Acórdão do Tribunal da Relação do Porto
Processo:
0821914
Nº Convencional: JTRP00041437
Relator: CARLOS MOREIRA
Descritores: EXPROPRIAÇÃO POR UTILIDADE PÚBLICA
CUSTO DA CONSTRUÇÃO
INFRA-ESTRUTURAS
RISCO DE CONSTRUÇÃO
SERVIDÃO
ÍNDICE DE CONSTRUÇÃO
VALORIZAÇÃO
Nº do Documento: RP200806030821914
Data do Acordão: 06/03/2008
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: APELAÇÃO.
Decisão: REVOGADA PARCIALMENTE.
Indicações Eventuais: LIVRO 276 - FLS 31.
Área Temática: .
Sumário: I - As condições especiais a que alude o art. 26º nº 8 do C. Exp. devem ser entendidas como reportadas aos próprios contornos físico-materiais que afectam os custos de construção, exigindo-se que a variação desses custos, que elas acarretam, seja substancial e acentuada, ultrapassando acréscimos ou aumentos que normalmente decorrem de dificuldades inerentes à actividade construtiva.
II - É difícil, na prática, quantificar as despesas necessárias ao reforço das infra-estruturas (art. 26º nº 9) e não é justo obrigar o expropriado a arcar sozinho com essas despesas, já que aquele reforço constitui um benefício para os outros prédios adjacentes não pertencentes ao expropriado.
III - A norma do art. 26º nº 10 do C. Exp. tem por função diminuir o valor da avaliação, com o fim de o ajustar ao valor de mercado e é ditada por exigências de igualdade entre o expropriado que, por virtude da expropriação, obtém uma indemnização sem sofrer os riscos e o esforço decorrentes do processo construtivo e o não expropriado que, em idênticas condições, levasse a cabo a edificação possível.
IV - As servidões acarretam normalmente prejuízo pois que, salvo raras excepções, limitam o direito de transformação que integra o conteúdo do direito de propriedade, traduzindo-se numa efectiva e importante redução do valor dos prédios servientes, que deve ser justamente ressarcido.
V - O índice de construção deve ser o urbanisticamente adequado, tendo em consideração as características da parcela, designadamente a sua área e configuração geométrica, especificidades da zona envolvente, bem como as dos edifícios aí situados e o tipo de construção já existente nas imediações.
VI - Apenas em circunstâncias excepcionais, em que esteja reunida uma plêiade de circunstâncias valorizantes da parcela, se pode admitir a fixação da percentagem máxima prevista no art. 26º nº 6 do C. Exp..
Reclamações:
Decisão Texto Integral: Processo nº 1914/08-2


ACORDAM NO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DO PORTO

1.

Respeitam os presentes autos a expropriação por utilidade pública em que é expropriante a EP-Estradas de Portugal e é expropriada B………., Lda., relativa à parcela de terreno n.º204, com a área de 592,00m2 a destacar de um prédio rústico sito no ………., Freguesia de ………., Concelho da Maia, melhor identificado no processo.

O Acórdão arbitral fixou o valor de 10.513,92 euros.
Inconformada recorreu a expropriada defendendo que a indemnização deve ser fixada em 45.520,00€, acrescida das devidas actualizações.
A expropriante respondeu pugnando pela improcedência do recurso.

Procedeu-se, seguidamente, à avaliação, tendo na mesma:
- os peritos nomeados pelo tribunal proposto um valor indemnizatório de 35.170,72€;
- o perito indicado pela expropriante proposto um valor indemnizatório de 10.579,04€; e
- o perito indicado pela expropriada proposto um valor indemnizatório de 79.814,38€.

Na sequência da referida avaliação, vieram as partes alegar nos termos do art.º 64.º do CE.
A fls.224 o tribunal ordenou que os peritos esclarecessem o laudo anteriormente apresentado, o que estes fizeram a fls.235, nada tendo as partes requerido quanto aos esclarecimentos prestados.

2.

Na continuação do processo foi proferida sentença que:

Julgou parcialmente procedente o recurso interposto pela expropriada e, em consequência, fixou o montante indemnizatório a pagar-lhe pela expropriante em 35.170,72€, actualizado até à notificação do despacho de fls. 155, e daí em diante actualizado o montante equivalente à diferença entre a quantia atribuída à expropriada e a ora fixada, à data da decisão final do processo, nos termos do art.º 24.º do Código das Expropriações, de acordo com os índices de preços no consumidor, com exclusão da habitação, publicados pelo I.N.E.

3.

Inconformadas recorreram ambas as partes.

3.1.
A expropriada concluiu pelo modo seguinte:

Os Senhores Peritos não justificam, minimamente, a aplicação de Factores Correctivos a qual não é automática.

1. As normas que o permitem não são indistintas na sua aplicabilidade e cada uma, por si, exige fundamentação clara e explicação objectiva de molde a poder preencher-se os seus requisitos.
2. Quanto ao primeiro factor correctivo de 10% não se sabe se é considerado à luz do nº. 8 se à luz do nº. 9 do artigo 26.º do CE e não se sabendo em qual das duas normas se subsume esvai-se qualquer possibilidade de controlo dos seus pressupostos de aplicação.
3. A interpretação do artigos 158.º e 659.º do CPC no sentido de ser dispensada a fundamentação de direito e a indicação da norma aplicada em sede de aplicação de factores correctivos previstos no CE viola o artigo 205.º da CRP o que se invoca.
4. Quanto ao considerado ao abrigo do nº. 10 do artigo 26.º do CE não está demonstrada a “comprovada inexistência de risco e esforço inerente à actividade construtiva relevante na situação concreta capaz de justificar uma redução do valor da avaliação do solo apto para construção, ajustando os custos à realidade hipotética – ver Ac. RP de 19/4/2005, 2ª. Secção, Proc. nº. 1678/05, Relator Alberto Sobrinho, in www.dgsi.pt, e Ac. RP de 15/10/2007, Relator José Ferraz, www.dgsi.pt.
5. Não devem, assim, ser considerados os referidos factores correctivos.
6. Acresce que os Senhores Peritos ao consignarem o valor referencial referido do nº. 5 do artigo 26.º do CE e não valores do mercado imobiliário ou de terrenos já loteados e este factor correctivo estão a penalizar duplamente a Expropriada.
7. É ponto assente na Sentença que, na área de 2.750m2 da parte sobrante do prédio, foi constituída uma servidão non aedificandi – ponto L) dos Factos Provados.
8. A Depreciação da Parte Sobrante na área de 2.750m2 fica, objectivamente, desvalorizada.
9. Perde a capacidade e valências construtivas que tinha ab initio e, assim, fica sem qualquer préstimo ou interesse económico para a Expropriada em termos objectivos limitando o direito de propriedade preexistente
10. Uma servidão non aedificandi suscita, pela afectação de uma faculdade essencial do direito de propriedade, um prejuízo do titular do direito de propriedade o qual é susceptível de indemnização.
11. A não indemnização da servidão non aedificandi implicaria, por isso, uma compressão desproporcionada do direito de propriedade (naquela área) e uma violação da igualdade na tutela desse direito;
12. A interpretação do artigo 29.º do CE no sentido de se desconsiderar a Depreciação na Parte Sobrante por via da implantação de uma servidão non aedificandi que retira potencialidade edificativa onde ela existia atenta a maior dimensão da demais viola os artigos 13.º e 62.º, nº. 2 da CRP e, portanto, é inconstitucional – o que se invoca – no mesmo sentido o Ac. RP de 22/9/2005, Relator José Ferraz, www.dgsi.pt.
13. Acresce que mesmo desconsiderando aquelas apetências construtivas – que não se desconsidera – sempre a servidão implicava restrições várias que vão muito além da afectação urbana ou urbanística.
14. Estes condicionamentos traduzem prejuízos efectivos que deveriam ser considerados pelo Tribunal a quo.

A expropriante contra-alegou pugnando pelo indeferimento desta pretensão.

3.2.
Por seu turno rematou as suas alegações com as seguintes conclusões:
1. Como decorre da Constituição da República Portuguesa, no seu artigo 62.º, n.º 2, a expropriação por utilidade pública de quaisquer bens ou direitos confere ao expropriado o direito de receber o pagamento de uma justa indemnização.
2. A aludida indemnização visa ressarcir o prejuízo que para o expropriado advém da expropriação e será medida pelo valor do bem expropriado, tendo em consideração as circunstâncias e as condições de facto existentes à data da declaração de utilidade pública.
3. A justeza da indemnização manifesta-se em dois sentidos: por um lado, impondo que o expropriado obtenha uma compensação integral e plena em consequência da lesão patrimonial sofrida, e, por outro lado, impondo que a indemnização não seja manifestamente desproporcionada à perda do bem expropriado.
4. Na fixação da indemnização o tribunal deverá atender aos elementos probatórios que constam nos autos, sendo instado o julgador à produção de uma valoração própria e autónoma, fundada nos critérios constitucionais e legais, e que não pode reconduzir-se a uma simples, mecânica e automática adesão à avaliação efectuada pelos peritos indicados pelo tribunal.
5. Na decisão o tribunal não pode deixar de debruçar-se sobre o teor da decisão arbitral e de explicar, atentas as características que esta partilha com o acto de avaliação, das razões pelas quais postergou a arbitragem em beneficio do acto de avaliação, tendo conta que os árbitros e os peritos indicados pelo tribunal ostentam qualidades em que se equivalem.
6. A parcela objecto do presente recurso classifica-se como solo apto para construção, por efeito da planta de ordenamento e do artigo 12.º do regulamento do PDM, nos termos do artigo 25.º, n.º2 al. c) CE, conforme constata a VAPRM.
7. Estabelece a al. a), do n.º 2 do artigo 12.º PDM que se trata de uma parcela pertence à categoria de “área predominantemente residencial” de “nível 3”, dispondo o artigo 17.º, n.º1, al. c) PDM, como índice de construção máximo para este zonamento de 0,6, tendo em face desta indicação concluído os peritos do Tribunal pela atribuição, para efeitos de cálculo do valor indemnizatório, do índice máximo previsto para a zona.
8. Não podemos aceitar tal conclusão sem mais, uma vez que não resulta, automaticamente, do PDM para a parcela em causa a garantia de uma qualquer pretensão potencial de capacidade edificativa máxima. Tal seria desvirtuar a natureza e fins do PDM e poria em causa a violação da legislação urbanística em vigor, designadamente, o Regulamento Geral das Edificações Urbanas, chegando no limite a atingir a legalidade e respectiva validade do PDM.
9. Nunca se pode fundar, de forma abstracta e automática, por mera leitura do articulado do regulamento do PDM, para efeitos do cálculo da indemnização, um valor que atribua, sem mais, o máximo previsto pelo PDM, uma vez que não há qualquer imposição, legal e regulamentar, de assegurar o esgotamento dos índices.
10. Não podem abster-se os peritos do Tribunal, em primeiro lugar, e o Tribunal, posteriormente, por pretenso fundamento legal nas disposições gerais do PDM e por ausência de um Plano de Pormenor ou de Urbanização em vigor, da realização de um juízo concretizador da situação fáctico-jurídica da parcela da concretização do índice de construção permitido para a parcela a destacar e muito menos concluir, sem qualquer fundamento, a possibilidade de realização da sua capacidade edificativa máxima.
11. Antes do necessário juízo de concretização edificativa cumpre aferir da validade e eficácia do denominado “Protocolo”, pelo qual, e segundo o expropriado, se integra a parcela numa “zona de edificação do denominado C………. com autorização de construção na redita área conforme Protocolo celebrado com autarquia local”.
12. O protocolo foi celebrado entre a D………., Lda. e a Câmara Municipal ………. e tem conde se pode ser qualificado como um contrato de planeamento, admissíveis juridicamente, mas feridos de ineficácia em termos de produção de efeitos perante terceiros, designadamente perante a entidade expropriante.
13. A pretensão da expropriada não tem qualquer fundamento jurídico, pois não pode a entidade expropriante responsabilizar-se quando a sua intervenção não viola nenhuma disposição normativa vigente e eficaz nem esbarra com nenhuma posição jurídica oponível e vinculativa, pelo facto de indirectamente a intervenção afectar o objecto de um contrato celebrado entre terceiros.
14. O presente protocolo não substitui a elaboração do respectivo plano de urbanização, nem tão pouco prescinde do acto de gestão urbanística de licenciamento de obras de construção, logo não é legítimo, nem legalmente fundada a alegação de que existe uma qualquer autorização de construção, como o faz a expropriado em sede de recurso do Acórdão de Arbitragem e muito menos reconhecer qualquer índice de construção superior ao que decorre nos termos gerais do PDM.
15. Não se trata este protocolo de um contrato que substitui o acto de licenciamento urbanístico, mas de um contrato que visa a definição dos termos em que este teria eventualmente lugar, pelo que não tendo sido emanado efectivamente aquele acto autorizativo, não se pode considerar que já tinha sido fixada e adquirida uma determinada edificabilidade pelo expropriado à data da declaração de utilidade pública.
16. Em termos de condicionantes, a parcela encontrava-se na íntegra, à data da decisão política de alargamento do IC24, já sujeita a uma servidão non aedificandi por integrar uma zona de protecção nos termos do artigo 3.º, al. a) do Decreto-Lei n.º 13/71 de 23 de Janeiro com uma zona mínima de 35m do eixo da estrada e nunca menos de 15m da zona da estrada, servidão essa incorporada nos termos do artigo 7.º e 47.º, n.º1 do PDM, constituindo, assim, uma condicionante prévia ao uso do solo.
17. Quer isto dizer que efectivamente o expropriado não podia, na parcela a destacar, realizar qualquer obra de edificação ou de urbanização, salvo nos estritos limites previstos no artigo 7.º do Decreto-Lei n.º 13/94 (construção de vedação mediante autorização da Junta Autónoma das Estrada, ora Estradas de Portugal, SA) e artigos 8.º, n.º2, 9.º e 10.º do Decreto-Lei n.º 13/71.
18. Perante o presente quadro legal e jurídico da parcela e atendendo ao disposto no artigo 23.º, n.º1 CE, torna-se obrigatório considerar, para efeitos do cálculo da justa indemnização, esta condicionante legal – a servidão – pois sem ela não é possível determinar qual o real prejuízo do expropriado e valor real e corrente do bem de acordo com o seu destino efectivo ou possível numa utilização económica normal, à data da publicação da declaração de utilidade pública.
19. Não faz sentido, nem é juridicamente fundado, ficcionar um índice de construção máximo da parcela quando, à data da DUP ele não se podia verificar em concreto e sequer a título eventual, nem era legalmente possível qualquer decisão administrativa que autorizasse um tipo de construção tal como resulta do artigo 17.º, n.º1 al. c) PDM.
20. A servidão em causa decorreu de um precedente procedimento expropriativo, pelo que a desvalorização que ela eventualmente introduziu no terreno do ora expropriado já foi apreciada e contabilizada nesse momento, não fazendo sentido considerar agora a perda de uma “pretensa” edificabilidade do terreno onerado com uma servidão, quando o particular já foi ressarcido da mesma.
21. Os factores correctivos têm de ser ponderados em concreto, ou seja, têm de representar a realidade e efectivas potencialidades da parcela objecto da expropriação.
22. Assim, para efeitos do disposto do n.º 6 do artigo 26.º CE, não podemos deixar de ter em conta que a localização, qualidade ambiental e equipamentos existentes na zona, numa escala com o máximo de 15%, atribuir o valor de 12% manifesta-se claramente desproporcionada atendendo ao facto de a parcela ser contínua ao IC24, uma via de elevado movimento [entre 70.000 a 90.000 veículos por dia ([1])] que implicam elevados índices de poluição pró fumos e ruídos.
23. Nenhuma prova existe nos autos que aponte no sentido da desvalorização das partes sobrantes com a oneração de uma servidão non aedificandi numa área de 2.750m2, nos termos do artigo 4.º do Decreto-Lei n.º 189/2002 de 28 de Agosto.
25. A alegação da desvalorização por localização em zona non aedificandi não merece provimento, uma vez que não se verifica nenhuma das situações previstas no artigo 8.º, n.º2 CE, quer porque a parte sobrante não é objecto de qualquer utilização, na sua consideração global, nem decorre a inviabilização da utilização do bem e consequente anulação do seu valor económico, pois no âmbito de uma eventual operação urbanística a servidão em nada interfere na determinação dos índices de construção (pois mantém-se a contabilização da área onerada), bem como a área pode ser utilizada para efeitos de cedência de espaços verdes e de utilização colectiva ou de estacionamentos, nos termos do artigo 12.º do Regime Municipal de Urbanização e Edificação, por não porem em causa o fim subjacente a razão de ser da existência de uma servidão non aedificandi.
26. A avaliação do Tribunal deve, como forma de alcançar o valor da justa indemnização, ancorar-se no relatório do perito da expropriante, o qual corrige os aspectos incorrectos da decisão arbitral, designadamente o índice a aplicar à parcela que deverá ser de 0,2 e atender ao valor de 10% do valor custo de construção, nos termos do artigo 26.º, n.º6 CE.
27. A decisão recorrida violou, assim, o disposto nos artigos 23.º, 24.º, 26.º e 27.º do CE e os artigos 158.º, n.º 1 e 668.º, n.º 1, alínea b) do Código de Processo Civil artigos 158.º, n.º 1 e 668.º, n.º 1, alínea b) do Código de Processo Civil, bem como os artigos 20.º e 205.º, n.º 1 da CRP.
28. Termos em que, deve o presente recurso ser julgado provado e procedente, revogando-se a decisão recorrida e substituindo-a por outra que julgue improcedente o recurso da decisão arbitral da expropriante, como é de inteira justiça!

4.
Sendo que, por via de regra: artºs 684º e 690º do CPC - de que o presente caso não constitui excepção - o teor das conclusões define o objecto do recurso, as questões essenciais decidendas são as seguintes:
A.
Do recurso da expropriada:

Não consideração dos factores correctivos fixados pelos peritos do tribunal.

Indemnização relativamente à área abrangida por servidão non aedificandi.
B)
Do recurso da expropriante.

Consideração do índice de construção de 0,2, em vez de 0,6.

Fixação da percentagem do artº26º nº6 em 10%, em vez de 12%.

5.

Os factos dados como apurados e nos quais a decisão se alicerçou são os seguintes:

A) Por despacho de 05/01/2005, proferido por Sua Excelência o Senhor Secretário de Estado Adjunto e das Obras Públicas (publicado no D.R., II série, n.º20, de 28/01/2005, a págs. 1432-(10) e ss.), foi declarada a utilidade pública da expropriação da parcela 204, necessária à execução da obra da SCUT–Grande Porto–A41/IC24–Freixieiro–Alfena (do quilómetro 8+200 ao quilómetro 14+252,276)–doc. de fls.72 e ss.;
B) A parcela em causa está compreendida num prédio rústico com a área total de 11.000m2, sito no ………., Freguesia de ………., concelho da Maia, inscrito na matriz predial rústica sob o artigo n.º715 e descrito na Conservatória do Registo Predial sob o n.º00148/200488–certidões da matriz (fls.66 e 67) e do registo predial (fls.68 e ss.);
C) A referida parcela confronta a Norte com a parte restante do prédio, a Sul com o IC 24, a Nascente com outro prédio da expropriada e a Poente com a Rua ……….–vistoria ad perpetuam rei memoriam;
D) O prédio, por sua vez, confronta a Norte com E………., a Sul com herdeiros de F………., a Nascente com caminho e a Poente com G……….–vistoria ad perpetuam rei memoriam;
E) Segundo o PDM em vigor à data da declaração de utilidade pública, a parcela encontra-se em área classificada como “espaços urbanos e urbanizáveis, área predominantemente residencial, de nível 3”–vistoria ad perpetuam rei memoriam;
F) A zona envolvente da parcela caracteriza-se pela existência de vasta mancha de terrenos de utilização florestal, mas também pela existência de áreas novas de expansão urbana, formando bolsas de construção-vistoria ad perpetuam rei memoriam a fls. 50 e laudo de avaliação a fls. 181;
G) Contiguamente ao prédio a poente existe uma urbanização nova, de área considerável, constituída por blocos habitacionais multifamiliares de três pisos-vistoria ad perpetuam rei memoriam, a fls.50;
H) O prédio do qual se destaca a parcela tem ampla frente para a Rua ………. (via pavimentada, dotada de rede pública de distribuição de água, saneamento com ligação a ETAR, rede de drenagem de águas pluviais e rede de distribuição de energia eléctrica e telefone), a partir da qual é possível aceder ao centro cívico da freguesia, que fica a cerca de 750 metros, e onde se situam a Junta de Freguesia, o centro de saúde, as escolas do ensino básico, a igreja paroquial e o cemitério-vistoria ad perpetuam rei memoriam a fls.50 e respostas aos quesitos a fls.186;
I) O prédio onde se insere a parcela margina o talude norte do IC24 e dista cerca de 2km do acesso pelo IC24 à A3 e A4 –respostas aos quesitos a fls.185;
J) A parcela tem acesso fácil e rápido às cidades da Maia (cujo centro urbano se situa a 3km), Porto e Matosinhos e ao Aeroporto Francisco Sá Carneiro–respostas aos quesitos a fls.185 e 186;
K) A parcela, à data da D.U.P., encontrava-se ocupada com mato e vegetação espontânea (varas e eucaliptos) – respostas aos quesitos a fls.186;
L) Uma área de 2.750m2 da parte sobrante do prédio fica abrangida pela servidão non aedificandi da via a executar-laudo de avaliação a fls.181.

Considerando o disposto no artº 712º n1 al.a) do CPC e porque tais factos são essenciais para a decisão da causa, há que aditar ainda os seguintes:
A parcela expropriada tem a área de 592m2 e apresenta-se praticamente plana e a vegetação nela existente não tem valor comercial – fls.50.
O PDM da Maia, aprovado pela Resolução do Conselho de Ministros nº 13/94 de 17 de Maio, admite um índice máximo de utilização de 0,6, sendo a cércea máxima de três pisos –fls.181.

6.
Apreciando.

6.1.
Primeira questão.
Os peritos do tribunal entenderam que deveria ser deduzida uma percentagem de 10% correspondente a encargos com despesas de urbanização bem como uma percentagem de 5% para o factor de risco.
Importa apurar da bondade e legalidade deste entendimento.

6.1.1.
Quanto ás despesas de urbanização.
Bem vistas as coisas os peritos fundamentaram-se nos nºs 8 e/ou 9 do artº 26º do CE.
Prescreve o artº 26º nº8 do Código das Expropriações:
«Se o custo da construção for substancialmente agravado ou diminuído pelas especiais condições do local, o montante do acréscimo ou da diminuição daí resultante é reduzido ou adicionado ao custo da edificação a considerar para efeito da determinação do valor do terreno.»

Este segmento normativo transcreve o nº4 do artº 25º do Código de 1991.
Prevê ele um aumento ou diminuição do custo da construção em função das especiais condições ou circunstâncias do local que tal impliquem.
Em primeiro lugar as condições a considerar não são umas quaisquer, designadamente as situadas a montante, isto é, as necessárias para tornar efectiva a capacidade construtiva da parcela.
Pois que tal alargaria demasiadamente a previsão legal e conferir-lhe-ia contornos de tal modo abrangentes e indefinidos que descambaria numa intolerável aleatoriedade.
Antes tais condições devem ser entendidas como reportadas aos próprios contornos físico-materiais da parcela que afectem - para melhor: diminuindo-os, ou para pior: aumentando-os - os custos da construção.
Como sejam, p.ex., as sua características orográficas ou a sua inclinação, na medida em que é muito mais difícil e oneroso construir num terreno montanhoso e com um declive acentuado do que num terreno plano e sem tal declive ou inclinação.
Em segundo lugar porque não são quaisquer condições ou circunstâncias do terreno que justificam a aplicação deste segmento normativo, nem as suas consequências no preço da construção podem apenas ser medianas ou normais.
Importa que sejam condições especiais, ie. fora do comum, extraordinárias. E que a variação do custo da construção que elas acarretem seja substancial, relevante e acentuado, ultrapassando certos acréscimos ou aumentos que normalmente decorrem de certas dificuldades geralmente inerentes à actividade construtiva – cfr. Ac. da Relação do Porto de 19.04.2005, dgsi.pt, p.0521678.
No caso vertente nada se apurou e sequer emerge dos autos que a parcela expropriada encerre tais especiais condições.
Antes pelo contrário provou-se quase trata de uma parcela praticamente plana, pelo que não se alcança que as sua condições materiais e os seus contornos e características físico-materiais sejam de tal jaez que agravem o custo de construção e, muito menos, substancialmente.
Sendo, assim, inadmissível subsumir este caso concreto na previsão deste segmento normativo.
Por seu turno estatui o art. 26º n.º9:
«Se o aproveitamento urbanístico que serviu de base à aplicação do critério fixado nos nºs 4 a 8 constituir, comprovadamente, uma sobrecarga incomportável para as infra-estruturas existentes, no cálculo do montante indemnizatório deverão ter-se em conta as despesas necessárias ao reforço das mesmas.»
Este preceito é inovador em relação ao código de 1991.
Introduzindo um elemento redutor no calculo da indemnização.
Deve entender-se que as infra-estruturas a que se reporta são as mencionadas na al.a) do nº2 do artº 25º: acesso rodoviário, abastecimento de água, energia eléctrica e sistema de saneamento ou, nos termos da alínea b), as existentes no núcleo urbano em que o solo se insere.
Mais uma vez o legislador foi exigente para fazer actuar a previsão legal.
Pois não se contenta com uma sobrecarga qualquer mas antes exige uma sobrecarga “incomportável”.
Compreendendo-se porquê.
É que o valor das infra-estruturas normais já está considerado na não aplicação das diversas percentagens a elas atinentes referidas no n.º7 do citado art. 26º.
Consequentemente, faltando uma ou mais dessas infra-estruturas, o seu valor não é tomado em conta para o efeito de aumentar a percentagem do valor do terreno em relação ao valor da construção.
E assim, a ausência das mesmas, provocando uma diminuição do valor do terreno, está obviamente a ser tomada em conta para o efeito do cálculo do mesmo valor – cfr. Ac. da Relação do Porto de 31.03.2004, dgsi.pt. p.0431552.
Por outro lado esta norma deve ser aplicada com cautelas, cum granno sallis.
Em primeiro lugar porque, como já se referiu, ela não pode deixar de ser concatenada com o estatuído na parte restante do artº 26, rectius o seu nº7.
Em segundo lugar porque se vislumbra sempre difícil, na prática, quantificar as despesas necessárias ao reforço das infra-estruturas.
Em terceiro lugar porque constituindo normalmente o reforço das infra-estruturas um benefício para outros prédios adjacentes não pertencentes ao expropriado, não parece justo – por violação do princípio da igualdade e da atribuição da equitativa indemnização expropriativa– obrigar o expropriado a arcar sozinho com as correspondentes despesas a deduzir naquela indemnização – cfr. Alípio Guedes in Valorização dos Bens Expropriados, Almedina, 2003, p.90.
No caso sub júdice verifica-se que:
Segundo o PDM, a parcela encontra-se em prédio inserido em área classificada como “espaços urbanos e urbanizáveis, área predominantemente residencial, de nível 3”.
Tal prédio tem ampla frente para a Rua ………. (via pavimentada, dotada de rede pública de distribuição de água, saneamento com ligação a ETAR, rede de drenagem de águas pluviais e rede de distribuição de energia eléctrica e telefone), a partir da qual é possível aceder ao centro cívico da Freguesia, que fica a cerca de 750 metros, e onde se situam a Junta de Freguesia, o centro de saúde, as escolas do ensino básico, a igreja paroquial e o cemitério.
Contiguamente ao prédio a poente existe uma urbanização nova, de área considerável, constituída por blocos habitacionais multifamiliares de três pisos.
A zona envolvente da parcela caracteriza-se pela existência de vasta mancha de terrenos de utilização florestal, mas também pela existência de áreas novas de expansão urbana, formando bolsas de construção.
Obviamente que o aproveitamento urbanístico que serviu de base à aplicação do critério fixado nos nºs 4 a 8, se fundamentou neste factualismo, maxime no facto de o prédio em causa já se encontrar rodeado por bolsas de construção, ser contíguo a zona já urbanizada e amplamente infra-estruturada e a construção admissível não poder, em princípio, ultrapassar os três pisos.
Torna-se, destarte, evidente que existe uma relação de adequabilidade e de normalidade entre as construções admitidas como possíveis pelos peritos e aceites pelo tribunal e a natureza, amplitude e qualidade das infraestruturas existentes junto da parcela – e não necessariamente na parcela, o que a lei não exige – cfr. redacção das várias alíneas do nº 7 do artº 26º.
Sendo que, pelo facto de o prédio não integrar passeios e rede distribuidora de gás, já fica penalizado pela não aplicação da majoração de 1,5%, concedida pelas alíneas b) e h).
Não se provando ou sequer indiciando nos autos que o referido aproveitamento urbanístico que serviu de base à determinação do valor do solo e da indemnização, constitua uma sobrecarga incomportável para as mencionadas infra-estruturas.
Em suma inexiste fundamento para onerar a expropriada com a percentagem de 10% a título de “despesas de urbanização”.

6.1.2.
No atinente ao factor de risco.
Neste particular rege o nº10 do artº 26º.
O qual prescreve:
«O valor resultante da aplicação dos critérios fixados nos n.ºs 4 a 9 será objecto da aplicação de um factor correctivo pela inexistência do risco e do esforço inerente à actividade construtiva no montante máximo de 15% do valor da avaliação».

Esta norma tem por função diminuir o valor da avaliação com o fim de o ajustar ao valor do mercado.
E é ditada por exigências de igualdade entre o expropriado que, por virtude da expropriação, obtém uma indemnização sem sofrer os riscos e o esforço decorrentes do processo construtivo e o não expropriado que, em idênticas condições, levasse a cabo a edificação possível.
Na verdade em situações normais, existem esforços, riscos e custos inerentes à construção que devem ser tomados em conta no valor da avaliação.
Estão em causa, vg., os riscos inerentes aos custos de organização, marketing, impostos, acidentes na obra, mau tempo, surpresas geológicas, encarecimentos da mão-de-obra e dos materiais e, até, riscos inerentes à comercialização, como, por exemplo, depreciação do imóvel, dificuldades de venda por retracção do mercado por virtude de aumento das taxas de juro de empréstimos para habitação que o expropriado suportaria se tivesse podido realizar o empreendimento admitido como possível na avaliação.
A aplicação deste normativo funda-se, pois, no pressuposto de que o expropriado ao receber uma indemnização liquida dos custos que normalmente advêm dos riscos e do esforço inerentes à efectiva edificação, ficaria numa situação de intolerável vantagem ou benefício.
Mas se por via de regra tal risco e esforço existem, em tese é admissível que eles se não verifiquem, pelo menos com a relevância e amplitude suficientes para afectarem o referido princípio da igualdade e, assim, poderem ser considerados.
É que, por um lado, a indemnização já é fixada por valores médios; por outro, no custo da construção, factor a tomar em consideração para cálculo do valor do terreno, já se entra em linha de conta com o esforço construtivo na situação concreta; e, finalmente, pode o expropriado vender o terreno a alguém que depois vai construir.
Logo, e como outrossim constitui jurisprudência uniforme, a aplicação deste factor correctivo não opera de modo automático, ou seja, não decorre do simples facto da concretização do acto expropriativo.
Nesta conformidade para o seu funcionamento exige-se uma comprovada inexistência de risco e esforço inerente à actividade construtiva, relevante na situação concreta, capaz de justificar uma redução do valor da avaliação do solo apto para construção, ajustando os custos à realidade hipotética.
O que passa pela prova da demonstração dos riscos que seriam corridos e os esforços que seriam suportados no caso de uma efectiva edificação no terreno expropriado, se não fosse a expropriação.
Na verdade a aplicação da dedução de forma sistemática, abstracta, “cega” e, quiçá, no seu máximo admissível, acarretaria a violação dos princípios da justa indemnização e da igualdade, na medida em que se prejudicariam indevidamente os expropriados nos casos em que a efectiva construção, se não fora a expropriação, não acarretasse riscos ou esforços que originassem despesas ou encargos relevantes - cfr. Acs. da Relação do Porto de 31.03.2004, dgsi.pt. p.0431552; de 19.04.2005, p.0521678; de 16.05.2006, p.0621568 e de 15.10.2007, p.0732452.
No caso sub Júdice os peritos do tribunal e da expropriante entenderam aplicar o factor correctivo de 5%. Não aduzindo qualquer justificação para tal.
Todavia, considerando o aproveitamento urbanístico que se considerou possível para o local – construção de blocos habitacionais multifamiliares de três pisos – e as características de toda a zona envolvente – na qual já existe um aproveitamento urbano de semelhante jaez –, bem como todas as infra-estruturas que já existem junto da parcela, não nos parece que o simples facto de ela própria ainda os não ter e, assim, se puder qualificar apenas como urbanizável, dificulte, pelo menos muito, as suas capacidades edificativas.
Mas tal não significa que tenha necessariamente de se aplicar a percentagem mínima de zero - 0% -do presente factor de correcção, como pretende a expropriada.
Pois que, como se viu, na esmagadora maioria dos casos, qualquer actividade de efectiva urbanização e edificação acarreta, por comparação com uma situação indemnizatória decorrente de expropriação, seguramente esforços acrescidos e, quase sempre e muito provavelmente, riscos e custos adicionais, oriundos de toda uma plêiade de situações que supra e apenas exemplificativamente se referiram.
O que, no caso concreto, não se provou que não possam vir a verificar-se, ou seja, pode admitir-se que se indicia suficientemente que, in casu, e em termos de normalidade, tais esforços, riscos e custos sobrevirão, não constituindo ele uma das situações excepcionais em que tal, seguramente, não se verificará.
Note-se, vg., que a parcela se encontra repleta de vegetação sem valor comercial cuja remoção e limpeza, numa perspectiva de urbanização, se imporia, o que, naturalmente, acarretaria esforços e custos que, assim e por força da expropriação, a recorrente não tem que suportar e arcar.
Nesta conformidade tudo visto e ponderado afigura-se-nos que a percentagem de 5% se apresenta situada dentro de parâmetros admissíveis, - atentos os limites legais: 0% a 15% - o que vale por dizer que se vislumbra como razoável, sensata e susceptível de operar a equilibrada composição dos direitos e interesses aqui em ponderação.
Havendo, consequentemente, que mantê-la.

6.2.
Segunda questão.

Estatui o artº8º do CE sob a epígrafe:
Constituição de servidões administrativas.
1. Podem constituir-se sobre imóveis as servidões necessárias à realização de fins de interesse público.
2. As servidões, resultantes ou não de expropriações, dão lugar a indemnização quando:
a) inviabilizem a utilização que vinha sendo dada ao bem, considerado globalmente;
b) inviabilizem qualquer utilização do bem, nos casos em que não estejam a ser utilizados; ou
c) anulem completamente o seu valor económico.
3. À constituição das servidões e á determinação da indemnização aplica-se o disposto no presente código com as necessárias adaptações, salvo o disposto em legislação especial.

Tal preceito substitui o correspondente artº 8ºdo precedente código de 1991 que estipulava:

2.
As servidões fixadas directamente na lei não dão direito a indemnização, salvo se a própria lei determinar o contrário.
3. As servidões constituídas por acto administrativo dão direito a indemnização quando envolverem diminuição efectiva do valor ou do rendimento dos prédios servientes.

A norma deste nº2 foi repetidamente declarada inconstitucional designadamente pelos Acs. do TC nºs 57/99, 243/99 e 331/99, in, vg, DR de 12.06.1999 e de 14.071999: «quando interpretada em termos de permitir que a indemnização devida pela parte de um prédio expropriado sobre que recai uma servidão legal non aedificandi, constituída em vista dessa expropriação, não leve em conta a anterior aptidão edificativa…» (sublinhado nosso).
Ou, com nuance semântica mas com o mesmo essencial sentido e significado: «na interpretação que não permite que haja indemnização pelas servidões fixadas directamente pela lei que incidam sobre parte sobrante do prédio expropriado, no âmbito de expropriação parcial, desde que a mesma parcela já tivesse, anteriormente ao processo expropriativo, capacidade edificativa, por violação do disposto nos artºs 13º nº1 e 62º nº2 da Constituição.»

Aliás tal matéria havia sido já objecto do Acórdão Uniformizador de Jurisprudência do S.T.J. nº16/94 de 15/6/94 in D.R. Is. de 19/10/94, o qual, posto que reportado ao C.Exp.76 impôs entendimento que se tem como válido para os diplomas reguladores da relação de expropriação por utilidade pública que se lhe seguiram.
Nele se tendo expendido que: «quando uma auto-estrada é construída em zona sem potencialidade urbanística, ou de pouco provável potencialidade, os proprietários de terrenos expropriados não ficam colocados em situação de sensível desigualdade em relação à generalidade dos proprietários de prédios rústicos, nem o sacrifício que para eles resulta da zona non aedificandi assume relevância. Mas não é assim quando essa zona abrange terrenos com potencialidade urbanística, principalmente se coincide com zona urbana, já que os respectivos proprietários ficam sujeitos a um prejuízo tão considerável quanto é certo existir normalmente grande diferença entre os terrenos com potencialidade urbanística e os que dela carecem. Nestes casos, à incidência de uma zona de proibição de edificar corresponde um real prejuízo, que, em tese geral, deverá ser compensado com a justa indemnização…».

Assim e vistas as coisas, conclui-se que a actual redacção do artº 8º do CE vigente, pretendeu respeitar as decisões daqueles Altos Tribunais.
endo que o actual regime difere do anterior em aspectos fulcrais.
Em primeiro lugar, acabou-se com a distinção entre servidões resultantes imediatamente da lei ou de acto administrativo, passando a falar-se apenas em servidões.
Em segundo lugar alargou-se o direito de indemnização do proprietário em relação à criação de qualquer servidão administrativa, independentemente de esta ter origem num processo de expropriação ou não ter.
Por fim, criaram-se critérios de delimitação desse direito, permitindo que dêem lugar a indemnização quando originem uma: «penetrante incidência do núcleo do direito de propriedade». – cfr. João Pedro de Melo Ferreira, Código das Expropriações Anotado, 2ª ed. pág. 75 cit. in Ac. da Relação do Porto de16.02.2006, p.053691.

Nesta conformidade, o nº2 do artº 8º: «contém uma regra geral, segundo a qual, todas as servidões que impliquem lesão efectiva de direitos ou interesses legalmente protegidos, dão lugar a indemnização, independentemente de qualquer expropriação. Esta norma vem colocar em situação de igualdade os proprietários de terrenos expropriados e não expropriados abrangidos pela proibição de edificar…» - Pedro Paes, Ana Pacheco e Luís Barbosa, Código das Expropriações, Almedina, 2ªed. p.63.
Aliás o artº 29º nº2 C.Exp. prevê a indemnização a este título ao estatuir que:
«Quando a parte não expropriada ficar depreciada pela divisão do prédio ou desta resultarem outros prejuízos ou encargos, incluindo a diminuição da área total edificável (…) especificam-se também em separado os montantes da depreciação e dos prejuízos ou encargos, que acrescem ao valor da parte expropriada.»

Consequentemente, da análise conjugada e concatenada destes normativos há que concluir:
- que as servidões podem implicar a desvalorização dos imóveis o que, por via de regra, assume particular acuidade e importância nos casos das servidões non aedificandi;
- que tais servidões acarretam, normalmente, prejuízo, pois que, salvo raras excepções: - vg. quando a área afectada consistir em logradouro de constituição existente - limitam o direito de transformação que integra o conteúdo da propriedade, traduzindo-se numa efectiva e, em muitos casos, importante redução do valor dos prédios servientes;
- que tal prejuízo deve ser justamente ressarcido – cfr. Ac. da Relação do Porto de 15.04.2008, dgsi.pt, p. 0726871.
Nem valendo o argumento que esta posição coloca em situação de desigualdade e prejudica os proprietários de terreno que, atingidos pela proibição de edificar resultante da implantação duma auto-estrada nas imediações dos seus prédios, não são todavia atingidos pela expropriação.
Efectivamente, ainda que tais proprietários não possam ser indemnizados no processo expropriativo comum -regulado no CE – tal reporta-se apenas a questão de índole meramente processual.
O que apenas impõe: «conduzir ao estudo da "acção que corresponde ao seu direito" (artº 2º nº2 C.P.Civ.) e não a que, por causa dessa dificuldade, se negue aos onerados-expropriados o direito a serem compensados…a norma do artº 8º nº2 C.Exp., nas suas diversas alíneas, não pode prejudicar o mais geral conceito de “justa indemnização”, destinado a ressarcir o efectivo prejuízo do expropriado.» - Ac. da Relação do Porto de 26.02.2008, dgsi.pt, p. 0820699.

In casu a potencialidade edificativa do prédio onde se integra a parcela resulta do PDM da Maia em vigor desde 1994.
A servidão non aedificandi é muito posterior, tendo sido imposta pelo artº 4º do DL 189/2002 de 28 de Agosto.
Ou seja, esta servidão veio, objectivamente, a afectar e prejudicar uma potencial e possível capacidade edificativa pré-existente e que, agora, por força da mesma, não se verifica.
O que acontece numa área não despicienda, antes pelo contrário muito significativa, pois que atinge 2.750 m2 num prédio cuja superfície total é de cerca de 1ha, ou seja, quase um terço desta área.
Há, pois, que concluir que extensão da zona non aedificandi inviabiliza a utilização que pode ser dada ao prédio, considerado globalmente, verificando-se a situação prevista no artº 8º, nº 2, al. a).
Não sendo lógico, nem do senso comum – a brigando com as leis da física e da matemática – o entendimento dos Srs. Árbitros quando expendem que: «com esta dimensão (do prédio: 1ha) considera-se viável a implantação de um empreendimento na parte sobrante, que, sem qualquer construção na zona non aedificandi, contenha a mesma densidade habitacional, caso não existisse qualquer servidão».
A questão não se prende com a densidade mas com a quantidade.
A densidade –dada a diminuição da área construtiva – até pode ser maior.
O que certamente não é possível, é construir com a mesma amplitude ou dimensão e, logo, rentabilizar cabal e totalmente - até porque para o local a cercea é limitada a três pisos – em cerca de 8000m2 o que normalmente seria possível construir em cerca de 11.000m2.
Assiste, consequentemente, à expropriada jus á respectiva indemnização.
O quantum da mesma deve corresponder à diferença entre os valores do bem antes e depois de constituída a servidão.
«Se toda a área da parte sobrante ficou sujeita a servidão, então nenhuma construção nela é possível, sendo a desvalorização a correspondente à diferença entre o valor do solo apto para construção e o valor do solo para outros fins.
Se só uma fracção da parte sobrante ficou sujeita à servidão, há que comparar as possibilidades construtivas da parte sobrante antes e depois de sujeita à servidão, representando a diferença de valores o prejuízo sofrido pelo expropriado» - cfr- Alípio Guedes, Valorização de Bens Expropriados, Almedina, 2ª ed. p.73/74.
Este critério tem, porém, de ser mitigado ou temperado em função de outros factores ou circunstâncias, como seja o facto de a expropriada continuar proprietária e na fruição - posto que limitada e condicionada, já que, como refere, por força do disposto no DL 13/71 de 23-1 lhe é proíbido, nomeadamente, a construção de vedações, tanques, eiras, ramadas, poços, minas, espigueiros, alpendres, depósitos de materiais e até, plantar árvores e arbustos - da área sujeita à servidão, o que, em tese, lhe permite retirar do mesmo algumas utilidades, seja a que título for.
Assim e à míngua de elementos que, outrossim, permitam a avaliação desta área na sua consideração de solo para outros fins, nos termos do artº 27º do CE, admite-se, como aceitável - já porque perfeitamente objectivo e mensurável e, consequentemente, suficientemente consecutor da justiça, quer na vertente do caso concreto, quer na perspectiva relativa e comparativa – a valorização da área serviente através da adopção de uma percentagem por comparação com a parte liberta e com aptidões construtivas.
O sr. Perito da expropriada adoptou a percentagem de 20%.
Tudo visto e ponderado, atentos os elementos fáctico-materiais emergentes dos autos e considerando, ainda e designadamente, que tal percentagem foi fixada por perito que – sem que com isto se coloque em causa a sua competência, idoneidade e probidade – até certo ponto está mais atreito á perspectiva de quem o indica e, bem assim, certos indicadores legais referenciais, como seja a percentagem máxima que é fixada para determinar o valor do solo por referência ao custo de construção que é de 15%, bem como o montante máximo estabelecido para o factor correctivo pela inexistência de risco, também 15% – nºs 6 e 10 do artº 26º - julga-se, equitativamente, mais adequado fixar a percentagem no valor de 10%.

6.3.
Terceira questão.

O índice de construção, que corresponde á relação entre a área construída, ou que é possível construir e a área total do lote, deve, em princípio, ser determinado de acordo com o estabelecido no PDM – cfr. Pedro Paes, Ana Pacheco e Luís Barbosa ob. cit, p.175.
Certo é que o ser permitido, pelo PDM e leis ou regulamentos em vigor, um certo índice de construção para determinada zona, não significa, só por si, que, pela sua consideração única e exclusiva, tal potencial volume de edificabilidade seja passível de implantação na parcela em causa.
Havendo que ajustar se aqueles índices, no caso concreto, são os urbanisticamente adequados, tendo em consideração as características dessa parcela, designadamente a sua área e configuração geométrica, especificidades da zona envolvente, bem como as dos edifícios aí situados e o tipo de construção já existente nas imediações – cfr. Acs. da Relação do Porto de 03.07.2003, dgsi.pt. p. 0332821 e de 19.04.2005, p.0521678.
Importando todavia atentar no estatuído no artº 23º do CE: «A justa indemnização…visa ressarcir o prejuízo que para o expropriado advém da expropriação, correspondente ao valor real e corrente do bem de acordo com o seu destino efectivo ou possível, numa utilização económica normal…».
In casu.
Na arbitragem foi fixado o índice de construção de 0,2m2/m2.
Com o fundamento de que: «a parcela em causa situa-se em espaço classificado como “Área verde urbana de protecção ou parque” e que os usos e actividades previstos para estas áreas, de acordo com o regulamento do PDM…admitem apenas a construção pontual de equipamento de apoio à sua utilização…».(sublinhado nosso)
Todavia e como resulta dos factos provados – que a expropriante não coloca em crise – estes pressupostos não se revelaram exactos.
Já que, como supra se referiu, apurou-se que: Segundo o PDM, a parcela encontra-se em prédio inserido em área classificada como “espaços urbanos e urbanizáveis, área predominantemente residencial, de nível 3”.
Apresenta-se praticamente plana.
Tal prédio tem ampla frente para a Rua ………. (via pavimentada, dotada de rede pública de distribuição de água, saneamento com ligação a ETAR, rede de drenagem de águas pluviais e rede de distribuição de energia eléctrica e telefone), a partir da qual é possível aceder ao centro cívico da Freguesia, que fica a cerca de 750 metros, e onde se situam a Junta de Freguesia, o centro de saúde, as escolas do ensino básico, a igreja paroquial e o cemitério.
Contiguamente ao prédio a poente existe uma urbanização nova, de área considerável, constituída por blocos habitacionais multifamiliares de três pisos.
A zona envolvente da parcela caracteriza-se pela existência de vasta mancha de terrenos de utilização florestal, mas também pela existência de áreas novas de expansão urbana, formando bolsas de construção.
E que:
O PDM da Maia, aprovado pela Resolução do Conselho de Ministros nº 13/94 de 17 de Maio, admite um índice máximo de utilização de 0,6, sendo a cércea máxima de três pisos.

É, assim, meridianamente evidente que, perante o acervo fáctico supra mencionado, a parcela expropriada tem, à partida, potencialidades edificativas efectivas, sendo perfeitamente possível, isto é, admissível e, até, normal e plausível, que tais potencialidades atinjam o índice de 0,6m2/m2.
Pois se o próprio PDM o permite e admite!
Ora tal possibilidade, que, em circunstancias normais, se apresenta com um elevado grau de seriedade e plausibilidade é mais do que suficiente - impõe até – que o índice a considerar seja o máximo admissível.
Excepto se se apurarem factos ou circunstâncias que a tal obstem e imponham a consideração de um índice inferior.
O que, in casu, não se verificou.
Pois que não merecem acolhimento as teses da expropriante.
Em primeiro lugar o índice de construção não resulta de qualquer protocolo celebrado - aliás nem sequer considerado ou referido na sentença – mas apenas e somente do respectivo instrumento de ordenamento territorial: PDM.
Em segundo lugar a servidão non aedificandi não afecta a capacidade construtiva da parcela.
É que, tanto quanto resulta do apurado, a área de 2750m2 de tal servidão é autónoma e não se confunde com a área de 592m2 da parcela expropriada, antes acrescendo a esta.
Nada nos autos indicando ou sequer indiciando que a capacidade edificativa desta, se não fosse expropriada, de algum modo ficaria prejudicada ou sequer afectada pelas restrições aqueloutra impostas.
Aliás neste particular apenas o perito da expropriante discordou.
Consequentemente - como é sobejamente consabido mas nunca é demais repeti-lo - devido ao respeito que os seus conhecimentos técnico-científicos devem merecer apenas perante uma prova clara, cabal e inequivocamente orientada em sentido diverso do propugnado pelos peritos maioritários – maxime se neles se incluem os indicados pelo tribunal -, ou perante a constatação de erro seu ou lapso manifesto ou adopção de critério ostensivamente inadmissível, se poderá contrariar a sua fundamentação e suas conclusões.
Isto na parte em que as mesmas se reportem à percepção e valoração técnica dos factos.
Pois já no que tange à formulação de juízos jurídico-normativos e à estrita subsunção dos factos ao direito, a lei reserva tal tarefa ao julgador. – cfr. entre muitos outros, os Acs. da Relação de Lisboa de 03.11.2005 e de 16.03.2006, in dgsi.pt. ps.3525/2005-6 e 241/2006-6; Ac. da Relação de Guimarães de 04.10.2007, p.1565/07-1 e Alberto dos Reis, CPC anotado, IV, 186.
Havendo, consequentemente, que manter o índice.

6.4.
Quarta questão.

Enfim, há que apreciar a pretensão da expropriante no sentido de ser considerada, para cálculo do valor do solo, a percentagem de 10% do custo de construção a que alude o nº6 do artº 26º.
Na arbitragem foi fixada a percentagem de 10%. Na peritagem 12% a qual que foi acolhida pelo tribunal.
Relativamente ao CE de 1991, este actual segmento normativo aumentou a percentagem de 10 para 15%.
Porém, versus o que então sucedia, o Código vigente exige que se considere também – e pelo menos, ie. sem prejuízo da consideração de outros factores - a localização do terreno e a sua qualidade ambiental.
Assim uma conclusão, ou, pelo menos, um critério ou ideia referencial, deve emergir, a saber: com o aumento da percentagem e o alargamento dos requisitos – aliás não taxativos – apenas em situações excepcionais, em que estejam reunidas uma plêiade de circunstâncias valorizantes da parcela - desde logo as legalmente previstas - se pode admitir a fixação da percentagem máxima.
Até porque e no que tange à qualidade ambiental, há a considerar que, nos termos do artigo 5º, nº 2 da LBA o ambiente é o conjunto dos sistemas físicos, químicos, biológicos e suas relações e dos factores económicos, sociais e culturais com efeito directo ou indirecto, mediato ou imediato, sobre os seres vivos e a qualidade de vida do homem;
Sendo que, nos termos do art. 6º da mesma Lei, são componentes do ambiente o ar, a luz, a água, o solo vivo e o subsolo, a flora e a fauna.
Assim a qualidade do ambiente resulta essencialmente da adequabilidade de todos os seus componentes às necessidades do ser humano.
Da relação e interpenetração desses diversos componentes depende a melhor ou menor qualidade ambiental que pode mesmo conflituar a localização, o que significa que uma óptima localização nem sempre corresponde, e frequentemente não corresponde, a uma boa qualidade ambiental.
A qual depende fundamentalmente de factores como inexistência de ruídos, movimento não intenso, espaços verdes, zonas de lazer, variedade de fauna e flora, bom ambiente social, nível económico e social dos habitantes, etc.
Daí que a atribuição de uma elevada percentagem só deve ser conseguida numa zona que reúna muito boas localização e qualidade ambiental e bons equipamentos, o que sucede em poucos centros cívicos dos grandes aglomerados – cfr. Ac. Da Relação do Porto de 22.09.2005, dgsi.pt, p.0530834.
No caso sub júdice apurou-se que o prédio onde está inserida a parcela encontra-se servido por, e/ou junto ou adjacente a, amplas e adequadas infra-estruturas.
A sua localização afigura-se boa, já que se encontra contígua a uma urbanização nova, de área considerável, constituída por blocos habitacionais multifamiliares de três pisos e próxima de áreas novas de expansão urbana, indiciando-se que esta está a assumir um nível qualitativo elevado ou pelo menos francamente razoável.
Boa qualidade que também se vislumbra no tangente à sua vertente ambiental, pois que, não obstante se encontrar numa zona que forma bolsas de construção, a zona envolvente caracteriza-se pela existência de vasta mancha de terrenos de utilização florestal, os quais, naturalmente, podem e, até, devem, ser parcialmente aproveitados na criação de espaços verdes e de lazer.
Legalmente admissível e razoável – posto que até pecando por defeito se comparada com percentagens fixadas em outros processos, lembrando-nos da de 13% atribuída a uma parcela expropriada em zona industrial: processo nº1081/2008-2 – se mostra, consequentemente, a fixada percentagem de 12%.
Nesta conformidade o quantum indemnizatório a que a expropriada tem jus ascenderia a 57.566,73 euros calculado pelo modo seguinte:
A) Valor da parcela expropriada.
0,6 X 568.22 euros X 20,5% - 5% = 66,40 euros m2.
592 m2 X 66,40 euros = 39.306,73 euros.
B) Compensação pela servidão non aedificandi.
66,40 euros X 10% X 2750 m2 = 18.260 euros.
C) Indemnização global (A+B) = 57.566,73 euros.
No entanto certo é que no recurso da decisão arbitral a expropriada quantificou os valores máximos por si pretendidos no montante de 35.520.00 euros quanto á parcela expropriada e na quantia de 10.000 euros no atinente á depreciação da parte sobrante decorrente da servidão non aedificandi.
Ora sendo este o valor que ele considerou justo e não tendo, desde então, sobrevindo quaisquer circunstâncias factuais que alterassem os dados da questão, está este tribunal impedido de ultrapassar tal montante - ex vi do disposto no artº 666º nº1 do CPC - independentemente de, como se viu, a interpretação dos critérios legais atinentes em tese tal permitir.
7.
Deliberação.
Termos em que se acorda conceder parcial provimento ao recurso e, consequentemente, fixar a indemnização devida no montante global de 45.520 euros.
No mais se mantendo o decidido.
Custas na proporção da respectiva sucumbência.

Porto, 2008.06.03
Carlos António Paula Moreira
Maria da Graça Pereira Marques Mira
António Guerra Banha

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[1] Valores disponíveis no sítio www.estradasdeportugal.pt.