Acórdão do Tribunal da Relação do Porto | |||
Processo: |
| ||
Nº Convencional: | JTRP00036222 | ||
Relator: | HENRIQUE ARAÚJO | ||
Descritores: | CONTRATO-PROMESSA USUCAPIÃO POSSE | ||
![]() | ![]() | ||
Nº do Documento: | RP200307100322806 | ||
Data do Acordão: | 07/10/2003 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Tribunal Recorrido: | 1 J CIV STA MARIA FEIRA | ||
Texto Integral: | S | ||
Privacidade: | 1 | ||
![]() | ![]() | ||
Meio Processual: | APELAÇÃO. | ||
Decisão: | CONFIRMADA A SENTENÇA. | ||
Área Temática: | . | ||
![]() | ![]() | ||
Sumário: | Os intervenientes em contrato-promessa não podem adquirir por usucapião, a não ser que se prove o exercício de actos de posse de facto na convicção do exercício do direito de propriedade com as demais características. | ||
Reclamações: | |||
![]() | ![]() | ||
Decisão Texto Integral: | ACORDAM NO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DO PORTO: I - RELATÓRIO Manuel....., residente no lugar de....., em....., ....., propôs no Tribunal Judicial dessa comarca, a presente acção de divisão de coisa comum contra a herança ilíquida de Francisco..... e contra Ramiro..... e mulher, Fernanda....., residentes no referido lugar de....., alegando, para o efeito, que o prédio identificado no artigo 1º da petição inicial, que lhes foi adjudicado em comum e partes iguais no âmbito do inventário obrigatório n.º ../.., da -ª secção, instaurado por óbito de José....., não pode ser dividido em substância. Os Réus Ramiro e mulher contestaram afirmando que o prédio em questão é sua propriedade exclusiva, na decorrência de contrato promessa segundo o qual o Autor lhes prometeu vender “um terço” indiviso desse prédio. O preço ajustado nesse contrato promessa foi integralmente pago ao Autor, mas a escritura pública nunca se celebrou. Mesmo assim, os contestantes há mais de 15 anos que se consideram donos e senhores exclusivos desse prédio, tendo adquirido por usucapião o respectivo direito de propriedade. Na resposta, o Autor refere que não houve inversão da posse, mantendo o alegado na petição inicial. Foi determinada a avaliação do prédio e, subsequentemente, alterado o valor da acção, bem como a respectiva forma de processo, que passou a ser ordinária. Pelo despacho de fls. 82 foi admitida a intervenção principal dos demais herdeiros da herança ilíquida e indivisa aberta por óbito de Francisco...... Proferiu-se o despacho saneador, fixaram-se os Factos Assentes e elaborou-se a Base Instrutória. Realizou-se, depois, o julgamento, tendo-se respondido a matéria da Base Instrutória pela forma e com a fundamentação que consta de fls. 148 a 150, sem que surgisse qualquer reclamação das partes. Elaborou-se, por fim, a sentença que julgou improcedente a contestação apresentada pelos Réus. Dessa decisão recorreram os Réus. O recurso foi admitido como sendo de apelação e com efeito suspensivo (v. fls. 165). Nas alegações de recurso os apelantes pedem a revogação da sentença formulando, para o efeito, as seguintes conclusões: 1. A fruição da materialidade correspondente à posse, faz presumir que o possidente tenha o substrato ideológico correspondente à intenção de possuir. 2. Tal presunção deriva da lei. Quem tem a presunção legal a seu favor não carece de fazer prova dos factos que a presunção estabelece. 3. A posse titulada é aquela que assenta num meio inadequado ou impróprio para servir de título formalmente válido. Esse título pode até ser um contrato promessa de compra e venda. 4. Mesmo que a posse não seja titulada, pode o possuidor afastar a presunção legal de que possui de má-fé, demonstrando a sua boa-fé, tal como o fizeram os apelantes no presente processo. 5. Os apelantes encontram-se na posse do imóvel objecto da acção de divisão de coisa comum há mais de quinze anos, de boa-fé, sem registo de título, nem da mera posse, pelo que o adquiriram por usucapião. 6. A decisão recorrida faz uma errónea interpretação dos preceitos legais e viola o disposto nos artigos 1263º, 1259º, 1260º e 350º, n.º 2 e 1296º do Código Civil. Nas contra-alegações de fls. 178 e ss., os apelados pugnam pela manutenção do julgado. Foram colhidos os vistos legais. * Sendo o âmbito do recurso balizado pelas conclusões dos recorrentes, a questão a dirimir está em saber se os apelantes exercem sobre o prédio em causa posse consentânea com a que lei exige para adquirir por usucapião, nomeadamente quanto ao animus, ao título da posse e à boa-fé. * II - FUNDAMENTAÇÃO OS FACTOS A 1ª instância deu como provados os seguintes factos: 1.O prédio urbano, designado por A......, constituído por um edifício de rés-do-chão, destinado a indústria, a confinar do Norte com Grupo Recreativo....., do Sul com Ramiro....., do nascente com Emídio..... e do Poente com Marcelino....., inscrito na matriz predial urbana com o artigo 1161 encontra-se descrito na Conservatória do Registo Predial de..... sob o n.º .../... (doc. de fls. 80 e 81). 2. Nos autos de inventário obrigatório apensos (proc. N.º ../..) o prédio referido em 1. foi descrito sob a verba n.º 13. 3. Por sentença proferida nesses autos foi homologada a partilha aí efectuada, tendo a verba n.º 13 sido adjudicada em comum e na proporção de um terço para os interessados Ramiro..... e esposa Fernanda...... 4. Francisco..... faleceu em 4.9.94, tendo deixado como únicos herdeiros a sua esposa, Emília..... e os seus filhos, encontrando-se a herança aberta por seu óbito por partilhar. 5. No dia 24 de Novembro de 1984, Manuel..... e Francisco....., na qualidade de promitentes vendedores e cedentes, e Ramiro....., na qualidade de promitente comprador e cessionário ou destinatário, assinaram o documento de fls. 37 e 38, que designaram por “contrato-promessa de compra e venda”, no qual os primeiros declararam ser comproprietários de 2/3 indivisos, juntamente com o promitente comprador, este em 1/3, do prédio referido em 1., onde funciona e funcionou a sociedade por quotas “I....., Lda.” de que os outorgantes são consócios; declararam ainda ser sócios gerentes da referida sociedade, no qual cada um possui um terço do capital social, juntamente com o outorgante Ramiro, que também é sócio gerente e dispõe de 1/3 do capital social. 6. No escrito referido em 5. os primeiros outorgantes declararam que “prometem vender ao segundo ou quem este indicar, que por sua vez promete comprar: - as quotas partes indivisas (1/3 + 1/3) que possuem no prédio antes assinalado; - as quotas que possuem na sociedade de “I....., Lda.” ao mesmo tempo que, com a escritura de cessão, renunciam aos poderes de gerência; - o promitente Francisco obriga-se a obter o necessário consentimento e outorga dos contratos prometidos por parte do seu cônjuge”. 7. Mais declararam que “O preço dos contratos prometidos seria de Esc. 5.100.000$00, pagos nos termos e pela forma seguinte: - neste acto, a título de sinal e como princípio de pagamento, a quantia de 1.500.000$00; - o restante pagamento será efectuado da forma seguinte: com início no mês de Dezembro de 1984, e até ao fim da cada mês, durante os 12 meses seguintes, a quantia de 100.000$00; com início no mês de Dezembro de 1985, e até ao fim de cada mês durante os 12 meses seguintes, a quantia de 200.000$00, após o que estará feito o total pagamento. Enquanto não for feita a escritura dos contratos prometidos, as quantias entregues pelos segundo aos primeiros serão havidas como reforço do sinal e princípio de pagamento”. 8. Mais declararam que “A escritura definitiva dos contratos prometidos será marcada pelo segundo outorgante, Ramiro, que avisará os promitentes vendedores por carta registada, para a direcção actual deles, com antecedência de 5 dias”. 9. Os Réus Ramiro e mulher marcaram a escritura para o dia 29 de Maio de 1985, no º Cartório Notarial de..... e avisaram os autores e o falecido Francisco e mulher para comparecerem. 10. O Autor e o falecido Francisco e mulher não compareceram no local e data referidos em 9. 11. Em 21 de Novembro de 1984, o Réu Ramiro pagou aos irmãos Manuel..... e Francisco e respectiva mulher Esc. 1.500.000$00 em dinheiro, por conta do preço referido em 7. 12. Os Réus Ramiro e mulher, na sequência do acordado (referido em 5.) pagaram a sisa e inscreveram o referido prédio na matriz predial em seu nome. 13. Após 21.11.84 o Réu Ramiro pagou as cinco primeiras prestações referidas em 7, no valor global de 500.000$00. 14. A partir dessa data os Réus passaram a ocupá-lo, aí instalando uma oficina metalúrgica própria e colocaram todas as máquinas. 15. E vedaram o prédio referido em 1. 16. A partir de 21.11.84 os Réus Ramiro e mulher pagaram os consumos de electricidade referente ao prédio identificado em 1. e passaram a pagar a respectiva contribuição autárquica. 17. E desde 21.11.84 que o Autor, o seu irmão Francisco, mulher e descendentes deste não entram no edifício referido em 1. 18. Os Réus Ramiro e mulher fizeram obras no interior e no telhado do prédio identificado em 1. 19. Mudaram as chaves das portas de acesso ao mesmo e substituíram as portas. 20. E alteraram o acesso ao prédio referido em 1. a partir da rua. 21. Os Réus Ramiro e mulher praticaram os actos referidos em 14. a 20. à vista de toda a gente e com o conhecimento de todas as pessoas daquele lugar. 22. De forma ininterrupta desde 21.11.84. 23. O Réu Ramiro viveu sempre numa casa adjacente ao prédio referido em 1., que têm comunicação um com o outro. 24. A partir de 29.05.85 o Autor deixou de pagar as prestações referidas em 7. O DIREITO A acção de divisão de coisa comum pressupõe - como se sabe - uma situação de compropriedade a que se quer pôr fim. Em relação ao prédio dos autos, não é questionada a sua indivisibilidade. A única questão que se suscita é saber se, afinal, existe ou não essa compropriedade, uma vez que os Réus afirmaram que esta deixou de existir por terem adquirido o dito prédio por usucapião. A posse do direito de propriedade ou de outros direitos reais de gozo, mantida por certo lapso de tempo, faculta ao possuidor, salvo disposição em contrário, a aquisição do direito a cujo exercício corresponde a sua actuação: é o que se chama usucapião – art. 1287º do CC. A verificação da usucapião depende de dois elementos: a posse e o decurso de certo período de tempo. A posse decompõe-se, ela própria, em dois elementos: o corpus, que se identifica com os actos materiais (detenção/fruição) praticados sobre a coisa com o exercício de certos poderes sobre ela; o animus, elemento psicológico, que se traduz na intenção de se comportar como titular do direito real correspondente aos actos praticados. Mas a posse conducente à usucapião tem ainda de revestir duas características: tem de ser pública e pacífica. Os demais requisitos de que a lei fala (boa ou má fé, título, etc.) apenas influem no prazo – v. Henrique Mesquita, “Direitos Reais”, 1967, pág. 112. Questão discutida na doutrina e na jurisprudência é a de saber qual o relevo a dar à posse do promitente adquirente. Exercerá o promitente comprador, que obteve do promitente vendedor a entrega da coisa objecto do contrato prometido, os poderes de facto com o animus de um direito real ? O contrato promessa é de natureza obrigacional, na medida em que cria a obrigação de contratar, ou, mais concretamente, a obrigação de emitir a declaração de vontade correspondente ao contrato prometido. Em muitos casos verifica-se a traditio do bem objecto do contrato prometido logo na data da feitura do contrato-promessa. Embora isso não resulte expressamente do texto do contrato-promessa celebrado em 21.11.84 (fls. 37/38), o certo é que - conforme ficou provado -, os Réus Ramiro e mulher passaram a ocupar o imóvel descrito em 1. desde essa data e de forma ininterrupta – v. 13., 14. e 22. Não se põe em causa que essa posse, materializada nos actos descritos em 14. a 16. e 18. a 20., é legítima e que essa relação entre os Réus Ramiro e mulher e o imóvel permite concluir pela verificação do corpus da posse. Todavia, como refere o Prof. Antunes Varela, RLJ Ano 128, pág. 146, a posse não se esgota no corpus da actuação de quem materialmente detém a coisa; compreende ainda, como logo transparece no texto legal introdutório do instituto (art. 1251º), apesar da secura sintética dos seus termos, o animus com que a exploração económica da coisa é exercida. (...) E o promitente-comprador, investido prematuramente no gozo da coisa, que lhe é concedido na pura expectativa da futura celebração do contrato prometido, não é possuidor dela, precisamente porque sabendo ele, como ninguém, que a coisa pertence ainda ao promitente-vendedor e só lhe pertencerá a ele depois de realizado o contrato translativo prometido, não pode agir seriamente com a intenção de um titular da propriedade ou de qualquer outro direito real sobre a coisa. Ele é apenas (...) o titular de um direito pessoal de gozo, destinado a perdurar como tal, até à celebração do contrato definitivo ou à adjudicação compulsória da coisa (resultante da execução específica: art. 830º do Cód. Civil) ou até à resolução ou anulação do contrato-promessa. No entanto, os Profs. Pires de Lima e Antunes Varela, admitem a verificação de situações excepcionais de posse do promitente-comprador. Será, por exemplo, o caso em que o promitente-comprador pagou integralmente o preço e a coisa lhe foi entregue “como se sua fosse já”, praticando sobre ela, nesse estado de espírito, diversos actos materiais, correspondentes ao direito real de propriedade. Numa situação deste tipo, pode falar-se, efectivamente, em actos praticados “em nome próprio”, com intenção de exercer sobre a coisa um direito real de propriedade – “Código Civil Anotado”, Vol. III, págs. 6/7. Por seu turno, o Prof. Menezes Cordeiro defende que se a traditio rei visa antecipar o cumprimento do próprio contrato definitivo, hipótese frequente nos casos em que o preço está todo ou quase todo pago; o promitente-comprador é, então, desde logo, investido num controlo material semelhante ao do proprietário, podendo falar-se em posse em termos de propriedade, ou seja, numa posse boa para usucapião, podendo proporcionar, por essa via, a aquisição do domínio – v. “A Posse – Perspectivas Dogmáticas Actuais”, Livraria Almedina, 2000, págs. 77/78. Ora, na construção subjectivista do animus adoptada pelo CC, que distingue o exercício do poder de facto da intenção de agir como beneficiário do direito - art. 1253º, al. a), do CC - é pela própria relação jurídica que está na base da posse que se verifica qual o animus do possuidor (vontade abstracta ou da causa), nomeadamente nos casos em que a posse procede de outrem - v. Prof. Oliveira Ascensão, “Direitos Reais”, 1978, págs. 247-249. Vejamos, então, mais de perto, os termos em que foi celebrado o contrato-promessa que está na origem do poder de facto que os Réus exercem sobre o prédio objecto do litígio. Do preço acordado – Esc. 5.100.000$00 – os Réus Ramiro e mulher entregaram como sinal e princípio de pagamento a quantia de Esc. 1.500.000$00 – v. cláusula 3ª. Com início no mês de Dezembro de 1984 e até ao fim de cada mês, os Réus obrigaram-se a pagar aos promitentes vendedores, até ao fim de cada mês, a importância de Esc. 100.000$00, e com início no mês de Dezembro de 1985 e durante os doze meses seguintes, até ao final de cada mês, a quantia de 200.000$00. Dessas prestações os Réus apenas pagaram as cinco primeiras, num total de Esc. 500.000$00. Ficou ainda estipulado que a escritura pública definitiva seria marcada pelos Réus. E, de facto, eles marcaram-na para o dia 29 de Maio de 1985, tendo faltado à outorga o Autor Manuel..... e Francisco..... e mulher. Ora bem. Das citadas prestações os Réus apenas pagaram as cinco primeiras, num total de Esc. 500.000$00, ou seja, pagaram as prestações mensais até Abril de 1985. A que se vencia no final de Maio de 1985, já não foi paga. Está, deste modo, por satisfazer mais de metade do preço acordado no contrato-promessa. Essa falta de pagamento pode ter a ver com a falta dos Réus à escritura pública que os Autores marcaram para esse mesmo dia – 29.05.85. Certo é que ficou por realizar a escritura pública definitiva de compra e venda e de cessão de quotas a que Autor (e seu irmão Francisco) e Réus se haviam obrigado no contrato-promessa. Apesar disso, os Réus continuaram a exercer o poder de facto sobre o prédio durante mais de 15 anos, até surgir a presente acção instaurada em 22.02.2000. Ora, não obstante se conceder que foram muitos os anos em que tal situação se desenrolou sem sobressalto e que foram muitos os actos materiais que os Réus praticaram sobre o objecto do contrato-promessa, não podemos aceitar que se confira à posse que vêm exercendo a relevância necessária para adquirirem por usucapião. Como se pode dizer que os Réus Ramiro e mulher agiam em relação ao prédio como se fossem seus donos, se nem metade do seu valor haviam pago aos promitentes-vendedores? Os poderes que os promitentes-compradores exercem de facto sobre a coisa, sabendo que ela ainda não foi comprada, não são os correspondentes ao direito do proprietário adquirente, mas os correspondentes ao direito de crédito do promitente-adquirente ou transmitente – v. Prof. Antunes Varela, RLJ Ano 124º, pág. 347. Não há no caso em análise - segundo cremos – verdadeira posse por parte dos promitentes-compradores, mas mera detenção ou posse precária – v., neste sentido, Ac. STJ de 06.03.1997, BMJ n.º 465, págs. 570-584. O Acórdão Uniformizador de Jurisprudência de 14.05.96, publicado no DR, II Série, de 24.06.96, escorando-se no disposto no art. 1252º, n.º 2, do CC, estabeleceu como doutrina que “podem adquirir por usucapião, se a presunção de posse não for ilidida, os que exercem poder de facto sobre uma coisa”. Segundo esse aresto, fica dispensada, em determinadas situações, a difícil prova da existência do elemento subjectivo da posse, como requisito de prescrição aquisitiva. Havendo o exercício de poderes de facto próprios do titular do direito de propriedade, a lei presume, no n.º 2 do art. 1252º do CC, a intenção de que o beneficiário se comporta como verdadeiro titular desse direito, excepto se tais poderes de facto corresponderem a simples detenção (art. 1253º - animus detinendi) ou se se provar que não existe a intenção de agir enquanto titular do direito real. Ora, como se concluiu que a situação dos promitentes-compradores é de mera detenção, essa presunção legal não opera. Repare-se, aliás, num outro pormenor constante dos autos: A Base Instrutória continha no quesito 12º a seguinte pergunta : Na convicção de estarem (os Réus Ramiro e mulher) a exercer um direito de propriedade sobre o prédio referido em A) ?. A resposta a este quesito foi: Não provado. Na fundamentação desta resposta a Mmª Juiz escreveu o seguinte: Quanto à intenção com que o Réu Ramiro exercia tais actos sobre o prédio importou o depoimento de Manuel....., filho do Réu Ramiro, que referiu que “grande parte da população” via o seu pai como o único proprietário daquele prédio, mas a outra parte não e que o seu pai se considerava dono “não totalmente”. Este depoimento aliado ao facto de ter sido celebrada uma promessa de aquisição que não foi cumprida permitiu-nos concluir pela inexistência daquela intenção por parte do Réu Ramiro, situação essa que este de forma implícita admitiu no depoimento que prestou. Sintomáticos do sentir dos Réus são também os documentos juntos pelo Autor na audiência de julgamento de 06.12.2002, não impugnados pelos Réus (v. fls. 145) : uma carta do Réu marido ao Autor e ao Francisco....., datada de 18.10.1988, a interpelá-los para cumprirem o contrato-promessa; e cópia de uma notificação judicial avulsa, com “nota de notificação” de 12.02.1990, feita pelos Réus àqueles, com o fim de auscultar a sua vontade em relação ao cumprimento do dito contrato – v. fls. 143 e 140 a 142, respectivamente. Ressalta claro desses documentos que os Réus, quando os emitiram, não agiam com animus possidendi, mas como meros detentores do imóvel prometido vender. Quanto às outras questões lançadas pelos apelantes (posse titulada e posse de boa-fé), o seu conhecimento fica claramente prejudicado em função do que acima se disse. Não existindo o elemento subjectivo essencial da posse (animus) nenhum interesse tem a discussão dos outros aspectos versados na impugnação da decisão da 1ª instância. * III - DECISÃO Nestes termos, julga-se improcedente a apelação, confirmando-se, embora com diversa fundamentação, a sentença recorrida. Custas pelos apelantes. * PORTO, 10 DE JULHO DE 2003 Henrique Luís de Brito Araújo Fernando Augusto Samões Alziro Antunes Cardoso |