivamente foi doutamente consignado que o menor CC visitaria/conviveria com o recorrente (e já agora com o seu irmão primogénito que consigo vive) nos três primeiros fins de semana de cada mês. 91. E que aconteceu entretanto em junho de 2022 para que o menor deixasse de visitar/conviver com o pai como sempre o havia feito? O que aconteceu é que o recorrente foi justamente absolvido num processo crime por suposta violência doméstica intentado pela progenitora remissa sem qualquer fundamento como se provou. Desconsolada com tal resultado aquela decidiu então substituir-se à justiça e delineou um plano para provocar o recorrente, retirando-lhe o filho. 92. Não há outra qualquer motivação que não aquela. 93. Confrontado com essa nova realidade o recorrente foi interpelando o menor sobretudo por mensagens, em algumas vezes por conversa telefónica, mensagens juntas aos sucessivos incidentes que foi intentando e ali referidos, que consubstanciam material probatório não admitido ou pelo menos valorado enquanto tal pelo tribunal a quo. 94. Notificada a progenitora remissa requerida para alegações, genericamente, em todos os sete incidentes de incumprimento, transferiu a responsabilidade dos mesmos para o menor, dizendo que tal se deve à vontade do menor que, agora, deixou de querer estar com o pai, imputando a este a responsabilidade factos geradores que justificam a superveniente atitude do menor. 95. Designadamente que o recorrente não leva o menor aos jogos de basquetebol o que não é verdade, propondo-se o recorrente em todas as peças incidentais apresentar prova documental e testemunhal em sentido contrário, provas incompreensivelmente não admitidas ou não valoradas pelo tribunal a quo. 96. Aconteceu apenas uma única vez que o recorrente no dia 19 de março de 2022, consagrado ao designado “ dia do pai “ não levou o CC ao jogo de basquetebol, pois nesse dia estava há muito marcado o jantar comemorativo dessa importante data para o recorrente, ocasião que considera solene pelo facto de poder juntar todos os seus 4 filhos à sua volta não sem antes, contudo, ter dito ao menor que ligasse ao treinador a dizer que nesse dia não ia poder apresentar-se para o jogo em face do motivo ali descrito e, este dia, constituiu uma única exceção pois sempre levou o menor a todos os jogos, inclusive, acompanhado do irmão, sendo que ambos vibravam com a execução desportiva daquele no jogo, como, aliás, se propôs provar sem que o tribunal a quo, uma vez mais, o permitisse, constituindo também neste particular a preterição do contraditório pela impossibilidade de fazer prova documental e testemunhal oferecida pelo recorrente. 97. Concluindo, o vertido pela progenitora no sentido de que “ a recusa do menor em conviver com o pai se deve aos mesmo não assegurar a condução do menor aos jogos “é falso, falsidade que não pode ser contraditada por exclusiva e única responsabilidade do tribunal a quo que o não permitiu. DEPOIS: 98. Acrescenta aquela que uma das razões pelas quais o menor perdeu a vontade de estar com o pai, digamos assim, deve-se ao facto do recorrente dizer mal da mãe. 99. E, pasme-se, não é que o tribunal a quo valorou e acreditou de tal forma nesse facto que o destacou na sua douta decisão, desprezando a apreciação e ponderação à luz da experiência que lhe diria que é incompreensível que, agora, passados todos estes anos, é que o pai passou a dizer mal da mãe, ou seja, interpretado o facto a contrario, durante mais de 8 anos o menor sempre visitou/conviveu com o pai porque este não dizia mal da mãe. 100. Porém esses incumprimentos trissemanais alargaram-se a partir das férias escolares da Páscoa e de verão do menor em junho de 2022, que à revelia do regime doutamente consignado e em vigor deixou de ser cumprido. 101. Registe-se que a progenitora remissa requerida, alegou que não foi cumprido o regime definido para as férias da Páscoa porque teve receio que o recorrente não levasse o menor à cerimónia da catequese, cuja prova desse receio ficou por produzir porquanto o tribunal a quo não quis e/ou não o permitiu. 102. Não nos admiramos com a ligeireza do alegado sem qualquer sentido para justificar a violação do regime, mas admiramo-nos, sim, com a aceitação sem mais pelo tribunal a quo de tão absurdo argumento que não mereceu daquele qualquer reparo. 103. É verdade que ainda que defeituosamente nas férias da Páscoa de 2022, o menor acabou por visitar/conviver com o pai alguns (poucos) dias, o que prova que, afinal, o menor tem vontade de estar com o pai, pois se desprovido dessa vontade como entende a progenitora remissa e o tribunal a quo por adesão, não o faria naquela altura. E uma vez mais tal circunstância, tal contradição, escapou a ponderação do tribunal a quo que concluiria pelo óbvio e não o fez. 104. Acrescenta a progenitora remissa requerida que, para além daqueles motivos existe um outro que de deve ao facto do menor estar a atravessar estados de ansiedade e que as pressões psicológicas exercidas pelo progenitor estão a provocar um afastamento gradual e reiterado do menor do seu pai. 105. Ora, perante essa alegação, pela sua importância acrescida devido a estar em causa a saúde do menor, impunha-se tribunal a quo exigir prova do alegado, o que não fez, bastando-se mais uma vez com uma mão cheia de nada mas suficiente para decidir como decidiu. 106. E de estupefação em estupefação constatou o recorrente que, uma vez mais sem qualquer reparo ou apreciação crítica por parte do tribunal a quo, o menor não esteve com o pai no fim de semana de 10 a 12/06/2022 como impõe o regime porque, a progenitora remissa requerida fez anos no dia 11 e portanto, segundo aquela, não fazia qualquer sentido o menor vir a 10, festejar o aniversário daquela a 11 como, aliás o recorrente propôs e no final desse dia regressar a casa do pai, ou seja, com condescendência acrítica do tribunal a quo, aquela, despudoradamente, permite-se entender sobre o que faz sentido e não faz sentido em matéria de cumprimento do regime de visitas/convívios doutamente fixado. 107. E como ali se disse, o caminho faz-se caminhando, pelo que não se deve perder de vista desde já, que a progenitora remissa requerida revela com aquela expressão de que “não faz sentido” que o verdadeiro, o autêntico leit motiv dos reiterados incumprimentos em matéria de visitas/convívios, em nada têm a ver com a vontade ou falta dela do menor em visitar/conviver com o recorrente, antes sim porque é aquela que decide em cada momento o que faz e não faz sentido ainda que à revelia de uma decisão judicial. 108. O recorrente na véspera da condução do menor sempre o interpelava via telefone, via WhatsApp ou por simples sms, visando confirmar a hora e o local onde o recolheria. Porém, constatou que a partir de certa altura aquele deixou de responder por mensagens às interpelações e a insistência do recorrente agora diretamente por telefone, as suas chamadas eram desligadas no receptor, algo que nunca tinha ocorrido. 109. Ora nesta questão, como noutras, não sabe o recorrente como não sabe, uma vez mais e com o devido respeito, por culpa própria, o tribunal a quo, se era o menor que desligava o telefone quando interpelado pelo recorrente ou se, pelo contrário, era a progenitora que o fazia. Ora a questão suscitava esclarecimentos em matéria de prova que o tribunal a quo preteriu. 110. O que o recorrente ficou agora a saber por via da douta sentença a quo é que, não obstante as evidências, o facto do menor residir assiduamente com a progenitora remissa requerida, as presunções empíricas do tribunal a quo absolutamente destituídas de saber e conhecimento científico na área da psicologia infantil que, não obstante, concluiu pela sinceridade das respostas do menor aquando das suas declarações. Terá sido essa convicção do tribunal a quo que se respeita mas, no entanto, parece-nos insuficiente para concluir como concluiu pois a única e absoluta certeza que resultou é que o menor respondeu como respondeu, mas já quanto à veracidade dos factos narrados por ele narrados, como qualquer outra prova está sujeita à contraprova, algo que o tribunal a quo não permitiu bastando-se simplesmente com uma declaração unilateral. 111. É que a provar-se que era a progenitora remissa requerida a desligar o telefone, impedindo o menor de falar com o pai recorrente, tal conduta é passível de configurar alienação parental. 112. E, concluindo nesta questão, não sabe o tribunal a quo porque não quis, se o menor é vítima de alienação parental, se prestou declarações condicionado ou não e assim sendo nunca poderia ter doutamente decidido como decidiu e ao fazê-lo nas circunstância em que o fez, sem permitir o contraditório, resultou num manifesto vício de violação de lei e de erro nos pressupostos de facto a que infra regressaremos. ENTRETANTO: 113. E porque à tomada de declarações do menor ali nos referimos esta ocorreu por ocasião da Conferência de Progenitores no pretérito dia 06/09/2022, diligência esta que, afinal, se revelou muito para além do que a lei prescreve para o efeito, pois, incompreensivelmente, pelo menos para o recorrente, à margem das regras processuais, ainda que em sede de jurisdição voluntária, revelou-se como uma estranhíssima “audiência de discussão e julgamento” onde definitivamente se decidiu sobre o mérito da causa, como, aliás, se depreende e conclui pela sentença que ora se recorre, gerando uma nulidade sobre a qual nos pronunciaremos infra. PROSSEGUINDO: 114. De toda a factualidade apurada quer pelas peças incidentais juntas, quer em sede da referida Conferência de Pais, que aqui não se transcreve por manifesta desnecessidade e economia de meios, mas que se dá por integralmente reproduzida, concluiu o tribunal a quo prolatando a decisão supra da qual ora se recorre, não sem que, pela sua aparente importância o recorrente destaque: 115. O menor chamado a prestar declarações, confirmou as suas ausências para visitas/convívios nas datas levadas aos autos pelo recorrente, balançou entre a certeza e a incerteza, entre a timidez evasiva e desinibição, avançou com as razões pela quais deixou de ter vontade de conviver com o pai, razões apenas e só, assim classificadas, na perspetiva empírica da M.ma Juiz a quo, tecnicamente impreparada para tal avaliação, permitimo-nos especular 116. Disse o menor CC que, ficando por se saber se, induzido ou não, instrumentalizado pela progenitora remissa, ou não, “ficou triste por o pai não o ter levado ao jogo do dia 19 de março (o tal dia do pai)”, “ que em casa do pai passa tempo sozinho”, “que fica triste com os comportamentos do pai na forma como trata a mãe” e “com ameaças de chamar a polícia” 117. Ou seja, independentemente de outras considerações, decidiu o tribunal a quo como decidiu projetando nessas razões a justificação suficiente para os incumprimentos pela progenitora remissa da douta decisão judicial que fixou o regime de visitas, por um lado e, por outro lado, dar àquela motivações/argumentos para incumprimentos futuros em matéria de visitas/convívios que não deixará de aproveitar, seguramente. 118. Refere o tribunal a quo na douta sentença sob recurso, que “não há necessidade de produzir mais provas porque...”, segundo a própria, “a questão controvertida e a decidir prende-se somente com a razão/motivação do não cumprimento do regime de convívios e só o menor ..” e não qualquer das testemunhas indicadas pelas partes tem a capacidade de elucidar o Tribunal sobre tal matéria . 119. Com todo o respeito que o tribunal a quo nos merece e é muito, não podemos concordar com tal opinião seguramente não respaldada nem ancorada na lei, na doutrina e na jurisprudência, como não podemos concordar quanto à desnecessidade da “avaliação psicológica ao menor com vista a apurar as razões da manifestação de vontade do menor e/ou mediação e audição técnica especializada” porquanto, segundo o tribunal a quo, só fazem sentido numa “eventual alteração do regime de convívios” e já não para a “apreciação dos presentes incidentes de incumprimento”, determinando-se o tribunal a quo pela não determinação de tais diligências, perspectiva que respeitamos mas não concordamos de todo em todo. 120. Prossegue a sentença a quo sob recurso referindo o regime do art.º 41.º, nºs 1 e 5 do RGPTC enfatizando o que aquele dispõe sobre a condenação em multa e indemnização, sobre a entrega do menor, concluindo que a verificação da culpa é requisito necessário para o efeito, explicitando que o incumprimento só releva se for culposo, se puder ser assacado ao progenitor faltoso um efetivo juízo de censura, ancorando-se no Acórdão do TRP de 3/10/2006. in www.dgsi.pt, acórdão que com a devida vénia subscrevemos na integra. DEPOIS: 121. Prossegue ainda o tribunal a quo dizendo que, “no caso dos autos resultou claro para o Tribunal que o CC está a vivenciar momento em que não tem vontade de estar com o progenitor de forma regular (....) mas sim em regime livre”. 122. E a questão que imediatamente se levanta sobre a clareza do tribunal a quo é, questionar-se de imediato de onde provém tal solene clareza, se das regras da experiência empírica se de uma qualificação técnica especializada em psicoterapia infantil possível que a M.ma Juiz terá mas desconhecida do recorrente? 123. Como se questiona o tribunal a quo sobre como se compatibiliza a sobredita clareza com as “saudades” que o menor tem do recorrente e sobre a alusão e descrição relativa a “comportamentos do progenitor que o incomodam e deixam triste “, comportamentos nunca evidenciados e concretizados pelo tribunal a quo na sentença sob recurso e portanto, com o devido respeito, despropositados. 124. Dispõe a sentença a quo ainda sobre a factualidade elencada que o CC tem 14 anos, revela já maturidade suficiente para opinar sobre o regime de convívios com o recorrente, sobre a relação que tem com o mesmo e que resultou de forma clara concluir que a não ocorrência dos convívios com o recorrente se deveu somente à vontade do menor, para a formação da qual terão contribuído os comportamentos que imputou ao pai. 125. Tudo, obviamente, na perspectiva empírica conclusiva da M.ma Juiz a quo desprovida de conhecimento avalizado em psicoterapia infantil, repete-se. 126. E prossegue o tribunal a quo, entremeando a obrigação da progenitora remissa sobre o incentivo do menor ao cumprimento do regime de visitas/convívio com a sua desresponsabilização, realçando que os 8 anos que já leva esse regime, sem incumprimentos, reforça o entendimento que os incumprimentos em avaliação se devem em exclusivo à vontade do menor e não da progenitora. 127. Curiosa é no mínimo, com o devido respeito, a conclusão do tribunal a quo, que dissertando sobe a antes referida instrumentalização do menor como referida nas peças incidentais pelo recorrente em face da sua absolvição em processo crime em que esteve pronunciado pelo crime de violência doméstica que, insiste-se, nunca ocorreu e assim ficou provado, concluiu que essa instrumentalização não ocorreu porque o menor, quando ouvido, não a confirmou e que, aliás, reforça, a progenitora remissa até o incentivava a ir para casa do recorrente, ficando-se sem saber, face à preterição da prova pelo tribunal a quo que a não permitiu ao recorrente, se efetivamente essa conclusão é adequada ou não à decisão tomada ora sob recurso. 128. Como curiosa é a afirmação do tribunal a quo que entende ser obrigação dos progenitores, usando o plural, de “elucidar o menor da importância dos convívios com o progenitor e incentivar tais convívios por forma ao estabelecimento efetivo de relacionamento entre o pai e o menor”, o que, com o devido respeito, entendemos ter usado a flexão gramatical errada, pois se atenta a todas as peças incidentais, da parte do recorrente, outra coisa não diz sobre a importância dessas visitas/convívios. 129. Por fim, em consequência da factualidade apurada determinou-se o tribunal a quo pela absolvição da progenitora remissa, dado que nos incumprimentos não atuou de forma censurável, não obstante terem ficado provados todos os incumprimentos supra referidos, que classificou de reiterados e que aquela “deixou de insistir com o filho para ir para a casa do pai”, mas que tais incumprimentos se devem única e exclusivamente à vontade do menor, isto não obstante a todo o afeto que aquele diz nutrir pelo pai, sendo que no futuro essas visitas/convívios deverão passa a ser de regime livre e não programadas como atualmente são. C - DO DIREITO: 130. Incumprindo dolosa e reiteradamente o regime de visitas/convívio fixado, a progenitora remissa requerida em sede das várias alegações no Apensos, já deixou bem claro que, doravante, não cumprirá quer o regime de visitas/convívio semanais quer agora e em coerência, o regime de visitas/convívio no período de férias do menor CC. 131. Substituindo-se pois, ao tribunal. INCONCEDENDO: 132. O direito de visitas assumindo a natureza jurídica de um direito/dever, deve ser estabelecido no interesse da criança, por forma a promover a manutenção dos laços de afectividade com o progenitor não residente e a salvaguardar as suas referências parentais, indispensáveis ao seu crescimento e desenvolvimento salutar e harmonioso (cfr. art.º 24..º, n.º 3, da Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia, art.º 36.º, n.º 6, da CRP e art.º 1906.º, nºs 5 e 6, do Código Civil). 133. Não pode, assim, o regime de visitas ser visto à luz de um pretenso direito dos pais ou dos seus interesses, mas antes numa perspectiva de satisfação do interesse real do filho – Acórdão do Tribunal da Relação do Porto, de 22.05.97, in CJ, Tomo III, p. 195. 134. O afastamento de um dos pais da vida da criança é uma situação que se configura, em si mesma, contrária aos interesses da própria criança e claramente violadora do regime legal, a convocar as normas que tutelam o exercício do respectivo direito. 135. E exemplo disso é o normativo consagrado no âmbito do art.º 41.º do Regime Geral do Processo Tutelar Cível, sob a epígrafe de “incumprimento”. 136. Visa tal norma, fundamentalmente, a tutela das decisões judiciais proferidas no âmbito dos processos de regulação das responsabilidades parentais, de molde a evitar que, quer o decidido, quer o aí acordado, se traduzisse em pura letra morta, prevendo-se a adopção de medidas coercivas para o respectivo incumprimento. 137. Aí se incluindo, também, o próprio direito de visita/convívio, enquanto direito/dever do progenitor não guardião, sancionando-se, por conseguinte, o incumprimento desse direito/dever de visitas/convívios por aquele que não cumpra a decisão judicial ou o proferido nessa matéria. 138. O regime estabelecido de visitas/convívios tem, sobretudo, em vista, permitir a indispensável conservação dos laços afectivos da criança com o pai, não é aceitável qualquer argumentação que vise desvalorizar a necessidade ou frequência regular da ocorrência de tais visitas, ou a defesa de que esse direito de visitas constitui uma mera faculdade ao dispor do progenitor não guardião da criança, que tanto pode como não cumpri-lo. 139. É que, para além da presença maternal, torna-se cada vez mais imprescindível a presença do pai na vida de um menor, à medida que este vai crescendo em idade, porquanto essa convivência regular com o pai e a sua natural intensificação não deixarão de facilitar aos menores uma adaptação tranquila às novas condições de vida familiares e sociais e de simultaneamente permitir o estabelecimento e manutenção dos laços afectivos com os menores, que importa, de todo, salvaguardar. 140. Sob pena de, em caso de incumprimento, haver lugar à aplicação das sanções previstas expressis et apertis verbis no art.º 41.º do RGPTC. 141. Sendo que a sua aplicação há-de pressupor uma crise, um incumprimento grave e reiterado por parte do progenitor remisso e não uma mera situação ocasional ou pontual de incumprimento, surgida por motivos imponderáveis alheios à vontade do próprio progenitor incumpridor. 142. Ora, regressado ao caso concreto, dir-se-á, por um lado, que, os argumentos da recusa nas visitas/convívios do menor CC, AINDA NÃO PROVADOS, LONGE DISSO, não é aceitável, como ali se disse, qualquer argumentação que vise desvalorizar a necessidade ou frequência regular da ocorrência de tais visitas/convívios com o recorrente, como não podem ser acolhidas explicações que pretendam justificar o injustificável, i.é., o incumprimento da progenitora remissa requerida, ao regime de visitas/convívios doutamente fixado. 143. Até porque, as sobreditas explicações/argumentos de recusa pelo menor CC, a serem verdadeiras e não são, NUNCA poderiam servir de justificação para a progenitora remissa requerida, de forma unilateral, impedir as visitas/convívio ao recorrente, tanto mais que uma medida desse tipo só poderá ser tomada pela autoridade judiciária. 144. Com efeito, os vínculos afetivos são do maior relevo para o equilibrado desenvolvimento do menor CC e a figura do pai, nesse desenvolvimento, é tão importante como a figura materna, a menos que existam factos objetivos que indiciem que o convívio com o pai é desfavorável para o interesse daquele, o que, neste caso, não se verifica, nem pouco mais ou menos. 145. E, apreciando o caso concreto, que factos objectivos indiciadores foram trazidos aos autos, de que o convívio do menor com o pai é desfavorável para os seus interesses? Serão os factos descritos no ponto 116. deste articulado recursivo que de novo reproduzimos? “ficou triste por o pai não o ter levado ao jogo do dia 19 de março (o tal dia do pai)”, “que em casa do pai passa tempo sozinho” “que fica triste com os comportamentos do pai na forma como trata a mãe” e “com ameaças de chamar a polícia”. 146. Bom! A serem verdadeiros esses factos e não o são como o recorrente quis provar e que o tribunal a quo não permitiu, é razoável que, do ponto de vista da ciência jurídica nesta matéria de incumprimentos aos regime de visitas/convívios, este tribunal a quo ou qualquer outro, face àqueles argumentos, decida como aquele decidiu? Sinceramente e com toda a humildade não nos parece. PROSSEGUINDO: 147. Diz e dirá a Requerida que não impede o menor CC de fazer as visitas/convívios ao Requerente, antes sim, que é o menor que as não deseja. 148. Só que ainda que assim fosse e não é seguramente, tal argumento esbarra num outro argumento legal e jurisprudencial que com a devida vénia se transcreve: “No Ac. do TRL de 8.02.2007, proferido no processo 10331/2006, disponível em www.dgsi.pt. defende-se que ( .... ) quem tem a criança na sua disponibilidade tem a obrigação de desencadear os mecanismos necessários para que a mesma se desloque para junto do pai, (.... ), tendo em vista o regime de visitas vigente. A não concretização desse desiderato revela a existência de atitude culposa da sua parte, a menos que lograsse demonstrar existirem razões para o não fazer (vd. art.º 799.º, n.ºs 1 e 2 do CC )”. 149. E de imediato se questiona? Demonstrou a progenitora remissa ao tribunal a quo uma só razão minimamente compreensível que justificasse a cessação do regime de visitas/convívios do menor com o recorrente ? A resposta não pode deixar se ser NÃO ! Dizer que é o menor que não quer é o mesmo que dizer coisa nenhuma. Porém foi esta mão cheia de nada com que o tribunal a quo se bastou para decidir como decidiu. 150. No mais e por desnecessidade e manifesta economia de meios, aqui se dá por reproduzida toda a matéria de Direito suscitada nos sete incidentes por incumprimento do regime de visitas/convívios em tramitação. 151. Impondo-se ainda assim reconduzir pragmaticamente à questão incidental de incumprimento disciplinada pelos Doutos Acórdãos que, com a devida vénia de novo se transcrevem: 152. O Douto Ac. TRP, de 19-06-2012, no proc. 1516/06.0TMPRT.2.P1 in www.dgsi.pt,, que com a devida vénia se sumaria: I –(....). II - Não pode porém o progenitor que tem a guarda facilmente se refugiar em impressões momentâneas da criança, ou, ao menos, não estruturadas, para nada fazer e, até na prática, vir a impedir o convívio com o progenitor não guardião, III - Como na vida e em todo o ordenamento jurídico, também no direito das crianças não existem absolutos, realidades rígidas ou intocáveis, cumprindo ao tribunal, ou aos colaboradores do tribunal, na auscultação da vontade da criança, distinguir o verdadeiro do falso, a opinião do facto, quer naquilo que a criança se conta a si própria, quer por via daquilo que os outros lhe dizem. IV - A negação ou supressão do direito ao convívio com o progenitor sem a guarda dos filhos apenas poderá justificar-se – e como última ratio - no quadro de um conflito extremo entre o interesse da criança e o direito referido. 153. Das duas uma, ou atende-se e valoriza-se a jurisprudência ou não! E como entendemos que sim sem qualquer sombra de dúvida e sem hesitar, não percebemos a douta decisão ora recorrida, alavancada especialmente nas declarações do menor, acolhidas pelo douto tribunal a quo que as entendeu consubstanciar como a ali referida “ ultima ratio num quadro de conflito extremo entre o interesse da criança e o direito referido”, que justificam a negação ou supressão do direito ao convívio daquele com o recorrente e que, de novo, aqui reproduzimos: (…)[2] 154. Bem sabemos que o tribunal a quo somente foi chamado a decidir exclusivamente sobre a responsabilidade culposa ou falta dela, pela progenitora remissa requerida e aparentemente foi o que fez. E diz-se aparentemente porque por via da absolvição, implicitamente, o tribunal a quo foi muito para além disso, convulando para a supressão do regime de visitas/convívios tal como esta doutamente consignado. 155. Sem mais comentários salvo que, incumbe, pois, à progenitora remissa requerida a obrigatoriedade de desencadear os mecanismos necessários para que aquele se deslocasse para junto do recorrente, tendo em conta o regime de visitas fixado na sobredita sentença e assim acautelar como se lhe impunha o superior interesse do menor CC, traduzido este em manter os contactos com o recorrente, repete-se. - Cfr. Ac. TRG de 06-01-2011, no proc. 2255/08.3TBGMR-G.G1, in www.dgsi.pt. DE TAL E TANTO: 156. Na verdade pelo que ali já disse, progenitora remissa requerida agiu em todos os sete incumprimentos de forma, reiterada, deliberada e culposa, sendo que o fez, em violação do regime instituído, devendo ser sancionada nos termos de n.º 1 do art.º 41.º do RGPTC: “ (...) condenação do remisso em multa até vinte unidades de conta e, verificando-se os respetivos pressupostos, em indemnização a favor da criança, do progenitor recorrente ou de ambos”, sem prejuízo da imputação da prática do crime previsto na al. c) do art.º 249.º do Código Penal, segundo o qual quem “ De um modo repetido e injustificado, não cumprir o regime estabelecido para a convivência do menor na regulação do exercício das responsabilidades parentais, ao recusar, atrasar ou dificultar significativamente a sua entrega ou acolhimento é punido com pena de prisão até dois anos ou com pena de multa até 240 dias.” 157. Além de que, “(....) o incumprimento repetido da regulação do poder paternal terá, se for necessário, que conduzir à alteração da guarda do menor; o menor não é propriedade privada da sua mãe e ela, se assim o entende, representa um enorme perigo para o desenvolvimento harmonioso da criança, que o Tribunal não pode continuar a ignorar; a mãe, só porque é mãe, não é necessariamente uma boa mãe”. (vide Ac.TRP de 18/5/06, in www.dgsi.pt, proc. 0632170, relatado pela Veneranda Desembargadora Ana Paula Lobo ) SEMPRE INCONCEDENDO: 158. Nos processos de jurisdição voluntária, nas providências a tomar, o tribunal não está sujeito a critérios de legalidade estrita, devendo antes adotar em cada caso a solução que julgue mais conveniente e oportuna – art.º 987.º do Código de Processo Civil. 159. O mecanismo processual, por excelência, verificado o incumprimento dos direitos ao convívio é o instituído no artigo 41.º do RGPTC, cuja legitimidade ativa está por força da lei atribuída ao Ministério Público, em representação dos interesses da criança, ao progenitor e ou a terceira pessoa a quem a criança haja sido confiada, no âmbito do qual poderão ser adoptadas providências coercivas, diretas ou indiretas, ao cumprimento do regime de convívios, cuja natureza e extensão dependerá, sempre, das circunstâncias do caso concreto. 160. A execução coerciva direta incide sobre a obrigação do progenitor residente de consentir que o outro visite a criança, de transportá-la ou de torná-la disponível, nos termos regulados no acordo ou na sentença das responsabilidades parentais. 161. A possibilidade de recurso à força pública (execução manu militari), por meio da intervenção policial, deve ser executada com prudência e como medida última ratio e no âmbito de uma atuação coordenada entre os diversos operadores judiciários, dado o seu carácter invasivo, o qual pode comprometer seriamente a capacidade emocional da criança e determinar o rompimento definitivo dos laços afectivos entre esta e o beneficiário da visita. 162. Regressado ao caso concreto, o recorrente, em todos os sete incumprimentos, decidiu e bem, não fazer intervir a força pública perante os sucessivos e reiterados incumprimentos, obtendo prova testemunhal dos mesmos, de forma a proteger o menor CC de estigmas não desejáveis para o próprio. 163. Bem sabe o recorrente como melhor proteger os filhos evitando-lhes quaisquer tipos de conflitos de natureza judicial e/ou policial, ao contrário da progenitora remissa requerida, que após ter agredido com gás pimenta, o irmão do menor e filho mais velho DD de apenas com 18 anos de idade, com gás pimenta, desejou a sua condenação, conseguida, nos autos de um processo crime, pois tendo o tribunal dado lhe a oportunidade de desistir da queixa de invasão do domicilio onde aquele só foi para ir buscar algumas peças de roupa (onde aquele nasceu e foi criado ), não só não desistiu como desejou a sua condenação, que conseguiu – UM HORROR. Uma atitude absolutamente execrável, desprezível, reprovável e impensável de uma “mãe” que ninguém compreende e aceita mas que este tribunal a quo parece condescender e tolerar todas as encenações despropositadas sem atender ao seu caráter insidioso, traiçoeiro, sorrateiro, enganador e falso. 164. Por outro lado, sabe muito bem o recorrente o que a progenitora remissa requerida pretende com os sucessivos incumprimentos de visitas/convívios é que o recorrente, indignado, se aproxime dela ou do local onde vive para ir buscar o menor e esta INVENTAR mais um crime de violência doméstica como aquele que INVENTOU e que ditou a absoluta absolvição do recorrente – as coisas não são como começam mas sim como acabam. 165. Bem gostaria a progenitora remissa requerida de que quando o recorrente fosse ao pavilhão, às sextas feiras, onde o menor treina, como habitualmente o faz, para aí buscar e transportar o CC para sua casa, aí provocar o recorrente, para depois ir a correr ao “amigo” que tem na PSP e que tramita os processos de violência doméstica e INVENTAR factos nunca ocorridos e, quiçá, provocar uma outra detenção fora do flagrante delito com posterior medida de coação de afastamento e proibição de contactos com vigilância à distância através de meios electrónicos, como o ocorrido no processo agora findo e que ditou, como ali se disse, a total e absoluta absolvição do recorrente. 166. E é com esta absolvição que a progenitora remissa requerida não se conforma e que por via dela entendeu agora “provocar” o recorrente através do afastamento do filho, esperando eventuais reações agressivas deste que nunca aconteceram nem nunca acontecerão. PROSSEGUINDO: 167. Quanto às medidas de execução indiretas são aquelas que, através da sua função dissuasora, visam obstar ao incumprimento, mormente medidas reparadoras de danos (ex. indemnização a favor da criança, do progenitor ou de ambos, nos termos do instituto da responsabilidade civil por factos ilícitos ( cfr. artºs 483.º e 562.º do CC ), medidas de tutela punitiva ( ex: multa até vinte unidades de conta) e medidas pecuniárias compulsórias ( ex: prestação de caução por parte do progenitor guardião, a reter pelo tribunal quando aquele subtraísse a criança ao contacto com o outro progenitor ( cfr. art.º 624.º do CC ), prestação de garantias reais ( cfr. artºs 669.º, 686.º do CC ), a introdução de uma cláusula penal no acordo ( cfr. art.º 810.º do CC) e a sanção pecuniária compulsória ( cfr. art.º 829.º-A do CC ). 168. A doutrina defende ainda a possibilidade de condenação do incumpridor como litigante de má-fé, nos casos em que este invoque falsos pretextos para impedir os convívios, sanção esta que se destinará não a punir a substância do incumprimento, mas sim o comportamento processual do incumpridor ( cfr. art.º 542.º e seguintes do CPC aplicável ex vi art.º 33.º, n.º 1, do RGPTC ). TAMBÉM: 169. Referindo, por fim, que, nos termos do art.º 249.º, n.º 1, al. c) do Código Penal, constitui crime a violação do regime fixado para o convívio da criança com o progenitor não residente, cujo procedimento está dependente do exercício do direito de queixa pelo ofendido, in casu por qualquer um dos progenitores ( cfr. art.º 49.º do Código Processo Penal, doravante CPP). - DOS DANOS NÃO PATRIMONIAIS: 170. Os incómodos e frustração do Requerente com a privação de convívio com o filho CC, constitui um dano não patrimonial que merece a tutela do direito ( cfr. art.º 496.º, n,º 1 do C.C. ). - DA SANÇÃO PECUNIÁRIA COMPULSÓRIA: 171. Considera a doutrina que este instituto da área obrigacional é suscetível de ser aplicado no domínio tutelar cível, tal como foi entendido por Helena Gomes de Melo et alii (in “Poder Paternal e Responsabilidades Parentais”, 2ª ed., págs. 124/125). Escreveu-se nesta obra que: “…as obrigações dos progenitores na execução do regime de visitas são precisamente um conjunto de obrigações infungíveis e de facto, tipo obrigacional para que foi estatuída a figura jurídica em causa; A execução do regime de visitas pelos progenitores inclui obrigações de facto positivo e negativo. Trata-se, pois, de situação jurídica para a qual a sanção pecuniária compulsória, ainda que não diretamente prevista, assenta muito adequadamente. E se se entender que não é diretamente aplicável poderá sê-lo por analogia ou por via de recurso à faculdade de decisão decorrente da natureza de jurisdição voluntária.” 172. Ora a execução do regime de visitas pelos progenitores inclui obrigações de facto positivo. 173. Dispõe o art.º 829.º-A, n. 1, do C.C. o seguinte: “Nas obrigações de prestação de facto infungível, positivo ou negativo, salvo nas que exigem especiais qualidades científicas ou artísticas do obrigado, o tribunal deve, a requerimento do credor, condenar o devedor ao pagamento de uma quantia pecuniária por cada dia de atraso no cumprimento ou por cada infração, conforme for mais conveniente às circunstâncias do caso.”. E o n.º 2, dispõe: “A sanção pecuniária compulsória será fixada segundo critérios de razoabilidade. - DA PRESTAÇÃO DE CAUÇÃO: 174. Nos termos do disposto pelo art.º 624.º do C. Civil, pode o tribunal impor ao progenitor/guardião do ou dos menores, uma caução que será retida pelo tribunal quando aquele subtrair esse menor ou esses menores ao contacto com o outro progenitor. - DA PRESTAÇÃO DE GARANTIAS REAIS: 175. Nos termos do disposto pelos art.ºs 624.º e 686.º do C. Civil, pode o tribunal impor ao progenitor/guardião do ou dos menores, a prestação de garantias reais quando aquele subtrair esse menor ou esses menores ao contacto com o outro progenitor. - DA CLAUSULA PENAL: 176. Pode o tribunal, nos termos do disposto no art.º 810.º do C. Civil, introduzir uma cláusula penal no acordo ou na sentença. CONCLUINDO: 177. Perante as atitudes e comportamento reiterado de incumprimentos e desrespeito pelo doutamente decidido, com manifesto prejuízo para os superiores interesses do menor, não pode o tribunal pactuar com tais desmandos pelo que, ao invés da absolvição, o tribunal a quo teria de condenar nos diversos pedidos ínsitos às sete petições incidentais bem como impor à progenitora remissa medidas de execução direta, prevista na al. e) do art.º 3.º, consubstanciada na notificação, daquela para entrega voluntária e imediata do menor CC ao recorrente, sob pena dessa entrega, em caso de recusa por aquela, ser coerciva por via do recurso à Polícia de Segurança Pública ou Guarda Nacional Republicana de Santa Maria da Feira, com jurisdição na área das residências da progenitora remissa e do menor CC, seguindo-se os ulteriores trâmites legais. 178. Apreciando a conduta da progenitora remissa face aos reiterados incumprimentos do aludido regime de visitas/convívios, tal conduta vai já muito para além de mero incumprimento; na verdade os sucessivos incumprimentos desse regime revelam já, sem dúvida alguma, UM ABSOLUTO DESPREZO, pelo doutamente decidido em sede da Regulação das Responsabilidades Parentais e ABSOLUTO DESPREZO PELA LEI E PELO DIREITO traduzidos e incorporados no superior interesse do menor CC, a que o tribunal a quo teve oportunidade e não quis, pôr termo. 179. Pois, segundo aquele dispositivo do n.º 1 do art.º 41.º do RGPTC, para além da sobredita condenação, perante uma prática dolosa e reiterada, pode o tribunal (...) determinar as diligências necessárias para o cumprimento coercivo “do regime de visitas/convívio fixado na referida sentença de 08-01-2018 e que importa fazer cumprir coercivamente através da autoridade policial, caso a progenitora remissa no uso dos seus poderes de autoridade que detêm sobre aquele, não fazer tudo o que lhe compete fazer para que essas visitas/convívio se concretizem. 180. Ou seja, num juízo de prognose e antecipando esses incumprimentos futuros, deveria ter sido judicialmente determinado pelo tribunal a quo e não o foi, com caráter de URGÊNCIA e a título cautelar, nos termos da al. e) do art.º 3.º do RGPTC a entrega judicial coerciva do menor CC ao recorrente através do acionamento automático das forças de segurança com jurisdição no local onde o menor CC se encontrar para coercivamente se cumprir o doutamente decretado na referida sentença de 08-01-2018, caso aquela não o faça voluntariamente. 181. E fazendo-o, o tribunal a quo teria aproveitado a oportunidade e desprezou-a, para transmitir aquela e a outros potenciais incumpridores que as decisões dos tribunais são para ser cumpridas, contribuindo, pois, para uma ainda maior credibilização da justiça. POIS: 182. Não sendo cumprido o doutamente decidido na sobredita sentença, pode (...) o progenitor afectado requerer ao tribunal as diligências necessárias ao cumprimento coercivo nos termos do n.º 1 do art.º 41.º do RGPTC “. 183. Isto é, no caso de violação do direito de visita os meios disponíveis são os seguintes: a. execução coerciva com entrega do menor CC; b. condenação da remissa em multa até vinte unidades de conta e, verificando-se os respetivos pressupostos, em indemnização a favor da criança, do progenitor requerente ou de ambos; c. convocação dos progenitores para conferência de pais (via concordial mas que poderá, na falta de acordo, redundar em condenação. 184. Isto no seguimento da circular do Conselho Superior da Magistratura com a qual deu conhecimento a todos os magistrados judiciais, “ (...) face às queixas contra o Estado Português no Tribunal Europeu dos Direitos do Homem, atinentes aos incidentes de incumprimento das responsabilidades parentais (nomeadamente na efetivação do direito ao convívio com o filho menor, vulgarmente intitulado de “direito de visita”, que assiste ao progenitor não exercente das mesmas, ser oportuno alertar para a existência de um arsenal de mecanismos preventivos e dissuasores da eclosão de tais incumprimentos, designadamente medidas de execução direta e indireta. 185. Ora, conhecendo o tribunal a quo que desde abril de 2022 (momento da propositura do primeiro incidente de incumprimento (apenso 4) da sucessiva acumulação de incidentes reiterados de incumprimento, pela progenitora remissa ao regime de visitas/convívio do menor com o recorrente, NUM MANIFESTO DESPREZO pelos superiores interesses do CC, da Lei, do Direito e da ordem jurídica, entendeu aquele tribunal com uma decisão surpreendente absolvê-la, quando e ao invés de lhe serem aplicadas as medidas direta e indiretas “(...) dissuasoras da eclosão de tais incumprimentos, a que alude aquela circular do CSM e com a devida vénia ali transcrevemos. 186. É que, apreciando e decidindo como decidiu o tribunal a quo, bastando-se, simplesmente com a, perdoe-se-nos a expressão popular, “conversa fiada” da progenitora remissa requerida a que aquele douto tribunal não permitiu contraditar e com as declarações do menor que o douto tribunal a quo acreditou serem autênticas e insusceptíveis de serem contraditadas, diremos com sentido de humor, que foi neste juízo de família e menores de Santa Maria da Feira, encontrada a panaceia tão perseguida e arduamente trabalhada quer pelo legislador quer pelas instâncias judiciais nacionais e internacionais em matéria de incumprimentos aos regimes de regulação das responsabilidades parentais. 187. Para este douto tribunal a quo, como se depreende da sentença ora recorrida, basta que o progenitor remisso alegue e transfira a responsabilidade do incumprimento para o ou a menor e que este ou esta, venha dizer que a mãe ou o pai em nada o ou a influenciaram no incumprimento, como foi no caso concreto, para que se despreze todo o todo o árduo trabalho legislativo, doutrinário e jurisprudencial, nacional e supra nacional, em matéria de incumprimentos, com o que não podemos concordar, obviamente. 188. Diríamos em jeito de roda pé que este douto tribunal trocou o incerto pelo certo. Bastaria tão só, para desmontar a estratégia de desresponsabilização pelos incumprimentos da progenitora remissa requerida, questioná-la sobre a razão pela qual, conhecendo a aquela que diz ser a posição do menor no sentido de já não querer estar com o pai, porque a não comunicou previamente ao tribunal que determinou aquele regime de visitas/convívios ? Ou se se preferir, porque não veio aquela aos autos propor uma alteração desse regime ? 189. Ora não o fazendo enjeitou o tribunal a quo uma soberana oportunidade de dignificar as decisões dos tribunais e, sobretudo, de zelar pelo superior interesse deste menor, como lhe compete e se exige. ASSIM: 190. A decisão que aqui se coloca em crise, padece neste âmbito de erros de julgamento, nulidades inultrapassáveis, violações de dispositivos legais, de princípios constitucionais e normas de direito infra e supra nacionais. 191. A não delimitação dos factos assentes e dos controvertidos e a não realização de uma audiência pública de julgamento para discussão da matéria de facto, declinando-se a inquirição das testemunhas arroladas pelas partes, neste caso, pelo recorrente nas sete peças incidentais a que acresce a referida providência tutelar especial para prova da sua versão dos factos, constitui um julgamento totalmente desrespeitador dos princípios da tutela jurisdicional efetiva, do contraditório, da legalidade e da igualdade de partes e dos artigos 8.º, 13.º, 16.º, 18.º, 20.º, 26.º, n.ºs 1 e 2, 36.º n.º 3, 5 e 6, 68.º, 202.º 206.º, toda da CRP. 192. A posição do tribunal a quo de decidir as causas por sentença sem que tivesse sido ordenada a produção de prova e/ou ordenada a realização da audiência pública para discussão da matéria de facto e/ou o recorrente na qualidade de advogado tenha requerido a dispensa de alegações finais, radica numa evidente denegação de justiça. 193. O tribunal a quo, preterindo atos que a lei prevê, bastou-se em dar, sem mais, como provados os factos decorridos da tomada das declarações do menor CC e dos factos alegados em todos os incidentes de incumprimento para progenitora remissa, ignorando em absoluto os factos carreados pelo recorrente nas sete peças incidentais e providência especial, sugando ao recorrente, nesse passo, sem qualquer justificação, a oportunidade de conseguir fazer prova dos factos que aduziu. 194. O recorrente, que foi conhecendo ao longo dos sete reiterados incumprimentos, os repetidos argumentos nas alegações articuladas pela progenitora remissa requerida, colocou em crise a veracidade dos factos alegados por aquela ao longo desses incumprimentos, ou seja, colocou em causa os factos aduzidos por aquela, contrapondo prova em contrário, documental, testemunhal quer por declarações e depoimento de parte, sem que essas provas fossem admitidas pelo tribunal a quo, consubstanciando, pois, um manifesto vício de violação de lei e de erro nos pressupostos de facto. 195. Factualidade que permite abalar os pressupostos em que a progenitora remissa requerida se refugiou para se furtar ao cumprimento do regime de visitas/convívios doutamente fixado pelo tribunal, invocando factos inexatos, refugiando-se na soberana vontade do menor e transferindo para este a total e absoluta responsabilidade pelos reiterados incumprimentos e que por esse motivo se justificava que sobre eles tivessem recaído meios de prova, designadamente, como ali se disse, a documental, testemunhal e por declarações e depoimento de parte como oportunamente foi requerido pelo recorrente e desatendido em toda a linha pelo tribunal a quo. 196. É que as testemunhas arroladas pelo recorrente não são quaisquer testemunhas: são precisamente os irmãos do menor com quem este priva com assiduidade e que são conhecedores privilegiados da fantástica relação que une o menor ao recorrente e vice versa, idóneas a abalar os falsos pressupostos factuais levados aos autos por via das alegações da progenitora remissa, absolutamente essenciais para uma diferente decisão daquela que ora se recorre. 197. Concluindo-se, pois neste importantíssimo detalhe processual que, tendo sido requerida e alegada matéria de facto controvertida, resulta pois, sem discussão, a necessidade da produção de prova, designadamente a testemunhal, que nos casos concretos, se mostra absolutamente imprescindível, necessária e pertinente para uma boa decisão da causa face à materialidade fática que fundamenta as peças incidentais. 198. E face a essa ilegal preterição e pela mesma ordem de motivação, praticou o tribunal a quo uma nulidade processual por omissão de ato e/ou formalidade que a lei prescreve, em violação do disposto no artigo 195.º , n.º 1 do Código de Processo Civil, que devendo ser declarada, impõe a sua declaração e consequente revogação da decisão proferida neste trecho decisório, ordenando-se a baixa do mesmo para que retome os respectivos e devidos trâmites – a audiência de discussão e julgamento. 199. Mais não fora e é, o recorrente na qualidade de advogado ainda que em causa própria, não renunciou às alegações e, claro, também neste particular, cometeu o tribunal a quo um erro de julgamento e gerou uma nulidade processual por igual omissão de ato que a lei prescreve, em violação do mesmo artigo 195.º do CPC. 200. Sem conceder quanto a nada, o recorrente não pode aceitar a ideia vertida de modo genérico na sentença a quo sob recurso, da desnecessidade da produção de mais prova, nem se pode satisfazer com a deficiente apreciação feita pelo tribunal a quo do por si recorrente despendido ao longo dos articulados nas peças incidentais, por um lado e, por outro lado, com a praticamente inexistente fundamentação, que se reconduz a uma adesão acrítica aos argumentos quer do menor quer da progenitora remissa, aquele nas declarações que prestou e esta nos articulados de alegações, avançada na sentença que se recorre, para tentar suster o entendimento que preconiza. 201. Pois, com o devido respeito que muito é, o tribunal a quo nem se deu ao trabalho de analisar os argumentos de facto e de direito, feitos pelo recorrente em todas as petições incidentais, a este propósito. 202. Perpassando de forma assustadora o entendimento de que as decisões tomadas no âmbito de incidentes de incumprimentos seja eles quais forem, desde que seja assegurado um alegado contraditório são definitivas e insusceptíveis de serem colocadas em crise, nomeadamente por via judicial em ampla violação do disposto no n.º 4 do artigo 268.º da CRP. 203. O tribunal a quo não pode partir e bastar-se com a premissa errada de que os pressupostos fatuais vertidos quer pelo menor na declarações que prestou quer dos vertidos pela progenitora remissa requerida na sua alegações são sempre verdadeiros e que, portanto, fixam os factos materiais e consequente valoração da prova, que não são susceptíveis de ser controvertidos pelo recorrente, amputando-o de uma liberdade probatória e de um critério de justiça tal como configurado na lei. D – NULIDADE DA SENTENÇA VIOLAÇÃO PRIMÁRIA DE DIREITO ADJECTIVO POR ERRO DE ESTATUIÇÃO Argui-se a nulidade secundária da douta decisão ora recorrida, nos termos do n.º 1 do art.º 195.º do CPC. Destarte: Por vício de decisão por erros notórios de apreciação das provas produzidas. Por vicio de decisão por manifesta insuficiência das provas carreadas para os autos, designadamente a omissão na inquirição de testemunhas arroladas. Por manifesta falta de fundamentação ou insuficiência desta; A douta decisão recorrida é ainda nula por errada aplicação do direito, quanto ao facto do tribunal a quo, não valorizar os superiores interesses do menor CC consubstanciando erro nos pressupostos de facto e de direito da decisão. Pelo que, quanto ao que a esta parte respeita, deverá a douta decisão ora recorrida do tribunal a quo ser anulada e/ou reformada pelo Venerando Tribunal Superior ad quem, consignando ser de condenar a progenitora remissa nos termos da lei e subsidiariamente determinar a imediata medida de execução direta consubstanciada na entrega judicial, sem mais, do menor CC ao recorrente para cumprimento do regime de Regulação das Responsabilidades Parentais em vigor, nos seus precisos termos. De tal sorte, por esse Venerando Tribunal ad quem, que dispõe da matéria de facto e de direito consignada na fundamentação da decisão recorrida, examinando serena e criteriosamente a prova dos autos. NORMAS JURÍDICAS VIOLADAS: Art.ºs 154.º e 607.º do CPC, este último por força das remissões que resultam da conjugação do disposto nos arts.º 295.º e 986.º, nº 1, do mesmo diploma legal. Art.º 3.º n.º 3 e art.º 6.º e 547.º do CPC Art.ºs 195.º, n.º 1 e 507.º do CPC. Regulamento (CE) n.º 2201/2003, de 27-11-2003 (RB II a / II bis) e 4/2009, de 18/12, ambos do Conselho Art.ºs n.ºs 9, n.ºs 1 e 3, 11 e 18, da Convenção sobre os Direitos da Criança.» Apenas o Ministério Público contra-alegou, formulando as seguintes conclusões: «1.O Ministério Publico concorda com a decisão proferida que valorou as declarações do menor e alegação da requerida /progenitora pelo que não pode aderir à motivação de recurso que revela que o progenitor/advogado em causa própria não se conforma nunca com essa valoração. 2. O recorrente recusa aceitar como verdadeiras e fidedignas a forma como o menor perceciona as suas atitudes perante a forma como reage à ausência de convívios do filho nos fins de semana regulados e à sua postura de agressividade e desprezo perante a progenitora e expressões denegridoras que profere; 3. Em consequência, recusa entender e aceitar que essas reações e sentimentos do menor, associados a litigio - que o progenitor persiste em manter aceso - conduzam ao distanciamento do menor e à expressada falta de vontade de cumprir com todos (mas não na totalidade) os convívios em toda a sua extensão (conforme RERP); 4. Em consequência, também não aceita que a requerida fosse absolvida sem determinação de sanções e meios de execução dos convívios com o progenitor pois pugna que é esta, com o seu caracter desvalioso, que procede a instrumentalização do menor e desrespeita pela lei, direito e decisões; acresce que questiona a capacidade da M.ma Juiz para valorar as declarações do filho. 5. Os argumentos do recorrente não possuem, no entendimento do Ministério Publico, a capacidade de ofuscar o valor do que acima se referiu quanto ao menor (e a que a sentença motivadamente tomou em consideração) e que o recorrente não aceita, não revelando qualquer sinal de alteração de estratégia pessoal para reverter a situação dos incumprimentos objetivos que se verificaram. 6.O funcionamento do mecanismo do art. 41º, nº 1, do RGPTC só se aplica a situações continuadas, reiteradas e graves de incumprimento, sendo certo que só releva o incumprimento que for culposo, isto é, se puder ser assacado ao progenitor faltoso um efectivo juízo de censura. (cfr., neste sentido, os Acs. da RP de 30/01/2006, Relator: Exmº Desembargador Sousa Lameira, de 03/10/2006, Relator: Exmº Desembargador Henrique Araújo, e de 06/11/2012, Relator : Exmº Desembargador Rui Moreira, todos in www.dgsi.pt ). 7- O funcionamento do art. 41º, nº 1, do RGPTC pressupõe o não cumprimento culposo, censurável, por parte do faltoso. Daí que, para haver incumprimento relevante do regime do exercício das responsabilidades parentais, no que diz respeito, por exemplo, ao regime de convívios entre o menor e um dos progenitores, é necessário que o outro progenitor tenha criado intencionalmente uma situação reiterada e grave, culposa, que permita assacar-lhe um efectivo juízo de censura (cfr., neste sentido, o Ac. da RP de 10/01/2012, Relatora: Exmª Desembargadora Maria Cecília Agante, in www.dgsi.pt ). 8- Nenhum elemento recolhido no incidente, ou mesmo os meios de prova que o requerido pretendia, seriam suspetíveis para formar o pretendido juízo de culpabilidade da requerida face à consistência e motivação adiantada pelo menor, conjugada com alegações da progenitora, contexto conflitual e litigiosidade comportamental e processual do progenitor e o constrangimento visível no menor mesmo na presença do pai. 9. Não foi violada qualquer norma legal invocada pelo recorrente 10. Não foi violada qualquer norma legal» O recurso foi admitido (com subida imediata, nos próprios autos do apenso e com efeito devolutivo). Colhidos os vistos, cumpre apreciar e decidir. Objecto do recurso São as conclusões que o recorrente extrai da sua alegação, onde sintetiza os fundamentos do pedido, que recortam o thema decidendum (cfr. artigos 635.º, n.º 4, e 639.º, n.º 1, do Código de Processo Civil) e, portanto, definem o âmbito objectivo do recurso, assim se fixando os limites do horizonte cognitivo do tribunal de recurso. Isto, naturalmente, sem prejuízo da apreciação de outras questões de conhecimento oficioso (uma vez cumprido o disposto no artigo 3.º, n.º 3 do mesmo compêndio normativo). Apesar da enorme extensão das “conclusões” da motivação do recurso (que ultrapassam largamente, em número, as alegações propriamente ditas), que na sua grande maioria não têm qualquer interesse para a decisão, a questão essencial a decidir é fácil de identificar e consiste, muito simplesmente, em saber se o incumprimento do “regime de visitas” entre o menor CC e o progenitor estabelecido por decisão judicial é imputável à progenitora requerida. Mais exactamente, é ponto assente que ocorreram situações objectivas de incumprimento desse regime, visto que, por várias vezes, o progenitor ficou privado do convívio com aquele seu filho, e o que importa determinar é se a requerida progenitora (a quem o menor está confiado e com quem reside) é passível de um juízo de censura por essas ocorrências. Só assim se justificará a aplicação das medidas previstas no n.º 1 do artigo 41.º do RGPTC que o recorrente tanto almeja. Previamente, há que conhecer da arguição de nulidades que o recorrente afirma terem sido cometidas. II – Fundamentação Sob o título “Nulidade da Sentença”, o recorrente imputa-lhe os seguintes vícios que afectariam a sua validade: «Argui-se a nulidade secundária da douta decisão ora recorrida, nos termos do n.º 1 do art.º 195.º do CPC. Destarte: Por vício de decisão por erros notórios de apreciação das provas produzidas. Por vicio de decisão por manifesta insuficiência das provas carreadas para os autos, designadamente a omissão na inquirição de testemunhas arroladas. Por manifesta falta de fundamentação ou insuficiência desta; A douta decisão recorrida é ainda nula por errada aplicação do direito, quanto ao facto do tribunal a quo, não valorizar os superiores interesses do menor CC consubstanciando erro nos pressupostos de facto e de direito da decisão.» Na conclusão 198.ª, alega que o tribunal cometeu nulidade processual ao omitir «ato e/ou formalidade que a lei prescreve, em violação do disposto no artigo 195.º, n.º 1 do Código de Processo Civil», aludindo à circunstância de não terem sido ouvidas as testemunhas que arrolou, o que implicaria a revogação da decisão recorrida e baixa do processo à primeira instância «para que retome os respectivos e devidos trâmites – a audiência de discussão e julgamento». Ainda, na conclusão 199.ª, alega que “não renunciou às alegações” e também aqui o tribunal teria cometido «um erro de julgamento e gerou uma nulidade processual por igual omissão de ato que a lei prescreve, em violação do mesmo artigo 195.º do CPC». Com o devid0 respeito, o recorrente incorre em vários equívocos que importa desfazer. Embora não seja propriamente uma sentença, à decisão do incidente de incumprimento do regime do exercício das responsabilidades parentais aplica-se o disposto no artigo 607.º (bem como o 613.º, n.º 3) do CPC, pelo que esta deve ter uma estrutura idêntica e cumprir os mesmos requisitos (ainda que possa ser mais aligeirada na sua fundamentação) e, nesse conspecto, a decisão recorrida é exemplar. Por isso, a sua impugnação segue as mesmas regras legais, nomeadamente em matéria de arguição de nulidades e ónus de especificação. É no artigo 615.º, n.º 1, do CPC que estão enunciadas as causas de nulidade da sentença (ou de decisões como a que está sob escrutínio) e o recorrente, numa verdadeira petição de princípio, afirma que a decisão recorrida é nula «por manifesta falta de fundamentação ou insuficiência desta». Qualquer sentença ou despacho que não seja de mero expediente, para satisfazer a exigência legal de fundamentação, deve revelar o percurso lógico e racional seguido pelo juiz, de forma a apresentar-se como uma peça coerente, fundada, convincente e à margem do arbítrio, sem enfermar de contradições ou violar as regras da experiência e do bom senso, expondo, de forma transparente, as razões de facto e de direito da decisão proferida. Só assim a fundamentação cumpre, cabalmente, a dupla função que se lhe assinala: garantia do controlo crítico da lógica da decisão, permitindo, por um lado, às partes o recurso da mesma decisão com conhecimento da situação e ao tribunal de recurso aferir se os juízos de racionalidade, de lógica e de experiência confirmam, ou não, o raciocínio e a avaliação da 1.ª instância, promovendo a sua imposição e aceitabilidade face aos seus destinatários directos (as partes) e perante a comunidade. Importa não confundir a falta de fundamentação e a fundamentação insuficiente, pobre, estéril ou divergente da pretendida pelas partes. A posição tradicional[3] é a de considerar que o vício em análise, apenas, se verifica quando ocorre falta absoluta de especificação dos fundamentos de facto e/ou dos fundamentos de direito[4]. No entanto, vem-se afirmando a tese de que, no actual quadro constitucional (artigo 205.º, n.º 1, da CRP), em que é imposto um dever geral de fundamentação das decisões judiciais, ainda que a densificar em concretas previsões legislativas, de forma a que os seus destinatários as possam apreciar e analisar criticamente, designadamente mediante a interposição de recurso, nos casos em que tal for admissível, também a fundamentação de facto ou de direito insuficiente, em termos tais que não permitam ao destinatário da decisão judicial a perceção das razões de facto e de direito da decisão judicial, deve ser equiparada à falta absoluta de especificação dos fundamentos de facto e de direito e, consequentemente, determinar a nulidade do acto decisório[5]. A decisão sob escrutínio revela, claramente, qual o iter lógico e racional seguido pelo tribunal a quo no seu processo de decisão e só não o entende quem não quer entender. A fundamentação contida na sentença cumpre cabalmente a dupla função que se lhe assinala: garantia do controlo crítico da lógica da decisão, permitindo, por um lado, às partes, o recurso da mesma decisão com conhecimento da situação e ao tribunal de recurso o reexame da causa; reforço do autocontrolo do julgador, servindo de instrumento de ponderação e legitimação da própria decisão judicial, sendo um elemento fundamental na transparência da justiça. Ressalvado o devido respeito, o que, sem qualquer esforço, se extrai da decisão recorrida é o oposto do que afirma o recorrente e que é este que confunde discordância em relação à decisão (que considera uma sucessão de erros) com falta/insuficiência de fundamentação. No mesmo registo de equivocidade se situa a arguição de nulidade da decisão «por erros notórios de apreciação das provas produzidas» e «por errada aplicação do direito». O erro de julgamento, quer em matéria de facto, quer em matéria de direito não gera a nulidade da sentença. Uma coisa, é decidir mal, quer porque se apreciou e valorou erradamente a prova, quer porque se interpretou e aplicou mal o direito aos factos apurados. Outra coisa, bem diversa, é não observar as prescrições que a lei estabelece para a prática dos actos processuais, inobservância que pode originar vícios formais. No primeiro caso, temos o error in judicando, que é fundamento de recurso e não cabe na previsão normativa das nulidades da sentença, nomeadamente na disciplina da sua impugnação específica; no segundo caso, temos o error in procedendo, que pode, por si só, ser fundamento de recurso. Vejamos as nulidades que, na tese do recorrente, se reconduziriam à previsão do artigo 195.º do CPC. Se bem que não se possa falar num princípio da legalidade ou tipicidade das nulidades em processo civil (no sentido de só se consideram nulos os actos que, sendo praticados com violação ou inobservância da lei, esta expressamente comine essa consequência), o Código de Processo Civil prevê e trata, autónoma e expressamente, nos artigos 186.º, 187.º, 191.º, 193.º e 194.º as chamadas nulidades principais ou típicas (que são de conhecimento oficioso e, em regra, a declaração de nulidade tem por efeito tornar inválido o acto em que foi cometida, bem como os que dele dependerem e aquela puder afectar). Fora desses casos, qualquer irregularidade na tramitação processual (prática de acto legalmente inadmissível ou omissão de acto ou de formalidade prescrita) só gera nulidade se influir no exame ou na decisão da causa (seja na instrução, discussão ou julgamento, seja, em processo executivo, na realização da penhora, na venda ou no pagamento): são as nulidades secundárias ou atípicas, que têm a sua previsão no artigo 195.º, n.º 1, do CPC. Não estando em causa nenhuma das nulidades principais (ou daquelas em que a lei permita o seu conhecimento oficioso) o tribunal apenas poderá conhecer de um tal vício após reclamação do interessado (artigo 196.º do Código de Processo Civil). Com efeito, as citadas disposições legais permitem concluir, com toda a segurança, que o meio próprio de reacção contra a prática de nulidades processuais atípicas é a reclamação para o órgão que praticou ou omitiu o acto contrário à lei e não o recurso. Só assim não será quando o vício esteja explícita ou implicitamente coberto por uma decisão judicial[6]. Daí que seja corrente a afirmação de que “dos despachos recorre-se, contra as nulidades reclama-se”[7]. Ao dizer que “não renunciou às alegações”, não se alcança a que se refere, exactamente, o recorrente. Tanto mais que apresentou extensas (e doutas) alegações escritas (que, em grande parte, recupera agora, em sede recursiva). Se pretende referir-se a alegações orais, não lhe assiste razão porque no incidente de incumprimento não tem que haver uma audiência de discussão. O que decorre das normas do artigo 41.º da LGPTC é que este incidente é de tramitação simples e célere e que, logo que o juiz disponha de elementos que considere suficientes para decidir, deve fazê-lo de imediato. Foi o que aconteceu neste caso: realizada a conferência de pais (na qual foram ouvidos o menor e os progenitores, ou seja, foram ouvidos todos os verdadeiros interessados), a Sra. Juiz considerou-se habilitada a decidir, dispensando a realização de outras diligências de prova porque entendeu que não aportariam aos autos qualquer contributo útil para apreciação e decisão da questão essencial, justificando assim o seu entendimento: «Não há necessidade de produzir mais provas porque, como referimos, a questão controvertida e a decidir prende-se somente com a razão/motivação do não cumprimento do regime de convívios e só o menor e não qualquer das testemunhas indicadas pelas partes tem a capacidade de elucidar o Tribunal sobre tal matéria. De mencionar também que, em nosso entender, avaliação psicológica ao menor com vista a apurar as razões da manifestação de vontade do menor e/ou mediação e audição técnica especializada terão relevância no âmbito de eventual alteração do regime de convívios e não para a apreciação dos presentes incidentes de incumprimento, pelo que não se determinou a realização de tais diligências.» Cabe aqui lembrar que o processo tutelar cível tem a natureza de processo de jurisdição voluntária (artigo 12.º do RGPTC) e, nos termos do artigo 986.º, n.º 2, segmento final, do CPC, só são admitidas as provas que o juiz considere necessárias. Ora, é sem qualquer reserva que aderimos ao entendimento expresso na decisão recorrida, pois só o menor poderia fornecer ao tribunal uma explicação plausível sobre a motivação das suas faltas ao convívio com o progenitor. E deu-a de forma que não deixou quaisquer dúvidas ao tribunal. A arguição de nulidades da sentença revela-se, assim, manifestamente infundada. 1. Fundamentos de facto Na primeira instância, foi seleccionada como relevante para a decisão e considerada provada a seguinte factualidade: - O CC nasceu no dia .../.../2008. -Por decisão já transitada em julgado foi fixada a residência do CC com a progenitora, com seguinte regime de convívios ao progenitor, que interessa para a questão a decidir: - O progenitor AA estará com o filho nos primeiros três fins de semanas de cada mês, de sexta-feira do fim do horário das atividades letivas a segunda-feira, com cumprimento do horário escolar, sendo as conduções a realizar por referência à escola ou ao ATL frequentado pelo menor, sem prejuízo de as entregas e os horários das mesmas poderem, por acordo entre os progenitores, ser realizados em outros locais e/ou em outras horas. - Nas festividades (véspera de Natal, dia de Natal, véspera de Ano Novo, dia de Ano Novo, Domingo de Páscoa) o CC estará alternadamente com cada um dos progenitores, começando com o progenitor com os próximos dias de Natal e de Ano Novo e o próximo Domingo de Páscoa. - Estará ainda com o filho nas férias escolares de verão, em semanas alternadas, fazendo-se a troca à sexta-feira, no fim do dia, pelas 19.00 horas. - No dia de aniversário de cada um dos progenitores, dia do pai e dia da mãe, o CC estará com o progenitor respetivo, sem prejuízo das suas atividades. - No dia 19 de março de 2022 o progenitor não levou o CC a jogo de basquetebol. - O CC não esteve com o progenitor nos fins-de-semana de 1 de abril (sexta), 15 de abril (sexta), 13 de maio (sexta) e 19 de maio (sexta); - O CC não esteve com progenitor no fim-de-semana de 10 de junho (sexta); - O dia de aniversário da progenitora corresponde ao dia 11 de junho; - O CC não esteve com o progenitor no fim-de-semana iniciado a 17 de junho de 2022; - No dia 17 de junho de 2022 o CC não esteve com o progenitor, bem como na semana iniciada a 20 de junho de 2022 correspondente à primeira semana de férias escolares de verão; - No fim-de-semana do dia 1 de julho o CC não esteve com o progenitor, bem como não esteve em gozo de férias de verão; - Na sexta-feira 8 de julho de 2022 o CC não esteve com o progenitor. - No fim de semana de 15 de julho de 2022 o CC não esteve com o progenitor. 2. Fundamentos de direito Entrando na apreciação das questão fundamental de direito submetida à apreciação deste tribunal de recurso, convém começar por lembrar que um dos princípios característicos dos processos de jurisdição voluntária é o de que as decisões neles proferidas não formam caso julgado[8], pois podem ser alteradas em qualquer altura se ocorrerem circunstâncias supervenientes que justifiquem a alteração (cfr. artigo 988.º, n.º 1, do Cód. Proc. Civil), quer a superveniência seja objectiva, isto é, tenham os factos ocorrido posteriormente à decisão, quer seja subjectiva, ou seja, quando os factos são anteriores à decisão mas não tenham sido alegados por não serem conhecidos por quem tinha interesse na alegação. No processo de regulação do exercício das responsabilidades parentais, o regime inicialmente fixado por acordo ou por decisão do tribunal pode ser alterado ou pode haver lugar à aplicação de medidas tendentes ao cumprimento coercivo sempre que: - haja incumprimento de um dos pais (artigo 41.º, n.º 1, do RGPTC); - haja incumprimentos de ambos os progenitores (artigo 42.º, n.º 1, do RGPTC) ou - circunstâncias supervenientes tornem necessária a alteração. No caso, interessa considerar a primeira situação, pois o pai do menor CC imputa à progenitora o incumprimento do “regime de visitas” judicialmente fixado. O juízo sobre o imputado incumprimento a formular tem de alicerçar-se no acervo factual que ficou enunciado, e não em qualquer outro, uma vez que o recorrente não impugnou a decisão sobre matéria de facto. Com efeito, apesar da crítica contundente que dirige à decisão recorrida, na sua óptica, merecedora de censura a todos os níveis, o recorrente acabou por se conformar com a decisão de facto. A modificação da decisão em matéria de facto, quando desencadeada pelo recorrente, via de regra, depende da reapreciação de meios de prova de livre apreciação e, quando assim sucede, a Relação só pode intervir se o recorrente tiver cumprido os chamados ónus de impugnação, definidos no artigo 640.º do CPC, desde logo, a indicação dos concretos pontos de facto que considera terem sido incorrectamente julgados pelo tribunal recorrido. Assim acontece, também, nos processos de jurisdição voluntária (em que o tribunal dispõe de amplos poderes investigatórios). Ora, o recorrente não identifica quaisquer pontos de facto que considera mal julgados. E não o faz porque os factos provados, ou resultam do que o próprio afirmou nos seus requerimentos dos vários incidentes de incumprimento, ou são por ele expressamente admitidos. O recorrente insurge-se contra as declarações que o tribunal tomou ao menor CC e a credibilidade e relevância que lhe foi atribuída. Na sua perspectiva, tais declarações não são merecedoras de crédito porque o menor estava condicionado pela progenitora, que o instrumentaliza contra si, em jeito de vindicta por ter ficado desconsolada com o resultado (absolvição) no processo crime em que estava acusado pela autoria do crime de violência doméstica contra a aqui recorrida. Não suscita qualquer controvérsia o entendimento de que só se justifica a intervenção coerciva do tribunal nos termos previstos no artigo 41.º do RGPTC se uma situação de incumprimento reiterado do regime de exercício das responsabilidades parentais for culposamente imputável a um dos progenitores. O próprio recorrente assim o reconhece: «(…) a sua aplicação há-de pressupor uma crise, um incumprimento grave e reiterado por parte do progenitor remisso e não uma mera situação ocasional ou pontual de incumprimento, surgida por motivos imponderáveis alheios à vontade do próprio progenitor incumpridor» (conclusão 141.ª). Resulta da decisão recorrida que as declarações prestadas pelo menor foram, realmente, decisivas para afastar qualquer juízo de censura sobre a progenitora: «No caso dos autos resultou claro para o Tribunal que o CC está a vivenciar momento em que não tem vontade de estar com o progenitor de forma regular, conforme estabelecido na regulação do exercício das responsabilidades parentais, mas sim em regime livre; tendo admitido que apesar da referida falta de vontade, por vezes, também tem saudades do mesmo. Aludiu e descreveu comportamentos do progenitor que o incomodam e deixam triste. Assim, das declarações do CC, que conta já com 14 anos de idade, revelando maturidade suficiente para opinar sobre o regime de convívios com o progenitor e classificar a relação que tem com o mesmo, resultou de forma clara que a não ocorrência dos convívios com o pai se ficou a dever somente à vontade do menor, para a formação da qual terão contribuído comportamentos que imputou ao pai. Ora, e tal como já referido em decisões anteriores, a progenitora embora tenha por obrigação incentivar e cumprir com o regime de convívios ao progenitor, também lhe cabe respeitar a vontade própria do filho, que conta já com 14 anos de idade, pelo que perante tal dualidade não pode assacar-se um juízo de censurabilidade à requerida.» O recorrente questiona esta “solene clareza” e ironiza sobre a «qualificação técnica especializada em psicoterapia infantil possível que a M.ma Juiz terá mas desconhecida do recorrente» (conclusão 122.ª), conclui que esta (Sra. Juiz) é «desprovida de conhecimento avalizado em psicoterapia infantil», desvaloriza «esta perspectiva empírica conclusiva» (conclusão 125.ª) e insiste que o menor fez as declarações que fez porque está a ser instrumentalizado pela progenitora. É bem sabido (é um dado da experiência comum) que em situações de grande conflitualidade entre os progenitores (subsequente a uma rotura conjugal ou ao termo de uma união de facto), como aqui se verifica, são frequentes as tentativas (empreendidas por ambos ou por um deles) de instrumentalização dos filhos e os comportamentos de alienação parental. Seria pura ingenuidade excluir qualquer hipótese de atitudes dessas terem ocorrido neste caso. Por isso mesmo é que o tribunal tomou medidas no sentido de procurar garantir que as declarações que decidiu tomar ao menor CC fossem por este prestadas sem constrangimentos, com o máximo de liberdade possível. Daí que as declarações tenham sido prestadas sem a presença dos progenitores. Ora, não é necessário ter especiais conhecimento de psicologia infantil/juvenil para perceber se o que diz um adolescente de 14 anos de idade resulta de manipulação da progenitora. Se um juiz não é capaz de perscrutar no depoimento de um adolescente eventuais manipulações dos progenitores e discernir se o que diz é ou não espontâneo, se é ou não genuíno, então não está em condições de julgar porque avaliar prova pessoal e fazer juízos sobre a sua credibilidade é o que tem que fazer quase diariamente. O menor CC manifestou, não rejeição, mas relutância aos convívios (tal como se vêm processando) com o pai, a quem atribuiu a responsabilidade por essa sua postura, e nada, rigorosamente nada, permite, sequer, suspeitar que essa não seja uma vontade livremente determinada. Aliás, justificou essa sua atitude narrando factos concretos que o têm desgostado e que, em parte, são corroborados pelo próprio recorrente, como acontece relativamente ao modo aviltante como este trata a mãe (e que é patente em requerimentos/alegações que fez chegar aos autos). Se uma criança é facilmente sugestionável e manipulável, com um adolescente de 14 anos já não é assim. Por isso é que a lei (artigo 35.º, n.º 3, do RGPTC) prevê que o jovem com idade superior a 12 anos seja ouvido pelo tribunal, nos termos previstos na alínea c) do artigo 4.º e no artigo 5.º, salvo se a defesa do seu superior interesse o desaconselhar, e que a sua opinião seja tida em consideração pelas autoridades judiciárias na determinação do seu superior interesse. Ora, é entendimento corrente que numa situação de incumprimento do “regime de visitas” em que o jovem adolescente afirma, expressa e inequivocamente, que não quer ter contactos com o progenitor não guardião, o tribunal não deve impor coercivamente esse convívio não desejado. Como expende Clara Sottomayor (“Regulação do Exercício das Responsabilidades Parentais nos Casos de Divórcio”, 5.ª ed., págs. 160/161): «O divórcio cria realidades novas na sociedade e dificuldades acrescidas para as crianças cujos pais estão em conflito. A reacção das crianças ao divórcio pode ser incompreendida pelos pais e introduz factores novos na análise das consequências do divórcio. Multiplicam-se, nos Tribunais, os processos de incumprimento do regime de visitas e a aplicação de medidas coercivas de execução dos acordos ou decisões judiciais, a pedido do progenitor sem a guarda, confrontado com a recusa da criança ao convívio ou às visitas. Estes processos, em que muitas vezes a criança não é ouvida e é levada ao progenitor requerente, sob coacção das forças policiais, tratam a criança como um objecto, propriedade do pai, e ignoram os seus sentimentos e desejos. Acaso algum adulto está sujeito a intervenções judiciais ou policiais que o obriguem a conviver com o seu cônjuge ou ex-cônjuge, progenitores, irmãos ou outros familiares? Se julgamos impensável forçar convívios e afectos, em relação a adultos que não os desejam, porquê coagir as crianças ao convívio com o progenitor não guardião? Aprenderá a criança a respeitar os outros, quando o sistema judicial não a respeita a si? A investigação científica sobre o impacto do divórcio nas crianças e a experiência dos profissionais que lidam com as famílias revelam que a recusa da criança é uma reacção normal ao divórcio e que assume um carácter temporário. A maneira de os tribunais lidarem com a recusa da criança tem que ser cautelosa, entrando em diálogo com ela para conhecer os seus motivos, sem impor medidas pela força, as quais só vão aumentar o conflito e reforçar o sofrimento da criança. O fenómeno da recusa das crianças à relação com um dos pais é sempre multifactorial, não resultando de uma só causa, como pretende a tese da síndrome de alienação parental, que faz a rejeição da criança derivar necessariamente de uma campanha difamatória levada a cabo por um dos pais contra o outro». Que fique bem claro que não se deve contemporizar e, muito menos, estimular situações de injustificado incumprimento do regime de exercício das responsabilidades parentais (em especial do regime de convívios com o progenitor que não tem a guarda do menor). Por outro lado, não são toleráveis comportamentos do progenitor guardião que, por acção ou por omissão, obstaculizem esses convívios. No entanto, temos por seguro e certo que nenhuma responsabilidade pode ser assacada à recorrida nos incumprimentos denunciados pelo recorrente. Não há (a Sra. Juiz do tribunal a quo não vislumbrou e, realmente, não é descortinável) qualquer indício no menor CC de síndrome de alienação parental. A realidade, como bem observa a digna Procuradora da República na sua resposta, é que o recorrente se revela incapaz de entender e assumir que o distanciamento que o seu filho vem manifestando em relação a si e a relutância em cumprir o regime de convivência em toda a sua extensão decorrem, não de instrumentalização da progenitora, mas da forma como o menor percepciona as suas (dele, progenitor) atitudes de reacção às faltas aos convívios estipulados e a postura de agressividade (e mesmo ameaçadora) que tem adoptado. Não é a recorrida que tem de ser sancionada, como pretende o recorrente; é este que tem de inverter o seu comportamento desajustado para não perder definitivamente o respeito e o afecto que o menor ainda tem por si. Se persistir nesse comportamento, estará a estimular uma atitude de rejeição e a pôr em causa a estabilidade emocional do CC. A decisão recorrida não afronta quaisquer normas legais e, muito menos, os princípios da tutela jurisdicional efetiva, do contraditório, da legalidade e da igualdade de partes. Improcedem, assim, todas as conclusões do recurso. III - Dispositivo Perante o exposto, acordam os juízes desta 5.ª Secção Judicial (3.ª Secção Cível) do Tribunal da Relação do Porto em julgar improcedente a apelação de AA e, em consequência, confirmar a decisão recorrida. Custas do recurso a cargo do recorrente (artigo 527.º, n.os 1 e 2, do Cód. Processo Civil), sem prejuízo do apoio judiciário de que beneficia. (Processado e revisto pelo primeiro signatário). Porto, 08.05.2023 Joaquim Moura Ana Paula Amorim Manuel Domingos Fernandes ______________ [1] Entendeu-se por conveniente manter a numeração sequencial adoptada pelo recorrente. [2] Reproduz o que já consta da conclusão 145.ª [3] Cfr. J. Alberto dos Reis, Código de Processo Civil Anotado, Coimbra Editora, 1984, reimpressão, vol. V, página 140. [4] É o que decorre da letra do artigo 615.º, n.º 1, al. b), do CPC. [5] Neste sentido veja-se o acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 02 de Março de 2011, relatado pelo Sr. Juiz Conselheiro Sérgio Poças, no processo nº 161/05.2TBPRD.P1.S1 e acessível no site da DGSI. [6] O Sr. Conselheiro António Santos Abrantes Geraldes, in Recursos no Novo Código de Processo Civil, Almedina 2017-4ª Edição, páginas 24 a 26, critica a corrente que admite a arguição de nulidade em via de recurso em casos de alegada decisão implícita por ser um critério rodeado de excessiva incerteza na definição dos exactos contornos da figura, optando antes por enquadrar tais casos na figura da nulidade da decisão por omissão de pronúncia. [7] A este propósito veja-se o Comentário ao Código de Processo Civil do Sr. Professor José Alberto dos Reis, Volume 2º, Coimbra Editora 1945, página 507. [8] Têm a força própria do chamado caso julgado rebus sic stantibus. |