Acórdão do Tribunal da Relação do Porto
Processo:
171/15.1T8AVR.P1
Nº Convencional: JTRP000
Relator: PAULA MARIA ROBERTO
Descritores: NULIDADE DA SENTENÇA
FACTOS PROVADOS
CONFISSÃO
Nº do Documento: RP20160314171/15.1T8AVR.P1
Data do Acordão: 03/14/2016
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: PROVIDO
Indicações Eventuais: 4ª SECÇÃO (SOCIAL), (LIVRO DE REGISTOS N.º237, FLS.101-107)
Área Temática: .
Sumário: I - Resulta do n.º 1, do artigo 57.º, do C.P.T., como efeito da revelia, a consagração de um efeito cominatório semipleno, no entanto, este não dispensa o juiz de elencar os factos alegados pelo A. que considera confessados, desde logo, por aplicação do disposto no n.º 3, do artigo 607.º, do CPC., do qual resulta que na sentença o juiz deve discriminar os factos que considera provados.
II - A sentença é nula quando não especifique os fundamentos de facto e de direito que justificam a decisão (n.º 1, b), do artigo 615.º, do C.P.C.), no entanto, só a falta absoluta de motivação e já não uma motivação deficiente ou incompleta conduz à nulidade da sentença.
III - Se o juiz não discriminou os factos provados por força da confissão tendo-se limitado a consignar: “consideram-se confessados os factos alegados na petição inicial, que aqui se dão por integralmente reproduzidos”, inexistindo qualquer fundamento legal que dispense o cumprimento do disposto no artigo 607.º, n.º 3, do C.P.C., a sentença é totalmente omissa quanto à fundamentação de facto e, consequentemente, é nula porque não especifica os fundamentos de facto que justificam a decisão.
Reclamações:
Decisão Texto Integral: Apelação n.º 171/15.1T8AVR.P1
Comarca de Aveiro
1ª Secção de Instância Central do Trabalho, com sede em Aveiro

Relatora – Paula Maria Roberto
Adjuntos – Desembargadora Fernanda Soares
Desembargador Domingos Morais

Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação do Porto:

I – Relatório

B…., residente em …

intentou a presente ação declarativa de processo comum contra

C…, com sede em …

alegando, em síntese, que foi admitido ao serviço da Ré em julho de 2001 para exercer as funções de servente, tendo prestado o seu serviço até 10/02/2014; em face do atraso no pagamento dos salários de setembro, outubro e novembro de 2014, em ../……. resolveu por escrito o contrato de trabalho, tendo efetuado a comunicação de resolução à Ré; a Ré deve-lhe a quantia de € 9.750,79, sendo € 485,00 x 3 a título de salários dos meses de setembro a novembro de 2014; € 118,14 de subsídio de alimentação; € 264,55 de 12 dias de férias não gozadas em 2014; € 1.394,38 de proporcionais dos subsídios de férias e de Natal e € 6.485,71 de indemnização e juros vencidos desde 16/1272014, no valor de € 33,01.
Termina, dizendo que a presente ação deve considerar-se procedente por provada e, em consequência, ser declarada a existência de um contrato de trabalho celebrado entre o A. e a Ré; ser declarado que o contrato de trabalho celebrado entre o A. e a Ré se converteu em contrato sem termo; ser declarado resolvido o contrato de trabalho celebrado entre o A. e a Ré com fundamento na falta culposa de pagamento pontual da retribuição e ser a Ré condenada a pagar ao A. as quantias supra discriminadas, no valor total de € 9.750,79, acrescida de juros de mora vincendos, à taxa legal, desde a data da citação até efetivo e integral pagamento.
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Teve lugar a audiência de partes e na qual não foi obtido acordo.
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A devidamente notificada para contestar não veio fazê-lo.
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Foi, então, proferida sentença (fls. 22e segs.) cujo dispositivo é o seguinte:
Nestes termos, e sem necessidade de mais considerações, julgando-se a presente acção parcialmente procedente, decide-se:
1 - Declarar a existência de justa causa para a resolução do contrato operada pelo autor com fundamento na falta de pagamento pontual da retribuição.
2 - Condenar a ré a pagar ao A. a indemnização pela resolução do contrato com justa causa no montante de € 6.485,71 (seis mil quatrocentos e oitenta e cinco e setenta e um a cêntimos) com juros de mora, à taxa legal, contados a partir do trânsito da decisão da presente acção até integral pagamento.
3 - Condenar a R. a pagar ao A. a quantia de € 3.232,07 (três mil duzentos e trinta e dois euros e sete cêntimos) de salários, férias e subsídios de férias e de Natal, com juros de mora, à taxa legal, contados desde 17.12.2014 até integral pagamento.”
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A Ré, notificada desta sentença, veio interpor o presente recurso através do requerimento de fls. 24 e segs.
A Exm.ª Procuradora-Geral Adjunta emitiu o douto parecer de fls. 47 no sentido de ser rejeitado o recurso, por entender que as conclusões apresentadas são a reprodução das alegações, o que equivale, no seu entendimento, à ausência das mesmas.
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A recorrente veio responder a este parecer e, posteriormente, convidada a sintetizar as conclusões do recurso veio fazê-lo, nos seguintes termos:
“I – A sentença, ora em crise, sem invocar o que dispõe o art. 57.º, n.º 2 do CPT, limita-se a dar os factos por reproduzidos conforme os mesmos constam da petição inicial e a genericamente efetuar o seu enquadramento legal, mas sempre com recurso ao que dispõe o dito articulado sobre tais matérias jurídicas, pelo que, e face a tal falta de invocação, entendemos que no caso concreto prescindiu o douto tribunal de usar a possibilidade conferida por tal normativo.
II – Ora uma sentença deve obedecer na sua elaboração, ao estatuído no art. 607.º do NCPC, aqui aplicável, que manda discriminar obrigatoriamente os factos que o julgador considera provados e não provados e como se vê da sentença, ora em crise, nenhum facto foi dado como assente, apenas se afirmando que eles se têm por confessados, sem qualquer especificação ou descriminação concreta, sendo certo que nos artigos da petição inicial também foi alegada matéria de direito e conclusões de facto, sem qualquer distinção ou separação entre si.
III – O que obsta, desde logo, a que a Ré, e agora o douto Tribunal de Segunda Instância, possa verificar da correta aplicação do direitos aos factos que foram tidos por provados, pois, efectivamente, nenhum deles foi elencado na sentença.
IV – Entendemos por isso que viola a presente sentença o que dispõe o art. 662.º, n.º2, alínea c) do NCPC, pois há uma clara omissão quanto à matéria de facto, ou na pior das hipóteses, o que se invoca subsidariamente, uma deficiência e obscuridade da decisão nesse sentido, o que comporta a anulação da decisão, anulação essa que aqui se requer, com as demais consequências legais por violação de tal normativo.
V – Sem prescindir, e caso improceda o supra invocado, mais se diz que a falta de fundamentação é uma das causas de nulidade substancial ou de conteúdo da decisão e verifica-se quando o tribunal não especifica quais os fundamentos de facto ou de direito com base nos quais tomou a sua decisão. (Art. 208.º da CRP, 607 e 615.º do NCPC).
VI - Ora, no nosso caso concreto, entendemos que efectivamente, e tendo usado, ainda que tacitamente, o douto tribunal dessa prorrogativa, certo é que o terá feito de forma abusiva e indevida. É que não se pode considerar a presente causa manifestamente simples, dando‐se possibilidade ao tribunal de nesses termos declarar genericamente o douto tribunal por confessados os factos articulados pelo Autor e aderir aos seus fundamentos, acrescentando meras considerações gerais, vagas e imprecisas para justificar a decisão final tomada.
VII – Resulta dos autos, nomeadamente da petição inicial, que discordam juridicamente as partes quanto à licitude da resolução, atento o teor, desde logo, da carta de resposta da Ré à carta de resolução da Autora, o que demonstra que estamos perante um litígio complexo e merecedor de mais atenção por parte do douto tribunal.
VIII – Ora, face à não simplicidade da causa exigia‐se uma sentença devidamente fundamentada, com enunciação clara dos factos considerados assentes e os fundamentos de direito concretos que estiveram na base da condenação e não por mera transcrição do que resulta da petição inicial.
IX - Assim, e subsidariamente caso se considere que tacitamente usou o douto tribunal da prerrogativa constante do art. 57.º, n.º 2 do CPT, deve ser tida por nula a decisão, ora em crise, por violação dos artigos 57.º, n.º 2 do CPT, art. 208.º CRP, art. 607, n.º 3 e 4 e art. 615, n.º 1, alínea b) do NCPC, o que aqui se invoca, com as demais consequências legais.
X - Contudo, e mais uma vez por mera cautela de patrocínio, e caso se entenda que não há lugar a anulação ou nulidade da decisão, o que não se aceita, sempre se diga que também nunca poderia ter havido lugar a condenação nos termos constantes da decisão alvo do presente recurso.
XI – É que parece olvidar o douto tribunal de primeira instância que a confissão dos factos articulados pelo Autor tem como consequência apenas uma cominação semi‐plena e não um efeito cominatório pleno, cabendo sempre ao tribunal julgar a causa conforme for de direito. A sentença ora em crise, excede claramente o tribunal o que dispõe a lei ao considerar que houve resolução com justa causa por a Ré não ter pago, à data da resolução do contrato, as remunerações dos meses de Setembro, Outubro e Novembro.
XII – É que na carta de resolução, com base na qual se afere quais os factos em juízo que devem ser apreciados (398.º, n.º 3 do Código de Trabalho – cuja violação vai aqui invocada), junta com a petição inicial, apenas invoca o Autor como motivo para resolver o contrato a falta de pagamento das retribuições de setembro e Outubro. Violando o douto tribunal a lei que ao considerar que a falta de pagamento do salário de dezembro também constituiu fundamento de resolução, ao contrário do que resulta da carta de resolução.
XIII – Ora, logo e considerando que apenas invocou na carta a falta de pagamento do vencimento de outubro e novembro e de que a mesma é datada de 15 de Dezembro de 2014, certo é que não existia justa causa de resolução.
XIV – Ora, o art. 394.º do Código do Trabalho possibilita resolver o contrato por falta de pagamento de retribuições quer esta seja culposa (394, n.º 2 a)) ou não culposa (394, n.º5), presumindo-se que é culposa quando a falta de pagamento se prolongue por período superior a 60 dias.
XV – No caso só decorreram 60 dias desde a data do vencimento do Mês de Setembro mas já não do mês de Outubro, pelo que apenas vale tal presunção para o vencimento do mês de Setembro, facilmente se afastando tal presunção uma vez que como resulta da carta de resposta da Ré à carta de resolução, junta pelo Autor na sua petição inicial, o atraso pontual no pagamento das mesmas apenas se deveu ao facto de a empresa ter verificado um grande decréscimo de vendas devido à crise económica que afetou o país, e em especial o sector da sua empresa.
XVI – E como resulta da lei da presunção de culpa no não cumprimento pontual não decorre, forçosamente, justa causa para a resolução do contrato de trabalho, tendo de se aferir a mesmo nos termos do n.º3 do art. 351.º do Código do Trabalho.
XVII – Sendo unânime na jurisprudência e na doutrina, conforme resulta da análise legal que fazem do art. 394.º e 395.º em conjugação com o art. 351.º do Código de Trabalho, que no caso do atraso (ou falta) do pagamento de uma ou duas retribuições, no caso de a empresa estar financeiramente debilitada devido a crise no sector, que não se verifica justa causa de resolução, perdendo, por isso, o trabalhador o direito a qualquer indemnização.
XVIII – No caso do vencimento de Outubro é certo que não há culpa porque não existe qualquer presunção, já na presunção que recai sobre o vencimento da retribuição de Setembro, é certo que nos termos legais a mesma se tem por afastada, atentas as circunstâncias descritas e constantes da carta e também não resulta dos factos constantes da petição inicial, e tidos por provados, que foi culposa ou deliberado o não pagamento de retribuições.
XIX - Requer-se, assim, que nestes termos seja revogada a presente sentença e substituída por outra que considere a resolução ilícita e absolva a Ré do pedido indemnizatório
XX – Sem prescindir, e caso não se subscreva a posição da Ré supra referida, o que não se consente mas apenas se admite por mera hipótese académica, atento à inexistência de culpa por parte da Ré e as circunstâncias do caso, deve a indemnização ser fixada em 15 dias de retribuição base e diuturnidades.
XXI – Por fim, também não se compreende como é condenada a Ré a pagar proporcionais do subsídio de férias e de Natal (ano 2014), quando resulta dos recibos de vencimento juntos pelo Autor, na sua petição inicial, que o mesmo recebia tais subsídios em duodécimos, assim, e face a tal prova documental, em claro contraste com o facto confessado e erroneamente dado por provado, deve igualmente ser absolvida a Ré do pagamento da quantia de 1.394,38€, sob pena de se tal se manter estarmos perante um Verdadeiro abuso de direito, nos termos do art. 334.º do Código Civil, e de um enriquecimento sem causa por parte do Autor.
XXII – Assim, e também nestes termos, deve ser revogada e alterada a sentença, ora em crise, só assim se fazendo justiça!
TERMOS EM QUE E NOS DEMAIS DE DIREITO DEVE SER DADO PROVIMENTO AO PRESENTE RECURSO E, POR VIA DELE, SER REVOGADA A SENTENÇA, ORA EM CRISE, POR VIOLAÇÃO DOS ARTIGOS 607.º, 615.º, n.º1, alínea b) do NCPC e 394.º, n.º 1 e 2, alínea a) e n.º5, 395.º e 398.º do CT e 57.º, n.º 2 do CPT, ATENDENDO ÀS SOLUÇÕES DE DIREITO INVOCADAS, COM AS DEMAIS CONSEQUÊNCIAS LEGAIS.
FAZENDO‐SE, ASSIM, A HABITUAL JUSTIÇA.”
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O A. apresentou resposta nos seguintes termos:
“1.º
Segundo o art. 57.º n.º 1 do Código de Processo do Trabalho, não contestando o Réu a acção contra si interposta, a sanção não é a condenação imediata no pedido mas sim considerarem-se confessados os factos articulados pelo Autor.
2.º
Nessa medida, face à matéria dada como provada outra solução não se impunha a não ser a que resultou da sentença recorrida, que foi devida e abundantemente fundamentada no plano jurídico.
3.º
Daí que a argumentação escanzurrada na peça recursória a que se responde se encontra vocacionada ao fracasso.
TERMOS EM QUE DEVERÁ IMPROCEDER O RECURSO, COM AS DEMAIS CONSEQUÊNCIAS LEGAIS.”
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Colhidos os vistos, cumpre, agora, apreciar e decidir.
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II – Fundamentação
a-) Factos Provados:
Os constantes do relatório supra.
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b) - Discussão
Como é sabido, a apreciação e a decisão dos recursos são delimitadas pelas conclusões da alegação do recorrente (art.º 639.º do C.P.C.), com exceção das questões de conhecimento oficioso.
Cumpre, então, apreciar as questões suscitadas pela Ré recorrente, quais sejam:
1ª – Nulidade da sentença por falta de fundamentação de facto e de direito.
2ª – Se a decisão da matéria de facto é omissa ou deficiente e obscura, impondo-se a anulação da sentença.
3ª – Inexistência de justa causa de resolução do contrato.
4ª – Se a indemnização por resolução devia ter sido fixada em 15 dias de retribuição.
5ª – Se a Ré não deve ao A. os proporcionais dos subsídios de férias e de Natal do ano de 2014.
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1ª questão
Nulidade da sentença por falta de fundamentação de facto e de direito
A Ré recorrente alega que o tribunal não especifica quais os fundamentos de facto ou de direito com base nos quais tomou a sua decisão; que face à não simplicidade da causa se exigia uma sentença devidamente fundamentada, com enunciação clara dos factos considerados assentes e os fundamentos de direito concretos que estiveram na base da condenação e não por mera transcrição do que resulta da petição inicial, violando a decisão recorrida os artigos 57.º, n.º 2 do CPT, 208.º da CRP, 607.º, n.ºs 3 e 4 e 615.º, n.º 1, b), ambos do CPC.
Significa isto que a recorrente veio invocar a nulidade da sentença por falta de fundamentação (artigo 615.º, n.º 1, b), do C.P.C.).
A propósito da arguição de nulidades da sentença dispõe o artigo 77.º, do C.P.T. que:
1. A arguição de nulidades da sentença é feita expressa e separadamente no requerimento de interposição de recurso.
2. Quando da sentença não caiba recurso, a arguição das nulidades da sentença é feita em requerimento dirigido ao juiz que a proferiu.
3. A competência para decidir sobre a arguição pertence ao tribunal superior ou ao juiz conforme o caso, mas o juiz pode sempre suprir a nulidade antes da subida do recurso.
A Ré recorrente arguiu as referidas nulidades de forma expressa e separada no requerimento de interposição de recurso, impondo-se, assim, a este Tribunal o conhecimento das mesmas.
Antes de mais, cumpre dizer que a Exm.ª Juiz do tribunal a quo se pronunciou sobre a arguição das nulidades da sentença, concluindo pela não verificação das mesmas.
Vejamos, então, se assiste razão à Ré recorrente.
Conforme resulta do artigo 57.º, do C.P.T., se o réu não contestar, tendo sido ou devendo considerar-se regularmente citado, consideram-se confessados os factos articulados pelo autor e é logo proferida sentença a julgar a causa conforme for de direito, sendo que, <<se a causa se revestir de manifesta simplicidade, a sentença pode limitar-se à parte decisória, precedida da identificação das partes e da fundamentação sumária do julgado; se os factos confessados conduzirem à procedência da acção, a fundamentação pode ser feita mediante simples adesão ao alegado pelo autor>> - n.º 2, do citado normativo.
Resulta do n.º1 deste normativo, como efeito da revelia, a consagração de um efeito cominatório semipleno, no entanto, este não dispensa o juiz de elencar os factos alegados pelo A. que considera confessados, desde logo, por aplicação do disposto no n.º 3, do artigo 607.º, do CPC., do qual resulta que na sentença o juiz deve discriminar os factos que considera provados.
Por outro lado, a sentença é nula quando não especifique os fundamentos de facto e de direito que justificam a decisão (n.º 1, b), do artigo 615.º, do C.P.C.).
Trata-se da apelidada nulidade por falta de fundamentação.
O dever de fundamentação encontra-se consagrado na CRP, dispondo o seu artigo 205.º que <<as decisões dos tribunais que não sejam de mero expediente são fundamentadas na forma prevista na lei>>.
Igual dever resulta do artigo 154.º, do C.P.C., no qual se dispõe que as decisões proferidas são sempre fundamentadas.
Acresce que, segundo a doutrina e jurisprudência maioritárias, só a falta absoluta de motivação e já não uma motivação deficiente ou incompleta conduz à nulidade da sentença[1].
Ora, da decisão recorrida consta o seguinte:
Face ao preceituado no art. 57º, nº1 do Cód. Proc. Trabalho, dada a falta de contestação da R. consideram-se confessados os factos alegados na petição inicial, que aqui se dão por integralmente reproduzidos.
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O Tribunal é competente em razão da nacionalidade, da matéria e da hierarquia.
O processo não enferma de nulidade total.
As partes, dotadas de personalidade e de capacidade judiciárias, são legítimas.
Inexistem outras excepções, questões prévias ou incidentais que obstem à apreciação do mérito da causa.
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Enquadramento jurídico dos factos
Ante os factos provados por ausência de contestação e mercê do preceituado nos arts 394º, nºs 1,2, al.a) e 5 e 395º do Cód. Trabalho, forçoso é concluir pela verificação dos pressupostos legais para a resolução com justa causa do contrato de trabalho por iniciativa do trabalhador com fundamento no não pagamento pontual da retribuição.
Com efeito, à data da resolução do contrato (16.12.2014) a R. tinha por pagar as remunerações dos meses de Setembro, Outubro e Novembro desse ano, existindo, por isso, mora há mais de 60 dias por parte da R.
Como assim, assiste ao A. o direito à indemnização prevista no art. 396º do C. Trab. e às retribuições e subsídios em dívida.
Tal indemnização é fixada entre 15 e 45 dias de retribuição base e diuturnidades por cada ano completo de antiguidade, atendendo ao valor da retribuição e ao grau de ilicitude do comportamento do empregador, não podendo ser inferior a três meses de retribuição base e diuturnidades
E no caso de fracção de ano de antiguidade, o valor da indemnização é calculado proporcionalmente.
Tal indemnização engloba quer os danos patrimoniais quer os não patrimoniais pode ser mais elevada, provando-se que efectivamente o trabalhador sofreu prejuízos de montante mais elevado – nº3 do art. 396º.
No presente caso, face ao valor da retribuição mensal do A. e à míngua de factos que nos permitam graduar o grau de ilicitude da conduta da R., afigura-se-nos ajustado fixar a indemnização no valor médio de 30 dias por cada ano de antiguidade, tal como vem peticionado.
Por conseguinte, face ao período de vigência do contrato de 1.7.2001 16.12.2014, o A. a título de indemnização tem o A. direito à quantia reclamada, no valor de 6.485,71.
Mas além da indemnização, nos termos do preceituado nos arts 127º, nº1, al.b), 238º, nº1, 245º, nº1, al. a) e b) 263º e 264º do C.Trabalho, tem o A. direito aos salários e às retribuições de férias e subsídios de férias e de Natal em dívida, que se mostram correctamente calculados e totalizam a quantia de € 3.232,07.
Sobre a indemnização ora fixada são devidos juros de mora a partir do trânsito da decisão da presente acção e relativamente às demais quantias, tratando-se de créditos vencidos e exigíveis à data da cessação do contrato, desde do dia seguinte a tal cessação até integral pagamento.” – fim de citação.
Assim sendo, facilmente se conclui que a Exm.ª juiz do tribunal recorrido não discriminou os factos provados por força da confissão tendo-se limitado a consignar: “consideram-se confessados os factos alegados na petição inicial, que aqui se dão por integralmente reproduzidos”.
Impunha-se, no entanto que o fizesse, uma vez que, como já referimos, não existe qualquer fundamento legal que dispense o cumprimento do disposto no artigo 607.º, n.º 3, do C.P.C.[2].
Desta forma, sendo a sentença recorrida totalmente omissa quanto à fundamentação de facto (o que já não ocorre quanto à fundamentação de direito que embora sucinta existe), a mesma é nula porque não especifica os fundamentos de facto que justificam a decisão, impondo-se, assim, a declaração de tal nulidade e a prolação de uma nova sentença da qual conste a discriminação dos factos provados por força da confissão.
Procede, assim, esta conclusão da Ré recorrente.
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Face à procedência da invocada nulidade da sentença recorrida as restantes questões suscitadas pela recorrente encontram-se necessariamente prejudicadas.
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IV – Sumário[3]
1. Resulta do n.º 1, do artigo 57.º, do C.P.T., como efeito da revelia, a consagração de um efeito cominatório semipleno, no entanto, este que não dispensa o juiz de elencar os factos alegados pelo A. que considera confessados, desde logo, por aplicação do disposto no n.º 3, do artigo 607.º, do CPC., do qual resulta que na sentença o juiz deve discriminar os factos que considera provados.
2. A sentença é nula quando não especifique os fundamentos de facto e de direito que justificam a decisão (n.º 1, b), do artigo 615.º, do C.P.C.), no entanto, só a falta absoluta de motivação e já não uma motivação deficiente ou incompleta conduz à nulidade da sentença.
3. Se o juiz não discriminou os factos provados por força da confissão tendo-se limitado a consignar: “consideram-se confessados os factos alegados na petição inicial, que aqui se dão por integralmente reproduzidos”, inexistindo qualquer fundamento legal que dispense o cumprimento do disposto no artigo 607.º, n.º 3, do C.P.C., a sentença é totalmente omissa quanto à fundamentação de facto e, consequentemente, é nula porque não especifica os fundamentos de facto que justificam a decisão.
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V – DECISÃO
Nestes termos, sem outras considerações, na procedência do recurso acorda-se:
- em declarar nula a sentença recorrida devendo ser proferida uma nova decisão em conformidade com o supra decidido.
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Custas a cargo da parte vencida a final.
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Porto, 2016/03/14
Paula Maria Roberto
Fernanda Soares
Domingos Morais
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[1] Neste sentido cfr. os acórdãos do STJ de 15/12/2011 e da RP de 17/04/2012, ambos disponíveis em www.dgsi.pt.
[2] Neste sentido cfr. o acórdão da RC de 20/05/2004, disponível em www.dgsi.pt.
[3] O sumário é da exclusiva responsabilidade da relatora.