Acórdão do Tribunal da Relação do Porto | |||
Processo: |
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Nº Convencional: | JTRP00036138 | ||
Relator: | ANTÓNIO GAMA | ||
Descritores: | CASO JULGADO PROCESSO PENAL | ||
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Nº do Documento: | RP200401140344725 | ||
Data do Acordão: | 01/14/2004 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Tribunal Recorrido: | T J ESTARREJA | ||
Texto Integral: | S | ||
Privacidade: | 1 | ||
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Meio Processual: | REC PENAL. | ||
Decisão: | NEGADO PROVIMENTO. | ||
Área Temática: | . | ||
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Sumário: | Ao caso julgado, em processo penal, aplica-se as regras do processo civil. | ||
Reclamações: | |||
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Decisão Texto Integral: | Acordam, em audiência, no Tribunal da Relação do Porto: No Tribunal Judicial da Comarca de Estarreja, para além do mais que agora irreleva, foi decidido condenar: A arguida Isabel..., pela prática de 1 crime de tráfico de estupefacientes, previsto no art. 21º, n.º 1, do Dec.-Lei 15/93, de 22 de Janeiro, de harmonia com o Art. 83º do Código Penal, numa pena relativamente indeterminada, entre 5 (cinco) anos e 4 (quatro) meses de prisão e 13 (treze) anos de prisão. A arguida Maria..., pela prática de 1 crime de tráfico de estupefacientes, previsto no Art. 21º, n.º 1, do Dec.-Lei 15/93, de 22 de Janeiro, na pena de 6 (seis) anos de prisão. A arguida Gina..., pela prática de 1 crime de tráfico de estupefacientes de menor gravidade, previsto no Art. 25º, n.º 1, do Dec.-Lei 15/93, de 22 de Janeiro, na pena de 3 (três) anos de prisão, suspensa na sua execução pelo período de 3 (três) anos. A arguida Catarina..., pela prática de 1 crime de tráfico de estupefacientes de menor gravidade, previsto no Art. 25º, n.º 1, do Dec.-Lei 15/93, de 22 de Janeiro, na pena de 3 (três) anos de prisão, suspensa na sua execução pelo período de 3 (três) anos. O arguido José..., pela prática de 1 crime de tráfico de estupefacientes de menor gravidade, previsto no Art. 25º, n.º 1, do Dec.-Lei 15/93, de 22 de Janeiro, na pena de 2 (dois) anos e 6 (seis) meses de prisão, suspensa na sua execução pelo período de 3 (três) anos. A arguida Ana..., pela prática de 1 crime de tráfico de estupefacientes de menor gravidade, previsto no Art. 25º, n.º 1, do Dec.-Lei 15/93, de 22 de Janeiro, na pena de 2 (dois) anos de prisão, suspensa na sua execução pelo período de 3 (três) anos. O arguido Bruno..., pela prática de 1 crime de tráfico de estupefacientes de menor gravidade, previsto no Art. 25º, n.º 1, do Dec.-Lei 15/93, de 22 de Janeiro, na pena de 2 (dois) anos de prisão, que se suspensa na sua execução pelo período de 2 (dois) anos. O arguido Fernando..., pela prática de 1 crime de tráfico de estupefacientes de menor gravidade, previsto no Art. 25º, n.º 1, do Dec.-Lei 15/93, de 22 de Janeiro, na pena de 1 (um) ano e 3 (três) meses de prisão, suspensa na sua execução pelo período de 2 (dois) anos. A arguida Ana Lúcia..., pela prática de 1 crime de tráfico de estupefacientes de menor gravidade, previsto no Art. 25º, n.º 1, do Dec.-Lei 15/93, de 22 de Janeiro, na pena de 1 (um) ano e 4 (quatro) meses de prisão, suspensa na sua execução pelo período de 2 (dois) anos. Inconformadas com as condenações recorreram as arguidas Isabel... e Maria..., rematando as pertinentes motivações com as seguintes conclusões que se transcrevem: Não pode o tribunal repetir em julgamento matéria objecto de anterior julgamento, em que terceira pessoa foi condenado pela prática de tráfico, com a posse de 7.140g de heroína, mais 5.990 em 13 pacotes de heroína. Não pode o tribunal dar como provado e atribuir às recorrentes, a posse de 7.140g de heroína e 5.990g do mesmo produto, todas encontradas na busca de 29-09 de 2001, em casa das arguidas, onde também vivia o filho e companheiro que foi julgado e condenado pelo crime de tráfico, devido à posse desta substância, sob pena de ofensa do caso julgado. Nem pode o tribunal mencionar sequer no libelo acusatório autos de busca que não foram realizados ao abrigo deste processo, mas de outro em que as recorrentes não foram arguidas. Uma vez julgado um crime de tráfico praticado por determinada pessoa, com base na posse de determinada quantidade de produto que lhe foi encontrado em busca, não pode posteriormente em outro julgamento, atribuir-se novamente essa droga a terceiras pessoas, residentes e familiares do 1º arguido. Tal facto constitui uma violação do caso julgado, e por isso o tribunal conheceu de matéria que não podia conhecer, o que determina a nulidade do acórdão nos termos do art.º 379º do Código de Processo Civil. A prova dos factos da prática de tráfico, que é um crime de natureza continuada, e a fixação da data do início, deve ser feita através de dados concretos, testemunhais ou não mas cujas provas existam. Não constituem provas da data do início a recepção no telemóvel de chamadas registadas em número de 159, entre 1 de Julho e Outubro de 2001, cujos números não são atribuídos a toxicodependentes. Nem pode com base nestes registos dar-se como provado um grande número de chamadas, dado que em média, e durante o período do registo, oscila numa média de 1,25 chamadas por dia. Não pode dar-se como provado que a aquisição da droga foi feita a determinada pessoa, se os agentes da PJ não perseguiram o comprador até ao local do encontro, e não viram a quem foi comprada a droga. Também não pode dar-se como provado este facto, dado que o comprador afirmou desconhecer o homem que lhe entregou o produto, atirando-o para o interior da viatura e a quem nem sequer viu a cara. Considerando-se como provados estes factos com total ausência de prova, o acórdão deu como provada matéria que não poderia dar como assente, com insuficiência para a matéria de facto, contradição insanável da fundamentação e por isso um erro notório na apreciação da prova. Também este facto determina a nulidade do acórdão nos termos do art.º 410º do Código Processo Penal. Dando-se como provado que por várias vezes a recorrente fazia entregas de produto estupefaciente, e referindo-se apenas a duas datas, no decurso de meses de vigilância, não esta constituído o crime de tráfico do art.º 21º mas um crime de tráfico do art.º 25º, ambos do Decreto Lei n.º 15/93. Analisando a prova contra a arguida Maria, verifica-se que cometeu apenas um crime do art.º 25º do Decreto Lei n.º 15/93, pelo que a sanção a aplicar-se-lhe deverá ser a pena mínima de 3 anos, com suspensão de execução da pena. A aplicação da pena indeterminada, tem como pressupostos, além dos anteriores crimes, e o prazo mínimo de 5 anos, os pressupostos de que a personalidade da arguida, no momento de julgamento mantém a tendência delinquente e não possível de ser ressocializada. Tais factos devem constar da acusação e ser o arguido notificado para os contestar autonomamente o que não aconteceu. No caso dos autos as condições legais de aplicação da pena não estão demonstradas pelo que não pode tal pena ser atribuída à recorrente, condenada pelo tráfico do art. 21º O acórdão violou expressamente o disposto nos artºs 379º do Código Processo Penal, n.º 1 al. c.) que determina a nulidade da sentença; art.º 410 nas suas alíneas a) b) e c.) do n.º 2; violou os artºs 70º, 71º, 73º, 74º, 83º e o art.º 21º e 25º do Decreto Lei n.º 15/93. A considerar-se a ofensa do caso julgado e o conhecimento de matéria subtraída ao conhecimento do tribunal recorrido, haverá que determinar-se a nulidade da sentença; ou caso assim se não entenda, deverá o recurso ser procedente, nos restantes pontos indicados. Já antes a arguida Isabel... tinha interposto recurso do despacho proferido na sequência da reclamação quanto ao exame psiquiátrico realizado na pessoa da recorrente, tendo apresentado as seguintes conclusões que se transcrevem: O exame médico psiquiátrico é o único capaz de avaliar a imputabilidade do arguido. Constando dos autos o relatório do perito técnico superior do IRS sobre a personalidade do arguido, sobre a sua capacidade mental situando-o próximo da incapacidade mental, dado que tal exame feito por um especialista, não pode ser o mesmo arguido sujeito a exame de clínica geral para apreciação do seu estado psíquico e da sua imputabilidade. O juízo técnico e cientifico inerente à prova pericial presume-se subtraído à livre apreciação do julgador e sempre que a convicção do julgador divergir do parecer dos peritos, deve aquele fundamentar a divergência. Não pode por isso, considerar-se como exame psiquiátrico muito menos bem executado, o exame sobre imputabilidade feito por um médico de clínica geral. A douta decisão recorrida violou o disposto nos art.ºs 151º, 159º, 60º n.º 1 e art.º 351º do Código Processo Penal. Admitido o recurso o Ministério Público respondeu concluindo pela improcedência de ambos os recursos. Após os vistos realizou-se audiência, não tendo sido suscitadas novas questões. Factos provados: 1. As arguidas Maria e Isabel, pelo menos desde Julho de 2001 até à data em que foram detidas à ordem destes autos (11.4.2002), vinham-se dedicando, em conjugação de esforços e de intenções, à cedência de heroína e mais raramente de cocaína a terceiros, mediante o pagamento de um preço, 2. De início, actuavam em conjugação de esforços e de intenções com António..., conhecido por Tó Cigano, companheiro marital da arguida Isabel e filho da arguida Maria, residindo todos juntos até 29.9.2001, data em que este foi preso, no âmbito do inquérito n.º 39.01.9PEVIS. 3. No dia 29 de Setembro de 2001, no âmbito de busca judicialmente ordenada, efectuada à residência das arguidas, sita na Rua...,..., ..., em Viseu, foram ali apreendidos: na sala, no interior de um maço de tabaco, 16 embalagens de plástico, contendo heroína com o peso líquido de 7,140 gramas; dois plásticos recortados destinados a embalar mais doses do mesmo produto; 13 embalagens em plástico contendo heroína com o peso liquido de 5,990 gramas e, no quarto da arguida Maria, 1.237.000$ em notas do banco de Portugal (correspondente a 6.170,13 Euros). 4. A partir da data em que o referido Tó Cigano foi detido, as arguidas Maria e Isabel prosseguiram, em conjugação de esforços e de intenções, a actividade de tráfico. 5. Adquiriam o produto estupefaciente na Póvoa de Lanhoso, através de familiares da arguida Isabel..., de nomes João... (seu pai) e Honório... (o Hinório, seu ir-mão), sendo a arguida Isabel quem os contactava e fazia as encomendas. 6. O transporte do produto estupefaciente (quase exclusivamente heroína) para Viseu era também efectuado pela arguida Isabel..., quando se deslocava a casa dos referidos familiares em Póvoa de Lanhoso; por estes, quando se deslocavam a Viseu e vinham receber dinheiro de encomendas anteriores, ou então através de alguém de origem não cigana, que denominavam de «lacorrilho», em quem tivessem confiança e que se prontificasse a fazer o transporte, como aconteceu com o arguido José... por duas vezes. 7. O empacotamento da heroína era efectuado, por regra, pelas arguidas Maria e Isabel em sua casa, em.... 8. Vendiam o produto estupefaciente por preço superior ao da sua aquisição, revertendo para elas os lucros das vendas. 9. Tinham elas várias pessoas a vender por sua conta, nomeadamente o arguido José..., já mencionado, as arguidas Catarina e Gina, estas sobrinhas da Maria, e ainda os argui-dos Ana... e Bruno. 10. Os arguidos José..., Ana... e Bruno são consumidores de droga, recebendo das arguidas Isabel e Maria, como forma de pagamento, quantidade não apurada de heroína e, por vezes, de cocaína. 11. As arguidas Catarina e Gina não são consumidoras de estupefacientes, recebendo roupa, tabaco e algum dinheiro (cerca de 5 Euros, por vezes) das arguidas Isabel e Maria, para pagamento dos seus serviços. 12. Os arguidos Fernando, Ana Lúcia e António adquiriam heroína às arguidas Isabel e Maria - umas vezes directamente a estas, outras vezes por intermédio dos vendedores acima identificados - que destinavam a consumo e à venda a terceiros e o António também a cedência à sua companheira. 13. Procediam às vendas por preço superior ao da sua aquisição, revertendo para eles o lucro da venda. 14. Embora raramente, as arguidas Isabel e Maria também vendiam directamente aos consumidores. 15. Na sua actividade as arguidas Maria e Isabel utilizavam os telemóveis com os nºs 96..., 93... e 966..., através dos quais eram contactadas e contactavam os arguidos José..., Catarina, Gina, Ana... e Bruno, bem como as pessoas que lhes adquiriam o produto para consumo e para revenda. 16. Estes telefonavam-lhes também de cabinas públicas, sitas na cidade de Viseu. 17. Por vezes, a arguida Maria procedia também ela própria a entregas de produto estupefaciente, o que ocorreu nomeadamente no dia 11 de Abril de 2002, cerca das 10h40m, data em que procedeu à entrega de quantidade não apurada de heroína ao arguido Fernando..., junto da cabina telefónica sita ao pé do posto de combustível da Galp, ao lado do Estabelecimento Prisional de Viseu e, no dia 8.4.2002, pelas 10 horas, data em que no mesmo local procedeu à entrega de 5 gramas de heroína à companheira do arguido Fernando... (a arguida Ana), sendo tal entrega previa-mente concertada entre ambas e a arguida Isabel, por telefone. 18. A arguida Maria também estabelecia contactos com os adquirentes de heroína, através do telemóvel com o n.º 93..., tal ocorrendo sobretudo durante o ano de 2001. 19. Estes telefonavam-lhe várias vezes de cabinas telefónicas públicas, sitas em Viseu, para fazerem encomendas e combinarem a entrega do produto, tendo sido contactada, para esse efeito, nomeadamente de cabinas sitas na Rua..., em frente à casa da..., no dia 26.10.2001, na Avenida..., no dia 26.10.2001, na Rua C..., nos dias 21.10.2001 e 25.10.2001, no Campus Universitário, no dia 25.10.2001, na Rotunda..., no dia 23.10.2001 e na Rua José..., no dia 21.10.2001. 20. No total, no período de 1.7.2001 a 26.10.2001, a arguida Maria recebeu 159 chama-das no dito telefone, de cabinas públicas, todas situadas em... ou em zonas próximas. 21. Recebeu ainda chamadas, no mesmo período de tempo, e com a mesma finalidade, efectuadas através do número 232..., pertencente a Maria de Lurdes..., identificada a folhas 360, residente no Bairro da...; do telemóvel n.º 91... pertencente a Ana Cristina..., residente em..., identificado a folhas 300; do telemóvel nº938... pertencente a Joaquim..., conhecido por Quim de M..., residente na Rua D..., em Viseu; do telemóvel n.º 9381... pertencente a José Carlos... identificado a folhas 329, residente no...; do telemóvel n.º 934... pertencente a Armando..., residente na Quinta S..., identificado a folhas 332. 22. No dia 15.4.2002, por mandado judicial, foi efectuada busca à residência das arguidas Maria e Isabel, tendo sido encontrada, no quarto da primeira e apreendida a quantia de 165 Euros, proveniente da actividade de tráfico das ditas arguidas. 23. A arguida Isabel estabelecia também contactos com os consumidores e com os vendedores. 24. Por vezes, ela própria fazia também entregas de produto estupefaciente. 25. Nomeadamente, recebeu, via telefone, encomendas de heroína por parte: 25.1. De José Manuel..., conhecido por Né, identificado a folhas 227 e de Manuel Pereira..., identificado a folhas 225, no dia 8.4.2002, tendo-os mandado ir buscar o produto encomendado ao arguido Bruno. 25.2. De Carlos Manuel..., de alcunha Carlos de S. Pedro, identificado a folhas 229, no dia 31.3.2002, cerca das 16h40, tendo-o mandado ir buscar o produto encomendado aos arguidos Ana ou Bruno, únicos que nesse próprio dia lhe poderiam fornecer, ou, no dia seguinte, à Catarina; no dia 1.4.2002, pelas 23h06, mandou-o, de novo, ir buscar o produto à arguida Ana.... 26. A mesma arguida Isabel vendeu heroína, nomeadamente ao Né, a Roberto..., conhecido por Babalu, identificado a folhas 199, nomeadamente no dia 30.3.2002, em..., junto ao café Doce C..., por volta das 20 horas e no dia seguinte, pela 1 hora, junto às bombas de gasolina sitas ao pé do estabelecimento prisional de Viseu. 27. O arguido José... foi, por duas vezes, transportador de confiança das arguidas Isabel e Maria, transportando o produto de Póvoa de Lanhoso para Viseu. 28. Utilizou para o efeito o veículo automóvel de matrícula ..-..-QA, pertencente à sua mãe. 29. Para tanto, recebeu, em troca, das ditas arguidas, algum produto estupefaciente. 30. O mesmo arguido José... procedia também à venda de produto estupefaciente pertencente às arguidas Maria e Isabel. 31. Quando as arguidas Maria e Isabel não tinham produto estupefaciente para lhe entregar, mandavam-no ir buscá-lo às arguidas Catarina ou Gina. 32. No dia 30.3.2002, a mando da arguida Maria, foi buscar heroína para vender, à arguida Gina, ao restaurante Grande..., tendo levado heroína no valor de 249,40 Euros. 33. Desse produto, vendeu à arguida Ana Lúcia, no mesmo dia 30.3.2002, cerca das 21h10m, um pacote, correspondente ao preço de 24,94 Euros, tendo recebido, em troca, um anel em ouro com uma pedra vermelha. 34. Foi a arguida Isabel quem mandou a arguida Ana Lúcia ir comprar o produto ao arguido José... depois de ter sido contactada telefonicamente por aquela, para lhe vender um pacote de heroína. 35. Em 5.4.2002 o mesmo arguido José... vendeu a clientes não apurados heroína no valor de 249,40 Euros, pertencente às arguidas Isabel e Maria. 36. Vendeu também heroína a Carlos de São Pedro, no dia 6.4.2002. 37. Este telefonou para a arguida Isabel, a fim de adquirir heroína, sendo esta quem o mandou ir adquirir o produto ao arguido José.... 38. Outras vezes, era o próprio arguido José... quem, a mando das arguidas Maria e Isabel, enviava os clientes às arguidas Catarina ou Gina, onde iam buscar o produto estupefaciente que pretendiam adquirir. 39. No dia 11.4.2002, pelas 18h50, o arguido José... veio a ser interceptado e detido por elementos da Polícia Judiciária, na estação de Serviço da Shell, sita na auto-estrada A1, em..., ..., quando regressava de Póvoa de Lanhoso, onde fora buscar heroína que a Isabel havia encomendado, de acordo com ordens que lhe haviam sido transmitidas por esta. 40. Trazia, então, consigo as seguintes produtos e objectos que lhe foram apreendidos: uma embalagem revestida a fita adesiva castanha, contendo no seu interior heroína com o peso líquido de 201,934 gramas, uma pequena embalagem em plástico contendo no seu interior bicarbonato de sódio com o peso bruto de 9,555 gramas, um rolo de fita adesiva castanha e um telemóvel Nokia, modelo 8210. 41. Fazia-se transportar no referido veículo de matrícula ..-..-QA, onde trazia todos os objectos e produtos supra referidos. 42. A heroína que lhe foi apreendida pertencia às arguidas Isabel e Maria, que a destinavam a venda por preço superior ao da sua aquisição. 43. Os restantes produto e objectos pertenciam ao arguido. 44. Este arguido recebera instruções das arguidas Isabel e Maria, nos dias 10.4.2002 e 11.4.2002, para ir buscar a heroína que lhe foi apreendida à Póvoa do Lanhoso e ainda para, na mesma altura, proceder à entrega de esc. 375.000$00 em dinheiro, ao indivíduo que lha entregasse, referente ao pagamento do preço de anterior aquisição de heroína. 45. O arguido José... recebeu o mencionado dinheiro, bem como mais 8.000$00 para portagens e despesas de gasolina, através da arguida Catarina, de acordo ainda com as instruções recebidas da Isabel e da Maria. 46. Tal dinheiro pertencia às arguidas Isabel e Maria, que o haviam entregue previa-mente à arguida Catarina, com a finalidade referida. 47. Já em Póvoa de Lanhoso, o arguido José... recebeu a heroína que lhe foi apreendida de um indivíduo não identificado, de etnia cigana, entregando-lhe em troca o dinheiro que recebera das arguidas, para pagamento do anterior fornecimento. 48. Segundo a combinação efectuada com as arguidas Isabel e Maria, quando chegasse a Viseu, o arguido José... devia ir ter com a arguida Catarina para esta, em troca do serviço prestado, lhe dar heroína, em peso não superior a uma 1 grama. 49. As arguidas Catarina e Gina, que são irmãs entre si e sobrinhas da arguida Maria, procediam à angariação de clientes, a entrega a estes do produto estupefaciente e recebimento do preço correspondente, tudo por conta das arguidas Maria e Isabel. 50. A arguida Catarina, para além disso, entregou por uma vez ao arguido José... o dinheiro para este ir buscar o produto estupefaciente à Povoa de Lanhoso, sendo a ela que o José... deixou o produto estupefaciente no regresso da viagem, tudo de acordo com instruções da Ma-ria e da Isabel. 51. Esta arguida (Catarina) vendeu heroína, nomeadamente, a José Manuel..., a Manuel Pereira... e a Carlos Manuel..., este último identificado a folhas 229. 52. O Carlos Manuel... ligava primeiro para a Isabel, que lhe dizia para ir comprar ao arguido Bruno, à arguida Paula ou à arguida Catarina, dependendo de quem tivesse produto para vender. 53. Comprava, em média, 2 a 3 pacotes de heroína, diariamente, pelo preço de 25 Euros cada. 54. Quando era a Catarina a proceder às vendas, entregava-lhe o produto em..., junto ao café Doce C.... 55. Na sua actividade de tráfico, a dita arguida utilizava o telemóvel com o nº968..., que lhe foi apreendido (folhas 171). 56. A arguida Gina, por seu turno, procedia à entrega do produto estupefaciente e recebi-mento do respectivo preço, normalmente no restaurante Grande..., sito na Rua..., em Viseu, onde trabalhava, e em outros locais que combinava telefonicamente com os clientes. 57. Vendeu, nomeadamente, ao referido Né; ao arguido José... - a este, designada-mente, no dia 30.3.2002, no restaurante Grande...; à arguida Ana a quem entregou, nomeadamente, 11 pacotes de heroína no dia 7.4.2002; e ao arguido Bruno: no dia 8.4.2002, entregou-lhe 11 pacotes de heroína e, no dia 9.4.2002 mais 11 pacotes do mesmo produto, tendo recebido, na mesma altura, esc. 100.000$00 (498,80 Euros) provenientes da venda de um fornecimento anterior de heroína. 58. Utilizava na sua actividade de tráfico o telemóvel Nokia modelo 3330, IMEI ....., que lhe foi apreendido (folhas 172). 59. Também a arguida Ana... vendia produto estupefaciente pertencente às arguidas Maria e Isabel. 60. Quem lhe entregava o produto estupefaciente eram, normalmente, as arguidas Cata-rina e Gina, esta última, por norma, no restaurante Grande..., onde trabalhava. 61. Entregava o preço do produto que recebia aquando do fornecimento seguinte, após ter procedido à sua venda. 62. Nomeadamente, no dia 2.4.2002, a arguida Ana entregou à arguida Catarina, a mando da arguida Isabel, esc. 100.000$00 (498,80 Euros), provenientes de vendas de heroína que efectuou e que estava a dever. 63. No dia 10.4.2002, a mesma arguida Ana recebeu 10 pacotes de heroína para vender, os quais lhe foram entregues pelas arguidas Gina ou Catarina, e vendeu-os nesse mesmo dia, entre as 16h00m e as 21h48m. 64. A arguida Ana... vendeu ainda heroína a José Gonçalves, identificado a folhas 225, a José Manuel..., identificado a folhas 227 e, no dia 1.4.2002, a Carlos Manuel..., identificado a folhas 229. 65. O referido José Manuel... ligava primeiro para a Maria ou para a Isabel para encomendar a heroína que pretendia, as quais lhe diziam para ir comprar aos arguidos Bruno ou Ana..., dependendo de quem tivesse para vender. 66. Na sua actividade de tráfico, a arguida Ana... utilizava o telemóvel Nokia, modelo 3330, com o IMEI n.º ....., que lhe foi apreendido (folhas 173), tendo chegado a utilizar também o telemóvel com o n.º 914..., que era propriedade do arguido Bruno. 67. O arguido Bruno era também um dos vendedores que vendia produto estupefaciente por conta das arguidas, recebia produto para venda e entregava o dinheiro das vendas à arguida Gina, no restaurante Grande.... 68. Chegou a vender, nomeadamente: 68.1. Ao arguido António Eugénio no dia 6.4.2002, dois pacotes de heroína e no dia 7.4.2002, pelo menos, mais um pacote do mesmo produto, sempre a mando da arguida Isabel. 68.2. A José Manuel... (Né), no dia 8.4.2002. 68.3. A Manuel Pereira..., conhecido por Manuel Chouriço no dia 8.4.2002. 68.4. E a Carlos Manuel..., tendo efectuado tais vendas sempre a mando da arguida Isabel. 69. O arguido Bruno utilizava, nessa actividade, o telemóvel n.º 9685..., que lhe foi apreendido a folhas 73; anteriormente utilizou também outro telemóvel, com o n.º 9146.... 70. Recebia o produto estupefaciente para vender, quer através da arguida Catarina, quer da arguida Gina. 71. Para o efeito, telefonava primeiro para a arguida Isabel, depois esta ligava para a arguida Gina ou para a arguida Catarina, avisando-as de que ele ia buscar heroína. 72. Por uma vez, o telefone foi atendido pela arguida Maria, sendo, então, esta quem providenciou pela entrega do produto ao arguido. 73. O arguido em referência entregava o preço do produto que lhe era entregue após a sua venda. 74. Nomeadamente no dia 6.4.2002, foi buscar quantidade não apurada de heroína à arguida Gina, a mando da arguida Maria, que vendeu no mesmo dia, após o que entregou o preço correspondente à arguida Gina, de acordo com o combinado. 75. De igual modo, o arguido António Eugénio comprou heroína às arguidas Isabel e Maria, pelo menos desde Setembro de 2001, até à data em que as arguidas foram detidas. 76. Comprava, em média, às ditas arguidas, 10 pacotes de heroína, de três em três dias, destinando-a toda a seu consumo. 77. Para o efeito, telefonava previamente à arguida Isabel para o n.º 9665..., a fazer a encomenda do produto que pretendia, o qual lhe era entregue no dia seguinte, em Viseu. 78. Nos telefonemas que efectuava para a arguida Isabel, utilizava o telefone n.º 9646.... 79.1. No dia 28.3.2002, a arguida Isabel entregou-lhe 10 doses de heroína, de acordo com o combinado previamente com o mesmo, na noite anterior, pelas 21h30m, por contacto telefónico. 79.2. No dia 1.4.2002, a arguida Isabel entregou-lhe mais 10 doses de heroína, de acordo com o combinado previamente com o mesmo, na noite anterior, cerca das 23h00m, por contacto tele-fónico, vindo o arguido a pagar, nesse dia, apenas o preço de metade do produto e no dia seguinte, a parte em falta. 79.3. No dia 3.4.2002, pelas 00h05m, telefonou para a arguida Isabel tendo efectuado nova encomenda de 10 doses de heroína, por contacto telefónico; esta, por seu turno, porque se encontrava então em casa dos seus familiares em Póvoa de Lanhoso, transmitiu a encomenda, também por contacto telefónico, à arguida Maria, tendo sido esta quem entregou o produto encomendado ao arguido António Eugénio; comprou ao arguido Bruno, no dia 6.4.2002, 2 pacotes de heroína. 79.4. Telefonou ainda para a arguida Isabel, no dia 7.4.2002, pelas 00h05m, a quem fez encomenda de 2 ou 3 doses de heroína, tendo-lhe a arguida dado instruções para ir buscar o produto à arguida Gina, que lho entregaria no restaurante Grande...; logo de seguida, a arguida Isabel telefonou para a arguida Gina, a fim de lhe dizer para entregar o mencionado produto ao António Eugénio, o que só não ocorreu em virtude da Gina já ter saído do restaurante e aí ter deixado o produto guardado, não podendo voltar atrás. 79.5. Cerca das 19h00m do dia 7.4.2002, de novo o arguido António Eugénio telefonou para a arguida Isabel, data em que esta o mandou ir buscar o produto ao arguido Bruno, pelo menos um pacote, o que este fez, tendo desde logo combinado com a Isabel a entrega de mais 10 doses de heroína para o dia seguinte de manhã. 79.6. No dia 10.4.2002, a arguida Isabel entregou-lhe mais 5 doses de heroína, de acordo com o combinado com o mesmo por contacto telefónico, no dia 9.4.2002, pelas 19h07m: telefonou à arguida Isabel no dia 11.4.2002, tendo sido atendido pela arguida Maria, a quem encomendou mais 10 doses de heroína, tendo ficado combinado que o produto lhe seria entregue na manhã seguinte. 80. Todos os arguidos actuaram sempre voluntária e conscientemente. 81. Os arguidos Maria..., Isabel..., José..., Gina, Catarina, Bruno, Ana..., Fernando e Ana Lúcia conheciam a natureza e características das substâncias que compra-vam, vendiam, davam e tinham na sua posse, sabendo que tais condutas lhes estavam vedadas por lei. 81.1. O arguido António Eugénio conhecia a natureza e características do produto que adquiria para seu consumo. 82. A arguida Isabel já sofreu as seguintes condenações: 82.1. No âmbito do processo comum n.º 452/92, do 1º juízo criminal do TJ de Guimarães, por acórdão de 2.3.1993 transitado em julgado em 8.3.1994, foi condenada como autora material de um crime de tráfico, ocorrido em Novembro de 1991, na pena de 8 anos de prisão. 82.2. No âmbito do processo comum colectivo n.º 62/96, da 2ª secção do Tribunal de Círculo de Santo Tirso (actual n.º 742/99.1TBSTS), por acórdão de 17.4.1997 transitado em julgado em 1.5.1997, foi condenada como autora material de um crime de tráfico de estupefacientes, praticado em 21.1.1994, na pena de 6 anos de prisão, da qual lhe foi perdoado 1 ano, ao abrigo da Lei 15/94, de 15.3; em cumulo jurídico com a pena descrita no número 82.1, foi a arguida condenada na pena única de 11 anos de prisão. 82.3. Esteve presa à ordem dos mencionados processos, ininterruptamente, desde 21.1.1994 a 22.11.2000, data em que lhe foi concedida a liberdade condicional até 21.1.2004, cujo prazo ainda decorre. 83. O arguido António Eugénio já sofreu diversas condenações, das quais se destacam as duas mais recentes: 83.1. No processo comum colectivo n.º 317/92, do 2º juízo criminal do TJ de Viseu, por acórdão do STJ transitado em julgado em 1993, foi condenado pela prática de um crime de tráfico de estupefacientes, na forma continuada, por factos ocorridos em 9.10.1991 e Dezembro de 1991, na pena de 3 anos de prisão; esteve preso à ordem deste processo, ininterruptamente, desde 14.12.1991 até 13.5.1994 e desde 8.9.1999 a 10.4.2000. 83.2. No âmbito do processo comum n.º 95/96, do 2º Juízo Criminal de Viseu, foi conde-nado por acórdão transitado em julgado em 12.7.1996, como autor material de um crime de tráfico de estupefacientes, por factos ocorridos entre finais do ano de 1994 e 8.3.1995, na pena unitária de 4 anos e 6 meses de prisão. 83.3. Esteve detido à ordem deste último processo, ininterruptamente, desde 8.3.1995 a 8.9.1999. 84. Tais condenações não constituíram obstáculo bastante ao cometimento de novos crimes pela arguida Isabel. 85. Esta arguida tem acentuada propensão para a prática de actos desta natureza, que no momento ainda se mantém. 86.1. A arguida Maria não confessou. 86.2. Aufere, da sua actividade profissional, a quantia mensal de cerca de 1.000 Euros. 86.3. Não tem antecedentes criminais registados. 87.1. A arguida Isabel não confessou. 87.2. Casada segundo a lei cigana, aufere, da sua actividade profissional, a quantia mensal de cerca de 1.000 Euros. 88.1. O arguido José... confessou parcialmente os factos. 88.2. Solteiro, vive com a mãe, a quem ajuda financeiramente e aufere, da sua actividade profissional, a quantia mensal de 400 Euros. 88.3. Tem emprego garantido, numa empresa ligada ao seu sector profissional. 88.4. Não tem antecedentes criminais registados. 89.1. A arguida Gina confessou os factos parcialmente. 89.2. Solteira, aufere, da sua actividade em part-time, a quantia mensal de 150 Euros. 89.3. Não tem antecedentes criminais registados. 90.1. A arguida Catarina confessou os factos parcialmente. 90.2. É solteira e está desempregada. 90.3. Não tem antecedentes criminais registados. 91.1. O arguido António Eugénio assumiu ser consumidor de heroína. 91.2. Divorciado, tem um filho com 14 anos de idade, auferindo a quantia mensal de cerca de 500 Euros, da sua actividade profissional. 92.1. O arguido Bruno confessou os factos provados. 92.2. Trabalha actualmente como canalizador, em Lisboa, auferindo a quantia mensal de 350 Euros. 92.3. Já foi julgado e condenado por condução ilegal. 93.1. A arguida Ana... confessou parcialmente. 93.2. É auxiliar de acção médica, auferindo a quantia mensal de 377 Euros, tendo dois fi-lhos, com 4 e 10 anos de idade. 93.3. Já foi julgada, por condução ilegal, roubo e tráfico de menor gravidade, em penas de prisão que foram suspensas na sua execução. 94.1. O arguido Fernando é casado e encontra-se em tratamento à sua toxicodependência. 94.2. Aufere, da sua actividade profissional, a quantia mensal de 500 Euros. 94.3. Não tem antecedentes criminais registados. 95.1. A arguida Ana Lúcia é casada com o arguido Fernando. 95.2. Aufere, da sua actividade profissional, a quantia mensal de 400 Euros. 95.3. Já foi julgada e condenada por crimes relacionados com tráfico de droga, em penas de multa. * Factos essenciais não provados:1. As arguidas Maria e Isabel faziam do tráfico de droga o seu único meio de subsistência. 2. A quantia de 1.237.000$00, em notas do banco de Portugal (correspondente a 6.170,13 Euros), encontrada no quarto da arguida Maria, era proveniente da actividade de tráfico das arguidas. 3. Os arguidos Ana... e Bruno misturavam outros produtos não estupefacientes na heroína que vendiam, para assim lograrem obter maior número de doses para venda e, dessa forma, maiores lucros para si próprios. 4. Na sua actividade de tráfico, as arguidas Maria e Isabel utilizavam ainda o veículo de marca Ford Orion, com a matrícula OD-..-.., registado em nome de Manuel..., conduzido habitualmente pela arguida Isabel ou por alguém da sua confiança. 5. A arguida Maria funcionava como o elemento dirigente e de coesão entre a sua nora - a arguida Isabel - as sobrinhas Catarina e Gina e os restantes vendedores, intervindo quando havia necessidade de tomar decisões acerca da distribuição da heroína, entrega do respectivo preço ou com outros aspectos ligados a tal actividade. 6. O arguido José... era o transportador de confiança das arguidas Isabel e Maria, transportando o produto de Póvoa de Lanhoso para Viseu. 7. Era também o arguido José... quem experimentava a qualidade do produto estupefaciente adquirido pelas arguidas Maria e Isabel, o que fazia a pedido destas. 8. Tal ocorreu no dia 6.4.2002, data em que aconselhou as ditas arguidas a trocar o produto (heroína) que tinham adquirido, o qual achou demasiado fraco em termos de grau de pureza, acabando por ser ele próprio que, a pedido das arguidas Maria e Isabel, foi à Póvoa de Lanhoso, a um irmão da Isabel, para fazer a troca, no dia 8.4.2002, de madrugada. 9. O arguido José... utilizava o bicarbonato de sódio para «cozinhar» a cocaína. 10. A arguida Catarina, para além disso, entregava ao arguido José... o dinheiro para este ir buscar o produto estupefaciente à Povoa de Lanhoso. 11. A arguida Ana... vendia também produto estupefaciente que adquiria a outros vende-dores de identidade não apurada. 12. O arguido Bruno... angariava clientes para as arguidas Maria e Isabel. 13. O arguido Bruno recebia sempre novo fornecimento das arguidas Maria e Isabel, depois de entregar o dinheiro das vendas de droga. 14. O arguido Fernando e a companheira, arguida Ana Lúcia, eram também vendedores de heroína tendo recebido para venda, nomeadamente, o produto acima descrito que receberam da Maria.... 15. Agiam ambos em comunhão de esforços e de intenções. 16. O preço correspondente às 5 gramas de heroína adquiridas pela arguida Ana nas circunstâncias já referidas apenas foi pago às arguidas Isabel e Maria depois da Ana e do seu companheiro, Fernando, terem procedido à sua venda, conforme combinação efectuada com aquelas na data da sua aquisição. 17. O arguido António Eugénio comprava, em média, às ditas arguidas, 10 gramas de heroína, de três em três dias, destinando-a também ao consumo da sua companheira, Cristina Isabel..., bem como à venda a terceiros. 18. No dia 28.3.2002, a arguida Isabel entregou 10 gramas de heroína ao arguido António Eugénio, de acordo com o combinado previamente com o mesmo, na noite anterior; no dia 1.4.2002, a arguida Isabel entregou-lhe mais 10 gramas de heroína, de acordo com o combinado previamente com o mesmo; no dia 3.4.2002, pelas 00h05m, telefonou para a Isabel tendo efectuado nova encomenda de 10 gramas de heroína, por contacto telefónico; o arguido telefonou para a arguida Isabel no dia 7.4.2002, pelas 00h5m, a quem fez encomenda de 2 ou 3 gramas de heroína; cerca das 19h do dia 7.4.2002, de novo o arguido António Eugénio telefonou para a arguida Isabel, tendo desde logo combinado com a Isabel a entrega de mais 10 gramas de heroína para o dia seguinte de manhã; no dia 10.4.2002, a arguida Isabel entregou-lhe mais 5 gramas de heroína, de acordo com o combinado com o mesmo; telefonou à arguida Isabel no dia 11.4.2002, a quem encomendou mais 10 gramas de heroína, pelo preço de 548,68 Euros. * Fundamentação. A convicção do Tribunal é formada, para além dos dados objectivos forneci-dos pelos documentos e outras provas constituídas, também por declarações e depoimentos, em função das razões de ciência, das certezas e das lacunas, contradições, hesitações, inflexões de voz, imparcialidade, coerência, coincidências e mais verosimilhanças que, porventura, trans-pareçam em audiência, das mesmas declarações e depoimentos. A interpretação desta fórmula legal está já sedimentada, na Jurisprudência do Supremo Tribunal de Justiça: a exposição, tanto quanto possível completa, ainda que concisa, dos motivos de facto e indicação das provas que serviram para for-mar a convicção do Tribunal, sem necessidade de se esgotarem todas as induções ou critérios de valoração das provas e contra-provas, mas permitindo verificar que a decisão seguiu um processo lógico e racional na apreciação da prova, não sendo ilógica, arbitrá-ria, contraditória ou violadora das regras da experiência comum. Nesta vertente, tendo presente a matriz da livre apreciação probatória (Art. 127º, do Código de Processo Penal), o Tribunal atendeu aos seguintes meios de prova, não só pelo seu valor individual quanto aos aspectos particulares e eventos que de cada um se indicam, mas também pela conexão geral de todos: * Documentos:Os documentos juntos aos autos e que a seguir se discriminam fundamentam os factos a que se referem, pela sua natureza e pela suficiência de cada um: Fotografias de folhas 4 a 6 (da casa das duas primeiras arguidas), 29 (restaurante onde a arguida Gina prestava serviço). Autos de busca e apreensão em casa das arguidas Maria e Isabel, a folhas 55, 148 e 261, de onde constam os objectos e valores ali encontrados. Autos de apreensão de folhas 73, 171, 172 e 173 e guia de folhas 193. Testes rápidos de folhas 56 e 57 ao material apreendido. Autos de folhas 61 e 74. Auto de exame directo a veículo, a folhas 197. Auto de exame de toxicologia, realizado no Laboratório de Polícia Científica, de folhas 203 - de onde constam as quantidades e qualidade da droga apreendida e dos demais objectos - sendo este exame essencial e suficiente na determinação daqueles parâmetros. Listagem de chamadas telefónicas, de folhas 270 a 281 e dos números de telefone, de folhas 298 a 321 e 329 a 334, sendo relevantes e reveladoras a quantidade, variedade e diversidade das chamadas efectuadas, referentes, entre outros, aos telefonemas para o telemóvel n.º 938..., da arguida Maria. Certidão de folhas 385 (acórdão proferido pelo Círculo Judicial de Viseu, em que foi arguido o filho da arguida Maria e companheiro da arguida Isabel). Certificados de registo criminal juntos a folhas 524 (arguida Catarina), 525 (arguido Fernando...), 526 (arguida Gina), 535, 1308, 1309, 1753 (arguido Bruno), 538 (arguida Maria), 539, 1302, 1755 (arguida Isabel), 549, 559, 1310, 1758 (arguido António Eugénio), 613, 1288, 1731 (arguida Ana...), 1305, 1735 (arguida Ana Lúcia), referente aos antecedentes criminais de todos os arguidos. Relatório de perícia sobre a personalidade, a folhas 1465 (da arguida Isabel) e 1492 (do arguido António Eugénio), que pouco acrescentam em sede de apreciação das suas personalidades e vivências, sendo mais útil a apreciação casuística feita em julgamento; aliás, no primeiro relatório referido, o senhor perito abalança-se a considerações verdadeiramente espúrias e exteriores à matéria que devia relatar. Declaração do CAT, referente ao arguido José..., a folhas 1792 e 1793. Declaração do Estabelecimento Prisional, de folhas 1794 e 1795. De folhas 1806, que demonstra que o arguido Bruno se encontra a trabalhar em Lisboa. Relatório de exame médico realizado em audiência, pelo Senhor Director do Centro de Saúde de Estarreja, à arguida Isabel, dele constando que a mesma não sofre de qualquer perturbação mental que a torne inimputável, sendo tal conclusão tão-só a confirmação daquilo que o próprio Tribunal Colectivo já havia concluído. * Escutas e intercepções telefónicas:As várias escutas e intersecções telefónicas (constantes dos três apensos destes autos) foram realizadas no âmbito e na sequência das investigações, todas elas judicial-mente ordenadas e controladas; quer o seu teor (estando as mesmas transcritas com seriedade e cuidado), quer as suas origens – não sendo passíveis de crítica as identifica-ções claras de quem usou os telefones e quem recebeu as chamadas (naturalmente, os donos e titulares dos respectivos telefones portáteis, sendo essa a realidade comum), tanto mais que nem isso os arguidos lograram negar, ou sequer pôr em causa de forma credível – foram essenciais na determinação e consolidação do acervo fáctico pro-vado, dando uma panorâmica correcta e coerente do modo como os arguidos se conexionavam, definindo o sistema de entrega da droga, com prévia encomenda da mesma às duas primeiras arguidas; por outro lado, a sua matéria e conteúdo foram descritos e explicados em julgamento pelos depoimentos das testemunhas ouvidas, nomeada e especialmente o Inspector Paulo..., da Polícia Judiciária, que esclareceu plenamente o Tribunal e descodificou as conversas, dando uma visão completa do modo como as duas primeiras arguidas vendiam droga e a distribuíam através de outros arguidos e a forma como estes últimos a distribuíam. Assim, valoram-se as sessões transcritas, nomeadamente (em termos meramente exemplificativos - dada a sua abundância - pelo que se referem apenas as consideradas mais relevantes): Para o telemóvel n.º 9665..., entre a arguida Isabel e o arguido José..., no apenso I, sessões n.º 5, 16, 20, 45, 53, 71, 77 (atendido pela arguida Maria, da arguida Ana...), 78 (de um consumidor), 79, 80, 95, 112, 136, 195, 214, 216, 244, 339, 341, 358, 400, 412, 415, 416, 502, 519, 520, 550, no apenso III, sessão n.º 83, nas quais se demonstram os factos provados com o n.º 6. Para o mesmo telemóvel, entre a arguida Maria e o arguido José..., no apenso I, sessões n.º 16 (nesta conversa, atende a arguida Maria, mas passou o telefone à arguida Isabel), 44, 45, 56 (combinação entre esta e o arguido para este se dirigir ao restaurante onde trabalhava a arguida Gina, a fim de se abastecer de droga), 55, 77, 112, 150, 195, 249, 255, 256, 259, 291, 342, 382, 385, 486, 524, sobre os factos dos n.º 15, 16, 18 e 27 a 34. Para a arguida Isabel, a combinar entregas de droga directamente, ou através dos seus “distribuidores”: no apenso I, sessões n.º 5, 16, 20, 47, 71, 94, 111, 112, 195, 291, 314, 398, 400, 415, 474, 494, 502, 521, 522, 550, no apenso II, sessões 8, 14, 38, 39, 54 e no apenso III, sessão n.º 83 (a linguagem é, aparentemente, cifrada, mas facilmente descodificável). Ainda para a arguida Isabel: da arguida Ana Lúcia, apenso I, sessões 341, 342 (a arguida Isabel passou o telefone à arguida Maria, que combina com a arguida Ana a entrega de droga, nas bombas de gasolina ao lado do estabelecimento prisional de Viseu); sessões n.º 397, 550, do arguido Bruno (conhecido por Chico); sessão n.º 398, da arguida Gina, a combinar entregas; sessão n.º 400, do arguido Bruno, a combinar a entrega pela arguida Ana...; sessões n.º 487, 494, 495, da arguida Ana..., a encomendar fornecimento de droga, em linguagem também pretensamente cifrada. Para o telemóvel n.º 9682..., conversas recebidas pelas arguidas Maria e Isabel: no apenso II, sessão n.º 7, a arguida Maria conversa com a sua sobrinha, a arguida Gina; na sessão n.º 8, a conversa é entre a arguida Isabel e o arguido Bruno; a arguida Ana... conversa com as arguidas Maria e Isabel, na sessão n.º 14. Para o telefone n.º 938..., como amostra, a conversa transcrita no apenso III, sessão n.º 83, entre as arguidas Isabel e Maria, sobre encomenda do filho desta e companheiro da primeira. * Declarações dos arguidos:De todos eles, quanto às suas condições de vida, pois que sobre as mesmas todos prestaram esclarecimentos de forma suficiente e credível. José..., que declarou nunca ter vendido droga, sendo consumidor de heroína e cocaína, comprando a mesma à arguida Catarina; confessou em parte os actos que lhe são atribuídos e que resultaram provados, nomeadamente a sua ida, por duas vezes, à Póvoa do Lanhoso, transportar droga e dinheiro para as duas primeiras arguidas; recebeu droga e receberia, desse serviço, um grama de heroína, como compensação (regalo, nas suas palavras); fumou droga juntamente com os arguidos Bruno e Ana.... Gina..., que assumiu ser correio das arguidas Maria e Isabel, transportando a droga que estas lhe entregavam no restaurante Grande..., onde trabalhava, entregando a mesma aos arguidos José..., Ana... e Bruno e o respectivo dinheiro àquelas arguidas; recebia, como pagamento, tabaco e algum dinheiro, em média cerca de 5 Euros. Catarina, que confessou genericamente os factos, admitindo ter sido correio das arguidas Maria e Isabel, entregando a droga que transportava à arguida Ana... (em maior quantidade) e aos arguidos José... (menos quantidade), Bruno (para consumo deste), bem como a consumido-res, tais como o José Manuel... e Manuel Pereira...; recebia, como pagamento desses ser-viços, roupa e 5 a 10 Euros; entregava o dinheiro recebido àquelas duas arguidas; agiu desse modo durante cerca de cinco meses. Bruno..., que actualmente vive e trabalha em Lisboa; fez entregas de droga para as arguidas Isabel e Maria, tendo-lhe sido dado, pela primeira, um telemóvel para contactos dos destinatários daquela droga, o que fez durante cerca de três meses, quase todos os dias; recebia, como compensação, pacotes de heroína para seu consumo. Ana..., consumidora de heroína, declarou nunca ter vendido droga; transportava droga ao arguido Bruno – cerca de 10 pacotes – e recebia, em troca, dois pacotes para si, que lhe eram entregues pelas arguidas Gina ou Catarina, por ordem das arguidas Isabel e Maria; admitiu ter fu-mado droga com o arguido José...; fazia esses transportes para poder ter droga para seu consumo. Fernando..., que era consumidor, estando actualmente em tratamento; recebeu droga di-rectamente da arguida Maria, cerca de 1 ou 2 pacotes, a cerca de cinco mil escudos cada; sabe que a sua mulher, a arguida Ana Lúcia, recebeu da arguida Maria, por uma vez, 5 gramas de heroína, que se destinaram a seu consumo; também comprou droga à arguida Ana.... Ana Lúcia, que admitiu ter comprado heroína às arguidas Maria e Isabel; por uma vez, comprou 5 gramas, à arguida Maria, por quarenta mil escudos, que destinou a seu consumo, tendo tal entrega sido feita por esta arguida, após contacto telefónico com a arguida Isabel; está em tratamento. Maria, que assumiu a propriedade do dinheiro apreendido em sua casa; nada mais disse com interesse. * Depoimentos consistentes das testemunhas (pela ordem em que foram ouvidas):Paulo..., inspector da Polícia Judiciária: narrou os factos por si apreendidos durante as investigações de forma extensa e completa, não deixando quaisquer dúvidas sobre a sua autenticidade; realizou diligências durante as investigações, descrevendo de modo claro a sua percepção sobre o modo como era distribuída a droga das arguidas Maria e Isabel, que por sua vez se abasteciam na Póvoa do Lanhoso, no pai e irmão da Isabel; a droga vinha embalada e era distribuída pelos restantes arguidos, para consumo posterior; acompanhou as escutas telefónicas e interpretou-as, por ter profundo conhecimento do seu teor; este depoimento, juntamente com as referidas transcrições (porque com elas cruzado), foi essencial na determinação do factualismo provado. Roberto...: confirma a conversa telefónica intersectada e transcrita a folhas 7, 8 e 9 do apenso I, na qual conversa com a arguida Isabel (a quem chama Dora, nome pelo qual a conhecia), combinando a entrega de droga para ele levar para o companheiro desta, preso também e no mesmo estabelecimento prisional. Joaquim de Almeida..., que apenas admite ter falado com a arguida Maria, que lhe foi indicada como vendedora de droga, sendo ele consumidor. António Neves..., agente da PSP de Viseu: fez investigações no processo e prestou um depoimento sereno, completo e credível, ajudando assim a formar a convicção do Tribunal, pela quantidade e qualidade de informações que forneceu e pelo seu conhecimento directo dos factos provados; fez vigilâncias à casa das duas primeiras arguidas, não interveio na busca à mesma, sabendo que elas continuaram a vender droga, após a detenção do referido Tó Cigano, filho e companheiro de-las, não tendo diminuído as movimentações naquela casa; a sua actividade investigatória durou até à intervenção da Polícia Judiciária; conhece bem os meandros da droga em Viseu, esclarecendo como se processava a venda da mesmas pelas arguidas e a forma como esta era distribuída pelos restantes (arguidos José..., Bruno, Ana..., Catarina e Gina), sendo conhecedor dos hábitos de consumo de alguns deles. Carlos Arcanjo..., das Brigadas de Investigação Criminal da PSP de Viseu: participou na busca e apreensão em casa das arguidas Maria e Isabel, narrando os objectos e valores que foram encontrados; confirmou que, mesmo após a detenção do filho e companheiro destas arguidas, as movimentações de consumidores de droga na sua casa se mantiveram. Maria de Lurdes..., que conhece as duas primeiras arguidas, do estabelecimento prisional de São Pedro do Sul, onde ia às visitas. António Silvério..., agente da PSP de Viseu: efectuou a busca à residência da arguida Maria, em Setembro de 2001, encontrando o dinheiro então apreendido dentro de uma gaveta de meias, de uma cómoda do quarto daquela, tendo a arguida assumido que o dinheiro lhe pertencia. Abel..., agente da PSP de Viseu: conhece a arguida Maria da cidade e da busca que fez à sua casa; esta assumiu ser a dona do dinheiro ali existente e apreendido. José Manuel Ferreira..., chefe das Brigadas Anti-Crime da PSP de Viseu: apreendeu o dinheiro encontrado em casa da arguida Maria, que assumiu ser dela; sabe que as vendas de droga diminuíram, desde a detenção das duas primeiras arguidas; referenciou todos os restantes arguidos – com excepção das arguidas Gina e Cristina – como consumidores de heroína. Manuel Pereira..., que foi consumidor de heroína, conhecendo as duas primeiras arguidas; em certa altura, contactou a arguida Isabel telefonicamente, para adquirir droga para outros consumidores, pois já tinha deixado de consumir (uma das conversas está transcrita a folhas 90 do anexo I); via grande movimentação de consumidores na zona da casa das arguidas Maria e Isabel, vivendo ele ali perto; as duas arguidas não entregavam a droga encomendada directamente, mandando alguém fazê-lo por elas; por uma vez, foi a arguida Catarina quem lhe entregou heroína, o mesmo acontecendo com a arguida Ana...; depois da prisão daquelas arguidas, o consumo diminuiu drasticamente em..., o que faz concluir pela abundância do fornecimento por aquelas, em consonância com os depoimentos dos agentes da PSP. José Manuel..., que vive na mesma localidade das duas primeiras argui-das; assegurou que tentara fazer 3 ou 4 encomendas de droga, directamente à arguida Isabel, mas esta encaminhou-o sempre para os arguidos Bruno e Ana..., mas ele não os procurou para o efeito; nunca comprou droga a qualquer dos restantes arguidos. Armando Marques, que nada sabe. José Figueiredo, vizinho do arguido José..., a quem conhece desde criança; sabe que este é considerado no meio, vivendo com a mãe, a quem ajuda. José Cardoso, patrão do arguido José..., a quem dará trabalho, por ele ser bom trabalhador, de confiança. José Silva, agente da PSP e familiar do arguido José..., que diz ser ele considerado. Os factos descritos como não provados tiveram tal desfecho, quer porque não incidiu prova sobre os mesmos, quer porque a que incidiu não foi relevante ou credível, quer ainda pelo respeito pela regra do in dubio pro reo; isto é, os factos não prova-dos ficaram a dever-se a uma total ausência de prova fiável, quer testemunhal, quer documental, quer qualquer outra que validamente pudessem corroborar a existência positiva daqueles, de modo a permitir ao Tribunal a formação, sobre os mesmos, de uma convicção positiva. * O Direito.A recorrente Isabel... recorreu da decisão final condenatória e já antes tinha interposto recurso do despacho proferido na sequência da reclamação quanto ao exame psiquiátrico que lhe foi realizado. A recorrente não cumpriu o disposto no art.º 412 n.º 5 do CPP, que a obrigava a especificar, nas conclusões, quais os recursos retidos que mantêm interesse. Como o incumprimento do comando do art.º 412º n.º 5 do CPP desencadeia, no nosso entendimento e em primeira linha, apenas convite para suprir a omissão, opta-se, por razões de celeridade e economia processual, por tomar em consideração a vontade presumível da recorrente, - da sua última alegação de recurso resulta que mantém interesse na apreciação do primitivo recurso, cfr. fls. 2006 in fine, - apesar de não ter sido manifestada, pela forma legalmente estabelecida. Sustenta a recorrente que o exame médico psiquiátrico é o único capaz de avaliar a imputabilidade do arguido; que constando dos autos o relatório do perito técnico superior do IRS sobre a personalidade do arguido, sobre a sua capacidade mental situando-o próximo da incapacidade mental, dado que tal exame feito por um especialista, não pode ser o mesmo arguido sujeito a exame de clínica geral para apreciação do seu estado psíquico e da sua imputabilidade; não pode por isso, considerar-se como exame psiquiátrico o exame sobre imputabilidade feito por um médico de clínica geral. Importa liminarmente pôr ordem nesta questão, que se foi desenvolvendo em espiral, de modo a equacionar o que verdadeiramente está em causa. Historiando: A fls. 1464 e segts, em 19 de Março de 2003, foi junto um Relatório de Perícia Sobre a Personalidade elaborado por um técnico do IRS. Esse relatório, conforme resulta de fls. 805, despacho prévio à acusação, foi pedido pelo MP e tinha em vista a aplicação do disposto no art.º 83º do Código Penal. Nesse relatório, em sede de avaliação psicológica, escreveu-se que [a arguida Isabel...] ao nível intelectual (…) apresenta desempenhos bastante abaixo dos considerados adequados para o seu grupo etário, situando-se num nível, normalmente denominado, inferior próximo da deficiência mental. Na segunda sessão da audiência de julgamento, dia 5.6.03 e na sua parte final, a mandatária da arguida, referindo o ponto em realce da predita perícia, requereu que a arguida fosse submetida a exame médico da especialidade. Na oportunidade o tribunal considerou que apesar de não lhe terem surgido dúvidas sobre a sanidade mental da arguida, não viu inconveniente em efectuar o exame requerido, tanto mais que o EP onde a arguida se encontra teria nos seus quadros médico que o poderia realizar sem prejuízo do normal andamento do processo. De seguida ordenou a realização de perícia médico-psiquiátrica. Na audiência de 6.6.03 foi proferido despacho a solicitar ao IML de Coimbra a realização de exame, pois segundo informação recebida o EP da Guarda não tinha psiquiatra. Em 16.6.03 o IML informou que distribuiu o exame ao Hospital Infante D. Pedro de Aveiro. Insistiu-se pela realização de exame, fls. 1870. A fls. 1902 o Hospital, por contas direitas, diz que no prazo concedido pelo tribunal não pode fazer o exame… O Exame foi então realizado pelo delegado de saúde da comarca, está junto a fls. 1911 e não conclui pela inimputabilidade da arguida. Na audiência de 25.6.03 foi notificado o resultado do exame. A arguida requereu que a perícia fosse feita por médico de psiquiatria. Acerca desse requerimento ponderou o tribunal que o exame se realizou ao abrigo do disposto no art.º 351º do CPP. Que perante a informação do Hospital de Aveiro não havia outra saída senão a que ocorreu, sob pena de se estar a eternizar o julgamento devido a uma diligência que até seria de não admitir. Uma vez que foi admitida, foi realizada. Se do relatório agora junto, surgisse qualquer dúvida sobre a inimputabilidade, ainda que diminuída, o tribunal teria razões fundadas para ordenar perícia mais completa. Como tal não ocorreu decidiu o tribunal nada mais ordenar. É deste despacho que recorre a arguida. Bem vistas as coisas, do que recorre a arguida é do despacho que não admitiu a realização de perícia por médico de psiquiatria de acordo com o art.º 159º do CPP. O que está em causa, não é questão, no presente contexto, académica e abstracta de saber se o exame médico psiquiátrico é o único capaz de avaliar a imputabilidade, ou a de saber se pode considerar-se como exame psiquiátrico o exame sobre imputabilidade feito por um médico de clínica geral. O que importa decidir é se, no caso, devia ter havido lugar a perícia sobre o estado psíquico da arguida. Impõe-se a realização de perícia sobre o estado psíquico de um arguido, se, nomeadamente durante a audiência de julgamento, se suscitar fundadamente a questão da inimputabilidade ou da imputabilidade diminuída do arguido, art.º 351º nºs 1 e 2 do CPP. Ora, no caso, o tribunal, desde a primeira hora, não teve dúvidas acerca da imputabilidade da arguida, apenas aquiesceu na realização do exame porque, apesar de não lhe terem surgido dúvidas acerca da sanidade mental da arguida, não viu inconveniente nisso. Impõe o rigor que se diga que a glosada perícia de personalidade nada adianta quanto à inimputabilidade. Pelo contrário, se o técnico do IRS tivesse recolhido elementos indiciadores da inimputabilidade, estamos convencidos de que não deixaria de sugerir a realização de exame médico legal. Agora o que não se pode, nem deve, é esgrimir com a perícia de modo a tentar que ela diga o que evidentemente não diz. Inimputabilidade e défice intelectual são categorias distintas. Sem curarmos do valor da avaliação levada a cabo pelo médico delegado de saúde - especialista em saúde pública -, uma coisa é certa: o seu juízo coincidiu com o do tribunal quanto à não verificação do estado de inimputabilidade. Neste contexto, não se tendo suscitado na audiência de julgamento fundadamente a questão da inimputabilidade da arguida - nem dos autos resultando indício nesse sentido, nomeadamente da perícia de personalidade e do exame de delegado de saúde, não vemos que o despacho posto em crise mereça qualquer censura, donde improcede a pretensão da recorrente. ***** Recursos da decisão final condenatória: O recurso interposto pelas arguidas, como se colhe das conclusões da sua alegação [A motivação do recurso tem duas edições e mais algumas complicações. A primeira edição junta por fax a fls. 2002 tem 8 páginas. A segunda – o que pretendia ser o original – fls. 2053 tem 15 páginas. A desconformidade, entre uma e a outra, mais do notória é palpável ! A complicação é que a motivação junta por fax ocorreu em três momentos: pág. 1 a 4 entrou no dia 29.7.03 das 22.16 às 22.17; nova entrada de pág. 1 e 2 às 23.51; mais três páginas já no dia 30.7 pelas 1.15 até às 1.16. Essa ocorrência não justifica o que se passou com a «segunda edição» pois a desconformidade, não é de falta de páginas, mas quanto ao seu conteúdo: as páginas do fax não correspondem às do pretenso original.... A segunda edição é aumentada. Assim, não temos cópia e original, mas duas motivações, o que é legalmente inadmissível. Acontece que o Ministério Público respondeu à primeira motivação. A segunda motivação só foi junta no dia em que os presentes autos foram remetidos a este tribunal da Relação, mais de vinte dias após a entrada da primitiva motivação, fora do prazo como é evidente. Daí que só se possa considerar a primitiva motivação. Mas como nem todas as conclusões apresentadas são conclusões dos fundamentos do recurso, pois algumas conclusões surgem ex novo, sem qualquer ligação e desgarradas da precedente motivação, essa circunstância leva-nos a atender apenas às questões que efectivamente são suscitadas na motivação], incide, sobre a decisão proferida quanto à matéria de facto, quer quanto à matéria de direito. No caso, impõe-se, logicamente, abordar em primeiro lugar as questões suscitadas quanto à matéria de facto, para, delimitada que esteja a matéria assente, depois analisar as questões de direito enunciadas pelas recorrentes. O poder de cognição do Tribunal da Relação em matéria de facto não assume uma amplitude tal que implique um novo julgamento, constitui apenas remédio para os vícios do julgamento em 1.ª instância, cfr. Germano Marques da Silva, Forum Iustitiae, Ano I n.º 0 Maio de 1999, pág. No mesmo sentido se pronuncia Damião Cunha, O caso Julgado Parcial, 2002, pág. 37 (1), ao afirmar que os recursos são entendidos como juízos de censura crítica - e não como “novos julgamentos”. A garantia do duplo grau de jurisdição da matéria de facto, no figurino legislativo actualmente talhado pelo legislador, não implica a anulação do princípio da livre apreciação da prova, que está deferido ao tribunal da 1ª instância, antes se impõe a compatibilização dos dois institutos. Conforme resulta da acta da audiência de julgamento, fls. 1799, a prova produzida foi documentada em obediência ao disposto no art.º 363º do Código Processo Penal. O nosso poder de cognição está confinado aos pontos de facto que as recorrentes considerem incorrectamente julgados, com as especificações estatuídas no art. 412º n.º 3 e 4 do CPP. Ora dispõe o art.º412º n.º 3 do CPPenal que quando impugne a decisão proferida sobre matéria de facto, o recorrente deve especificar: a) Os pontos de facto que considera incorrectamente julgados; b) As provas que impõem decisão diversa da recorrida; c) As provas que devem ser renovadas. E o n.º 4 que quando as provas tenham sido gravadas, as especificações previstas nas alíneas b) e c) do número anterior fazem-se por referência aos suportes técnicos, havendo lugar a transcrição. Acontece que, no caso, as recorrentes não fizeram as especificações por referência aos suportes técnicos. As recorrentes apenas sindicam a matéria de facto nos termos do art.º 410º n.º 2 do Código Processo Penal. Dispõe-se neste normativo, que o recurso pode ter como fundamento, desde que o vício resulte do texto da decisão recorrida, por si só ou conjugada com as regras da experiência comum: - Insuficiência para a decisão da matéria de facto provada; - A contradição insanável da fundamentação ou entre a fundamentação e a decisão; - Erro notório na apreciação da prova. No caso as recorrentes assacam à decisão, os vícios de (sic) insuficiência para a matéria de facto, contradição insanável da fundamentação e erro notório na apreciação da prova. Importa, assim, averiguar se a decisão recorrida padece de algum dos preditos vícios, e ainda, se há alguma nulidade que não deva considerar-se sanada, art.º 410 n.º 3 do CPPenal, até porque o conhecimento dos vícios a que alude o art.º 410º n.º2 do Código Processo Penal é oficioso, Ac. do Plenário das secções criminais do Supremo Tribunal de Justiça de 19.10.1995 DR, Iª série, de 28 de Dezembro. O problema em geral. Ocorre o vício de insuficiência para a decisão da matéria de facto provada, quando a matéria de facto provada é insuficiente para fundamentar a solução de direito, ou quando o tribunal deixou de investigar toda a matéria com interesse para a decisão final, cfr. S Santos e Leal Henriques, Recursos..., 5ª ed. pág. 62. Verifica-se contradição insanável da fundamentação ou entre os fundamentos e a decisão, quando há uma incompatibilidade, não ultrapassável através da própria decisão recorrida, entre os factos provados, entre estes e os não provados ou entre a fundamentação probatória e a decisão, aut. e ob. cit. pág. 63. Há contradição insanável da fundamentação ou entre os fundamentos e a decisão, quando se verifica uma incompatibilidade, não ultrapassável através da própria decisão recorrida, entre os factos provados, entre estes e os não provados ou entre a fundamentação probatória e a decisão. Ou seja: há contradição insanável da fundamentação quando, fazendo um raciocínio lógico, for de concluir que a fundamentação leva precisamente a uma decisão contrária àquela que foi tomada ou quando, de harmonia com o mesmo raciocínio, se concluir que a decisão não é esclarecedora, face à colisão entre os fundamentos invocados; há contradição entre os fundamentos e a decisão quando haja oposição entre o que ficou provado e o que é referido como fundamento da decisão tomada; e há contradição entre os factos quando os provados e os não provados se contradigam entre si ou de forma a excluírem-se mutuamente, cf. Simas Santos, , cfr. Simas Santos, Recursos..., 5ª ed. pág. 63 e 64. Consubstancia erro notório na apreciação da prova, a falha grosseira e ostensiva na análise da prova, perceptível pelo cidadão comum, talvez melhor por um juiz normal –com a cultura e experiência da vida e dos homens que deve pressupor-se num juiz chamado a apreciar a actividade e os resultados probatórios - na sugestão de C. Neves, Sumários de Processo Criminal, 1968, pág. 50-1, denunciadora de que se deram provados factos inconciliáveis entre si. Há um tal vício quando um homem médio, rectius, um juiz normal, perante o que consta do texto da decisão, por si só ou conjugada com o senso comum, facilmente se dá conta de que o tribunal violou as regras da experiência ou se baseou em juízos ilógicos, arbitrários ou mesmo contraditórios ou se desrespeitaram regras sobre o valor da prova ou das leges artis. Coisa diversa, e corrente, é a não aceitação pelo recorrente, da forma e do resultado da valoração e apreciação da factualidade produzida em audiência, efectuada pelo tribunal, segundo as regras da experiência e a livre convicção, cfr. art.º 127º do CPPenal, cfr. S. Santos e L. Henriques, Recursos em Processo Penal, 5.ª ed. pág. 65 Não se verifica erro notório na apreciação da prova se a discordância resulta da forma como o tribunal teria apreciado a prova produzida, Ac. do STJ de 19.9.90, BMJ 399º 260. O erro notório na apreciação da prova, art.º 410º, n.º 2, al.ª c) do CPPenal, não tem nada a ver com a eventual desconformidade entre a decisão de facto do julgador e aquela que teria sido proferida pelo próprio recorrente cfr. Ac. do STJ de 1.7.98 Proc. N.º 548/98 e Ac. do STJ de 21.10.98 Proc. n.º 961/98. O problema em particular: No caso as recorrentes limitam-se a não aceitar a forma e o resultado da valoração e apreciação da factualidade produzida em audiência, efectuada pelo tribunal. Assim insurgem-se com a data fixada pelo tribunal para a sua actividade delituosa, que não pode dar-se como provado que a aquisição da droga foi feita a determinada pessoa, porque os agentes da PJ não perseguiram o comprador até ao local do encontro, e não viram a quem foi comprada a droga, que também não pode dar-se como provado este facto, dado que o comprador afirmou desconhecer o homem que lhe entregou o produto, atirando-o para o interior da viatura e a quem nem sequer viu a cara, etc. Acontece que esse desiderato das recorrentes só se conseguia com a impugnação ampla da matéria de facto. Se as arguidas queriam concretamente sindicar a apreciação da prova nos termos amplos consentidos pelo art.º 412º n.º 3, do Código Processo Penal, deviam ter percorrido, passo a passo, o caminho aí estabelecido, o que como já vimos não fizeram. Restando-nos a via do art.º 410º nºs 2 e 3 do Código Processo Penal, cumpre dizer que lida e relida a matéria de facto provada não vislumbramos os vícios genérica e conclusivamente invocados, mas não concretamente definidos, nem quaisquer outros, nem a inobservância de requisito cominado sob pena de nulidade. Pelo contrário a decisão relativa à matéria de facto é suficiente para sustentar as decisões condenatórias proferidas, não sofre de contradição, nem se vislumbra erro na sua apreciação. Assim temos a matéria de facto definitivamente assente. Sustentam as recorrentes que há violação de caso julgado. O fundamento central do caso julgado radica-se numa concessão prática às necessidades de garantir a certeza e a segurança do direito, ainda mesmo com possível sacrifício da justiça material; quer-se assegurar através dele aos cidadãos a sua paz jurídica, quer-se afastar definitivamente o perigo de decisões contraditórias. Uma adesão à segurança com um eventual detrimento da verdade, eis assim o que está na base do instituto [Eduardo Correia, Caso Julgado e Poderes de Cognição do Juiz, 1983 pág. 302 aqui seguido de perto]. O valor desta ideia só é afirmado vigorosamente, em matéria criminal, com o iluminismo e as correntes que preparam a revolução francesa. Na sua primeira formulação legal dizia a Constituição francesa de 3 -14 de Setembro de 1791 « Tout homme, acquitté par un jury légal, ne peut être repris ni accusé à raison du même fait». A máxima ne bis in idem, em matéria criminal, pode considerar-se universalmente aceite. A questão que se põe é em que consiste este idem? Costuma desdobrar-se a questão na determinação da identidade das pessoas, «eaedem personae», e identidade do facto, ou «eadem res». A identidade das pessoas demarca os limites subjectivos, a identidade do facto, os limites objectivos do caso julgado [Cavaleiro de Ferreira, Curso de Processo Penal III, 1981, pág. 45]. A nossa Constituição recebeu esse princípio no art.º 29º 5 com a seguinte formulação «ninguém pode ser julgado mais do que uma vez pela prática do mesmo crime». O Código Processo Penal não contém qualquer norma expressa sobre o caso julgado penal, referindo-se-lhe apenas incidentalmente, v.g. art.º 449º n.º 1 b) do Código Processo Penal. Perante esta situação dois caminhos têm sido seguidos: O apontado pelo Assento do Supremo Tribunal de Justiça, de 27.1.93, DR S A de 10.3.93, no sentido de que os princípios que regem o caso julgado penal (...) se não articulam com as regras do caso julgado cível, o que implica que estas últimas não possam ser aplicadas, nos termos do art.º 4º do Código Processo Penal. A solução, segundo essa decisão, é recorrer aos princípios gerais do processo penal (...) consagrados na legislação anterior. O indicado por Germano Marques da Silva [Curso de Processo Penal, III, pág. 35] que consiste na aplicação subsidiária da disciplina do Código de Processo Civil, com as necessárias adaptações, por força do disposto no art.º 4º do Código Processo Penal. Dispõe o art.º 4º do Código Processo Penal que «nos casos omissos, quando as disposições deste código não puderem aplicar-se por analogia, observam-se as normas do processo civil que se harmonizem com o processo penal e, na falta delas, aplicam-se os princípios gerais do processo penal». Na presente situação há caso omisso e não há possibilidade de aplicação analógica de outras disposições do Código Processo Penal, pelo que, seguindo a hierarquia legal do art.º 4º do Código Processo Penal, cabe recorrer ao processo civil e às suas normas que se harmonizem com o processo penal. Assim sendo parece-nos ser de seguir o entendimento de Marques da Silva. O recurso aos princípios gerais do processo penal e nomeadamente a anteriores soluções legislativas, só deve ocorrer para conformar as necessárias adaptações do processo civil, de modo a não caucionar importações acríticas de soluções legais civilísticas. Estatui o art.º 498º n.º 1 do Código de Processo Civil, que se repete a causa quando se propõe uma acção idêntica a outra quanto aos sujeitos, ao pedido e à causa de pedir. E no n.º 2 que há identidade de sujeitos quando as partes são as mesmas sob o ponto de vista da sua qualidade jurídica. Sustentam as recorrentes que uma vez julgado um crime de tráfico praticado por determinada pessoa, com base na posse de determinada quantidade de produto que lhe foi encontrado em busca, não pode posteriormente em outro julgamento, atribuir-se novamente essa droga a terceiras pessoas, residentes e familiares do 1º arguido. Tal facto constitui uma violação do caso julgado. Liminarmente se afasta a existência de caso julgado. Não há identidade das pessoas julgadas. Pelos factos em causa nestes autos, as arguidas foram pela primeira e única vez julgadas neste processo. No processo de Viseu, as aqui arguidas, não foram acusadas, não foram julgadas, logo a decisão lá proferida, não forma relativamente a elas qualquer caso julgado; não há assim qualquer ataque ao princípio nom bis in idem, pois, repete-se, nestes autos as arguidas estão a ser julgadas pela primeira vez por determinados factos. Depois impõe-se uma precisão: nos presentes autos a droga não foi atribuída a terceiras pessoas, mas também a terceiras pessoas, o que é algo diverso. O que se apurou nestes autos, relativamente a uma parte da conduta das arguidas foi uma co-autoria. Como na eventualidade de no processo de Viseu se ter apurado que a actuação do arguido foi em co-autoria com as aqui arguidas, não se impunha nestes autos, nem fazia aqui qualquer caso julgado, também a circunstância de naquele processo as arguidas não terem sido acusadas e julgadas pela co-autoria de determinado facto não impede que, nestes autos, se apure essa responsabilidade. Não há assim qualquer violação do caso julgado. Isto é o que resulta inequivocamente da aplicação do instituto do caso julgado. Idêntica solução resulta dos princípios de processo penal e estava consagrada no regime legal pré-vigente. Do art.º 153º do Código Processo Penal de 1929 resultava que nada impedia a instauração de acção penal quanto a participantes não julgados em anterior processo. A regra era, então como agora, que a participação no mesmo crime deve normalmente ser julgada no mesmo processo em razão das regras de competência por conexão. Mas porque não há em processo penal hipótese de litisconsórcio necessário, o caso julgado condenatório não tem efeito «erga omnes». Pode assim acontecer que, em nova acção penal, sejam perseguidos cúmplices ou outros autores do mesmo facto que motivou a condenação de um autor do crime, se tempestivamente se não se procedeu à junção de processos [Cavaleiro de Ferreira, Curso de Processo Penal III, 1981, pág. 44]. Ora foi esta a situação que ocorreu nestes autos, daí que não se perceba a alegação de caso julgado por banda das recorrentes. Também não se vislumbra fundamento para que o auto de busca efectuado perca validade porque dos presentes autos apenas consta certidão tendo original ficado noutros autos que foram autonomizados. Pretende a arguida Maria ser condenada apenas pela prática do crime do art.º 25º do Decreto Lei n.º 15/93, com uma a sanção de 3 anos, com suspensão de execução da pena. Vejamos se lhe assiste, ou não, razão. A arguida Maria foi condenada, pela prática de um crime de tráfico de estupefacientes, da previsão do art.º 21º, 1 do Dec. Lei n.º. 15/93, de 22.01. É sabido que na estrutura do DL n.º 15/93, as situações de tráfico podem revestir, entre outras, duas modalidades: A) O tráfico propriamente dito, tipo fundamental de ilícito, previsto no art. 21º; B) O tráfico de menor gravidade, tipo de ilícito privilegiado, previsto no art. 25º. Dispõe-se no art.º 25 do DL n.º 15/93 que "se nos casos dos artigos 21 e 22 a ilicitude do facto se mostrar consideravelmente diminuída, tendo em atenção nomeadamente os (a) meios utilizados, a (b) modalidade ou as circunstâncias da acção, a (c) qualidade ou a (d) quantidade das plantas, substâncias ou preparações, a pena é de prisão de um a cinco anos se se tratar de plantas ou preparações compreendidas nas tabelas I a III..." Uma primeira nota: a disposição paralela do pré-vigente DL n.º 430/83 art. 24º falava em quantidades diminutas e no n.º 3 do mesmo artigo dizia-se que são quantidades diminutas as que não excedem o necessário para o consumo individual durante um dia. Abreviando razões entendemos que o paralelismo entre os tipos se cinge à circunstância de ambos, na economia dos diplomas em que se inserem, serem tipos privilegiados e nisso se esgota. No mais a diferença impera. Logo as epígrafes o denunciam: tráfico de quantidades diminutas no sistema legal pré-vigente, tráfico de menor gravidade no sistema actual. Aquele mais restrito: as quantidades diminutas, este mais amplo: a ilicitude do facto consideravelmente diminuída. Ora a ilicitude diminuída (a ilicitude como negação dos valores jurídico-criminais cfr. E. Correia, Direito Criminal I pg. 273) pode ser indiciada quer pela quantidade, quer pela qualidade da droga, quer pelos meios utilizados, a modalidade ou as circunstâncias da acção. Isto sem esquecer que estamos perante um " tipo aberto" pois no art.º 25º diz-se "nomeadamente". Assim a menor gravidade do tráfico pode resultar, singular ou cumulativamente - desde que a acção no seu conjunto, globalmente, se nos ofereça menos grave - da importância da actividade desenvolvida pelos arguidos na disseminação dos estupefacientes, do seu grau de organização e profissionalismo, da quantidade total de droga adquirida, detida ou cedida. Importante é também considerar o período de tempo da actividade, o número de pessoas identificadas como adquirentes, a repetição das aquisições, vendas ou cedências, as quantidades cedidas e os montantes pecuniários envolvidos no negócio, cf. Ac. STJ 13.2.91 BMJ 404º 188, que apesar de ter sido proferido à sombra do regime pré-vigente mantém, neste particular, plena actualidade. O que é necessário é que essa circunstância, nominada ou inominada, diminua consideravelmente a ilicitude. Daí também poder-se afirmar que essas circunstâncias não são de funcionamento automático. Esta alteração legislativa é perfeitamente justificável e de aplaudir. Sugeriu-a várias vezes a jurisprudência nomeadamente a nível do STJ. Recordamos aqui, de entre os mais significativos, o Ac. STJ de 18.2.87 BMJ 364º 578, relatado por Almeida Simões que observava assim a uma interpretação "correctiva" da lei pré-vigente: "Mas será de sufragar tal interpretação dirigida a subtrair um pequeno traficante da severa penalidade, compreensível, isso sim, para o verdadeiro "gangsterismo" ? (...) Claro que não (...) ". E mais adiante: "...seria estimável que o nosso direito positivo não desencadeasse reacções penais tão violentas em casos como o que estamos a apreciar". O legislador não foi insensível a este coro de vozes autorizadas. Quanto a nós, o art. 25º, com a amplitude que lhe desenhamos, é a resposta a esta antinomia. O aplicador do direito não fica amarrado como no regime pré-vigente às "quantidades diminutas", "consumo de um dia" art. 24º ou seja a 1,5 gramas [Cfr. a título de exemplo Ac do STJ de 30.1.90 BMJ 393º 320; Ac de 30.4.86 356º 166 ; Ac. de 10.12.86 362º 350; Ac de 1.7.87 369º 330; Ac de 18.2.87 364º 574; Ac de 2.5.90 397º 128; Ac de 10.7.91 409º 392; Ac de 11.7.91 409º 423 e Ac. de 19.9.91 409º 456.]. Houve um avanço salutar, há que o dizer, do princípio da culpa relativamente a necessidade de prevenção geral. Mas se houve um alargamento da base de incidência da previsão do tipo legal, como entendemos e vimos defendendo, também houve a agravação do máximo da pena aplicável. Esta agravação, alias, só se compreende e é também uma consequência do alargamento da base de incidência do tipo do art. 25º. Essa solução de política criminal arranca da constatação de que o "dealer" tem uma importância decisiva no mercado da droga e na criação de um tecido e rede fechada, muitas vezes de difícil controlo, transformando-se ele próprio também em elemento estimulador de um tráfico mais grave. Mas convém não perder de vista que o sistema penal intervém na perspectiva da culpa concreta do agente, permitindo que a pena aplicada corresponda à circunstância do caso, à personalidade do agente e à culpa concreta que ele revelou em cada facto. Voltando a nossa atenção ao caso dos autos será de considerar o tráfico levado a cabo pela arguida Maria como de menor gravidade? De relevante apurou-se, nomeadamente, que: 1. As arguidas Maria e Isabel, pelo menos desde Julho de 2001 até à data em que foram detidas à ordem destes autos (11.4.2002), vinham-se dedicando, em conjugação de esforços e de intenções, à cedência de heroína e mais raramente de cocaína a terceiros, mediante o pagamento de um preço(...) 3. No dia 29 de Setembro de 2001,(...) foram ali apreendidos: na sala, no interior de um maço de tabaco, 16 embalagens de plástico, contendo heroína com o peso líquido de 7,140 gramas; dois plásticos recortados destinados a embalar mais doses do mesmo produto; 13 embalagens em plástico contendo heroína com o peso liquido de 5,990 gramas e, no quarto da arguida Maria, 1.237.000$ em notas do banco de Portugal (correspondente a 6.170,13 Euros). 4. A partir da data em que o referido Tó Cigano foi detido, as arguidas Maria e Isabel prosseguiram, em conjugação de esforços e de intenções, a actividade de tráfico. 5. Adquiriam o produto estupefaciente na Póvoa de Lanhoso, através de familiares da arguida Isabel..., de nomes João... (seu pai) e Honório... (o Hinório, seu ir-mão), sendo a arguida Isabel quem os contactava e fazia as encomendas. 7. O empacotamento da heroína era efectuado, por regra, pelas arguidas Maria e Isabel em sua casa, em.... 9. Tinham elas várias pessoas a vender por sua conta, nomeadamente o arguido José..., já mencionado, as arguidas Catarina e Gina, estas sobrinhas da Maria, e ainda os argui-dos Ana... e Bruno. 10. Os arguidos José..., Ana... e Bruno são consumidores de droga, recebendo das arguidas Isabel e Maria, como forma de pagamento, quantidade não apurada de heroína e, por vezes, de cocaína. 11. As arguidas Catarina e Gina não são consumidoras de estupefacientes, recebendo roupa, tabaco e algum dinheiro (cerca de 5 Euros, por vezes) das arguidas Isabel e Maria, para pagamento dos seus serviços. 12. Os arguidos Fernando, Ana Lúcia e António adquiriam heroína às arguidas Isabel e Maria - umas vezes directamente a estas, outras vezes por intermédio dos vendedores acima identificados - que destinavam a consumo e à venda a terceiros e o António também a cedência à sua companheira. 14. Embora raramente, as arguidas Isabel e Maria também vendiam directamente aos consumidores. 22. No dia 15.4.2002, por mandado judicial, foi efectuada busca à residência das arguidas Maria e Isabel, tendo sido encontrada, no quarto da primeira e apreendida a quantia de 165 Euros, proveniente da actividade de tráfico das ditas arguidas. 27. O arguido José... foi, por duas vezes, transportador de confiança das arguidas Isabel e Maria, transportando o produto de Póvoa de Lanhoso para Viseu. 29. Para tanto, recebeu, em troca, das ditas arguidas, algum produto estupefaciente. 30. O mesmo arguido José... procedia também à venda de produto estupefaciente pertencente às arguidas Maria e Isabel. 31. Quando as arguidas Maria e Isabel não tinham produto estupefaciente para lhe entregar, mandavam-no ir buscá-lo às arguidas Catarina ou Gina. 32. No dia 30.3.2002, a mando da arguida Maria, foi buscar heroína para vender, à arguida Gina, ao restaurante Grande..., tendo levado heroína no valor de 249,40 Euros. 33. Desse produto, vendeu à arguida Ana Lúcia, no mesmo dia 30.3.2002, cerca das 21h10m, um pacote, correspondente ao preço de 24,94 Euros, tendo recebido, em troca, um anel em ouro com uma pedra vermelha. 35. Em 5.4.2002 o mesmo arguido José... vendeu a clientes não apurados heroína no valor de 249,40 Euros, pertencente às arguidas Isabel e Maria. 38. Outras vezes, era o próprio arguido José... quem, a mando das arguidas Maria e Isabel, enviava os clientes às arguidas Catarina ou Gina, onde iam buscar o produto estupefaciente que pretendiam adquirir. 39. No dia 11.4.2002, pelas 18h50, o arguido José... veio a ser interceptado e detido por elementos da Polícia Judiciária, na estação de Serviço da Shell, sita na auto-estrada A1, em..., ..., quando regressava de Póvoa de Lanhoso, onde fora buscar heroína que a Isabel havia encomendado, de acordo com ordens que lhe haviam sido transmitidas por esta. 40. Trazia, então, consigo as seguintes produtos e objectos que lhe foram apreendidos: uma embalagem revestida a fita adesiva castanha, contendo no seu interior heroína com o peso líquido de 201,934 gramas, uma pequena embalagem em plástico contendo no seu interior bicarbonato de sódio com o peso bruto de 9,555 gramas, um rolo de fita adesiva castanha e um telemóvel Nokia, modelo 8210. 42. A heroína que lhe foi apreendida pertencia às arguidas Isabel e Maria, que a destinavam a venda por preço superior ao da sua aquisição. 44. Este arguido recebera instruções das arguidas Isabel e Maria, nos dias 10.4.2002 e 11.4.2002, para ir buscar a heroína que lhe foi apreendida à Póvoa do Lanhoso e ainda para, na mesma altura, proceder à entrega de esc. 375.000$00 em dinheiro, ao indivíduo que lha entregasse, referente ao pagamento do preço de anterior aquisição de heroína. 49. As arguidas Catarina e Gina, que são irmãs entre si e sobrinhas da arguida Maria, procediam à angariação de clientes, a entrega a estes do produto estupefaciente e recebimento do preço correspondente, tudo por conta das arguidas Maria e Isabel. Depois segue-se o relato de múltiplas vendas, através de intermediários por conta da Maria e Isabel, e do respectivo modo de actuação, cuja transcrição nos dispensamos de fazer, para não alongar fastidiosamente a decisão, remetendo para os correspondentes nºs da matéria de facto provada: nºs 50, 51, 53, 54, 55, 56, 57, 59, 60, 61, 62, 63, 64, 65, 73, 74, 75, 76, 79.3 e 79.6. Da matéria de facto provada e agora posta em realce resulta, inequivocamente, que a arguida, não era uma «vendedora de fim de circuito», apresenta-se-nos antes como uma «armazenista». Isto fazendo apelo a uma linguagem argumentativa metafórica, propositadamente metafórica, porque tem um valor heurístico que ultrapassa em muito o desvalor da sua incorrecção metodológica. Por outro lado não se apurou que a arguida fosse sequer consumidora de produtos estupefacientes. Face a este quadro, entendemos que não se mostra minimamente indiciada menor gravidade. Pelo contrário, as circunstâncias de actuação em concreto da arguida afastam liminarmente a aplicação do tipo de ilícito privilegiado do art.º 25º do Decreto Lei n.º 15/93. Contrariamente ao pressuposto pelo tipo legal, efectuaram-se muitas, mas mesmo muitas vendas, em múltiplas dessas vendas foram identificados os consumidores, muitos consumidores, a quantidade de droga vendida é elevada, a actividade delituosa da(s) arguida(s) tinha um esquema de funcionamento montado, uma organização. Afigura-se-nos patente a desrazoabilidade da pretensão da recorrente. As quantidades detidas e comercializadas, os meios utilizados, a importância da actividade desenvolvida pela arguida na disseminação dos estupefacientes, o seu grau de organização e profissionalismo, o período de tempo da actividade, o número de pessoas identificadas como adquirentes - directos e indirectos -, a repetição das aquisições, vendas ou cedências, e os montantes pecuniários envolvidos no negócio, levam-nos inelutavelmente a uma conclusão: não se configura a ilicitude diminuída, antes o contrário. Sendo assim, fica prejudicada a apreciação da outra pretensão da arguida a condenação numa pena de três anos e respectiva suspensão. Quanto à pena concreta aplicada, considerando a culpa da arguida, as exigências de prevenção, o grau de ilicitude e a intensidade do dolo, artºs 40º e 71ºdo Código Penal, e tendo em vista toda a factualidade apurada, o que se pode dizer é que a mesma é proporcionada e por isso de manter. Entende a recorrente Isabel que os factos pressupostos para a aplicação da pena relativamente indeterminada devem constar da acusação e ser o arguido notificado para os contestar autonomamente o que não aconteceu: no caso dos autos as condições legais de aplicação da pena não estão demonstradas pelo que não pode tal pena ser atribuída à recorrente. A pena relativamente indeterminada, introduzida no Código Penal de 1982 e com origem no Projecto de Eduardo Correia, tenta dar resposta ao problema de certa delinquência considerada particularmente perigosa. A pena relativamente indeterminada não pode integralmente conceber-se como uma pena de culpa [F Dias, 1993 pág. 559 e segts], trata-se de uma pena compósita, em que tudo o que exceda a pena concreta - obrigatoriamente calculada e que serve de base aos limites mínimo e máximo da pena efectivamente a cumprir - mais não é do que uma verdadeira medida de segurança [Carlota Pizarro de Almeida, Modelos de Inimputabilidade: da Teoria à Prática, pág. 116]. O fundamento da pena relativamente indeterminada é a perigosidade. Da garantia penal - nulla poena sine lege- implícita no princípio da legalidade deriva consequentemente a proibição de penas absolutamente indeterminadas na sua duração. Já as penas relativamente indeterminadas, aquelas em que, embora não seja fixado o quantum exacto, se fixa na sentença um período temporal limitado por um mínimo e um máximo, não são proibidas [Anabela Rodrigues, A pena Relativamente Indeterminada, Jornadas de Direito Criminal, pág. 288]. Os pressupostos da sua aplicação, conforme resulta do art.º 83º do Código Penal, sugestivamente inserido numa secção com a epígrafe Delinquentes por tendência, podem classificar-se, tendencialmente, de formais e materiais. São requisitos formais: a prática de crime doloso a que devesse aplicar-se concretamente prisão efectiva por mais de 2 anos e ter cometido anteriormente dois ou mais crimes dolosos, a cada um dos quais tenha sido ou seja aplicada prisão efectiva também por mais de 2 anos. Qualquer crime anterior deixa de relevar quando entre a sua prática e a do crime seguinte tiverem decorrido mais de cinco anos, sendo que neste prazo não é computado o período durante o qual o agente cumpriu pena de prisão ou medida de segurança. Como requisitos materiais: a declarada inclinação para o crime e a insusceptibilidade manifesta de alterar o comportamento anti-social por virtude de penas aplicadas. Entre o delinquente que fica sujeito a pena relativamente indeterminada e os inimputáveis a quem é aplicada uma medida de segurança, as diferenças não são muitas e, há que reconhecer, as semelhanças são inegáveis [Carlota Pizarro de Almeida, Modelos de Inimputabilidade: da Teoria à Prática, pág. 118]. Os factos dados como provados que ancoraram a aplicação da pena relativamente indeterminada à arguida, os descritos nos nºs 82, 84 e 85, tinham sido vertidos na acusação, concretamente nos nºs 93, 95 e 96, cfr. fls. 815v. e 816, acrescendo que, já na acusação, juntamente com a respectiva qualificação jurídica era requerido que à arguida fosse aplicada uma pena relativamente indeterminada, cfr. fls. 816. A acusação foi notificada à recorrente que a podia ter contestado, como é evidente. Se oportunamente não contestou foi porque não quis, pois para isso, repetimos, foi notificada. Agora o que não pode, melhor não deve, é vir alegar que não lhe foi feita uma notificação para uma contestação autónoma. Essa alegação não tem qualquer sentido: o legislador não estabeleceu um regime especial para a notificação da acusação onde seja formulado o pedido de aplicação de pena relativamente indeterminada, como também não existe para a contestação desse pedido qualquer formalismo especial. O legislador limita-se a assegurar abstractamente todas as garantias de defesa, não se reclama do poder conformador concreto de cada defesa: aí o arguido é soberano, defende-se se quiser e como quiser. Tem é que assumir as consequências das suas escolhas, da sua acção ou omissão, do seu cuidado ou distracção e não alijar a sua responsabilidade para terceiros. Operando a subsunção dos factos apurados, nºs 82,, 84 e 85, no normativo do art.º 83 do Código Penal, conclui-se que estão verificados os requisitos objectivos ou formais de aplicação do instituto em causa. À data dos factos apreciados nos presentes autos a arguida ainda estava em liberdade condicional no âmbito do processo 62/96 do TC Santo Tirso, onde lhe foi aplicada a pena de seis anos de prisão, pena essa que cumulada com a pena de 8 anos de prisão, anteriormente aplicada no 1º Juízo Criminal de Guimarães, processo 452/92, deu origem a uma pena única de 11 anos de prisão. Perante a factualidade apurada também não merece reparo a conclusão de que se verificam os requisitos materiais para a aplicação da pena relativamente indeterminada. O quantum sancionatório base - sete anos de prisão - é proporcionado e a pena relativamente indeterminada está correctamente determinada. Assim não foram violados os artºs 70º, 71º, 73º e 83º do Código Penal. Decisão: Na improcedência dos recursos confirma-se a decisão recorrida. Custas pelas recorrentes fixando-se a taxa de justiça em 6 UC. Honorários da tabela. Porto, 14 de Janeiro de 2004. António Gama Ferreira Ramos Arlindo Manuel Teixeira Pinto Rui Manuel de Brito Torres Vouga José Casimiro O da Fonseca Guimarães |