Acórdão do Tribunal da Relação do Porto
Processo:
1512/13.1TTPRT.P1
Nº Convencional: JTRP000
Relator: RUI PENHA
Descritores: ERRO MATERIAL
DECLARAÇÃO DE INSOLVÊNCIA
ENCERRAMENTO TEMPORÁRIO DE EMPRESA OU ESTABELECIMENTO
FALTA DE PAGAMENTO DA RETRIBUIÇÃO
DANOS NÃO PATRIMONIAIS
Nº do Documento: RP201505261512/13.1TTPRT.P1
Data do Acordão: 05/26/2015
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: CONFIRMADA
Indicações Eventuais: 4ª SECÇÃO (SOCIAL)
Área Temática: .
Sumário: I - Não integra o conceito de erro material, susceptível de rectificação, a omissão de pronúncia relativamente a um dos pedidos formulados pelo autor.
II - A declaração de insolvência da empregadora não extingue o contrato de trabalho.
III - Tendo a empresa encerrado o estabelecimento e apresentado à insolvência, tal circunstancialismo não traduz um encerramento «definitivo», mas antes um encerramento temporário que para ser «convertido» em definitivo necessita de uma declaração do empregador, ou então do administrador da insolvência, que se torne conhecida dos trabalhadores.
IV - Os danos não patrimoniais resultantes da falta de pagamento de retribuições, em consequência da insolvência da empregadora, não resultando consequências permanentes para o trabalhador, nomeadamente doença, não assumem gravidade suficiente para justificar a indemnização.
Reclamações:
Decisão Texto Integral: Processo nº 1512/13.1TTPRT.P1

Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação do Porto

I. Relatório
B…, residente na Rua …, nº …, habit. .., Porto, através de mandatário judicial e litigando com apoio judiciário na modalidade de dispensa de taxa de justiça e demais encargos com o processo, veio intentar a presente acção declarativa de condenação, com processo comum, contra C…, Lda., com sede na Rua …, nº ., …, Gondomar.
Pede a condenação da ré a:
a) Pagar ao A., a título de créditos decorrentes da sua prestação de trabalho, a quantia de € 5.444,18, acrescida de juros moratórios à taxa legal de 4%, a contar da data da citação da R. até efectivo e integral pagamento;
b) Pagar ao A., a título de indemnização, nos termos previstos no nº 1 do art. 396º do Cód. Trabalho, a quantia de € 3.750,00;
c) Pagar ao A., a título de indemnização por danos não patrimoniais decorrentes da supra descrita conduta culposa da R., quantia não inferior a € 2.500,00;
d) Pagar ao A. juros moratórios sobre as quantias discriminadas supra nas alíneas b) e c) deste petitório, à taxa legal a contar da sentença e até integral pagamento.
Alega em síntese:
1. O A. foi admitido ao serviço da R., por efeito de um contrato de trabalho entre ambas as partes celebrado verbalmente, por tempo indeterminado e com início de vigência em 1 de Agosto de 2009,
2. Mediante a retribuição base mensal ilíquida de € 1.250,00, acrescida do subsídio de alimentação, no valor de € 6,17 por cada dia de trabalho prestado.
3. A partir de 06/09/2010, o A. viu-se impossibilitado de prestar o seu trabalho por doença, até 26/08/2011.
4. Quando o A. se deslocou às instalações da R., onde trabalhava, no primeiro dia útil seguinte a ter terminado a sua baixa médica por doença, em 29/08/2011, deparou com as portas da empresa encerradas, sem que fosse visível qualquer movimento ou presença de pessoas no seu interior,
5. O A. veio a tomar conhecimento de que a empresa estava num processo de reestruturação, tendo solicitado a todos os trabalhadores que, antes do encerramento para férias, estavam ao serviço efectivo, para aguardarem instruções para regresso ao trabalho e retoma das suas funções,
6. Algum tempo depois, veio a tomar conhecimento de que a R. tinha-se apresentado a um processo de insolvência,
7. No qual foi proferida sentença de declaração de insolvência da R., com nomeação de administrador de insolvência.
8. Por carta datada de 12 de Junho de 2013, enviada sob registo e com aviso de recepção para a morada da sede social e instalações da R. onde desempenhava as suas funções, o A. comunicou àquela que punha termo ao contrato de trabalho, com efeitos imediatos na data de recepção dessa sua carta,
9. Tendo o A. trabalhado 5 dias do mês de Setembro de 2010, esse tempo de trabalho não lhe foi pago.
10. Não foi pago também ao A. o subsídio de férias proporcional ao tempo de trabalho prestado no ano da sua admissão, 2009.
11. Igualmente não foi pago ao A. o subsídio de Natal correspondente a 5 meses de trabalho prestado no ano da sua admissão.
12. E não pagou a R. ao A. as férias, subsídio de férias e subsídio de Natal respeitantes ao tempo de trabalho prestado no ano de 2010.
13. Tem o A. ainda direito ao crédito de 35 horas anuais para formação profissional, que lhe não foi ministrada.
14. Tudo isso provocou e provocará no A. sofrimento, angústia, depressão e tristeza, que afectarão inelutavelmente o seu quotidiano e bem-estar pessoal durante um longo período de tempo.
Realizou-se a audiência de partes, à qual não compareceu a ré, que se considerou regularmente citada por despacho de fls. 86.
A ré não apresentou contestação.
Foi proferida sentença na qual se considerou haver caducado o contrato de trabalho, por insolvência da ré, assim improcedendo o primeiro pedido formulado, e se decidiu a final: julgo parcialmente procedente a presente acção, em consequência do que condeno a Ré a pagar ao Autor as seguintes quantias:
a) 239,18€, a título de vencimentos e subsídio de alimentação em falta;
b) 681,82€, a título de subsídio de férias de 2009;
c) 1.250,00€, a título de subsídio de férias vencido em 01 de Janeiro de 2010;
d) 2.500,00€, a título de proporcionais de férias, de subsídio de férias e de subsídio de natal do ano de 2010;
e) 252,35€, a título de formação profissional em falta.
f) Tudo acrescido de juros de mora, à taxa legal, desde a citação até integral pagamento.
Inconformado interpôs o autor o presente recurso de apelação, concluindo:
1. Crê-se existir um mero lapso do Mmo Sr. Juiz a quo, ao não condenar a ré na totalidade do pedido formulado pelo autor na alínea a) do seu petitório, no montante de € 5.444,18, mas apenas no total de € 4.923,35, neste não tendo feito incluir a quantia de € 520,83, alegada no art. 29º da petição inicial, relativa ao subsídio de Natal correspondente a 5 meses de trabalho prestado no ano da sua admissão, que o mesmo aí referiu não lhe ter sido paga.
2. Assim, por se crer tratar-se de uma mera omissão involuntária que estará na origem de tal lapso, já que inexiste qualquer referência ao aludido crédito na douta sentença recorrida que obste a que a ré seja nele também condenada, deverá ser reconhecido ao autor esse crédito, em consequência do que deverá a ré ser condenada ao respectivo pagamento e assim condenada na totalidade do pedido formulado na alínea a) do petitório.
3. Considera o Mmo Sr. Juiz a quo, na douta sentença recorrida, que o autor sustenta a sua tese na violação pela ré do dever de lhe proporcionar ocupação efectiva e, consequentemente, de pagar o seu salário, mais referindo aí que tal se ficou a dever ao facto de a ré “manter as instalações encerradas e sem qualquer actividade, pelo menos desde Agosto de 2011”. E que tal facto – o encerramento definitivo do estabelecimento a partir de Agosto de 2011 – seria determinativo da caducidade do contrato de trabalho, nos termos previstos no art. 346º, nº 3 do Código do Trabalho, caducidade essa verificada nessa mesma data.
4. Daí decorreria que, quando em Junho de 2013 o autor enviou a carta de resolução, inexistia já qualquer contrato de trabalho entre as partes há quase dois anos; pelo que tal decisão do autor não poderia acarretar quaisquer consequências jurídicas.
5. Entende o autor que inexistem quaisquer elementos de facto, quer relativamente à matéria que por si foi alegada e considerada confessada por falta de contestação, quer por referência aos documentos existentes nos autos, que sejam suficientes e permitam retirar a conclusão de que se verificou a caducidade do contrato de trabalho ajuizado, com fundamento no encerramento total e definitivo das instalações da ré.
6. Na verdade, nem da matéria de facto alegada pelo autor nem dos documentos que se encontram juntos aos autos resulta qualquer factualidade que permita dela extrair a conclusão de que a empresa ré, o estabelecimento ou as instalações onde o autor trabalhava se encontrassem e mantivessem encerrados total e definitivamente desde o mês de Agosto de 2011, sendo que o que o autor alegou foi que, no dia 29 de Agosto de 2011 se tinha deslocado às instalações da ré, mas deparou com as portas da empresa encerradas, sem que fosse visível qualquer movimento ou presença de pessoas no seu interior – art. 6º da petição –, tendo presumido então que a ré teria interrompido a sua actividade e encerrado as instalações durante esse mês de Agosto, para férias dos trabalhadores – art. 7º da petição – e pouco tempo depois, o autor veio a tomar conhecimento de que a empresa estava num processo de reestruturação, tendo solicitado a todos os trabalhadores que, antes do encerramento para férias, estavam ao serviço efectivo, para aguardarem instruções para regresso ao trabalho e retoma das suas funções.
7. Desta matéria de facto alegada entende o autor não poder resultar nem concluir-se que ocorreu um encerramento total e definitivo da empresa ré e, assim, não poderá dar-se por verificada a caducidade do contrato de trabalho em causa.
8. Assim, inexistindo elementos factuais bastantes para se concluir pela verificação da caducidade do contrato de trabalho, deverá ter-se por válida e operante a comunicação da resolução do contrato de trabalho por iniciativa do autor e com os fundamentos por si alegados, devendo, em consequência, ser-lhe reconhecido o direito à indemnização peticionada nos termos previstos no nº 1 do art. 396º do Cód. Trabalho, no montante de € 3.750,00 e o direito à indemnização dos danos não patrimoniais, no montante de € 2.500,00, no que deverá ser a acção julgada totalmente procedente e a ré condenada na totalidade dos pedidos contra si formulados.
9. Ao assim não ter sido decidido, entende o recorrente ter-se verificado uma incorrecta aplicação à matéria de facto havida por provada da disciplina prevista no nº 3 do art. 346º do Cód. Trabalho.
Não foram apresentadas contra alegações.
O Ministério Público junto deste Tribunal teve vista nos autos, emitindo parecer no sentido da procedência parcial da apelação.
Admitido o recurso e colhidos os vistos legais, cumpre decidir.
Como se sabe, o âmbito objectivo dos recursos é definido pelas conclusões do recorrente (artigos 684º, nº 3, e 690º, nº 1, do CPC, por remissão do art. 87º, nº 1, do CPT), importando assim decidir quais as questões naquelas colocadas.
Questões a decidir:
I. Não consideração do pedido relativo ao subsídio de natal do ano de admissão;
II. Caducidade do contrato de trabalho;
III. Licitude da resolução do contrato pela trabalhador e respectivas consequências.

II. Fundamentação de facto
a) No dia 01 de Agosto de 2009 o Autor foi admitido ao serviço da Ré para, por conta, sob as ordens, direcção e fiscalização desta e nas instalações da mesma, desempenhar as funções correspondentes à categoria de técnico de electrónica.
b) O Autor auferia a retribuição base mensal ilíquida de 1 250,00€, acrescida do subsídio de alimentação, no valor de 6,17€ por cada dia de trabalho prestado.
c) O Autor esteve de baixa médica, por doença, desde 06 de Setembro de 2010 até 26 de Agosto de 2011.
d) No dia 29 de Agosto de 2011 o Autor deslocou-se às instalações da Ré, mas deparou com as portas da empresa encerradas, sem que fosse visível qualquer movimento ou presença de pessoas no seu interior.
e) O Autor presumiu então que a Ré teria interrompido a sua actividade e encerrado as instalações durante esse mês de Agosto, para férias dos trabalhadores.
f) Pouco tempo depois, o Autor veio a tomar conhecimento de que a empresa estava num processo de reestruturação, tendo solicitado a todos os trabalhadores que, antes do encerramento para férias, estavam ao serviço efectivo, para aguardarem instruções para regresso ao trabalho e retoma das suas funções.
g) O Autor aguardou também que a Ré lhe comunicasse ulteriores informações sobre a sua situação laboral e a eventual data de retoma do trabalho.
h) Algum tempo depois, o Autor veio a tomar conhecimento de que a Ré tinha-se apresentado a um processo de insolvência, que correu termos sob o nº 937/11.1TYVNG, do 1º Juízo do Tribunal do Comércio de Vila Nova de Gaia.
i) No âmbito do processo mencionado em h), a Ré foi declarada insolvente através de sentença proferida em 14 de Fevereiro de 2012, transitada em julgado no dia 13 de Março de 2012.
j) Tal insolvência foi declarada com carácter limitado, ao abrigo do disposto no artigo 39º do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas, em virtude de inexistirem bem suficientes no seu património que permitissem satisfazer as custas do processo e as dívidas previsíveis da Massa Insolvente.
k) O Autor procurou obter junto de diversas instituições informações sobre que atitude deveria tomar para preservar os seus direitos laborais, sem que tivesse conseguido qualquer informação segura a tal respeito.
l) O Autor contactou também o administrador de insolvência nomeado, com vista a obter informação sobre a sua situação laboral, ao que lhe foi comunicado que a insolvência fora decretada com carácter limitado, por insuficiência da massa; e que relativamente ao Autor não tinha sido tomada qualquer decisão de cessação do vínculo de trabalho, nem por aquele administrador nem pelos legais representantes da empresa.
m) Por carta datada de 12 de Junho de 2013, enviada nesse mesmo dia, sob registo e com aviso de recepção para a morada da sede social e instalações da Ré, o Autor comunicou a esta que punha termo ao contrato de trabalho nos termos e com os fundamentos previstos no artigo 394º, nº 1 e nº 2, alíneas a) e b) do Código do Trabalho, com efeitos imediatos na data de recepção dessa sua carta, com o fundamento de que se encontrava numa situação de violação manifesta da parte da Ré quanto ao dever de ocupação efectiva e ao dever de pagamento do seu salário, em manifesta violação do previsto no artigo 127º, nº 1, alíneas b) e c) do Código do Trabalho, prolongando-se tal situação por bem mais do que os 60 dias previstos no nº 5 do artigo 394º do mesmo diploma.
n) A referida carta foi devolvida ao Autor em 25/06/2013, com a indicação nele aposta pelos serviços postais de que não foi reclamada.
o) O mencionado em m) bem como o completo abandono a que o Autor foi votado pela Ré, a qual o ignorou por completo e o remeteu para uma situação de desemprego forçado, sem ter tomado qualquer iniciativa para colocar à disposição do A. os documentos necessários a que pudesse recorrer ao subsídio de desemprego, provocaram-lhe uma prolongada situação de forte depressão e angústia quotidianas.
p) O Autor ainda hoje está desempregado, sendo conhecidas as dificuldades de obter um novo vínculo laboral no quadro de profunda crise laboral que se vive no País.
q) Tudo isso provocou e provocará no Autor sofrimento, angústia, depressão e tristeza.

III. O Direito
1. Não consideração do pedido relativo ao subsídio de natal do ano de admissão
Alega o recorrente:
A primeira questão tem a ver com o que se crê tratar-se de um mero lapso do Mmo Sr. Juiz a quo, ao não condenar a ré na totalidade do pedido formulado pelo autor na alínea a) do seu petitório, no montante de € 5.444,18, mas apenas no total de € 4.923,35, neste não incluindo a quantia de € 520,83, alegada no art. 29º da petição inicial, relativa ao subsídio de Natal correspondente a 5 meses de trabalho prestado no ano da sua admissão, que o mesmo aí referiu não lhe ter sido paga.
Assim, por se crer tratar-se de uma mera omissão involuntária que estará na origem de tal lapso, já que inexiste qualquer referência ao aludido crédito na douta sentença recorrida, deverá ser reconhecido ao autor esse crédito, em consequência do que deverá a ré ser condenada ao respectivo pagamento e assim condenada na totalidade do pedido formulado na alínea a) do petitório.
O Ministério Público entende que estamos perante um caso de nulidade da sentença, não tendo sido cumprido o disposto no art. 77º do CPT, pelo que deve tal pretensão improceder.
A questão prende-se com o facto de repetição do pedido por subsídio de natal pela trabalho prestado em 2009.
Verifica-se a apontada falta de pronúncia relativamente a esta matéria.
Efectivamente, o recorrente formulou no art. 29º da sua petição, por remissão formulada no pedido, o seguinte pedido:
Igualmente não foi pago ao A. o subsídio de Natal correspondente a 5 meses de trabalho prestado no ano da sua admissão, no montante de (€ 1.250,00 x 5/12) € 520,83.
Já da sentença consta apenas:
(…) o Autor formulou ainda vários outros pedidos, no sentido de a Ré ser condenada a pagar-lhe uma série de créditos salariais, a saber:
a) 239,18€, a título de vencimentos e subsídio de alimentação em falta;
b) 681,82€, a título de subsídio de férias de 2009;
c) 1.250,00€, a título de subsídio de férias vencido em 01 de Janeiro de 2010;
d) 2.500,00€, a título de proporcionais de férias, de subsídio de férias e de subsídio de natal do ano de 2010;
e) 252,35€, a título de formação profissional em falta.
f) Tudo acrescido de juros de mora, à taxa legal, desde a citação até integral pagamento.
Neste âmbito - considerando a simplicidade da causa, e tendo em atenção que os factos confessados acarretam a procedência integral da acção nessas partes - limito-me a aderir ao que foi alegado na petição inicial relativamente a esses mesmos pedidos - artigo 57o no 2 do Código de Processo do Trabalho.
Nos termos do art. 614º, nº 1, do CPC, se a sentença omitir o nome das partes, for omissa quanto a custas, ou contiver erros de escrita ou de cálculo ou quaisquer inexactidões devidas a outra omissão ou lapso manifesto, pode ser corrigida por simples despacho, a requerimento de qualquer das partes ou por iniciativa do juiz.
A questão é colocada quanto à última das aludidas omissões (erros de escrita ou de cálculo ou quaisquer inexactidões devidas a outra omissão ou lapso manifesto).
Conforme se salienta no acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra de 10-3-2015,[1] “o erro material não pode ser confundido com o erro de julgamento, sendo que apenas o primeiro pode ser corrigido por simples despacho; o erro de julgamento não é susceptível de rectificação ao abrigo da norma supra citada, apenas podendo ser reparado por via de recurso.
“A propósito da distinção entre erro material e erro de julgamento, afirma o Prof. Alberto dos Reis o seguinte: “O erro material dá-se quando o juiz escreveu coisa diversa do que queria escrever, quando o teor da sentença ou despacho não coincide com o que o juiz tinha em mente exarar, quando, em suma, a vontade declarada diverge da vontade real…O erro de julgamento é espécie completamente diferente. O juiz disse o que queria dizer; mas decidiu mal, decidiu contra lei expressa ou contra os factos apurados. Está errado o julgamento. Ainda que o juiz, logo a seguir, se convença de que errou, não pode socorrer-se do art. 667º para emendar o erro”.
“Mas, pressupondo o erro material uma divergência entre a vontade real do juiz e aquela que declarou, como poderemos constatar essa divergência, ou seja, como poderemos saber qual era a vontade real do juiz? Importa notar que, ainda que o juiz chamado a efectuar a rectificação seja o mesmo que proferiu o despacho ou sentença a rectificar (e que, como tal, saberá melhor que ninguém aquilo que pretendia escrever), a existência de um erro material susceptível de rectificação tem que ser apreensível externamente, sob pena de se estar a permitir que, de forma encapotada, o juiz possa emendar um erro de julgamento que tenha cometido com o pretexto de que aquilo que escreveu não era o que pretendia escrever.
“É por isso que a lei, ao determinar os erros susceptíveis de rectificação, impõe que eles sejam devidos a omissão ou lapso manifesto e tal significa que o erro tem que se manifestar com alguma clareza a quem leia o despacho ou sentença, de tal forma que possa ser percebido por outrem (e não apenas pelo juiz que os proferiu) que o juiz escreveu coisa diversa daquela que pretendia e que, como tal, o erro em causa não é um erro de julgamento.
“Com efeito, e citando mais uma vez o Prof. Alberto dos Reis, “é necessário que as circunstâncias sejam de molde a fazer admitir, sem sombra de dúvida, que o juiz foi vítima de erro material: quis escrever uma coisa e escreveu outra. Há-de ser o próprio contexto da sentença que há-de fornecer a demonstração clara do erro material”.
Face à matéria supra referida, conforma salientado pela Ministério Público, o eventual erro cometido na sentença proferida nos autos não poderá ser qualificado como erro material que seja susceptível de rectificação, mas antes um erro de julgamento que, como tal, apenas poderia ser reparado por via de recurso, nos termos do art. 615º, nº 1, al. d), do CPC.
Porém, o conhecimento de tal nulidade depende o cumprimento pelo recorrente do formalismos previsto no art. 77º, nº 1 do CPT (a arguição das nulidades da decisão deve ser feita, expressa e separadamente, no requerimento de interposição de recurso, sob pena de, se suscitadas mais tarde, delas não se poder conhecer).[2]
A razão dessa exigência (a de habilitar o tribunal “a quo” a suprir a falta cometida) torna indispensável que seja no requerimento de interposição do recurso, dirigido à instância recorrida, que se proceda à adequada explanação das razões pelas quais se suscita a nulidade. …as nulidades das sentenças e dos acórdãos devem ser arguidas no requerimento de interposição do recurso, e não nas respectivas alegações, sob pena de se considerarem extemporâneas, delas não se conhecendo.[3]
No caso concreto estamos perante uma total omissão de pronúncia sobre o pedido em causa.
Assim, não tendo o recorrente cumprido tal formalismo, improcede neste particular a apelação.

2. Caducidade do contrato de trabalho
Alega o recorrente:
(..) entende o autor que inexistem quaisquer elementos de facto, quer relativamente à matéria que por si foi alegada e considerada confessada por falta de contestação, quer por referência aos documentos existentes nos autos, que permitam retirar a conclusão de que se verificou a caducidade do contrato de trabalho ajuizado, com fundamento no encerramento total e definitivo das instalações da ré.
Na verdade, nem da matéria de facto alegada pelo autor nem dos documentos que se encontram juntos aos autos resulta qualquer factualidade que permita dela extrair a conclusão de que a empresa ré, o estabelecimento ou as instalações onde o autor trabalhava se encontrassem e mantivessem encerrados total e definitivamente desde o mês de Agosto de 2011. O que o autor alegou foi que, no dia 29 de Agosto de 2011 se tinha deslocado às instalações da ré, mas deparou com as portas da empresa encerradas, sem que fosse visível qualquer movimento ou presença de pessoas no seu interior – art. 6º da petição -, tendo presumido então que a ré teria interrompido a sua actividade e encerrado as instalações durante esse mês de Agosto, para férias dos trabalhadores – art. 7º da petição – e pouco tempo depois, o autor veio a tomar conhecimento de que a empresa estava num processo de reestruturação, tendo solicitado a todos os trabalhadores que, antes do encerramento para férias, estavam ao serviço efectivo, para aguardarem instruções para regresso ao trabalho e retoma das suas funções.
Desta matéria de facto alegada entende o autor não poder resultar nem concluir-se que ocorreu um encerramento total e definitivo da empresa ré e, assim, não poderá dar-se por verificada a caducidade do contrato de trabalho em causa.
Assim, inexistindo elementos factuais bastantes para se concluir pela verificação da caducidade do contrato de trabalho, deverá ter-se por válida e operante a comunicação da resolução do contrato de trabalho efectuada por iniciativa do autor e com os fundamentos por si alegados, devendo, em consequência, ser-lhe reconhecido o direito à indemnização peticionada nos termos previstos no nº 1 do art. 396º do Cód. Trabalho, no montante de € 3.750,00 e o direito à indemnização dos danos não patrimoniais, no montante de € 2.500,00, no que deverá ser a acção julgada totalmente procedente e a ré condenada na totalidade dos pedidos contra si formulados.
O Ministério Público emitiu parecer afirmando, no sentido da procedência do recurso neste ponto, por entender não se verificar o encerramento definitivo do estabelecimento.
Consta da sentença sob recurso:
O Autor sustenta a sua tese na violação pela Ré do dever de lhe proporcionar ocupação efectiva e, consequentemente, de pagar o seu salário, em virtude de manter as instalações encerradas e sem qualquer actividade, pelo menos desde Agosto de 2011.
Sucede, porém, que este mesmo facto – o encerramento definitivo do estabelecimento a partir de Agosto de 2011 – acarreta, só por si, consequências absolutamente decisivas para a apreciação da pretensão do Autor.
Com efeito, por força do disposto no artigo 346º nº 3 do Código do Trabalho, o encerramento total e definitivo da empresa determina a caducidade do contrato de trabalho.
Esta norma reproduz aquela que constava já do artigo 390º nº 3 do Código do Trabalho de 2003; e que veio consagrar uma nova solução legislativa, deixando o encerramento definitivo da empresa de ser considerada como uma das formas de despedimento colectivo (como sucedia até então, por força do disposto no artigo 16o do Decreto-Lei no 64-A/89, de 27/02), e passando, como já referi, a ser considerada uma causa de caducidade do contrato.
(...)
Ou seja, e voltando ao caso concreto, tendo a Ré encerrado definitivamente o seu estabelecimento comercial em Agosto de 2011, então o contrato de trabalho do Autor cessou, por caducidade, nessa mesma data.
Logo, quando em Junho de 2013 o Autor enviou a carta de resolução, inexistia qualquer contrato de trabalho entre as partes há quase dois anos; pelo que tal decisão do Autor não pode acarretar quaisquer consequências jurídicas.
É certo que, ainda de acordo com o disposto no artigo 346º nº 3 do Código do Trabalho, a Ré deveria ter seguido o procedimento previsto nos artigos 360º e seguintes, relativo ao processo de despedimento colectivo, com as necessárias adaptações.
Não o fazendo, então estaríamos perante um caso que a Ré faria cessar o contrato sem qualquer motivo ou justificação e sem precedência do procedimento exigido por lei, o que corresponde a um despedimento ilícito, por força do disposto no artigo 381º c) do Código do Trabalho.
Porém, afigurava-se necessário que o próprio Autor assim tivesse configurado a presente acção; ao invés de ter optado por o fazer nos termos supra expostos.
Em consequência, terá necessariamente de improceder o primeiro pedido formulado pelo Autor (o da declaração de justa causa para a resolução do contrato de trabalho); bem como aqueles que com ele estão directamente relacionados (o do pagamento da indemnização prevista no artigo 396º; e da indemnização por danos não patrimoniais).
Nos termos do art. 39º, nº 7, al. a), do CIRE, não sendo requerido o complemento da sentença (como se verificou no caso vertente), o devedor não fica privado dos poderes de administração e disposição do seu património, nem se produzem quaisquer dos efeitos que normalmente correspondem à declaração de insolvência, ao abrigo das normas deste Código.
Daí que a acção devesse ser intentada contra a aqui ré.
Nos termos dos arts. 343º, al. b), e 346º, nº 3, do Código do Trabalho, verifica-se a caducidade do contrato de trabalho quando ocorra o encerramento total e definitivo de empresa.
A propósito do encerramento do estabelecimento dispõe o art. 311º, nº 1 e 3, do Código do Trabalho que no caso de encerramento temporário de empresa, ou estabelecimento por facto imputável ao empregador, sem que este tenha iniciado procedimento com vista a despedimento colectivo, a despedimento por extinção de posto de trabalho, a redução temporária do período normal de trabalho ou a suspensão do contrato de trabalho em situação de crise empresarial, ou que não consista em encerramento para férias, o empregador informa os trabalhadores e a comissão de trabalhadores ou, na sua falta, a comissão intersindical ou as comissões sindicais da empresa, sobre fundamento, duração previsível e consequências de encerramento, com antecedência não inferior a 15 dias ou, sendo esta inviável, logo que possível.
Mais se estipula no nº 2 do mesmo preceito que, para tal efeito, se considera que há encerramento temporário de empresa ou estabelecimento por facto imputável ao empregador sempre que, por decisão deste, a actividade deixe de ser exercida, ou haja interdição de acesso a locais de trabalho ou recusa de fornecimento de trabalho, condições e instrumentos de trabalho, que determine ou possa determinar a paralisação de empresa ou estabelecimento.
Acrescenta ainda o art. 347º, nº 3, do Código do Trabalho que a cessação de contratos de trabalho decorrente do encerramento do estabelecimento deve ser antecedida do procedimento previsto nos artigos 360º e seguintes, com as necessárias adaptações, ou seja, o encerramento terá que ser precedido de comunicação dessa intenção, por escrito, à comissão de trabalhadores ou, na sua falta, à comissão intersindical ou às comissões sindicais da empresa representativas dos trabalhadores a abranger.
Por outro lado, nos termos do art. 347º, nº 1, do Código do Trabalho, a declaração de insolvência do empregador não faz cessar o contrato de trabalho, devendo o administrador da insolvência continuar a satisfazer integralmente as obrigações para com os trabalhadores enquanto o estabelecimento não for definitivamente encerrado.
Daí que se tenha de concluir com o acórdão deste Tribunal da Relação do Porto de 8-10-2012, que quando a empresa encerrou o estabelecimento e se apresentou à insolvência [não necessariamente por esta ordem], tal circunstancialismo não traduz um encerramento «definitivo», mas antes um encerramento temporário que para ser «convertido» em definitivo necessita de uma declaração do empregador que se torne conhecida dos trabalhadores ou então do administrador da insolvência.[4]
Terá, pois, que proceder a apelação neste ponto.

3. Licitude da resolução do contrato pelo trabalhador e respectivas consequências
Sobre esta questão provou-se o seguinte:
d) No dia 29 de Agosto de 2011 o Autor deslocou-se às instalações da Ré, mas deparou com as portas da empresa encerradas, sem que fosse visível qualquer movimento ou presença de pessoas no seu interior.
e) O Autor presumiu então que a Ré teria interrompido a sua actividade e encerrado as instalações durante esse mês de Agosto, para férias dos trabalhadores.
f) Pouco tempo depois, o Autor veio a tomar conhecimento de que a empresa estava num processo de reestruturação, tendo solicitado a todos os trabalhadores que, antes do encerramento para férias, estavam ao serviço efectivo, para aguardarem instruções para regresso ao trabalho e retoma das suas funções.
g) O Autor aguardou também que a Ré lhe comunicasse ulteriores informações sobre a sua situação laboral e a eventual data de retoma do trabalho.
h) Algum tempo depois, o Autor veio a tomar conhecimento de que a Ré tinha-se apresentado a um processo de insolvência, que correu termos sob o nº 937/11.1TYVNG, do 1º Juízo do Tribunal do Comércio de Vila Nova de Gaia.
i) No âmbito do processo mencionado em h), a Ré foi declarada insolvente através de sentença proferida em 14 de Fevereiro de 2012, transitada em julgado no dia 13 de Março de 2012.
j) Tal insolvência foi declarada com carácter limitado, ao abrigo do disposto no artigo 39º do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas, em virtude de inexistirem bem suficientes no seu património que permitissem satisfazer as custas do processo e as dívidas previsíveis da Massa Insolvente.
l) O Autor contactou também o administrador de insolvência nomeado, com vista a obter informação sobre a sua situação laboral, ao que lhe foi comunicado que a insolvência fora decretada com carácter limitado, por insuficiência da massa; e que relativamente ao Autor não tinha sido tomada qualquer decisão de cessação do vínculo de trabalho, nem por aquele administrador nem pelos legais representantes da empresa.
m) Por carta datada de 12 de Junho de 2013, enviada nesse mesmo dia, sob registo e com aviso de recepção para a morada da sede social e instalações da Ré, o Autor comunicou a esta que punha termo ao contrato de trabalho nos termos e com os fundamentos previstos no artigo 394º, nº 1 e nº 2, alíneas a) e b) do Código do Trabalho, com efeitos imediatos na data de recepção dessa sua carta, com o fundamento de que se encontrava numa situação de violação manifesta da parte da Ré quanto ao dever de ocupação efectiva e ao dever de pagamento do seu salário, em manifesta violação do previsto no artigo 127º, nº 1, alíneas b) e c) do Código do Trabalho, prolongando-se tal situação por bem mais do que os 60 dias previstos no nº 5 do artigo 394º do mesmo diploma.
Nos termos do art. 394º, nº 1, do Código do Trabalho, ocorrendo justa causa, o trabalhador pode fazer cessar imediatamente o contrato. Constituem justa causa de resolução do contrato pelo trabalhador, nomeadamente, a falta culposa de pagamento pontual da retribuição (nº 2 do mesmo artigo), considerando-se culposa a falta de pagamento pontual da retribuição que se prolongue por período de 60 dias (nº 5).
Por outro lado, nos termos do art. 129º, nº 1, al. b), do mesmo Código, é proibido ao empregador obstar injustificadamente à prestação efectiva de trabalho.
A justa causa é apreciada nos termos do nº 3 do artigo 351º (art. 394º, nº 4, do Código do Trabalho), com as necessárias adaptações, o qual estabelece que, na apreciação da justa causa, deve atender-se, no quadro de gestão da empresa, ao grau de lesão dos interesses do empregador, ao caráter das relações entre as partes ou entre o trabalhador e os seus companheiros e às demais circunstâncias que no caso sejam relevantes.
A presunção do art. 394º, nº 5, do Código do Trabalho não se traduz no afastamento dos pressupostos previstos no art. 351º, nº 3. Se é verdade que da falta de pagamento da retribuição para além de 60 dias decorre uma presunção inilidível de culpa, esta só justifica a resolução do contrato de trabalho se a situação tornou impossível a subsistência da relação de trabalho.[5]
Conforme se refere no acórdão do STJ de 12-10-2011, Provando-se que a mora no pagamento da retribuição ocorreu apenas relativamente a parte diminuta da mesma ou que a violação de direitos do trabalhador foi de pouco relevo no âmbito geral da execução do contrato, tais incumprimentos do empregador não tornam prática e imediatamente impossível a manutenção do contrato de trabalho.[6]
No caso vertente, atendendo que a falta de retribuição se prolongou por mais de 60 dias e considerando a essencialidade da mesma para a subsistência do trabalhador e seu agregado familiar, afigura-se que se encontram preenchidos os pressupostos para a licitude da resolução do contrato por parte do trabalhador.
Conforme se refere no acórdão deste Tribunal da Relação do Porto de 9-3-2015:[7] “A verificação de justa causa pressupõe, deste modo e como refere Ricardo Nascimento, Da Cessação do Contrato de Trabalho, em Especial Por Iniciativa do Trabalhador, Coimbra Editora, págs.185/186, a ocorrência dos seguintes requisitos:
“a) um de natureza objetiva – o facto material integrador de algum dos comportamentos referidos nas alíneas do nº 2 do art. 394º do Código de Trabalho (ou outro igualmente violador dos direitos e garantias do trabalhador);
“b) outro de caráter subjetivo – a existência de nexo de imputação desse comportamento, por ação ou omissão, a culpa exclusiva da entidade patronal;
“c) outro de natureza causal – que o comportamento da entidade patronal gere uma situação de imediata impossibilidade de subsistência da relação laboral, tornando inexigível, em concreto e de acordo com as regras de boa fé, que o trabalhador permaneça ligado à empresa por mais tempo.
“E, diga-se, tais requisitos tanto se aplicam nas situações de presunção ilidível de culpa (de mora inferior a 60 dias), como de presunção inilidível de culpa (mora de 60 dias ou superior). Quanto a esta, ao contrário do que parece ser entendido pelo Recorrente, a mora não faz operar, automaticamente, o direito de resolução, devendo a situação subsumir-se ao conceito de justa causa…
“Na apreciação da inexigibilidade de o trabalhador manter a relação laboral como requisito da justa causa de resolução, nunca poderá ser esquecido que, enquanto o empregador dispõe de sanções intermédias para censurar um determinado comportamento, o trabalhador lesado nos seus direitos não tem modos de reação alternativos à resolução (ou executa o contrato ou resolve-o). Neste contexto, o rigor com que se aprecia a justa causa invocada pelo empregador não pode ser o mesmo com que se aprecia a justa causa invocada pelo trabalhador, sendo certo que, naquele, se tutela a garantia do emprego, por um lado, e que, nesta, não tem o trabalhador, à semelhança do que ocorre com o empregador (que detém um leque variado de sanções disciplinares), outros meios de reação ao comportamento infrator do empregador.”
Já não assim relativamente à falta de ocupação efectiva do trabalhador, uma vez que a insolvência da empresa afasta, à partida, a falta de justificação exigida no art. 129º, nº 1, al. b), do Código do Trabalho, nada se tendo provado em contrário.
Nos termos do art. 396º, nº 1, do Código do Trabalho, em caso de resolução do contrato com justa causa por parte do trabalhador, este tem direito a indemnização, a determinar entre 15 e 45 dias de retribuição base e diuturnidades por cada ano completo de antiguidade, atendendo ao valor da retribuição e ao grau da ilicitude do comportamento do empregador, não podendo ser inferior a três meses de retribuição base e diuturnidades.
Entende-se que, face à antiguidade do autor e comportamento da ré, cujo comportamento se terá devido à sua situação de insolvência, considerando-se o limite mínimo referido, ser de fixar o montante da indemnização por lícita resolução do contrato no montante pedido de € 3.750,00.
Sobre a mesma são devidos juros de mora à taxa legal, desde o trânsito em julgado do presente acórdão (art. 805º, nº 3, 1ª parte, do Cód. Civil).[8]
O recorrente pede ainda a condenação da recorrida por danos não patrimoniais. Nos termos do art. 396º, nº 3, do Código do Trabalho, o valor da indemnização pode ser superior ao que resultaria da aplicação do seu nº 1, sempre que o trabalhador sofra danos patrimoniais e não patrimoniais de montante mais elevado.
Relativamente a esta questão provou-se que:
o) O mencionado em m) bem como o completo abandono a que o Autor foi votado pela Ré, a qual o ignorou por completo e o remeteu para uma situação de desemprego forçado, sem ter tomado qualquer iniciativa para colocar à disposição do A. os documentos necessários a que pudesse recorrer ao subsídio de desemprego, provocaram-lhe uma prolongada situação de forte depressão e angústia quotidianas.
p) O Autor ainda hoje está desempregado, sendo conhecidas as dificuldades de obter um novo vínculo laboral no quadro de profunda crise laboral que se vive no País.
q) Tudo isso provocou e provocará no Autor sofrimento, angústia, depressão e tristeza.
A obrigação de indemnizar por danos não patrimoniais tem como pressupostos fundamentais, o facto ilícito, o dano, a culpa e o nexo de causalidade, conforme prescrito pelo art. 483º do Código Civil.
No caso vertente, verifica-se a ilicitude do comportamento da recorrida, ao deixar de pagar as remunerações devidas ao recorrente, por prazo superior a 60 dias.
Também se provou que o trabalhador/recorrente sofreu dados, conforme resulta da factualidade transcrita.
Finalmente, mostra-se também presente o nexo causal entre o comportamento da recorrida e os danos.
A este propósito, para situação similar, considerou-se no acórdão deste Tribunal da Relação do Porto de 25-6-2012:[9]
“De acordo com o disposto no artigo 496º, do Código Civil, na fixação da indemnização deve atender-se aos danos não patrimoniais que, pela sua gravidade, mereçam a tutela do direito.
“Como a doutrina e a jurisprudência têm afirmado, a gravidade do dano deve medir-se por um padrão objectivo, embora tendo em conta as circunstâncias do caso concreto, e não em função de factores subjectivos, donde que os vulgares incómodos, contrariedades, transtornos, indisposições, por não atingirem um grau suficientemente elevado, não conferem direito a indemnização; isto é, não basta a verificação de um qualquer dano não patrimonial para justificar o pagamento de indemnização, impondo-se que o mesmo revista gravidade. “A gravidade do dano há-de medir-se por um padrão objectivo (conquanto a apreciação deva ter em linha de conta as circunstâncias de cada caso), e não à luz de factores subjectivos (de uma sensibilidade particularmente embotada ou especialmente requintada).
“Por outro lado, a gravidade apreciar-se-á em função da tutela do direito: o dano deve ser de tal modo grave que justifique a concessão de uma satisfação de ordem pecuniária ao lesado” (Antunes Varela, “Das Obrigações em Geral”, volume I, 4ª edição, Almedina, página 532).
“(…) a indemnização deve ser fixada equitativamente pelo tribunal, tendo em atenção as circunstâncias referidas no art. 494º, Código Civil, ou seja, a culpabilidade do agente, a situação económica deste e do lesado e as demais circunstâncias do caso que o justifiquem (nº 3 do referido artigo 496º, e artigos 494º, nº 1 e 570º, todos do Código Civil).
“Isto é, no dizer de Pires de Lima e Antunes Varela (Código Civil Anotado, Coimbra Editora, vol. I, 3ª edição, pág. 501), o montante da indemnização “(...) deve ser proporcionado à gravidade do dano, tomando em conta na sua fixação todas as regras de boa prudência, de bom senso prático, de justa medida das coisas, de criteriosa ponderação das realidades da vida”.
“Ou seja, havendo culpa do lesado e do lesante na produção do dano deverá determinar-se, tendo por base a gravidade da culpa de cada um deles, se, como explicita o artigo 570º, do Código Civil, a indemnização “deve ser totalmente concedida, reduzida ou mesmo excluída”.”
No caso dos autos, resulta que a ilicitude do comportamento da empregadora decorre da situação de insolvência em que se encontra, situação que era de há muito conhecida do recorrente.
Assim, a ilicitude, quer a culpa da recorrida são diminutas.
Face ao exposto, afigura-se correcto fixar a indemnização por danos não patrimoniais em € 500.00.
Assim, procede neste particular o pedido.

IV. Decisão
Pelo exposto, acorda-se em julgar parcialmente procedente a apelação, condenando-se a ré a pagar ao autor/recorrente indemnização por resolução lícita do contrato de trabalho, no montante de € 3.750,00 (três mil setecentos e cinquenta euros), bem como indemnização por danos não patrimoniais no montante de € 500,00 (quinhentos mil euros), ambas acrescidas de juros de mora à taxa legal de 4% desde o trânsito em julgado do presente acórdão e até integral pagamento.
No mais confirma-se a sentença recorrida.
Custas em ambas as instâncias na proporção do vencido.

Porto, 26-5-2015
Rui Penha - relator
Maria José Costa Pinto
João Nunes
___________
[1] Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra de 10-3-2015, processo 490/11.6TBOHP-D.C2, relatora Catarina Gonçalves, acessível em www.dgsi.pt/jtrc.
[2] Acórdão do STJ de 8-5-2013, processo 3020/09.6TTLSB-A.L1.S1, da 4ª Secção, relator Fernandes da Silva, acessível em http://www.stj.pt.
[3] Acórdão do STJ de 14-12-2004, processo 04S2169, relator Vítor Mesquita, acessível em www.dgsi.pt/jstj.
[4] Acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 8-10-2012, processo 196/11.6TTBCL.P1, relatora Fernanda Soares, acessível em www.dgsi.pt/jtrp.
[5] Acórdão do STJ de 12-10-2011, processo 2384/07.0TTLSB.L1.S1, relator Fernandes da Silva, acessível em www.dgsi.pt/jstj.
[6] Acórdão do STJ de 12-10-2011, processo 612/09.7TTSTS.P1.S1, relator António Leones Dantas, igualmente acessível em www.dgsi.pt/jstj.
[7] Acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 9-3-2015, processo 736/12.3TTVFR.P1, relatora Paula Leal de Carvalho, acessível em www.dgsi.pt/jtrp.
[8] Acórdãos do STJ de 25-6-2008, processo 08S1033, relator Pinto Hespanhol, e de 21-10-2009, processo 1996/05.1TTLSB.S1, relator Vasques Dinis, ambos acessíveis em www.dgsi.pt/jstj.
[9] Acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 25-6-2012, processo 11503/07.6TBMAI.P1, relatora Paula Leal de Carvalho, acessível em www.dgsi.pt/jtrp.