Acórdão do Tribunal da Relação do Porto | |||
Processo: |
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Nº Convencional: | JTRP00033521 | ||
Relator: | CUNHA BARBOSA | ||
Descritores: | PENHORA VEÍCULO AUTOMÓVEL REGISTO PROVISÓRIO CITAÇÃO | ||
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Nº do Documento: | RP200403310451617 | ||
Data do Acordão: | 03/31/2004 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Texto Integral: | S | ||
Privacidade: | 1 | ||
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Meio Processual: | AGRAVO. | ||
Decisão: | PROVIDO. | ||
Área Temática: | . | ||
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Sumário: | Efectuado o registo provisório da penhora de um veículo automóvel, sem que tenha ainda sido apreendido, se o titular inscrito no registo não for o executado, deve, desde logo, ser ordenada a citação do titular que constar da inscrição registral, nos termos do artigo 119 n.1 do Código do Registo Predial. | ||
Reclamações: | |||
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Decisão Texto Integral: | Acordam neste Tribunal da Relação do Porto: 1. Relatório: No Tribunal Judicial de ..............., .. Juízo, sob o nº .../.., foram instaurados uns autos de execução de sentença, em que é exequente B.......... e executado C.............. * No âmbito de tal processo, o exequente nomeou à penhora, entre outros bens, o “veículo automóvel de marca BMW modelo ... e de matrícula ..-..-BH, em estado regular, do ano de 1992, o qual já teve um acidente e cujo valor venal se calcula em 1.000 contos, encontrando-se o mesmo estacionado na garagem do prédio onde habita o executado, sito em ......... – ........ – ................”.* Por despacho proferido em 20.10.98, foi ordenada a penhora nos bens indicados pelo exequente, incluindo o supra identificado veículo.* Por requerimento apresentado em 3.12.98, o exequente veio requerer a citação, ao abrigo do disposto no artº 119º do CRPredial, do titular inscrito no registo relativamente ao identificado veículo automóvel, que não era o executado, juntando, para tanto, uma ‘nota de registo’ da Conservatória do Registo de Automóveis do ........., de que consta que se procedeu ao registo provisório, por natureza, de penhora sobre o veículo de matrícula ..-..-BH, de que é titular inscrito D..............Mais se refere, na referida nota, que a provisoriedade do mencionado registo se ficou a dever ao facto de o executado ser pessoa diversa do titular inscrito e a diligência ter sido ordenada, mas não realizada. * Em 20.5.2002, o exequente apresentou requerimento (cfr. fls. 27, 131 da execução) em que se requer que seja ordenada a apreensão do veículo e a notificação do titular inscrito, nos termos e para os efeitos do disposto no artº 119º, nº 3 do CRPredial, e, bem assim, se notifique a firma E............. para informar onde se encontra o veículo automóvel, com os seguintes fundamentos:“... 1 - Conforme se alcança do douto Acórdão do Tribunal da Relação do Porto de folhas 43 e seguintes do apenso D, foi deferida a penhora e subsequente apreensão do veículo automóvel de matrícula ..-..-BH. 2 - Como se vê de folhas 11, 15, 16, 17 e 40 dos autos de execução, o titular inscrito do veículo penhorado é o Ex. Sr. D............... 3 - Torna-se assim necessário por um lado proceder à efectiva apreensão do veículo e por outro ordenar-se desde já a notificação do titular inscrito nos termos e para os efeitos do disposto no artº 119º, nº 3 do C. Registo Predial, aplicável ao registo automóvel. 4 - Por outro lado face à informação do executado, datada de 15 de Abril de 2002, torna-se necessário notificar a firma E............, para esta informar onde se encontra o veículo. ...”. * Tal requerimento mereceu o despacho de fls. 34 (132 da execução), proferido em 27.5.2002, do seguinte teor:“… Antes de se determinar do cumprimento do art. 119º do Cód. Reg. Predial, cumpre proceder à penhora do veículo e à subsequente junção de certidão actualizada de ónus e encargos sobre ele inscritos, porquanto o cumprimento da norma citada o há-de ser com referência ao titular inscrito no registo no momento da penhora e não com relação a documento de pretérito, uma vez que nada obsta à alteração da situação jurídica – da dominialidade – do veículo, no lapso de tempo entretanto decorrido. Assim, antes do mais, notifique o stand de automóveis melhor id. a fls. 119 para, em 10 dias, vir aos autos esclarecer onde se encontra o veículo automóvel cuja penhora vinha pedida nos autos e foi ordenada, sendo-o com cópia de fls. 119 para melhor compreensão do solicitado e mediante a advertência de que não dando cumprimento ao ordenado ou justificando a omissão será condenado em multa por falta de colaboração devida ao tribunal (cfr. art. 519 C.P.C.). Vinda essa informação nos pronunciaremos sobre o mais requerido a fls. 131. * Notifique ainda o exequente de todo o teor do despacho que antecede.…”. * Não se conformando com tal decisão, o exequente dela interpôs recurso de agravo e, tendo alegado, formulou conclusões que, por extensas e prolixas, nos abstemos de, aqui, as reproduzir, sendo que a verdadeira e única questão suscitada nas mesmas é a violação do disposto no artº 119º, nº 3 do CRPredial, face à não ordenação de citação do titular inscrito no registo, preceito esse aplicável por força do disposto no artº 29º do Dec. Lei nº 54/75, de 12 de Fevereiro.* O executado/agravado não contra-alegou.* A Mmª Juiz proferiu despacho de sustentação.* Colhidos que se mostram os vistos legais, cumpre decidir.Assim: * 2. Conhecendo do recurso (agravo):2.1 – Dos factos assentes: Com relevância para o conhecimento do recurso, resultam dos autos os seguintes factos: a) – O exequente/agravante, em 15.9.98 e no requerimento inicial de execução de sentença, requereu a penhora, entre outros, do ‘veículo automóvel de marca BMW modelo ............ e de matrícula ..-..-BH, em estado regular, do ano de 1992, o qual já teve um acidente e cujo valor venal se calcula em 1.000 contos, encontrando-se o mesmo estacionado na garagem do prédio onde habita o executado, sito em ........... – .......... – .................’; b) – Por despacho proferido em 20.10.98, foi ordenada a penhora; c) – Em 3.12.98, o exequente veio requerer a citação do titular inscrito, ou seja, do Dr. D..............., tendo, para tanto, junto uma nota de registo (cfr. fls. 21 a 26), de que resulta ser este o titular inscrito; d) – De tal nota de registo resulta ainda que se procedeu ‘…ao registo de penhora provisório por natureza, nº 2 al. a) e al. n), nº 1, art. 92 …’ sobre o veículo identificado em a), com fundamento em que ‘… O executado é pessoa diversa do titular inscrito …’ e ‘… A diligência foi ordenada e não foi efectuada…’; e) – Em 20.5.2002 (cfr. fls. 27, 131 da execução), o exequente veio requer a efectiva apreensão do veículo, com prévia notificação da firma E.............. para dizer onde o mesmo se encontrava, e, bem assim, a notificação do titular inscrito nos termos do artº 119º, nº 3 do CRPredial; f) – A penhora no veículo, apesar de ordenada, ainda se não mostra concretizada, isto é, dos autos não resulta que tenha ocorrido a efectiva apreensão do mesmo. 2.2 – Dos fundamentos do recurso: De acordo com as conclusões formuladas pelo agravante nas suas alegações de recurso, as quais delimitam o objecto deste – cfr. arts 684º, nº 3 e 690º do CPCivil, temos que a questão a dilucidar é a de saber se, efectuado o registo provisório de penhora de móveis sujeitos a registo e sem que esta tenha sido concretizada através de efectiva apreensão, ocorre, desde logo, situação determinativa de citação, ao abrigo do disposto no artº 119º, nº 1 do CRPredial, de titular inscrito no registo diferente do executado. Vejamos. Dispõe-se no artº 119º, nº 1 do CRPredial que “… 1. Havendo registo provisório de arresto, penhora ou apreensão em falência de bens inscritos a favor de pessoa diversa do requerido ou executado, o juiz deve ordenar a citação do titular inscrito para declarar, no prazo de 10 dias, se o prédio ou direito lhe pertence. …” Em face do disposto em tal preceito, entendeu a Mmª Juiz do Tribunal de 1ª instância, na decisão sob recurso, que não deveria ordenar a, pretendida e cominada em tal preceito, citação do titular inscrito, com fundamento em que não ocorria, ainda, penhora realizada ou concretizada através de efectiva apreensão do bem móvel – veículo automóvel - nomeado pelo exequente, embora já tivesse a mesma sido ordenada por despacho judicial, proferido em 20.10.98, havendo, por isso, que, previamente, concretizar tal penhora (efectiva apreensão). Não há dúvida que, à data da prolação do despacho sob recurso, não havia ainda ocorrido, como resulta dos autos e o próprio agravante aceita, a efectiva apreensão do veículo automóvel nomeado à penhora e, consequentemente, a concretização desta, porquanto, como resulta do disposto no artº 848º, nº 1 e 5 do CPCivil, com a redacção vigente à data e resultante da reforma do processo civil introduzida pelos Decs. Leis nº 329-A/95, de 12/12 e 180/96, de 25/9 (cfr., ainda, artº 21º do Dec. Lei nº 38/2003, de 8/3, alterado pelo Dec. Lei nº 199/2003, de 10/10), a penhora de veículos automóveis fazia-se com a apreensão do veículo e dos seus documentos. Mas será que do teor do nº 1 do artº 119º do CRPredial, resulta que a citação aí referida só deverá ocorrer após a realização da penhora? Na realidade, ‘prima facie’ e numa interpretação literalista, pareceria que a resposta a tal questão não poderia deixar de ser positiva, isto é, só depois de realizada a penhora deveria ocorrer a citação referida em tal normativo, porquanto nele se refere ‘registo provisório de penhora’ e esta, como já se referiu supra, só ocorre com a efectiva apreensão do bem. Todavia, tal interpretação não é sufragável em face do disposto no artº 92º, nº 1, al. n) do CRPredial, na redacção então vigente, anterior à introduzida pelo artº 6º do Dec. Lei nº 38/2003, de 8/3 (esta só é aplicável aos processos instaurados posteriormente a 15 de Setembro de 2003 – cfr. artº 21º do mesmo diploma legal, alterado pelo Dec. Lei nº 199/2003, de 10/10), porquanto naquele normativo se dispunha que “… 1. São pedidas como provisórias por natureza as seguintes inscrições: … n) De penhora, arresto ou apreensão em processo de falência, depois de ordenada a diligência, mas antes de esta ser efectuada; …” (sublinhado nosso). No caso ‘sub judice’, como resulta da ‘nota de registo’, oportunamente junta com o requerimento em que se requeria a citação ao abrigo do nº 1 do artº 119º do CRPredial, foi requerido e concretizado o registo provisório de penhora ao abrigo do disposto no citado normativo, pelo que não pode deixar de se entender que ocorre, desde logo, o ‘registo provisório de penhora’ a que alude o nº 1 deste último normativo, sob pena de inutilização do efeito pretendido pelo mesmo, como seja a produção de efeitos contra terceiros prevista no artº 5º do CRPredial com retroacção à data da efectivação do registo provisório – cfr. artº 6º, nº 3 do CRPedial. Na realidade, compreende-se que assim seja, porquanto, com a admissibilidade do registo provisório de penhora em face de despacho que a ordena e antes que esta se torne efectiva, pretende obstar-se a que o executado possa transferir, por acto oponível ao requerente (exequente) do registo, a titularidade do bem sobre o qual se mostra requerida a penhora e, por razões alheias à vontade do requerente, não tenha sido concretizada, o que, a verificar-se, redundaria num acréscimo injustificado de dificuldades para este, que se veria confrontado com a necessidade de ombrear com procedimentos judiciais de êxito duvidoso e em face de actividade menos correcta por parte do executado que, tomando conhecimento do requerimento de penhora, promoveria actos de transferência de titularidade com vista a dificultar ou obstar definitivamente à concretização da penhora, apesar de ela se poder justificar plenamente ao tempo do requerimento e do despacho que a ordena. Assim, ter-se-á que, no caso concreto, ocorria ao tempo de prolação do despacho sob recurso, ‘registo provisório de penhora’ justificativo do cumprimento do disposto no artº 119º, nº 1 do CRPredial, já que o titular inscrito era pessoa diversa do executado, impondo-se, por isso, ao juiz a citação nos termos e para os efeitos do disposto em tal normativo. Aliás, note-se, por mera curiosidade, que, actualmente, em face do disposto no artº 851º do CPCivil, com a redacção introduzida pelo Dec. Lei nº 38/2003, de 8/3, à concretização da penhora sobre veículo automóvel não é necessária a efectiva apreensão, ocorrendo esta por mera comunicação electrónica à conservatória do registo predial competente – cfr. artº 851º, nº 1, 838º, nº 1 do CPCivil (redacção introduzida pelo DL 38/2003), seguindo-se, ocorrido a penhora, a imobilização do veículo e a apreensão dos respectivos documentos – nº 2 do artº 851º do CPCivil (redacção introduzida pelo DL 38/2003), o que determinou a alteração da al. n) do nº 1 do artº 92º do CRPredial, já que se tornava dispiciendo o registo provisório de penhora ordenada e não concretizada, na medida em que, pela redacção introduzida nos normativos supracitados do código de processo civil, deixou de existir qualquer lapso de tempo entre a ordem de penhora e a sua concretização. De tudo se haverá de concluir que procede o agravo e, no seu provimento, deverá ser revogado o despacho em que se não determinou a citação do titular inscrito ao abrigo do disposto no artº 119º, nº 1 do CRPredial sem que ocorresse a penhora com a efectiva apreensão, e, consequentemente, deverá ser proferido outro despacho em sua substituição, que determina a citação em falta. * 3. Decisão:Nos termos supra expostos, acorda-se em: a) – conceder provimento ao agravo, revogando-se o despacho recorrido na parte em que considerou não ser admissível a citação nos termos do artº 119º, nº 1 do CRPredial, devendo, em sua substituição, ser proferido um outro despacho que determina a realização da citação em falta; b) – Sem custas – artº 2º, nº 1, al. o) do CCJ, então vigente (cfr. artº 2º, nº 1, al. g) do CCJ com a redacção introduzida pelo Dec. lei nº 324/2003, de 27/12). * Porto, 31 de Março de 2004José da Cunha Barbosa José Augusto Fernandes do Vale António Manuel Martins Lopes |