Acórdão do Tribunal da Relação do Porto
Processo:
0825384
Nº Convencional: JTRP00041845
Relator: M. PINTO DOS SANTOS
Descritores: CUSTAS
TAXA DE JUSTIÇA INICIAL
Nº do Documento: RP200810280825384
Data do Acordão: 10/28/2008
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: APELAÇÃO.
Decisão: CONFIRMADA A DECISÃO.
Indicações Eventuais: LIVRO 287 - FLS 13.
Área Temática: .
Sumário: I - De acordo com o art. 24° n° 2 do C.Cust.Jud. (na redacção aqui aplicável), o talão comprovativo do pagamento da taxa de justiça inicial (no caso, devida pela dedução de contestação) perde validade no prazo de 90 dias a contar da respectiva emissão se não tiver sido, entretanto, apresentado em juízo.
II - Decorrido aquele prazo, o mesmo não pode ser junto aos autos (pelo réu) para prova do prévio pagamento da respectiva taxa de justiça, mesmo que este tenha sido atempadamente efectuado, restando-lhe requerer, no prazo de 180 dias (também contados a partir da data da emissão daquele), nos termos do no 3 daquele normativo, o reembolso da quantia despendida junto da entidade competente.
III - No processo, face à perda da validade daquele comprovativo, o faltoso (“in casu”, o réu), se quiser fazer valer o seu articulado (a contestação), terá que efectuar o pagamento da taxa de justiça que (para todos os efeitos) está em falta, com o acréscimo de multa de igual montante (mas não inferior a 1 UC nem superior a 10 UC’s) nos termos do nº 3 do art. 486-A do Código de Processo Civil, quando para tal for notificado pela secretaria.
IV - Se o não fizer, restar-lhe-á, para evitar o desentranhamento do seu articulado, pagar a taxa de justiça e as multas a que alude o nº 5 do mesmo artº 486º.
Reclamações:
Decisão Texto Integral: Proc. nº 5384/08 – 2ª Secção
(apelação, com um agravo)
________________________
Relator: Pinto dos Santos
Adjuntos: Des. Cândido Lemos
Des. Marques de Castilho
* * *

Acordam nesta secção cível do Tribunal da Relação do Porto:

1. Relatório:

B………., Lda., com sede da Rua ………., nº .., .º, no Marco de Canaveses, instaurou os presentes autos que começaram por ser de injunção, contra C………., Lda., sedeada na ………., nº …., na mesma localidade, em que requeria, com base em contrato de fornecimento de bens/serviços que prestou à segunda, que esta lhe pagasse a quantia de € 10.980,12 (dez mil novecentos e oitenta euros e doze cêntimos), sendo € 9.146,94 a título de capital e o restante de juros, bem como a importância de € 89,00 relativa ao montante pago pela apresentação do requerimento de injunção.

Citada, deduziu a requerida oposição (fls. 7), negando a dívida alegada pela requerente.

Alterada a distribuição da espécie, face à oposição, para processo sumário, foi a requerente/autora convidada a aperfeiçoar o articulado inicial, concretizando os factos constitutivos da causa de pedir.

Observando tal convite, a autora apresentou novo articulado em que alegou os factos integradores da causa de pedir em que assenta a sua pretensão.

Por a ré não ter junto com a oposição, nem nos dez dias seguintes à apresentação desta, o comprovativo do pagamento da taxa de justiça devida, a secretaria judicial, oficiosamente, notificou-a para, “no prazo de 10 dias efectuar o pagamento omitido da taxa de justiça bem como da multa prevista no n° 3 do art. 486°-A do CPC”, advertindo-a de que “o não cumprimento do ora notificado desencadeará o preceituado nos números 5 e 6 do mesmo normativo legal – acréscimo de outra multa de valor não inferior a 10 UC e eventual desentranhamento da contestação”.

A ré, na sequência dessa notificação, veio, a fls. 24, expor e requerer o seguinte:
“Por lapso, aquando da apresentação da oposição não foi junto o comprovativo do pagamento da taxa de justiça, tendo o mesmo ficado junto aos duplicados da ora requerente pensando tratar-se da 2ª via (duplicado) da taxa de justiça.
Aliás pode-se constatar junto dos duplicados entregues pelo opositor, que consta dos mesmos cópia do pagamento da taxa de justiça datada de 29/06/2004 e cuja junção do original agora se requer (…).
A data da taxa de justiça é precisamente a mesma data em que a oposição deu entrada e em que foi paga a estampilha pela oposição (29/06/2004) .
Assim, a taxa de justiça foi paga atempadamente tendo o dinheiro entrado nos Cofres dos Tribunais, pelo que se requer a V. Exa. se digne dar como paga a taxa de justiça em tempo devido e não ser aplicada a multa prevista no art. 486-A n° 3 do Cód. Proc. Civil”.
Com este requerimento juntou o talão que se encontra a fls. 25.

Logo após, o Mmo. Juiz do processo proferiu o douto despacho de fls. 28, do seguinte teor:
“Analisando o teor do documento de fls. 25 constata-se que efectivamente a taxa de justiça aí mencionada foi paga na mesma data da dedução da oposição nestes autos.
Sucede que a lei fala em “falta de junção do documento comprovativo” e não em falta de pagamento como pressuposto da notificação a que a secretaria procedeu, nos termos do preceituado no art. 486-A, nº 3, do Código de Processo Civil.
Pretende assim evitar-se o aproveitamento de comprovativos de pagamento de umas acções para outras (situação perfeitamente possível em grandes escritórios ou em profissionais forenses com elevado volume de serviço em matéria de acções declarativas de pequena monta).
Pelo exposto, entendo que a notificação efectuada pela secretaria é valida e eficaz, pelo que o não cumprimento, por parte do requerido, do que ali se dispunha determina que se accione agora o que vai preceituado no art. 486°-A, n° 5, do Código de Processo Civil.
Assim, notifique o requerido para, em dez dias, proceder ao pagamento da multa em falta (€ 133,50 – cfr. fls. 23), acrescida da multa a que alude o indicado normativo, ou seja, 10 UC (limite mínimo, no caso em concreto), advertindo-o de que, não o fazendo em 10 dias, proceder-se-á ao desentranhamento da oposição – cfr. art. 486º-A, n° 6, do Código de Processo Civil”.

Notificada de tal despacho (e para efectuar os pagamentos nele indicados), interpôs a ré, a fls. 35, recurso de agravo que, admitido (fls. 38), motivou (fls. 47 a 50) formulando as seguintes conclusões:
“1ª – A Recorrente entregou a oposição juntamente com o comprovativo da taxa de justiça e no requerimento de oposição na parte final diz: «JUNTA: Selo da injunção, comprovativo do pagamento da taxa de justiça inicial, procuração forense e duplicados legais».
2ª - Caso a taxa de justiça não estivesse junta com o original da oposição e com os duplicados o funcionário da secção central não receberia a oposição sem fazer menção expressa de que não tinha sido junto o comprovativo do pagamento da taxa de justiça.
3ª - O comprovativo da taxa de justiça terá sido devolvido à parte juntamente com o duplicado da oposição, ou por lapso do funcionário da secção central que recebeu a oposição, ou por lapso da parte que o juntou aos duplicados.
4ª - Se o funcionário não tivesse visto o comprovativo da taxa de justiça deveria ler feito menção expressa de que não tinha sido junto o comprovativo.
5ª - A parte também não está isenta de culpa porque recebeu o duplicado com o comprovativo original do pagamento da taxa de justiça.
6ª – Desconhece-se de quem terá sido o erro, por isso não se pode atribuir esse erro à recorrente, com as inerentes graves consequências.
7ª - Se a Requerida ora recorrente estivesse de má fé facilmente resolveria a situação bastando-lhe alegar que tinha junto o comprovativo e que com certeza o mesmo se teria extraviado no tribunal atento o seu diminuto tamanho (talão Multibanco).
8ª – Não é devido o pagamento da multa prevista no art. 486°-A n° 3 do CPC, mas muito menos o da multa a que alude o art. 486°-A, n° 6.
9ª – Tendo a Recorrente feito o requerimento que deu entrada no dia 22/09/2005, deveria suspender o prazo, ou seja, se a Mma. Juiz indeferisse o requerimento a Recorrente tinha prazo para pagar a multa prevista no nº 3 do art. 486-A do CPC..
10ª - Quando muito a Mma Juiz “a quo” poderia ter indeferido o requerimento apresentado em 22/09/2005 e ordenado o pagamento da multa prevista no art. 486-A, n° 3 do CPC e caso esta não fosse paga, aí sim desencadear-se-ia o estabelecido nos nºs 5 e 6 do art. 486-A do CPC.
11ª – As multas aplicadas, porque indevidas, e o desentranhamento da oposição, são uma manifesta denegação de justiça que originaram a condenação da recorrente no pedido, (…).
Termos em que, (…), deve ser concedido provimento ao presente recurso, revogando-se a decisão recorrida, assim se fazendo JUSTIÇA.”

Por a ré não ter pago a multa fixada ao abrigo do nº 5 do art. 486º-A do C.Proc.Civ., foi ordenado, a fls. 38, o desentranhamento da oposição/contestação e a sua devolução àquela.

De seguida foi proferida sentença que, considerando provados os factos alegados na petição inicial e a acção procedente, condenou a ré a pagar à autora a quantia de € 9.146,94 (nove mil cento e quarenta e seis euros e noventa e quatro cêntimos), acrescida de € 1.744,18 (mil setecentos e quarenta e quatro euros e dezoito cêntimos) de juros de mora vencidos e € 89,00 (oitenta e nove euros) de taxa de justiça.

Inconformada, interpôs a ré recurso de apelação cuja motivação culminou com as seguintes conclusões:
“1ª - A ter sido admitido o recurso de agravo com subida imediata, poderia ter-se evitado a decisão da qual agora se interpõe recurso, pois sendo aquele julgado procedente a decisão de que agora se recorre fica desde logo prejudicada.
2ª - Tendo sido desentranhada a contestação, a Mma. Juiz «a quo» considerou que a Ré não apresentou contestação, tendo considerado confessados os factos constantes do requerimento de injunção.
3ª - A prolação do despacho que indeferiu a subida imediata, o efeito suspensivo do recurso de agravo e o desentranhamento da contestação foram uma completa denegação de justiça que as partes em tribunal procuram alcançar.
4ª - A Ré apresentou oposição em devido tempo, tendo pago a taxa de justiça também em devido tempo, tendo sido desentranhada por uma errada interpretação do artigo 486°-A do Cód. Proc. Civil.
5ª a 15ª (a recorrente reproduz nestas conclusões «ipsis verbis» as que havia formulado nas alegações do recurso de agravo sob as conclusões 1ª a 11ª, para as quais se remete).
16ª - Ao ser dado provimento ao recurso de agravo interposto terá de ser admitida a oposição apresentada e realizado o respectivo julgamento, assim se fazendo a justiça que (…) pretendemos alcançar e que na 1ª instância foi denegada.
Termos em que, (…), deve ser concedido provimento ao presente recurso, na sequência do provimento do recurso de agravo, revogando-se a decisão recorrida, assim se fazendo JUSTIÇA”.

A apelada não contra-alegou.
Colhidos os vistos legais, cumpre decidir.
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2. Questões a apreciar e decidir:

Sabendo-se que o objecto do(s) recurso(s) – de agravo e/ou de apelação - é delimitado pelas conclusões das alegações da recorrente (art. 684º nº 3 e 690º nºs 1 e 3 do C.Proc.Civ.), as questões que importa apreciar e decidir neste acórdão são as seguintes:
I – Quanto ao recurso de agravo:
. Se, em função da junção do talão de fls. 25, comprovativo do pagamento da taxa de justiça inicial – devida pela oposição deduzida pela requerida/ré -, havia lugar ao cumprimento do preceituado no nº 3 do art. 486º-A do C.Proc.Civ..
. E se foi correcto o desentranhamento da dita oposição, determinado por despacho de fls. 38, por a ré não ter cumprido o estabelecido no nº 5 daquele art. 486º-A.
II – No que diz respeito à apelação:
. Em caso de provimento do agravo, quais as consequências daí resultantes para a sentença final proferida a fls. 38 a 40.
. Em caso de não provimento do agravo, importará saber se a mesma sentença final merece alguma censura por parte deste Tribunal de recurso.
* * *

3. Apreciação jurídica:

3.1. O recurso de agravo:
Impõe-se, em primeiro lugar, a apreciação do recurso de agravo, quer por uma questão de precedência e de lógica, quer pelo facto do objecto da apelação estar, em grande parte, condicionado pela solução a dar àquele.
Para se decidir o mesmo, importa ter presente o seguinte circunstancialismo fáctico:
a) A ré, ora agravante, deduziu oposição à injunção requerida pela aqui apelada, a qual deu entrada em juízo a 29/06/2004 – cfr. data aposta no selo que está colado ao canto superior direito da 1ª folha da oposição e a data constante do carimbo implantado na mesma folha (fls. 7).
b) Na parte final daquele articulado de oposição consta, designadamente: “JUNTA: … comprovativo do pagamento da taxa de justiça inicial …” – cfr. verso de fls. 7.
c) A ré, no entanto, não juntou com a oposição o talão comprovativo do pagamento daquela taxa de justiça inicial – facto que resulta das folhas que se seguem àquela oposição, onde não se mostra junto tal comprovativo.
d) A 02/07/2004, a secção de processos remeteu ao (então) mandatário da ré uma notificação dando-lhe conta de que os autos de injunção haviam sido distribuídos ao .º Juízo, com o nº …/04.1TBMCN e, bem assim, “para em 10 dias efectuar o pagamento da taxa de justiça inicial” – cfr. cópia junta a fls. 9.
e) A ré, por si ou através do seu mandatário, nada disse e nada fez na sequência da notificação referida em d) – facto que decorre das folhas que se seguem à fl. 9.
f) Em 19/09/2005, a secção de processos “não encontrando junto aos autos o documento comprovativo da autoliquidação da taxa de justiça”, notificou (oficiosamente) o mandatário da ré “para no prazo de 10 dias efectuar o pagamento omitido da taxa de justiça bem como da multa prevista no nº 3 do art. 486°-A do CPC”, bem como de que “o não cumprimento do ora notificado desencadeará o preceituado nos números 5 e 6 do mesmo normativo legal – acréscimo de outra multa de valor não inferior a 10 UC e eventual desentranhamento da contestação” – cfr. duplicado dessa notificação a fls. 22.
g) A 22/09/2005, a ré apresentou requerimento informando que havia pago a dita taxa de justiça na mesma data em que a referida oposição deu entrada em Juízo (29/06/2004) e que devido a lapso o respectivo comprovativo não foi junto com aquela oposição, antes ficou junto aos duplicados que ficaram na sua posse – cfr. fls. 24.
h) Nessa mesma data (22/09/2005) juntou aos autos o talão comprovativo do pagamento da quantia de € 133,50, a título de taxa de justiça, efectuado no dia 29/06/2004 – cfr. fls. 25.
i) Na sequência do ordenado no despacho de fls. 28, foi a ré, através do seu mandatário, notificada, designadamente, para “no prazo de 10 dias efectuar os pagamentos omitidos, multa referida no nº 3 do art. 486º-A do CPC, acrescidos da multa referida no nº 5 do mesmo normativo, sob pena de desentranhamento da contestação” – cfr. fls. 33.
j) A ré também não deu cumprimento a tal notificação – cfr. folhas seguintes do duplicado de fls. 33.
k) Em 27/04/2007, por despacho, foi ordenado o desentranhamento da oposição (contestação) da ré – cfr. despacho de fls. 38.

3.1.1. Se, em função da junção do talão de fls. 25, comprovativo do pagamento da taxa de justiça inicial – devida pela oposição deduzida pela requerida/ré -, havia lugar ao cumprimento do preceituado no nº 3 do art. 486º-A do C. Proc. Civ..
Enunciados os factos relevantes a considerar, passemos então à apreciação do agravo, começando pela questão em epígrafe neste item.
O que está em causa é a taxa de justiça inicial devida pela apresentação de oposição/contestação e as consequências da falta de junção do comprovativo do seu pagamento.
A presente acção teve o seu início a 11/06/2004 (cfr. carimbo aposto no requerimento de injunção, a fls. 2), o que significa que lhe são aplicáveis as normas que o DL 324/2003, de 27/12, introduziu quer no Código das Custas Judiciais, quer no Código de Processo Civil.
No preâmbulo deste DL, escreveu-se que se “voltava a consagrar a regra do desentranhamento das peças processuais da parte que não proceda ao pagamento das taxas de justiça devidas”, “a operar apenas após a parte ter sido sucessivamente notificada para o efeito”, o que constituiu substancial alteração relativamente ao regime que até então esteve consagrado no art. 14º do DL 329-A/95, de 12/12.
Em obediência àquele objectivo, estabelece o art. 28º do C.Cust.Jud. que a omissão do pagamento da(s) taxa(s) de justiça inicial (e subsequente) “dá lugar à aplicação das cominações previstas na lei de processo”.
É sabido que a taxa de justiça é paga gradualmente pelas partes processuais - art. 22º do C.Cust.Jud. - e que, no que diz respeito ao réu ou requerido (expressões aqui utilizadas em sentido amplo), o documento comprovativo do seu pagamento é entregue ou remetido ao Tribunal com a apresentação da oposição do réu ou requerido - art. 24º nº 1 al. b) do mesmo diploma.
Em conjugação com este preceito, dispõe o art. 150º-A do C.Proc.Civ. (diploma a que nos reportaremos quando outra menção não for feita), no seu nº 1, que “quando a prática de um acto processual exija, nos termos do Código das Custas Judiciais, o pagamento de taxa de justiça inicial (…), deve ser junto o documento comprovativo do seu prévio pagamento (…)”, acrescentando o nº 2 que “(…) a falta de junção do documento referido no número anterior não implica a recusa da peça processual, devendo a parte proceder à sua junção nos 10 dias subsequentes à prática do acto processual, sob pena de aplicação das cominações previstas nos arts. 486º- A, 512º-B e 690º-B”.
Destes dois números resulta, desde logo, no que para aqui releva – que tem a ver, como se disse, com o pagamento da taxa de justiça devida pela apresentação de oposição/contestação – que a falta de apresentação do documento comprovativo do prévio pagamento da taxa de justiça não implica (não é cominada) desde logo o desentranhamento do articulado em questão, podendo a parte apresentá-lo, ainda, sem qualquer sanção, nos dez dias subsequentes à prática do acto processual.
Só se não juntar nesse prazo o referido comprovativo é que começam as sanções para o «faltoso».
No caso «sub judice» é inequívoco que a ré, ora recorrente, não juntou aos autos, no momento da apresentação da sua oposição/contestação, o comprovativo do pagamento da taxa de justiça inicial, como também não o fez nos dez dias seguintes de que dispunha para tal efeito. E isto apesar de, três dias depois da entrada em juízo da dita oposição/contestação, a secção de processos até a ter notificado para pagar a taxa de justiça inicial, altura em que, se fosse diligente, logo teria constatado que o talão comprovativo do pagamento da mesma não tinha sido junto com aquele articulado e faria imediatamente a respectiva junção aos autos, ainda no prazo facultado pelo nº 2 do citado art. 150º-A (isto apesar da notificação em referência ter sido indevidamente feita, já que tal obrigação da secção de processos tinha desaparecido há já algum tempo, mais precisamente desde a entrada em vigor do DL 320-B/2000, de 15/12, que determinou que a taxa de justiça inicial e subsequente passassem a ser autoliquidadas pelas partes, sem necessidade de prévia liquidação pela secretaria judicial ou secções de processos).
Perante a referida omissão da ré, que havia a fazer?
As sanções para a inobservância, pelo réu/requerido, da obrigação de juntar aos autos o comprovativo da taxa de justiça devida pela apresentação de oposição/contestação constam do art. 486º-A.
No seu nº 3, este normativo prescreve que “na falta de junção do documento comprovativo do pagamento da taxa de justiça no prazo de 10 dias a contar da apresentação da contestação, a secretaria notifica o interessado para, em 10 dias, efectuar o pagamento omitido, com acréscimo de multa de igual montante, mas não inferior a 1 UC nem superior a 10 UC’s”.
Foi em cumprimento deste artigo que a secção de processos, em 19/09/2005, notificou a ré para, naquele prazo legal, efectuar o pagamento omitido da taxa de justiça, com acréscimo de multa de igual montante (que este é o primeiro passo a dar nos casos de omissão do pagamento ou de junção do comprovativo do pagamento da taxa de justiça inicial devida pela apresentação de contestação, afirmaram-no também os Acs. desta Relação de 18/09/2007, proc. 0722858, publicado in www.dgsi.pt/jtrp e da Rel. de Lisboa de 27/02/2007, in www.dgsi.pt/jtrl).
Porém, a ré, em vez de dar cumprimento ao teor da notificação, veio, só então, juntar aos autos o talão comprovativo de que tinha efectuado o pagamento da taxa de justiça em questão no próprio dia em que deu entrada em Juízo a contestação que havia deduzido, dizendo que a falta de junção com o articulado se deveu a lapso e entendendo que, assim, não tinha que cumprir a referida notificação, ou seja, que efectuar novo pagamento da taxa de justiça inicial nem do acréscimo de multa fixado no nº 3 do art. 486º-A.
É aqui que tudo se complica.
Diremos, sem prejuízo do que adiante se irá afirmar, que se o talão comprovativo do apontado pagamento ainda estivesse dentro do prazo legal de validade, alguma razão poderia assistir ao réu-recorrente, pois tendo pago a taxa de justiça no momento processual adequado (previamente à oposição que deduziu) não faria sentido obrigá-lo a pagá-la segunda vez. Teria apenas, numa interpretação lógica do disposto no nº 3 do citado art. 486º-A (que fala em “efectuar o pagamento omitido”, pelo que se o pagamento foi feito oportunamente já não há “pagamento omitido”), que pagar a multa a que alude o mesmo número.
Mas isto seria assim se o talão comprovativo ainda pudesse então ser validamente utilizado pela ré.
Acontece, no entanto, que o nº 2 do art. 24º do C.Cust.Jud. estabelece que “o documento comprovativo do pagamento da taxa de justiça inicial perde a sua validade no prazo de 90 dias a contar da data da respectiva emissão se não tiver sido, entretanto, apresentado em juízo”, normativo que visa “evitar a incerteza temporalmente indeterminada da afectação do valor depositado no sistema de pagamento inerente aos processos judiciais” (Cons. Salvador da Costa in “Código das Custas Judiciais – Anotado e Comentado”, 8ª ed., 2005, pgs. 196 e 197).
Ora, como no caso em apreço a ré apenas veio juntar aos autos o talão comprovativo de que tinha efectuado o pagamento da taxa de justiça inicial mais de um ano depois de ter apresentado em Juízo a dita oposição/contestação (esta deu entrada em Tribunal em 29/06/2004 e o talão comprovativo daquele pagamento só foi junto aos autos a 22/09/2005), não há dúvida que tem aqui aplicação o disposto no nº 2 daquele art. 24º do C.Cust.Jud.. O que quer dizer que em 22/09/2005 o talão da autoliquidação que juntou havia perdido, há muito, a sua validade e a ré já não o podia utilizar nos autos como (documento) comprovativo do pagamento da aludida taxa.
É que, decorridos os 90 dias a que se reporta o nº 2 daquele art. 24º, a única “coisa” que restava à ré era, no prazo fixado no nº 3 do mesmo preceito legal (180 dias a contar da data da emissão do referido talão Multibanco), “requerer ao Instituto de Gestão Financeira e Patrimonial da Justiça o reembolso da quantia despendida, mediante a entrega do seu original, ou de documento de igual valor probatório, (…), sob pena de esse montante reverter para o Cofre Geral dos Tribunais”.
Deste modo, pela perda de validade do indicado talão comprovativo, não restava à ré, em função da notificação que lhe foi feita em 19/09/2005, outra saída que não fosse a de pagar novamente a taxa de justiça em dívida (a que pagou em 29/06/2004 já havia revertido para o Cofre Geral dos Tribunais), bem como a multa de igual montante imposta pelo nº 3 do citado art. 486º-A.
Aliás, o eventual desconhecimento pela ré do consignado nos nºs 2 e 3 do referido art. 24º do C.Cust.Jud., ou a incorrecta interpretação dos mesmos, não lhe conferia o direito de querer fazer uso nos autos de um comprovativo que perdera a sua validade, pois, como prescreve o art. 6º do C.Civ., “a ignorância ou má interpretação da lei não justifica a falta do seu cumprimento nem isenta as pessoas das sanções nela estabelecidas”.
Por isso, tudo o que argumentou no seu requerimento junto a fls. 24 era inócuo face à perda de validade (processual) do talão Multibanco que juntou a fls. 25, como irrelevante é o que refere nas conclusões 1ª, parte final, a 8ª das alegações de agravo, repetidas nas conclusões 5ª a 12ª das alegações da apelação (como se decidiu no Ac. desta Relação de 19/02/2006, in CJ ano XXXI, 1, 162, “se o interessado não efectua o pagamento ou se, fazendo-o, não junta aos autos o documento comprovativo, no momento ou no prazo que para tanto a lei lhe confere, «sibi imputet», devendo arcar com as consequências da sua omissão”; com interesse, também Ac. desta Relação de 24/04/2007, in CJ ano XXXII, 2, 194), sendo certo que não competia ao funcionário que recebeu a oposição/contestação fazer qualquer “menção expressa de que não tinha sido junto o comprovativo”, como vem sustentado na conclusão 4ª das primeiras alegações (pelo contrário, como atrás se disse, a secção de processos, embora indevidamente, até alertou a ré, em tempo útil – três dias depois da apresentação da oposição -, para a questão, que considerou, de falta de pagamento da taxa de justiça, e que aquela bem podia ter aproveitado para juntar aos autos o talão comprovativo em falta).

3.1.2. Se foi correcto o desentranhamento da dita oposição por a ré não ter cumprido o estabelecido no nº 5 do mesmo art. 486º-A.
Não tendo a ré efectuado o pagamento da taxa de justiça e da multa fixadas no citado art. 486º-A nº 3, o que podia o Tribunal determinar?
Com isto entramos na apreciação da segunda questão enunciada em I do ponto 2.
Segundo o nº 5 do citado art. 486º-A, “findos os articulados e sem prejuízo do prazo concedido no nº 3, se não tiver sido junto o documento comprovativo do pagamento da taxa de justiça inicial e da multa por parte do réu, o juiz profere despacho nos termos da alínea b) do nº 1 do artigo 508°, convidando o réu a proceder, no prazo de 10 dias, ao pagamento da taxa de justiça e da multa em falta, acrescida de multa de valor igual ao da taxa de justiça inicial, com o limite mínimo de 10 UC”.
Foi precisamente em obediência e para que a ré observasse o preceituado no normativo acabado de citar que a Mma. Juiz «a quo» proferiu o douto despacho de fls. 28, quando já se encontrava finda a fase dos articulados (aliás, nesse despacho até só foi ordenado que a ré procedesse ao pagamento da multa em falta, do nº 3 do art. 486º-A, acrescido do pagamento da multa do nº 5 do mesmo artigo, certamente por não se ter atentado que o talão Multibanco junto a fls. 25 já não tinha qualquer valor e não podia ser utilizado nos autos).
Novamente a ré, em vez de aproveitar a última oportunidade que tinha de poder fazer valer a defesa que apresentou na dita oposição/contestação, pagando o que lhe fora determinado, fez «finca-pé» no sentido de que nada tinha a pagar a mais, por ter pago a taxa de justiça na data em que apresentou aquele articulado, e interpôs recurso de agravo contra aquele despacho da Sra. Juiz «a quo».
Como este recurso não era de subida imediata (por não se reconduzir a nenhuma das alíneas do nº 1 do art. 734º e por a sua retenção não o tornar absolutamente inútil, nos termos do nº 2 do mesmo normativo), nem era de se lhe atribuir efeito suspensivo (por não se reportar a qualquer das matérias indicadas nas alíneas do nº 2 do art. 740º - aquele despacho não “aplicou” qualquer multa à ré, apenas a “convidou” a proceder ao pagamento das multas taxadas no nº 5 do art. 486º-A, o que é “coisa” bem diferente, pois a “aplicação” de uma multa exige uma decisão condenatória nesse sentido – e por não estar em causa a aplicação do nº 3 do mesmo, na medida em que a recorrente, no seu requerimento de interposição do agravo, não invocou que a execução imediata do despacho recorrido seria susceptível de lhe causar prejuízo irreparável ou de difícil reparação, nem o Tribunal «a quo» o reconheceu, e bem, pois um eventual provimento do recurso de agravo levaria à “anulação” dos actos subsequentes, incluindo a sentença que a Mma. Juiz «a quo» veio depois a proferir), só havia uma coisa a fazer perante o não pagamento, por parte da ré-recorrente, da taxa de justiça e das duas multas a que se fez referência: ordenar, após decurso do prazo concedido pelo nº 5 do art. 486º-A, o desentranhamento da oposição/contestação apresentada por aquela.
Foi o que fez o Tribunal de 1ª instância a fls. 38, que, assim, bem andou.
Daí que, também nesta parte, não assista razão alguma à recorrente no que afirma nas conclusões 9ª a 11ª das alegações do agravo (e nas que lhes são iguais nas da apelação), pois o requerimento que apresentou a fls. 24 não era susceptível de suspender o prazo que decorria para que ela cumprisse o estatuído no nº 3 do citado art. 486º-A, nem cabia à Mma. Juiz, ao apreciar aquele requerimento, conceder-lhe um novo prazo para que ela cumprisse o fixado no normativo acabado de mencionar (o que seria um acto «contra legem»).

Por conseguinte, o recurso de agravo não merece provimento.
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3.2. O recurso de apelação:
Como facilmente se afere das conclusões das alegações da apelação (na parte que não são meras repetições das que já constavam das alegações do agravo), a recorrente põe em causa o mérito da douta sentença da 1ª instância apenas e só por entender que a sua contestação não devia ter sido desentranhada e que, por isso, os factos não deviam ter sido dados como provados com base em confissão da sua parte por falta de oposição.
Já vimos, na apreciação do recurso de agravo, que bem andou a Mma. Juiz «a quo» ao ter mandado desentranhar aquele articulado, pois limitou-se a dar cumprimento ao consignado no nº 5 do citado art. 486º-A.
Na sequência disso, havia que proferir sentença quanto ao mérito da causa, considerando, por falta de oposição, confessados os factos alegados na petição inicial, tanto mais que era admissível este meio de prova e inexistem nos autos documentos que infirmem o resultado daquela confissão – art. 490º nºs 1 e 2.
Foi o que fez o Tribunal de 1ª instância no item III da sentença de fls. 38 a 40.
Face à prova da factualidade alegada na petição inicial, não restava outra solução ao mesmo Tribunal que não fosse a da condenação da ré a pagar à autora as quantias e juros que estão enunciados na dita sentença.
Esta não merece, assim, qualquer censura, improcedendo, consequentemente, a apelação.
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Síntese conclusiva do que fica exposto:
I. De acordo com o art. 24º nº 2 do C.Cust.Jud. (na redacção aqui aplicável), o talão comprovativo do pagamento da taxa de justiça inicial (no caso, devida pela dedução de contestação) perde validade no prazo de 90 dias a contar da respectiva emissão se não tiver sido, entretanto, apresentado em juízo.
II. Decorrido aquele prazo, o mesmo não pode ser junto aos autos (pelo réu) para prova do prévio pagamento da respectiva taxa de justiça, mesmo que este tenha sido atempadamente efectuado, restando-lhe requerer, no prazo de 180 dias (também contados a partir da data da emissão daquele), nos termos do nº 3 daquele normativo, o reembolso da quantia despendida junto da entidade competente.
III. No processo, face à perda da validade daquele comprovativo, o faltoso (“in casu”, o réu), se quiser fazer valer o seu articulado (a contestação), terá que efectuar o pagamento da taxa de justiça que (para todos os efeitos) está em falta, com o acréscimo de multa de igual montante (mas não inferior a 1 UC nem superior a 10 UC’s), nos termos do nº 3 do art. 486º-A do C.Proc.Civ., quando para tal for notificado pela secretaria/secção de processos.
IV. Se o não fizer, restar-lhe-á, para evitar o desentranhamento do seu articulado, pagar a taxa de justiça e as multas a que alude o nº 5 do mesmo art. 486º-A.
V. Porque o agravo do despacho proferido nos termos do preceito acabado de citar (em que o Juiz “convida” o réu a proceder ao pagamento aí fixado) não tem efeito suspensivo – por não subir imediatamente nos próprios autos e não se reconduzir ao caso previsto na al. a) do nº 2 do art. 740º do C.Proc.Civ. -, deve, após decurso do prazo estabelecido naquele nº 5 do art. 486º-A, ordenar-se o desentranhamento do articulado em questão se a parte em falta não cumprir o que aí está exarado.
VI. Ordenado o desentranhamento da contestação, tudo se passa como se esta não existisse e, por falta de oposição/impugnação, devem considerar-se confessados os factos alegados na petição inicial, a não ser que se verifique alguma das situações previstas na segunda parte do nº 2 do art. 490º do C.Proc.Civ..
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4. Decisão:

Nesta conformidade, os Juízes desta secção cível da Relação do Porto acordam em:
1º) Negar provimento ao agravo e manter o despacho recorrido (de fls. 28).
2º) Julgar improcedente a apelação e confirmar a sentença recorrida.
3º) Condenar a recorrente nas custas do agravo e da apelação.
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Porto, 2008/10/28
Manuel Pinto dos Santos
Cândido Pelágio Castro de Lemos
Augusto José Baptista Marques de Castilho