Acórdão do Tribunal da Relação do Porto | |||
Processo: |
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Nº Convencional: | JTRP00 | ||
Relator: | ANTÓNIO LUÍS CARVALHÃO | ||
Descritores: | INVERSÃO DO ÓNUS DA PROVA CESSAÇÃO DO CONTRATO DE TRABALHO COMPENSAÇÃO DE CRÉDITOS | ||
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Nº do Documento: | RP202311134139/20.8T8AVRS.P1 | ||
Data do Acordão: | 11/13/2023 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Texto Integral: | S | ||
Privacidade: | 1 | ||
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Meio Processual: | APELAÇÃO | ||
Decisão: | RECURSO PARCIALMENTE PROCEDENTE. ALTERADA A SENTENÇA. | ||
Indicações Eventuais: | 4. ª SECÇÃO SOCIAL | ||
Área Temática: | . | ||
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Sumário: | I - Para ter lugar a inversão do ónus da prova, nos termos do art.º 344º, nº 2 do Código Civil e art.º 417°, n° 2 do Código de Processo Civil, importa que as partes sejam advertidas previamente da eventualidade dessa inversão, de forma a poderem gerir o esforço probatório que lhe é exigível e evitar uma decisão surpresa. II - Tendo a empregadora operado a compensação da indemnização a que se refere o art.º 399º do Código do Trabalho com os créditos devidos à trabalhadora com a cessação do contrato de trabalho, invocando na contestação essa compensação, o tribunal pode considerar essa compensação porque feita depois da cessação do contrato de trabalho (art.º 279º, nº 1 do Código do Trabalho), mesmo sem ser apresentada reconvenção; porém, não pode o tribunal oficiosamente considerar ser a indemnização de valor superior ao compensado pela empregadora, sem que a empregadora tivesse formulado essa pretensão, com possibilidade de contraditório. | ||
Reclamações: | |||
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Decisão Texto Integral: | Recurso de apelação n.º 4139/20.8T8AVR.P1 Origem: Comarca de Aveiro, Juízo do Trabalho de Aveiro – J1 Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação do Porto: RELATÓRIO AA (Autora) instaurou contra “A..., Unipessoal, Lda.” (Ré) a presente ação, com processo comum, pedindo a condenação da Ré a reconhecer a justa causa da Autora para resolução do contrato de trabalho e a pagar-lhe, a título de indemnização e demais créditos salariais, o montante de €16.659,12, acrescido dos juros vencidos no valor de €556,83, e vincendos a calcular à data da sentença. Fundou o seu pedido alegando, em síntese, que foi admitida como trabalhadora da Ré no princípio de março de 2014, contrato que cessou em 28/02/2020, por sua iniciativa; a Autora comunicou a resolução do contrato com pré-aviso de 60 dias em 13/02/2020; no entanto, a partir de 14/02/2020 a gerente da Ré proibiu a Autora de desempenhar as suas funções nos termos habituais, relatando uma sucessão de factos que culminaram com comunicação escrita por parte da Autora, em 27/02/2020, a resolver o contrato com justa causa; reclama o pagamento de indemnização por antiguidade e créditos em falta. Realizada «audiência de partes», frustrou-se a sua conciliação, pelo que foi notificada a Ré para poder contestar, o que fez, apresentando contestação na qual alegou, em resumo, que não aceita que a Autora tenha cessado o contrato com justa causa, dando a sua versão do sucedido, dizendo que ocorreu uma denúncia do contrato pela Autora sem aviso prévio, tendo-lhe liquidado os créditos devidos, com desconto da indemnização a que tem direito por falta do período de aviso prévio, nada devendo a Autora; esta litiga de má-fé; concluiu dizendo dever a ação ser julgada totalmente improcedente, e a Autora condenada como litigante de má-fé em multa e indemnização, esta nunca inferior a € 500,00. A Autora apresentou requerimento de resposta à contestação, na qual refere, entre o mais, que as rúbricas apostas no doc. nº 4 junto com o articulado da contestação não foram feitas por si, e que a Ré quem litiga de má-fé, devendo ser condenada em conformidade. A Ré solicitou a realização de perícia à letra. Foi proferido despacho a dispensar a realização de audiência prévia, sendo proferido despacho saneador afirmando a validade e regularidade da instância, com dispensa da prolação de despacho identificando o objeto do litígio e enunciando os temas de prova. Foi fixado o valor da ação em €17.215,95. Depois de realizada a perícia à letra, foi realizada «audiência de discussão e julgamento», sendo depois proferida sentença decidindo, na procedência parcial da ação, o seguinte: I. Condenar a Ré a pagar à Autora a quantia ilíquida de € 16,88 (dezasseis euros e oitenta e oito cêntimos), a título de retribuição por trabalho suplementar, mais juros de mora à taxa legal (atualmente de 4%), até integral pagamento, contados desde 30/04/2019, sobre metade dessa quantia; e desde 31/08/2019, sobre a outra metade. II. Condenar a Ré a pagar à Autora a quantia ilíquida de €115,20 (cento e quinze euros e vinte cêntimos), a título de créditos laborais em dívida, mais juros de mora à taxa legal (atualmente de 4%), desde 28/02/2020, até integral pagamento. III. No mais, absolver a Ré do pedido, incluindo do pedido de condenação como litigante de má-fé formulado pela Autora. IV. Condenar a Autora, como litigante de má-fé, em multa no valor de 5 (cinco) Unidades de Conta e a indemnizar a Ré, em montante cuja fixação se relega para ulterior momento, ao abrigo do disposto no art.º 543º, nº 3 do Cód. de Processo Civil. Não se conformando com a sentença proferida, dela veio a Autora interpor recurso, formulando as seguintes CONCLUSÕES, que se transcrevem[1]: ………………………… ………………………… ………………………… Termina dizendo dever o recurso merecer provimento, e em consequência revogar-se a sentença recorrida, substituindo-se por outra que julgue procedentes os pedidos formulados na petição inicial, condenando a Recorrida em conformidade. A Ré apresentou resposta, formulando as seguintes CONCLUSÕES, que se transcrevem: ………………………… ………………………… ………………………… Termina dizendo dever manter-se inalterada a decisão recorrida. Foi proferido despacho a mandar subir o recurso de apelação, imediatamente, nos próprios autos, e com efeito meramente devolutivo. O Digno Procurador-Geral-Adjunto, neste Tribunal da Relação, emitiu parecer (art.º 87º, nº 3 do Código de Processo do Trabalho), pronunciando-se no sentido do recurso ser rejeitado quanto à impugnação da matéria de facto, ou de não obter provimento, sendo escrito, essencialmente, o seguinte: Atento o objeto dos presentes autos, determinado pelas conclusões formuladas, afigura-se-nos que a Recorrente não tem razão. É evidente a fragilidade argumentativa apresentada quanto à impugnação da matéria de facto, por incorreta observância do ónus a que se alude no artigo 640º nº 1, al. c) do mesmo diploma legal. Nas conclusões que a Recorrente formula, na que vem enunciada sob a al. A) menciona-se que “A factualidade considerada como provada na douta sentença sob os números 7.º, 8.º e 29.º está em desconformidade com a prova produzida, em manifesta violação das regras da apreciação da prova e, por isso, fica claramente impugnada para todos os efeitos;”. Mais consta da subsequente al. K) a seguinte asserção: “Considerando o exposto não poderá manter-se a factualidade dada como provada em 7.º, 8, e 29.º dos factos provados na douta sentença, devendo face os elementos de prova supra invocados dar-se como provado que: 1- A autora durante a vigência do contrato cumpriu sempre um horário de trabalho superior a 40 horas semanais: de segunda a sexta feira das 9h30m às 12h30m e das 14h00m à 19h30m, ao sábado das 9h30m às 13h00m; 2- A gerente da Ré, depois de tomar conhecimento da decisão da autora de denunciar o contrato e trabalho, a partir de 14 de Fevereiro de 2020, proibiu-a de desempenhar as funções nos termos habituais, ordenando-lhe que permanecesse no armazém para arrumações, sem qualquer contato com o público que frequentava o estabelecimento e sem acesso aos utensílios e meios de trabalho”. Resulta destas conclusões que a Recorrente delimita o objeto do recurso e fundamenta para impugnação da decisão da matéria de facto quanto a seus três pontos da matéria de facto provada que identifica sob os nos 7, 8 e 29, propõe duas novas redações para alteração daqueles e a serem dados como provados em conformidade. Em nosso modesto entendimento, quanto à conclusão da al. K), tal consubstancia uma incorreta indicação sobre a decisão a ser proferida, por não observância da previsão do disposto no al. c) do nº 1 do art.º 640º do CPC. Ou seja, a Recorrente não faz uma correspondência exata entre os pontos impugnados, que são três, e os pontos a serem aprovados, que são dois. Tal denota uma imperfeição formal do cumprimento do ónus resultante deste segmento normativo. No dizer de António Santos Abrantes Geraldes, in Recursos em Processo Civil - Recursos nos Processos Especiais e Recursos no Processo do Trabalho, 7ª Edição Atualizada, Almedina, Coimbra, 2022, pág. 200-201, ocorre uma “falta de posição expressa, na motivação, sobre o resultado pretendido relativamente a cada segmento da impugnação”. A este respeito sumariou-se no Ac. deste TRP, de 26/06/2023, que “II - Por menor exigência formal que se adote relativamente ao cumprimento dos ónus do art.º 640º do CPC e em especial dos estabelecidos nas suas alíneas a) e c) do nº 1, sempre se imporá que seja feito de forma a não obrigar o tribunal ad quem a substituir-se ao recorrente na concretização do objeto do recurso”. Ocorre uma causa de imediata rejeição do recurso nesta parte – cfr. Acs. do STJ de 05 e 27, ambos de setembro de 2018 e deste TRP de 22/02/2021; tb. António Abrantes Geraldes, in Recursos no Novo Código de Processo Civil, 2013, páginas 126, 127 e 129. Estabilizada deste modo a matéria de facto, que deverá ser integralmente confirmada, não há motivo para alteração da matéria de direito. Ainda e quanto a esta desconhece-se qual o vício de que padece a sentença “sub iudice” por ausência de menção de norma legal em clara violação do disposto no art.º 639º, nº 2 do CPC. O ilustre julgador “a quo” bem decidiu quanto à realização de trabalho suplementar prestado pela recorrente e ao não reconhecimento da existência de justa causa na resolução operada pela recorrente. Os créditos salariais foram fixados sem reparo. Nenhuma das “conclusões” da alegação da recorrente subsiste perante a argumentação que foi expendida na douta decisão “sub iudice” e o que afasta qualquer vício ou erro de julgamento. A Recorrente apresentou resposta dizendo, em síntese, que cumpriu o disposto nas diversas alíneas do nº 1 do art.º 640º do Código de Processo Civil, estando perfeitamente concretizado o objeto do recurso, corretamente expresso nas conclusões apresentadas. A Recorrida também apresentou resposta, concluindo que o recurso deve ser rejeitado quanto à impugnação da matéria de facto, ou não obter provimento. Procedeu-se a exame preliminar, foram colhidos os vistos, após o que o processo foi submetido à conferência. Cumpre apreciar e decidir. * FUNDAMENTAÇÃOConforme vem sendo entendimento uniforme, e como se extrai do nº 3 do art.º 635º do Código de Processo Civil (cfr. também os art.ºs 637º, nº 2, 1ª parte, 639º, nºs 1 a 3, e 635º, nº 4 do Código de Processo Civil – todos aplicáveis por força do art.º 87º, nº 1 do Código de Processo do Trabalho), o objeto do recurso é delimitado pelas conclusões da alegação apresentada[2], sem prejuízo, naturalmente, das questões de conhecimento oficioso. Assim, aquilo que importa apreciar e decidir neste caso[3] é saber se: ● houve erro no julgamento sobre a matéria de facto? ● a Ré deve ser condenada no pagamento da quantia peticionada pela Autora a título de trabalho suplementar? ● verificou-se justa causa para resolução do contrato de trabalho pela Autora? ● sem haver pedido da Autora, não pode ser considerada indemnização que seja devida pela Ré à Autora por falta de aviso prévio? ● a Autora não litigou de má-fé? * Porque tem interesse para a decisão do recurso, desde já se consignam os factos dados como provados e como não provados na sentença de 1ª instância, objeto de recurso.Quanto a factos PROVADOS, foram considerados os seguintes, que se reproduzem: 1. A Ré prossegue a atividade comercial de venda de material médico. 2. A Ré tem estabelecimento na Estrada ..., em ..., Aveiro, composto por duas lojas contíguas, com os n.ºs ... e ..., que não comunicam entre si, tendo ambas porta para a rua e balcões de atendimento, trabalhando os funcionários da Ré tanto numa loja como na outra. 3. A Ré tem um armazém sito na Rua ..., ..., Aveiro. 4. A Autora foi admitida a trabalhar sob as ordens e fiscalização da Ré em 09 de abril de 2014, mediante contrato de trabalho sem prazo, para o exercício das funções inerentes à categoria profissional de promotora de vendas. 5. No exercício das suas funções, a Autora atendia ao balcão, respondia aos clientes por escrito, faturava as vendas, emitia pontualmente recibos, recebia o preço, fazia por vezes o fecho do caixa diário e mantinha organizado o arquivo, ou seja, as faturas pró-forma dos clientes e as medidas tiradas aos clientes. 6. A Autora também procedia à apresentação e entrega dos produtos comercializados pela da Ré, nas instalações dos clientes, nomeadamente em lares, clínicas e hospitais. 7. A Autora cumpria um horário de trabalho de segunda-feira a sexta-feira, começando a trabalhar desde hora não concretamente apurada, não posterior às 10h00, até às 12h30m e depois das 14h00m até às 19h00m; e aos sábados, desde hora não concretamente determinada, não posterior às 10h00, até pelo menos às 12h30m. 8. Pelo menos nos sábados de 06 e 13 de abril de 2019 e de 03 e 10 de agosto de 2019, a Autora trabalhou das 10h00 às 13h00, tendo nas quatro semanas em causa trabalhado de segunda-feira a sexta-feira, pelo menos das 10h00 até às 12h30m e das 14h00m às 19h00m. 9. A Autora enviou à Ré missiva datada de 12/02/2020, recebida pela Ré no dia 13/02/2020, com seguinte teor: «Eu, AA, com C.C. ... e nº c. ...70, venho por este meio apresentar a minha carta de despedimento, cumprindo o aviso prévio de dois meses de antecedência, a contar do dia de hoje». 10. No dia 13/02/2020, a Autora e outro trabalhador da Ré, BB, deslocaram-se ao Lar ..., sito em ..., para promoverem a venda e procederem à entrega de produtos e equipamento médico. 11. Quando regressaram ao estabelecimento da Ré, por volta das 17h00 e como se tratou de um dia cansativo para ambos os trabalhadores, a gerente da Ré autorizou-os a saírem mais cedo. 12. Era habitual a gerente da Ré autorizar os trabalhadores a irem para casa mais cedo, em dias em que realizavam trabalho mais cansativo, fora do estabelecimento comercial da Ré. 13. Na noite de 12 para 13 de fevereiro de 2020, as fechaduras das portas do estabelecimento da Ré foram forçadas, o que levou a Ré a mudar as fechaduras, tendo a gerente da Ré dado conta do sucedido aos trabalhadores (incluindo a Autora), no dia 13/02/2020, de manhã. 14. Não foi dada uma chave da nova fechadura à Autora, porque esta tinha denunciado o contrato de trabalho. 15. No dia 14/02/2020, a Autora esteve a trabalhar no estabelecimento da Ré, a exercer as suas funções – e não no armazém. 16. No referido dia (14/02/2020), a Autora foi embora do estabelecimento cerca das 14h30, sem apresentar qualquer justificação, não obstante se encontrarem clientes no estabelecimento. 17. A Autora só regressou ao trabalho no dia 26/02/2020. 18. A Autora enviou à Ré, em 17/02/2020, comunicação escrita, datada de 15/02/2020, com o teor constante de fls. 10 vº/11 dos autos, recebida pela Ré no dia 18/02/2020, onde conclui dizendo: «Não retomarei funções enquanto não me for garantido o desempenho das funções inerentes à categoria profissional de promotora de vendas, consubstanciadas nas funções referidas em 8 da presente comunicação. - Revogar a comunicação de denúncia do contrato de trabalho, recebida por V. Exa. em 13 de fevereiro de 2020, ficando sem efeito a cessação do mesmo. - A prestação de trabalho, conforme o reclamado, deverá ocorrer no prazo de 48 horas, a contar da receção desta comunicação, sem prejuízo da participação às entidades competentes, designadamente, à autoridade para as condições do trabalho (ACT) e/ou propositura da respetiva ação no juízo do trabalho da comarca de Aveiro, destinada à obrigação de prestação efetiva de trabalho, conforme o contrato». 19. Em resposta, a Ré, em 19/02/2020, remeteu missiva à Autora – por esta recebida em 21/02/2020 – com o seguinte teor: «Exma. Senhora AA: Com os melhores cumprimentos. Acusamos a receção da sua carta, datada de 15/02/2020, recebida em 17/02/2020, a qual mereceu a nossa maior atenção. Desde já demonstramos a nossa satisfação por se encontrar bem, dado que no dia 14 de fevereiro, sexta-feira passada, da parte da tarde, abandonou o seu local de trabalho sem para o efeito ter apresentado qualquer justificação, não mais tendo regressado ao trabalho desde essa data. Importará esclarecer que V. Exa descreve uma série de factos/episódios que não correspondem, de todo à verdade, o que nos obriga aprestar os seguintes esclarecimentos: 1º- V. Exa é trabalhadora desta Empresa desde o dia 09 de abril de 2014, exercendo as funções inerentes à categoria de profissional de promotora de vendas. 2°- Nunca esta empresa impediu ou dificultou, de qualquer forma, V.Exa de desempenhar as funções inerentes à sua categoria profissional, de promotora de vendas. 3°- De facto, esta Empresa, no dia em que rececionou a sua carta de denúncia do contrato de trabalho, deu-lhe indicações para sair à 17h20, conhecendo V. Exa perfeitamente a razão pela qual saiu mais cedo, pois tal razão foi-lhe explicada no momento em que lhe foram dadas a referidas indicações. No referido dia, V. Exa juntamente com o trabalhador Senhor BB, foram fazer uma entrega de produtos, a qual foi exaustiva para ambos, e foi por esse motivo, unicamente e tão só, que a sua Entidade Patronal lhe deu indicações para sair mais cedo. Tais indicações foram-lhe dadas não só a si como ao trabalhador BB, o qual, inclusivamente, também saiu à mesma hora que V. Exa. Assim, dado o trabalho árduo realizado pelos dois trabalhadores, esta Empresa julgou, de boa-fé, que a saída antecipada colmataria essa situação. 4º- Em momento algum, esta Empresa lhe deu indicações para efetuar arrumações no armazém, não se compreendendo tal acusação uma vez que V. Exa nunca se ausentou da loja, tendo sempre permanecido no seu local de trabalho. 5°- Também a gerência não foi questionada sobre qualquer reintegração de funções, pois repita-se, nunca lhe foram retiradas as suas funções. 6°- No que se refere à substituição das fechaduras, tal situação, não resulta de qualquer retaliação ou impedimento ao desempenho das suas funções, até porque, como certamente concordará, o seu acesso ao local de trabalho não depende de ter as chaves do Local de trabalho onde labora. Efetivamente esta Empresa procedeu à substituição das fechaduras da sua loja, para garantir a segurança das suas instalações. Todavia, tal também não a impede nem nunca impedirá de aceder ao seu local de trabalho, pois saliente-se, o seu local de trabalho trata-se de uma loja aberta ao público, com o horário de funcionamento das 09h00 às 12h30 e das 14h00 às 19h00. 7°- Quanto ao seu pedido para retomar o seu trabalho no prazo de 48 (quarenta e oito) horas, tem a referir esta Gerência que não entende tal solicitação, uma vez que: - A Senhora é que, na frente de clientes, sem qualquer justificação, abandonou o seu posto de trabalho em pleno horário de funcionamento da loja, - Nunca esta empresa a impediu ou dificultou, por qualquer meio, de desempenhar as suas funções de promotora de vendas. Face ao exposto, poderá retomar o trabalho quando entender, uma vez que, como já se referiu, a nossa loja trata-se de um Estabelecimento aberto ao público, com o horário supra indicado, o qual é do seu pleno conhecimento. Atentamente nos subscrevemos». 20. A Autora apresentou-se ao trabalho já fardada, no dia 26/02/2020, por volta das 09:30 horas. 21. A gerente da Ré chegou ao estabelecimento por volta das 09:30 horas e disse à Autora que não estava na sua (da Autora) hora de trabalho e para esperar lá fora pelas 10h00. 22. A Autora recusou-se a sair e insistiu em permanecer no estabelecimento e começar a trabalhar, falando em voz alta e de forma agressiva, em frente aos clientes que se encontravam no estabelecimento, dizendo que não saía. 23. A gerente da Ré chamou a Polícia de Segurança Pública (PSP). 24. O agente da PSP procedeu à identificação da Autora. 25. A Autora contactou telefonicamente a Autoridade para as Condições do Trabalho (ACT), tendo comparecido no local a Inspetora CC. 26. A Inspetora da ACT, CC, solicitou à gerente da Ré o mapa de horário de trabalho e os registos dos tempos de trabalho dos trabalhadores. 27. O mapa de horário de trabalho estava afixado no estabelecimento. 28. Faltavam registos de tempos de trabalho dos trabalhadores, incluindo da Autora. 29. Foi a Autora que rubricou, pelo seu próprio punho, as “folhas de ponto” respeitantes aos meses de abril e de junho de 2019, cujos originais constam de fls. 151 e 152 dos autos, respetivamente. 30. Em 27/02/2020, a Autora enviou à Ré carta registada com aviso de receção, recebida pela Ré em 28/02/2020, com o seguinte teor: «Aveiro, 27 de fevereiro de 2020 Assunto: Resolução do contrato de trabalho com justa causa – Art.º 394º do Código do Trabalho Serve o presente para comunicar a essa gerência de que, a partir da receção da presente comunicação, considero resolvido o contrato de trabalho subordinado a que estive vinculada desde março de 2014, invocando para o efeito justa causa. De facto, a manutenção do contrato mostrou-se total e claramente impossível, tendo em conta os comportamentos da entidade empregadora. Durante toda a vigência do contrato sempre desempenhei as funções inerentes à categoria profissional de promotora de vendas, auferindo o salário mensal de 710,00 euros, acrescidos de subsídio de alimentação e duas diuturnidades. A execução daquela categoria profissional compreendia as seguintes tarefas: atendimento do público ao balcão, responder aos clientes por escrito, faturar as vendas, emitir recibos e receber o preço, elaborar e fazer o fecho do diário de caixa e manter o arquivo devidamente organizado. Sucede que, após ter manifestado a intenção de denunciar o contrato de trabalho à gerência, no dia 13 de fevereiro, esta ordenou que fosse para o armazém e que estava proibida de desempenhar quaisquer outras funções. Situação que se manteve no dia seguinte, o que me obrigou a comunicar por escrito no sentido de reclamar a reintegração no exercício pleno das funções. Porém, no dia de ontem (26/02/2020) apresentei-me ao trabalho às 09h30m, como era normal, fui logo avisada por um colega de trabalho de que tinha que ir para o armazém, o que não aceitei. Cerca das 09h45m chegou a gerente que de imediato comunicou que deveria despir a farda e sair do estabelecimento para, sem qualquer explicação, dizer que o horário tinha início às 10h00m. Mais acrescentando que o meu local de trabalho era o armazém e que não desempenhava quaisquer outras funções, designadamente as supra referidas. Apesar deste comportamento a gerência requisitou a presença da autoridade policial (a PSP) que passado algum tempo compareceu, identificando-me. Pelo telefone, requisitei a ACT, tendo comparecido no local a inspetora CC. Na presença destas entidades, a gerente da empregadora manteve todas as ordens já anteriormente comunicadas, acusando-me de ter roubado as folhas de presença diariamente assinadas na entrada e saída do estabelecimento, acrescentando que era uma “maluca”, dado ter revogado a anterior declaração de cessação do contrato. Acresce que o meu horário de trabalho desde a admissão é o seguinte; das 09h30m às 12h30m, das 14h00m às 19h00m, de Segunda a Sexta-feira e aos sábados das 09h30m às 13h00m perfazendo um horário semanal de 43 horas e 30 minutos. Apesar de ter horário que excede semanalmente 03h30m, a entidade empregadora nunca procedeu ao pagamento do trabalho suplementar, com manifestos prejuízos económicos e óbvias consequências nos direitos sociais (desemprego, doença e reforma). Finalmente, nunca frequentei qualquer ação de formação profissional durante a vigência do contrato. As condutas da entidade empregadora, além de serem claramente injustificadas, constituem violação dos mais elementares direitos inerentes à relação laboral, designadamente os previstos nas alíneas a) a d) do nº 1 do art.º 127º do CT. Por isso, os fatos expostos nos termos do n.º 2, alíneas a), b), d), e) e f) do art.º 394.º do CT, constituem justa causa de resolução do contrato. Estando, como está, atenta a presente comunicação, resolvido o contrato de trabalho, aguardo pelo prazo de 5 dias o seguinte: a) Pagamento de todos os créditos emergentes da cessação do contrato: salário, férias e subsídio e bem assim proporcionais de férias, subsídio de férias e subsídio de Natal respetivo ao ano de cessação; b) Pagamento de todo o trabalho suplementar - 03h30m por semana desde o início do contrato até à cessação do mesmo; c) Pagamento do tempo de formação profissional não paga nem administrada; d) Pagamento de indemnização de antiguidade; e e) Emissão de todos os documentos para efeitos de Segurança Social (declaração para efeitos de desemprego) e Certificado de Trabalho com data de admissão e cessação, cargos desempenhados e retribuição auferida. Sendo tudo o que tenho a comunicar, aguardo pelo solicitado por via postal. Atentamente». 31. Em resposta, a Ré enviou à Autora, em 04/03/2020, comunicação com o seguinte teor: «Exma. Senhora AA: Com os melhores cumprimentos. Acusamos a receção da sua carta, datada de 27/02/2020, recebida em 28/02/2020, a qual mereceu a nossa maior atenção. Desde já cumpre informá-la que não aceitamos a sua resolução com justa causa do contrato de trabalho celebrado entre nós, porquanto entendemos não se verificar nenhuma causa justificativa de tal resolução. Assim, cumpre-nos referir que as situações que descreve não correspondem, de todo, à verdade, como se demonstrará. Porquanto, se é verdade que sempre exerceu as funções de promotora de vendas, executando, entre outras, as tarefas que refere, não é verdade que tenha sido, por nós, ordenado que fosse para o armazém ou lhe fosse proibido o desempenho de quaisquer funções. Até porque, não entendemos a que se refere quando faz alusão a um armazém, pois sempre exerceu as suas funções no nosso estabelecimento comercial sito na Estrada ..., ..., em Aveiro. Tendo esta Empresa já estranhado a sua carta remetida a 17/02/2020, na qual requeria a sua reintegração no exercício das suas funções, quando, nunca esta Empresa a impediu de exercer as suas funções ou lhe deu indicações para exercer qualquer outra função que não as por si indicadas nesta carta. Sendo totalmente falso o que refere relativamente ao dia 13/02/2020, pois, como bem sabe, nesse dia, V. Exa juntamente com o trabalhador, Senhor BB, foi fazer uma entrega de produtos a um Cliente, não tendo, assim estado em qualquer armazém, nem sequer no nosso Estabelecimento Comercial, o que pode ser atestado, inclusivamente pelo próprio Cliente. Pelo que é totalmente falso que no dia 13/02/2020 lhe tenham sido dadas ordens para que fosse função para o armazém ou que lhe fosse proibido o desempenho de qualquer outra. Relativamente ao sucedido no dia 26/02/2020, efetivamente você apresentou-se ao trabalho às 09h30, tendo-lhe sido comunicado de que não poderia entrar àquela hora, uma vez que o seu horário de trabalho se iniciava apenas às 10h00, sendo por isso falso que não lhe tenha sido dada uma explicação. Ora, é de salientar que apenas requisitamos a presença da PSP, uma vez que a Senhora demonstrou resistência, quer física, quer verbal, às ordens que lhe estavam a ser dadas, nomeadamente de iniciar o seu trabalho às 10h00 e não antes. Não se entendendo, mais uma vez, a que se refere quando afirma que lhe foi dito que o seu local de trabalho era o armazém e que não ia desempenhar as suas funções, quando lhe foi dito para exercer as suas funções no nosso estabelecimento comercial sito na Estrada ..., ..., em Aveiro, onde sempre o fez. Inclusivamente, já na presença da Senhora Inspetora da ACT sempre foi por nós referido que você podia iniciar a sua prestação laboral, de imediato, até porque a loja estava repleta de clientes e por isso “havia muito trabalho para fazer”. Sendo totalmente falso que a tenhamos apelidado de “maluca” ou acusado de ter roubado as folhas de presença diárias, tendo sido apenas referido à Senhora Inspetora que as suas folhas de presença haviam desaparecido. Por outro lado, como já se referiu, o seu horário de trabalho sempre se iniciou às 10h00 e não às 09h30 como refere, pelo que não se aceita que tenha feito qualquer trabalho suplementar, tendo sido sempre o seu horário o seguinte: 10h00 às 12h30, das 14h00 às 19h00 de Segunda a Sexta-feira, e das 10h00 às 12h30 aos sábados. Pelo exposto, não podemos, assim, aceitar que exista alguma causa justificativa da sua resolução do contrato de trabalho celebrado entre nós. Aliás, na verdade, foi V. Exa. quem abandonou o posto de trabalho, sem qualquer justificação, no dia 14/02/2020, não tendo regressado ao trabalho até ao já aludido dia 26/02/2020, situação esta que poderia ter dado origem ao seu despedimento com justa causa, nos termos do art.º 351º, nº 2 g) do Código do Trabalho. Assim, não houve qualquer violação, da nossa parte, de qualquer direito inerente à relação laboral. Pelo que não aceitamos a sua resolução com justa causa, considerando-a sim uma denúncia do contrato de trabalho, sem aviso prévio, nos termos do art.º 400º e 401º do Código do Trabalho. Face ao exposto, iremos proceder ao cálculo e ao pagamento dos seus créditos laborais. Mais informamos que não iremos proceder ao pagamento da indemnização, devida por resolução do contrato de trabalho por justa causa, porque o contrato de trabalho não foi resolvido com justa causa, mas sim denunciado. Agradecemos, assim, que proceda à devolução do telemóvel que lhe foi emprestado, no prazo de 5 (cinco) dias a contar da presente. Segue em anexo a declaração da situação de desemprego e certificado de trabalho». 32. A Ré não proporcionou à Autora formação profissional. 33. Como contrapartida do seu trabalho, a Autora auferia, aquando da cessação do contrato de trabalho, a retribuição mensal ilíquida de €773,28, mais subsídio de alimentação de € 4,50 por cada dia de trabalho e duas diuturnidades, no valor de €11,50 cada. 34. Na sequência da cessação do contrato de trabalho, a Ré processou as seguintes quantias ilíquidas, em dois recibos de vencimento referentes ao mês de fevereiro de 2020: - Retribuição de fevereiro de 2020 (€368,74); - Diuturnidades (€23,00); - Subsídio de Refeição (€40,50); - Férias não gozadas de 2019 (€773,28); - Subs. de férias 2019 (€773,28); - Férias não gozadas 2020 (€142,72); - Subs. de natal 2020 (€128,88); - Subs. de férias 2020 (€142,72); - Formação Profissional (€535,20). 35. No total global ilíquido de €2.928,32, ao qual a Ré descontou €1.546,56, a título de indemnização por aviso prévio em falta, pagando à Autora, por transferência bancária, as quantias líquidas de €389,15, em 03 de março de 2020 e de €262,95, em 06 de março de 2020. 36. Em 2019, a Autora auferia, como contrapartida do seu trabalho, a retribuição mensal ilíquida de €710,00, mais subsídio de alimentação de €4,40 por cada dia de trabalho e duas diuturnidades, no valor de €11,00 cada. E foi consignado que NÃO se PROVARAM quaisquer outros factos de entre os alegados na petição inicial e contestação, nomeadamente que: − ao longo da execução do contrato de trabalho, a Autora auferiu as seguintes retribuições: €593,00 até 31/12/2015; €600,00 até 31/12/2017; €635,31 até 31/03/2018; e €654,97 até 31/10/2018. − a Autora começava a trabalhar às 09h30m, de segunda-feira a sexta-feira e aos sábados. − a gerente da Ré, depois de tomar conhecimento da decisão da Autora de denunciar o contrato de trabalho, a partir do dia 14 de fevereiro de 2020, proibiu a Autora de desempenhar as suas funções nos termos habituais, ordenando-lhe que permanecesse no armazém para arrumações, sem qualquer contacto com o público que frequentava o estabelecimento. − ato contínuo, foi retirada à Autora a chave do estabelecimento, deixando a Autora de atender os clientes, quer pessoalmente, que por escrito (via email ou telefone), porque lhe foi impedido o acesso aos equipamentos, deixando de utilizar o computador para emitir a faturação e os recibos, receber os preços e fazer o diário de caixa. − quando a Autora se apresentou ao trabalho no dia 26 de fevereiro de 2020, foi advertida por um colega de trabalho de que não poderia atender clientes e tinha de ir para o armazém. − na presença do agente da PSP e da inspetora da ACT, a gerente da Ré acusou a Autora, de viva voz, de ter roubado as folhas de presença diárias dos trabalhadores que documentavam o horário de entrada e saída do estabelecimento, apelidando a Autora de “maluca”, por ter revogado a declaração de denúncia do contrato de trabalho. − a Autora trabalhou sempre mais que 40 horas semanais. ** Da impugnação da decisão sobre matéria de facto: A Recorrente refere impugnar a decisão sobre matéria de facto, relativamente aos pontos 7., 8. e 29. dos factos provados, pronunciando-se o Digno Procurador-Geral Adjunto no parecer emitido, secundado pela Recorrida, no sentido de ser rejeitado o recurso nessa parte, por não terem sido observados os ónus impostos pelo legislador à parte recorrente que pretende impugnar a decisão sobre matéria facto. Para ver se assim é, vamos começar por fazer uma breve referência a esses ónus impostos pelo legislador. No caso de impugnação da decisão sobre matéria de facto com fundamento em erro de julgamento, é necessário que se indiquem elementos de prova que não tenham sido tomados em conta pelo tribunal a quo quando deveriam tê-lo sido; ou assinalar que não deveriam ter sido considerados certos meios de prova por haver alguma proibição a esse respeito; ou ainda que se ponha em causa a avaliação da prova feita pelo tribunal a quo, assinalando as deficiências de raciocínio que levaram a determinadas conclusões ou assinalando a insuficiência dos elementos considerados para as conclusões tiradas. É que, a reapreciação pelo Tribunal da Relação da decisão da matéria de facto proferida em 1ª instância não corresponde a um segundo (novo) julgamento da matéria de facto, apenas reapreciando o Tribunal da Relação os pontos de facto enunciados pelo interessado (que circunscrevem o objeto do recurso). No entanto, ainda que a modificação da decisão da matéria de facto se deva limitar aos pontos de facto especificamente indicados, cumprindo os requisitos estabelecidos pelo legislador, o Tribunal da Relação não está limitado à reapreciação dos meios de prova indicados por quem recorre, devendo atender a todos os que constem do processo[4]. Na verdade, embora não se trate de um novo julgamento, tendo presente o disposto no art.º 662º do Código de Processo Civil, vem-se entendendo que o Tribunal da Relação na apreciação da impugnação da decisão sobre matéria de facto usa do princípio da livre apreciação da prova com a mesma amplitude de poderes que tem a 1ª instância (art.º 607º, nº 5, do Código de Processo Civil), em ordem ao controlo efetivo da decisão recorrida, devendo sindicar a formação da convicção do juiz, ou seja, o processo lógico da decisão, recorrendo com a mesma amplitude de poderes às regras de experiência e da lógica jurídica na análise das provas, como garantia efetiva de um segundo grau de jurisdição em matéria de facto (porém, sem prejuízo do reconhecimento da vantagem em que se encontra o julgador na 1ª instância em razão da imediação da prova e da observação de sinais diversos e comportamentos que só a imagem fornece)[5]. Daí referir o nº 1 do art.º 662º do Código de Processo Civil que “a Relação deve alterar a decisão proferida sobre matéria de facto, se os factos tidos como assentes, a prova produzida ou um documento superveniente impuserem decisão diversa” (sublinhou-se), ou seja, não basta que os meios de prova admitam, permitam ou consintam uma decisão diversa da recorrida. Assim, a parte recorrente não pode simplesmente invocar um generalizado erro de julgamento tendente a uma reapreciação global dos meios de prova, não podendo a censura do recorrente quanto ao modo de formação da convicção do tribunal a quo assentar, de forma simplista, no ataque da fase final da formação de tal convicção, isto é, simplesmente em defender que a sua valoração da prova deve substituir a valoração feita pelo julgador; antes tal censura tem que assentar na violação de qualquer dos passos para a formação de tal convicção, designadamente por não existirem os dados objetivos que se apontam na motivação ou por se terem violado os princípios para a aquisição desses dados objetivos ou ainda por não ter existido liberdade de formação da convicção[6]. Como nos diz António Santos Abrantes Geraldes[7], depois de dizer que não existe, quanto ao recurso da decisão da matéria de facto, despacho de aperfeiçoamento[8], deve ter lugar a rejeição do recurso (total ou parcial) respeitante à impugnação da decisão da matéria de facto caso se verifique alguma das seguintes situações: − falta de conclusões sobre a impugnação da decisão da matéria de facto [artºs 635º, nº 4 e 641º, nº 2, al. b) do Código de Processo Civil]; − falta de especificação, nas conclusões, dos concretos pontos de facto que o recorrente considera incorretamente julgados [art.º 640º, nº 1, al. a) do Código de Processo Civil] [9]; − falta de especificação, na motivação, dos concretos meios probatórios constantes do processo ou nele registados; − falta de indicação exata, na motivação das passagens da gravação em que o recorrente se funda; − falta de posição expressa, na motivação, sobre o resultado pretendido relativamente a cada segmento da impugnação. Como frisa este autor, estas exigências devem ser apreciadas à luz de um critério de rigor, sendo, afinal, uma decorrência do princípio da autorresponsabilidade das partes[10], impedindo que a impugnação da decisão sobre matéria de facto se transforme numa mera manifestação de inconsequente inconformismo. Mas, a esse rigor deve corresponder o esforço da Relação de na reapreciação da decisão recorrida observar o disposto no art.º 662º do Código de Processo Civil que acima se referiu. Na verdade, o legislador impõe à parte recorrente, que pretenda impugnar a decisão de facto, um ónus de impugnação, devendo o recorrente expor os argumentos que, extraídos de uma apreciação crítica dos meios de prova, determinem, em seu entender, um resultado diverso do decidido pelo tribunal a quo. Com efeito, o art.º 640º, nº 1 do Código de Processo Civil, impõe ao recorrente, na impugnação da matéria de facto, a obrigação de especificar, sob pena de rejeição, o seguinte: a) os concretos pontos de facto que considera incorretamente julgados (tem que haver indicação clara dos segmentos da decisão que considera afetados por erro de julgamento); b) os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida (tem que fundamentar as razões da sua discordância, concretizando e apreciando criticamente os meios de prova constantes dos autos ou da gravação que, no seu entender, implicam uma decisão diversa); e c) a decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas. Quanto ao ónus referido na alínea b), manda o legislador (nº 2 do art.º 640º do Código de Processo Civil) que se observe o seguinte: a) quando os meios probatórios invocados como fundamento do erro na apreciação das provas tenham sido gravados, incumbe ao recorrente, sob pena de imediata rejeição do recurso na respetiva parte, indicar com exatidão as passagens da gravação em que se funda o seu recurso, sem prejuízo de poder proceder à transcrição dos excertos que considere relevantes; b) independentemente dos poderes de investigação oficiosa do tribunal, incumbe ao recorrido designar os meios de prova que infirmem as conclusões do recorrente e, se os depoimentos tiverem sido gravados, indicar com exatidão as passagens da gravação em que se funda e proceder, querendo, à transcrição dos excertos que considere importantes. Importa referir que, como é consabido, a generalidade das provas produzidas na audiência de julgamento está sujeita à livre apreciação do tribunal (como é o caso da prova testemunhal e da prova por declarações de parte – art.º 396º do Código Civil e art.º 466º, nº 3 do Código de Processo Civil). Com efeito, dispõe o nº 5 do art.º 607º do Código de Processo Civil que o juiz aprecia livremente as provas segundo a sua prudente convicção acerca de cada facto, ou seja, a apreciação da prova pelo juiz é pautada por regras da ciência e do raciocínio e em máximas de experiência, sendo a estas conforme, o que não se confunde com uma apreciação arbitrária (consiste numa conscienciosa ponderação dos elementos probatórios e circunstâncias que os envolvem)[11]. Feitas estas considerações, vejamos a impugnação apresentada pela Recorrente, tendo presente que é pacífico que a apreciação a fazer é da questão posta, de saber se houve erro de julgamento sobre a matéria de facto, sem que haja o dever de responder, ponto por ponto, a cada argumento que seja apresentado pela parte recorrente[12]. Visto o recurso apresentado pela Autora, encontramos conclusões sobre a impugnação da decisão sobre a matéria de facto, e aí encontramos identificados os pontos da matéria de facto que a Recorrente considera incorretamente julgados, a saber: os pontos 7., 8. e 29. dos factos provados [conclusões A) e K)]. Daqui decorre, tendo presentes as considerações acima expendidas, que o objeto do recurso está delimitado a eventual erro na decisão sobre esses pontos da matéria de facto. Sendo assim, não se considera que esteja impugnada a decisão sobre outros pontos da matéria de facto, como por exemplo o ponto 15. dos factos provados referido no artigo 47º da alegação (pois não está mencionado nas conclusões). Centrando-nos, então, sobre eventual erro no julgamento dos pontos 7., 8. e 29. dos factos provados, na conclusão K) encontramos o “resultado pretendido” com a impugnação da decisão da matéria de facto [indicando um ponto 1. e um ponto 2.] e, na verdade, não estando esses pontos dos factos provados relacionados entre si, não faz a Recorrente a ligação entre cada um desses pontos [1. e 2.] com os factos dos pontos 7., 8. e 29., ficando-se designadamente sem se saber porque “substitui” o ponto 2. algum daqueles pontos dos factos provados. Porém, se virmos a alegação [como se deixou expresso supra, a rejeição ocorrerá se faltar posição expressa na motivação sobre o resultado pretendido relativamente a cada segmento da impugnação], constatamos que dela decorre o seguinte: I) dos artigos 4º ao 32º da alegação, a Recorrente defende que os pontos 7., 8. e 29. dos factos provados devem ser substituídos pelo ponto 1. referido na conclusão K); II) dos artigos 33º a 48º da alegação, a Recorrente defende dever ser inserido nos factos provados um ponto com os dois parágrafos, constantes do ponto 48º da alegação, cuja ideia é semelhante à constante do ponto 2. referido na conclusão K), considerando-se o constante na conclusão (por serem as conclusões que delimitam o objeto do recurso), que corresponde grosso modo àquilo que o tribunal a quo consignou no 3º parágrafo dos factos não provados. Ou seja, afinal, conjugando com a alegação percebemos que a Recorrente, por um lado impugna a decisão de considerar os pontos 7., 8. e 29. como factos provados nos termos em que o foram, dizendo deverem ser substituídos pelo ponto 1. referido na conclusão K), e por outro lado entende dever ser transferido um ponto dos factos não provados para os factos provados, com a redação constante do ponto 2. referido na conclusão K). Sendo assim, ainda que o recurso apresentado possa não servir de modelo, não se nos afigura ser de rejeitar desde já o mesmo (nesta parte sobre a decisão da matéria de facto), vendo-se mais de perto cada um dos agora referidos segmentos do recurso [os pontos I) e II) referidos]. Vejamos então. I) dos pontos 7., 8. e 29. dos factos provados: A Recorrente agrupa estes pontos na impugnação que apresenta, depreende-se que porque o tribunal a quo na motivação da decisão sobre matéria de facto também o fez, e havendo alguma ligação entre os primeiros e o último, vai-se analisar a impugnação dos mesmos em conjunto. Comecemos por recordar a redação destes pontos dos factos provados (que acima se transcreveram): 7. A Autora cumpria um horário de trabalho de segunda-feira a sexta-feira, começando a trabalhar desde hora não concretamente apurada, não posterior às 10h00, até às 12h30m e depois das 14h00m até às 19h00m; e aos sábados, desde hora não concretamente determinada, não posterior às 10h00, até pelo menos às 12h30m. 8. Pelo menos nos sábados de 06 e 13 de abril de 2019 e de 03 e 10 de agosto de 2019, a Autora trabalhou das 10h00 às 13h00, tendo nas quatro semanas em causa trabalhado de segunda-feira a sexta-feira, pelo menos das 10h00 até às 12h30m e das 14h00m às 19h00m. 29. Foi a Autora que rubricou, pelo seu próprio punho, as “folhas de ponto” respeitantes aos meses de abril e de junho de 2019, cujos originais constam de fls. 151 e 152 dos autos, respetivamente. Como se disse, a Recorrente defende a substituição destes pontos por um só com a seguinte redação [que se traduz em eliminar o ponto 29. e substituir os primeiros por este – o ponto 1. que consta da conclusão K)]: ● A Autora durante a vigência do contrato cumpriu sempre um horário de trabalho superior a 40 horas semanais: de segunda a sexta feira das 09h30m às 12h30m e das 14h00m à 19h30m, ao sábado das 09h30m às 13h00m. Para sustentar esta alteração a Recorrente cita, e transcreve, excertos dos depoimentos das testemunhas DD e EE, discordando da circunstância de o tribunal a quo não ter dado, segundo as suas palavras, qualquer crédito a esses depoimentos, e cita, e transcreve, excertos do depoimento da testemunha FF, dizendo que “não é tão coerente como assinala a douta sentença”, acrescentando que no caso se verifica situação de inversão do ónus da prova dado que a entidade empregadora notificada para juntar o registo dos tempos de trabalho não o fez nem apresentou qualquer justificação. A Recorrida pronunciou-se pela improcedência do recurso nesta parte, citando, e transcrevendo, excertos das declarações de parte da gerente da Ré (GG) e dos depoimentos das testemunhas BB e FF, referindo também os documentos nº 3 e nº 4 juntos com a contestação, e ainda os depoimentos das testemunhas DD e EE (dizendo serem pouco merecedores de atenção), e mais cita, e transcreve, excertos do depoimento da testemunha HH. O tribunal a quo para motivar a decisão de dar estes pontos como provados, escreveu o seguinte: Nos 7., 8. e 29.: Nos respetivos articulados, as partes concordaram que a Autora trabalhava de segunda-feira a sexta-feira e aos sábados de manhã; e que de segunda-feira a sexta-feira, no período da manhã, a Autora trabalhava até às 12h30m e no da tarde, das 14h00m até às 19h00m. Discordando, porém, quanto à hora de entrada ao serviço da Autora no período da manhã, quer aos dias da semana, quer aos sábados, alegando esta que era às 09h30m e a Ré que era às 10h00m horas; e quanto à hora de saída aos sábados, alegando a Autora que era às 13h00m e a Ré que era às 12h30m horas. No que concerne à hora de entrada da Autora ao serviço no período da manhã, como se assinalou no despacho proferido no final da sessão de julgamento de 14/11/2022 – que deferiu o requerimento da Autora no sentido de ser ouvida uma testemunha sobre tal matéria – as testemunhas BB e FF prestaram depoimentos divergentes dos produzidos pelas testemunhas DD e EE (amiga da Autora há mais de 10 anos, com quem costuma tomar café de manhã), afirmando as duas primeiras referidas testemunhas que era às 10h00m e as duas últimas que a Autora tomava café com elas todos os dias de manhã na “Pastelaria ...” e que esta entrava ao serviço da Ré às 09h30m, quer os dias de semana, quer ao sábado. O depoimento da testemunha cuja inquirição se deferiu no mencionado despacho, HH – que trabalhou na “Pastelaria ...” durante 11 anos, até 2018/2019, em três turnos semanais rotativos, incluindo aos sábados, sendo o turno da manhã, que fazia de 3 em 3 semanas, das 07h00 às 14h30m – não se revelou decisivo num ou noutro sentido, já que disse apenas que a Autora costumava chegar à pastelaria entre as 09h00m e as 10h00m, sem poder afirmar se era mais para as 09h00m ou para as 10h00m. As testemunhas BB e FF, embora tenham prestado os seus depoimentos de forma segura e coerente, são trabalhadores da Ré, tendo o primeiro vivido em união de facto com a gerente da Ré e sendo o segundo filho desta, o que faz supor que possam ter interesse no desfecho da causa. Porém, do outro lado, as testemunhas DD e EE são amigas da Autora e os respetivos depoimentos pareceram-nos pouco espontâneos e nalguns pontos bastante confusos (particularmente o da testemunha EE) e inclusivamente contraditórios, nomeadamente na parte em que a testemunha DD disse que saía muitas vezes da pastelaria para o trabalho juntamente com a Autora, ao passo que a testemunha EE afirmou que a DD era a primeira a sair da pastelaria para o trabalho e saía sempre sozinha, e que a Autora saía depois, também sozinha. Tendo, por seu turno, a testemunha HH afirmado que a Autora era sempre a primeira a sair depois de tomar café e que as outras ainda ficavam sentadas à mesa. Acresce que, como se concluiu no relatório da perícia efetuada pela “Prof. J. Pinto da Costa – Centro Médico-Legal, Lda.”, constante de fls. 151 a 172 dos autos, é “provável” (grau de probabilidade de 50% a 70%) que tenha sido a Autora que rubricou pelo seu próprio punho a “folha de ponto” respeitante ao mês de abril 2019, cujo original consta de fls. 151; e “muito provável” (grau de probabilidade de 70% a 85%) que tenha sido a Autora que rubricou pelo seu próprio punho a “folha de ponto” respeitante ao mês de junho de 2019, cujo original consta de fls. 152. Perante a conclusão a que se chegou no relatório pericial e os depoimentos das testemunhas BB e FF, que afirmaram que existiam efetivamente no estabelecimento folhas de ponto e que estas eram assinadas pelos trabalhadores da Ré, considera-se provado que foi efetivamente a Autora que rubricou as referidas folhas de ponto – em que consta como hora de entrada da Autora ao serviço as 10h00m. De acordo com as regras de distribuição do ónus da prova, consagradas no art.º 342º, nº 1 do Cód. Civil, cabia à Autora demonstrar factos que permitissem concluir que prestou trabalho em condições passíveis de conduzir à sua qualificação como trabalho suplementar, designadamente que entrava ao serviço às 09h30m – como alegou. E como estabelece o art.º 414º do Cód. de Processo Civil, a dúvida sobre a realidade de um facto, resolve-se contra a parte a quem o facto aproveita. Pelo que as dúvidas que no descrito contexto se suscitam sobre se a Autora começava ou não a trabalhar para a Ré às 09h30m funcionam contra a Autora, com a consequência de não se dar como provada tal alegação. No que respeita à hora de saída da Autora aos sábados, as testemunhas BB e FF afirmaram que era às 12h30m horas, sem que se tenha produzido qualquer prova em sentido diferente, a não ser em relação aos sábados de 06 e 13 de abril de 2019 e de 03 e 10 de agosto de 2019, em que a Autora trabalhou das 10:00 horas às 13:00 horas, de acordo com a “folha de ponto” do mês de abril de 2019, constante de fls. 151 dos autos, rubricada pela Autora, e com a “folha de registo das horas trabalhadas” pela Autora no mês de agosto de 2019, junta ao processo pela Ré a fls. 66. Folhas essas das quais resulta ainda que a Autora, nas quatro semanas em causa, trabalhou de segunda-feira a sexta-feira, pelo menos das 10:00 horas até às 12h30m e das 14h00m às 19h00m. Como se vê, o tribunal a quo formou a sua convicção de forma diferente em relação às horas de entrada ao trabalho (todos os dias) e em relação às horas de saída do trabalho nos sábados. Com efeito, quanto às primeiras [horas de entrada ao trabalho (todos os dias)], aquilo que resulta é que o tribunal a quo, perante versões contraditórias, ficou com dúvidas sobre se a Autora entrava ao trabalho pelas 09h30m, entendeu que o ónus da prova de tal facto cabia à Autora [facto constitutivo do seu direito, na medida em que tal permitiria concluir que excedia as 40 horas semanais, como alegou[13], ou seja, que prestou trabalho suplementar], e por isso deu redação próxima da versão da Ré [entrada pelas 10 horas[14]]. Já quanto à hora de saída aos sábados, o tribunal a quo atendeu aos depoimentos das testemunhas BB e FF, considerando que não foi produzida prova em sentido diferente. Tenha-se presente que na apreciação da prova o julgador conjugará todos os elementos de prova produzidos sobre a matéria a provar, sendo o que refere o acórdão desta Secção Social do TRP de 04/05/2022[15]: a prova dum facto há de resultar da conjugação de todos os meios de prova produzidos sobre um mesmo facto, ponderando-se a coerência que exista num determinado sentido e aferindo-se esse resultado convergente em termos de razoabilidade e lógica. Ou seja, não é porque alguém diz algo que fica provado, impondo-se a conjugação com os demais elementos de prova, e que o julgador forme convicção nesse sentido. De resto, não se pode esquecer que um depoimento não se resume a palavras, havendo todo um contexto a interpretar (por exemplo, esgares, silêncios, hesitações, monossílabos, as pausas, o olhar, a postura, a colocação das mãos, etc)[16]. Passando à análise da impugnação da decisão sobre os pontos 7. e 8. dos factos provados, que se reportam, como se disse, por um lado “a hora de entrada” (de segunda a sábado) e por outro lado “a hora de saída aos sábados”, vistos todos os excertos das declarações depoimentos, não se forma convicção de que os horários praticados fossem aqueles que a Recorrente pretende ficassem como provados. A questão vem, então, a traduzir-se em saber se o ónus da prova das horas de entrada e saída cabia à Autora, como refere o julgador a quo, ou se antes se houve inversão do ónus da prova, como defende a Recorrente, de modo a depois ponderar as consequências a retirar da dúvida sobre a realidade dos factos. Ao trabalhador cabe demonstrar ter prestado trabalho suplementar, como facto constitutivo do seu direito a receber o acréscimo de remuneração devido por essa prestação, cabendo-lhe alegar quando prestou o trabalho suplementar em concreto (não em termos genéricos, para poder haver contraditório), e depois demonstrá-lo. Tendo presente este ónus da prova, o tribunal a quo, apelando ao disposto no art.º 414º do Código de Processo Civil – segundo o qual a dúvida sobre a realidade de um facto … resolve-se contra a parte a quem o facto aproveita – não deu como provada a versão da Autora, dando uma redação próxima da versão da Ré. Sustenta a Recorrente que requereu na PI a junção, por parte da Ré, das folhas de presença diariamente assinadas pelos trabalhadores, de onde conste a entra e saída do trabalho, correspondente ao período em que durou o contrato de trabalho, o tribunal a quo notificou a Ré para essa junção, mas esta nada juntou nem deu qualquer explicação para essa junção, acrescentando que, em face do que consta dos pontos 25., 26. e 28. dos factos provados, é legítimo concluir que a gerente da Ré dolosamente não exibiu as folhas de ponto que de facto existiam. Cumpre esclarecer que, a este propósito, refere a Recorrente as declarações de parte da gerente da Ré prestadas em audiência de discussão e julgamento (artigo 18º da alegação), mas sem situar qualquer excerto na gravação, donde não se considerarem aqui as mesmas. Por outro lado, o facto de ficar estabelecido no contrato de trabalho reduzido a escrito [junto ao processo com o articulado de contestação – doc. nº 1 – cláusula 5ª, alínea a)] que “a trabalhadora fica obrigada ao seguinte período normal de trabalho a) um período semanal de trabalho de 40 (quarenta) horas, o que se traduz num período de trabalho diário de 8 (horas) horas”, não garante de todo que na execução do contrato não fosse observado um horário diverso [uma alteração tácita, portanto], não se podendo ser retirada a conclusão que a Recorrente pretende de que as 40 horas eram esgotadas de segunda a sexta feira (artigo 21º da alegação). De referir ainda, em face do alegado pela Recorrente, que do eventual desrespeito de imposições legais (como de manter os registos de trabalho em local acessível e por forma permitir a sua consulta imediata) não decorre automaticamente a inversão de algum ónus da prova. A posição da Recorrida é de que cumpriu com o dever de cooperação para a descoberta da verdade material, não procedendo a alegação da Recorrente. Vejamos então. O art.º 344º, nº 2 do Código Civil dispõe que há inversão do ónus da prova quando a parte contrária (no caso o empregador) tiver culposamente tornado impossível a prova ao onerado (no caso o trabalhador). Por sua vez, o nº 2 do art.º 417º do Código de Processo Civil dispõe que [a]queles que recusem a colaboração devida são condenados em multa, sem prejuízo dos meios coercitivos que forem possíveis; se o recusante for parte, o tribunal aprecia livremente o valor da recusa para efeitos probatórios, sem prejuízo da inversão do ónus da prova decorrente do preceituado no nº 2 do artigo 344º do Código Civil. Como se disse no acórdão desta Secção Social do TRP de 18/09/2023[17], a parte, quando é notificada para a junção dos documentos tem que estar conhecedora da possibilidade da inversão do ónus da prova [no voto de vencida da 2ª adjunta, foi defendido que previamente à aplicação da cominação da inversão do ónus da prova, deveria a Ré ter sido expressamente notificada no sentido da possibilidade da sua aplicação], só assim podendo ser retiradas as consequências previstas pelo legislador. De resto, não se pode esquecer que não é oportuno vir suscitar questões em recurso que antes o não foram[18]. Ora, in casu, compulsado o processo, verifica-se que, na verdade, a Autora no final da PI requereu, entre o mais, que a Ré procedesse à junção das folhas de presença diariamente assinadas pelos trabalhadores, de onde conste a entra e saída do trabalho, correspondente ao período em que durou o contrato de trabalho (ponto 2. do requerimento probatório), juntando depois a Ré, como doc. nº 4 com o articulado da contestação, aquilo que designou como “folhas de presença assinadas pela própria Autora” (artigo 11º), tendo em 19/10/2021 o tribunal a quo proferido despacho dizendo [d]everá a Ré juntar ao processo, no prazo de 10 dias, os documentos a que a Autora alude nos pontos 1, 2, 3, 4 e 5 da petição inicial, que ainda não tenha apresentado, tendo tal despacho sido notificado às partes. Em 24/10/2022 a Ré apresentou requerimento no processo referindo que, a propósito dos documentos a que a Autora alude no ponto 2. da sua petição inicial, mais concretamente as folhas de presença diariamente assinadas pelos trabalhadores, a Ré já juntou aos presentes autos, vidé doc. nº 4 da contestação, todas as folhas de presença que tem na sua posse (artigo 4º desse requerimento), tendo havido notificação desse requerimento entre mandatários. Depois, nada mais se alcança no processo sobre tais documentos. Como se vê, ao contrário do referido pela Recorrente, a Ré procedeu à junção de documentos, e explicou, depois da notificação, que não dispunha de mais. Acresce que não houve qualquer referência, em 1ª instância, à possibilidade da inversão do ónus da prova, não tendo sido referido à Ré que a não junção poderia conduzir a essa consequência. Sendo assim, sem necessidade de considerações mais desenvolvidas, improcede toda argumentação da Recorrente, não se podendo dizer haver lugar a inversão do ónus da prova, e não havendo fundamento que imponha a alteração do decidido quanto a esta matéria de facto (pontos 7. e 8. dos factos provados). Importa agora fazer referência ao ponto 29. dos factos provados. Este não se trata de facto que releve diretamente para a decisão da causa, traduzindo-se num elemento de credibilização de um meio de prova (as “folhas de ponto” juntas pela Ré com o articulado de contestação). Ou seja, a perícia teve em vista aferir da credibilidade a dar às “folhas de ponto” como meio de prova da versão da Ré, já que a Autora negou que as rúbricas delas constantes tivessem sido apostas por si[19] – e só sendo as rúbricas da autoria da trabalhadora, se poderia dizer que horas de entrada e saída constantes das “folhas de ponto” foram por ela validadas. Todavia, tal facto pode vir a relevar para aferir da litigância de má-fé por parte da Autora, donde a sua inclusão nos factos provados. Vista a impugnação apresentada, aquilo que se pode dizer é que a argumentação da Recorrente não afasta a sua prova, tendo o julgador a quo conjugado o resultado da perícia à letra (cujo grau de probabilidade supera os 50%) com os depoimentos das testemunhas BB e FF (estes na medida em que referiram a sua existência). Ora, não se nos afigura que tenha algum relevo, para aferir da autoria das rúbricas, a circunstância de as testemunhas BB e FF terem referido a existência das “folhas de ponto”. Mais relevante seria a circunstância de a própria trabalhadora reconhecer na PI a existência destes documentos (donde ter solicitado a sua junção), só impugnando a assinatura (rubrica) constantes daqueles que foram juntos. Ou seja, temos que nos centrar no resultado da perícia realizada [como se escreveu no acórdão do TRG de 07/06/2018[20], os factos a apurar [autoria das rúbricas] apresentam feição essencialmente técnica, sendo compreensível, aos olhos de todos, que o juízo técnico-científico exerça aqui uma influência predominante, não se podendo esquecer que na generalidade dos exames à letra não há uma aproximação à certeza. Visto o “relatório pericial” junto ao processo, vemos que dele consta ser “provável” [quanto às rúbricas constantes de uma das “folhas”] e “muito provável” [quanto às rúbricas constantes da outra] que as rúbricas tenham sido manuscritas pelo punho da Autora, o que significa mais que uma possibilidade, sendo uma plausibilidade, uma presumível realidade, isto é, é mais provável terem sido apostas pela Autora do que o contrário[21]. Sendo assim, superando o grau de probabilidade constante do resultado da perícia à letra os 50%, não se impõe alterar o decidido em 1ª instância. Sendo assim, o ponto 29. dos fatos provados mantém-se como provado. II) do inserção nos factos provados dum ponto com a redação do ponto 2. referido na conclusão K): Pretende a Recorrente que se considere provado o seguinte [como consta do ponto 2. da conclusão K), como se disse], facto que corresponde grosso modo ao que o tribunal a quo consignou como não provado (§ 3º dos factos não provados): ● A gerente da Ré, depois de tomar conhecimento da decisão da Autora de denunciar o contrato e trabalho, a partir de 14 de fevereiro de 2020, proibiu a de desempenhar as funções nos termos habituais, ordenando-lhe que permanecesse no armazém para arrumações, sem qualquer contacto com o público que frequentava o estabelecimento e sem acesso aos utensílios e meios de trabalho. Para sustentar a sua posição cita, e transcreve, a Recorrente excerto do depoimento da testemunha BB, acrescentando não ser plausível que o tribunal a quo considere provada a factualidade consignada no ponto 15. dos factos provados [que, como se deixou expresso supra, não se considera impugnado, por falta de observância dos ónus impostos pelo legislador à parte recorrente, mas a ficar provado este ponto, excluirá, pelo menos a parte final do ponto 15. dos factos provados]. A Recorrida diz que a Autora no dia em causa não foi trabalhar para qualquer armazém, citando, e transcrevendo, excertos dos depoimentos das testemunhas BB, FF, II, JJ, DD e KK. O tribunal motivou a sua decisão, para considerar como não provado, escrevendo que no tocante à matéria de facto controvertida que não foi considerada provada, a convicção do tribunal assentou, para além do que ficou já dito, na ausência de prova produzida em julgamento passível de a demonstrar. Sucede que, lendo todos os excertos de depoimentos indicados pela Recorrente e Recorrida, vemos que não resulta de modo algum suporte para dar como assente este facto que a Recorrente pretendia ficasse provado, não levando a formar convicção diversa da formada em 1ª instância (os excertos levam a formar idêntica convicção). Sendo assim, não se insere este facto entre os provados, improcedendo o recurso também nesta parte. ** Da remuneração do trabalho suplementar:Como é sabido, o trabalho suplementar é o prestado fora do “horário de trabalho”, sendo o mesmo remunerado com acréscimos. Aqui estava em causa passar a constar nos factos provados a prestação de trabalho em horário diferente, mais alargado, do que aquele que ficou a constar nos factos provados. Tendo improcedido a alteração nos factos provados propugnada pela Recorrente, decorre a improcedência do recurso nesta parte. Assim, nada há a alterar quanto ao decidido em 1ª instância sobre trabalho suplementar. * Da justa causa para resolução do contrato de trabalho:O tribunal a quo considerou que não se pode concluir pelo preenchimento dos requisitos necessários ao reconhecimento da existência de justa causa na resolução operada pela Autora, escrevendo essencialmente o seguinte: Porém, apenas se provou, nessa matéria: − Que a Autora se apresentou ao trabalho já fardada, no dia 26/02/2020, por volta das 09h30m, tendo-lhe a gerente da Ré dito que não estava na sua hora de trabalho e para esperar lá fora pelas 10h00. Tendo-se a Autora recusado a sair e insistindo em permanecer no estabelecimento e começar a trabalhar, falando em voz alta e de forma agressiva, em frente aos clientes que se encontravam no estabelecimento, dizendo que não saía. Em face do que a gerente da Ré chamou a PSP, tendo a Autora, por seu turno, solicitado telefonicamente a comparência da ACT. − Que pelo menos nos sábados de 06 e 13 de abril de 2019 e de 03 e 10 de agosto de 2019, a Autora trabalhou das 10h00 às 13h00, tendo nas quatro semanas em causa trabalhado de segunda-feira a sexta-feira, pelo menos das 10h00 até às 12h30m e das 14h00 às 19h00. O que significa que prestou, em cada um desses sábados, meia hora de trabalho suplementar, no valor global de €16,88 – que a Ré não provou ter-lhe pago. − Que a Ré não proporcionou à Autora formação profissional. No que concerne ao episódio do dia 26/02/2020, não se tendo demonstrado que a hora de entrada ao serviço da Autora era às 09h30m, não pode concluir-se que a Ré tinha obrigação de permitir que a trabalhadora iniciasse a sua prestação laboral à referida hora. E o comportamento da Autora, ao recusar-se a sair, insistindo em começar a trabalhar, em voz alta e de forma agressiva, perante clientes que se encontravam no estabelecimento, justifica a chamada da PSP, por parte da gerente da Ré. Sendo evidente que o desentendimento ocorrido nesse dia entre a Autora e a gerente da Ré e as reações de ambas, tiveram como pano de fundo as missivas que trocaram dias antes, com o teor transcrito nos nos 18 e 19 dos factos provados. Quanto ao trabalho suplementar prestado em 4 sábados, à razão de meia hora em cada um (a que corresponde, como se viu, retribuição no valor global de €16,88) e à não prestação à Autora de formação profissional, tratam-se de factos que não revestem gravidade suficiente para fundamentar o direito à resolução contratual por parte da Autora. Não havendo de resto notícia que esta alguma vez se tenha contra isso insurgido, antes de resolução contratual que operou, nomeadamente solicitando o pagamento do trabalho suplementar ou a prestação da formação. Em suma, do que se provou, não se retira a prática pela Ré de comportamentos ilícitos, culposos, ofensivos da dignidade da Autora ou violadores de garantias legais que lhe assistam, enquanto trabalhadora ao seu serviço, que pela sua gravidade e consequências, sejam de molde a tornar imediata e praticamente impossível a manutenção do vínculo laboral. A Recorrente discorda deste entendimento, dizendo que estão reunidos os requisitos legais a que se refere o nº 1 e nº 2 alíneas a), b), d) e f) do artigo 394º do Cód. do Trabalho. Está em causa o envio da carta referida no ponto 30. dos factos provados, com o assunto “resolução do contrato de trabalho com justa causa – art.º 394º do Código do Trabalho”. O nº 1 do art.º 394º do Código do Trabalho[22] prevê a possibilidade de o trabalhador fazer cessar imediatamente o contrato no caso de ocorrer justa causa[23], estabelecendo os seus nos 2 e 3 situações que, entre outras, constituem justa causa, as quais estão relacionadas com os deveres do empregador e garantias do trabalhador (artos 127º e 129º do Código do Trabalho). Nos termos do nº 1 do art.º 395º do Código do Trabalho, o trabalhador deve comunicar a resolução do contrato ao empregador, por escrito, com indicação sucinta dos factos que a justificam, nos 30 dias subsequentes ao conhecimento dos factos. Pode dizer-se ser pacífico que na apreciação da justa causa há apenas que ter presentes os factos invocados na comunicação escrita do trabalhador à entidade empregadora (art.º 395º, nº 1 do Código do Trabalho), não podendo outros ser invocados judicialmente[24]. Para aferição concreta da existência de justa causa, o nº 4 do art.º 394º do Código do Trabalho manda atender aos critérios de apreciação da justa causa disciplinar com as necessárias adaptações, pelo que se impõe a verificação de três requisitos para que se configure uma situação de justa causa subjetiva, a saber: i) comportamento do empregador violador dos direitos ou garantias do trabalhador; ii) atribuição desse comportamento ao empregador a título de culpa (sendo certo que, porque nos encontramos no domínio da responsabilidade contratual, há uma presunção de culpa do não cumpridor – art.º 799º do Código Civil)[25]; iii) o comportamento do empregador tem que tornar imediata e praticamente impossível para o trabalhador a subsistência do vínculo laboral[26]. Estas são situações em que o empregador falta culposamente ao cumprimento dos deveres emergentes do contrato de trabalho, só podendo o trabalhador resolver o contrato se do comportamento do empregador resultar uma justa causa para desvinculação: tem que existir um comportamento ilícito, culposo e que, em razão, da sua gravidade, implique a insubsistência da relação laboral[27]. O nº 2 do art.º 394º do Código do Trabalho refere que constituem justa causa de resolução do contrato pelo trabalhador, nomeadamente (exemplos-padrão) os comportamentos do empregador que enumera (transcrevendo-se as alíneas citadas pela Recorrente): a) falta culposa de pagamento pontual da retribuição; b) violação culposa de garantias legais ou convencionais do trabalhador, designadamente a prática de assédio praticada pela entidade empregadora ou por outros trabalhadores; c) (…) d) falta culposa de condições de segurança e saúde no trabalho; e) lesão culposa de interesses patrimoniais sérios do trabalhador; f) ofensa à integridade física ou moral, liberdade, honra ou dignidade do trabalhador, punível por lei, incluindo a prática de assédio denunciada ao serviço com competência inspetiva na área laboral, praticada pelo empregador ou seu representante. No caso sub judice, a Autora, na carta remetida à Ré [ponto 30. dos factos provados], imputou à sua empregadora essencialmente o seguinte: a) em 13/02/2020 a gerência da Ré ordenou que fosse para o armazém [o que não se inclui nas tarefas que desempenhava], proibindo-a de desempenhar quaisquer outras funções, dizendo que tal ocorreu porque manifestara a intenção de denunciar o contrato de trabalho [em 12/02/2020 a trabalhadora enviara carta a comunicar a denúncia do contrato com aviso prévio, e em 17/02/2020 comunicou que revogava essa denúncia – pontos 9. e 18. dos factos provados], situação que se manteve no dia seguinte; b) em 26/02/2020 apresentou-se ao trabalho pelas 09h30m, tendo colega de trabalho dito que teria que ir para o armazém, o que não aceitou, e pelas 09h45m chegou a gerência que lhe disse para despir a farda e aguardar fora do estabelecimento a hora do início do trabalho (10 horas), chamando a empregadora a PSP e a trabalhadora a ACT; c) o seu horário de trabalho excede em 03h30m o horário normal de trabalho, e a empregadora nunca remunerou esse trabalho suplementar; d) nunca frequentou formação profissional. Sendo estas as condutas imputadas, importa ver o que ficou provado. Quanto ao sucedido em 13/02/2020 [alínea a)] nada consta dos factos provados, donde não ser de considerar. Quanto ao sucedido em 26/02/2020 provou-se o que consta dos pontos 20. a 28. dos factos provados, afigurando-se-nos que, tal como refere a sentença recorrida, tal terá sucedido na sequência das cartas que as partes (primeiro a trabalhadora, depois a empregadora) trocaram nos dias anteriores. Não se nos afigura que seja relevante que a Autora se apresentasse ao trabalho antes da hora de entrada, pois, independentemente disso, não se pode dizer ser correto determinar-lhe “para esperar lá fora” [ponto 21. dos factos provados], como se estivesse num local onde não era bem querida, como se não fosse o seu local de trabalho. Porém, também não se pode aprovar a conduta da trabalhadora para com a gerência da Ré, descrita no ponto 22. dos factos provados [note-se que falou em voz alta e tom agressivo, em frente a clientes]. É que, não só a empregadora como também a trabalhadora, têm deveres, que passam pelo respeito mútuo, para com companheiros de trabalho e para com quem se relaciona com a empresa – artos 127º e 128º do Código do Trabalho. Ora, tem que se ponderar todo o contexto, e dessa forma não se retira desta conduta da empregadora, só por si, uma gravidade tal que torne imediata e praticamente impossível para o trabalhador a subsistência do vínculo laboral, impondo-se ver as demais condutas imputadas (ponderando aquilo que se apurou). Relativamente ao trabalho suplementar [alínea c)] não ficou provado que todas as semanas fossem prestadas três horas e meia como trabalho suplementar (a impugnação sobre a decisão sobre matéria de facto improcedeu), apenas ficando provada a prestação de trabalho suplementar em 4 sábados, que não foi remunerado, como devia, sendo o valor da retribuição €16,88. Quanto à formação profissional [alínea d)], ficou demonstrado que não foi proporcionada [ponto 32. dos factos provados]. Porém, claramente não será daqui que resulta uma gravidade, que a acrescer ao referido na alínea b), nos leve a dizer que se tornou imediata e praticamente impossível para o trabalhador a subsistência do vínculo laboral. Assim, concluímos, como a sentença recorrida, que não pode, por isso, concluir-se pelo preenchimento dos requisitos necessários ao reconhecimento da existência de justa causa na resolução operada pela Autora. Mas para que dúvidas não haja (como se dirá infra a Ré no articulado de contestação aponta outra forma de cessação do contrato de trabalho), deixa-se expresso que a forma de cessação do contrato de trabalho foi a resolução promovida pela trabalhadora, ainda que de forma irregular[28]. Improcede, então, o recurso nesta parte. * Da consideração da dedução aos créditos devidos à Autora do valor relativo a indemnização à Ré por falta de aviso prévio:Como consta dos pontos 34. e 35. dos factos provados, a Ré considerou serem devidos, aquando da cessação do contrato de trabalho, créditos no valor de €2.928,32, descontando a esse valor a quantia de €1.546,56 a título de “indemnização por aviso prévio em falta”. O tribunal a quo considerou ser devida (além da quantia relativa a remuneração por trabalho suplementar prestado) a quantia de €3.089,52, mantendo a dedução da “quantia relativa a indemnização por aviso prévio em falta”, que considerou ser de €1.592,56. Alega a Recorrente que o tribunal a quo jamais poderia considerar essa dedução, porquanto a Ré na contestação não deduziu qualquer pedido reconvencional ou outro (compensação), limitando-se a pedir a mera improcedência da ação. A Recorrida defende que bem decidiu o tribunal a quo ao considerar que a Autora tem que indemnizar a Ré nos termos do art.º 399º do Código do Trabalho, não sendo ilegal o desconto efetuado (citando o acórdão desta Secção Social do TRP de 29/11/2010, processo nº 264/09.4TTMAI.P1[29]), não tendo que deduzir reconvenção na medida em que considerava já ter liquidado todos os créditos salariais, ao que acresce não poder a Recorrente pedir (apenas) em recurso essa devolução. Visto o articulado da contestação apresentado, oportunamente, pela Ré no processo, verifica-se que a mesma defendeu que não se configura justa causa para resolução do contrato de trabalho, nos termos do art.º 394º do Código do Trabalho, traduzindo a comunicação, em 27/02/2020, uma denúncia do contrato por parte da trabalhadora, sem observar o período de aviso prévio, donde ter descontado o valor relativo à indemnização por falta do período de aviso prévio nos termos do art.º 401º do Código do Trabalho (ao que parece, diretamente, não por remissão do art.º 399º do Código do Trabalho), nada devendo à Autora; concluiu a contestação dizendo dever a ação ser julgada totalmente improcedente e ser a Ré absolvida do pedido, ou seja, não foi apresentada reconvenção [como é sabido deve ser deduzida separadamente na contestação – art.º 583º, nº 1 do Código de Processo Civil] nem foi (expressamente) invocada a compensação [como causa de extinção de obrigação – art.º 847º do Código Civil]. Na carta remetida pela Ré à Autora, em 04/03/2020 [em resposta à carta em que a Autora comunicara a resolução do contrato de trabalho com justa causa], a Ré refere, entre o mais, não aceitar a resolução com justa causa, considerando haver denúncia do contrato de trabalho, sem aviso prévio, dizendo que vai proceder ao cálculo e pagamento dos créditos laborais, esclarecendo que não pagará indemnização devida por resolução do contrato de trabalho por justa causa, porque foi denunciado [cfr. ponto 31. dos factos provados, que reproduz o teor dessa carta]. Como se vê do “recibo de vencimento” [junto pela Ré em 24/10/2022, depois de notificação para tanto, aquando da prolação do despacho saneador, na sequência do requerido pela Autora no final da PI], reportado de 29/02/2020, a Ré, procedendo às “contas finais”, inseriu um item «Desconto Pré Aviso”, abatendo o valor de duas retribuições base [2 x € 773,28], a ele se referindo o ponto 35. dos factos provados. Todavia, entendendo a Ré que o contrato não cessou por resolução com justa causa (em contrário do que fora invocado na PI), não formulou pedido ao tribunal, quando apresentou contestação, no sentido de que, em face da forma como cessou o contrato de trabalho, tinha direito a indemnização por não observância do aviso prévio. De todo o modo, aquilo que está em causa no recurso, é aferir da aplicação pelo tribunal a quo do disposto no art.º 399º do Código do Trabalho, a saber: não se provando a justa causa de resolução do contrato, o empregador tem direito a indemnização dos prejuízos causados, não inferior ao montante calculado nos termos do artigo 401º [indemnização de valor igual à retribuição base e diuturnidades correspondentes ao período de aviso prévio em falta, sem prejuízo de indemnização por danos causados pela inobservância do prazo de aviso prévio ou de obrigação assumida em pacto de permanência]. Sendo assim, a questão não se enquadra como faz a Recorrida, ou seja, não está em causa saber se a Recorrente podia, ou não, pedir em recurso a entrega do valor da indemnização “retida” (deduzida) pela Ré, estando sim em causa saber se o tribunal a quo podia, ou não podia, considerar a dedução de indemnização por falta de aviso prévio operada pela Ré nos créditos devidos à Autora, sem que tivesse a Ré formulado no processo pedido ao tribunal no sentido de que fosse reconhecido ser-lhe devida essa indemnização, mas alegando que procedeu a essa compensação (cfr. artigo 133º do articulado da contestação). A indemnização devida pelo trabalhador pela resolução do contrato de trabalho por si levada a cabo, sem que prove a justa causa e sem o cumprimento do aviso prévio, tem subjacente a proteção dos interesses da empregadora, com vista, nomeadamente, a que esta possa providenciar, em tempo útil, pela substituição do trabalhador sem prejudicar a atividade da empresa, vindo a entender-se de forma uniforme que a mesma funciona automaticamente, pelo simples facto de o trabalhador ter feito cessar a sua relação laboral sem cumprir – ou cumprindo apenas parcialmente – o prazo de aviso prévio, independentemente de a entidade empregadora ter com isso sofrido ou não quaisquer efetivos danos[30]. Mas, pergunta-se: tendo o trabalhador a haver créditos do empregador, e em montante superior ao valor dessa indemnização, pode o tribunal considerar uma compensação feita pelo empregador aquando das “contas finais”, sem que o empregador tenha formulado pedido ao tribunal que considerasse essa indemnização? [sem entrar agora, porque indiferente para a questão a decidir, na questão que a Recorrente refere de saber se deduzindo reconvenção, se excecionando a compensação de créditos (facto extintivo)[31]] Ora, a compensação não tem que ser declarada em juízo, não impedindo o legislador, logo sendo permitido, que o empregador proceda à compensação de retribuição em dívida com crédito que tenha sobre o trabalhador, no caso de o contrato de trabalho ter cessado, como se retira do art.º 279º, nº 1 do Código do Trabalho, a contrario. Isso mesmo disse o acórdão desta Secção Social do TRP de 29/11/2010, citado pela Recorrida (acima referido), que tratou da questão de saber se a empregadora estava impedida de deduzir aos créditos devidos à trabalhadora o valor da indemnização por “incumprimento de aviso prévio”, sendo decidido que não existe esse impedimento (essencialmente porque feita depois de o contrato de trabalho cessar). E se nos acórdãos desta Secção Social do TRP de 29/06/2015 (acima referido) e de 23/02/2015[32], está dito que essa indemnização funciona automaticamente desde que requerida pela empregadora, nos mesmos essa questão não foi colocada/tratada, pois nesses processos existia reconvenção deduzida, algo de semelhante se passando no acórdão do STJ de 07/10/2003[33], no qual se escreveu que não há que condenar o autor no pagamento à ré-reconvinte de indemnização por não concessão de aviso prévio se esta não formulou esse pedido na reconvenção deduzida, pois a questão aí é da existência de reconvenção mas sem contemplar o pedido da indemnização em causa. Com similitude à situação em causa neste processo, é a situação subjacente ao acórdão do TRL de 23/02/2022[34], processo em que estava em causa a resolução de contrato de trabalho (de serviço doméstico), tendo ficado assente que a ali ré pagou à ali autora quantia relativa a créditos depois de ter retirado o valor correspondente à compensação devida pela autora face à denúncia não precedida do aviso prévio exigido por lei, se escreveu que não pode o tribunal operar, ex oficio, uma compensação de créditos sem a mesma ter sido pedida pela ré e sem pela mesma ter sido deduzida reconvenção. Todavia, afigura-se-nos que a doutrina citada neste último aresto se refere à questão de saber se a compensação tem, ou não, que ser operada por reconvenção, que tem pertinência quando a compensação não foi operada extrajudicialmente, mas já não quando a situação está em saber se é de considerar, ou não, uma compensação efetuada extrajudicialmente, como é a que agora nos ocupa. Tem pertinência citar o referido no acórdão do STJ de 13/04/2021 (Secção Cível)[35], dizendo [t]endo presente que o direito processual serve a correta ordenação das situações de direito substantivo, dificilmente se compreenderia a imposição de formular pedido reconvencional a quem não se sente credor da contraparte. O que o réu pretenderá demonstrar é que já não era devedor quando foi demandado, porque o pagamento havia sido realizado por meio de compensação. Não pretende demonstrar que é credor da contraparte [36]. Ou seja, estando em questão saber se a empregadora podia ter efetuado a compensação da referida indemnização com créditos, se a mesma foi lícita, invocando a empregadora esse “desconto” (leia-se “compensação”), tudo está em saber se o art.º 279º, nº 1 do Código do Trabalho o possibilita, e isso já vimos que sim. Quer isto dizer que, no caso em apreço, o tribunal a quo podia considerar a compensação que a Ré operou. Sucede que, a Ré na referida indemnização considerou, como se disse já, o valor de duas retribuições base [2 x €773,28 = €1.546,56], como resulta dos pontos 33. e 35. dos factos provados, mas o tribunal a quo, uma vez que os artos 399º e 401º do Código do Trabalho falam em valor igual à retribuição base e diuturnidades, considerou o valor de duas retribuições base mais 4 diuturnidades, duas em cada mês, como consta do ponto 33. dos factos provados [(2 x €773,28) + (2 x €11,50 x 2) = €1.592,56]. Ora, nesta parte, na consideração das diuturnidades, é que o tribunal a quo já não podia entrar porque já extravasa a questão que podia apreciar – saber se a Ré podia ter operado a compensação –, pois está em causa um valor superior ao compensado, donde já só poder ser apreciado/considerado se houvesse pedido expresso nesse sentido[37]. Quer isto dizer que em vez de €115,20 ilíquidos a título de créditos laborais em dívida, a Autora tem a haver da Ré €161,20 [€3.089,52 (o devido) – €1.546,56 (o valor da indemnização, compensado) – €1.381,76 (o pago, mas em termos líquidos)]. Procede, então o recurso, nesta parte, mas apenas parcialmente. * Da litigância de má-fé:O tribunal a quo condenou a Autora como litigante de má-fé, fundamentando da seguinte forma: Para demonstrar a alegação de que a Autora não entrava ao serviço às 09h30m – como esta tinha alegado na petição inicial, para fundamentar o pedido de condenação no pagamento de trabalho suplementar – mas às 10h00m, a Ré juntou ao processo com a contestação, como documento n.º 3, mapa de horário de trabalho dos seus trabalhadores e “folhas de ponto” referentes aos meses de abril e junho de 2019, em relação à Autora, alegando que essas folhas de ponto foram rubricadas pela Autora. Em resposta, a Autora afirmou que tais rúbricas não foram feitas por si, sendo falsas, impugnando-as para os efeitos do disposto no art.º 444º do Cód. de Processo Civil e alegando que é a Ré que falta à verdade, com o objetivo de a prejudicar e entorpecer a realização da justiça, pedindo a sua condenação como litigante de má-fé. Na sequência dessa resposta e do pedido de condenação como litigante de má-fé nela formulado, a Ré reafirmou que a Autora rubricou pelo seu próprio punho as “folhas de ponto” juntas ao processo, requerendo a realização de exame pericial para o comprovar. No relatório da perícia efetuada pela “Prof. J. Pinto da Costa - Centro Médico-Legal, Ld.ª”, constante de fls. 151 a 172 dos autos, concluiu-se que é “provável” (grau de probabilidade de 50% a 70%) que tenha sido a Autora que rubricou pelo seu próprio punho a “folha de ponto” respeitante ao mês de abril 2019, cujo original consta de fls. 151; e “muito provável” (grau de probabilidade de 70% a 85%) que tenha sido a Autora que rubricou pelo seu próprio punho a “folha de ponto” respeitante ao mês de junho de 2019, cujo original consta de fls. 152. Perante a conclusão a que se chegou no relatório pericial e os depoimentos das testemunhas BB e FF – que afirmaram que existiam efetivamente no estabelecimento folhas de ponto e que estas eram assinadas pelos trabalhadores da Ré – considerou-se provado que foi a Autora que rubricou, pelo seu próprio punho, as “folhas de ponto” respeitantes aos meses de abril e de junho de 2019, cujos originais constam de fls. 151 e 152 dos autos, respetivamente – em que figura como hora de entrada da Autora ao serviço as 10h00m. Consequentemente, ao afirmar que as rúbricas em questão não foram feitas por si e que são falsas, a Autora faltou dolosamente à verdade, levando à realização de exame pericial que, para além do custo que importou (€738,00), protelou de forma significativa o andamento do processo, cujo julgamento se encontrava inicialmente agendado para 10/11/2021 e teve que ser reagendado por causa do referido exame. Tal comportamento processual é enquadrável na al. b) do n.º 2 do art.º 542º do Cód. de Processo Civil, pelo que deverá ser sancionado. A Recorrente alega que não existe fundamento legal para essa condenação, dizendo que as rúbricas apostas nos documentos são facilmente imitáveis e a perícia referida não conclui categoricamente que foram executadas pela mão da Autora. Vejamos. Nos termos do art.º 542º do Código de Processo Civil existe má-fé quando se verificar algumas das seguintes atuações: a) do ponto de vista da atuação substancial: (i) se a parte tiver deduzido pretensão ou oposição cuja falta de fundamento não ignorava; (ii) se a parte tiver alterado a verdade dos factos ou omitido factos relevantes para a decisão da causa; (iii) se a parte tiver praticado omissão grave do dever de cooperação; b) do ponto de vista da conduta processual: (i) se a parte tiver feito do processo ou dos meios processuais um uso manifestamente reprovável com um de três fins: conseguir um objetivo ilegal; entorpecer a ação da justiça; ou impedir a descoberta da verdade. A parte tanto pode ter agido com dolo como com negligência grave, sendo que, como consta do sumário do acórdão do STJ de 06/12/2001[38], haverá negligência grave, fundamentadora de um juízo de litigância de má-fé, quando o litigante procede com imprudência grosseira, sem aquele mínimo de diligência que lhe teria permitido facilmente dar-se conta da desrazão do seu comportamento, que é manifesta aos olhos de qualquer um. Todavia, a conclusão da atuação da parte como litigante de má-fé decorrerá sempre da análise da situação concreta, o que quer dizer que não será apenas por uma ação improceder que se concluirá automaticamente pela litigância de má-fé por parte do demandante, e mais que isso, não basta a não prova de factos para haver litigância de má-fé [note-se que a não prova de um facto não implica a prova do contrário], impondo-se que os factos provados a evidenciem. Em consonância com o acabado de referir, diz-se no acórdão do TRG de 15/10/2015[39] que para a condenação como litigante de má-fé exige-se que se esteja perante uma situação donde não possam surgir dúvidas sobre a atuação dolosa ou gravemente negligente da parte, estando reservada a situações em que se demonstre nos autos, de forma manifesta e inequívoca, que a parte agiu, conscientemente, de forma manifestamente reprovável, com vista a impedir ou a entorpecer a ação da justiça, litigando de modo desconforme ao respeito devido ao tribunal e às partes. Há, pois, que ser muito prudente no juízo sobre a má-fé processual[40]. No caso em apreço, o tribunal a quo considerou litigar a Autora de má-fé essencialmente por afirmar que as rúbricas em questão não foram feitas por si e que são falsas. Como referiu de forma clara o Prof. Alberto dos Reis[41], uma coisa é o direito abstrato de ação, outra coisa o direito concreto de exercer atividade processual. O primeiro não tem limites; é um direito inerente à personalidade humana. O segundo sofre limitações, impostas pela ordem jurídica; e uma das limitações traduz-se nesta exigência de ordem moral: é necessário que o litigante esteja de boa-fé ou suponha ter razão. Portanto, revelada a má-fé, torna-se patente que ele exerceu atividade ilícita. Como refere Paula Costa e Silva[42], o comportamento da parte é censurável se puder influenciar a decisão por determinação da decisão de facto, sendo o tipo do art.º 542º, nº 2, al. b) do Código de Processo Civil um tipo de resultado, mesmo que tão só tentado. Como se escreveu no acórdão do TRC de 11/06/2019[43], o que está em causa na litigância de má-fé não é o facto de a parte ter ou não razão ou o facto de conseguir (ou não) fazer prova dos factos que alegou; o que está em causa é um determinado comportamento processual que, correspondendo a um incumprimento doloso ou gravemente negligente dos deveres de cooperação e de boa-fé processual, a que as partes estão submetidas – deveres que se encontravam previstos nos artos 7º (princípios da cooperação) e 8º (dever de boa-fé processual) do Código de Processo Civil –, é censurável e reprovável por atentar contra o respeito pelos Tribunais e prejudicar a ação da justiça. In casu, a Autora negou a versão da Ré sobre a hora de início da jornada de trabalho em todos os dias da semana, que contrariava a versão da Autora de que prestou trabalho suplementar todas as semanas (três horas e meia), e ao afirmar que rúbricas apostas nas “folhas de ponto” não foram manuscritas por si (o contrário, como se disse supra, levava a dizer que as horas de entrada e saída constantes das “folhas de ponto” foram por ela validadas) teve uma conduta processual manifestamente reprovável com o intuito claro de impedir a descoberta da verdade. Sendo assim, ainda que não o tenha conseguido, nenhuma censura merece a condenação da Autora como litigante de má-fé, improcedendo o recurso nesta parte. * Quanto a custas, havendo procedência parcial do recurso (fixando-se essa procedência 1% do pretendido), as custas do recurso ficam a cargo de ambas as partes na respetiva proporção (art.º 527º do Código de Processo Civil).*** DECISÃOPelo exposto, acordam os juízes desembargadores da Secção Social do Tribunal da Relação do Porto em conceder parcial provimento ao recurso e, em consequência, decide-se: A) Alterar o ponto II. do dispositivo da sentença de modo que passa a ter a seguinte redação: II. Condenar a Ré a pagar à Autora a quantia ilíquida de € 161,20, a título de créditos laborais em dívida, mais juros de mora à taxa legal (atualmente de 4%), desde 28/02/2020, até integral pagamento. B) Confirmar no mais a sentença recorrida. Custas pela Recorrente e Recorrida na proporção do decaimento (99% e 1% respetivamente), com taxa de justiça conforme tabela I-B anexa ao RCP (cfr. art.º 7º, nº 2 do RCP). Valor do recurso: o da ação (art.º 12º, nº 2 do RCP). Notifique e registe. (texto processado e revisto pelo relator, assinado eletronicamente) Porto, 13 de novembro de 2023 ___________António Luís Carvalhão Eugénia Pedro Germana Ferreira Lopes [1] As transcrições efetuadas respeitam o respetivo original, salvo correção de gralhas evidentes e realces/sublinhados que no geral não se mantêm (porque interessa o texto em si), consignando-se que quanto à ortografia utilizada se adota o Novo Acordo Ortográfico. [2] Vd. António Santos Abrantes Geraldes, “Recursos no Novo Código de Processo Civil”, Almedina, 5ª edição, pág. 156 e págs. 545/546 (estas no apêndice I: “recursos no processo do trabalho”). [3] Seguindo a ordem da precedência lógica, sendo que a solução de alguma pode prejudicar o conhecimento de outra(s) – art.ºs 608º e 663º, nº 2 do Código de Processo Civil (cfr. art.º 87º, nº 1 do Código de Processo do Trabalho). [4] Vd. António Santos Abrantes Geraldes, “Recursos no Novo Código de Processo Civil”, Almedina, 5ª edição, págs. 292/293. [5] Vd. António Santos Abrantes Geraldes, “Recursos no Novo Código de Processo Civil”, Almedina, 5ª edição, pág. 286. [6] É que, de outra forma, ocorreria uma inversão da posição dos intervenientes no processo, mediante a substituição da convicção de quem tem de julgar pela convicção de quem espera a decisão. [7] In “Recursos no Novo Código de Processo Civil”, Almedina, 5ª edição, págs. 168/169. [8] Vd. o acórdão desta Secção Social do TRP de 05/06/2023, consultável em www.dgsi.pt, processo nº 125/22.1T8AVR.P1. [9] Em conformidade, veja-se o sumário do acórdão desta Secção Social do TRP de 09/09/2019 [consultável em www.dgsi.pt, processo nº 12532/18.0T8PRT.P1], com o seguinte teor (ponto I): sob pena da rejeição do recurso quanto à impugnação da decisão da matéria de facto, deve o recorrente indicar, nas conclusões do recurso, os concretos pontos de facto que considera incorretamente julgados (art.º 640º, nº 1, al. a), do CPC/2013), não bastando a sua indicação no corpo das alegações. Cfr. também o acórdão do STJ de 07/07/2016, e ainda o acórdão desta Secção Social do TRP de 18/01/2021, ambos consultáveis em www.dgsi.pt, processos nº 220/13.8TTBCL.G1.S1 e nº 16209/18.8T8PRT.P1, respetivamente. [10] Segundo o qual incumbe às partes deduzir e fazer valer os meios de ataque e de defesa que lhes correspondam (incluídas as provas) suportando uma decisão adversa, caso omitam algum (vd. Fernando Pereira Rodrigues, “O Novo Processo Civil, Os Princípios Estruturantes”, Almedina, 2013, pág. 231). [11] Vd. Miguel Teixeira de Sousa, “Estudos Sobre o Novo Processo Civil”, Lex, 2ª edição (Lisboa 1997), pág. 347. [12] Vd. António Santos Abrantes Geraldes, “Recursos no Novo Código de Processo Civil”, Almedina, 5ª edição, pág. 116. [13] No artigo 28º da PI alegou que “trabalhou sempre para além do horário de 40 horas semanais”, tendo no artigo 4º do requerimento de resposta à contestação referido um horário em conformidade. [14] Cfr. artigo 10º do articulado da contestação. [15] Consultável em www.dgsi.pt, processo nº 1166/20.9T8MTS.P1. [16] Sobre a importância da aplicação da linguagem não verbal, relativamente ao processo penal mas com aplicação ao processo civil, vd. Celso Leal e Pedro M. Lamy, “Linguagem Não Verbal no Processo Penal – um livro sobre comunicação verbal e não verbal em ambiente jurídico”, Rei dos Livros, outubro 2019. [17] Consultável em www.dgsi.pt, processo nº 6249/21.5T8VNG.P1, subscrito pelo agora relator como 1º adjunto. [18] Como é sabido, a natureza do recurso, como meio de impugnação de uma anterior decisão judicial, determina, para além das demais, uma importante limitação ao seu objeto, limitação essa decorrente do facto de, em termos gerais, apenas poder incidir sobre questões que tenham sido anteriormente apreciadas, não podendo confrontar-se o tribunal ad quem com questões novas [vd., por exemplo, o acórdão do STJ de 17/11/2016 – consultável em www.dgsi.pt, processo nº 861/13.3TTVIS.C1.S2]. [19] Depois de serem juntas as “folhas de ponto” com o articulado da contestação (doc. nº 4), a Autora em requerimento de resposta à contestação alegou que as rúbricas nelas constantes não foram feitas por si (artigo 8º), requerendo de seguida a Ré (requerimento de 07/06/2021) a realização de perícia (tendo por objeto saber se as rúbricas apostas no documento que se juntou com a contestação como doc. nº 4 foram apostas pelo punho da Autora). [20] Consultável em www.dgsi.pt, processo nº 3/14.8TJVNF.G2. [21] Vidé a “tabela de significância” inserta no relatório pericial. [22] A Lei nº 13/2023, de 03 de abril (altera o Código do Trabalho e legislação conexa, no âmbito da agenda do trabalho digno), neste domínio não introduziu alterações. [23] O trabalhador para proceder à resolução do contrato, com justa causa, não tem que instaurar ação em tribunal com vista a esse reconhecimento, bastando a comunicação ao empregador nos termos do art.º 395º do Código do Trabalho. [24] Vd. Ricardo Nascimento, “Da Cessação do Contrato de Trabalho – em especial por iniciativa do trabalhador”, Coimbra Editora, 2008, pág. 246. [25] Cabendo, pois, ao empregador provar que a falta de cumprimento da obrigação não procede de culpa sua. [26] Seguiu-se de perto Maria do Rosário Palma Ramalho, “Direito do Trabalho, Parte II – Situações Laborais Individuais”, Almedina, pág. 910. [27] Vd. Pedro Romano Martinez, “Direito do Trabalho”, 2ª ed., Almedina, pág. 988. [28] Vd. António Monteiro Fernandes, “Direito do Trabalho”, Almedina, 22ª edição, 2023, pág. 652. [29] Consultável em www.dgsi.pt. [30] Vd., por exemplo, o acórdão desta Secção Social do TRP de 29/06/2015, consultável em www.dgsi.pt, processo nº 953/14.1TTPNF.P1. [31] Sobre a questão, vd. Jerónimo Freitas, “O pedido reconvencional na ação comum declarativa e na AIRLD”, in Prontuário de Direito do Trabalho”, Centro de Estudos Judiciários, 2022-II, pág. 234-239. [32] Consultável em www.dgsi.pt, processo nº 712/12.6TTPRT.P1. [33] Consultável em www.dgsi.pt, processo nº 03S1702. [34] Consultável em www.dgsi.pt, processo nº 2182/19.9T8BRR.L1-4. [35] Consultável em www.dgsi.pt, processo nº 69310/19.0YIPRT.G1.S1. [36] Vd. também o acórdão do STJ (Secção Cível) de 14/12/2021, consultável em www.dgsi.pt, processo nº 107694/20.2YIPRT.S1. [37] Cfr. art.º 609º, nº 1 do Código de Processo Civil. [38] Sumário consultável em www.dgsi.pt, processo nº 01A3692. [39] Consultável em www.dgsi.pt, processo nº 3030/11.3TJVNF.G1. [40] Cfr. o acórdão do STJ de 28/05/2009, consultável em www.dgsi.pt, processo nº 09B0681. [41] In “Código de Processo Civil Anotado”, vol. II, 3ª edição, Coimbra Editora, 1949, pág. 261. [42] In “Responsabilidade por Conduta Processual – Litigância de Má Fé e Tipos Especiais”, Almedina, 2022, pág. 352. [43] Consultável em www.dgsi.pt, processo nº 355/16.5T8PMS.C1. |