Acórdão do Tribunal da Relação do Porto
Processo:
19/08.3GASTS.P1
Nº Convencional: JTRP00043827
Relator: JOSÉ CARRETO
Descritores: TRÁFICO DE ESTUPEFACIENTE
AGRAVANTE MODIFICATIVA
Nº do Documento: RP2010042119/08.3GASTS.P1
Data do Acordão: 04/21/2010
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: REC. PENAL.
Decisão: REVOGADA PARCIALMENTE.
Indicações Eventuais: 1ª SECÇÃO - LIVRO 632 FLS. 192.
Área Temática: .
Sumário: I- No tráfico de estupefacientes junto de estabelecimento de ensino ou em qualquer local em que se pratiquem actividades lectivas de qualquer natureza, o que se visa é evitar o perigo de contacto com a droga por parte de pessoas/crianças/jovens especialmente vulneráveis, incluindo, por isso, o território de incriminação as “imediações” dos locais onde se encontram ou possam encontrar.
II-Para se evidenciar a agravante consignada no artigo 24º al.h) do DL 15/93, basta que se crie o perigo de os jovens contactarem, comprarem ou de lhes ser oferecida a droga.
Reclamações:
Decisão Texto Integral: Rec. nº 19.08.3GASTS.P1
TRP 1ª Secção Criminal

Acordam em conferência os juízes no Tribunal da Relação do Porto

No Proc. C.C. nº 19.08.3GASTS, do ..º Juízo Criminal do Tribunal Judicial de Vila do Conde, em que são arguidos:
- B………….,
- C………….. e
- D…………..,

Foi a final por acórdão de 17/11/09, proferida a seguinte decisão:
“… Pelo exposto, acordam os juízes que constituem este Tribunal Colectivo em:
a) Absolver o arguido B………… da prática de um crime de tráfico de estupefacientes agravado, previsto e punível pelos artigos 21º, n.º 1 e 24º, h) do DL. 15/93;
b) Absolver o arguido C……….. da prática de um crime de tráfico de estupefacientes agravado, previsto e punível pelos artigos 21º, n.º 1 e 24º, h) do DL. 15/93;
c) Absolver o arguido D………… da prática de um crime de tráfico de estupefacientes agravado, previsto e punível pelos artigos 21º, n.º 1 e 24º, h) do DL. 15/93-
d) condenar o arguido B……….. pela prática, como reincidente, de um crime de tráfico de estupefacientes, previsto e punível pelos artigos 21º, n.º 1 do DL. 15/93 na pena de prisão de cinco (5) anos e seis (6) meses;
e) Condenar o arguido D…………. pela prática de um crime de tráfico de estupefacientes, previsto e punível pelos artigos 21º, n.º 1 do DL. 15/93 na pena de prisão de quatro (4) anos e três (3) meses;
f) Suspender a execução da pena de prisão ao arguido D…………, por igual período, com a sujeição a um regime de prova – artigos 50º, n.º 1, 2 e 5 e 53º do C. Penal;
g) Condenar o arguido C………… pela prática de um crime de tráfico de estupefacientes de menor gravidade, previsto e punível pelos artigos 21º, n.º 1 e 25º, a) do DL. 15/93 na pena de prisão de catorze (14) meses;
h) Suspender a execução da pena de prisão ao arguido C………., por igual período, com a sujeição a um regime de prova – artigos 50º, n.º 1, 2 e 5 e 53º do C. Penal;
i) Declarar perdido, a favor do Estado, o produto estupefaciente apreendido à ordem deste processo, e ordenar a sua posterior destruição – artigo 35º, n.º 2 do DL 15/93;
j) Declarar perdido, a favor do Estado, todas as quantias em dinheiro apreendidas à ordem deste processo - artigo 35º do DL 15/93;
( …)”

Inconformado recorreu o Mº.Pº, o qual no final da sua motivação apresenta as seguintes conclusões:
“1 – A agravação prevista no art. 24º do Dec-Lei nº 15/93 é uma agravação objectiva que ocorre se se verificar, no caso concreto, alguma das situações ali enumeradas entre as quais se encontra o tráfico de estupefacientes desenvolvido nas imediações de um estabelecimento de ensino;
2 – Esta agravação não está dependente da verificação de uma qualquer condição ou juízo de censurabilidade;
3 – Basta a mera potenciação abstracta da venda poder ser detectada pelos jovens estudantes, concretizada com o simples acto de traficar nas imediações de uma Escola, para que o crime de tráfico de estupefacientes seja qualificado nos termos do art. 24º alínea h);
4 – O corpo deste artigo não contém nenhum pressuposto de que faça depender aplicação de cada uma das alíneas ali referidas, designadamente que os estudantes/menores se apercebam da actividade de tráfico que está a ser desenvolvida;
5 – Com agravação da pena prevista no art. 24º do Decreto-Lei nº 15/93 a pena concretamente aplicável ao arguido B………….. nunca poderá ser inferior ao mínimo legal de 7 anos de prisão;
6 – A gravidade do crime cometido pelo arguido D…………. e as repercussões sociais adjacentes a este tipo de ilícito desaconselham que, mesmo com condições pessoais favoráveis e com ausência de antecedentes criminais, se opte pela suspensão da execução da pena;
7 - Só em casos muito excepcionais, é que deverá admitir-se a suspensão da execução da pena a um indivíduo condenado pelo art.21º nº1 do Decreto-Lei nº 15/93 devendo reservar-se apenas as situações de pouca gravidade em que o arguido convença o tribunal que está arrependido e que está disposto a pautar a sua vida pelo respeito das normas que regem a vida em sociedade;
8 - No caso dos autos, nem o arrependimento do arguido nem a sua postura colaborante nem a sua vontade de abandonar a delinquência foram dados como provados pelo que não é possível o tribunal concluir que a simples ameaça da prisão realiza de forma adequada as finalidades da punição;
9 – O tribunal recorrido violou o disposto nos arts. 21º e 24º al.h) do Dec-Lei nº 15/93, de 22 de Janeiro e art. 50º nº1 do Código Penal.
Nestes termos, deverá o Acórdão recorrido ser substituído por um outro que:
- aplique ao crime de tráfico de estupefacientes praticado pelo arguido B………….. a agravação prevista no art. 24º al.h) do Dec-Lei nº 15/93 e em consequência lhe aplique uma pena concreta de, pelo menos, 7 anos de prisão;
- não suspendendo a execução da pena de prisão ao arguido D………… lhe aplique a pena efectiva de 4 anos e 3 meses de prisão pelo crime em que foi condenado.”

Os arguidos não responderam.
Nesta Relação o ilustre PGA é de parecer que o recurso deve proceder.
Foi cumprido o artº 417º2 CPP e o arguido D………… pronunciou-se pela suspensão da pena.

Colhidos os vistos, procedeu-se á conferência com observância do formalismo legal
Cumpre decidir.
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São as seguintes as questões suscitadas:
- qualificação jurídica dos factos praticados pelo arguido B…………, como integradores de um crime de tráfico de estupefacientes agravado, e
- respectiva pena
- não suspensão da pena aplicada ao arguido D…………….
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O recurso é restrito á matéria de direito e apenas em relação aos arguidos B………… e D…………..

Quanto á 1ª questão.
Os arguidos vinham acusados da pratica de um crime de tráfico de estupefacientes agravado p. p. pelo artº 24º al h) DL 15/93 e ainda pela reincidência o arguido B…………..

Insurge-se o MºPº, quanto á absolvição do arguido por tal crime (e condenação apenas pelo crime fundamental - artº 21º), porquanto entende estar preenchido tal ilícito.

Ora consta dos factos provados que:
“ … pelo menos desde Agosto de 2008 até Março de 2009, … o arguido…. dedicou-se à venda de produtos estupefacientes – heroína - o que acontecia, por vezes, na zona junto á Escola EB 2-3 da ……., Vila do Conde, o que, e em face ao aglomerado de toxicodependentes que ai se deslocavam para adquirir e consumir produtos estupefacientes” (nº 7)
“No dia 26 de Setembro de 2008, cerca das 11,45 horas o arguido … encontrava-se nas imediações do referido estabelecimento de ensino, na Rua ………, ……., Vila do Conde com o intuito de vender heroína em doses individuais com que se fazia transportar, a toxicodependentes que áquele local se dirigiam com esse propósito” donde se verifica que o arguido procedia a actividades de tráfico nas imediações de um estabelecimento de ensino.
Ora nos termos do artº 24º al.h) DL 15/93 de 22/1 (alterado pela Lei 11/04 de 27/3) as penas são agravadas se o tráfico de droga tiver sido cometido em “ estabelecimento de educação, ou em outros locais onde os alunos ou estudantes se dediquem à pratica de actividades educativas, desportivas ou sociais, ou nas suas imediações”.
Em face dos factos provados evidente se torna que estão preenchidos os elementos objectivos de tal circunstância agravativa.

A diferença entre o acórdão recorrido e o recorrente reside no facto de naquele se entender que o âmbito de protecção da norma se dirige ás pessoas e não aos locais, pelo que não se tendo demonstrado que essa actividade pudesse ter influencia na aquisição de hábitos de consumo por parte dos alunos da escola (uma vez que … não se demonstrou que os mesmos se apercebessem de tal actividade) entende que a agravante em causa não se encontra preenchida.

Analisado o artº 24º DL 15/93 verifica-se que ali se enumeram situações diversas, e sem por em causa a doutrina do Ac. STJ 7/7/09 in www.dgsi.pt/jstj, que se refere especificamente ao tráfico no estabelecimento prisional (e exclui a agravação automática mormente em função da quantidade de droga detida pelo recluso ou a sua finalidade, mas como consta do Ac. STJ 8/10/08 in www.dgsi.pt/jstj sendo taxativas as circunstâncias agravantes ali previstas) e onde “A razão de ser da agravação do facto por efeito da conduta integrante haver tido lugar em estabelecimento prisional reside na perturbação do processo de ressocialização dos reclusos e no grave transtorno da ordem e organização das cadeias que o tráfico comporta.”, no tráfico de estupefacientes junto de estabelecimento de ensino ou em qualquer local onde se pratiquem actividades lectivas de qualquer natureza, o que se visa é evitar o perigo de contacto com a droga por parte de pessoas / crianças/ jovens especialmente vulneráveis, e por isso o território de incriminação inclui as “imediações” dos locais onde eles se encontrem ou possam encontrar procurando com isso evitar qualquer possibilidade de contacto.
E como nesse normativo (artº 24º) se usam técnicas diversas, desde conceitos indeterminados (“grande números de pessoas “– al b) “avultada compensação remuneratória” al.c) a dados objectivos, não é possível interpretar de modo redutor todas as circunstâncias.

Assim:
- porque no caso concreto está em causa um estabelecimento de ensino/ local educativo onde se encontram os jovens alunos/ estudantes, local e pessoas, de onde e de quem a lei quer afastar a droga (sendo o tráfico de droga uma actividade anti-social e anti-educativa), e por isso inclui até as suas imediações desses locais, e
- porque o crime de tráfico de droga é um crime de perigo – crime de perigo comum, em face dos múltiplos bens jurídicos protegidos onde sobressai a incolumidade pública na vertente da saúde pública - Ac.STJ 23/7/85, BMJ 349º 293 - mas que põe em causa a vida, a integridade física e a liberdade de virtuais consumidores, e, afecta a vida em sociedade dificultando a inserção social do consumidor e possuindo efeitos criminogenos - Ac.T.C. 7/6/94 DR 2ªs de 27/10/94 – e crime de perigo abstracto, pois não se mostra necessária a verificação de uma concreta situação de perigo para a verificação do crime, mas apenas a perigosidade da acção, em relação aos jovens estudantes, traduzida até na simples detenção de droga (qualquer uma das acções do artº 21º1 DL 15/93), para considerar preenchido, in casu, a agravação do artº 24º h) nas imediações de estabelecimento de ensino, traduzindo em função do aglomerado de jovens alunos de diversas idades susceptíveis a novas experiências, a exasperação do grau de ilicitude por parte dos adultos traficantes, pois de outro modo estaríamos já, quer-nos parecer - no âmbito de um perigo concreto.
Basta que crie a possibilidade, o perigo, de os jovens contactarem, de comprarem ou de lhes ser oferecida a droga, para a razão de ser daquela agravante se evidenciar.
Acresce que, no caso concreto, estamos perante uma conduta reiterada e não meramente esporádica ou acidental, caso em que ponderação poderia ser outra.
O facto de não se haver provado que com aquela conduta o arguido “procurasse incitar ou iniciar ao consumo consumidores cada vez mais jovens” não releva para o efeito, dado que tal situação se podia enquadrar na l.a ) do artº 24º DL 15/93 “As substancias … foram entregues ou se destinavam a menores…”

Aceitamos por isso, que estamos perante um crime de tráfico de droga qualificado do artº 24ºh) DL 15/93 (redacção da Lei 11/04 de 27/3 que fixou o aumento da pena em ¼ ) e em que a pena vai de 5 a 15 anos de prisão.

Reclama o recorrente que a pena do arguido deve ser fixada em 7 anos de prisão, em substituição dos 5 anos e 6 meses pelo crime de tráfico do artº 21º.
Em face da nova qualificação do crime, e porque o arguido foi considerado reincidente, circunstância que não é questionada (e se verifica - artº 75º CP) e impõe a agravação do limite mínimo em um terço (ou seja 20 meses ou 1 anos e 8 meses), verifica-se que o limite mínimo a considerar é o de 6 anos e 8 meses.
Tendo em conta os factos apurados que interessam para a determinação da medida da pena e elencados e ponderados no acórdão recorrido (culpa do arguido e exigências de prevenção geral e especial e todas as circunstâncias do artº 71º CP, e para que se remete – fls. 38 e 39 do acórdão), efectivamente a pena de 7 anos de prisão (apenas mais 4 meses para além do limite mínimo) é adequada e justa.

Procede por isso o recurso.
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Quanto ao arguido D…………. foi o mesmo condenado como autor de um crime de tráfico de estupefacientes p. p. pelo artº 21º DL 15/93 na pena de 4 anos e 3 meses, cuja execução foi suspensa por igual período com submissão ao regime de prova.

É contra esta suspensão que se insurge o recorrente.

Como se refere no acórdão recorrido e resulta da lei - artº 50º CP - a suspensão da execução da pena de prisão, exige que seja possível emitir um juízo de prognose favorável á reinserção social do arguido, e se a tal se não opuserem razões de prevenção geral.
O tribunal recorrido justificou a suspensão da pena de prisão, pelo facto de ter tido uma vida laboralmente activa e estar socialmente inserido e não ter antecedentes criminais (fls. 43).

Ora o arguido D………. dedicou-se ao tráfico de droga / heroína desde Novembro de 2008 a 12 de Março de 2009 altura em que foi detido e tinha consigo no carro e em casa heroína e dinheiro resultante das vendas.
Iniciou o tráfico de droga logo no mês a seguir a encontrar-se de baixa médica (nºs 27 e 28 dos factos provados) por doença oncológica.

Ora estes factos evidenciam uma personalidade desconforme com a Ordem Jurídica, pois que apesar da sua doença, o arguido não se coíbe de procurar ganhar dinheiro á custa da saúde e vida dos consumidores de droga, sabendo o mal que lhes causa.
O arguido não prestou declarações, não confessou os factos e não mostra arrependimento pelo mal feito, pelo que em face dos dados do processo, nada nos permite concluir que a simples censura do facto e a ameaça da pena realizam de forma adequada e suficiente as finalidades da punição (protecção dos bens jurídicos e reintegração do agente na sociedade – artº 40º CP), e assim em face das condições que o levaram ao crime e da sua personalidade, nada parece obstar á sua continuação, face ás razões que o levaram á prática de tais factos, sendo certo que estamos perante um individuo que inicia tal actividade com 48 anos de idade e por isso perfeitamente consciente dos seus actos e das suas responsabilidades, não se vendo outro intuito na sua acção que não o financeiro, pondo em causa a educação do filho de 20 anos com quem convivia.
Ora tendo em conta tais factos e circunstâncias e porque não se trata de uma actividade esporádica mas que decorreu durante 5 meses e a que foi posto cobro com a sua detenção, e está em causa uma droga dura, a suspensão da pena de prisão a nosso ver “inviabilizaria a necessária tutela dos bens jurídicos e a estabilização contrafáctica das expectativas comunitárias” – Ac. STJ 7/7/09, www.dgsi.pt/jstj proc. 52/07.2PEPDL.S1; é que como refere o STJ no ac. de 25/11/07 wwwdgsi.pt / jstj. proc. nº 07P3761 para além da necessidade do juízo de prognose social favorável á reintegração social do arguido, há que ponderar as fortes exigências de prevenção geral, e que “7…A Resolução do Conselho de Ministros n.º 46/99, de 26 de Maio, que aprovou a estratégia nacional de luta contra a droga, fixou como um dos objectivos primordiais o reforço do combate ao tráfico, aliás, como opção estratégica fundamental para Portugal. E acrescentou que «as dramáticas consequências do tenebroso negócio do tráfico ilícito de drogas, empreendido tantas vezes por verdadeiras organizações criminosas, e que atinge não apenas a vida dos jovens mas também a vida das famílias e a saúde e segurança da comunidade, são de tal modo chocantes que se torna um imperativo mobilizar todos os esforços para combater o tráfico com redobrada determinação...” 8 – Assim, a suspensão da execução da pena nos casos de tráfico comum e de tráfico agravado de estupefacientes, em que não se verifiquem razões muito ponderosas, (…) seria atentatória da necessidade estratégica nacional e internacional de combate a esse tipo de crime, faria desacreditar as expectativas comunitárias na validade da norma jurídica violada e não serviria os imperativos de prevenção geral.”
E se no caso há que reiterar o que no acórdão recorrido se refere citando o ac. STJ de 18/12/08 www.dgsi.pt/jstj “…nos crimes de tráfico de estupefacientes, as razões de prevenção geral só excepcionalmente se satisfazem com uma pena de substituição. Os efeitos nocivos para a saúde resultantes do tráfico, especialmente quando (como no caso) se trata de drogas duras, e as situações em que os actos de venda se prolongam no tempo e/ou atingem um elevado número de pessoas despertam “um sentimento de reprovação social do crime”, para usar as palavras do Prof. Beleza dos Santos, que impedem a aplicação da suspensão da execução da pena, sob pena de “…ser posta em causa a crença da comunidade na validade de uma norma e, por essa via, os sentimentos de confiança e de segurança dos cidadãos nas instituições jurídico-penais” (Figueiredo Dias, op. cit, pag. 243). Por isso, razões de prevenção geral afastam a aplicabilidade deste instituto, por mais favorável que pudesse ser o juízo de prognose a formular acerca do arguido” não vemos como encontrar razões para suspender a execução da pena de prisão, não apenas porque a Comunidade/sociedade não perceberia a razão dessa suspensão, como não existe uma razão ponderosa que nos leve a considerar essa suspensão da pena (ou estaria justificada a pratica de crimes de tráfico por necessidades de dinheiro ou por pessoas doentes do foro oncológico), como é reafirmado na necessidade de ponderar “a estratégia nacional e internacional de combate a esse tipo de crime“ (Ac. STJ 9/4/08 www.dgsi.pt/jstp Cons. Simas Santos) sob pena de serem postos em crise “…os imperativos de prevenção geral” tanto mais que apesar do combate ao tráfico de droga (e dos enormes custos que isso envolve) este se acentua e cresce, quiçá fruto de uma desadequação do regime sancionatório á realidade, pois como refere o “SOL” na sua edição online de 12/11/08, o consumo de droga aumentou passando de 7,8 % para os 12% da população portuguesa, sendo que “ Quando o universo se restringe à população jovem adulta (15 aos 34 anos), os índices de consumo de estupefacientes pelo menos uma vez na vida sobem na generalidade, passando de 12,6 por cento em 2001 para 17,4 por cento no ano passado, ainda de acordo com os números apresentados por João Goulão aos deputados da Comissão Parlamentar da Saúde e Assuntos Sociais.” sendo a heroína uma das drogas de maior consumo. Cfr.:
http://sol.sapo.pt/PaginaInicial/Sociedade/Interior.aspx?content_id=116576, e no comportamento, modo de vida e personalidade do arguido expresso nos factos provados nada vemos que nos leve a considerar que o arguido não voltará a delinquir, uma vez que nada permite concluir que “interiorizou o mal do crime” e por essa razão não o repetirá e passe a ter uma conduta conforme á Ordem Jurídica, levando uma vida socialmente útil, sendo certo que se a doença do foro oncológico, a que foi operado, não o impediu de se dedicar ao tráfico de droga e não é impeditivo de cumprir a pena de prisão.
Não é assim de suspender a execução da pena, antes o seu cumprimento é exigido pela ordem jurídica, pelo que procede o recurso.

Não há outras questões de que cumpra conhecer.
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Pelo exposto, o Tribunal da Relação do Porto, decide:
Conceder provimento ao recurso interposto pelo MºPº, e revoga parcialmente o acórdão recorrido, e em consequência:
- Como autor de um crime de tráfico de estupefacientes agravado p.p. pelos artºs 21º e 24º h) Dl 15/93 de 22/1, e ponderando o disposto nos artºs 71º e 75º CP, como reincidente, condena o arguido B……….., na pena de sete anos de prisão; e
- revoga a suspensão, com submissão ao regime de prova, da execução da pena de quatro anos e três meses aplicada ao arguido D…………., que assim deve cumprir a pena de prisão em que foi condenado.
Sem custas.
Notifique.
Dn
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Porto, 21/04/2010
José Alberto Vaz Carreto
Joaquim Arménio Correia Gomes